Perguntas-me?
By Manuel Alves
3/5
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About this ebook
Quarenta e seis histórias pequeninas com ilustrações nos rostos.
As histórias também têm rostos? Ora, as histórias são multidões de rostos, desejos, sonhos e gostos.
Que histórias estão nestas páginas? Perguntem ao livro.
Manuel Alves
https://www.patreon.com/manuelalves--O autor só fala de si mesmo na terceira pessoa quando tem de falar do autor ou, é claro, quando pratica a extraordinária arte da feitiçaria imaginativa — há quem lhe chame Escrita. Se houvesse na minha vida lugar para gatos, teria dois e um seria um Gremlin disfarçado. Tenho um furão e uma hiena — ambos imaginários.--The author only speaks of himself in the third person when he has to speak about the author or, of course, when he conjures the extraordinary art of imaginative sorcery—some call it Writing. If there was any place for cats in my life, I would have two and one of them would be a Gremlin in disguise. I have a ferret and a hyena—both imaginary.
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1 rating1 review
- Rating: 3 out of 5 stars3/5Há poesias interessantes.
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Perguntas-me? - Manuel Alves
Vamos fugir e fazer um filme?
Casablanca é um cliché estragado por um ponto de vista errado.
Dêem-nos outra guerra, para reacender os amores e recordar à voz como se berra.
Desta vez, Lisboa será o ponto de partida em vez de mais uma paragem esquecida.
O filme não será maculado pela cor. Na emoção, demasiados arco-íris matam a dor.
Nem o velhinho preto e branco terá lugar. O positivo e o negativo não são suficientes para falar. Não neste filme que a vontade necessita de narrar.
Sépia.
Quero tons quentes mas tristes. Não muito. Apenas o suficiente para serem reais. Não mais.
O sangue será de um vermelho velho. Não será reflexo nem espelho.
A pele quero-a toda da mesma terra, cor da madeira aberta pelos dentes da serra.
Os dentes não têm cor, são apenas sorriso. Quero-os em grandes planos, em tímidos lábios entreabertos, para que a tristeza saiba o que é um aviso.
É isso.
Depois?
Depois fazemos amor com sexo. Rimos das desgraças dos outros, como se fossem piadas sem nexo.
O fim do filme será triste. Pelo menos, para quem assiste.
Quem o vir terá inveja de nós. Sentir-se-ão pequeninos e terrivelmente sós.
No fim, não haverá palavras. Nem mesmo o The End tão cinematográfico.
O próprio som será um contrabandista silenciado pelo receio da acusação de tráfico.
A película será queimada no fim da exibição.
Uma vida vive-se uma vez.
O que se faz envelhece para o que se fez.
O resto é recordação.
Esperar por quem?
Não te toquei no cabelo.
Os meus dedos ficaram longe, invisíveis, a uma cobardia de distância, a desejar toques impossíveis como se deseja o regresso à infância.
Não foi justo. A minha ausência apanhou-te de susto.
Ficaste ali, sentada a olhar para o futuro, à espera de mim, como se a vida estivesse já ali, mas do outro lado do muro.
Agora estou aqui, eu sei. Mas, nessa altura, não vim. Ainda não me perdoei.
Foi um medo estranho que não me deixou andar. Não sei explicar.
Tudo mete medo quando a vida acontece demasiado cedo e nada anda devagar.
E quando tudo acontece demasiado tarde?
Se a espera for longa, o fogo ainda se mantém? A chama ainda arde?
E se ninguém espera por ninguém?
Esperar de verdade, com a força da saudade.
Se ninguém espera assim, compreendo porque não esperaste por mim.
Mas se essa espera existe, agora estou aqui com um querer que não desiste.
Vou esperar, sentado no mesmo baloiço partido.
Um baloiço partido é um lugar avariado, onde algo aconteceu de modo errado.
Este lugar avariou-se com um desencontro.
Faz tempo que tu partiste.
Faz tempo que eu estou aqui sentado.
Eu sei que, no início, sorriste no vaivém deste lugar.
Mas fico triste por saber que, quando partiste, foste embora a chorar.
O tempo não obedece à vontade de