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ESCOLA SEC. DR.

MANUEL GOMES DE
ALMEIDA
Jorge Barbosa ESPINHO
FILOSOFIA – 10º ANO RECORRENTE

FILOSOFIA.
OS VALORES. – ANÁLISE E
COMPREENSÃO DA
EXPERIÊNCIA VALORATIVA.

13 Janeiro 2009
Valores e Valoração.
“A verdadeira divindade do homem branco é o metal e o papel forte, a que ele chama dinheiro. Quando se fala a um
Europeu do Deus do Amor, ele faz uma careta e sorri. (...) O dinheiro é a sua divindade. (...) Muitos há que, pelo dinheiro,
sacrificam o riso, a honra, a consciência, a felicidade e até mesmo mulher e filhos. Quase todos eles sacrificam a saúde (...) ao
dinheiro. (...) No mundo dos brancos, a importância de um homem não é determinada nem pela sua bravura, nem pela sua
coragem, nem pelo fulgor do seu espírito, mas sim pela quantidade de dinheiro que possui ou que é capaz de ganhar por dia,
dinheiro esse que ele fecha no seu grande baú de ferro, o qual nenhum tremor de terra é capaz de destruir.” Tulavil, O Papalagui

O texto relata o modo como um chefe da tribo Tiavéa avalia o modo como vive o Homem Branco – o Papalagui. Ele
estranha os seus hábitos e comportamentos que são muito diferentes dos do seu povo. A questão que se põe é a de saber o que
leva os dois grupos humanos a adoptarem modos de vida tão diversos.

A resposta é complexa, mas uma das razões dessa diferença é certamente os valores aceites e reconhecidos pelos dois grupos.
O Homem Branco elegeu a riqueza e a posse de bens materiais como valor dominante, sobrepondo-o a valores aceites e
reconhecidos pelos índios, tais como a bravura, a coragem ou a inteligência.

Com efeito, a nossa acção orienta-se em função de valores. O que são então os valores? O que significa a expressão “a
coragem é um valor”?

O valor não é um objecto ou uma coisa; é uma qualidade que alguém atribui às coisas, às situações, aos acontecimentos.
Essa atribuição torna-os desejáveis ou indesejáveis, objecto de adesão ou de rejeição, de preferência ou de repúdio, conforme se
trata de valores positivos ou negativos.

O valor não é uma qualidade do objecto em si próprio, mas uma qualidade que aparece na relação do homem com as coisas,
pois é ele quem confere valor, de acordo com as circunstâncias.

Assim, na sociedade índia, a que o texto se refere, o dinheiro não é um bem, isto é, não é reconhecido como tendo valor. Por
isso, também não é considerado um critério para determinar a importância dos outros objectos.

Os valores só surgem no mundo humano e social, sendo criações culturais que tomam forma na linguagem (sem linguagem
não há valores) e são interiorizados através da educação.

Os valores fixam os fins gerais da acção social e são seus princípios orientadores, determinando as opções e as decisões dos
indivíduos e das instituições, e impõem-se exigindo o respeito dos membros do grupo em que vigoram.

Os valores são os motivos, ou as razões, que justificam as nossas acções tornando-as preferíveis a outras. Dependem da
cultura, pois são criados pelo Homem, reflectindo necessidades sociais fundamentais. Por isso, a novas necessidades,
corresponde a emergência de novos valores, como, por exemplo, os valores ecológicos, surgidos recentemente nas sociedades
tecnologicamente desenvolvidas; há também valores que desaparecem, por já não corresponderem às necessidades dos grupos
humanos, onde foram aceites.

Quando reflectimos sobre a natureza e as características dos valores, costumamos reconhecer que eles:

• Valem positiva ou negativamente, pois aparecem sempre desdobrados num pólo positivo e num pólo negativo:
beleza/fealdade, riqueza/pobreza, coragem/cobardia...

• Apresentam-se-nos sempre ordenados, de acordo com o grau de importância que lhes reconhecemos, implicando o
estabelecimento de prioridades. Uns apresentam-se como sendo superiores a outros. Esta escala ou tábua de valores
é variável e discutível. Podemos, por exemplo, em abstracto, considerar a liberdade como valor supremo ou
considerar que, em certas circunstâncias, o valor segurança deve prevalecer.

• Sendo componentes essenciais da cultura, existem em todas as sociedades (carácter absoluto dos valores), podendo
variar apenas o que é valorizado, isto é, o que é digno de apreço ou repúdio (carácter relativo dos valores).

• Implicam uma componente afectivo-emocional, pois lidamos com s valores de forma apaixonada. As nossas opções,
em termos axiológicos, nem sempre têm uma justificação racional.

JB 2
Há uma Crise de Valores Espirituais?
“Se não se encontrar uma valor supremo, escreve André Malraux, dentro de cinquenta anos, a nossa civilização, que se
acredita ser uma civilização da ciência, tornar-se-á uma das mais submissas aos instintos e aos sonhos elementares que o
mundo já conheceu, por lhe faltar uma espécie de alimento espiritual que tenha domínio sobre o poder científico do homem
moderno. Está claro, agora, que a ciência é incapaz de ordenar a vida. Uma vida é ordenada por valores.” Paulo Gusmão

O texto de Paulo Gusmão faz referência a um sentimento de crise de valores, considerando que, faltando os valores espirituais,
a humanidade será governada pelos instintos.

O desenvolvimento científico-tecnológico deu aos seres humanos um poder imenso, que tem de ser usado em seu benefício, e
não contra eles. O autor chama a atenção para a necessidade de valores espirituais, que orientem a acção humana no sentido da
humanização e do respeito pela pessoa, numa época em que se assiste a uma alteração dos critérios valorativos: valorização do
poder económico e desvalorização, ou indiferença, perante valores como a solidariedade, a compaixão, a paz.

Há autores que falam mesmo de ausência de valores, ou de vazio axiológico, que é responsável:

• Pelo enfraquecimento da capacidade crítica, criando condições para a fácil manipulação dos indivíduos, por parte
daqueles que apelam aos instintos mais primários – à justiça popular, ao fanatismo religioso, ideológico ou rácico.

• Pela indiferença e descomprometimento político-social e pela desresponsabilização do indivíduo, face aos problemas
sócio-políticos e à sua resolução. Parece ter-se caído num certo individualismo egoísta, que só valoriza as necessidades
e interesses próprios.

• Pela perda de unidade e de coesão social, com o consequente isolamento dos indivíduos e comunidades, geradora de
insegurança, violência, marginalidade, racismo e xenofobia.

Alguns autores, afirmam que esta mudança dos critérios valorativos e a crise dos valores espirituais e humanistas se devem à
perda das crenças religiosas, já que eram elas a justificação e a razão de ser da existência e do reconhecimento de tais valores.
No entanto, seria lamentável que os valores estivessem tão dependentes das crenças religiosas.

Os Valores Dominantes no Mundo Ocidental.


Há, então, autores que acreditam que o ateísmo do mundo moderno seria o responsável essencial pela crise dos valores e pela
consequente crise civilizacional.

No entanto, outros autores consideram positiva a separação entre os valores humanistas e a religião. Estes autores consideram
positivo o facto de os valores passarem a justificar-se com base no próprio Homem.

Para estes autores, é o valor da dignidade da pessoa humana que passa a servir de fundamento e de valor supremo, a que todos
os outros se devem subordinar. Estes autores fazem um diagnóstico mais optimista da sociedade ocidental, reconhecendo
inúmeros sinais de progresso axiológico e moral. Reconhecem que as sociedades ocidentais, pelo menos, ao nível dos valores e
dos princípios:

• Combatem todas as formas de discriminação.

• Defendem os direitos dos mais fracos e das minorias.

• Eliminam a tortura e todas as formas de abuso de autoridade.

• Lutam contra todas as formas de tirania e opressão.

• Promovem o reconhecimento, a todos os seres humanos, de direitos fundamentais e de condições mínimas de


desenvolvimento: direito à educação, à saúde, à alimentação e habitação, liberdade de culto...

Seja como for, parece consensual que, na sociedade ocidental, prevalecem os valores económicos, o egoísmo e o
individualismo. Estes acabam por dominar todos os outros. Por exemplo, os direitos dos mais fracos e das minorias podem ser
postos em causa por razões de ordem económica.

JB 3
Esta hierarquização de valores, onde os valores económicos são prioritários, coloca em segundo plano da escala axiológica
valores como a lealdade, a honestidade, o interesse colectivo, a solidariedade, etc., e legitima comportamentos de
marginalização dos menos aptos.

Trata supostamente os seres humanos de acordo com o seu mérito, mas esquece que o mérito e as capacidades de cada um
dependem das condições sociais.

Usa os seres humanos como meios e instrumentos, postos ao serviço dos interesses de outros (indivíduos ou povos).

Parece, portanto, que há razões para estarmos preocupados e para falar de crise axiológica e valorativa.

Vivemos, para além disso, numa época de multiplicidade e conflitualidade axiológica, pois coexistem diferentes critérios de
avaliação, que são defendidos pelos agentes sociais. As próprias instituições transmitem e procuram impor valores
contraditórios, o que confunde as novas gerações e enfraquece o poder impositivo dos valores e das normas.

JB 4
Valores e Cultura.
Já vimos que os valores são relativos e históricos. Esta característica dos valores permite que, em cada época histórica, e em
cada cultura, surjam valores diferentes, ou que eles sejam hierarquizados de modo diferente.

O Homem já foi definido como um ser biocultural, ou seja, o homem tem uma natureza estritamente biológica (é um animal) e
uma outra essencialmente cultural, e que também define a sua natureza humana.

Definição de Cultura.
Afinal, o que é a cultura?

A cultura, em sentido amplo, pode ser definida como os aspectos de ordem material e de ordem espiritual que, relativamente a
uma sociedade ou a um grupo, foram adquiridos com base em formas de vida ancestrais comuns.

Assim sendo, um grupo social apresenta crenças, tradições, valores e práticas que, por um lado, permitem uma ligação ao
passado e, por outro lado, garantem a sua continuidade no futuro. Podemos até afirmar que: “Sem Homem, não há cultura.
Mas sem cultura, também não há Homem.”

As aprendizagens, que visam a integração do indivíduo numa cultura, iniciam-se no momento do nascimento e só terminam no
fim da vida. Uma destas aprendizagens é, justamente, a dos valores preferidos no seu meio social.

Há diferentes grupos humanos que valorizam e adoptam diferentes atitudes e comportamentos. Esta diversidade de práticas
depende e condiciona os valores, fazendo evoluir os próprios critérios valorativos. Cada nova geração recebe um conjunto de
valores mais ou menos institucionalizados, e transforma-os.

A este fenómeno, chamamos dinâmica cultural.

Assim, a cultura e os valores transformam-se, e a própria diversidade cultural e valorativa é um valor, ou seja, as sociedades
ocidentais avaliam positivamente a existência de uma sociedade multicultural, em que se valoriza o respeito pelas diferenças de
padrões culturais e dos valores que os fundamentam

Esta atitude, face à diversidade cultural, é uma aquisição recente.

No passado, a tendência era para cada sociedade avaliar os padrões culturais dos restantes grupos humanos, em função dos
seus próprios valores. Esta tendência etnocêntrica alimentou fenómenos como o racismo e a xenofobia, tendo, em alguns
casos, conduzido à destruição de povos e culturas que, na avaliação ocidental, eram considerados inferiores.

Actualmente, apesar da aceitação do diálogo cultural e da valorização da multiculturalidade, continua-se a perseguir minorias
étnicas, religiosas e sexuais.

A facilidade de comunicação a nível planetário permite uma troca de informações e de influências que pode conduzir à
formação de padrões culturais, segundo os valores das culturas dominantes. São os interesses político-económicos das
economias mais poderosas que orientam os padrões culturais a nível mundial.

A globalização pode ser, de facto, uma nova estratégia de destruição dos mais fracos.

Esta tendência para a globalização parece ser irreversível nos domínios político, económico, artístico, etc. Mas será que os
povos vão perder a sua identidade cultural? Será isso desejável?

O reconhecimento do direito à diferença e o respeito por padrões e valores terá limites?

Poder-se-ão aceitar todas as práticas, em nome dessa diversidade de valores e de crenças?

Os valores legitimam todo o tipo de padrões e práticas sociais?

A vida será um valor relativo?

A dignidade humana poderá ser posta em causa, por valores como o nacionalismo, o sexismo, a crença religiosa?

JB 5
O que é Preciso Saber.
• O Homem aprecia e avalia a importância que as coisas, as pessoas e os acontecimentos têm para si.

• Para poder fazer estas avaliações, ele usa padrões valorativos, formulando juízos de valor.

• Os juízos de facto distinguem-se dos juízos de valor. Os juízos de facto descrevem os factos. Podemos, por isso,
verificar se são verdadeiros ou falsos.

• Os juízos de valor enunciam uma apreciação subjectiva dos objectos, em função da existência neles de propriedades
que, para nós, são valores.

• É a presença dessas qualidades valorizadas que nos faz julgá-las dignas de estima ou desejáveis e estabelecer com elas
uma relação de preferência.

• Aprendemos e interiorizamos os valores, através da nossa educação, pois os valores emergem na vida social. Fazem
parte da cultura e identificam os ideais de uma sociedade.

• Sendo componentes culturais, os valores implicam adesão e acção, isto é, se os interiorizamos e nos apropriamos deles,
guiam-nos e, por isso, concretizamo-los n modo como vivemos.

• O valor é uma qualidade potencial, porque surge na relação do ser humano com as coisas, resultando de uma
apreciação.

• As coisas que reconhecemos como tendo valor são bens.

• Os valores valem. Por isso, aparecem sempre como algo que é reconhecido como desejável ou preferível (valor
positivo) ou rejeitável (valor negativo). A polaridade dos valores refere-se a esta bivalência dos valores, a um pólo
positivo está sempre ligado um pólo negativo.

• A hierarquização dos valores expressa, numa escala, o grau de importância relativa, que é reconhecida aos diferentes
valores.

• Os valores existem em todas as sociedades, embora variem as qualidades que as coisas têm de possuir para poderem
ser consideradas bens (carácter absoluto/relativo dos valores).

• Atribuir valor a algo envolve os domínios intelectual e afectivo-emocional.

• A evolução e progresso social acarretam o aparecimento de novos problemas e de novas mentalidades e a necessária
transformação dos valores. Esta mudança de valores é tomada, por alguns autores, como sinal de uma crise de valores
espirituais e mesmo de um vazio axiológico.

• Nas sociedades actuais, parecem predominar valores como o individualismo egoísta, o consumo, a necessidade de
sentir ou experimentar o prazer imediato, o lucro fácil, a utilidade, a inovação, a criatividade, a iniciativa individual e
a tolerância perante as outra formas de vida e de cultura.

• O individualismo egoísta manifesta-se na falta de solidariedade e na indiferença perante as desigualdades sociais e o


sofrimento dos outros, e na falta de participação cívica, que evidencia desinteresse perante aquilo que diz respeito a
todos.

• Há novos valores positivos no mundo actual: o respeito pelos direitos humanos: liberdade, igualdade e dignidade. Em
nome dos quais, são condenados, como valores negativos, a violência, a tortura, o racismo, a xenofobia e qualquer
tipo de discriminação.

• O reconhecimento destes valores não tem impedido, porém, a emergência de movimentos fundamentalistas que, em
nome da tradição e das diferenças raciais, étnicas, religiosas, sexuais ou outras, legitimam práticas racistas e
xenófobas.

• A tolerância e a diversidade cultural são valores positivos reconhecidos, pelo menos em abstracto, no mundo ocidental.

JB 6
• A diversidade cultural expressa os diferentes modos de viver ou a diversidade dos padrões culturais existentes, para a
satisfação das necessidades do ser humano.

• Os diferentes grupos humanos definem objectivos, crenças, valores e padrões de comportamento que não são
necessariamente partilhados por todos os outros e que, no seu conjunto, constitui a sua identidade cultural, que deverá
ser preservada.

• A reprodução cultural garante a preservação da identidade cultural de um grupo social. Cada nova geração recebe a
cultura através da educação, mas há um processo constante de modificação a que chamamos dinâmica cultural.

• A alteração da identidade cultural, hoje, é mais rápida, devido à influência exercida pelas facilidades de comunicação.
Hoje em dia, os meios de comunicação social, as trocas comerciais, o turismo, a emigração, a influência das séries
televisivas tornam-se causas de processos de aculturação.

• As trocas comerciais à escala planetária, o poder das grandes empresas multinacionais, a publicidade e a moda também
condicionam os nossos hábitos e modos de viver.

• Há uma tendência cada vez maior para a globalização e a homogeneização cultural.

• A valorização da diversidade cultural, da preservação da identidade cultural e do diálogo intercultural é recente e ainda
não tem um reconhecimento universal. No passado (e ainda hoje) encontramos práticas que impunham formas
forçadas de aculturação.

• Houve (e ainda há) povos e países que se consideravam superiores e impuseram a outros povos os seus valores,
crenças, padrões de comportamento, perseguindo ou mesmo eliminando (genocídio) as minorias, apenas por terem
uma cultura diferente e por insistirem em preservar essa identidade.

• O relativismo cultural aceita que os comportamentos, socialmente aprovados, e os sistemas de valores de uma
sociedade ou grupo social devem ser julgados e avaliados, sem referência a padrões absolutos. Por isso, adopta valores
como a tolerância e o respeito mútuo, independentemente da raça, etnia, religião, sexo, classe social, nacionalidade ou
outras diferenças.

• A valorização da diversidade e identidade culturais, no entanto, não pode legitimar todas as práticas.

• Para além da valorização do relativismo e da identidade culturais, há valores que têm que ser reconhecidos como
universais, tais como o valor da vida e o valor da pessoa humana e da sua dignidade.

JB 7

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