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ÁQUUINA DO ARCA
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Fernaando Nascim
mento 
Adelinda A. Candeias1 

“Ideentity is aboout belongiing, about w what you h have in com mmon with  some 


peop ple and wh hat differentiates you ffrom otherrs. At its mo ost basic it  gives 
you a sense of p personal location, the stable scorre to your in ndividualityy. But 
it is  also aboutt your socia al relationsships, your  complex in nvolvementt with 
otheers, and in tthe modern n world thesse have beccome ever b become com mplex 
and  confusing.  Each of uss live with  a variety of of potentiallly contradiictory 
idenntities, whicch battle w within us forr allegiancee: as men o or women,  black 
or wwhite, straig
ght or gay,  able­bodied d or disableed, ‘British’’ or ‘Europeean’… 
The  list  is  potentially  infinite,  and a so  theerefore  arre  our  posssible 
beloongings.  Wh hich  of  themm  we  focuss  on,  bring  to  the  foree,  ‘identify’  with, 
depeends  on  a  host 
h of  facctors.  At  thee  centre,  however,  arre  the  valuees  we 
sharre or wish tto share witth others. 
Jeffrey W
Weeks 

1 Profe
essora Auxiliarr do Departam
mento de Psicollogia da Univerrsidade de Évo
ora. 
adelin
ndacandeias@
@gmail.com 
NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 
 
“The Value of Difference” 
 in “Identity, Community, Culture, Difference.”  
 

 “An  autobiography  is  a  text  that  seeks  to  draw  us  into  itself  without 
reservations and one which we are invented to read as being sanctioned 
by  a  ‘metaphysics  of  presence’,  its  formal  nature  being  belied  by  the 
intimacy and truthfulness with it seems to address us. In autobiography, if 
anywhere  in  literature,  we  are  expected  to  sense  that  these  are  texts 
inhabited by a living person, that an author who was peculiarly present to 
himself  while  he  was  writing  is  now  present  to  us  as  we  read. 
Autobiography is the certificate of a unique human passage through time 
and  the  theorist  who  comes  to  it  full  of  sceptical  questions  about  its 
rhetorical  nature  knows  that he is  playing an  unkind  game: he  is  not  as 
other, more charitable readers of autobiography.” 
John Sturrock 
“The Language of Autobiography” 

INTRODUÇÃO
“A  Máquina  do  Arcanjo”  de  Frederico  Lourenço  é  um  pequeno  reconto 
autobiográfico, de noventa e seis páginas, acerca da passagem da adolescência para 
a vida adulta, para as emoções e a dor de amar e para um novo caminho criativo. A 
obsessão  do  primeiro  amor.  Amar  no  masculino,  o  masculino.  É  a  descoberta  da 
vivência  duma  emoção  e  da  sexualidade  ansiada,  do  caminho  a  seguir:  enquanto 
pessoa  que  se  completa  sexual  e  criativamente  na  procura  da  sua  voz,  da  sua 
expressão. Neste reconto autobiográfico, Frederico Lourenço traça o seu retrato de 
jovem  que  busca  o  seu  curso:  da  vida,  enquanto  pessoa  e  enquanto  escritor.  O 
adulto, apresentando‐se na primeira pessoa, compõe a sua memória de momentos 
cruciais  da  passagem  da  adolescência,  marcantes  e  definidores  de  quem  é,  no 
desejo de partilha das suas vivências 

O  objectivo  deste  trabalho  é  analisar,  de  forma  sumária,  de  que  forma  a 
criatividade se exprime na personalidade do jovem Frederico, que faz um percurso 
de  músico  para  escritor.  Ainda  que  nesta  fase  da  sua  vida  seja  de  músico  para 
estudante de clássicas, a escrita esteve sempre latente:  

“Escritor, professor universitário: como é que se costuma apresentar? 

Hoje em dia penso mais em mim como escritor do que como outra coisa 
qualquer. 

Acho que a faceta de escritor se sobrepôs às outras coisas todas. 

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NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 

Tornou-se a sua primeira natureza ou já o era?

Penso  que  já  era,  mas  estava  bloqueada.  Acho  que  essa  natureza  de 
escritor teve uma grande rolha em mim durante muito tempo e, a partir 
do momento em que a rolha saltou, realizo­me e vejo­me, de facto, muito 
mais como escritor do que como professor. 

A vocação da escrita é anterior à vocação pedagógica? 

  Sim, muito anterior. Penso que mesmo antes de saber escrever já escrevia. 

(…)  

Estávamos em Oxford e eu não sabia ainda escrever, mas queria escrever 
cartas às minhas avós. Portanto, imitava a caligrafia dos meus pais, mas 
sem  saber  escrever.  Muito  menos  em  português.  Mas  sempre  tive  essa 
vontade de estar agarrado a um papel, a escrever.” (Marques: 2005, 32) 

Tendo  um  percurso  de  treino  musical,  desde  a  infância,  para  passar  às  letras, 
devido  à  “incompatibilidade”  entre  a  música  e  a  assumpção  e  a  prática  da  sua 
sexualidade, o trabalho tentará reflectir de que forma personalidade e criatividade 
se apresentam nestas memórias.  

Criatividade  é  a  capacidade  de  trazer  algo  de  novo  e  com  valor  à  luz  do  dia 
(Helson:  1996,  295),  é  ter  soluções  “novas”  e  adequadas  para  os 
problemas/situações  que  nos  são  apresentados/das  (Feist:  1998).  Indivíduos 
criativos,  ainda  segundo  Helson,  serão  aqueles  que  passarem  o  seu  tempo  nessa 
actividade e lhe trouxerem contributos. 

Personalidade,  embora  seja  um  termo  sem  definição  universal  adoptado,  é 


considerada,  por  muitos  psicólogos,  relacionar‐se  com  aspectos  importantes,  e 
relativamente estáveis no tempo, do comportamento duma pessoa e lida com uma 
grande variedade de comportamento humano. Embora alguns teóricos considerem 
que  a  personalidade  seja  só  objecto  de  estudo  externo  e  em  contexto  social,  a 
maior  parte  argumenta  que  esta  é  intrínseca  a  cada  indivíduo,  possível  existir 
mesmo  na  ausência  do  contacto  com  outras  pessoas  e  com  aspectos  não 
observáveis  tais  como  sonhos,  pensamentos  e  memórias.  Os  factores  sociais, 
mentais,  físicos  e  emocionais  duma  pessoa  são  importantes  assim  como  todos 
aqueles de que se tem ou não consciência. (Ewen: 1998, 3) Ou seja: tudo aquilo que 
nos  rodeia  e  nos  distingue  é  um  aspecto  importante  da  nossa  personalidade, 
estejamos mais ou menos inseridos num espaço ou comunidade. 

Mas  nem  todos  somos  criativos:  embora  com  menor  ou  maior  grau,  a 
criatividade não se manifesta nem da mesma forma em todas as pessoas, nem em 
todas  se  manifesta.  A  personalidade  de  qualquer  um  revela‐se  criativa  se  reunir 

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NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 
 
certas características que são essenciais ao processo. Destacamos como principais 
traços de personalidade que favorecem o processo criativo (Russ: 1993, 12): 

• tolerância à ambiguidade; 
• abertura à experiência; 
• ter valores não convencionais; 
• não fazer juízo de valores; 
• ser curioso; 
• manifestar gosto pelo desafio e pela complexidade; 
• ter auto‐confiança; 
• ter capacidade de correr riscos; 
• ser motivado2  

Frederico  Lourenço,  nesta  obra,  como  na  generalidade  das  suas  criações  de 
forte  pendor  autobiográfico,  apresenta‐se  como  um  ser  criativo  e  como 
homossexual,  não  por  razões  de  “militância”,  mas  simplesmente  por  assim  se  ter 
sentido toda a vida, naturalmente: 

“A  homossexualidade  –  tenho  que  afirmá­lo  ­  nunca  se  me  afigurou 


profana.  Nunca  vi  outra  coisa  em  namorados  (ou  em  parceiros 
ocasionais)  que  não  irmãos  em  Cristo;  ser­me­ia  estruturalmente 
impossível  não  respeitar,  em  cada  gesto  sexual,  o  divino  da  pessoa 
humana.  Nunca  concebi  a  homossexualidade  como  outra  coisa  que 
não  um  nome  diferente  para  hombridade.”  (sublinhado  meu) 
(Lourenço: 2006, 13) 

O seu processo de crescimento foi um percurso, não de fuga mas de encontro a 
si próprio. Um processo que, pela sua sexualidade e pela actividade a desempenhar 
na vida, lhe trouxe não só a pertença a algo, como também o estabeleceu como um 
ser  único,  lhe  deu  uma  identidade.  “Identity  is  about  belonging,  about  what  you 
have in common with some people and what differentiates you from others. At its 
most  basic  it  gives  you  a  sense  of  personal  location,  the  stable  score  to  your 
individuality.” (Weeks:1998, 88) 

Ao  escrever  os  seus  textos  Frederico  traz‐nos  à  sua  vida,  partilha connosco  os 
seus  momentos,  emoções,  dores,  prazeres  artísticos  e  criativos,  fala‐nos  da  vida, 
2
 Nas várias obras consultadas, há, por diversas vezes a alusão à jovem idade que os estudos da personalidade 
e  da  criatividade  têm,  cerca  de  quarenta  e  cinco  anos.  Manifesta‐se,  também  o  desejo  e  a  vontade  que  nos 
próximos  anos  esta  área  seja  um  campo  mais  produtivo  uma  vez  que  muito  precisa  ser  estudado,  e  os 
resultados dos estudos apresentados sejam confirmados de forma muito mais cabal. O problema não terá a ver 
com algum carácter especulativo que os estudos possam por vezes apresentar, mas sim confirmar, com maior 
segurança e rigor, aquilo que se tem estudado e que muitas das vezes vinha já confirmar ideias pré‐concebidas, 
ou, porque não dizê‐lo, preconceitos e estereótipos.  

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NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 

com a qual sentiremos, ou não, empatia, mas, certamente teremos uma perspectiva 
diferente  da  vivência  humana,  da  sua  vivência.  Confere‐nos  o  poder  de  estarmos 
consigo  relatando‐nos  a  sua  história,  não  de forma  ficcionada,  como  fez  com  três 
dos  seus  romances,  embora  se  possa  considerar  a  personagem  principal  dos 
mesmos como um alter‐ego do autor, mas sim optando o registo autobiográfico de 
modo  a  ter,  por  parte  do  leitor,  uma  afinidade  e  uma  filiação,  senão  total,  pelo 
menos de compreensão e acolhimento. Aquilo que lemos é de alguém que o viveu, 
não é criação, imaginado, é a memória duma pessoa que toma corpo perante nós: 

  “An  autobiography  is  a  text  that  seeks  to  draw  us  into  itself  without 
reservations and one which we are invented to read as being sanctioned 
by  a  ‘metaphysics  of  presence’,  its  formal  nature  being  belied  by  the 
intimacy and truthfulness with it seems to address us.” (Sturrock: 1994, 3) 

É para essa viagem dentro de si que somos convidados. 

SER OU NÃO SER MÚSICO…


“Quando,  no  final  da  adolescência,  a  necessidade  de  passar  da  teoria  à 
prática em questões sexuais começou a tornar­se premente, dei­me conta 
de  que  ser  activo  ao  mesmo  tempo  nas  esferas  da  música  e  do  sexo 
causava um entrechoque com efeitos de anulação recíproca para ambas 
as  coisas.  Em  termos  de  vivência  prática,  sexo  e  música  eram,  no  meu 
caso, incompatíveis. Apercebi­me disto quando, aos dezanove anos, tive a 
primeira  experiência  de  um  envolvimento  simultaneamente  romântico  e 
carnal.  Os  efeitos,  para  meu  espanto,  fizeram­se  logo  sentir.  No  dia 
seguinte à primeira noite de amor, pressenti, quando me sentei ao piano 
para  estudar,  que  algo  de  estranho  se  passara  dentro  de  mim;  que  eu 
deixara de ser quem fora ­ eu, que estava habituado, desde os seis anos, a 
ver­me (e a ser visto) como pianista. O que se passava dentro de mim era 
demasiado complexo para que, na altura, eu tivesse compreendido o que 
poderia  estar  em  causa.  Hoje,  a  situação  parece­me  clara.  O  que 
aconteceu foi isto: após uma adolescência de renúncia sexual, passada ao 
teclado a estudar de manhã à noite, de repente vi a minha identidade de 
músico  ferida  de  obsolescência.  Afinal,  o  que  eu  sempre  procurara  no 
piano era, simplesmente, um namorado. ” (Lourenço: 2006, 9/10) 

O que é um músico? Poderá uma prática recorrente e diária de tantos anos ser 
abandonada uma vez resolvida a questão da prática sexual? 

Ser  músico  de  carreira  é,  em  qualquer  das  suas  vertentes  compositorias, 
performativas,  e  múltiplas  outras,  uma  tarefa  complexa.  Implica  uma  entrega 
grande  e  laboriosa  por  toda  a  vida.  Escolher  essa  carreira  não  implica,  à  partida, 
características  especiais,  faz  parte  dum  processo  normal  como  escolher  outra 
qualquer  profissão:  é  um  processo  que  implica  toda  uma  série  de  razões, 
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NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 
 
necessidades  pessoais,  constructos  pessoais  e  oportunidades  sócio‐culturais  que 
estão  para  além  da  vontade  e  da  decisão  de  cada  um.  No  entanto,  para  se  ser 
músico, há que ter uma mescla de talento genético e biológico, conjuntamente com 
reforços emocionais e sociais. (Henley Woody II: 1999, 241) Assim se justifica que 
uma  criança  tenha  talento  inato  e  não  o  desenvolva  devido  a  constrangimentos 
familiares e sociais (ambiente familiar desfavorável, pouco propício à música ou a 
questões  culturais,  e  sem  condições  financeiras),  como  podendo  não  ter  esse 
talento  tenha  todas  as  condições  para  desenvolver  as  técnicas  performativas  e  o 
gosto, não chegando a ser criativo, mas somente um executante. Ou simplesmente 
ter todas as condições necessárias para se tornar músico: 

“An individual's interest in music is cultivated through early experiences 
within the home (e.g., parents interest in music, opportunity to take music 
lessons,  etc.),  and  is  later  subject  to  the  powerful  reinforcers  of 
identification  with  peers  and  idiosyncratic  self­concept.  (…)  Anecdotal 
accounts suggest that many musicians had one or both parents who were 
also  musicians,  and  this  experience  likely  allowed  for  an  identification 
process  or  purposeful  directions  that  reinforced  the  child’s  musical 
interests and abilities.” (Henley Woody II: 1999, 242) 

Henley  Woody  II  refere  também  estudos  que  indicam  que  a  personalidade  de 
um  jovem  músico,  comparada  com  a  de  outros  jovens  não  artistas,  apresenta 
extroversão,  sensibilidade,  inteligência  e  boa  adaptação  a  circunstâncias 
diferentes. Outro aspecto importante é que se verificou que os jovens estudantes 
de  música  são  bastante  mais  criativos  que  os  jovens  não  artistas.  O  talento  e  o 
interesse musical fazem parte dum processo evolucional: desenvolve‐se durante a 
infância, depois passa para puro prazer e a manifestação intuitiva, tornando‐se em 
devoção adolescente no que respeita aos aspectos analíticos e formais da música. 
Há, assim toda uma série de factores que contribuem para um domínio não só da 
técnica  como  do  aspecto  performativo,  ou  se  quisermos  do  aspecto  criativo  na 
execução e realização musical. 

Vindo  duma  família,  que  não  sendo  aristocrata,  mas  da  classe  média  alta,  com 
pais  professores  do  ensino  Secundário  e  Universitário,  pessoas  com  formação 
científica  e  gosto  pela  cultura,  Frederico  usufrui  na  sua  infância  de  todas  as 
condições  para  ser  um  bom  músico:  um  bom  ambiente  familiar,  condições 
financeiras  que  lhe  disponibilizam  as  aulas  na  melhor  escola,  o  Conservatório, 
gosto e motivação cultural, e algum prazer pessoal. O que na realidade acontece é 
que o gosto que sente em si é mais o de amante da música, que o de praticante de 
alto  nível,  como  uma  carreira  de  música  clássica  exige.  “Afinal,  o  que  eu  sempre 
procurara no piano era, simplesmente, um namorado.”(Lourenço: 2006, 10) Ao pôr 
em prática a sua sexualidade, a entrega e o gosto ao piano desaparece. Parte da sua 
vida  está  resolvida,  preenchida,  e  o  tempo,  horas  e  horas,  dedicado  ao  estudo  e 
prática do piano deixa de ter significado por se tornar vazio de sentido. Já tem algo 
que  o  realize  e  apercebe‐se  que  a  música  e  o  piano  ocupavam  um  espaço  que 
esperava  ser  completo.  A  música  era  a  sublimação  de  um  desejo  imenso  de 

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NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 

realização  sexual  e  pessoal.  Embora  possa  parecer  uma  observação  um  tanto 
rebuscada  por  parte  de  Frederico  Lourenço,  o  facto  é  que,  mais  uma  vez,  Henley 
Woody II, refere estudos que dizem que: 

“…the findings supported an interpretation that "individuals who choose 
to study with music may be underaroused and seek arousal from music in 
order  to  be  at  an  optimal  performance  level"  (Henley  Woody  II:  1999, 
243)  

Ao  estudar  música,  e  não  exactamente  ao  estudar  com  música,  como  a  citação 
refere, há uma procura de excitação, não só emocional como sexual. Estando a sua 
vida destituída duma componente tão central a si próprio, a música no seu papel 
de  despertadora  dos  sentidos  e  das  emoções,  preenche, até  à assumpção  efectiva 
da sexualidade e das emoções, esse vazio. “A Máquina do Arcanjo” é o retrato dum 
jovem que descobre as emoções associadas do sexo, da paixão e da dor. É o relato 
dum aprendizado doloroso, mas profícuo. Para a vida. 

“Depois  formulou‐se  no  meu  íntimo  a  seguinte  pergunta:  e  se  fossem  os  meus 
amigos,  muito  mais  soltos  e  descomplicados  do  que  eu,  que  tinham  razão?  Seria 
"pura"  e  desinteressada  a  minha  negação  do  sexo?  Sem  conseguir  formular  o 
raciocínio  com  contornos  precisos,  eu  intuía  vagamente  que,  com  a  opção  pela 
castidade, eu pretendia comprar ou pagar qualquer coisa: em troca, eu esperava de 
Deus o talento musical que me faltava.  

Talento. Era a palavra mágica no círculo dos meus amigos. Tudo, mas tudo, eu 
seria  capaz  de  ofertar em  prol  dessa  quimera,  a  ponto de,  até  aos dezanove anos 
(durante todo o período da minha vida em que estudava, sempre que possível, seis 
a  oito  horas  de  piano  por  dia),  eu  ter  abdicado  por  completo  quer  de  romances, 
quer  de  engates  –  limitando,  inclusive,  ao  mínimo  possível,  a  própria  actividade 
auto‐erótica.  "Abdicado  ".  Bom...eu  pensava,  de  facto,  na  coisa  como  Abdicação; 
mas  restaria  saber  se  é  possível  abdicar‐se  de  algo  que  nunca  se  experimentou.” 
(Lourenço: 2006, 11/12) 

Esta  vivência  de  Frederico,  torna‐se  mais  importante  ao  leitor  que  se  propõe 
analisar  as  questões  da  personalidade  e  da  criatividade,  e  também  com  mais 
sentido,  uma  vez  que  Henley  Woody  II  menciona  estudos  que  relacionam  a 
criatividade  e  o  talento  musical  com  a  androginia.  Esta,  que  pode  ser  reforçada 
pelas  experiências  da  vida,  reflecte  formas  únicas  de  processar  informação  e 
assume  características  de  flexibilidade  e  versatilidade  para  se  poder  tocar  vários 
tipos  de  obras.  Verificou‐se  também  que  há  uma  relação  muito  maior  entre  a 
androginia e o talento musical no rapazes que nas raparigas. Refere‐se, ainda, que: 

“Persons  attracted  to  music  may  have  a  higher  level  of  androgyny  than 
those  who  lack  interest  in  music.  Because  there  is  a  link  between 
androgyny and creativity, research is needed on the significance, if any, of 

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NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 
 
androgyny  for  the  musician's  personality;  that  is,  perhaps  androgyny  is 
subsumed by creativity.” (Henley Woody II: 1999, 243)  

Csikszentmihalyi (1996), num artigo sobre a personalidade criativa refere que a 
pessoa  que  é  psicologicamente  andrógina  duplica  a  sua  capacidade  de  resposta. 
Assim os indivíduos criativos tendem a ter não só as potencialidades do seu sexo 
mas  também  a  do  sexo  oposto.  Pessoas  de  sexos  diferentes  poderão  ser 
simultaneamente  agressivas  e  protectoras,  sensíveis  e  rígidas,  submissas  ou 
dominantes. 

Outra  característica  associada  à  personalidade  dos  músicos  é  que  são  frágeis, 


vulneráveis e, de forma estereotipada, femininos, não sendo necessariamente uma 
característica  negativa,  uma  vez  que  a  conotação  com  a  “emotividade”  pode  ser 
vantajosa na performance musical. Estas ideias feitas, que os estudos por um lado 
confirmam,  assumem  uma  maior  relevância,  já  que  essa  era  a  questão  que 
Frederico e os seus amigos pianistas se punham em relação à sua sexualidade e à 
escolha do instrumento musical que tinham feito. Seria alguma marca particular? 

“Assunto afim que nos ocupava, quando não estávamos explicitamente a 
falar "daquilo", era o facto, a todos os títulos enigmático, de a profissão de 
pianista  não  atrair,  entre  a  juventude  lisboeta  nossa  coetânea,  rapazes 
que se interessassem por raparigas. Discutíamos se haveria alguma coisa 
de  intrinsecamente  homossexual  no  piano  enquanto  instrumento;  se  a 
profissão  de  pianista  seria  análoga  à  de  bailarino,  que,  naquela  altura 
(hoje  é  diferente),  estava  como  que  oficialmente  vedada  a  rapazes 
heterossexuais.” (Lourenço: 2006: 15/16) 

Para  além duma  questão  de  possível  sensibilidade  especial  para  a música,  que 
no caso de alguns pianistas se verificou, mas, como refere no texto, não aconteceu 
com  a  maior  parte  dos  mais  famosos,  a  situação  terá  sido  meramente 
circunstancial,  e  de  conjuntura  social.  É  de  recordar  que  durante  muito  tempo, 
certas actividades relacionadas com as artes ou o mundo do espectáculo eram mal 
vistas, devido à vida que os artistas levavam. Considerada dissoluta durante muito 
tempo,  muitas  famílias  impediam  que  os  seus  descendentes  a  ela  acedessem 
devido  às  conotações  que  acarretava.  Por  outro  lado,  Csikszentmihalyi,  refere  no 
mesmo artigo referido, que as pessoas criativas escapam ao estereótipo de género. 
Verificou‐se que se por um lado as raparigas criativas são mais dominantes e duras 
que  as  não  criativas,  os  rapazes  criativos  são  mais  sensíveis  e  menos  agressivos 
que  os  não  criativos.  A  questão  que  se  põe  aos  “pianeiros”  do  Conservatório  é  a 
soma  de  variáveis  sociais,  biológicas  e  psicológicas.  Csikszentmihalyi,  mais  uma 
vez  refere  que  a  tendência  andrógina  é  por  vezes  vista  em  termos  puramente 
sexuais,  sendo  confundida  com  homossexualidade.  O  facto  de  nessa  altura  todos 
serem homossexuais terá sido coincidência, ou não. 

Se Frederico procurava no piano o namorado, ou melhor a relação inexistente, 
tanto  do  ponto  de  vista  afectivo  como  sexual  (uma  prática  diária  de  oito  horas 

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NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 

desde  a  mais  tenra  idade,  tornará  o  instrumento  musical,  não  só  parte  de  nós, 
como,  também,  o  confessor,  aquele  com  quem  nos  envolvemos,  partilhamos 
emoções  e  pelo  qual  nos  exprimimos),  ao  se  encontrar  sexualmente  a  sua 
personalidade  musical  transforma‐se.  Assim  se  um  músico  tem  que,  seja  em  que 
área da expressão musical for, deixar fluir a sua personalidade de forma bem clara, 
mostrar  a  sua  sensibilidade,  força  e  fragilidade,  se  tem  que  se  expor  tanto 
performativa como tecnicamente e ser objecto de avaliação do ouvinte, tendo que 
estar  preparado  para  ser  apupado  ou  ovacionado  (Henley  Woody  II:  1999,  245), 
essas  características  mantiveram‐se  em  Frederico  ao  mudar  a  sua  capacidade 
criativa da música para os estudos Helenistas e para a escrita. 

O ESCRITOR SURGE
“Futuro  esse  que  nunca  chegou  a  materializar­se,  porque,  um  dia, 
"aquilo"  aconteceu.  Houve  um  jantar  (que  relatei,  em  traços  gerais,  no 
texto  inicial  de  A  Formosa  Pintura  do  Mundo).  Nesse  dia,  tudo  mudou 
para  mim  e  o  pianista  que  eu  era  morreu.  Isto  é:  eu  ainda  toquei  piano 
mais uns meses, mas os dedos já só mexiam como patas de uma galinha 
decapitada. Acho mesmo que, desde esse dia, nunca mais tive uma certeza 
absoluta  na  vida.  A  transição  gradual  de  músico  para  helenista,  que 
começou nesse fatídico jantar, levar­me­ia, como o futuro comprovou, da 
derrocada ao êxito, mas o preço  exigido foi o sabor a fracasso que  tudo, 
daí  para  a  frente,  me  deixaria  na  boca.  Não  obstante  os  sucessos 
universitários  e  o  reconhecimento  pelas  traduções  de  poetas  gregos, 
nunca deixei de me sentir um falhado. Como se, de algum modo, os vinte e 
tal  anos  que  passaram  em  nada  tivessem  contribuído  para  me  tirar  do 
estado  de  choque  do  caso  Gonçalo.  Como  se  o  arcanjo  nunca  me  tivesse 
perdoado.“ (Lourenço: 19/20) 

A personalidade de Frederico continua a ser a personalidade de um ser artístico 
e como tal nela exprimem‐se qualidades cognitivas essenciais ao processo criativo: 
pensamento  divergente,  que  enquadra  os  conceitos  de  associação  de  ideias,  boa 
capacidade de observação e fluidez de pensamento; capacidade de transformação, 
que  engloba  flexibilidade  de  pensamento,  capacidade  de  mudança  em  situações 
diferentes,  reorganização  de  informação  e  utilização  de  diferentes  formas  de 
resolução  de  problemas.  (Russ:1993;  9/10)  Por  outro  lado  ter  capacidade  de 
autoavaliação é um factor determinante no acto criativo:  

“The  individual  must  stand  back  and  evaluate  the  ideas,  association,  or 
composition  and  refine  it.  Without  critical  thinking  ability,  the  other 
cognitive  abilities  are  like  unavailable  resources.  They  may  be  present, 
but they cannot work for the individual or for the creative process. (Russ: 
1993; 11) 

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NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 
 
Assim se confirma a estabilidade da personalidade durante a vida duma pessoa. 
Apesar  da  mudança  de  “objecto”  criativo,  as  características  da  personalidade  de 
Frederico mantêm‐se de forma a resolver as situações que se vão deparar. 

“Poderei,  no  entanto,  deixar  aqui  muito  brevemente  a  confirmação  de  que 
Gonçalo foi o competentíssimo responsável pela minha educação sexual, para me 
desviar já para outro foro de aprendizagem, que teria profundas consequências na 
pessoa que vim a ser: a literatura.  

(…) 

Lacunas, porém, era o que não faltava à minha própria cultura. Contei em Amar 
não  acaba  como  fiz  o  liceu  em  regime  de  autodidacta,  estudando  as  matérias um 
pouco  "a  despachar"  para  fazer  os  exames  e  logo  me  esquecer  de  toda  aquela 
espiga,  pois  o  que  me  interessava,  até  à  exclusão  absoluta  de  tudo  o  resto,  era  a 
Música;  e  saber  as  rotas  do  açúcar  no  século  XVIII  ou  a  diferença  entre  palavras 
como "cartesianismo " e "dialéctica " eram coisas que me faziam bocejar. Os meus 
pais  ficavam  eles  próprios  um  pouco  exasperados  com  esta  minha  atitude,  mais 
ainda pelo facto de serem ambos professores de Filosofia. A brilhante nota de 10 
no exame final a esta disciplina deixou a família perplexa, primeiro indecisa quanto 
à etiqueta que com maior propriedade se me aplicaria ‐ "burro" ou "calão" ‐, mas 
depois convencida de que eu merecia ambas por igual.  

Gonçalo,  por  seu  lado,  parecia  achar‐me  um  rapaz  esperto  e  aplicado;  e  tirava 
constantemente livros da estante na sua sala para me pôr nas mãos, com a frase:  

‐ Lê isto. 

Foi assim que (de novo em situação pós‐coital, lembro‐me perfeitamente) recebi 
nas mãos um livro chamado La couronne et la lyre de Marguerite Yourcenar, uma 
antologia  de  poetas  gregos,  que  Gonçalo  me  pôs  a  ler  na  página  onde  surgem  as 
Purificações de Empédocles. Francês era a "minha" disciplina (tirara 19 no exame 
final do liceu sem estudar uma linha), mas mesmo assim li duas vezes o poema sem 
perceber rigorosamente nada. Na altura, pensei que isso seria devido à minha tão 
apregoada  burrice,  mas  hoje,  com  anos  de  estudo  de  poesia  grega  em  cima, 
confesso  que  ainda  não  percebo  o  poema  de  Empédocles,  embora  as  belas  frases 
francesas da Yourcenar me ecoem na cabeça desde esses tempos da saga Gonçalo. 
Aliás, outros poemas por ela traduzidos no mesmo livro haveriam de provocar em 
mim sérias decepções quando os conheci na língua original: tantas são as palavras 
acrescentadas na tradução francesa que o texto verdadeiro fica obscurecido. Basta 
dizer  que  o  maravilhoso  verso  Aphrodite  au  char  blanc  tiré  par  des  colombes, 
atribuído  a  Safo,  tem  exactamente  de  Safo  uma  única  palavra:  a  primeira.  E  o 
encantador  verso  de  Teógnis  L'aigre  cri  de  l’héron  qui  revient  en  avril  tem  o 
problema  de  três  das  suas  mais  expressivas  palavras  (aigre,  héron  e  avril)  terem 
sido  inventadas  pela  "tradutora  ",  que  melhorou,  neste  caso,  é  preciso  dizer,  o 
poeta grego.  

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NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 

Na  altura  eu  aceitava  com  naturalidade  que  um  menino  bem  como  o  Gonçalo 
tivesse este tipo de literatura em casa, mas hoje não deixo de me pasmar, pensando 
também nos trinta anos que ele fez no dia em que " começámos ", trintena de anos 
essa que se, face aos meus dezanove anos, parecia uma idade vetusta e respeitável, 
hoje parece‐me a idade de alguém que, no meu idiolecto actual, ainda merece sem 
ironia o estatuto de "rapaz". (Lourenço: 67/68/69/70) 

O seu percurso de desenvolvimento pessoal e escolar evidencia, à partida, uma 
capacidade de adaptação às circunstâncias. Aprende consoante a sua motivação e 
não  consoante  aquilo  que  é  esperado  dele  e  das  suas  capacidades  em  termos 
formais/escolares.  Há  na  sua  aprendizagem  escolar  um  lado  prático  que  tem 
somente a ver com os seus focos de interesse: é bom estudante nas áreas que lhe 
são  naturalmente  próximas,  fraco  estudante  em  áreas  onde  podendo  ser  bom 
aluno não tem motivação pessoal para alcançar os resultados ambicionados pelos 
pais.  No  entanto  basta  sentir  um  ponto  de  maior  afinidade  pessoal  em  relação  a 
essas  matérias  rapidamente  alcança  excelentes  resultados.  Frederico  tem  que  ter 
uma motivação intrinsecamente pessoal, não é um executor mecânico de saberes. 
No  respeitante  às  suas  inter‐relações  pessoais  a  sua  vontade  de  conhecimento  é 
completamente  assimiladora:  como  um  bom  discípulo  devora  e  apropria‐se  dos 
conhecimentos que outros lhe transmitem. O seu lado cognitivo anda passo a passo 
com  o  lado  emocional,  afectivo.  Nessas  circunstâncias  os  processos  afectivos 
relacionados com a criatividade são também importantes na sua personalidade. Há 
dois  desses  processos  que  poderemos  encontrar  em  Frederico  ao  longo  do  seu 
reconto: 

“Access to affect­laden thoughts is the ability to call up cognitive material 
with affect­laden content. Primary process thinking and affective fantasy 
in  daydreams  and  in  play  are  examples  of  this  kind  of  ability.  Thoughts 
involving  affect  themes  such  as  aggressive  and  sexual  ideation  illustrate 
this kind of blending of affect and cognition.  

Openness  to  affect  states  is  the  ability  to  experience  the  affect  itself. 
Comfort with intense affect, the ability to experience and tolerate anxiety, 
and passionate involvement in a task or issue are examples of openness to 
affect states.” (Russ: 1993, 12) 

Na  sua  história  da  descoberta  da  sexualidade  e  do  sentimento  amoroso,  luta 
desigual por não ser correspondido, Frederico necessita ter uma estrutura afectiva 
que lhe permita comportar a dor e o desgaste sentido, e deles tirar partido, não só 
para  os  superar,  mas  para  abrir  novos  caminhos  na  vida.  A  relação  vivida  com 
Gonçalo,  por  mais  dolorosa  e  conturbada,  foi  um  processo  de  passagem  de 
adolescente  para  adulto:  a  libertação  de  alguém  que  tinha  uma  imagem  de  si 
próprio  como  músico,  e  com  uma  sexualidade  sublimada,  dá  lugar  a  uma 
sexualidade  vivida  e  assumida  e  encontra  uma  nova  forma  de  expressão  criativa 
mais próxima de si. A satisfação afectiva perante o desafio, mesmo doloroso, como 

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NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 
 
foi  o  seu  caso,  e  o  bem‐estar  afectivo  em  resolver  problemas  com  que  se  depara, 
são outros processos afectivos importantes para a criatividade: 

“Affective  pleasure  in  challenge  involves  the  excitement  and  tension 


involved in identifying the problem and working on the task.  

Affective  pleasure  in  problem  solving  is  the  deep  pleasure  and  passion 
involved  in  solving  the  problem,  achieving  insight,  or  completing  a 
musical composition that sounds exactly right.  

Finally, the overall cognitive control of the affective process is important.  

Cognitive integration and modulation of affective material is a cognitive­
affective  process  crucial  in  adaptive  creative  functioning.  Although  this 
category is probably more cognitive than affective, it warrants inclusion 
because it reflects both cognition and affect, and it is so important in the 
creative process.” (Russ: 1993, 13) 

Este processo permite‐lhe uma passagem mais adaptada, não só à  vida adulta, 
como,  acima  de  tudo, à  sua nova actividade criativa:  as letras,  na  componente  do 
estudo  helénico,  na  escrita  e  na  tradução.  Para  além  de  professor  universitário  e 
escritor, Frederico é um celebrado tradutor de epopeias gregas. 

“Fechar, de uma vez por todas, o tampo do piano era solução menos fácil 
de pôr em prática do que à primeira vista parecia. Abdicar da identidade 
que  me  caracterizara  desde  a  infância  parecia  exequível  num  dia,  para 
logo,  no  seguinte,  se  afigurar  impossível:  eu  continuava  a  sentir  os 
chamamentos  do  arcanjo  a  obrigar­me  a  tanger  a  sua  máquina.  E,  na 
verdade,  nunca  me  libertei  inteiramente  do  teclado:  muitos  anos  depois 
do  piano  desta  fase,  viria  nova  fase  pianística  e  depois  uma  fase 
cravística. O facto de eu hoje não conseguir escrever à mão, com caneta e 
papel,  leva  a  que,  afinal  de  contas,  no  teclado  do  computador  eu  tenha 
finalmente encontrado a máquina certa do arcanjo certo ­que poderá não 
ser  Rafael,  protector  de  Tobias.  Ou  então,  como  me  diz  muitas  vezes  o 
terceiro  "Gonçalo",  novamente  em  terras  de  Entre  Douro  e  Minho,  a 
máquina  do  meu  arcanjo  é  simplesmente  a  língua  portuguesa.” 
(Lourenço: 92) 

O  processo  pelo  qual  Frederico  passou  assume  ao  mesmo  tempo  proporções 
desestruturadoras, que implicam o distanciamento em relação àquilo que sempre 
foi;  uma  imagem  identificatória,  o  seu  constructo  pessoal,  que  o  definia;  e 
proporções  estruturantes,  que  lhe  dão  uma  representação  mais  real  de  si,  mais 
consentânea com a sua forma de ser. Naturalmente, e como já foi referido, sendo a 
personalidade,  na  maior  parte  dos  casos  uma  constante  no  tempo,  marcas  dessa 
identidade ficam, como a comparação entre o teclado do computador ao escrever, e 
a performance musical que continuou, com maior ou menor intensidade, a praticar. 

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NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 

A identidade de alguém, tendo como componente a sua personalidade e, no caso, 
sendo uma personalidade criativa, estará permanentemente em contenda consigo 
própria, em busca duma paz que dificilmente conseguirá. O processo criativo é em 
si  mesmo,  conturbado,  e  umas  vezes  mais  que  outras,  relaciona  o  criador  com 
diferentes  universos,  ou  com  inúmeras  formas  de  ser  dum  universo.  O  que  fica 
sempre a marcar presença é a personalidade, a marca distintiva que nos permite 
dizer isto é uma obra de Frederico Lourenço, é um filme de Fellini, é mesmo a voz e 
o cantar de Schuwarskopff, mesmo quando na sua versatilidade mudam de registo. 

“Each  of  us  live  with  a  variety  of  potentially  contradictory  identities, 
which  battle  within  us  for  allegiance:  (…)  The  list  is  potentially  infinite, 
and so therefore are our possible belongings. Which of them we focus on, 
bring  to  the  fore,  ‘identify’  with,  depends  on  a  host  of  factors.  At  the 
centre,  however,  are  the  values  we  share  or  wish  to  share  with  others.” 
(Sturrock: 1994, 3)  

Ao  resolver  esta  relação,  mais  consigo  próprio  do  que  a  dois,  uma  vez  que  à 
partida parecia condenada, Frederico faz em si uma purga, liberta‐se ainda mais de 
constrangimentos  que  tinha em  si,  tendo  vivido  aquilo  que  era  necessário  ao seu 
crescimento. Do sismo emergiu uma nova ordem que fez despertar em si e na sua 
personalidade criativa o que sempre tinha estado adormecido. A emoção escolheu 
o  seu  caminho  e  a  sua  expressão.  Fiquemos  com  as  suas  palavras  da  descoberta 
dum novo mundo, que sempre andou presente à espera que dele tomasse posse: 

“Que a escrita e a tradução se revelariam a tábua de salvação de que eu 
andava  à  procura  veio  a  perceber­se  depois  da  derrocada  final  com  o 
Gonçalo,  que,  pelo  tipo  de  coincidência  impossível  (porque  demasiado 
"forçada") num romance, aconteceu no aniversário seguinte dele, que era 
também o nosso aniversário e foi, a todos os títulos, um descalabro.  

No  rescaldo  desse  acontecimento  sísmico,  foi­me  parecendo 


gradualmente  que  esgotara  a  capacidade  de  sofrer  e  que,  não  havendo 
martirização possível que alterasse a irrevogabilidade daquele desfecho ­ 
e não tendo eu mais lágrimas para chorar ­, o melhor que eu tinha a fazer 
era ficar parado, à espera que o pó assentasse. Sentava­me ao piano, mas 
se  não  me  apetecesse  estudar,  não  forçava.  Passava  dias,  semanas,  sem 
tocar.  Punha­me  a  ler  livros  variados  (muito  me  ajudaram,  nesta  fase 
difícil,  os  deliciosos  romances  da  Nancy  Mitford),  olhava  para  as 
gramáticas  de  Grego  compradas  pelo  meu  pai  no  tempo  em  que  fora 
aluno  do  Prof.  Rosado  Fernandes  e  ficava  ali,  qual  basbaque,  fitando 
aquelas palavras indecifráveis, ainda na dúvida de algum dia ser capaz de 
dominar um "piano" tão temível como aquele.  

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NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 
 
Entre  as  leituras  que  me  caíram  nas  mãos  nesta  altura,  houve  uma  que  foi 
absolutamente decisiva.  

Conhecia  desde  criança  o  nome  Sophia  de  Mello  Breyner  Andresen,  não  só 
porque a minha irmã e eu tínhamos A Menina do Mar e O Rapaz de Bronze (tema 
sobre  o  qual  o  Gonçalo  pintou  uma  delicada  aguarela  que  mais  tarde  inspirou  o 
díptico  "Porto,  Campo  Alegre"  na  Formosa  Pintura),  mas  sobretudo  porque  os 
meus  pais  a  conheciam  através  do  João  Bénard  da  Costa  e  a  minha  mãe  contava 
sempre a história maravilhosa de um passeio de barco no Algarve em que a Sophia 
se  coroava  com  algas  enquanto  declamava  os  seus  próprios  versos.  Tínhamos, 
desde os anos 60, na nossa sala, um exemplar do livro Geografia, livro esse que é 
das minhas mais antigas memórias, porque o abria, de vez em quando, ao longo da 
infância  e  da  adolescência,  para  logo  o  repor  na  estante,  perplexo,  em  virtude  de 
não ter percebido nada do que lera.  

Um pouco maquinalmente, como era meu hábito já arreigado e antigo, tirei um 
dia a Geografia da estante e abri o livro numa página em que se lia:  

Aqui despi meu vestido de exílio  

E sacudi de meus passos a poeira do desencontro  

Como  é  que  esta  poesia  me  fora  incompreensível  durante  tantos  anos? 
Estes  versos  eram  exactamente  a  resposta  de  que  eu  andava  à  procura. 
Chegara o momento de despir o vestido de exílio, em mais de um sentido; 
chegara o momento de sacudir dos meus passos a poeira do desencontro. 
Chegara o momento de me reconstruir.  

Perguntei à minha mãe o que significava "Acaia", o título do poema.  

­ O mesmo que Grécia ­ foi a resposta.  

Começou em mim uma autêntica febre grega (que ainda hoje continua a arder, 
como se sabe). Li e reli os poemas gregos dos vários livros da Sophia; supliquei à 
minha mãe que perguntasse na escola onde dava aulas se não haveria alguém que 
me pudesse dar explicações de Grego e Latim. Estava decidido. Ia estudar Clássicas. 
O tampo do piano ficaria fechado durante dez anos.” (Lourenço: 93/94/95)  

CONCLUSÃO
Criatividade  é  conceber  algo  de  novo  e  com  valor.  Ser  criativo  é  ter  soluções 
“novas” e adequadas para os problemas/situações que nos são apresentados/das. 
Personalidade  compõe‐se  de  características  comportamentais  que  cada  pessoa 

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NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 

apresenta  em  determinadas  situações  e  que  se  mantêm  constantes  ao  longo  do 
tempo. A criatividade tem dois enfoques: o pessoal, enquanto trabalho interior não 
é  observável  directamente  mas  pode‐se  observar  o  modo  exterior  de  criar  – 
comportamento  criativo;  e  o  produto  dessa  laboração  interior,  o  livro,  o  filme,  o 
quadro, a sinfonia… Criatividade é algo que se pode encontrar em qualquer pessoa 
que se situe em qualquer área de conhecimento ou actividade. No entanto, esta é 
geralmente  mais  reconhecida  em  pessoas  ligadas  ao  mundo  das  artes  ou  das 
ciências,  embora  se  dê  o  caso  de  muitas  pessoas  deste  mundo  pouco  ou  nada 
serem  criativas.  Gregory  Feist  refere  estudos  que  foram  feitos  e  estabelecem 
relação  entre  personalidade  e  criatividade.  Estes  estudos  referem  que  há 
características não sociais e sociais entre artistas e não artistas. Assim verificou‐se 
que  no  respeitante  às  características  não  sociais  os  artistas  têm  mais  abertura  à 
experiência,  mais  fantasia  e  imaginação,  são  mais  norteados  esteticamente,  mais 
intuitivos,  mais  impulsivos,  mais  inseguros,  ansiosos,  tem  mais  insegurança 
afectiva  e  com  mais  susceptibilidade  emocional.  São  também  muito  motivados  e 
ambiciosos.  Destas  características,  Frederico  Lourenço,  se  nos  ativermos  ao  seu 
reconto,  que  não  se  limita  a  descrever  a  sua  história  passada,  mas  nos  dá 
indicações  do  seu  posicionamento  enquanto  adulto,  partilha  todas:  é  aberto  à 
experiência; é imaginativo e fantasioso, embora, por enquanto a sua ficção seja de 
carácter marcadamente autobiográfico; é bastante norteado esteticamente, dentro 
do classicismo; é bastante intuitivo e impulsivo; é inseguro, como se pode ver na 
referência  que  faz  no  texto  à  sua  obra,  e  é  susceptível  emocionalmente.  Das 
características  sociais  Frederico  partilha,  quase  necessariamente  pela  sua 
orientação sexual que manifesta abertamente, sem qualquer forma de arrogância, 
a independência, o ser não conformista e questionador de normas. Por fim é uma 
pessoa introvertida.  

“A  Máquina  do  Arcanjo”  dá‐nos  o  retrato  dum  jovem  pueril,  com  vontade  de 
viver  e  aprender,  à  sua  custa,  sem  medo,  assumindo  as  consequências  dos  seus 
actos,  numa  entrega  completa,  sofrida:  o  retrato  de  alguém  que  tem  que  se 
cumprir. Um jovem de personalidade marcada, que observa o mundo à sua volta e 
a ele está atento. Enquanto obra autobiográfica é o depoimento duma vivência, que 
tal  como  Frederico  Lourenço  pretende,  é  partilha  para  que  outros  se  possam 
descobrir como ele próprio o fez. Partilha para mostrar que amar no masculino, o 
masculino,  ser‐se  homossexual,  não  será  tão  diferente  do  amor  heterossexual: 
sofre‐se  da  mesma  forma,  recusa‐se  o  amor  dos  outros  da  mesma  forma,  é‐se 
cúmplice da mesma forma, realiza‐se o afecto da mesma forma. A diferença estará 
na forma como se vê o amor. 

Embora seja uma autobiografia, “A Máquina do Arcanjo” tem marcas do género 
“Bildungsroman”3.  Este  género  de  livro,  do  qual  um  dos  expoentes  do  romance 
moderno  é  “Portrait  of  the  artist  as  a  Young  Man”  de  James  Joyce  (não  se 
pretendendo aqui comparar Joyce com Lourenço) estava muito em voga no séc. XIX 

 Como diz Suzanne Hader, em “The Bildungsroman Genre”. [Consulta em 16/01/2006] Disponível na WWW: 
3

URL: http://www.victorianweb.org/genre/hader1.hml. 

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NASCIMENTO, F. & Candeias, A. (2007) Características da personalidade criativa – contributos 
para a sua demarcação em “a máquina do arcanjo” de Frederico Lourenço. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 
 
em Inglaterra e na Alemanha. “Bildungsroman” é o romance que se ocupa do auto‐
desenvolvimento da personagem principal (no caso de Joyce e Frederico, dá‐nos o 
retrato  do  crescimento  também  enquanto  artistas,  ou  seja  do  processo  criativo): 
mostra‐nos  o  crescimento  pessoal  dum  jovem  num  determinado  contexto  social. 
Esse  crescimento  pessoal  é  a  aprendizagem  para  vida  e  a  busca  duma  existência 
com  significado  na  sociedade.  No  entanto,  esse  processo  de  maturação  é  longo, 
gradual, mostrando os conflitos entre os desejos e as necessidades do protagonista 
para  se  integrar  numa  sociedade  pouco  afeita  a  mudanças.  Finalmente,  estas 
narrativas, dão‐nos a avaliação que o protagonista faz da sua posição na sociedade. 

A  busca  de  si,  fez‐se  através  da  anulação  do  que  era.  Transformou‐se  para 
melhor ser quem é. 

“Para poder encontrar­me a mim mesmo, tive primeiro de me perder. Tive 
de chegar ao pleno vazio de mim. Não foi um vazio imóvel, um compasso 
de  espera  na  dança  do  ser:  o  meu  vazio  foi  um  rodopiar  imparável  de 
dinâmica  negativa,  de  tal  forma  que  desistir  surgiu,  por  fim,  como 
premente  solução  lógica  para  acabar  de  vez  com  o  tormento  daquele 
excesso giratório. Tinha dezanove anos.” (Lourenço: 2006, 95) 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Cambridge University Press, Cambridge, 2003* 

Ewen,  Robert  B.,  An  Introduction  to  Theories  of  Personality,  Lawrence  Eribaum 
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Lourenço, Frederico, A Máquina do Arcanjo, Edições Cotovia, Lisboa, 2006 

Marques, Carlos Vaz, Frederico Lourenço, Ler, Livros & Leitores, Lisboa, Círculo de 
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Sturrock,  John,  The  Language  of  Autobiography,  Cambridge  University  Press, 


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Weeks,  Jeffrey,  The  Value  of  Difference,  in  Identity,  Community­Culture­Difference, 


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RECURSOS NA INTERNET
“The Bildungsroman Genre” 

http://www.victorianweb.org/genre/hader1.hml 

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www.questia.com 

Csikszentmihalyi, Mihaly, The Creative Personality: 
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