Professional Documents
Culture Documents
PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LINE
1 9 6 I
ANO III
ÍNDICE
L CIENCIA E RELIGIAO
n. DOGMÁTICA
V. MORAL MEDICA
I. CIENCIA E KELIGIÁO
R. M. J. (Volta Redonda) :
— 179 —
estudos teóricos e práticos; publicou varias obras, das quais
a mais famosa ficou sendo «On the Origin of Species by mean
of Natural Selection» (Londres 1859; 6a. ed. em 1882).
— 180 —
em dia estáveis e subtraidas á evolugáo, embora aínda se
imponha a luta pela vida ; explicava, porém, que tal aparéncia
é ilusoria, devendo-se exclusivamente á lentidáo das transfor-
magóes, que de fato continuam a se dar.
— 181 —
humana, oriunda do psiquismo dos animáis inferiores, tém
algum valor e atingem a realidade objetiva ?
Assím, por exemplo, escrevia Darwin a um amigo em 1881:
«Exprimiste minha conviccao intima,... a saber: o universo nao
é o resultado do acaso. Mas a dúvida me assalta sempre, e pergunto-
{ -me se as conviccoes do homem, que se desenvolveu do espirito de
, animáis inferiores, tém algum valor, de sorte que nelas possamos
de algum modo confiar» (Vida e correspondencia, t. I 368).
Apenas de passagem, antectpando o que mais adiante se frisará
melhor, note-se que a sá Filosofía rejeita a expressáo «espirito de
animáis inferiores». Nos irracionais nio há espirito; cf «P R»
5/1958, qu. 1.
— 182 —
no agnosticismo ou mesmo no materialismo puro ? Se a for-
, magáo das especies se explica por evolucáo, onde fica a idéia
de um Deus CriadoS de todas as coisas, visíveis e invisíveis ?
Nao teráo razáo os que propóem o dilema : «Ou Criagáo e
crenca em Deus ou Evolucáo e renegado de Deus ?».
É a tais questóes que vamos dedicar o parágrafo seguinte.
2. Criacáo ou evolugáo ?
— 183 —
mada por vida vegetativa apenas ou por vida vegetativa e sen
sitiva. Quanto ao espirito, ele é sempre animado, e animado
por vida intelectiva. Cf. «P.R.» 7/1958, qu. 1.
INANIMADA: mineral
— 184 —
Tornam-se oportunas algumas observagóes ao esquema
ácima:
1) Nao há dúvida, toda e qualquer alma humana, no
decorrer dos sáculos, tem a mesma órigem, ou seja, é direta-
mente criada por Deus.
2) Entre os dois atos criadores ácima notados, é claro
que Deus pode ter efetuado outros atos criadores. Nao poucos
estudiosos julgam que a vida, mesmo em seu grau ínfimo (que
é o grau vegetativo), nao se pode explicar por simples pro-
cesso evolutivo da materia (a vida vegetativa nao poderia estar
contida dentro da potencialidade da materia, embora o seu
principio vital seja material) ; em tal caso, tornar-se-ia evi-
__dente que Deus interveio no mundo para criar os primeiros
seres vivos. Há também quem julgue impossível a transicáo
dé urna especie para outra nos reinos vegetativo e sensitivo;
Deus entáo terá interferido com sua potencia criadora tantas
vézes quantas sejam necessárias para explicar as diversas
■especies de viventes (note-se, porém, que é difícil delimitar
as especies e que as intervencóes criadoras de Deus nao sao
perceptíveis ao dentista, pois nao deixam vestigios diretos ñas
carnadas dá térra).
y Ao confeccionar o esquema ácima, o que nos interessava era
'únicamente mostrar o que, no mínimo, se deve admitir no tocante
aos atos criadores de Deus; as duas intervencóes apontadas bastam,
a rigor, tanto aos olhos da Filosofía como aos da Revelacáo crista,
para explicar o mundo presente.
— 185 —
especies. Duas outras sao as dificuldades que o filósofo e o teólogo
formulam contra o darwinismo: ^
— 186 —
Nao se poderia encerrar a presente resposta sem urna referencia
aos fascículos de «P. R.» nos quais sao elucidadas as páginas da S.
Escritura atinentes k origem do mundo e do homem. Veja-se:
H. DOGMÁTICA
1. O problema
— 187 —
b) Muito mais rico em testemunhos congéneres é o Novo
Testamento, onde Jesús aparece como «o Cordeiro de Deus
que tira os pecados do mundo» (cf. Jo 1,29) ou como o Filho
que Deus Pai, por amor, entregou para salvar o mundo (cf. Jo
3,16). É Sao Paulo quem com a máxima clareza desvenda o
designio divino:
— 188 —
«Nao sabéis que os injustos nao hSo de possuir o Reino de
Deus? Nao vos iludáis! Nem os fornicadores, nem os idólatras, nem
os adúlteros, nem os efeminados, nem os infames, nem os fraudulentos,
nem os avarentas, nem os ebriosos, nem os caluniadores, nem os
ladrOes possuiráo o Reino de Deus» (1 Cor 6, 9s).
2. A solucáo clássica
— 189 —
considerando o homem segundo as notas essenciais da sua
natureza, Deus certamente quer a salvagáo ou a posse da
bem-aventuranea para todos os homens ; foi em vista da feli-
cidade eterna, e sómente em vista desta, que o Senhor criou
o género humano.
Considerando, porém, cada individuo humano de per si,
tal como comparece perante o juízo de Deus após o currículo
desta vida, o Senhor nao pode querer que todos tenham indis
tintamente a mesma sorte bem-aventurada, pois nisto haveria
injusticia. Na realidade, alguns homens, abusando do livre ar
fa'trio, frustram sua vocacáo para a bem-aventuranga eterna,
aderindo incondicionalmente as criaturas. Sobre ésses o Se
nhor Deus tem que proferir sentenga diversa da que compete
as almas retas. Portante, em sua vontade consecuente, Deus,
justo como é, nao pode querer a salvagáo de todos os homens,
mas há de querer o castigo dos maus (alias, ésse «querer o
castigo dos maus», em última análise, nao é senáo «respeitar
a livre opgáo dos que se quiseram saciar com as criaturas»,
como ainda mais claramente diremos abaixo).
— 190 —
outros termos: Deus, ao querer a salvagSo de todos os homens em sua
vontade antecedente, quer salvar sem extinguir o livre arbitrio do
homem; antes, ... envolvendo a livre colaboragáo da criatura; o
Todo-Poderoso nao quis dotar o homem de livre arbitrio para redu-
zí-lo, no momento decisivo, á categoría de autómato.
— 191 —
Ao afirmar que Deus quer a salvacao de todos os homens o
Apostólo emprega o verbo thélo (thélei, em 1 Tim 2,4). Ora tal verbo
nos hvros do Novo Testamento em geral, significa freqüentemente
um designio que Deus mesmo se digna condicionar a certos fatóres
sem Ihe atribuir eficacia absoluta (cf. Mt 23, 37: «Jerusalém, Jeru-
salém, ... quantas vézes quis [ethélesa] Eu reunir teus filhos como
a galinha reúne os pintinhos debaixo de suas asas... e tu nao o
quiseste!»). Ao contrario, quando os escritores sagrados tencionam
exprimir um decreto absoluto da vontade divina usam o verbo bóulo-
mai! ct. 1 Cor 12, 11; Le 10,22; 22,42; Hebr 6,17; Mt 11,27; Me 15,15;
Al JOO6 2O2T
— 192 —
livremente resistem á graga divina. Eis os textos que mais
interessam ao estudioso da questáo:
— 193 —
7) Em 1690 Alexandre VIII anatematizava mais as seguintes
sentencas jansenistas:
«Cristo se ofereceu a Deus Pai em sacrificio por nos, nao pelos
escolhidos apenas, mas também por todos as íiéis, e sómente por
estes» (Denzinger 1294).
«Os pagaos, os judeus, os herejes e outros homens semelhantes
nao recebem influxo algum de Jesús Cristo; donde deduzirás que
sua vontade está destituida de todos os recursos para se impor,
assim como de toda graca suficiente» (Denzinger 1295).
294
1. Fundamento e origem do coito das reliquias
A. Os fundamentos bíblicos
— 195 —
mil moedas de prata. Foi assim que o poder do Senhor fez crescer
a palavra e a tornou sempre mais eficaz».
«Eis que u'a mulher que, havia doze anos, sofría de um fluxo
de sangue, se aproximou d'Éle (Jesús) por tras e Lhe tocou a orla
do manto. Dizia consigo: 'Se eu tocar ainda que seja apenas as
suas vestes, serei curada'. Jesús voltou-se entáo e, vendo-a, lhe disse:
'Tem confianca, minha filha, a tua fé te salvou'».
c') Me 14, 6-9: «Ela me fez urna boa obra;... embaLsamou anteci-
padamente o meu corpo para a sepultura. Em verdade vos digo: onde
quer que fór pregado no mundo éste Evangelho, será narrado o que
ela acaba de fazer para se conservar a lembranca dessa mulher» (cf.
Mt 26,9-12; Jo 12,7).
— 196 —
B. Os primeiros marcos da Tradicáo crista
— 197 —
Ésse texto, a mais de um titulo, é importante. Supóe, sim,
que, logo após o desenlace do mártir Policarpo na cidade de
Esmirna, os cristáos se dispunham a usar do seu direito legal
de sepultar honoríficamente os despojos do defunto. Contudo
os judeus se insurgiram contra tal praxe, percebendo o ca-
ráter profundamente religioso que os discípulos de Cristo atri-
buiam ao sepultamento dos mártires; por isto o oficial ro
mano resolveu mandar queimar os restos moríais de Policarpo.
Feito isto, os cristáos, nao se dando por vencidos, ainda reco-
lheram as preciosas cinzas, levaram-nas para lugar oculto,
onde as depositaram ; de entáo por diante, propuseram-se reu-
nir-se lá anualmente a fim de celebrar religiosamente o ani
versario do mart'rio (ou melhor, segundo o vocabulario dos
antigos :... o natalicio para a vida eterna) de Policarpo.
Como se depreende do teor geral do documento, os judeus
se opuseram ao sepultamento do santo mártir, por temerem
que os cristáos o praticassem em espirito pagáo, endeusando,
ao lado de Jesús Cristo, um mero homem... Esta atitude dos
israelitas, longe de quebrantar o ánimo dos cristáos, provocou,
ao contrario, da parte déstes urna tomada de posigáo ainda
mais consciente : o autor da Ata se viu obrigado a explicar
aos leitores (em fórmula breve, mas rica) a mentalidade que
animava os cristáos ao cultuarem os mártires e suas reliquias:
— 198 —
gentíos; davam a vida justamente para nao pactuar com os
costumes de seus concldadáos e mesmo de seu familiares poli
teístas. — Note-se outrossim que os dois documentos se refe-
rem á veneracáo das reliquias em termos táo claros e serenos
que nao parecem estar insinuando urna inovagáo. Duas comu
nidades cristas importantes — urna, de Antioquia, capital da
Siria; a outra, de Esmirna, cidade luzeiro da Asia menor
só podiam proclamar no inicio do séc. II, perante as demais
comunidades do mundo romano, a sua estima para com os
despojos de seus bispos e mártires, caso tal atitude já estivesse
realmente contida em germen dentro do ensinamento dos
Apostólos e, por conseguinte, do próprio Cristo.
— 199 —
confirmando a íé e a devocáo dos que a Ela recorriam por intercessáo
dos mártires.
— 200 —
dessa tese anticristá, acidentalmente associada a modernas campa-
nhas em prol da incinera gao, tem sido a Igreja levada a repelir
tal procedimento funerario (cf. «P. R.» 5/1957, qu. 5).
— 201 —
reliquias cuja náo-autenticidade lhes conste com certeza (can. 1284);
quem expSe ao público urna falsa reliquia, conhecida como tal, incorre
imediatamente em pena de excomunháo (can. 2326).
S. Tomaz mesmo admoesta a que, no culto das reliquias, se
evite toda especie de supersticao, seja por excesso de veneracáo,
seja pela observancia de práticas vas que nao se conciliem com a
reverencia devida a Deus e aos santos (cf. Suma Teol. II/II 96 4 ad
3; III 54, 2 ad 3).
Em termos positivos, o Direito Canónico exige que toda reliquia
proposta ao culto público seja devidamente autenticada por documento
oficial assinado por um Cardeal ou pelo Prelado ordinario do lugar
(can. 1283) (1). Quanto ás reliquias que gozam de culto muito
antigo, existe presuncao de direito em seu favor, de sorte que se
requerem argumentos seguros para se negar a sua autenticidade
(can. 1285 § 2); a piedade dos fiéis e os beneficios espirituais alcan-
Cados na veneracáo de tais objetos sao títulos que conferem a essas
presumidas reliquias um caráter sagrado, independenteniente da
qiiestáo da respectiva autenticidade. Dado que o documento de genui-
nidade de urna reliquia se tenha perdido por desordens civis ou por
qualquer outro motivo, o Direito eclesiástico prescreve, nao seja tal
reliquia entregue á pública veneracao antes que o Ordinario local,
tendo realizado um inquérito minucioso sobre as vicissitudes ocorridas,
conceda novo atestado de autenticidade (can. 1285 § 1).
Como se compreende, é proibida qualquer venda de reliquia (can.
1289 § 1). Os Prelados ordinarios e em geral os sacerdotes que tém
cura de almas, devem cuidar para que, por ocasiáo de herancas ou
de vendas de bens, nao sejam auténticas reliquias vendidas nem
sejam entregues a pessoas nao católicas. A venda de reliquias ver-
dadeiras, como a fabricacáo e a distribuido de falsas reliquias,
sao punidas imediatamente por excomunháo (can. 2326).
Quanto ao caso do anel de Sao Pío X que, conforme os jomáis,
devia ser públicamente vendido em leilao na cidade do Rio de Janeiro
em fevereiro de 1960, considere-se o seguinte:
Trata-se de urna peca que o citado Pontifice recebeu como
presente quando foi nomeado bispo de Mantua em 1884. Ao morrer,
Pió X doou-a por testamento ao seu amigo Dr. José Ricaldoni, o
qual naturalmente se tornou legitimo possessor da mesma. Ora a
familia Ricaldoni emigrou para o Brasil e dispóe-se agora a leiloar
a joia...
No caso, o anel de S. Pió X está sendo tratado qual reliquia
histórica ou qual objeto que pertenceu a um grande vulto da historia
moderna, e nao como objeto sagrado, destinado á veneracáo religiosa
dos fiéis. Nao se pode, portanto, falar de venda de reliquia reíigiosa
nem de simonía (venda de bens espirituais). Ademáis o mencionado
anel está subtraido á jurjsdicao das autoridades eclesiásticas, tendo-se
tornado propriedade da familia Ricaldoni; por conscguinte, o que se
fizer com essa venerável peca, far-se-á independentemente de algum
mandato dos superiores religiosos.
— 202 —
III. SAGRADA ESCRITURA
PRIMO (Niterói) :
1. GAL 4, 13-15
«Sabéis que foi por causa de urna enfermidade que vos anuncie!
o Evangelho pela primeira vez. E, apesar de meu corpo enfermo ser
para vos urna provagSo, nenhum desprézo ou desgasto manifestastes.
Pelo contrario, vos me recebestes como um anjo de Deus, como o
Cristo Jesús... Dou-vos meu testemunho: se fósse possivel, terieis
arrancado vossos olhos para mos dar» (Gal 4,13-15).
— 203 —
Estas palavras dáo-nos a saber que certa vez, estando o
Apostólo de viagem pela Galácia, foi acometido de grave mo
lestia, que o obrigou a interromper o seu itinerario; aproveitou
entáo o ensejo para comunicar a mensagem de Cristo á po
pulacho que o acolhera.
Sao Paulo nao explica qual tenha sido a doenga. Certa-
mente reduziu o paciente a situagáo humilhante, capaz de
causar repugnancia em quem o visse. Sim; o Apostólo, no
v. 14 ácima traduzido, dizia ao pé da letra : «A tentacjío que
o meu estado corporal vos suscitava, nao provocou em vos
desprézo nem vos fez cuspir = (oudé exeptúsate)».
— 204 —
Em conclusáo : de Gal 4,13-15 apenas se pode deduzir que
Sao Paulo foi no ano de 51 (aproximadamente) acometido de
grave molestia. Qual terá sido essa enfermidade ? Deverá ser
identificada com a doenga habitual a que o Apostólo se refere
em 2 Cor ? — Sao questóes que nao é possível elucidar pe-
remptóriamente. Tentemos, porém, aproximar-nos um pouco
mais da solugáo.
— 205 —
O Génesis ensina que o sofrimento físico é conseqüéncia do
pecado e que éste, por sua vez, foi desencadeado no mundo por agáo
de Satanaz (cí. Gen 3); dai a associacáo de «doenca» e «demonio»
na mentalidade judaica e, de certo modo, também na mentalidade
crista. Jesús ao ver u'a mulher paralítica, interrogou: «Essa filha
de Abraáo, havia dezoito anos, estava presa por Satanaz; nao devia
ela ser libertada dessa prisao em dia de sábado?» (Le 13,16).
— 206 —
Apostólo mesmo tanto tem que lutar, como pederemos nos,
fráeos discípulos, resistir á seducáo ?».
Na base destas observagóes, os exegetas em nossos dias
já nao aceitam a suposigáo que acabamos de focalizar.
— 207 —
4) Em termos positivos, dever-se-á dizer que qualquer
interpretagáo verossimil há de levar em conta as seguintes
características: tratava-se de doenga muito dolorosa («espi-
nhosa»), manifestada em acessos violentos («murros de Sata-
naz») e de Índole crónica (cf. 2 Cor 12, 8s).
— 208 —
As questóes formuladas deixam de constituir pro
blemas desde que se esclarecam os dois seguintes pontos:
a) por que motivo a exegese moderna mudou varias senten-
c.as professadas pelos autores medievais ? b) qual tem sido
no caso a atitude da autoridade infalível da Igreja ?
Elucidemos, pois, sucessivamente estes dois itens.
— 209 —
lucionistas no setor da biología, da antropología, da sociología;
aventou-se a possibilidade de que o Pentateuco (os cinco livros
de Moisés) e outros opúsculos bíblicos tenham sido redigidos
a partir de documentos-fontes, mediante a colaboragáo de
autores diversos, etc.
Tais teses nao sómente eram inovadoras ; elas vinham
outrossim apregoadas por autores de mentalidade atéia ou, ao
menos, pouco crista, como Wellhausen, Darwin, Haeckel, Karl
Marx, Augusto Comte...
— 210 —
denável, pois de certo modo equivalía a urna traigáo. Com
efeito, a atengáo que tais «concordistas» dlspensavam á letra
da Escritura Sagrada era insuficiente; os criterios adotados
na exegese eram as teorías das ciencias naturais (astronomia,
biología, etc.) ; a Biblia vinha assim acomodada a padróes
náo-bíblicos; seus intérpretes, sem o saber nem querer, a
desvirtuavam e esvaziavam...
— 211 —
aproximagáo dos exegetas com os dentistas, no inicio do
séc. XX verificava-se outra tentativa de obter o mesmo efeito,
tentativa, porém, que só contribuiu para disseminar entre mui-
tos teólogos ortodoxos aínda maior desconfianga para com as
teses da ciencia e da filosofia modernas. Tal ensaio era o cha
mado «Modernismo».
O Modernismo representa, sim, um esfórgo (esfórgo infe
liz, porém) de adatar a doutrina crista (em particular, a exe-
gese bíblica) á mentalidade contemporánea; guardando a
nomenclatura da teología tradicional («dogma, fé, inspiraqáo,
revelagác», etc.), os modernistas esvaziavám o seu conteúdo,
pois atribuiam á mensagem crista um caráter relativista : a
religiáo, em suma, nao seria senáo a expressáo do senso místico
subjetivo do homem condicionado pelas circunstancias de sua
respectiva época ; em conseqüéncia, o que é verdade religiosa
em determinada fase da historia, já nao é tal em outros tem-
pos. Mais urna vez o conceito de evolugáo entrava em jógo
para servir a urna filosofia anti-cristá... !• Alguns sacerdotes
católicos, fascinados pela «elegancia» das proposicóes moder
nistas e possivelmente desejosos de realizar urna catequese
mais adatada ao homem do séc. XX, aderiram aos novos erros,
tornando-se apóstatas notorios (entre éles sobressaiam Loisy,
Tyrrell, Buonaiuti, Murri, Minocchi).
Em reagáo ao Modernismo, muitos exegetas ortodoxos se
fecharam em posigóes medievais. A Pontificia Comissáo Bíblica
em Roma chegou a publicar instrugoes que restringiam a li-
berdade de trabalho dos estudiosos católicos, principalmente
no que dizia respeito ao Antigo Testamento.
— 212 —
acomodados a cada um dos diversos assuntos explanados na Biblia;
em conseqüéncia, trechos da Biblia tidos sem restricto como textos
de historia deveriam ser interpretados menos literalmente. Embora
o professor de Jerusalém guardasse em tudo a mais pura ortodoxia
e fidelidade absoluta ao magisterio da Igreja, algumas de suas pro-
posicóes pareciam pouco oportunas na época, prestando-se a equívo
cos mais do que á edificacáo.
Á vista disso, o Patriarca de Jerusalém em 1903 chamou a atencáo
do Santo Oficio para as idéias aparentemente revolucionarias do Pe.
Lagrange; o Papa Leao XIII, porém, defendeu o exegeta. Os anos
de 1905-1914 foram penosos para o douto religioso, que sentia pesa-
rom sobre si suspeitas gerais de heterodoxia. Os Superiores em 1912
o removeram do magisterio e da cidade de Jerusalém. Voltou, porém,
a esta em 1913, menos de um ano depois de partir, e em breve reto-
mou suas atividades de professor e escritor. Finalmente, o Papa
Bento XV, logo que subiu ao pontificado (1914), impós silencio ás
vozes temerosas contrarias ao Pe. Lagrange.
Ao 3er momentáneamente afastado da cátedra em 1912, Lagrange,
conservando o auténtico espirito sobrenatural, escreveu em suas notas
intimas: «Poderia alguém justificar-se indefinidamente contra as
suspeitas? Tinha eu recurso mais seguro do que o silencio e o apelo
a Deus?» Na mesma época escreveu ao Papa S. Pió X: «Meu primeiro
movimento foi, e meu último movimento será, o de me submeter
com o espirito e o coracáo, sem reserva, ás ordens do Vigário de
Jesús Cristo...». Alguns meses mais tarde, declarava em um de seus
sermdes: «Filhos de celtas que somos nos. estamos habituados a
dedicar-nos inteiramente; nao sabemos marcar o passo. Se o Papa
quiser moderar nossos esforcos, se mandar que nao nos adiantemos
na diregáo para a qual nos impele a generosidade, será essa a nossa
provacáo... Ainda que o Papa dissesse aos seus soldados: 'Nao
sois feitos para combater, ide vigiar a bagagem', obedeceríamos com
alegría...».
— 213 —
Toda a tendencia católica á sintese, no campo da exegese, chegou
ao seu ponto de cristalizacáo oficial quando em 1943 o S. Padre Pió XII
publicou a encíclica «Divino afilante Spiritu», encíclica que foi saudada
como «urna rajada de ar fresco, de' ozónio, depoLs da tempestade»
(Monsenhor Charue, bispo de Namur, no prefacio á edigáo de L.
Cerfaux: Encyclique sur les études bibliques. Bruxelles 1945).
— 214 —
prudente que eré dever atacar ou declarar suspeita qualquer novidade
únicamente pelo fato de ser novidade» (transcrito da «Revista Eclesiás
tica Brasileira» 4 [1944] 459-61).
— 215 —
bibliotecas e pegas literarias dos antigos assírios, babilonios,
egipcios..., cuja lingüística comparada com a das páginas
bíblicas ajuda valiosamente o exegeta a penetrar no sentido
literal da Escritura. É possível que para o futuro aínda novos
documentos orientáis váo sendo descobertos e decifrados de
modo a projetar ainda mais luz sobre os textos bíblicos. Na
medida, portante, em que se pode esperar melhor conheci-
mento da lingüística oriental (seja israelita, seja nao israelita),
pode-se também admitir, para o futuro, alguma conclusáo nova
em pontos acidentais de exegese do Antigo Testamento (os
pontos essenciais já estáo esclarecidos e documentados).
Quanto ao texto dos Santos Evangelhos, deve-se observar
que foi redigido segundo as categorías da historiografía do
inicio da era crista ; ora essas categorías já nos sao suficien
temente conhecidas, de sorte que nao restem dúvidas sobre o
género literario dos Evangelhos e sobre a mensagem própria
de cada Evangelista.
Mais urna vez ssja lícito frisar : sao criterios sempre obje
tivos, independentes de gósto ou moda, que norteiam a posigáo
do exegeta católico diante das perguntas assinaladas no cabe-
galho déste artigo.
2. E a infalibilidadc da Igrcja ?
— 216 —
déste artigo), costumavam tomar ao pé da letra os capítulos
da Biblia que envolvem questóes de ciencias profanas (nao se
viam motivos para atitude contraria). Já que essa interpreta-
cáo era serenamente admitida por todos os cristáos, o magis
terio da Igreja nunca se viu solicitado a se pronunciar solene-
mente sobre ésse proceder, de mais a mais que versava em
grande parte sobre questóes pertencentes nao á fé e aos cos-
tumes, mas as ciencias profanas.
— 217 —
No tocante á Sagrada Escritura em particular, Pió XIX iazia
observar na encíclica «Divino afilante Spiritu» que poucos sao os
textos cujo sentido haja sido definido pelo magisterio extraordinario
da Igreja:
«Tenham os fiéis presente que as diretivas e leis dadas pela
Igreja versam sobre assuntos de fé e costumes, e que, entre as
muitas coisas que se léem nos Livros Santos..., poucas sao aquetas
cujo sentido tenha sido declarado pela autoridade da Igreja; nem
sao mais numerosas aquelas das quais tenhamos a sentenca unánime
dos Padres. Restam, pois, muitas e muito importantes questdes em
cuja discussáo e explicacáo se pode e deve exercitar livremente o
genio e a perspicacia dos intérpretes católicos» (transcrito da «Revis
ta Eclesiástica Brasileira» 4 [1944] 461).
V. MORAL MÉDICA
H. L. M. (Salvador) :
— 218 —
nascem e ílorescem para definhar e morrer á semelhanca da erva
dos campos que se torna cinza e lama. Multo diversa é a concepcáo
crista. Segundo esta, o Senhor fez o corpo humano como obra prima
entre as criaturas visiveis. file o destinou a crescer aquí na térra
e a se expandir imortal na gloria do céu... Nao foi Deus quem
tornou mortal o nosso corpo, mas, sim, o pecado. Por causa do pecado,
o corpo, tirado do pó, deve voltar ao pó; o Senhor, porém, de novo
o tirará déste para lhe restituir a vida. Mesmo reduzidos ao pó, a
Igreja respeita e honra os cadáveres, destinados a ressuscitar um
dia» (Alocucáo proferida aos 20 de maio de 1945).
— 219 —
de 1316 na cidade de Bolonha, o famoso Mondino dei Luzzi, retalhou
e examinou dois cadáveres de mulheres, consignando logo seus mé
todos e suas observacSes num pequeño tratado de anatomía.
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS»
UEDACAO ADMINISTRAgAO
Caixa Postal 2666 R. Real Grandeza, 108 — Botafogo
Rio do Janeiro Tel. 26-1822 —Rio de Janeiro
Assinatura anual: Cr$ 150.00
Número avulso do ano corrente : Cr$ 15.00
Número de ano atrasado : Cr$ 20,00
Índice de 1959 : Cr$ 15,00
Colecáo encadernada de 1957 : Cr$ 280,00
" 1958 ou 1959 : Cr$ 380,00
«Volta ás fontes» (separata de
«P. R.» 20/1959 qu. 2 e 3) CrS 10.00