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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoriam)
APRESENTAQÁO
DA EDigÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanga a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).
Esta necessidade de darmos
conta da nossa esperanga e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenga católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.
Eis o que neste site Pergunte e
Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortaleca
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar este trabalho assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.
A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaga
depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
tnó
[ENFRENTE ;
Sumario
P«S.

AS PREVISÓES PARA A DÉCADA DE 80 309

Um Hvro pionelro:
"O ROSTO MATERNO DE DEUS", por Leonardo Bofí O.F.M. ... 311

Importante documento:
A PASTORAL DOS DIVORCIADOS 320

Um Hvro questlonador:
"A QUESTÁO HOMOSSEXUAL". por Marc Oralson 332

Qual a niensagem de
"UNIVERSO EM DESENCANTO" ? 345

LIVROS EM ESTANTE 352

COM APROVACÁO ECLESIÁSTICA

NO PRÓXIMO NÚMERO:

Os direitos da crianca. — Os dons do Espirito Santo. — Pro


fecías de ¡mínente fim do mundo. — "Reflexóes sobre vida
após a vida".

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS»

Número avulso de qualquer mes Cr$ 18,00

Assinatura anual Cr$ 180'00

Diregao e Reda«áo de Estéváo Bettencourt O.S.B.

ADMINISTBACAO
Livrarla Mlssionária Editora REDACAO DE PR
Rúa México, 168-B (Castelo) Calxa postal 2 fl6(J
20.031 Rio de Janeiro (RJ)
Tel.: 324-0059 20.000 Rio de Janeiro (RJ)
Mil
AS PREVISÓES PARA A DÉCADA DE

No comego de julho próximo passado reuniu-se no Rio de


Janeiro o Clube de Roma, sociedade que se preocupa com os
grandes problemas internacionais do momento. O certame
contou com a presenga de notáveis cultores das ciencias huma
nas do Brasil e do estrangeiro, os quais se debrucaram since
ramente sobre os desafios da poluigáo, da fome, do subdesen-
volvimento...

O cristáo se interessa vivamente por tais assuntos,...


nem sempre na qualidade de técnico e especialista, mas, sim,
como portador do olhar e dos sentimentos de Cristo para com
a humanidade. Precisamente como portador desse olhar bené
volo e amigo, o S. Padre Joáo Paulo n quis considerar o ho
mem contemporáneo através da sua encíclica «Redemptor Ho-
minis». Verificava, entáo, que esse homem estranhamente
vive sob o signo do medo... Medo, sim, porque ameagado
pelos engenhos que ele mesmo produz, ou «pelo resultado do
trabalho de suas máos e, ainda mais, pelo resultado do traba-
lho de sua inteligencia e das tendencias da sua yontade (ib.
n* 15). O homem teme que alguns desses maravillosos pro-
dutos se possam tornar instrumentos de autodestruigáo catas
trófica, perante a qual os grandes cataclismas da humanidade
perderiam o seu significado. — Urna tal inquietagáo é bem fun
damentada. .. fundamentada no fato de que o progresso da
técnica e da civilizacáo exige proporcional desenvolvimento da
consciéncia moral e da ética; ora estes valores, no homem, tem
ficado aquém do nivel dos demais. A consciéncia é nao raro
sacrificada as conquistas da técnica. Assim o designio do Cria
dor vem sendo conculcado. Com efeito; segundo o plano de
Deus, expresso no livro do Génesis, o homem foi criado para
explorar o mundo na qualidade de imagem e semelhansa de
Deus, como lugar-tenente ou como guarda nobre e inteligente
das riquezas naturais, e nao como referencial absoluto e ego
céntrico ou como desfrutador apaixonado e irreverente.

É a falta dos valores éticos que suscita a pergunta: o pro


gresso, do qual o homem é autor, torna realmente a vida hu
mana sobre a térra mais humana?... Torna-a mais digna do
homem? Atinge o verdadeiro objetivo de todo progresso, que
é «tornar o homem mais consciente da dignidade da sua humar
nidade, mais responsável, mais aberto para o outro,... mais
disponível para prestar ajuda a todos, especialmente aos mais
fráeos e necessitados»? (ib. n» 15). — Dir-se-ia que precisa-

— 309 —
mente o contrario acontece: quanto mais o ser humano des
cobre perspectivas de conquistas materiais, tanto mais se es-
quece dos valores tipicamente humanos, entre os quais se conta
o senso de fraternidade, de solidariedade, de compreensáo mu
tua... O fato de que milhares de cidadáos vietnamitas pere-
cani em alto mar, ameagados pela fome, pela sede, pelas doen-
cas e pelo próprio océano, nao é precisamente a conseqüéncia
de que os govemantes das nacóes pensam prioritariamente em
seus interesses económicos,... interesses económicos aos quais
sao imoladas centenas e centenas de familias, cuja eficiencia
produtiva é nula ou negativa? O fato de que o povo da Nica
ragua sofra como tem sofrido nos últimos meses, nao será a
conseqüéncia do egoísmo e da avidez? A poluigáo que infesta
o ar, os océanos, os rios, as montanhas... nao será o prego da
procura desenfreada de mais producáo material, mais dinheiro,
e poderío?

Requer-se, pois, urna mudanga de mentalidade ou conver-


sáo da parte dos homens, sem a qual as tentativas de solucáo
apregoadas pelas assembléias internacionais de dentistas e
estadistas ficaráo esteréis. «Nao será fácil avangar se nao
intervier urna verdadeira conversáo das mentes, das vontades
e dos coragóes», diz Joáo Paulo H (ib. n« 16). Requer-se que
os homens valorizem o ser mais antes do que o ter mais..., o
ser mais, que nem sempre acarreta riqueza material, mas que
sempre engrandece e nobilita a criatura, encaminhando-a para
a verdadeira felicidade e a plenitude da vida. «Urna civiliza-
gáo de aspecto puramente materialista condena o homem a
escravidáo, embora algumas vezes isto acontega contra as
intengóes... dos seus pioneiros» (ib. n' 15).
A conversáo assim apregoada parece urna utopia. Como
realizá-la num mundo em que tudo leva a correr ao encalgo
dos bens materiais? Como quer que seja, o cristáo é um tanto
utopista e certamente um idealista. Que cada qual comece por
converter a si mesmo e transformar o ambiente em que vive!
Se muitos fizerem isto, muitos ambientes seráo transfigura
dos .. Além do qué, sabemos que a sabia Providencia Divina
quer servir-se dos mínimos esforgos de suas criaturas para rea
lizar as máximas faganhas.

Creio no poder e na eficacia de urna conduta convertida e


de urna vida santa... Nao porque a santidade faga alarde, mas
porque Deus quer salvar o mundo principalmente mediante os.
santos, mediante aqueles que, pobres em aparéncia, sao cha
mados a enriquecer o mundo inteiro (cf. 2 Cor 6,10)!
E,B.
— 310 —
PERGUNTE E RESPONDEREMOS»
Ano XX — N» 236 — Agosto de 1979

PUC-RS.
BIBLIOTECA
CENTRAL

Um livro pioneiro:

"o rosto materno de deus"


por Leonardo Boff O.F.M.

Em sfntese: O livro "O Rosto Materno de Deus" de Freí Leonardo


Boff O.F.M. tenta reformular a Marlologla a partir do conceito de feml-
nlno. Para tanto, estuda o feminino ñas ciencias humanas em geral — prin
cipalmente na psicología — e projeta a luz destas ciencias sobre María;
a mulher — e, em especial, Maria — bem pode ser tida como o símbolo
de Deus. Segundo o autor, em María o feminino é divinizado, como o
masculino foi divinizado em Jesús; María pode ser considerada como unida
hipostaticamente á terceira pessoa da SS. Trindade.

Passando as fontes da fé, o autor percorre os textos do Novo Testa


mento referentes a Maria, adotando as conclusSes da exegese mals critica,
que reduz a poucos os episodios históricos de Mt 1-2 e Le 1-2. No tocante
aos artlgos de fé concernentes a María SS., o autor os professa todos e
explana em termos profundos; chama a atencSo a manelra muito positiva
como expoe a vlrgindade de Maria antes do parto, no parto e após o
parto.

O livro se aprésenla como um ensaio aberto ao debate (p. 17,)(,


Nele encontramos páginas belas e profundas, ao lado de outras que pre-
cisailam de ser menos generalizantes, como se tenta mostrar na segunda
parte do presente artigo.

Comentario: O conhecido teólogo franciscano Frei Leo


nardo Boff publicou recentemente mais um de seus Iivros inti
tulado, este, «O Rosto Materno de Deus. Ensaio interdiscipli-
nar sobre o feminino e suas formas religiosas» (Ed. Vozes,
Petrópolis, 135 X 210 mm, 267 pp).

O autor estuda o feminino dos pontos de vista antropoló


gico, psicológico, sociológico, filosófico e teológico. No plano
teológico, detém-se longamente sobre a figura de Maria SS.
no texto do Evangelho e na historia da salvagáo.

— 311 —
ePERGUNTE E RESPONDEREMOS* 236/1979_

Dada a importancia da obra, vamos primeiramente ana-


lisá-la de maneira sucinta, para depois propor alguns comen
tarios a respeito.

1. O conteúdo do livro

A obra comeca por urna reflexáo sobre o feminino segundo


as diversas ciencias humanas, chegando a seis conclusoes¡bási
cas, das quais vai realgada aqui a chamada «inclusividade»:
"Embora diferentes, masculino e feminino se Interpenetram. Cada ser
humano ó simultáneamente masculino e femlnlno em densidades e propor-
coes próprias a cada um" (p. 71).

A seguir, o autor passa a examinar a tradigáo judeo-


-cristá Verifica que ordinariamente na Biblia o homem e a
mulher aparecem no mesmo plano: «Quando Deus cnou o
homem, fé-lo á semelhanca de Deus. Criou-os varao e femea,
e abencoou-os. Deu-lhes o nome de Homem no día em que os
criou» (Gn 5,ls). Todavia, nota o autor, foi prevalecendo na
Tradicáo judaica urna concepgáo pessimista e depreciativa em
relagáo á mulher, como se depreende de passagens como Eclo
25,17.23.33; 42,14.
No Novo Testamento, Jesús terá valorizado a mulher, cha
mando-a a colaborar na sua obra missionána (cf. Le 8,1-3,
245-10)' todavia os Apostólos, em suas epístolas haverao ce-
dtto á dis¿Sna5áo, colocando a mulher em posigáo de sub-
missáo ao homem; cf. lPd 3,17; Tt 2,5; ICor 14,34; Ef 5,22,24,
Q 3,18...
A Tradigáo crista, por sua vez, mostrou-se antifeminista,
apesar de enumerar entre os seus grandes vultos figuras femi-
ninas como S. Catarina de Sena, S. Teresa de Avila, S. Joana
d'Arc, Madre Joana Angélica...
Em nossos dias, a mulher está sendo de novo valorizada;
assumV ¿sigSes de destaque na sociedade, exercendo fungoes
de primeira importancia:
••Tudo oarece Indicar que oslamos assistlndo a emergencia de um

qüadro Institucional dos poderes e sua Imagem de

— 312 —
«O ROSTO MATERNO DE DEUS>

É á luz destas observagóes que Frei Leonardo Boff ana-


lisa dois temas teológicos:

— María SS., que, para o autor, representa a divinizagáo


máxima do feminino (p. 108), como Jesús representa a divini
zagáo do masculino (p. 104). Boff propóe, como hipótese, que
María tenha sido unida hipostaticamente á terceira pessoa da
SS. Trindade (p. 106). Em María Deus se «auto-realiza», «o
Espirito se espiritualiza» (p. 163).

A mulher bem pode ser expressáo do divino ou da rea-


lidade do próprio Deus. A S. Escritura, que apresenta Deus
como Pai, também O apresenta qual MSe (cf. Is 49,15; 66,12;
Os 11,4; Le 13,34; Ap 21,4...). A tradigáo crista, num ou
noutro de seus textos, retomou essa imagem e finalmente era
nossos dias Joáo Paulo I afirmou: «Deus é Pai e, mais ainda,
é Máe» (p. 101).

No que diz respeito aos Evangelhos, Freí Leonardo Boff


considera os respectivos textos mariológicos. Submete-os a
exegese crítica, para a qual varios dos episodios da infancia de
Jesús sao construgóes teológicas emanadas da fé das primeiras
comunidades cristas. Em conseqüéncia, escreve:
"Com criterios hlstoriográflcos e literarios se torna difícil discernir
nos relatos da Infancia o que é aconteclmento histórico e o que é retlexSo
teolóolca da comunldade primitiva com seus evangelistas. Quaae tudo se
concentra em Jesús e María emerge como a reallzacflo das promesías do
Antlgo Testamento. Os fatos considerados históricos sao os seguintes:
a vlrglndade de Nossa Senhora e seu nolvado com José (Mt 1, 18.24) ,
concepgáo virginal por obra do Espirito Santo (Mt 1.18-20; Le 1.35) ,
nome imposto pelo Alto, Jesús (Mt 1.21; Lo 1,31); infancia em Mazaré
(Mt 2,23). Estes fatos vém urdidos de reflex5es teológicas calcadas sobre
textos do Antigo Testamento" (p. 124).
O autor professa os artigos de fé da Igreja referentes a
Maria SS.: maternidade divina, virgindade perpetua, Imaculada
Conceigáo, Assungáo corporal. Procura penetrar no sentido
das grandes proposigóes da Mariologia, mostrando a sua har
monía e o seu valor teológico.
O livro termina com um enfoque sobre a mitología e Ma-
ría. Por «mito» entende o autor as imagens com que os ho-
mens de todos os tempos tentaram e tentam exprimir certos
conceitos transcendentais; a realidade de tantas imagens e a
sua fundamentagáo no psiquismo humano sao de grande im
portancia; Cari Gustav Jung recentemente pos em realce os
arquetipos ou as imagens básicas que estáo incluidas na psique

— 313 —
6 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 236/1979

humana. Ora Maria SS.f tal como é conhecida e venerada pela


piedade crista, despertou na psique dos fiéis numerosas ima-
gens ou arquetipos: a do paraíso, a do vaso ou receptáculo, a
da sementé, a da térra fértil, a da noiva, a da esposa, a da
máe... Em sintese, Maria tornou-se «um polo articulador
dos grandes motivos da arqueologia psíquica da humanidades
(p. 230). Em conseqüéncia, Maria foi grandemente exaltada
pelas artes (pintura, escultura, belas letras...), que tentaram
traduzir por símbolos e imagens a realidade histórica da Santa
Máe de Deus.

Assim encerra-se o livro de Frei Leonardo. É um tratado


rico em dados de diversas ciencias, que lhe conferem notável
erudigáo. A figura de Maria vem, através de tais páginas,
reconhedda em sua grandeza real histórica, em seu signifi
cado para a fé e em seu extraordinario potencial simbolista.

Compete-nos agora tecer algumas consideragóes sobre a


obra em pauta.

2. Refletincfo sobre o livro...

Eis algumas impressóes sugeridas pela leitura do livro


«O Rosto Materno de Deus»:

2.1. Original e pioneiro

Trata-se inegavelmente de obra original, interessante, rica


em elementos aptos a ilustrar a figura da mulher e, em espe
cial, Maria SS. As análises do feminino que Frei Leonardo
propoe, estudando a psicología das profundidades, sao dignas
de consideragáo, embora nao possam ser tidas como algo de
definitivo (o autor baseou-se especialmente na escola de Cari
Gustav Jung).

2.2. Maria e o Evangelho da infancia

No tocante á figura de Maria em particular, o autor pro-


fessa e explana os artigos que a Igreja ensina a propósito:
Maternidade divina, virgindade antes do parto, no parto e depois
do parto, Imaculada Conceicáo, Assungáo corporal. Merecem
especial atengáo as palavras de Leonardo Boff ao abordar a
virgindade de Maria antes do parto:

— 314 —
«O ROSTO MATERNO DE DEUS»

"Quanto á pergunta: como se deu ao nivel biológico a conceicfio


de Jesús no seio de María? Nada sabemos ao certo. A fé nos garante que
nao é 'ex semine Joseph' (Papa Paulo IV; DS 1880), mas ó 'conceptuth
de Splritu Sánelo1. Se Deus ctiou um esperma ou se atuou diretamente no
óvulo de María, Isso constituí urna hipótese sem possibilldade de com-
provacSo. A reflexio se torna Inocua e pode descambar numa curiosidade
sem recato. O que nos ó permitido dlzer, sem poder nem necessltar entrar
em detalhes, é que Jesús, homem-Deus, fol concebido de forma humano*
-divina. Por mais hemem que seja, Ele nao é somente homem. É também
Deus. Nos somos concebidos humanamente. Ele, humano-divinamente"
(P- 158).

A respeito da virgindade de Maria no parto, escreve sabia


mente Frei Leonardo:

"O que podemos dlzer, é o segulnte; escapam-nos os conheclmentos


sobre os processos concretos ocorridos por ocasISo do nascimento de
Jesús. Mas fol um nascimento verdadelro. Nao (ol como os nasclmentoa
comuns, pois, á dlferenca destes, aquele de Jesús nSo pressupSe relacáo
sexual previa. O nascimento corresponde á natureza de quem estava nas-
cendo, Jesús, que é a um tempo Homem e Deus. Houve um verdadelro
nascimento bem como urna plena maternldade. Isto nos basta para a fé,
sem outros detalhes" (p. 159).

No tocante á exegese bíblica do Novo Testamento, Frei


Leonardo, seguindo a tendencia mais critica da exegese con
temporánea, é minimalista, ou seja, reduz ao mínimo o núcleo
histórico dos Evangelhos da infancia (Mt 1-2 e Le 1-2), como
notamos a p. 313 deste artigo; o que nao lhe parece histórico,
ele o tem na conta de construcóes teológicas das comunidades
cristas primitivas. Ora a propósito desejamos observar: é fato
que os Evangelhos da infancia pertencem a um género litera»
rio próprio chamado «midraxe» (= exposicáo, em hebraico)
ou «hagada> (= narracáo). O midraxe nao é mera fiecáo,
mas supóe um cerne histórico,... cerne histórico que é apre-
sentado de tal modo que o leitor reconhega o significado teoló
gico desse episodio histórico. Nao há, pois, razáo para negar
a realidade histórica da vocacáo dos pastores ao presepio (cf.
Le 2,8-20), da circuncisáo do Senhor (cf. Le 2,21), da apre-
sentagáo de Jesús no Templo aos quarenta dias (cf. Le 2,22-38),
do episodio dos reis magos (cf. Mt 2,1-23), do encontró de
Jesús com os doutores em Jerusalém aos doze anos (cf. Le
2,41152). Nao há dúvida, tais episodios sao relatados de ma-
neira tal que fazem eco a textos proféticos do Antigo Testa
mento; verifica-se que os evangelistas quiseram apresentar
Jesús como o Prometido aos Patriarcas e Profetas; isto, porém,
nao significa que tenham «inventado» episodios pseudo-histó-
ricos.

— 315 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 236/1979

O grande exegeta Beda íügaux, professor da Universidade


de Lovaina, estudando o Evangelho da infancia segundo Ma-
teus (Mt 1-2) \ verifica que as profecías de Os 11,1; Jr 21,15;
Is 11,1; 53,2; Mq 5,1, citadas pelo evangelista, só tém afinidade
verbal ou mera assonáncia de palavras com os episodios da
infancia de Jesús relatados por Mt 2. Em outros termos: tais
profecías, entendidas rigorosamente ou em seu sentido literal
imediato, jamáis significariam o que Mateus narra a respeito
do Menino Jesús, pois nao foram proferidas diretamente em
vista do Menino Jesús. Donde se depreende que Mateus nao
«inventou» episodios para corresponder as profecías, mas rela-
tou episodios históricos, aos quais fez corresponder as profe
cías. O que Mateus quería dizer, é que a infancia de Jesús,
com seus quadros históricos, estava enquadrada dentro das
perspectivas da historia da salvagáo e do plano salvífico de
Deus.

"As quatro citacSes (Mq 5,1; Os 11.1; Jr 31,15; Is 11,1) só tém


relagSo verbal com os iatos que elas ilustram...

Mateus leu o Antigo Testamento a luz dos fotos que ele narra. Ele
nSo procura provar a realidade... Nenhum dos textos proféticos serla
adequado para criar o episodio do Evangelho que esses textos ptoféticos
llumlnam" (ob. cit. p. 137).

O mesmo seja dito a respeito do Evangelho da infancia


em Le 1-2: o evangelista nao «cria» fatos, mas expóe os fatos
á luz de textos do Antigo Testamento, a fim de evidenciar a
consumagáo da Antiga Alianga na vinda e na mensagem de
Jesús Cristo.

Referindo-se ao milagre das bodas de Cana da Galiléia


(Jo 2,1-12), Freí Leonardo julga que «possivelmente» ocorre-
ram os fatos ai narrados; todavía provavelmente deram-se
«antes da vida pública de Jesús... na roda dos conhecidos da
familia;... Jesús era, efetivamente, um taumaturgo» (p. 128).
Ora tais afirmagóes tém conseqüéncias, pois o milagre de Cana
está estritamente ligado com a estrutura do quarto Evangelho
(cf. Jo 2,12); nao obstante o alcance de tais afirmativas, o
autor nao as prova nem discute, mas simplesmente as propóe
ao leitor sem lhe dar ulterior satisfagáo. Na verdade, a supo-
sigáo apresentada por Freí Leonardo tem um qué de gratuito
e imponderável.

i Cf. Béda Rigaux, Témolgnage de l'Evanglle de Malthleu. Desctée de


Brouwer 1967.

— 316 —
«O ROSTO MATERNO DE DEUS>

2.3. Obsérveles gerais

Em tom amigo e fraterno, desejaríamos agora propur um


comentario de ordem geral ao novo livro de Frei Leonardo
Boff:

O autor revela enorme capacidade de leitura. Conhece


muito bem nao só a teología, mas também a filosofía e as cien
cias humanas em geral. Esta erudicáo se impóe ao leitor das
obras de Leonardo Boff.

Todavía quem analisa de mais perto os escritos do autor,


inclusive aquele que vem sendo focalizado nestas páginas, veri
fica que as vezes lhes falta um tanto de precisáo. Com outras
palavras: Frei Leonardo, cá ou lá, afirma um pouco genérica
mente, esquecendo-se de matizar; propóe hipóteses discutíveis
como se fossem teses comprovadas. Quando aborda assuntos
controvertidos, nem sempre expóe as hipóteses (ou teses) con
trarias á que ele adota; em conseqüéncia, o leitor desprevenido
pode julgar que a hipótese (ou sentenca) apresentada por Frei
Leonardo é a última conclusáo a que tenha chegado a teología
contemporánea. Segundo nos parece, Frei Leonardo poderia
ser um pouco mais circunspecto sempre que adota urna posicáo
nova ou original; poderia propor os fundamentos da mesma e
fornecer ao leitor os elementos para que pondere ele mesmo a
autoridade das hipóteses ou das teses que lhe estáo sendo apre-
sentadas; quando oportuno, faga ver ao leitor que existem
outros modos de pensar sobre tal ou tal assunto controvertido
(principalmente em se tratando de exegese bíblica).

Eis alguns espécimens de passagens do livro «O Rosto Ma


terno de Deus» ñas quais eremos que se poderia desejar mais
clareza e precisáo:

1) O autor repete freqüentemente nao só no livro em


foco, mas em outros escritos seus, a expressáo «Deas se rea
liza». — Ora esta é ambigua ou antropomórfica. O homem,
sim, realiza-se, faz-se paulatinamente... Deus, por definigáo,
nao se pode realizar ou fazer, pois é o Eterno e Absoluto. Por
conseguinte, só impropriamente se entendería tal locugáo. Por
que entáo insistir tanto no uso da mesma? Cf. pp. 163.166.184.

2) «María deve ser considerada como unida hipostatíca-


mente a terceira pessoa da SS. Trindade» (p. 106). O autor
classifica esta proposigáo como hipótese por ele formulada.
— Mais urna vez a terminología merece reparos: uniáo hipos-

— 317 —
10 tPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 236/1979

tática, no sentido habitual da expressáo, é aquela pela qual


duas naturezas — a divina e a humana — se unem numa só
hypósfasis ou pessoa ou num só eu; ocorreu urna vez só na his
toria, a saber: em Jesús Cristo, que era urna só pessoa ou um
só eu (a segunda pessoa da SS. Tríndade), embora tivesse
toda a realidade da natureza humana e a da natureza divina.
Se em Maria houve íntima presenga e agáo do Espirito, nunca
se deu o que em Jesús ocorreu; daí dizermos que a expressáo
«uniáo hipostática» só impropriamente compete a Maria; deve-
ria, pois, ser afastada da nomenclatura mariológica para nao
causar ambigüidades.

3) «Segundo o Código de Direito Canónico aínda vigente


(codificado em 1917), a mulher é, eclesiásticamente, equipa-
parada as criancas e aos loucos» (p. 85).

É o que Frei Leonardo afirma ao pretender mostrar que


a Tradicáo crista foi antifeminista.

Observaremos que, ao fazer a afirmagáo em foco, Frei


Leonardo nao cita fonte alguma. Pode-se crer que esta tenha
sido o canon 93 § 1», que assim reza ao especificar o conceito
jurídico de domicilio:

«A esposa que nao esteja legítimamente separada do ma


ndo, tem necesariamente o domicilio do seu marido. O louco
tem o domicilio do seu curador. O menor de idade tem o domi
cilio da. pessoa a cuja autoridade esteja sabmisso».
Pode-se dizer que este canon «equipara eclesiásticamente
a mulher ás mangas e aos loucos?»
Observa-se que o canon apenas enumera numa lista
tríplice a mulher casada (nao a mulher em geral), as criangas
e os loucos, nao para avaliá-los ou para proferir algum juízo
de valores sobre eles, mas únicamente porque eram os tres
tipos de pessoas cujo enderego jurídico era preciso explicitar.
Vé-se que a justaposigáo de «mulher casada, criangas e loucos»
é algo de meramente material, sem significagáo formal alguma.
Teria seu paralelo na expressáo: «O chefe da familia é respon-
sável pela incolumidade da sua esposa, dos seus filhos e dos
demais bens existentes no lar». Será que, assim fálando, um
legislador proferiría um juízo de valor sobre a esposa, equipa
rando-a aos filhos e aos bens materiais e inanimados do lar?
Nao; tratar-se-ia apenas de enumeragáo material, destituida
de qualquer intengáo de comparar entre si os seres nomeados.

— 318 —
4O ROSTO MATERNO DE DEUS» 11

O fato de que o Código reconheea ao marido o direito de


indicar o enderego da esposa, pode talvez ser discutido. Tal
funcáo toca ao esposo pelo fato de ser ele considerado o chefe
e o responsável pelo casal e pelo lar. Poderia esta funcáo ser
atribuida á mulher. No dia em que o for, o canon poderá ser
tranquilamente alterado.

E, para mostrar que o Direito Canónico nao ignora as


prendas da mulher, citemos o canon 88, que atribuí responsa-
bilidade ao sexo feminino antes de atribui-la ao masculino:
«Os menores de idade do sexo masculino salo considerados
adolescentes a partir dos quatorze anos; os do sexo feminino,
a partir dos doze anos completos».

Vale a pena também registrar como o Código reconhece


os direitos da mulher frente ao marido no tocante ao rito
litúrgico:

«£ facultado a esposa de rito diferente passar para o rito


do marido por ocasiáo do contrato matrimonial <ou depols.
Urna vez dissolvido o casamento, poderá reassumir o sen pró-
prio rito, caso nao naja obstáculo a isto por parte de Direito
particular» (canon 98 § 4).

Passamos agora a urna

3. ConclusSo

As obscrvacóes ácima tencionam apenas cultivar o diá


logo teológico, que é sempre valioso. O próprio autor parece
convidar os seus leitores ao diálogo, quando escreve:
"Tentaremos refundir o tratado sobre María a partir das reflexSes
acerca do teminlno.

A tarefa que nos propomos é ousada e chela de percalcos, teóricos


e préticos. Por isto as re(lex6es possuem um caráter nítido de ensaio
(p. 17).
Agradecemos a Frei Leonardo o ensejo de trocar idéias
que ele assim proporciona aos seus amigos. O que todos que-
rcm é acertar..., é unir os conhecimentos novos e enriquece-
dores da Teología á venerável caudal da Tradigáo (no que esta
tem de genuino e perene). Se o intercambio de posicóes se faz
em clima de respeito mutuo, de amor fraterno e de procura
sincera dos valores da fé, só poder merecer as luzes e as bén-
cáos do Espirito de Deus.

— 319 —
importante documento:

a pastoral dos divorciados

Em sintcse: O presente artigo reproduz as grandes linhas de


recente documento da Conferencia dos Bispos da Italia relativo a pessoas
divorciadas e outras que estejam vivendo situacoes conjugáis irregulares.
É notoria a tendencia pastoral e, ao mesmo tempo, coerente dfssas
normas Com efeüo, de um lado, o documento reafirma a indlssolubllidade
do matrimonio sacramental - indissolubllldade que a Igreja nto ''Inywitou'.
mas que tsm suas raizes ñas palavras do próprio Cristo (cf. Me 10.9-11,
Le 1618- Mt 5,32; 1Cor 7,10). Doutro lado, os bispos da Italia apregoam
asslsténcla moral e espiritual as pessoas que vivem irregularmente, a fim
de que entretenham seu espirito de fé. de oracSo e de confianca em Deus.
Sim- muitos daqueles que entraram em unides ilegitimas sofrem verda-
deirós dramas de consciéncia, mas nfio podem desfazer-se de sua situacáo
irregular por causa dos filhos a educar... É neeessário que essas e outras
pessoas vltimas de situacaes análogas nao percam a fó e a esperance,
desde que sejam sinceras.

Também é Importante que os filhos de casáis Infellzes ou ilegítimos,


Inocentes como sSo, n8o venham a ser prejudicados por causa da situacáo
conjugal dos genitores. É mlster que os país e os agentes de pastoral da
Igreia se interessem pela formacao crista dessas criancas e tudo facam
para que recebam os sacramentos da iniclacao crista (Batismo, Eucaristía,
Confirmacao).

***'" O documento dos bispos da Italia, em suas grandes linhas, aplica-se


adequadamente também as circunstancias da pastoral no Brasil.
• • •

Comentario: As Conferencias Episcopais de varios países


tém-se ocupado especialmente com o modo de tratar os cató
licos que, divorciados, contraem novas nupcias civis. Assim,
o episcopado da Suíga (cf. L'Osservatore Romano, 14/03/76),
as Conferencias Episcopais de língua alema (cf. Boletim da
Agencia Kipa, 30/06/75), os bispos da Franga (cf. La Croix,
17/06/77), os do Chile (cf. L'Osservatore Romano, ed. fran
cesa, 9/01/79, PR 232/1979, pp. 168-175), os de Uganda (cf.
Radiogiornale Vaticano, /16/02/79).

O episcopado italiano voltou-se últimamente também para


tal questáo, levando em conta outrossim o caso dos cristáos
que se juntam á semelhanca de um casal, sem qualquer vin
culo matrimonial. Após cuidadosos estudos, houve por bem

— 320 —
PASTORAL DOS DIVORCIADOS 13

promulgar o documento «La pastorale dei divorziati risposati


e di quanti vivono in situazioni matrimonian irregolari e dif-
ficili». Vista a importancia de tal estudo e de suas normas
pastorais, julgamos oportuno trazer ao conhecimento do pú
blico brasileiro as grandes linhas do mesmo, acrescentando-
-lhes algumas observagóes sugeridas pela situagáo concreta do
problema no Brasil.
Para apresentar o texto italiano, servir-nos-emos de um
resumo do mesmo elaborado pelo Padre G. Caprile S. J., e
publicado na revista La Civilta Cattolica n' 3094, 19/05/79,
pp. 375-381.

t. O DOCUMENTO DOS BISPOS DA ITALIA

Parte 1 : O Evangelho da indissolubilidade matrimonial


e a missño pastoral da Igreja

Nesta primeira secgáo, os bispos reafirmam a indissolubi


lidade do matrimonio sacramental validamente contraído. No-
tam outrossim que a legislagáo divorcista vigente na Italia
induz nao poucos cristáos a julgar que possa ser aceito, do
ponto do vista moral, um costume legalizado pelo Estado; na
verdade, nem tudo o que as leis do Estado permitem, vem a
ser moralmente aceitável. É precisamente em vista de tal situa
gáo que os bispos se dispóem a lembrar certos principios e esta-
belecer normas pastorais atinentes ao assunto (n« 1-14).

Parte 2 : Os divorciados que eontraem novas nupcias


Há, sem dúvida, pessoas que, conscientes de viver em con-
dicóes irregulares perante a mcnsagcm do Evangelho, desejam,
nao obstante, levar a vida crista táo fielmente quanto possivel,
e procuram aproximar-se da Igreja e das fontes da graga. E
para estas pessoas que se volta especialmente a solicitude dos
pastores (n» 15).

1) Os divorciados que se casan» de novo, e a comunldade


eclestal (n« 162-20)

Tais pessoas continuam sendo cristas e membros do povo


de Deus, embora vivam em circunstancias contrarias ao Evan-

— 321 —
14 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 236/1979

gelho. O caráter batismal eafc que essas pessoas ainda pro-


fessam, vinculam-nas á Igreja, mesmo que nao possam receber
os sacramentos enquanto permanegam em situagáo irregular.
O Direito Canónico nao inflige a censura da excomunháo aos
divorciados que se casem de novo no foro civil, embora nao
aprove o seu procedimento.

Compete, pois, entregar a Deus o julgamento das cons-


ciéncias e das responsabilidades pessoais dos cristáos que se
deixaram envolver em situagóes matrimoniáis irregulares. Os
sacerdotes, os familiares e amigos deveráo procurar manter
contato com esses irmáos (embora nao ratifiquen! o seu com-
portamento); tratem-nos com fraterna caridade e lembrem-
•lhes as grandes verdades da fé, aproveitando, para tanto, as
ocasióes oportunas, como sao o nascimento e o batizado dos
filhos, tribulagóes da vida, momentos de luto... De modo
especial, toca aos sacerdotes examinar se o primeiro enlace
matrimonial contraído na Igreja foi válido; caso se verifique
suspeita de invalidade, estimule as pessoas interessadas a recor
rer a algum tribunal eclesiástico para obter a eventual decla-
racáo de nulidade dessa primeira uniáo e casar-se legitima-
mente em uniáo definitiva.

2) Porticiposáo na vida da Igreja (n? 21-23)

A fim de que nao pereca, mas, ao contrario, se alimente a


vida de fé dos divorciados de novo casados, sejam convidados
a participar das realizacóes da comunidade católica: estudos,
cursos, oragáo comunitaria, paraliturgias penitenciáis, celebra-
cao da S. Eucaristía (sem a comunháo sacramental), obras de
caridade espiritual e corporal, educagáo crista dos filhos...
Compreende-se, porém, que nao poderáo exercer «fungóes que
exijam a plenitude do testemunho cristáo, como sao os minis
terios da S. Liturgia, especialmente o de leitor, catequista,
padrinho de batismo, crisma...»

3) Os sacramentos da Reconciliajáo e da Eucaristía (n* 24-29)

A participa gao nos sacramentos por parte de católicos


divorciados que se tenham casado de novo, implicaría contra-
digáo.

Com efeito. O sacramento da Reconciliagáo requer o arre-


pendimento dos pecados e o conseqüente propósito de nao mais

— 322 —
PASTORAL DOS DIVORCIADOS 15

os cometer. Ora no caso de unióes ilegitimas que perdurem,


faltam estas duas condicóes ou, se há arrependimento, falta o
propósito de por fim á situacáo ilegítima. «Como é possivel
escolher, ao mesmo tempo, o amor de Deus e a nao obediencia
aos seus preceitos?»

Quanto á Eucaristía, ela supóe o estado de graca, pois sig


nifica e realiza a plena uniáo com Cristo e com a sua Igreja.
Por conseguinte, «nao pode receber dignamente o sinal da uni-
dade perfeita com Cristo e a Igreja, quem, por sua própria
condigáo de vida, cria e conserva urna ruptura com Cristo e a
Igreja».

Há casos, porém, em que os divorciados, após ter con


traído novas nupcias, se dispóem a retomar um tipo de vida
auténticamente crista: «Desde que a sua situagáo nao esteja
sujeita a reversibilidade ou a recaída, por estarem em idade
adiantada ou por motivo de doenga de um ou de ambos os
consortes ou por nao terem filhos necessitados de ajuda e de
educagáo ou por outros motivos análogos, a Igreja os admite
a absolvigáo sacramental e a. Comunháo eucarística. Para
tanto, porém, devem estar sinceramente arrnpendidos e com-
prometer-se a interromper o seu relacionamento sexual e a
transformar o seu vínculo em amizade, estima e ajuda recí
procas. Caso isto se dé, poderáo receber a absolvigáo sacra
mental e chegar-se á Comunháo Eucarística numa igreja onde
nao sejam conhecidos, a fim de evitar um possivel escándalo» K

Aos divorciados que hajam contraído novas nupcias, nao


seráo recusados os funerais cristáos, contanto que o defunto
tenha guardado algum liame de fidelidade á Igreja e haja dado
algum sinal de arrependimento. Requer-se também que tais
exequias nao ocasionem escándalo para os fiéis — o que nao
acontecerá se os pastores souberem explicar em termos opor
tunos o genuino sentido dos funerais cristáos, os quais vém a
ser a invocagáo da misericordia de Deus e o testemunho de fé
da comunidade na ressurreicáo e na vida eterna.

i O documento aqui tem em mira conjuges Ilegítimos que, embora


contlnuem a coabltar, possam delxar de ter relacionamento sexual, ou
porque já Idosos ou por motivo de doenca; vlvem entáo como amigos
ou como irmao e Irma sob o mesmo teto. Também considera os conjugas
ilegítimos que, nSo tendo filhos para educar, resolvem delxar de coabltar
sob o mesmo teto. — A todos estes é facultada a freqüéncia aos sacra
mentos desde que ss evite o escándalo da comunldade que os vlr chegar-se
& vida sacramental.

— 323 —
16 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 236/1979

4) A Igreja aínda é mfie ? (n? 30-33)

Nao se deveria acusar de dureza a Igreja. O fato de nao


aceitar os divorciados de novo casados para a recepgáo dos
sacramentos nao seja considerado como punicáo, mas como
sinal de amor e de sinceridade para com aqueles que nao devem
ser sujeitos a ilusáo,... ilusáo que ocorreria se fossem trata
dos como se nao vivessem em desordem moral. Urna atitude
condescendente da Igreja implicaría outrossim que tal situagao
irregular passasse a ser eventualmente considerada lícita. A
Igreja faz votos para que esta sua firmeza (sem dúvida, dolo-
rosa) sirva a manter claro o caminho indicado pelo Evange-
lho, sirva também a sustentar irmáos vacilantes e a tornar
mais límpido o seu corajoso testemunho de amor a Cristo e
aos cristáos.

Parte 3: Outras situajóes matrimoniáis irregulares


e dtfíceis

Sao diversas as situagoes compreendidas sob tal titulo.


Frente as mesmas a Igreja deseja dizer a palavra firme do
Evangelho, embora esteja «pronta a reconhecer aspectos even
tualmente positivos que nelas se encontram» e encorajar os
interessados á conversáo.

1) Os que vivem unidos sem vínculo matrimonial (n? 35$)

Sao em número crescente aqueles que se juntam sob o


mesmo teto sem vínculo algum, principalmente ñas grandes
cidades. Ñas raízes de tal comportamento há motivos diver
sos: sim, razóes sociais, jurídicas (impossibilidade de legitimar
tal convivencia), culturáis (recusa do casamento como insti-
tuicáo, individualismo exagerado...). O fenómeno, muitas
vezes caracterizado como pobreza espiritual, superficialidade,
espirito de contestagáo, nao pode deixar indiferentes os pasto
res, dada a sua gravidade. Sem julgar o íntimo das conscién-
cias, os cristáos, com discrigáo e respeito, háo de procurar apro-
ximar-se de tais «casáis» a fim de ajudá-los a superar os seus
problemas e esclarecé-los a respeito dos ensinamentos da fé.
«É claro que, enquanto as pessoas assim unidas permanecerem
nessa situagao, nao poderáo receber os sacramentos».

— 324 —
PASTORAL DOS DIVORCIADOS 17

2) Os católicos casados apenas no foro civil (n» 37-41)

Tal situagáo nao é rara, embora inaceitável aos olhos da


Moral católica. Convém recorrer, também nesses casos, ao
diálogo para apurar os motivos de tal situagáo: estes seriam,
eventualmente, a perda da fé, a nao compreensáo do sentido
religioso do casamento, os ambientes leigos ou irreligiosos em
que tenham sido educados os interessados. É preciso, pois, que
os agentes da pastoral da Igreja exortem tais pessoas á coe-
renda com a graga e com o Batismo recebido. Usem de pru
dencia pastoral sempre que as pessoas em foco pedirem a regu-
larizagáo religiosa da sua situagáo: procurem saber os motivos
dessa situagáo e certifiquem-se de que há sincero arrependi-
mento e o propósito de entrarem em cordial comunháo com a
Igreja depois de adequada preparagáo catequética. Também
aos cónjuges católicos que só tenham contraído matrimonio ci
vil, nao será permitido receber os sacramentos da Penitencia
e da Eucaristía enquanto permanecerem nessa situagáo.

«Mais delicado é o caso em que urna pessoa católica casada


civilmente apenas e separada do 'cónjuge', mas ainda na expec
tativa de divorcio, vem pedir á Igreja o matrimonio religioso
com urna terceira pessoa canónicamente livre. Mesmo que
o (a) requerente esteja livre diante da Igreja (pois a celebragao
meramente civil nao satisfaz as exigencias canónicas) e, por
islo, conserve o seu direito a um matrimonio válido, nao se
pode deixar de levar em consideragáo o fato de que, celebrando
um casamento meramente civil, o (a) requerente exprimiu o
desejo de viver maritalmente com alguém; além do que, viveu
realmente, durante anos talvez, com esse alguém, chegando
eventualmente a ter filhos. A agáo pastoral da Igreja deve
proceder com grande equilibrio... principalmente porque a
Igreja que sempre defendeu a estabilidade da uniáo conju
gal nao pode arriscar-se a favorecer 'as experiencias conju
gáis' ou a abrir o caminho ao 'casamento'. Em conseqüéncia,
via de regra, nao se deverá conceder a celebragao do matri
monio religioso com terceira pessoa enquanto o casamento civil
nao tiver sido extinto por regular sentenga de divorcio, ficando
assim satisfeitas as partes interessadas. Em todo e qualquer
caso deste tipo, o sacerdote deverá informar o Ordinario do
lugar a respeito da situagáo das pessoas interessadas».

— 325 —
18 .PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 236/1979

3) As pessoas separadas (n» 42-45)

Compreende-se que a uniáo conjugal possa passar por fases


de desentendimento e de insuficiencia de doacáo conjugal, com
repercussóes negativas sobre o equilibrio matrimonial e a edu-
cagáo dos filhos. Por conseguinte, pode em certos casos tor-
nar-se legítima a separacáo, sempre como remedio extremo
adotado após longa reflexáo, seria ponderacáo e muitas ora-
góes. A comunidade católica deve sustentar os cónjuges sepa
rados, reconfortando-os na sua solidáo e no seu abatimento;
ajude-os a participar da vida da Igreja, para que, entre outras
coisas, esses cónjuges possam superar tnais fácilmente a ten-
tagáo de recorrer ao divorcio e contrair novas nupcias civis.
Para poder receber os sacramentos, tais pessoas devem obser
var as normas gerais da vida crista e, além disto, «manter
viva a atitude de perdoar própria do amor e estar sincera
mente dispostas a se questionar sobre a oportunidade ou nao
de retomar a vida conjugal».

4) Os divorciados que nao contrairam novas nupcias (n? 46-48)

O cónjuge que deseje manter-se fiel a Cristo e ao Evan-


gelho, deve opor-se á proposta de divorcio; «somente por gra-
vissimos motivos o aceitará, contanto que deixe claro que, para
o cónjuge católico, o divorcio equivale apenas a urna separagáo
e nao rompe o vínculo conjugal».1 O cónjuge que sofra o
divorcio, merece plena estima e apoio; pede-se-lhe, porém, que
se mantenha fiel ao vinculo matrimonial e á vida crista. Tal
fidelidade constituí um testemunho precioso, um exemplo para
os irmáos em análogas dificuldades e um titulo a maior soli-
citude por parte da Igreja.

O cónjuge que tenha pedido e obtido o divorcio, sem, po


rém, se casar de novo, deve ser ajudado de modo discreto e
atento, a fim de que possa eventualmente retomar a vida con
jugal anterior, superar a tentagáo de novas nupcias, e man
ter-se na sua vida crista. Poderá receber os sacramentos táo
somente se estiver sinceramente arrependido e procurar repa
rar concretamente o mal cometido. «Em particular, para que
possa receber o sacramento da reconciliacáo, a pessoa divor-

1 Cotnpreende-se que estas observa?Ses tém valor apenas para os


c6njuges que tenham contraído matrimonio religioso. O divorcio de quem
tenha realizado matrimonio meramente civil, é abordado no rr? 40.

— 326 —
PASTORAL DOS DIVORCIADOS 19

ciada (e nao casada de novo) deverá dizer ao sacerdote que


ela, embora tenha obtido o divorcio civil, se considera real
mente ligada diante de Deus pelo vinculo matrimonial e que
vive a sos por motivos moralmente válidos e, em particular,
pela inoportunidade ou mesmo impossibilidade de retomar a
convivencia conjugal».

Parte 4: O problema pastoral dos filhos (n* 49-55)

Os filhos de pais divorciados sao inocentes. Tém, pois, o


direito de crescer num contexto afetivo que nao só evite as
repercussSes negativas de situagóes irregulares ou difíceis dos
genitores, mas os prepare e ajude a enfrentá-las cristámente
desde que nao possam ser evitadas. Por isto, da parte dos
genitores devem receber conveniente educagáo humana e crista;
devem ser objeto, por parte da comunidade católica e de seu
sacerdote, de especial solicitude por ocasiáo dos sacramentos
(Batismo, Eucaristía, Crisma); o pedido de Batismo e Primeira
Comunháo, feito á Igreja pelos pais divorciados em favor de
seus filhos, pode tornar-se, para os próprios pais, ocasiáo de
luz e de graca.

Mesmo em caso de divorcio e de novo matrimonio, os geni


tores — ou, ao menos, um dos dois — devem garantir a ge-
nuína educagáo crista dos seus filhos; em circunstancias de
dúvidas ou de incertezas, será necessário insistir sobre o papel
dos padrinhos, aos quais toca um real e auténtico ministerio
catequético. Desde que haja o consentimento dos genitores, o
compromisso de catequese pode ser assumido, em casos parti
culares, até por um párente próximo ou por um memoro qua-
lificado da comunidade crista.

Se os pais que pedem o Batismo para seu filho, estáo casa


dos apenas no foro civil, o sacerdote deverá aproveitar a oca
siáo para exortá-los a regularizar a sua situacáo em coeréncia
com o sacramento da fé que pedem para seu filho; «o sacer
dote os convidará a legalizar, sempre que possivel, a sua posi-
eáo antes que procedam, com as necessárias garantías de edu-
cacáo crista, ao batízado de seu filho». O mesmo deverá ser
feito por ocasiáo dos pedidos de Crisma e de Primeira Comu
nháo, levando-se em conta que também os filhos podem ser
instrumentos do bem em favor de seus pais.

— 327 —
20 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 236/1979

ConclusSo

Renovar a pastoral matrimonial (n' 56-60)


As normas expostas inserem-se dentro do estatuto da pas
toral do matrimonio que a Igreja tenciona desenvolver, princi
palmente a fim de sustentar os casáis em crise e evitar, nos
limites do possivel, a ocorréncia de fracassos e de situacoes
irregulares. Torna-se absolutamente necessária urna adequada
pastoral pré-matrimonial a fim de que os jovens sejam edu
cados para urna auténtica visáo crista do amor, vivam com
responsabilidade e alegría o periodo de noivado, evitem o casa
mento precoce e aventureiro e celebrem conscientemente o
sacramento do matrimonio.

De modo especial, os cristáos sao chamados também ao


engajamento político, «dirigido a dialogar com os governantes
civis em todos os níveis, como também a colaborar com estes,
em vista de estensa e aprofundada acáo educadora, moral, so
cial e politica em favor da familia, antes e depois do casamento,
de modo a reduzir, tanto quanto possivel, as múltiplas razoes
de dificuldades, mal-estar e dissensóes entre os cónjuges».
Compreensáo, senso humanitario e caridade sejam dispen
sados aos casáis em crise, sem que isto implique traigao a ver-
dade. Diante de situacoes concretas especiáis, tenha-se era
vista a tarefa dos consultores familiares de inspiragao crista.
A Iereia tenciona proclamar incansavelmente o Eyangelho
mofconjugal, indissolúvel e fiel. Para tanto, ela confia
S
do

otan^Sde Deus receberam, dando o testemunho vivo da


fidelidade do Senhor Jesús & sua Igreja e ao mundo».

II. COMENTARIOS

Deste interessante documento, parece oportuno realcar os


seguintes pontos:

1) Os bispos da Italia apregoam a necessidade de se pro-


moverem coSos pastarais entre os fiéis católicos (sacerdo-
— 328 —
PASTORAL DOS DIVORCIADOS 21

tes agentes de pastoral, familiares...) e as pessoas que vivem


em situagáo conjugal irregular (indua ou nao o divorcio).
Tais contatos teráo em vista ajudar as pessoas afastadas a
nao se distanciarem, por completo, dos valores da fé ou, ate
mesmo, poderáo ser-lhes úteis para que reconsideren! a sua
situagáo irregular e, na medida do possível, a legitimjm ou
Ihe ponham fim.

Esses contatos pastorais, como se compreende, nao se


identificam com participagáo em atos ou festas meramente
sociais, nem significam aprovagáo da situagáo irregular, mas
visam a proporcionar, ao menos indiretamente, algum servigo
de ordem espiritual aos irmáos que precisam de sentir que
Cristo e a Igreja os acompanham com interesse pastoral em
seu drama de consciéncia.

Esta orientagáo vem a ser, de certo modo, algo de novo


entre as diretrizes pastorais da Igreja, que deste modo pro
cura ser Máe em todas as circunstancias e ate as ultimas
conseqüéncias.

2) Permanece a proibigáo de se ministrarem os sacra


mentos a quem viva irregularmente enquanto assim vivera.
Isto se compreende bem: urna situagáo conjugal irregular é
sempre um desrespeito ao plano de Deus; ao contrario, os
sacramentos supóem, da parte de quem os recebe, o propósito
de identificagáo crescente com o plano do Sennor.
Acontece, porém, que certas pessoas unidas ilegitima-
mente nao podem desfazer essa uniáo porque tem filhos peque-
nos a educar. Em tais casos, recomendem-se ao Senhor pela
oracáo, pela freqüéncia á S. Missa, pela educagao crista dos
filhos E confiem na Providencia Divina, que tem insonda-
veis recursos para salvar os homens, mesmo quando esgotadas
as vias oficiáis de salvagáo.
3) O documento distingue nítidamente entre cónjuges
que apenas sofrem o divorcio, e cónjuges que pedem e promo-
vem o seu divorcio (sem contrair novas nupcias civis). Incute a
uns e outros o fato de que permanecem casados aos olhos de
Deus e da Igreja (desde que tenham recebido legítimamente o
sacramento do matrimonio).
Em particular, quanto aqueles que nao pediram o divor
cio, mas o sofrem, toca-lhes respeito e apoio por parte da

— 329 —
22 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 236/1979

comtuiidade católica, desde que vivam dignamente a sua nova


situagáo civil. — No tocante aos que pedem e promovem o
seu divorcio, sem se casar de novo, nao há empecilho a que
recebam os sacramentos caso se arrependam de o ter feito e
guardem fidelidade ao vinculo conjugal ainda existente.

4) É sempre delicado o caso daquelas pessoas que, ten-


do-se casado civilmente apenas, desejam dissolver essa uniáo
meramente civil para contrair outra, sacramental ou na Igreja.
— A rigor, taias cristáos nao estáo casados aos olhos de Deus,
pois para os fiéis católicos só existe um tipo de casamento,
que é o sacramento do matrimonio legítimamente contraído.
Por conseguinte, tém direito a se casar pela primeira vez de
maneira legitima ou sacramental. Acontece, porém, que a
Igreja é cautelosa em tais casos, a fim de evitar mal-entendi
dos por parte das autoridades civis ou do público nao cató
lico: precisamente para que tais equívocos nao ocorram, a.
Igreja habitualmente só realiza o casamento religioso de tais
pessoas depois que estejam livres perante a lei civil ou depois
de obtido o divorcio (embora este como tal nao seja necessario
nem significativo aos olhos da Igreja). Dizemos:... habitual
mente, pois é certo que pode haver excegóes para tal norma..

5) Os filhos do país que vivam irregularmente, mcrecem


particular ateneáo pastoral, pois sao inocentes e se faz mister
evitar o mais possivel que sofram prejuizo pela infelicidade
dos pais.

Primeiramente, vém ao caso os filhos de pais que se divor-


ciaram ou estáo para se divorciar. É necessario que recebam.
dos genitores a educacáo católica e sejam levados a vida sacra
mental. Toca aos sacerdotes, aos agentes de pastoral e á comu-
nidade católica interessar-se especialmente por tais enancas,,
suprindo o que nao possam receber de seus pais, a fim de que
sejam seguramente encaminhados para urna reta conduta de
vida crista.

Quanto aos filhos nascidos de unides ilegitimas (casáis,


divorciados ou nao), há nao raro a tendencia a exclui-los dos
sacramentos (Batismo, Primeira Comunháo, Crisma...), por
causa do género de vida irregular dos genitores. Ora tal pro-
cedimento pune indevidamente criancas inocentes. Nao inte-
ressa diretamente, no caso, o género de vida dos pais, mas as
possibilidades que as criancas tenham de receber a educacáo-

— 330 —
PASTORAL DOS DIVORCIADOS __j»

católica exigida pela recepeáo dos sacramentos: pode ser que


ambos os genitores (ou, ao menos, um dos dois) se interes-
se(m), ele(s) mesmo(s), por tal dever; em caso contrario, com
pete aos sacerdotes e agentes de pastoral insistir junto aos
padrinhos para que assumam a tarefa da educacáo religiosa
dos aniñados; se nem isto for viável, poder-se-á pedir o con-
sentimento dos genitores para que um párente próximo ou
outra psssoa digna se encarregue da formagáo crista das crian-
cas- urna vez preenchida esta exigencia, nada se opóe a que
os filhos de pais ilegítimamente unidos recebam os sacramen
tos da iniciaeáo crista. Ao contrario, tudo leva a desejar que-
isto se realize.

Sao estas algumas ponderacóes sugeridas pela Dedaracáo.


da Conferencia Episcopal Italiana a respeito do divorcio e de
situacóes conjugáis irregulares. Poderá tal documento parecer
severo... Na verdade, melhor seria dizer que é um texto coe-
rente e, ao mesmo tempo, pastoral.
Coerente, porque reafirma em termos precisos e concretos.
a indissolubilidade do sacramento do matrimonio,... indissolu-
bilidade que a Igreja nao «criou», mas que encontra suas rai-
zes no próprio Evangelho. Vale a pena citar as palavras do
Apostólo: «Quanto aqueles que estáo casados, ordeno nao eu,
mas o Senhor: a mulher nao se separe do mando; se, porern,
se separar, nao se case de novo, ou reconcilie-se com o marido.
E o marido nao repudie a esposa!» (ICor 7,10). A Igreja pro
cura, pois, ser a porta-voz fiel da palavra do Senhor, cum-
prindo assim um dever que lhe é, por vezes, ingrato, mas que,
sem dúvida, vem a ser um servico á humamdade.
Pastoral Pois o documento em foco procura compreen-
der os cristáos que sofrem crises conjugáis, oferecendo-Jnes;
amparo e benevolencia, em vez de repudio ou desdem.
Possa, portante, tal atitude produzir os frutos desejados-
em prol da familia brasileira!

A propósito

PR 232/1979, pp. 168-175 (béncfio para unIBes Ilegitimas?)


PR 214/1977, pp. 429-449 (conseqüénclas da ¡mplantasSo do divor
cio no Brasil).
PR 215/1977. pp. 453-496 (regulamentacao do divorcio).
PR 156/1972. pp. 558-570 (ComunhSo para "casáis" n&o casados)-

— 331 —
Um livro questíonador:

"a questáo homossexual"


de Marc Orai9on

Em síntese: O llvro "A questáo homossexual" de Marc Oralson


apresenta o homossexuallsmo como anormalldade de que nSo tém culpa
os seus pacientes. Sendo geralmente de fundo psicogenlco, o auxilio que
se pode prestar aos homossexuals, é de ordem psicoterapia: toca ao
analista contribuir para que o seu cliente se flxe no homossexualismo ou
tente vlver heterossexualmente sem medo ou recelo de executar o que
Ihe parecer melhor. Nao há que orientar o homossexual, mas apenas ajuda-lo
a libertar-se de qualquer complexo de angustia que o deprima. Pols, na
verdade, o homossexuallsmo nlo deve ser tachado de antinatural, visto
que decorre das incllnacóes naturals e espontaneas do paciente.

A esta tese o presente artigo faz algumas observacSes:

£ louvável. slm reconhecer que os homossexuals merecem com-


preensio e auxilio da'parte da sociedade. Todavía nSo se pode dlzer que
a prátlca do homossexuallsmo seja algo de moralmente Indiferente; com
efelto o homossexuallsmo ó urna aberracSo fisiológica; contraria a cons-
tltulcfio natural do ser humano, de modo que quem o cultiva consciente
e voluntariamente nao pode delxar de se desfigurar moralmente, embora
nSo tenha culpa de ser homossexual. O homossexuallsmo pode ser di o
"natural" como a cegueira de nascenca ó natural ou é anterior á dell-
beracSo do homem; todavía vem a ser um síntoma de deformidade da
natureza, que nao pode ser tomado como padrfio da comportamento
humano.

A genulna ajuda que se deve prestar aos individuos homossexuals,


consistirá em procurar generosamente levá-los a sublimar a sua tendencia
em favor do trabalho. do esporte, da arte, do estudo... NSo desanimen
nem cedam a instintos cegos. Nao se pode dizer que a felicidad» m
adía no prazer sensual ou erótico; multo ao contrario, sem autodominio
e coIbicSo das suas tendencias passionals, nenhum ser humano (mesmo
os heterossexuais) encontré a verdadelra fellcidade.

Comentario: Marc Oraison, • 1914, médico que se fez


sacerdote, é muito conhecido por seus estudos sobre a psico
logía humana e a Moral. Compreende-se, pois, que tenha
publicado um livro sobre a difícil questáo homossexual, pro
curando abordá-la do ponto de vista psicológico, antropológico

— 332 —
«A QUESTAO HOMOSSEXUAL> 25

e cristáo K O autor diz repetidamente ter vinte anos de expe


riencia (cf. pp. 15. 22. 78...), durante os quais entrou em
contato com numerosos homossexuais (dos quais alguns casos
sao referidos no livro) 2. É na base desta experiencia que
Marc Oraison propóe urna conceituacáo original de homosse-
xualismo assim como um novo modo de se procurar resolver
o problema.

Dada a importancia da temática e da posieáo de Oraison,


vamos, a seguir, referir sumariamente o conteúdo do livro, a
fim de sugerir algumas reflexóes a respeito.

1. Que diz o livro ?

1 M Oraison analisa, antes do mais, o fato do homos-


sexuaíismo: afeta, diz ele, tres vezes mais os homens do que
as mulheres (p. 35), sendo que 7% da populagao masculina e
homossexual (p. 133). O fenómeno ocorreu em todos os tem-
pos, desde os da Grecia pré-cristá (p. 45).
O homossexual nao há de ser considerado como um
doente propriamente dito, sujeito a tratamento médico, mas,
sim, como um anormal (pp. 53s). As causas dessa anormali-
dado nao sao orgánicas (de ordem genética ou de ordem hor
monal), mas psicogenicas, isto é, tal anormalidade prende-se
á afetividade do paciente e ás influencias que tenha recebido.
"A tese pslcogénlca envolve toda a historia da pessoa na suajela-
cfio com as outras do seu meló desde o nasclmentoai até antes do
nasclmento, ou seja. a forma como é vivida na ImaginacSo pelos que
a esperam ou temem sua vinda ao mundo (p. 75).

Para corroborar sua tese de que o homossexualismo nao


se deriva do capital genético do paciente, mas da educagáo dos
seus afetos, Oraison cita o caso de urna familia em que nasce-
ram dois gémeos univitelinos, isto é, dotados do mesmo poten
cial genético inicial. Aos vinte e dois anos, um deles era homos
sexual e sofría por isto. O outro, nao; já amava fielmente
iA questSo homossexuai. TraducSo de José Koslnskl. Ed. Nova Fron-
telra, Rio de Janeiro 1977, 140x210 mm, 157 pp.
»"Em media estatlstlca, durante vinte anos recebl ou vi, cada se-
niana, ao menos seis ou sete pessoas com problemas homossexuais (en-
tenda-se: novas pessoas). Um quarto de mulheres, tres quartos de homens,
aproximadamente. As Idades eram multo variadas. VI pessoas de dezessete
anos e outras de oitenta. A malor proporcfio, entretanto, se sitúa entre
vinte e trlnta e cinco anos" (p. 15).

— 333 —
2ti <:PERGUNTE E RESPONDEREMOS^ 236/J979

urna jovem, que mais tarde se tornou sua esposa. Desde o


nascimento, porém, por motivos de ordem prática, tinham sido
separados um do outro: um fora educado pelos pais; o outro
pelos avós, só voltando a viver juntos, com os pais, por volta
dos doze aos treze anos. Dai concluí Oraison que a causa da
homossexualidade, no caso (como também de modo geral), nao
era genética, mas afetiva ou devida ao tipo de educagáo rece-
bida pelo paciente.

Verdade é que, em uma ou outra passagem do seu livro,


o autor nao deixa de reconhecer uma certa influencia de fato-
res orgánicos na génese do homossexualismo l.

Em conseqüéncia, afirma o autor:

"O problema do homossexualismo é totalmente comparável ao de


multas outras diffculdades de vlver: escrúpulos, ansiedades, InlblcSes,
obsessCes, timidez, etc." (p. 74).

2. Estes dizeres implicam que as tendencias homosse-


xuais sao, sim, uma anormalidade no plano psíquico ou físico
do ser humano, mas nao incluem necessariamente a nogáo de
pecado ou de anormalidade moral. Sao palavras de Oraison:

"Se aparece um recém-nasc'do sem cerebro (anencéfalo) ou cujas


mfios estejam dlretamente flxadas nos ombros (focometla). é claro e
Indiscutlvel que Isso nSo é normal, no sentido exato da relapso com a leí
científica do desenvolvlmento do ovo e do embrISo... A no<;So do
anormal Impde-se nesse caso. Mas ela nSo comporta de forma elguma
conotacáo moral. Alias, é o que há de mais desconcertante: o fato, na
maloria das vezes, é totalmente Independente da Intenclonalidade de quem
quer que seja, e nio há culpado. Se é efetlvamente um mal no sentido
ortológico (alguma colsa que falta áquilo que deverla ser), nSo se trata
de modo algum de um mal moral (pecado ou 'punlgSo de pecado').

O campo de conheclmento aberto por Freud nos levou a uma abor-


dagem análoga e de caráter científico no que toca ao conhecimento do
crescimento específicamente humanó da vida psíquica, afetiva e sexual:
virtualidade relacional, obscuramente Inscrita, alias, ñas estruturas gené
ticas, que se desenvolve segundo suas próprlas lels" (p. 54s).

3. É de se notar ainda algo de importante: Marc Orai


son nao aceita os conceitos clássicos de natureza e lei natural.
A natureza nao seria um padráo ao qual o ser humano se
deva, consciente e voluntariamente, configurar ou adaptar.
Natural, para um espirito científico, é o que se produz por si

* "Permanece de pé o fato de que os fatores psicológicos sao c,uase


sempre multo mais importantes que os fatores orgánicos" (p. 78).

— 334 —
.;A QUESTAO HOMOSSEXUAL> 27

ou por suas próprias virtualidades, sem intervengáo do homem.


Por conseguinte, o homossexualismo, em muitos casos, é natu
ral, pois é espontaneo: «Aparece como natural — neste sen
tido — que a especie humana se comporte, em grande parte,
de forma literalmente aberrante em relagáo ao que se observa»
(P- 48).

E, para explicar melhor a sua posicáo, o autor nota que


no ser humano as fungóes biológicas estáo nao raro associadas
ao prazer. Em nome deste, o homem pode empreender ativi-
dades que contrariem a sua índole fisiológica ou biológica, mas
que nem por isto deixam de ser naturais; na verdade, essas
atividades se derivam de um livre designio do individuo que
quer usufruir do prazer acarretado por determinada prática;
esta pode parecer antinatural, mas, sendo espontáneamente
sugerida pelos instintos, é natural. Sao palavras do autor:

"A atlvldade homossexual ó aberrante com relacfio ao significado


fisiológico da funcfio sexual... Mas permanece outra dlmensáo: a da
relagSo e do significado do prazer. N8o está provado que numa relacSo
aberrante do ponto de vista fisiológico jamáis possa haver urna troca afetiva
relacional que seja verdadeira nesse nivel" (p. 50).

Dai deduz o autor:

"Decididamente, nSo crelo que se possa avangar na reflexSo se nos


prende rmos as categorías de nalural ou antinatural. Serla desconhecer de
salda a complexldade conflitual e especifica da natureza humana" (p. 51).

4. Assim caracterizado o fato, Marc Oraison julga que


a única maneira de ajudar a pessoa homossexual é a via psico-
terápica. Por mais paradoxal que pareca, tal via nao é um
tratamento médico (ou urna terapia no sentido etimológico),
mas consiste em que o paciente procure espontáneamente um
analista; este o ouvirá prolongadamente, nao como quem sabe
o quer orientar o seu cliente, mas como quem o quer ajudar
a se libertar de medo, de receios ou de recalques arcaicos. Se
o paciente chegar á conclusáo de que deve procurar tornar-se
heterossexual, o analista só o pederá apoiar; se, ao contrario,
optar pelo homossexualismo sem temor ou tabú, o técnico tam-
bém o incentivará... Nao há conselhos a dar ao individuo
homossexual. Deve-se evitar enquadrá-lo dentro de «urna
explicacáo simples, definitiva e categórica; esta atitude impli
caría o risco de dar a ilusáo de um saber bem estabelecido: o
clínico faria as vezes de alguém que tem poder sobre os outros
e que gosta de exercé-lo, ignorando a singularidade e a liber-
dade das pessoas» (cf. p. 74).

— 335 —
28 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 236/1979

De modo especial o autor rejeita determinados tipos de


aconselhamcnto aos homossexuais: o de freqüentar urna pros
tituta «bem escolhida» (p. 80), o de se encaminhar para o
casamento (p. 80), como também o de procurar viver com
um parceiro homossexual (para Oraison, este tipo de uniáo é
efémero ou fadado a dissolver-se; cf. p. 70) \ O que ao ana
lista importa, é táo somente ajudar o cliente a viver sem medo
nem angustia a sua opsáo, qualquer que ela seja (homosse
xual ou heterossexual).

5. Como dito, tais premissas levam Marc Oraison a afir


mar que o homossexualismo nao é um mal moral. Com efeito,
declara o autor: o criterio da moralidade é a capacidade de
relacáo intersubjetiva (p. 143). Com outras palavras: um ato
nao é moralmente bom ou mau por ser conforme ou contrario
á natureza, mas, sim, pelo fato de ser ou nao a expressáo do
amor:

"O prazer trocado e partllhado pode ser urna expressflo de amor


na medida exatamente em que ele é vivido numa relacSo Intersubjetlva
bem sucedida.

O prazer sexual pode ser lugar do amor, no verdadeiro significado


desta palavra...

Urna pessoa homossexual so pode ser atraída por esse prazer com
alguém do mesmo sexo que ela. É, |á vimos, um Inacabamento da evo-
lucSo afetlva, urna Imperfelcáo... Mas ela nSo pode mudar nada disso,
pois a situacSo surglu malgrado ela mesma. Nao ó, portento, Impossfvei
que nessa sltuacSo, que é a sua, ela viva urna relacáo erótica com um
parceiro Igualmente homossexual que seja, ao nivel que Ihe é acesslvel,
a expressSo de urna verdadelra relacáo intersubjetlva. Nesse momento, é
um pecado?" (p. 144).

O autor, a seguir, se define pelo Nálo: a procura de um


parceiro homossexual nao seria pecado.

Por conseguinte, Marc Oraison pede á sociedade que nao


rotule os homossexuais de viciados nem de doentes, mas que
lhes permita viver sem máscara; caso os haja, aceite os pares
homossexuais (embora sejam raros e geralmente efémeros),
reconheca o direito que toca aos homossexuais de procurar
companheiros do mesmo sexo para formar pares. Eis os dize-
res de Marc Oraison:

1 "Pelo fato mesmo de que a estrutura homossexual propriamente


dita (pessoas que experimentan! atracOes homossexuais) é condicionada
pelo narcisismo e a obsessSo predominante do dupto, o par homossexual
durável, positivamente expandido, só raramente pode existir" (p. 70).

— 336 —
«A QUESTAO HOMOSSEXUAL» 29

"Mlnha experiencia clínica levo-me a pensar que um par homossexual


bem sucedido, no sentido do amor verdadeiro, é raro, sobretudo sob o
aspecto da duracfio prolongada. Raro, mas nSo impossfvel. Pode acon
tecer de fato que se estabeleca verdadeira amlzade que é para os dols
a única possibilldade de se expandir ou escapar á angustia da Intolerável
solldSo. Nessa sltuacfio, crlstámenle talando, é que podemos evidente
mente nos perguntar onde está o pecado, enquanto atitude moral pessoal.
A sltuacio nSo é em nada assimllável á de um casamento, termo que
de (ato implica, por si, a diferenca sexual e a dimensSo da fecundidade
genital. Mas ó urna situacSo real, que os interessados vivem com a
melhor vontade que Ihes é posslvel, e que eles pedem que nSo seja rejei-
tada ou condenada pelo contexto social. Com toda a objetividade, esse
pedido parece legitimo. Contanto que seja, para eles, o melhor que
possam pretender. Quantas vezes ouvi pessoas desejarem poder conseguir
tal situac&o, fatigadas, desencorajadas, amargamente decepcionadas do
ponto de vista moral com os encontros furtivos ou passageiros, onde a
procura de urna relacSo intersubjetiva verdadeira nao pode ter éxito 1"
(p. 145).

Para que os homossexuais possam ser aceitos pela socie


dade, preconiza Oraison que eles nao se mostrem agressivos
em relagáo a esta. As vezes, sim, o desejo de se autoafirma-
rem e imporem á sociedade leva os individuos homossexuais
a atitudes provocadoras frente a esta; daí um distanciamento
crescente entre a sociedade e tais pessoas. Que estas, portante,
nao cedam á agressividade!

"Parece-me totalmente necessárlo promover urna mudenca profunda


na mentalldade geral. As pessoas que tém tendencias homossexuais nao
devem mais ser consideradas nem como taradas nem como excluidas da
comunidade humana. Mas isto so será posslvel se algumas dessas pessoas
nio provocarem, por sua atitude, tal reacfio de exclusáo ou rejelcSo. Os
excessos agressivos oferecem o risco de desviar a melhor boa vontade"
(p. 116).

6. Ñas últimas páginas de seu livro, o autor analisa a


figura de Sao Paulo e chega a admitir tenha sofrido de ten
dencias homossexuais (como, alias, tambérn Davi e Jónatas,
segundo Oraison):

"NSo está absolutamente excluido que o sofrlmento pessoal de Paulo,


lugar de seu encontró com Cristo, estlvesse diretamente ligado á questao
homossexual. A mesma hipótese nSo vlrla á Idéla — e nao é cortamente
por acaso — para Jofio, Pedro, Lucas, Mateus, Tlago" (p. 154).

7. Tal é, em sintese, o pensamento de Marc Oraison.


Como se vé, o autor procura considerar o homossexualismo de
modo a levantar os ánimos de quem sofre deste mal. Afirma
que os homossexuais nao sao doentes. Mais: isenta de culpa
moral as pessoas assim atribuladas e pede aos demais homens

— 337 —
30 «cPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 236/1979

nao as segreguem nem fustiguen! >, mas, ao contrario, as acei-


tem como sao e lhes reconhecam o direito de manifestar suas
tendencias e viver segundo estas. Haveria valores profundos
em certos tipos de relacionamento homossexual, a ponto de se
poder incentivar alguém a constituir com outrem um par
homossexual, desde que o faga sem n.sdo nem angustia.

Procuremos agora tecer algumas consideragóes sobre tal


tese.

2. Urna reflexao serena

Proporemos cinco pontos á consideragáo do leitor:

2.1. Remojóo de falsas concepjóes

Nao há dúvida, Marc Oraison merece aplausos na medida


em que procura mostrar que o homossexualismo nao é sempre
decorrente de paixáo desregrada voluntariamente alimentada;
muitas vezes, sim, é algo que se encontra em individuos infeli-
zes que nada fizeram para tornar-se homóssexuais, mas, em
certa fase da vida, descobriram ser tais. Estas pessoas geral-
mente sofrem por se reconhecerem assim, e querem livrar-se
da inclinaqáo homossexual. O scu sofrimento é aumentado
pelo fato de que a sociedadc costuma té-Ios em dcsprezo como
se se houvessem voluntariamente pervertido. Marc Oraison
tende, através do seu livro, a minorar a angustia desses irmáos,
pondo em relevo o fato de que muitos carregam urna anorma-
lidade que, em grande parte, nao é moral, mas corresponde
apenas a um defeito psicológico inculpado.

É necessário, sim, nao rotular globalmente os individuos


homóssexuais, mas ajudá-los a encontrar o seu oaminho certo
nesta vida. O individuo homossexual necessita, muitas vezes,
de quem o compreenda o lhe preste auxilio para que se possa
soerguer.

Eis, porém, que esta atitude benigna ou simpática de Marc


Oraison merece algumas observagóes, como se verá abaixo.

1 "Fala-se, por vezes, de segregacáo ou de racismo sexual. Nos vamos


ver que nSo se trata de um falso problema e que ó altamente necessário
denunclá-lo o tentar reduzl-lo; as pessoas que tém tendencias homossexuals.
slo seres humanos que valem tanto e sSo t3o respeitávels como as
demais" (p. 101).

— 338 —
«A QUESTAO HOMOSSEXUAL» 31

2.2. O cenceito de natureza

Marc Oraison julga que o homossexualismo como tal nao


pode ser julgado do ponto de vista moral; é simplesmente uma
anormalidade de ordem física ou psíquica. Por conseguinte, a
prática do homossexualismo como tal nao seria pecaminosa.
E por qué?

— Porque quem afirma que é pecaminosa, supóe haja


uma natureza humana feita por Deus para a heterossexuali-
dade; em conseqüéncia, as pessoas que contradigam á heteros-
sexualidade, violam a natureza, pela qual Deus se revela aos
homens; pecam, portante, ofendendo a lei de Deus manifestada
pela lei da natureza. — Ora bem, diz Oraison, nao existe a
natureza humana como manifestacáo da vontade de Deus. A
natureza humana está sujeita á vontade do homem livre. É
este quem dita as leis a sua natureza.

Diante deste raciocinio, lembraremos o seguinte:

É impossivel negar a natureza humana como um modelo


dotado de leis naturais, dentro de cujos termos o homem encon-
tra (de maneira exclusiva) a sua realizacáo. O ser humano
nao se improvisa. Com efeito,

no plano biológico, o homem descobre seu potencial fí


sico, com as respectivas exigencias e só se realiza físicamente
caso se submeta as leis da natureza (que lhe ordenam respi
rar, comer, beber, repousar-se, fazer exercícios físicos, traba-
lhar...). É desarrazoado violar as leis da respiracáo ou da
alimentagáo, em nome da liberdade de arbitrio;

— no plano da inteligencia c da vontade, a grandeza do


homem consiste em desdobrar lucidamente o potencial da sua
natureza, auscultando-o e levando-o as últimas expressóes.
Ora a natureza humana é sexuada física e psíquicamente; a
configuracáo física do sexo masculino é voltada para o sexo
diferente (feminino), e vice-versa. O próprio Marc Oraison o
reconhece; por isto diz ser o homossexualismo uma anormali
dade.

Se algum individuo descobre em si tendencias homosse-


xuais, descobre uma deficiencia sua física ou psíquica, como é
deficiencia a timidez, a inibicáo, a obsessáo, a agressividade

— 339 —
32 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 236/1979

despropositada, etc. A existencia de tal tendencia nao consti


tuí, por si, um pecado... Este porém, passa a existir desde
que a pessoa consciente e voluntariamente se entregue a algum
ato horaossexual... Dizemos: ... consciente e voluntaria
mente, porque o pecado só ocorre na proporgáo em que seja
um ato humano. É difícil, pois, julgar as consciéncias; pode
haver atos de homossexualismo cuja culpabilidade seja muito
atenuada ou quigá (dadas as condicóes em que sao cometidos)
nula.

Dito isto, reconhecamos, com M. Oraison e alguns dentis


tas, que tudo o que é espontáneo, pode ser dito natural. Assim
o homossaxualismo é natural se é tendencia congénita. É natu
ral, porém, como a cegueira congénita é natural, ou como a
falta de bragos em bebés recém-nascidos é natural. A natu-
reza tem também suas falhas, suas taras, suas deficiencias...;
estas sao naturais, mas nao sao padráo ou referencial para se
configurar o ser humano. Assim também o homossexualismo
tido como natural é urna aberragáo da natureza, que nao pode
ser equiparada ao heterossexualismo.

2.3. E a nojáo de liberdade?

Ainda a respeito da liberdade, observemos o seguinteí

A liberdade é urna faculdade que o homem possui para


que ele chegue á sua plena realizagáo nao como um autómato
ou urna planta, mas como criatura consciente que estuda os
seus potenciáis, e resolve encaminhar-se livremente para a sua
consumagáo. O auténtico uso da liberdade nao consiste em
«fazer qualquer coisa a partir de qualquer coisa», mas em
atender 'ás exigencias que cada criatura traz gravadas em sua
própria natureza.

Tomemos como exemplos urna gilete e um abridor de


latas. Cada qual destes instrumentos tem sua natureza dotada
de leis próprias, concebidas por seu respectivo fabricante. Com
efeito, a gilete foi feita para cortar a barba; em conseqüéncia,
ela impóe suas exigencias a quem a queira usar, nao podendo
ser utilizada de qualquer modo para qualquer finalidade. O
abridor de lata também tem sua estrutura própria concebida
pelo fabricante para determinada finalidade; o homem ciue
queira fazer uso positivo ou construtivo de tais instrumentos,
terá que submeter-se as «leis naturais» de um e outro; nada

— 340 —
«A QUESTAO HOMOSSEXUAL» 33

lucrará se, em nome da liberdade, aplicar o abridor ao corte


da barba e a gilete a urna lata de sardinhas. Fazendo isto, o
homem revelará ser livre, sim, mas nao se realizará melhor
(como nao se realiza o homem que, em nome da sua liberdade
ou para nao fazer como todos fazem, se precipita do décimo
andar de um edificio ao solo).

Assim é a natureza humana; tem suas leis naturais, embe


bidas em sua própria estrutura ou morfología. A liberdade
consiste em seguir consciente e voluntariamente essas leis me
diante as quais o ser humano se torna mais pessoa, mais
aberto ao transcendental. Entre essas leis, está a da heteros-
sexualidade impregnada no próprio físico humano.

Se alguém experimenta tendencias homossexuais, isto se


dá por anomalía da natureza, anomalía que nao pode ser iden
tificada com a normalidade.

2.4. Como a¡udar o homossexual?

1. M. Oraison, como psicanalista, julga que a terapia


aplicada aos homossexuais nao os deve orientar nem induzir
a determinado comportamento.

Aceitamos que a psicanálise nao queira ser diretiva. To-


davia dizemos que, se assim é, a psicanálise nao basta para
ajudar um paciente homossexual. Com efeito, nao se pode
dizer que a felicidade do individuo homossexual consista em
viver homossexualmente, caso ele o queira (mudando periódi
camente de parceiro, visto que os pares homossexuais sao íns-
táveis).

A felicidade nao pode ser avallada por prazeres eróticos


ou sensuais; ela, as vezes, supóe a renuncia a determinados
prazeres da carne, para que a pessoa possa usufruir de valo
res superiores ou espirituais, encontrando nestes a sua verda-
doira felicidade.

Por isto a genuína ajuda que se possa prestar a urna pes


soa homossexual, consistirá em procurar demové-la das pra-
ticas anormais e oferecer-lhe a ocasiáo de sublimar suas ten
dencias no trabalho, no esporte, na música, na poesía, na pin
tura, etc. O amigo do individuo homossexual que, com toda a

— 341 —
34 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS? 236/1979

brandura e paciencia, tentar ajudá-lo a realizar tal sublimacáo,


comunicando-lhe coragem para recomegar constantemente sem
desanimar, prestará o melhor servido a seu irmáo.

Os resultados desse aconselhamento sao variáveis. Há


individuos homossexuais que, convictos de que a prática hornos-
sexual é aberrante, se esforcam por evitá-la e conseguem efei-
tos estupendos. Outros há que nao conseguem convencer-se do
mesmo modo, porque «bombardeados» por teorías provocado
ras; entregam-se entáo ao homossexualismo de diversas ma-
neiras e nunca sao felizes. É utópico dizer-se que, no dia em
que a sociedade os reconhecer como representantes de um «ter-
ceiro sexo», seráo felizes e realizados.

Dir-se-á, porém: segundo tais concepcóes, o homossexual é


obrigado ao celibato! — Reconhecemos que sim. O celi
bato, para certas pessoas, é penoso, ao passo que, para outras,
nao... Isto depende da maneira como cada qual o considera:
se alguém encara o celibato como desgraca e condenacáo, cer-
tamente sentir-se-á infeliz na vida una; se, porém, assume o
celibato decorrente do homosscxualismo como um componente
do seu quadro de vida (como assume a sua patria, a sua nado-
nalidade, a sua familia...), saberá encontrar na vida celiba-
tária a sua realizacáo... até mesmo grandiosa. O que difi
culta ao homossexual encarar o celibato deste modo, é o am
biente no qual vive,... ambiente em que tudo incita á vida
sexual, como se nao houvesse felicidade sem a prática corpórea
do sexo. Na verdade, a sexualidade faz parte integrante da
personalidade de cada ser humano; todavía ela nao se limita
as funcóes fisiológicas; ela se realiza também em todas as
expressoes culturáis do individuo. Em suma, o problema do
homossexualismo está muito ligado ao psíquico do respectivo
sujeito; é agravado ou atenuado de acordó com a manoira como
cada qual o considera.

2.5. Alusóes o Biblia

Por duas vezes procura Marc Oraison possiveis testemu-


nhas de práticas homossexuais entre personagens bíblicos. — A
propósito faremos duas observares:

1) Nem todos os personagens bíblicos sao apresentados


pela Escritura como santos ou como modelos a ser imitados.
Pode-se mesmo dizer que a Biblia refere a historia da miseria

— 342 —
<A QUESTAO HOMOSSEXUAL> 35

do homem, para a qual se inclina a misericordia de Deus. Por


isto ninguém se surpreende, ao encontrar na Biblia narragóes
de realismo pecaminoso.

2) Com isto nao tencionamos reconhecer que Davi e Jó-


natas (1 e 2 Sm) ou o Apostólo Sao Paulo tenham praticado
o homossexualismo. Entre Davi e Jónatas sabe-se que houve
profunda amizade; gratuito, porém, seria dizer que existiram
também relagóes sexuais (ou será que toda amizade incluí
necessariamente prática do sexo?). Quanto a Sao Paulo, justi-
ficava o celibato ou a vida una pela consciéncia de que o Eterno
se fez presente aos homens no tempo e, por isto, o cristáo tem
o máximo interesse em lhe estar todo presente, sem divisáo
nem compromissos de ordem temporal; cf. ICor 7,25-35. Donde
se vé que somente um espirito preconcebido e alheio á men-
sagem bíblica poderia levar a serio as insinuagóes de Marc
Oraison.

3. Em síntese

Concluindo nossas reflexóes, julgamos poder resumi-las


nestes termos:

1) As tendencias modernas a justificar e legitimar as


práticas homossexuais, oficializando-as ou legalizando-as, vém
a ser a confirmagáo de evidente aberragáo ou o nivelamento
do normal e do anormal — o que nao pode trazer felicidade
nem aos individuos nem á sociedade como tal. Tais tenden
cias, concebidas no intuito de aliviar a sorte dos homossexuais
na sociedade, só contribuem para agravar o problema, pois o
equacionam erradamente e iludem a pessoa homossexual no
sentido de lhc dar a crer que encontrará bem-estar na con-
cessáo aos instintos cegos ou passionais (ilusáo esta que a pró-
pria experiencia dos homossexuais dissipa).

2) Importa acentuar a heterossexualidade como sendo o


paradigma normal do ser humano e, por isto, ajudar os homos
sexuais a procurarem nao no sexo, mas em outros valores, a
sua plena realizagáo ou consumagáo.

3) A contribuicáo que os estudos modernos trouxeram


ao enfoque do homossexualismo, traduzir-se-á na maneira de
tratar os homossexuais: nao sao criminosos, mas irmáos, que
merecem auténtica amizade fraterna e compreensáo benévola.

— 343 —
36 ^PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 230/1979

A paciencia generosa e amiga consegue auténticos portentos


no plano moral.

4) Um dos fatores que concorrem para dificultar a abor-


dagem do homossexualismo em nossos dias, é a concepcáo de
que só há felicidade onde se fazem concessóes aos instintos.
Toda tentativa de controlar as paixóes ou as tendencias cegas
ou espontáneas do organismo é indevidamente tida como muti-
lagáo, «castragáo» e penhor de infelicidade ou desgrasa. Ora
isto é falso e induz a decepgóes. Nao há verdadeira alegría
sem autodisciplina e autodominio ou mesmo sem espirito e
prática de renuncia.

5) As concepgóes atrás expostas nao implicam que o ser


humano seja reduzido a «coisa» regida por leis biológicas cegas.
Nao ignoramos a inteligencia e a liberdade do homem, que
principalmente a filosofía personalista exalta; mas julgamos
que a grandeza do ser humano nao consiste em improvisar-se
ou em violar as leis da natureza humana; ela se realiza, antes,
na ausculta e na execucáo do modelo que é comum a todos
os homens e que está impregnado na natureza de cada qual.
Ninguém é isento de obstáculos na execucáo desse modelo; os
que nao sofrem de alguma deficiencia, padecem de outro pro
blema; mesmo os que mais sadios e aquinho?^ :::-ccem, tem
ocasiáo de lutar contra dificuldades para podercm tornar-se
grandes. Quem nao luta, mas encontra os «frutos» prontos,
nao se desabrocha nem se torna feliz.

Estas sao as ponderagóes que nos ocorrem a propósito do


momentoso livro de Marc Oraison e das cruciantes questóes
langadas pelo homossexualismo. Seja o problema abordado
com os sentimentos de fraternidade e compreensáo inspirados
pelo Evangelho, mas sem que se diga que a anormalidade pode
ser padráo de vida e penhor de felicidade para o irmáo que
amamos!

A propósito

MARGEL. ECK, Sodomía. París 1966.

OVERNIG E OUTROS, Homosexuallté. París 1967.


S. CONGREGACAO PARA A DOUTRINA DA PÉ. DeclaracSo sobre
alguna pontos de Ética Sexual. Roma 1975.

PR 99/1968, pp. 118-127.

PR 103/1968, pp. 301-311.

— 344 —
Qual a mensagem de

"universo em desencanto" ?

Em sintese: "Universo em desencanto" é obra de origem medlúnlca


ou espirita, que pretende narrar ao leltor as origens do planeta Térra, as
etapas de sua deformacSo ou degenerescencia e propor o remedio para
os males presentes. A solucfio para estes consistiría em dar atencáo ás
mensagens do Racional Superior expressas pela obra "Universo em De
sencanto" e pela Cultura Racional.

O médium e distribuidor dos dez volumes de "Universo em Desen


canto" ó o Sr. Manoel Jacintho Coelho, que tem Gráfica em Nova Iguacu
e se dedica a ampia propaganda dos seus escritos.

A propósito de "Universo em Desencanto" observamos tudo o que


se objeta ao espiritismo. As pretensas comunlcacdes do Além sSo hoje expli
cadas pela ciencia psicológica e parapsicología como projecdes do
subconsciente e do Inconsciente do médium; este nfio recebe suas men
sagens do Além, mas apenas transmite, de maneira llvre, os conhecimentos
e as imagens que ele traz em si e que captou através dos seus sentidos
no decorrer mesmo desta vida terrestre. Donde se ve que nSo se podem
ctasslficar como revelacdes as descríeles contidas na obra "Universo em
Desencanto".

Comentario: Muitos sao os que, movidos pela grande


publicidade da obra, perguntam qual a origem e a mensagem
de «Universo em Desencanto». Televisáo, cartazes e folhas
volantes difundem os grandes méritos de tal escrito, de modo
a provocar legítima curiosidade do público. Vejamos, pois, em
poucas linhas o que seja.

1. A obra «Universo em Desencanto»

O autor é o Sr. Manoel Jacintho Coelho, que possui urna


Gráfica em Nova Iguacu. Diz ter recebido comunicac5es de
um espirito superior ou da esfera Racional a respeito da ori
gem do planeta Térra e dos meios de prover a melhores con-
digóes de vida neste mundo. Tais comunicacóes foram consig
nadas por escrito na obra de dez volumes intitulada «Universo
em Desencanto».

O médium Sr. Manoel Jacintho Coelho afirma que o globo


terrestre se deriva de um mundo racional superior; todavia

— 345 —
38 .PEROUNTE E RESPONDEREMOS.» 236/1979

sofreu deformacóes e a degeneracáo da natureza. Ultima-


mente a situagáo na Térra piorou enormemente, pois em 1935
o pensamento (que era até entáo fator de equilibrio) parou.
Até 1935 havia respeito a tudo e a todos e amor ao próximo.
Eis, porém, que, terminada a fase do pensamento, o mundo se
acha atualmente em convulsáo; impera a violencia, que vem
assombrando e apavorando cada vez mais todos os homens.
É preciso que justamente nestes nossos dias o ser humano ter
restre se volte para a cultura de outra esfera ou de outra pla
nicie, isto é, para a Cultura Racional ou para o Racional Supe
rior. Só acabaremos com a violencia, se desenvolvermos o
raciocinio, entrando na Fase Racional, que é «o natural da
natureza. Terminou a fase do pensamento e estamos na fase
do raciocinio, a FASE RACIONAL» (extraído de folha volante
de propaganda).

Em sintese, Manoel Jacintho Coelho entende a evolugáo


do nosso planeta nos seguintes termos:
"O principio fol de monstros,

De monstros para selvagens.

De selvagens para bicho racional.

De bicho racional para animal racional.

De animal racional para ser humano.

De ser humano para aparelho racional.

De aparelho racional para racional.

De racional passam para o grau de supremacía racional.

E do grau de supremacía racional

Passam para o racional puro, limpo e perfeito

No seu verdadeiro mundo de origem".

(extraído de "Jornal Racional" ano II, marco 1979,


n? 21, 4» capa):

É difícil compreender o que cada qual destas etapas sig


nifique e como cada urna se diferencia das outras... A ver-
bosidade é a característica de «Universo em Desencanto».

O terceiro milenio doverá ser precisamente a época da


Cultura Racional; devemos entrar conscientemente através
dos seus pórticos (dever este que é assinalado pelo símbolo
típico da capa dos volumes de «Universo em Desencanto»).
A fim de ajudar os homens a dar o passo de entrada no ter-

— 34G —
«UNIVERSO EM DESENCANTO» 39

ceiro milenio, os habitantes de outros planetas tém vindo a


este mundo em discos voadores, procurando transmitir-nos o
conhecimento da Cultura Racional. Os chamados «discos voa
dores» sao corpos de Energía Racional; nos somos de outró
campo de energia, ou seja, do elétrico e magnético; devenios,
pois, ligar-nos á energia deles, que é a Racional, para poder
tomar conhecimento da cultura deles e entender a sua lingua-
gem. «A Cultura Racional desvenda todos os fenómenos, todos
os misterios e todos os enigmas, por ser cultura de um mundo
superior ao nosso — o Mundo Racional» (extraído de folha
volante de propaganda).

Ainda a propósito dos discos voadores, diz Manoel Ja-


cintho Coelho o seguinte:

Nao sao discos voadores, mas sao habitantes do Racional


Superior, que, para poder ser compreendidos por nos, tomam
a íorma de discos voadores, apresentando-se numa infinitude
de formas, tamanhos e cores. Assim desejam chamar melhor
a nossa atengáo e convencer-nos de que existe outro mundo
habitado, que é o mundo Racional: desta maneira eles nos inci-
tam a ler o Livro do Mundo Racional, que é o livro da Cultura
Racional: «Universo em Desencanto». Quem leia esta obra,
está habilitado a voltar ao seu mundo de origem.

As folhas publicitarias da Cultura Racional referem curas


e beneficios físicos e psíquicos obtidos por pessoas que leram
a obra em pauta ou procuraram seguir os seus ensinamentos.
Eis um caso-espécimen:

"Eu era viciado em tóxicos, só vivía para o vicio, tentel multas vezes
parar, mas nada conseguía me livrar das garras monstruosas deste polvo
magnético, até que conheci a Obra Recuperadora de toda a humanldade
e com pouquíssimo tempo de leltura ful curado completamente. Sou outra
pessoa, multo diferente do jovem desequilibrado em último grau que era.
Minha familia sabia que eu era viciado e plorava meu estado, devido ás
brlgas constantes. Já chegava em casa brlgando com todos; derrubava
tudo, cafa num desespero tal que pedia até a morte. Felizmente, o pesa-
delo passou gragas ao RACIONAL SUPERIOR, que me socorreu a tempo.

Quando meu amigo Armando Paladlnl me falou sobre o llvro UNIVERSO


EM DESENCANTO, fique) espantado, adiando ¡mpossível que um llvro ti-
vesse todas as qualidades por ele mencionadas, tais como transmitir urna
Energía poderosísima, fazer-se acompanhar por um Corpo de Energía
destinado a resolver todos os casos da vida do leltor, o Emlssárlo do
Dono do Llvro e mals aínda, as revelacdes inéditas sobre a Verdadeira
Origem da Humanldade, dltada por um Ser extraterreno aquí na Térra.

Curioso, mande! buscar o prlmelro e o segundo volumes da Obra e


logo passei a ler, mas nao entendia nada, por estar acostumado com a

— 347 —
40 ^PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 236/1979

base errada. Mas nSo parel a leltura, urna forca dentro de mlm pulsionava
seu prossegulmento. Ho|e sel que era o vinculo Racional Já despertado
pela Otigem e pela ¿urea que fez a llgacfio dos dols mundos fazendo
surgir a Fase Redentora, o tercelro Milenio. Estou relendo o sexto volunte,
convicto de ter me encontrado finalmente com a Verdade das verdades.

Benvlndos sejam, limaos do MUNDO RACIONAL, e obrigado, RACIO


NAL SUPERIOR, pols, se esta Obra nao chegasse no momento preciso,
eu nao teria mais condlcdes de sobreviver, de tSo esgotado e velho que
me sentía nos meus poucos anos de vida mal vivida. Gracas a CULTURA
RACIONAL, que me salvou, agora só pensó no momento em que entrarel
em contacto com meus irmaos Puros, Llmpos e Perfeltos. Enquanto me
preparo com a leitura, desenvolvendo o meu Raciocinio, para isto, vou
divulgando a Salvacfio para todos, que este ó um Bem Universal.

Everton Pacheco Ferrelra


Loteamento Imco, n? 163
Araranguá (SC)"

Outros testemunhos podem ser lidos nos textos de publici-


dade da nova corrente filosófico-religiosa.

Notemos ainda que, segundo o Sr. Manoel Jacintho Coe-


lho, «Universo em Desencanto» também revela o verdadeiro
Deus. «Só agora, neste século, é que viemos conhecer quem é
Deus, porque até entáo ninguém conhecia o verdadeiro> (ex
traído de folha volante de propaganda)!

2. Atgumas ponderasóes

1. Como se vé, a obra «Universo em Desencanto» é de


índole espirita. Sup5e comunicagóes mediúnicas, feitas ao As
tral Inferior pelo Racional Superior. Por conseguinte, é lícito
questionar tal obra como se questiona o Espiritismo. Quem
hoje estuda com mentalidade científica os fenómenos mediú-
nicos, sabe que estes nao sao senáo fatos parapsicológicos
explicáveis pela constituigáo psíquica do próprio médium sem
qualquer intervengáo do Além. As comunicagóes e revelagóes
atribuidas pelos médiuns ás entidades do Astral Superior sao
apenas a projegáo de conhecimentos (adquiridos nesta vida
mesma) que o médium traz em seu subconsciente ou incons
ciente; o médium combina de maneira livre e fantasista esses
dados e os apresenta como mensagens do Além. Ao fazer isto,
pode estar procedendo de boa fé ou sinceramente (o que pa
rece ser freqüentemente o caso em sessóes espiritas e umban-
distas). Isto, porém, nao quer dizer que ele esteja interpre
tando auténticamente os fenómenos em pauta.

._ 348 _
cUNIVERSO EM DESENCANTO» 41

2. Alias, a parapsicología tem estudado com especial


interesse o inconsciente (ou subconsciente) e sua extraordina
ria eficacia. Na base de repetidas investigagóes, os mestres
afirmam que o ser humano.em estado inconsciente ou subcon-
ciente, é muito mais «inteligente» do que em estado consciente.
É Erích Fromm quem afirma: «Em sonó produzimos opera-
cóes intelectuais superiores as que realizamos quando acorda
dos («El lenguaje olvidado». Buenos Aires, 1953, p. 43).

Ora o transe espirita se assemelha a um estado crepus


cular, intermediario entre a vigilia e o sonó. Tal estado é
muito propicio a um trabalho eficaz do inconsciente. Lsto
explica que em estado de transe espirita as faculdades da
mente trabalhem com grande desinvoltura. Para ilustrar estes
dizeres, pode-se citar, entre outros, o caso da médium Helena
Smith, que funcionava em sessóes espiritas sob o controle do
Dr. Lemaítre.

Assistia as sessóes urna senhora que tinha perdido seu


filho Alexis tres anos antes. Pediu entáo a Helena que evo-
casse o espirito de Alexis. Helena deu algumas respostas como
se proviessem de Alexis; nada, porém, de notável. — Um dia
aconteceu que o prof. Lemaitre falou a urna párente de He
lena sobre o interesse em saber o que havia concretamente no
planeta Marte. Um mes mais tarde já o inconsciente de He
lena comecava a dar os primeiros sinais de suas elaboracóea
de aventuras marcianas. Durante sessóes sucessivas a médium
«visitou» Marte. Descrevia tudo o que contemplava: carros de
cávalos sem cávalos nem rodas, deslizando e produzindo fals
eas; casas cujos telhados eram recobertos por ondas, um berso
que, em lugar de cortinas, tinha anjos de ferro com as asas
estendidas. Os habitantes do planeta eram como os homens
da Térra, exceto no seu trajar, igual para ambos os sexos:
caigas largas e ampias, com urna comprida blusa apertada á
cintura e recamada de desenhos.

Numa vasta sala de conferencias, Helena encontrou Ale


xis, o filho da senhora que ela procurava. Na primeira fila do
auditorio, Alexis (cujo nome em Marte era Esenale) seguía
atentamente a conferencia proferida em marciano. Quando
Alexis por meio de Helena falava aos amigos da Térra, falava
francés. O inconsciente de Helena precisou de algumas sessóes
para ir elaborando aos poucos a lingua de Marte. No fim das
sessóes, porém, Alexis parecía falar urna difícil lingua, tida
como a lingua de Marte!

— 349 —
42 «PERGUNTE E RE5PONDEREMOS> 236/1979

O fenómeno impressionou os estudiosos, que se puseram a


analisá-lo de perto. Aplicaram-se principalmente á pesquisa
do marciano, do qual restavam frases escritas. Aos poucos,
foram chegando a significativas conclusóes, a saber:

O idioma marciano de Helena Smith se compunha de sons


que existem todos em francés. Ora ñas línguas reais isto ja
máis ocorre; por mais semelhantes que sejam os idiomas e por
mais próximos que estejam geográficamente os que os falam,
sempre possuem algum som próprio. Em suma: a língua do
planeta Marte nao apresentava a mínima originalidade foné
tica!

Mais: notável quantidade de palavras «marcianas» reprodu-


zia de modo suspeito o número de silabas ou mesmo de letras
de seus correspondentes franceses e imitava as vezes até a dis-
tribuigáo das consoantes e das vogais. Ñas frases, a ordem das
palavras era absolutamente a mesma em marciano e em fran
cés. E isto até nos pormenores... Verificava-se mesmo a
introdugáo de urna letra em certas circunstancias fonéticas:
«Quand viendra-t-il?», diz-se em francés, ao passo que em
«marciano» dizia Helena: «Kevi berinmi-m-eb?» Concluiram,
portanto, os estudiosos que o processo de criacáo do marciano
consistirá simplesmcnte em servir-se de frases francesas e
substituir cada palavra por outra, arbitraria, mas geralmente
construida com o mesmo número de sílabas e letras!

Tais resultados contribuiram decisivamente para desfazer


a ilusáo de que Helena Smith viajara mentalmente até Marte
e lá tivera contato com seres extra-terrestres. É lícito, pois,
indagar agora: tal historia nao elucidaría de maneira suficien
temente nítida os fenómenos que estáo na base da obra «Uni
verso em Desencanto», de tal modo que apareja totalmente
infundada ou falsa a hipótese de se tratar de comunioacóes do
Além ou de um Espirito do Racional Superior?

3. A colegáo «Universo em Desencanto» caracteriza-se


pela pomposidade e grandiosidade de suas perspectivas e de
seus vocábulos. Isto pode impressionar os leitores... Todavía
quem examine, com um pouco de senso crítico, o que lé, veri
fica que as concepgóes da obra sao confusas e as palavras
pouco ou nada dizem de concreto. Os dez yolumes da serie
parecem perder-se em divagacóes da fantasía pouco contro
lada pela razáo e pela lógica. Desta maneira estaría sendo

— nso —
«UNIVERSO EM DESENCANTO» 4?

introduzida a Fase Racional da historia do género humano!...


Por via táo pouco racional ou lógica!
curas e os portentos atribuidos pelo médium

Sñsy
ñor há de socorre-las em dado momento.

é válido o principio seguinte: todos os fenómenos que

distingue-se de crendices o genuino ato de crer.


Eis. em poucas páginas, o que nos ocorre dizer a respeito
de «Universo em Desencanto».

A propósito
KLOPPENBURQ. BOAVENTURA. O Espiritismo no Brasil. Ed. Vozea,
Petrópolls 1960.
QUEVEDO. ÓSCAR 6.. A face oculta da mente. Ed. Loyola. Sao
Paulo 1976. ^ Jorsas síquicas da mente, 2 volumes. Ed.
Loyola, S8o Paulo 1974.

Estéváo Bettenoonrt O.S.B.

de Antonio Barreto Freiré (Fortaleza, CE) :

,„„ xas* Maa¿^-.2£S£ras


nao sal urna e^alagemsem este carimbo^A cada o» ^ pe|ft

ano II, marco 1979. n* 21, p. 6).


— 351 —
livros em estante

estudo.

„ o autor chama a atengo P- a■ £» do


afirma que entre os antigo* cristóos se Pral"«"» do
asssüSSflt^ u «-me-

conversSo, o que é deveras lamentável

SJ ColegSo "T
130 x 200 mm, 239 pp.

_ o modelo «nsH.uc.ona., decorrente da organ.zagio ¡ur.dlca da Igreja;


- o mode.0 místico, que rea.ga a comun^o de amor dos fiéis com
Deus e entre si;

Patavra;

_ o modelo «..aconal. que considera a «arela como servidora e pro


motora da lustlca e da paz entre os homens.

— 352 —
A Dulles julga sabiamente que nenhum desses modelos esgota o
conteúdo da realidade da Igreja, que, em última análise, é um misterio
ou algo de transcendental. Para aproxlmar-se dessa realidade transcen
dental, o estudioso deve combinar entre si os aspectos válidos de cada
qual das eclesiologias apontadas, dando especial énfase ao modelo sacra
mental. A Igreja de Cristo assim caracterizada subsiste, de maneira plena,
na Igreja Católica Romana; há, porém, elementos da mesma verdadeira
Igreja ñas comunidades eclesiais cristas (protestantes e ortodoxas orlen-
tais) separadas de Roma. Estas vém a ser realizares incompletas ou
parctais da única Igreja de Cristo, tendentes a realizar de maneira plena
ou consumada o modelo da verdadeira Igreja.

O livro de Dulles se recomenda por sua capacidade de sintetizar


elementos diversos e múltiplos. Ajuda a clarear conceitos. Todavía nSo se
devem separar do respectivo contexto as suas afirmacSes sob pena de
falsificar o pensamento do autor, que é lúcido e equilibrado.

A mensagem de Sao Paulo para o homem de hoje, por C. H. Dodd.


Traducáo de Alexandre Macintyre e José Raimundo Vldigal. Colecao "Bi
blioteca de estudos bíblicos" — 4. — Ed. Paulinas, SSo Paulo 1978,
145x210 mm, 183 pp.

O autor é notável exegeta inglés, de confissáo evangélica (congre-


gacional) Tem-se dedicado especialmente aos escritos do Novo Testa
mento. Este volume sobre Sao Paulo é fruto de prolongados estudos, que
permitiram a Dodd penetrar no ámago do pensamento paulino. Chama-nos
a atencáo, porém, o capítulo 5 do livro, intitulado "A antiga culpa"
(pp. 53-65). O autor al examina a antropología paulina e a questSo do
pecado dito "original". Nao há dúvida, o modo paulino de conceber a
estrutura psicossomática do homem dífere da concepcao grega aristoté
lica; é devedora tanto ao pensamento semita quanto a correntes de pen
samento grego; os bíblistas e os teólogos nao se surpreendem com o
(ato Mais importante, porém. é a maneíra como Dodd interpreta os textos
paulinos referentes á "antíga culpa"; julga que permítem explicar a orlgem
do pecado por duas vias distintas urna da outra: ou "pela transgressáo
histórica de um antepassado humano em um pass-ado remoto" ou pela
sujeicáo do homem aos "espíritos elementares" (anjos maus?); cf. p. 58.
Ao propor tal interpretagao, Dodd se distancia da tradicáo católica, que
entende Rm 5, 12-21 como relato da culpa do primeiro Adáo, que o
segundo Adáo recapitulou a fim de reconduzir ao Pai os homens des
viados pelo primeiro homem.

Mais: na paráfrase da epístola aos Romanos posta em apéndice


ao livro (pp. 169-178), nota-se a falta de urna expressáo típicamente
paulina como seria o termo symphylol, enxertados (cf. Rm 6,5); é pre
cisamente este vocábulo que designa a comunháo de vida sacramental
com Cristo. Cf. p. 172.

Em suma, quem leia o livro de Dodd, encontrará ai interessantes e


valiosas explanacóes do pensamento paulino; todavía perceberá, aquí ou
ali que o autor nao é católico, ou seja, nao leva em conta as grandes
linnas da tradícao católica afirmadas oportunamente pelo magisterio da
Igreja.

O Deus Próximo, por Ladislaus Boros. Tradugao do Pe. Jesús Hortal.


— Ed. Loyola, Sao Paulo 1979, 140x210 mm, 60 pp.

Este livro reproduz o texto de conferencias de retiro espiritual reali


zadas pelo autor, que foi teólogo de boa nota. As reffexóes falam da
(«nPrianeia de Deus em termos existenciais muito aptos a despertar a vida
de'oácao e o ap'ofundamento da espiritualidad, crista. Para tanto, serve-se
constantemente de textos bíblicos interpretados em sentido fenomenoló-
gico Recomenda-se este escrito a quantos queiram progredir na consc.én-
cia da presenca e da acao de Deus em sua vida cotidiana.

O Ser do Cristáo, por Ladislaus Boros. Traducao do Pe. Jesús Hortal


S.j. — Ed. Loyola, S5o Paulo, 140x210 mm, 50 pp.

Eis outro livrinho precioso para a meditacáo. Mostra ao leitor alguns


pontos a que se há de voltar a sua atencáo para crescer na intimidado
com Deus em termos densos de teología. "Um homem se perde quando
perde o seu centro. Um homem nao tem lempo se nao se reserva ur.s
momentos para té-lo. Um cristáo ¡á nao sabe por que é cnstao se pensa
que isto consiste apenas em ser ativo" (p. 5).

AMIGO,

SE A VIDA LHE PARECE INCLEMENTE,

LEMBRE-SE:

ELE ESTÁ Aí,


QUANDO NOS JULGAMOS SOS.

ELE NOS OUVE,


QUANDO NINGUÉM RESPONDE.

ELE NOS AMA,


QUANDO TUDO NOS ABANDONA.

(S. AGOSTINHO)

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