You are on page 1of 59

LÍVIA DUTRA

LIDERANÇA CARISMÁTICA:

Análise da Construção da imagem de Adolf Hitler nos documentários


O Triunfo da Vontade e Arquitetura da Destruição

Belo Horizonte
2008
LÍVIA DUTRA

LIDERANÇA CARISMÁTICA:

Análise da Construção da imagem de Adolf Hitler nos documentários


O Triunfo da Vontade e Arquitetura da Destruição

Monografia apresentada ao Curso de


Comunicação Social, do Departamento de
Ciência da Comunicação do Centro
Universitário de Belo Horizonte – UNI-
BH, como requisito parcial para obtenção
do título de bacharel em Jornalismo.

Orientador: Fabrício Marques

Belo Horizonte
2008
Aos colegas de curso
e à Mara Greide pela idéia.
Dedico este trabalho única e
exclusivamente a minha mãe,
Cecília Dutra, por tornar minha vida
cada dia mais colorida.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 7

1 LIDERANÇA CARISMÁTICA ......................................................................................... 13

2 SURGIMENTO E QUEDA DE UM LÍDER .................................................................... 21

3 AS ESTRATÉGIAS DE COMUNICAÇÃO DE HITLER .............................................. 33

4 ANÁLISE ............................................................................................................................. 42

4.1 Metodologia ........................................................................................................................ 42

4.2 Filmografia ......................................................................................................................... 43


4.2.1 O Triunfo da Vontade ...................................................................................................... 43

4.2.2 Arquitetura da Destruição ............................................................................................... 44

4.3 Análise dos documentários ................................................................................................. 45


4.3.1 Um espetáculo cinematográfico hipnótico e terrificante ................................................. 45

4.3.2 A tentativa de estetização de um país .............................................................................. 51

5 CONCLUSÃO...................................................................................................................... 57

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 59


7

INTRODUÇÃO

Com o final da Primeira Guerra Mundial1 (1914-18), em que Inglaterra e França se fizeram

vitoriosas, a Alemanha encontrou-se enfraquecida e abalada pelas perdas durante os

confrontos. Além disso, a Europa ainda não tinha se desvinculado das hostilidades vividas no

período da Guerra. E é a partir do fim da Primeira Guerra Mundial e da derrota alemã que

surgiu o nazismo.

Por volta de 1918, o povo alemão, já cansado de tanta guerra e violência, passa a culpar o

Kaiser Guilherme por má administração do país, e ele renuncia ao poder. Friedrich Ebert, do

Partido Social Democrata, assume o poder. O partido de esquerda tinha como principal líder

Karl Kautsky, primeiro teórico do socialismo alemão. Nesse mesmo período, é assinado o

Tratado de Versalhes2. Por contrato, foi firmado que a Alemanha, como conseqüência dos

males que a Guerra causara, perderia 13,5% de seu território, o potencial econômico e sofreria

limitações para seu exército, o que traria, ao mesmo tempo, a paz para a Europa. Mesmo com

tantas restrições, a Alemanha consegue se reconstituir. A dependência de capital internacional

gera nos alemães o sentimento de anti-internacionalismo, em especial por motivos

econômicos.

1
“A Primeira Guerra Mundial (também conhecida como Grande Guerra antes de 1939, Guerra das Guerras ou
ainda como a Última Guerra Feudal) foi um conflito mundial ocorrido entre Agosto de 1914 a 11 de Novembro
de 1918. A guerra ocorreu entre a Tríplice Entente (liderada pelo Império Britânico, França, Império Russo (até
1917) e Estados Unidos (a partir de 1917) que derrotou a Tríplice Aliança (liderada pelo Império Alemão,
Império Austro-Húngaro e Império Turco-Otomano). A guerra causou o colapso de quatro impérios e mudou de
forma radical o mapa geo-político da Europa e do Médio Oriente”. Fonte
http://pt.wikipedia.org/wiki/Primeira_Guerra_Mundial. Acesso em 25 de maio de 2008.
2
“O Tratado de Versalhes (1919) foi um tratado de paz assinado pelas potências européias que encerrou
oficialmente a Primeira Guerra Mundial. Após seis meses de negociações, em Paris, o tratado foi assinado como
uma continuação do armistício de Novembro de 1918, em Compiègne, que tinha posto um fim aos confrontos. O
principal ponto do tratado determinava que a Alemanha aceitasse todas as responsabilidades por causar a guerra
e que, sob os termos dos artigos 231-247, fizesse reparações a um certo número de nações da Tríplice Entente”.
Fonte http://pt.wikipedia.org/wiki/Tratado_de_Versalhes. Acesso em 25 de maio de 2008.
8

Acontece assim, segundo Couto (2007), a motivação populacional por nacionalismo e a

construção do nazismo como ideologia popular. Para o autor, ainda hoje, muitos acreditam

que o Nazismo está diretamente ligado a Hitler, mas não é exatamente essa a real história.

Nascido em 20 de abril de 1889, Adolf Hitler era filho de Alois Hitler e Klara Polzl. Hitler

não teve uma boa relação com seu pai e o principal motivo das discussões era que Hitler

almejava ser pintor e seu pai queria que seguisse a carreira pública. Alois tinha fama de tirano

e impunha muitas leis dentro de casa.

Couto (2007) aponta que, em 1903, Alois morre vítima de alcoolismo e, no mesmo dia, Hitler

abandona a escola para tentar a vida como sempre imaginou. A morte do pai não abalou

Hitler, mas o pior ainda estava por vir. Em dezembro de 1907, após inúmeras tentativas de

salvação e até mesmo da ajuda de um médico judeu, Klara morre em decorrência de um

câncer no seio, o que deixou Hitler transtornado. Com a herança deixada por seus pais, Hitler

muda-se para Viena.

Hitler passou a vender quadros, mas nunca conseguiu entrar na Escola de Artes. Foi nesse

período que ele consolidou seus pensamentos e formou seu caráter; lia constantemente

periódicos anti-semitas que idolatravam a raça ariana, antes mesmo de culminar a Primeira

Guerra Mundial. Alistou-se no exército alemão, mas nunca foi promovido a cabo e, em seu

primeiro confronto, foi atingido e ficou cego por alguns dias. Em 1919, deixou o exército para

se aliar ao Partido dos Trabalhadores Alemães, DAP.

O povo alemão precisava de uma justificativa palpável para a falência decorrente da Guerra e

era isso que Hitler sabia fazer. De acordo com Lindholm (1993), Hitler era carismático e seus
9

discursos traziam certo conforto aos alemães. Em 1932, torna-se presidente. A partir desse

momento, o Führer3 não exerce seu papel de líder carismático.

O Führer começa então a fazer propagandas de idéias nazistas: cartazes com emblemas

nazistas foram espalhados por todo o território alemão, ganhando assim o apoio de uma

nação. Hitler derrubou os termos do Tratado de Versalhes e se aliou a Mussolini4 na Itália.

Como forma de propagandear seus feitos e conquistas, financiou filmes nazistas em que se

valorizava o poder e a força do povo alemão.

Segundo Nichols (2005), um dos filmes mais conhecidos e questionados da época foi O

Triunfo da Vontade (1934), dirigido pela cineasta Leni Riefenstahl, que arquitetou como

Hitler deveria ser apresentado ao mundo. O documentário celebrava o poder das massas

agrupadas e coreografadas. Com movimentos das tropas coordenados com uma trilha sonora

marcante, ele mostra como os alemães estavam em estado de êxtase diante do Führer.

Sempre com intuito de poder, Hitler participa da guerra que marcaria a história da

humanidade: era iniciada a Segunda Guerra Mundial (1939-45) e, em decorrência da

participação da Alemanha, alguns estudantes e civis começaram a se manifestar contra o

regime nazista de Hitler. Nesse período de início de grandes rebeliões contra Hitler, podemos

constatar o momento de queda do Führer, já que seu poder carismático começa a se apagar.

3
“O termo Führer foi o título adotado por Adolf Hitler na Alemanha para designar o chefe máximo do Reich e
do Partido Nazi. O nome significa o chefe máximo de todas a organizações militares e políticas da Alemanha.
Significa, em alemão, o "condutor", "guia" ou "líder" - usado também no trânsito e nos transportes”. Fonte
http://pt.wikipedia.org/wiki/F%C3%BChrer. Acesso em 25 de maio de 2008.
4
“Ditador que governou a Itália de 1922 a 1943, autodenominado "Il Duce" (O Condutor), foi jornalista de
profissão. Mussolini foi influenciado pelas leituras de Nitzsche e de Georges Sorel. Durante certa fase de sua
vida abraçou o socialismo, tendo inclusive escrito artigos em defesa do socialismo à época em que foi redator-
chefe do jornal Avanti, mas tarde foi expulso do Partido Socialista Italiano e em 1919 fundou uma organização
intitulada Fasci Italiani di Combatimento, embrião do futuro Partido Fascista.” Fonte
http://www.marxists.org/portugues/dicionario/verbetes/m/mussolini.htm. Acesso em 25 de maio de 2008.
10

Hitler parece não mais agradar a todos e devido à sua teimosia irritou muitos militares. Sua

autoridade, no entanto, era irredutível e, em decorrência disso, muitas pessoas morreram, e o

Führer sofreu cerca de 40 atentados contra sua vida segundo Couto (2007). Em 1945, a guerra

teve fim. Hitler então cometeu suicídio no dia 30 de abril do mesmo ano. A Alemanha

terminou a Guerra com 22% a menos de seu território e apenas no país foram estimados cerca

de 5.500.000 mortos.

Contrapondo as idéias de propaganda de um líder carismático feitas pela cineasta Leni

Riefenstahl, com a queda do império nazista e a morte de Hitler, muitos filmes foram

lançados para retratar esse momento da história. Para Nichols (2005), um deles mostra como

se deu a queda e a destruição da imagem de Hitler como figura emblemática e salvadora da

Alemanha. Arquitetura da Destruição (1992), de Peter Cohen, apresenta uma Alemanha

derrotada prestes a presenciar a queda de seu líder. Já O Triunfo da Vontade (1934), mostra

um líder que exerce o papel de salvador de uma nação.

Durante todo o período da Segunda Guerra Mundial, a comunicação de massa era precária e

falha com relação aos dias de hoje. Os informativos sobre a guerra aconteciam por meio de

rádios, jornais e cinema. O cinema de fato representou naquela época, através de

documentários, para muitas pessoas, a visão da realidade. Era pelos famosos documentários

que se tinha uma noção do que realmente acontecia naquele período. Por ser o cinema o

grande projetor de informações daquela época, muito se manipulou e maquiou informações a

cerca da guerra.
11

Pelo valor histórico devido ao Holocausto5, ao Nazismo, à Primeira e Segunda Guerras

Mundiais, Hitler foi protagonista de uma das histórias que marcaram a humanidade. A

pesquisa desenvolvida pretende elucidar questões referentes aos procedimentos adotados por

Hitler para se tornar um líder carismático e responsável por toda barbárie ocorrida na

Alemanha Nazista.

Desde o início da Primeira Guerra Mundial até o fim da Segunda Guerra e a queda de Hitler

na Alemanha, muito se discutiu a respeito da forma com que o Führer entrou e saiu do poder

alemão. Cerca de milhões de pessoas foram mortas pelos nazistas, pessoas essas que foram

expostas a uma guerra que de certa maneira só fazia bem para o próprio ego e loucura de

Hitler. O que podemos apresentar é que problemas éticos e econômicos cercaram toda a

trajetória do Führer. O dia 30 de janeiro de 1933 não é apenas a data em que Hitler chegou ao

poder na Alemanha, mas o dia em que foi assinada a sentença de morte de milhares de

pessoas.

A partir do III Reich6, em que Hitler soube conduzir o povo alemão, os meios de comunicação

se mostraram como uma das armas mais poderosas de guerra, capazes de persuadir e

manipular toda uma nação através de documentários que enfatizavam a raça ariana. O partido

nazista utilizou o cinema, em formato documental, para propagandear toda uma ideologia e

convencer que o nacional-socialismo era a melhor forma política para a nova Alemanha.

5
“A partir do século XIX, a palavra holocausto passou a designar grandes catástrofes e massacres, até que após a
Segunda Guerra Mundial o termo Holocausto (com inicial maiúscula) passou a ser utilizado especificamente
para se referir ao extermínio de milhões de judeus e outros grupos considerados indesejados pelo regime nazista
de Adolf Hitler. A maior parte dos exterminados eram judeus, mas também haviam militantes comunistas,
homossexuais, ciganos, eslavos, deficientes motores, deficientes mentais, prisioneiros de guerra soviéticos,
membros da elite intelectual polaca, russa e de outros países do Leste Europeu, activistas políticos, Testemunhas
de Jeová, alguns sacerdotes católicos e sindicalistas, pacientes psiquiátricos e criminosos de delito comum”.
Fonte http://pt.wikipedia.org/wiki/Holocausto. Acesso em 23 de maio de 2008.
6
“Nome que se dá ao período durante o qual vigorou na Alemanha o regime totalitário nazista (de 1933 a 1945),
assim como no império formado pelas nações por ela conquistadas”. Fonte
http://pt.wikipedia.org/wiki/Alemanha_Nazi. Acesso em 21 de maio de 2008.
12

Dentro desse contexto, este estudo é de fundamental importância para o conhecimento geral

para que todos saibam como aconteceu toda essa transformação histórica mundial e como

Hitler conseguiu enquanto líder levar até as últimas conseqüências uma catástrofe mundial. O

período relacionado à superioridade e queda de Hitler faz parte de modificações econômicas,

sociais e culturais. Analisar Hitler como líder é de total pertinência, pelo simples fato de se

ampliar nossa própria memória, já que os acontecimentos referentes à guerra podem fazer

parte da construção cultural de nossas vidas. Essa análise te como objetivo principal

demonstrar que em diferentes formatos de documentários pagos ou não, se era possível

administrar a imagem de Hitler como um Líder Carismático.

Para tanto, divide-se o trabalho em quatro capítulos. O capítulo inicial aborda a teoria

weberiana sobre Liderança Carismática. Já no segundo capítulo acontece uma

contextualização histórica e uma breve biografia de Hitler, já que o presente trabalho circunda

toda a problemática do Führer em sua posição diante do poder da Alemanha. O terceiro

capítulo trata de uma abordagem minuciosa das estratégias utilizadas por Hitler para

“divulgar” o nazismo pelo mundo e ainda faz uma discussão sobre o que é um filme

documentário. No quarto e último capítulo é apresentada a análise dos filmes: O Triunfo da

Vontade (1934), de Leni Riefenstahl e Arquitetura da Destruição (1994), de Peter Cohen, a

partir das teorias sobre Liderança Carismática discutidas no primeiro capítulo.


13

1 LIDERANÇA CARISMÁTICA

A primeira arma de uma nova doutrinação que se inspire em grandes


princípios, por mais que isso possa desagradar a certos indivíduos,
deve ser o exercício da mais forte crítica contra aqueles que estão na
liderança da sociedade. De observações superficiais sobre a história
dos povos costuma-se chegar à conclusão de que a evolução dos
mesmos, de nenhum modo, é devida à crítica negativa, mas ao
trabalho construtivo. Essa cegueira "popular", infantil e sem sentido,
é uma prova de como, nessas cabeças, até os acontecimentos dos dias
de hoje passaram sem deixar vestígios.
Adolf Hitler em Minha Luta

O ato de dominar algo, ou alguém é para a Sociologia de Max Weber7 conseqüência da

obediência ou mera afeição por parte do dominado ao seu dominador. Dentro da análise de

Weber a busca da legitimação é destacada por três diferentes casos: dominação legal,

tradicional e carismática.

O primeiro tipo de dominação a ser abordado pelo autor é a dominação legal, que é

identificada quando a autoridade é legitimada não na pessoa física, mas, sim, na lei. Segundo

o autor, o tipo mais puro da dominação legal é a dominação burocrática, em que seu conceito

é determinado a partir de estatutos. Dessa maneira podemos afirmar que a dominação legal

tira a autonomia do indivíduo e o coloca hierarquicamente ao dispor do seu superior. Mas é

sabido que esse grau de dominação é coordenado por regras que visam o crescimento do

indivíduo com relação à sua capacidade, tornando-o cada vez mais nulo, apenas um objeto.

Nesse caso é de extrema importância ressaltar que essa dominação somente existe por estar

assegurada por um arcabouço legislativo. Assim, a dominação legal detém a autonomia do

indivíduo através do ordenamento, da padronização e da rotina. Ao invés de deixar o

7
“Max Weber, sociólogo alemão falecido em 1918, foi um dos primeiros cientistas sociais importantes a levar
em conta a importância da religião ou da mentalidade religiosa na configuração da economia política. O objetivo
dele foi refutar a tese de Karl Marx, segundo a qual o capitalismo nascera somente da exploração do homem pelo
homem.” Fonte http://educaterra.terra.com.br/voltaire/cultura/2005/04/02/000.htm. Acesso em 19 de maio de
2008.
14

indivíduo pensar por si próprio, o dominador legal mostra para o indivíduo que o que ele

precisa fazer já foi planejado anteriormente. Dessa forma, entendemos que o indivíduo

dominado é mera peça de funcionamento programável, já que a informação está ligada a

regras pré-estabelecidas.

Obedece-se não à pessoa em virtude de seu direito próprio, mas à regra estatuída,
que estabelece ao mesmo tempo a quem e em que medida se deve obedecer.
Também quem ordena obedece, ao emitir uma ordem, a uma regra: à “lei” ou
“regulamento” de uma norma formalmente abstrata. O tipo daquele que ordena é o
“superior”, cujo direito de mando está legitimado por uma regra estatuída, no âmbito
de uma competência concreta, cuja delimitação e especialização se baseiam na
utilidade objetiva e nas exigências profissionais estipuladas para a atividade do
funcionário, (WEBER, 1980, p.129).

Ainda ao analisar os tipos de dominação Weber (1980) aponta um segundo modelo, a

chamada dominação tradicional, da qual classifica como tipo mais puro a dominação

patriarcal. Nessa nova forma de dominação o poder, ou seja, a capacidade de um grupo ou

indivíduo de resignificar a conduta do outro, está diretamente ligado ao relacionamento da

hierarquia. A dominação tradicional é a mais efetiva e mais difícil de ser quebrada. Um

exemplo interessante seria a monarquia como processo de dominação tradicional, ou seja,

quando o indivíduo é membro de uma cultura que o reconhece como figura legítima.

Em princípio, considera-se impossível criar novo direito diante das normas e da


tradição. Por conseguinte isso se dá, de fato, através do “reconhecimento” de um
estatuto como “válido desde sempre” (por “sabedoria”). Por outro lado, fora das
normas tradicionais, a vontade do senhor somente se acha fixada pelos limites que
em cada caso lhe põe o sentido de equidade, ou seja, de forma sumamente elástica,
(WEBER, 1980, p.131).

Portanto, a partir da análise weberiana podemos afirmar que a tradição é a temporalidade. Ela

deixa de ser um hábito de quem criou algo e passa a transcender outras pessoas. A tradição

pode ainda se perpetuar como forma, mas se modificar como conteúdo. Em uma organização
15

a contratação de funcionários, no caso da dominação tradicional, acontece por meio de

conhecimento mais íntimo dos eventuais contratados e não por seu currículo ou

conhecimentos específicos para o trabalho.

Logo, podemos afirmar que na dominação tradicional o indivíduo somente é reconhecido se

for constatado grau de familiaridade, fidelidade e parentesco. As organizações que têm

influência patrimonial são geralmente concebidas pelo fundador e a história da instituição. A

relação de proximidade do núcleo fundador é o maior grau de avaliação dos indivíduos. A

autoridade na organização patrimonial não reconhece o indivíduo como bom funcionário, para

ela, o que valerá é o tempo de serviço destinado a organização e acima de tudo o grau de

proximidade e amizade entre o indivíduo e as autoridades. E ainda constatamos aqui que na

dominação patriarcal não existe a separação da vida pública e privada.

Weber (1980) em seu estudo aponta a existência da dominação carismática. Nessa dominação

é sabido que a autoridade é reconhecida e legitimada por seu carisma. E é exatamente esse

tipo de dominação que norteia toda a análise do presente estudo. É importante fazer a ressalva

de que carisma é diferente de simpatia. Carisma, segundo Weber (1980), seria um dom

natural, qualidades extraordinárias e a capacidade de envolvimento de um líder solado. Para

que ocorra a liderança carismática é necessária a utilização da imagem e da presença física de

um indivíduo. O líder carismático tem a facilidade para a persuasão, podendo assim dominar

intelectualmente outros indivíduos. Essa capacidade é comparável à sedução, ao

envolvimento emocional; dessa forma, o carismático se torna referência, parâmetro para

outros indivíduos.
16

Obedece-se exclusivamente à pessoa do líder por suas qualidades excepcionais e não


em virtude de sua posição estatuída ou de sua dignidade tradicional; e, portanto,
também somente enquanto essas qualidades lhes são atribuídas, ou seja, enquanto
seu carisma subsiste. (WEBER, 1980, p.135).

Nessa análise constatamos que ainda na mesma linha de raciocínio weberiana o autor Charles

Lindlholm (1993) questiona o porquê da capacidade de um indivíduo carismático atrair

discípulos. Para o autor, o carismático é fonte de magnetismo e normalmente são figuras

capazes de transparecer grandes emoções. A expressividade acentuada do carismático e a

fúria frenética espelhada em seus discípulos são características claras em todo carismático. E

ainda, podemos afirmar que o carismático é capaz de utilizar de técnicas de êxtase, músicas,

penitências e oratória para “dominar”.

Por ser uma liderança que precisa de um posicionamento físico, é criada uma expectativa

sobre o indivíduo dominador, que por vezes pode acarretar em frustrações, já que o líder

carismático pode não conseguir ser ou agir como as pessoas esperavam. Muitas vezes, o

indivíduo carismático é uma pessoa idolatrada, amada por determinado grupo.

A autoridade carismática baseia-se na “crença”, no profeta ou no “reconhecimento”


que encontram pessoalmente o herói guerreiro, o herói da rua e o demagogo, e com
eles cai. (...) Sem dúvida, a autoridade carismática é uma das grandes forças
revolucionárias da História, porém em sua forma totalmente pura tem caráter
eminentemente autoritário e dominador. (WEBER, 1980, p.136).

Assim podemos concluir que, com relação às dominações legitimadas e hierarquizadas, a

dominação carismática é diferentemente interpretada por Weber (1980). O líder carismático é

aquele personagem capaz de dominar mentalmente qualquer indivíduo de comum acordo com

o seu carisma. Segundo Weber (1980), esse tipo de dominação pode ocorrer por meio da

busca da qualificação de um líder, através de oráculo e/ou pela designação do qualificado.


17

As paixões e desejos dos indivíduos, diz ele, estão sempre subordinados aos do
grupo, e os impulsos que motivam o grupo são de tipo e caráter bem diferentes dos
que motivam os indivíduos que o formam. São de ordem mais elevada, e
transcendem interesses menores e desejos pessoais. (LINDHOLM, 1993, p.44).

De acordo Weber (1963), as estruturas burocráticas e patriarcais com relação ao poder

legitimado têm o fundamento comum, a permanência, e se enquadram nas rotinas diárias da

vida cotidiana. Nesse regime, o patriarca é o líder natural, já na burocracia seria uma contra-

imagem do poder patriarcal, sendo assim mais racional. É sabido que no passado, revendo a

história, as pessoas que tinham sido alçadas à liderança carismática não faziam parte de

nenhum tipo, em sua maioria, de serviço ou especialização. Eram consideradas pessoas com

um dom sobrenatural.

Weber foi o primeiro a questionar o termo “carisma” na literatura, como sendo algo vindo da

interação de um “grande homem” e seus seguidores. Segundo Lindholm (1993), o carisma

não foi definido de forma clara por Weber, já que ele só comenta sobre duas formas de

carisma, uma delas o carisma institucional que vem como um legado familiar, a outra aponta a

forma genuína do carisma.

O carisma desse tipo é revolucionário e criativo, ocorrendo em épocas de crise


social, abrindo caminho para um novo futuro. Nos movimentos carismáticos, as
pessoas não obedecem mais aos costumes ou à lei; em vez disso, os seguidores se
submetem às exigências imperiosas de uma figura heróica, cujas ordens não são
legitimadas pela lógica, nem pela posição do herói em qualquer hierarquia
estabelecida, mas somente pelo “poder de comando” do indivíduo carismático.
(LINDHOLM, 1993, p.40).

Portanto podemos afirmar que a figura de um líder carismático é aquela que cumpre sua tarefa

em virtude de sua missão e geralmente quando não consegue cumprir o que pretendia entra
18

em colapso. O carisma é um dom particularizado, ou seja, é resultado de uma barreira

qualitativa onde seu efeito somente acontece dentro de determinado grupo.

Em sentido e conteúdo, a missão pode estar dirigida a um grupo de homens que são
delimitados localmente, eticamente, socialmente, politicamente, ocupacionalmente
ou de alguma outra forma. Se a missão dirigi-se assim a um grupo limitado de
homens, como é comum, encontra seus limites dentro desse círculo. (WEBER,
1963:285).

Economicamente o domínio carismático também é bem diferente do burocrático. Segundo

Weber (1963), a figura carismática embora viva em um círculo econômico burocrático, não

faz questão de ter posse de dinheiro. Em geral, o líder carismático rejeita todo e qualquer tipo

de comportamento econômico racional. Ainda de acordo com Weber (1963), o indivíduo de

carisma é fadado a rejeitar tudo e qualquer coisa relacionada com o mundo exterior, existe

uma separação muito clara do que é patriarcal, racional e carismático.

Sendo assim, o indivíduo com carisma está fadado também ao “esquecimento” assim como

Jesus na Cruz. E ainda aponta que esse “esquecimento” de um líder carismático se dá porque

o dominado, ou seja, seus seguidores enxergam somente no carisma a força pessoal, portanto

o carisma é a força de um líder legitimada para determinado grupo. O carismático, segundo o

autor, está constantemente sendo provado por seus seguidores e às vezes um erro pode ser

fatal para a sua liderança. Weber (1963) ainda aponta que a figura do carismático não

conquista a sua autoridade por meios legais como códigos e estatutos, por isso está

constantemente a mercê da interpretação de seus seguidores.


19

O líder carismático ganha e mantém a autoridade exclusivamente provando sua força


na vida. Se quer ser profeta, deve realizar milagres; se quer ser senhor da guerra,
deve realizar feitos heróicos. Acima de tudo, porém, sua missão divina deve ser
“provocada”, fazendo que todos os que se entregam fielmente a ele se saiam bem. Se
isso não acontecer, ele evidentemente não será o mestre enviado pelos deuses.
(WEBER, 1963:287).

Weber (1963) anda afirma que, a figura, por exemplo, de um governante carismático é

responsável por aqueles que governam, ou seja, os dominados ou governados. Ele é

responsável por ser aquele indivíduo que é realmente desejado por Deus. Ainda afirma que o

domínio do carismático não reconhece as leis, pois a sua lei é aquela construída por

experiências estritamente pessoais.

A dominação carismática significa uma rejeição de todos os laços com qualquer


ordem externa, em favor da glorificação exclusiva da mentalidade genuína do
profeta e herói. Daí, sua atitude ser revolucionária e transpor todos os valores; faz
que um soberano rompa todas as normas tradicionais ou racionais: “Está escrito,
mas eu vos digo”. (WEBER, 1963:288).

Para Weber (1963) o reinado é como evolução do carisma político. O rei é um senhor da

guerra e seu reinado uma conseqüência de seu heroísmo carismático. Os predecessores do

reinado antigamente eram os detentores do carisma enquanto poder, esse rei era sempre tido

como uma figura dupla, o chefe de um clã e ao mesmo tempo um chefe carismático. Um

exemplo dado pelo autor é de que o chefe de uma guerra representa, prova seu carisma através

do reconhecimento de sua braveza e heroísmo diante de um povo. E dessa forma, Weber

(1963) conclui que o poder real e os grupos que nele tem interesses lutam sempre pela

legitimidade da figura por ele definida como governante carismaticamente qualificado.

Ainda na linha de raciocínio Weberiana, o autor Lindholm (1993), relata que a sociologia

apresentada por Weber é um estudo de ações sociais planejadas racionalmente e orientadas


20

para determinado objetivo. Weber em sua narrativa, de acordo com o autor mostra que, muito

do que se acreditava na história e que parecia irracional, na verdade, podia se entender como

situação do ponto de vista de um ator de acordo com crenças e valores culturais. O autor ainda

afirma que Weber mostrou que o comportamento não-racional é um ciclo de repetições desses

atores.

De acordo com Lindholm (1993), a semelhança física entre membros de uma sociedade se dá

a partir de sua unificação. E ainda afirma que movimentos espontâneos fadados às multidões

acontecem através de energias físicas naturais. O autor então conclui que independente do que

o líder seja capaz ele será repudiado se algo de errado faça. Seja na forma de não

comprimento de um desejo coletivo ou, de um erro brutal. E ainda afirma que, Weber tem

como intenção principal chamar a atenção para um protótipo de herói cultural criativo que

seria aqui, o carismático.

Portanto de acordo com Lindholm (1993), em uma sociedade moderna, em que os indivíduos

se importam cada vez mais para problemas econômicos é produzida a ideologia de desunião e

diminuição da interdependência social. Sendo assim, o autor afirma que os indivíduos cada

vez menos têm se colocado em experiências de análise coletiva.


21

2 SURGIMENTO E QUEDA DE UM LÍDER

Enquanto a resolução de meu pai de fazer-me funcionário público


encontrou em mim apenas uma oposição de princípios, o conflito
foi facilmente suportável. Eu podia, então dissimular minhas
idéias íntimas, não sendo preciso contraditar constantemente.
Para minha tranqüilidade, bastava-me a firme decisão de não
entrar de futuro para a burocracia. Essa resolução era, porém,
inabalável. A situação agravou-se quando ao plano de meu pai eu
opus o meu. Esse fato aconteceu já aos treze anos. Como isso se
deu, não sei bem hoje, mas um dia pareceu-me claro que eu
deveria ser artista, pintor.
Adolf Hitler em Minha Luta

A palavra nazista normalmente é associada a algo terrível, abominável. De acordo com a

análise realizada por Ribeiro Júnior (1987), a palavra nazista deixou de ser um termo histórico

para ter conotação de adjetivo. O autor ainda aponta que, apesar da semelhança de

autoritarismo do nazismo e do fascismo8, ambos têm conotações diferentes. Por causa do uso

equivocado da palavra nazismo e de sua generalização, Ribeiro Júnior (1987) observa que há

quem não consiga definir seu limite. Ele afirma que o fascismo e o nazismo são uma resposta

a uma situação de ansiedade diante da destruição de uma sociedade.

Assim, nas origens, tanto do fascismo (Itália) como no nazismo (Alemanha)


encontram-se os mesmos elementos: um regime democrático instável, ineficaz e sem
autoridade; poderosos partidos de esquerda, especialmente o comunista; grupos que
realizam plenamente a destruição da razão, através de um nacionalismo
hipertrofiado, que se esteia sobre as glórias do passado remoto; desenvolvimento de
uma grave crise econômica; e cristalização, na pessoa de um chefe (Duce/ Fuhrer)
dos sentimentos nacionais e pessoais (RIBEIRO JÚNIOR, 1986, p.9).

8
“O fascismo é uma doutrina totalitária desenvolvida por Benito Mussolini na Itália, a partir de 1919, durante
seu governo (1922–1943 e 1943–1945). Fascismo deriva de fascio, nome de grupos políticos ou de militância
que surgiram na Itália entre fins do século XIX e começo do século XX; mas também de fasces, que nos tempos
do Império Romano era um símbolo dos magistrados: um machado cujo cabo era rodeado de varas,
simbolizando o poder do Estado e a unidade do povo. Os fascistas italianos também ficaram conhecidos pela
expressão camisas negras, em virtude do uniforme que utilizavam”. Fonte http://pt.wikipedia.org/wiki/Fascismo.
Acesso em 28 de maio de 2008.
22

Desde 1888, com o reinado do imperador Guilherme II, a conquista do crescimento

econômico e científico na Alemanha fez crescer o sentimento de superioridade nacional.

Porém, a Primeira Guerra Mundial chegou ao fim com a vitória da Inglaterra e França. A

Alemanha encontrava-se totalmente enfraquecida e abalada. E a Europa estava em total

desordem, por não conseguir se desligar dos hábitos hostis de violência.

Segundo o autor, é nesse contexto que o nazismo surge. Lênin9 foi o único que percebeu a

mudança na ordem natural da Europa, porém não acreditou no poder eterno dos bolchevistas,

uma corrente marxista russa. Para Ribeiro Júnior (1987), a Alemanha foi a grande solução

para Lênin, e entre 1919 e 1923, os alemães tentaram tomar o poder, embora todas as

tentativas tivessem sido um fracasso.

Em meados de 1918, para evitar uma derrota maciça, foi aumentado o poder bélico alemão,

mas não havia preocupação com o povo, mas sim com o exército. Mas, naquele mesmo

momento, a sociedade alemã já estava saturada de tanta guerra e passa a culpar o Kaiser

Guilherme por má organização política. Houve então a renúncia do imperador.

A primeira renúncia alemã fora proclamada de um balcão do Reichstag (Parlamento)


às 15 horas do dia 9 de novembro de1918, pelo social-democrata de direita Philipp
Scheidemann, assumindo a chefia do governo o presidente do Partido Social
Democrata, Friedrich Ebert (RIBEIRO JÚNIOR, 1986, p.16).

É sabido que, de acordo com autor, enquanto o Partido Social Democrata tomava o poder na

Alemanha à esquerda com os revisionistas cujo principal líder era Karl Kautsky, o primeiro

teórico do socialismo alemão. Dessa ala de esquerda nasceu o Partido Comunista alemão.
9
“Revolucionário russo, responsável em grande parte pela execução da Revolução Russa de 1917, líder do
Partido Comunista, e primeiro presidente do Conselho dos Comissários do Povo da União Soviética”. Fonte
http://pt.wikipedia.org/wiki/Lenin. Acesso em 28 de maio de 2008.
23

Nessa época era assinado o Tratado de Versalhes em que estava estipulado que a Alemanha se

posicionasse a respeito das conseqüências da guerra e que desse apoio aos países da Tríplice

Entente (França, Inglaterra e Rússia).

O Tratado de Versalhes, que tinha 200 páginas e 440 artigos, fez com que a
Alemanha perdesse cerca de 13,5% de seu território e potencial econômico e quase
10% de sua população; estabeleceu que o exército alemão não poderia ter mais de
100 000 homens entre oficiais e soldados, e a marinha ficaria com 15 0000.
(RIBEIRO JÚNIOR, 1986, p.18).

De acordo com Ribeiro Júnior (1987), mesmo com tantas restrições feitas pelo tratado, a

Alemanha conseguiu reintegrar sua soberania nacional, o que contribuiu veementemente para

a expansão do nacionalismo e a construção do nazismo alemão. Mas sabemos que o Tratado

de Versalhes trouxe aos alemães a submissão ao capitalismo internacional, com seus

sacrifícios e privações; mesmo assim contribuiu para a criação de nacionalismo agressivo

capaz de transformar a idéia geral de uma sociedade.

A partir desse momento o nacionalismo alemão começa a criar o anti internacionalismo,

capitalismo em que também vislumbram-se a presença dos judeus no país. Segundo o autor,

foi em meio a todos esses fatos que nasceu a idéia do racismo alemão, característico do

fascismo.

Em meados de 1919, Adolf Hitler, ex cabo do exército, é efetivado como funcionário da

política de Munique para que possa supervisionar o Partido dos Trabalhadores Alemães, já

que à palavra, trabalhadores, se ligava diretamente a palavra comunismo. Mas, em 1920, por

causa do seu poder de oratória e liderança, Hitler já era líder do Partido Nacional Socialista

dos Trabalhadores Alemães. A partir da criação de um novo partido, foi elaborado um


24

programa político e econômico que se baseava na formação explícita de uma ideologia

nazista, em que a centralização do poder em um III Reich era legível.

Porém, em sua narração, o autor conta que em 1923 a nova república nacionalista alemã

começou a sofrer grande pressão de direita e esquerda. Essa crise colocou a população em

estado de miséria e desespero. Sabe-se que para Hitler o melhor a se ter feito naquela situação

era caracterizar o radicalismo de direita, revolucionário que traria assim frenesi em toda

sociedade alemã, podendo fazer com que os judeus fossem bode expiatório do Partido

Nazista.

De 1927 a 1928, o Partido Nazista divide a Alemanha em 34 distritos eleitorais sendo

protegido pelo serviço paramilitar denominado SA (Sturmabteilung, Seção de Assalto). Ele

também ajudou na difusão do nazismo na Alemanha. Temendo que a SA fosse um

instrumento de acesso ao poder, Hitler cria a SS (Schutzstaffel, Tropa de Proteção), que mais

tarde foi reconhecida como A Ordem Negra, sociedade secreta.

Em meados de 1929, a crise econômica gerada pela luta de classes faz aumentar ainda mais o

desemprego na Alemanha. Dessa maneira, de acordo com o autor, essas conseqüências sociais

trouxeram a Hitler uma grande força para a tomada do poder em 1932. Nesse ano, ele é

candidato à presidência da república alemã, mas mesmo assim quem tomou o poder do Reich

foi Hindenburg por mais seis anos. No poder, Hindenburg nomeia, em 1933, Hitler como seu

chanceler, achando assim que poderia fazer com que Hitler tornasse submisso, podendo

controlar melhor o avanço do nazismo, o que de fato foi um grande erro político. Em 1934, o

então presidente alemão morre, ficando no poder Hitler.


25

A consolidação do nazismo se deu a partir do firmamento de três frentes: o uso da autoridade

para gerir os recursos do Estado, o terrorismo que criou a atmosfera de ameaça e medo da

violência e, em terceiro, o uso maciço da propaganda nazista em toda a Alemanha.

Porém, para analisar melhor a questão do surgimento de um líder tido como Carismático, é

necessário nos aprofundarmos mais na história de vida do Führer. De acordo com Couto

(2007), “o mito”, como é chamado Hitler durante todo o livro, nasceu em Braunau am Inm, na

Áustrial, próximo à fronteira da Alemanha, em 20 de Abril de 1889. Seu pai, Alois Hitler,

tinha então 50 anos e era funcionário da alfândega; já sua mãe, Klara Polzl, 28 anos era dona

de casa. A relação entre Hitler e seu pai não era das melhores, Alois era muito severo. Mas,

para o autor, o principal ponto de discórdia entre pai e filho era que Hitler pretendia se tornar

pintor e seu pai queria que ele seguisse a carreira pública. O autor ainda afirma que o fato de

Alois ter sido tirano e imposto várias leis e ordens sob forma de castigo e tortura fizeram de

Hitler uma pessoa agressiva. Seria para ele uma “educação destrutiva”.

Assim, o próprio Hitler lembrou que sua maior discussão com o pai foi quando
anunciou que queria ser pintor. Isso aconteceu quando ele tinha 11 anos e causou um
verdadeiro rebuliço na mente do conservador Alois, que se opôs imediatamente à
idéia. Curiosamente, Adolf nunca citou as agressões físicas, mas deixou claro que o
relacionamento “pai e filho” havia se deteriorado muito a partir desse dia. O futuro
ditador, contrariado pelas oposições do pai, sentiria o efeito psicológico disso muito
rapidamente, quando se desinteressou definitivamente pelo estudo de qualquer coisa
que não estivesse ligada diretamente às artes. (COUTO, 2007, p.11).

Conforme a análise do autor, a partir desse dia, Hitler tornou-se uma pessoa mal-humorada e

não conseguiu por duas vezes passar na prova para fazer a escola secundária. Mas em janeiro

de 1903 Alois morre vítima de alcoolismo e Hitler, no mesmo dia, abandona a escola. Sua

mãe Klara Polzl morreu em dezembro de 1907, vítima de câncer no seio. O autor descreve o

amor que Hitler sentia por ela e como foi capaz de tudo para tentar curá-la. Ele teria
26

contratado Edmund Bloch, médico judeu, para tratá-la. Mas de nada adiantou, Couto (2007)

ainda questiona em seu texto que esse poderia ter sido um dos muitos motivos para a sua idéia

futura de anti-semitismo10 e racismo. Mas o autor ainda constata que a idéia inicial de racismo

não partiu de Hitler, mas, sim da ideologia do próprio povo alemão desde o II Reich de

Bismark.

Couto (2007) relembra em seu texto que quando Alois faleceu, Hitler se apropriou da herança

e foi para Viena tentar a vida através da arte. Por lá, tentou entrar por duas vezes na escola de

artes, mas foi reprovado, pois aparentava ter tendência para a arquitetura. Nessa época, de

acordo com o autor, Hitler sobreviveu com a venda de quadros por ele pintados, freqüentava a

ópera de Viena, relacionadas ao seu ídolo Richard Wagner11, lia livros que o ajudaram a

estabelecer maior entendimento sobre as idéias anti-semitas, além de periódicos que

idolatravam a raça ariana. Para o autor, foi justamente nessa época, em que esteve em Viena

que Hitler consolidou seus pensamentos, formando assim o seu caráter.

10
“Anti-semitismo é a ideologia de aversão cultural, étnica e social aos judeus. O termo foi utilizado pela
primeira vez pelo escritor anti-semita Wilhelm Marr, em 1873, surgindo como uma forma de eufemizar a palavra
alemã "Judenhass", que significava ódio aos judeus”. Fonte
http://mundoeducacao.uol.com.br/sociologia/antisemitismo.htm. Acesso em 23 de maio de 2008.
11
Wilhelm Richard Wagner (22 de maio de 1813, Leipzig — 13 de fevereiro de 1883, Veneza) foi um
compositor, maestro, teórico musical, ensaista e poeta alemão, considerado um dos expoentes do romantismo e
dos mais influentes compositores de música erudita já surgidos. Com a sua criatividade, inúmeras inovações
foram trazidas para a música, tanto em termos de composição quanto em termos de orquestração. Wagner
expandiu e enriqueceu as possibilidades da orquestra sinfônica, chegando a inventar um novo instrumento, a
trompa wagneriana. Fonte http://pt.wikipedia.org/wiki/Richard_Wagner. Acesso em 24 de maio de 2008.
27

Foi principalmente lá que o anti-semitismo, que já era uma característica própria da


cultura católica reinante no sul da Alemanha e na própria Áustria, tomava forma. Lá
havia uma grande comunidade de judeus, muitos dos quais ortodoxos, vindos do
Leste Europeu. Intrigado com os judeus, o futuro ditador não tardou a obter
panfletos abertamente anti-semitas e observar as tendências político-religiosas
semelhantes, que apareciam na forma de escritos e idéias de homens como Jorg
Lanz von Liebenfels – um ideólogo racista e ex-monge cisterciense, criador da
Teozoologia (que pregava a esterilização das chamadas “raças inferiores” e autor de
vários dos panfletos lidos por Hitler -, de políticos como Karl Lueger – o presidente
da Câmara de Viena – e Georg Ritter von Schnerrer – fundador do partido Pan-
Germânico. (COUTO, 2007, p.17).

O autor ainda explica sobre a “raça superior” tão elucidada pelos alemães, através do nazismo

esotérico e em relatos históricos da origem da idéia ariana vinda dos Estados Unidos. Para o

autor, a palavra ariano tem origem através dos povos indo-iranianos que falavam as línguas

indo-européias. Mais tarde, os povos romanos, gregos, alemães, celtas e eslavos também

foram considerados do mesmo grupo. O autor afirma que todos esses povos tinham como

origem a mesma língua, a proto-indo-européia de seus ancestrais. A partir de então, seus

descendentes foram chamados de arianos.

Segundo Couto (2007), o termo ariano se relaciona com o subgrupo dos indo-europeus que

estavam localizados no planalto iraniano no final do terceiro milênio a.C. Ele afirma que esse

grupo teria habitado a Península da Índia por volta de 1500 a.C. Em outra definição, o autor

observa que a origem do nome ariano poderia ter vindo dos gregos para definir povos

invasores. E ainda lembra que até hoje os armênios se autodenominam como arianos, de

sangue puro.

O autor ainda relata que, em maio de 1912, Hitler deixa Viena para fugir das obrigações de

seu alistamento militar. Em Munique, é encontrado e preso pelas forças austríacas, mas havia

sido liberado do serviço militar, pois tinha porte físico inadequado para tais atividades.

Poucos meses antes de culminar a Primeira Guerra Mundial, em Munique, Hitler continuou a
28

vender quadros e, segundo Couto (2007), a ter uma rotina de leitura diária de jornais e revistas

anti-semitas.

Conforme o autor, o assassinato de Francisco Fernandino, herdeiro do Império Austro-

Húngaro, por terroristas em Sarajevo e a Áustria declarando guerra aos sérvios, foram duas

boas notícias para os germanos, já que muitos eslavos e outros cidadãos estavam “roubando”

seus empregos e a guerra seria um alicerce para o extermínio dos não arianos. Os alemães se

uniram aos austríacos e a Sérvia teve o reforço da Rússia. Hitler então se rendeu ao estado e

se alistou ao exército, mas nunca foi promovido, não passou de cabo, o que, segundo o autor,

era motivo de vergonha para Hitler. No decorrer da guerra, Hitler foi atingido por uma bomba

de gás e ficou temporariamente cego, quando então recebeu a notícia da derrota Alemã. Para o

autor, Hitler achava que o resultado da guerra se deu por um boicote dos judeus dentro da

Alemanha. A partir daí desenvolveu um ódio mortal pelos judeus. Com a implantação do

Tratado de Versalhes, a Alemanha caiu em desgraça.

Couto (2007) observa que Hitler deixou o exército em 1919 e dedicou-se a atividades

relacionadas ao Partido dos Trabalhadores Alemães, DAP. Os adeptos desse movimento

passariam a se chamar Nazi, termo do nacional socialismo. Eles adotaram assim a suástica,

símbolo ariano, e a saudação romana. Para o autor, o povo precisava de uma justificativa para

a perda na guerra e o que Hitler fazia em seus discursos no DAP era exatamente isso. Nessa

época, Hitler treinava seus textos como um ator e muitas pessoas já percebiam o poder de

inspiração e lealdade que o futuro Führer aparentava.

Em novembro de 1923 Hitler, junto ao DAP, tenta tomar o poder do governo da Bavária, e

com isso posteriormente conseguiria tomar o poder alemão. Mas sua tentativa foi frustrada e
29

acabou sendo preso. Em dezembro de 1924 sai da prisão. Mas, segundo Couto (2007), é nessa

época que a Alemanha ganha força e começa a se reestruturar, e a população consegue mais

empregos com o crescimento industrial. Em 1929, quando houve a queda da Bolsa de Valores

em Nova Iorque, o planeta entrou em crise, o que acabou contribuindo para o crescimento do

fascismo na Europa. Quando a crise teve início, o governo alemão acreditou que cortes em

gastos públicos iriam estimular o crescimento econômico do país, assim cortando

drasticamente gastos estatais, incluindo o setor social.

De acordo com o autor o governo alemão esperava e acreditava que a recessão, iria deteriorar

a Alemanha socio-economicamente, esperando com o tempo, porém, a melhoria da estrutura

socio-econômica do país, sem intervenção do governo. Quando a recessão chegou ao seu auge

em 1932, a República de Weimar perdera toda sua credibilidade junto à população alemã,

fator que facilitou a ascensão do nazista Adolf Hitler ao governo do país, em 1933. Couto

(2007) afirma que Hitler fundou sua própria tropa de defesa pessoal, o que possibilitou a

execução de seus planos. E foi nas eleições de 1930 que o partido firmou o seu lugar na

opinião popular como o segundo maior partido alemão. Mas, em 1932, Hitler acabou

tornando-se presidente da Alemanha.

O Führer então começa a mostrar qual era a sua real intenção na construção de uma nova

Alemanha nazista. Sindicatos e partidos políticos foram extintos. A propaganda foi utilizada

por Hitler até o fim da Segunda Guerra Mundial para manipular fatos e conquistar a

Alemanha. Todas as leituras feitas por Hitler em Viena o fizeram querer ainda mais

transformar seus pensamentos em práticas.


30

Vale ressaltar que a corrente esotérica fala do carisma “sobrenatural” de Hitler com
certa freqüência, além de afirmar que ele só teria tal poder de atração se estivesse
envolvido com forças ocultas. Mas simplesmente ignoram o fato de que, como já
dissemos, ele tomara algumas aulas de teatro e usava certas imposições e posturas
junto a seus dons naturais de oratória que estavam em pleno desenvolvimento.
Assim, não há nada de sobrenatural em seus discursos, mas sim cada movimento era
calculado nos mínimos detalhes. E a manipulação da verdade por meio da
propaganda nazista era essencial para obter esse sucesso. (COUTO, 2007, p.66).

Ainda com o objetivo de propagar o nazismo, segundo o autor, Hitler utiliza-se do cinema

para ganhar apoio de outras nações nazistas. Eram comuns cartazes de filmes com a suástica

espalhados pelas cidades. Uma das maiores colaboradoras para o cinema nazista foi Leni

Riefenstahl, cineasta oficial do partido nazista. De acordo com Couto (2007), Hitler financiou

vários filmes nazistas e os dois mais conhecidos são O Triunfo da Vontade e Olimpíadas, esse

último valorizava ainda mais o poder e a força do povo alemão.

Hitler fez de tudo para derrubar os termos do Tratado de Versalhes e assim rearmar a

Alemanha. Durante esse período, o país saiu da Liga das Nações, reimplantou o serviço

militar obrigatório e se tornou aliado de Mussolini na Itália. Em meados de 1939, Hitler

resolveu, de acordo com Couto (2007), se voltar contra a Tchecoslováquia, por causa de

supostas minorias de alemães lá existentes, a Polônia e o Leste Europeu. Em 1º de setembro

daquele ano, começou a guerra que marcaria a história da humanidade. A partir de 1942,

muitos estudantes começaram a se manifestar contra o regime nazista e Hitler irredutível

mandou prender e executar milhares de pessoas. Já em 1945, com a queda de Mussolini, essa

situação favoreceu aos alemães que algo muito parecido pudesse acontecer com Hitler.

Outro ponto importante que o autor aborda são as “trapalhadas militares” exercidas por Hitler

diante de sua autoridade irredutível, o que acabou irritando muitos militares de alto escalão.

Para Couto (2007), a teimosia de Hitler causou sentimento de mal-estar, prejuízo financeiro e
31

humano, já que milhares de pessoas morreram por sua causa. Muitos tentaram matar Hitler:

de acordo com o autor, foram cerca de 40 atentados.

Com a situação na guerra cada vez mais próxima de uma derrota, Hitler não aparecia
mais em público e raramente visitava Berlim, preferindo passar muito de seu tempo
na Wolfschanze (Toca do Lobo), seu quartel localizado na Polônia, com algumas
aparições ocasionais em seu retiro nas montanhas em Berchtesgaden, cidade nos
Alpes alemães. (COUTO, 2007, p.98).

Foram criadas várias frentes de ataque aos nazistas vindas de toda a Europa, Rússia,

Normandia, forças anglo-americanas. Forças desembarcadas do Marrocos e da Armênia

também faziam parte da tropa que iria atacar cada vez mais a Alemanha enfraquecida. As

tropas aliadas, em 1945, ocuparam a Itália e os nazistas por lá se renderam em abril do mesmo

ano. Mussolini então foi capturado e, de acordo com Couto (2007), fuzilado por forças

guerrilheiras.

Segundo Couto (2007), o assassinato de Mussolini aparentemente foi o que tencionou Hitler a

cometer o suicídio e pedir a seus “discípulos” que ateassem fogo em seus restos mortais. A

Alemanha terminou a II Guerra Mundial com cerca de 20% a menos de território e

completamente dividida.

Antes da morte de Hitler, o autor ainda constata que Hitler desde 1944 já não estava bem de

saúde o que mais tarde se constataria ser portador do Mal de Parkinson12. Hitler cometeu

suicídio ao lado de sua esposa Eva Braun. O autor ainda determina dois grandes motivos para

12
“A doença de Parkinson ou mal de Parkinson é caracterizada por uma desordem progressiva do movimento
devido à disfunção dos neurônios secretores de dopamina nos gânglios da base, que controlam e ajustam a
transmissão dos comandos conscientes vindos do córtex cerebral para os músculos do corpo humano. Não
somente os neurônios dopaminérgicos estão envolvidos, mas outras estruturas produtoras de serotonina,
noradrenalina e acetilcolina estão envolvidos na gênese da doença.” Fonte
http://pt.wikipedia.org/wiki/Mal_de_Parkinson. Acesso em 25 de maio de 2008.
32

o suicídio: ele não queria ser capturado vivo e, o segundo, não queria ter o mesmo destino de

Mussolini. Hitler, como afirma Couto (2007), se matou no dia 30 de abril de 1945, ao lado de

Eva Braun às 15h30, com um único disparo de pistola no ouvido.


33

3 AS ESTRATÉGIAS DE COMUNICAÇÃO DE HITLER

O judaísmo provocou em mim forte repulsa quando consegui


conhecer suas atividades, na imprensa, na arte, na literatura e no
teatro. Protestos moles já não podiam ser aplicados. Bastava que
se examinassem os seus cartazes e se conhecessem os nomes dos
responsáveis intelectuais pelas monstruosas invenções no cinema
e no drama, nas quais se reconhecia o dedo do judeu, para que se
ficasse por muito tempo revoltado.
Adolf Hitler em Minha Luta

Em meados de 1933 o primeiro ano do III Reich já gerava um clima de insegurança e

ameaçava a democracia. Hitler já havia sofrido várias tentativas de assassinato por parte de

seus inimigos não somente externos, mas de seu próprio partido, um deles Ernst Rohm, que

segundo Diehl (1996), arquitetou um golpe contra o Führer.

Outro caso importante foi o incêndio do Parlamento alemão por membros do NSDAP, com a

chefia de Hermann Wilhelm Göring da AS, quando a culpa recaiu sobre os comunistas.

Assim, segundo a autora, os jornais comunistas e social-democratas são interditados e

colocados na ilegalidade.

Nessa mesma época, de acordo com Diehl (1996), os jovens alemães desfilavam nas ruas de

Berlim com uma nova bandeira alemã: as cores preto-vermelho-branca com o símbolo da

suástica no centro. E, em 13 de março de 1933, para proporcionar uma maior publicidade e

popularidade ao III Reich, é criado o Ministério da Propaganda chefiado, por Joseph

Goebbels. Segundo Diehl (1996), o novo ministério recebe o nome de Reichsministerium für

Volksauflklärung und Propaganda (Ministério do Reich para o Esclarecimento do Povo e

Propaganda). Nesse mesmo período, o NSDAP é declarado como sendo o único partido legal

da Alemanha, montando dessa forma as bases da ditadura totalitária.


34

De acordo com Diehl (1996), o Partido Nacional-Socialista promove por intermédio do

Ministério da Propaganda, a Campanha da Queima de Livros, encorajando os jovens alemães

a atearem fogo nos livros de conteúdo subversivo. Em 10 de maio de 1933 livros com autores

antigermânicos são queimados, dentre eles autores marxistas, pacifistas e judeus. A partir

desse momento, o III Reich tinha total controle alemão e a próxima etapa de controle era com

relação às crianças alemãs. Hitler passa a por em prática a idéia de raça ariana e ordena a

esterilização de doentes hereditários.

As organizações para jovens, antes presentes apenas no interior do partido, agora se


expandem para toda a sociedade, ganhando força de instituição. A criança deveria
passar o máximo de tempo possível sob os cuidados do Reich, que se responsabiliza
pela educação intelectual e a diversão dos jovens. A sociedade fascista não deve
apenas ser perfeitamente organizada, mas também obter como produto indivíduos
perfeitos excluindo qualquer outra possibilidade que não a hegemônica. (DIEHL,
1996, p.65).

As estratégias de Propaganda Nazista de Hitler ainda contaram com o espetáculo dos Jogos

Olímpicos de 1936. Segundo a autora, Hitler proporciona desfiles militares e comícios do

partido nacional-socialista. Aquele momento era fundamental para que Hitler mostrasse para

todo o mundo uma Alemanha forte, ariana. É assim montada uma complexa rede de eventos e

informação com exposições de arte.

Outro fator importante relatado pela autora é que, com a chegada de um novo meio de

comunicação, no caso a TV, foram espalhados 28 televisores em salas populares em que a

população alemã pode assistir toda a cobertura das Olimpíadas.


35

Além disso, o Ministério da Propaganda monta uma rede especial de informação


para a cobertura das competições, que tinha por objetivo servir os jornais
estrangeiros que não dispunham de correspondentes in loco. A censura também é
utilizada para filtrar e divulgar a boa imagem do Reich: os competidores alemães
são submetidos a controles em suas correspondências, enquanto apenas fotógrafos
alemães credenciados podem cobrir de perto as competições. Os outros devem se
contentar com as entrevistas coletivas que os esportistas realizam após cada prova.
(DIEHL, 1996, p.73).

Diehl (1996) ainda afirma que, durante todo o período das Olimpíadas, as propagandas anti-

semitas foram retiradas das ruas enquanto Hitler mostrava a sua outra face diante dos

microfones e lentes de todo o mundo. Durante os jogos foi rodado em Berlim o filme

Olympia, da cineasta Leni Riefenstahl. A Alemanha conquista 33 medalhas de ouro e 26 de

prata e deixa o povo alemão extasiado com a exibição do filme de Riefenstahl mostrando as

aquisições da raça ariana no esporte. Tudo isso, segundo a autora, acontece pouco antes da II

Guerra Mundial e o povo alemão não se dá conta do que estaria por vir. A propaganda

desempenhou um forte papel no nacional-socialismo, e ainda se afirma que a propaganda é a

principal base do partido nazista.

Assim, a propaganda se expande aos poucos para o cinema, música, comícios,


eventos e arquitetura. Até mesmo os corpos dos indivíduos são usados como objetos
propagandísticos. O corpo passa a ser treinado e disciplinado a fim de espelhar a
“perfeição” nacional-socialista. Tudo torna-se passível de conversão
propagandística. (DIEHL, 1996, p.82).

De acordo com Diehl (1996), o mundo totalitário de Hitler precisava do apoio da propaganda

como forma de sustentar uma realidade artificial. Era obrigação da propaganda assegurar que

a imagem de Hitler fosse vendida e propagada de maneira correta para que aquele sistema por

ele pretendido se tornasse possível. A autora ainda afirma que Hitler foi inovador ao utilizar

artifícios propagandísticos no III Reich e o que fez sua propaganda ser tão eficaz foram

principalmente elementos coletados de várias fontes, como teatro, ópera, propaganda política
36

e dos meios de comunicação de massa que tinham acabado de nascer em meados dos anos 20.

Todos esses elementos foram usados para convencer o povo alemão.

Para garantir seu sucesso, Hitler observou alguns pontos eficazes para a propaganda.
Uma das principais regras citadas por ele era a de que não se deveria “dispensar o
ódio das massas”, isto é, deveria-se apontar o mínimo de inimigos possível a serem
combatidos e apenas um por vez. Assim, evitar-se-ia que as massas se
confundissem. Era preciso que se apresentassem um mundo maniqueísta, de fácil
compreensão e de idéias simplistas, pois essa massa deveria ser conquistada por
“seus sentimentos” e não por sua capacidade de análise. Quanto mais simplista e
radical a propaganda, mais seguro os resultados obtidos com ela. (DIEHL, 1996,
p.86).

Podemos observar que alguns elementos foram explorados pelo Partido Nazista, dentre eles a

águia, tida como rainha das aves e também empregada por César 13e Napoleão14, personagens

que Hitler admirava. A ave era tida como símbolo do poder e força divina. Outro elemento

marcante na propaganda nazista foi o símbolo da suástica, que indicava o ciclo de perpétua

regeneração.

Além dos símbolos do nazismo, outro elemento milhares de vezes repetido durante o III

Reich, foi a saudação Hitlerista. De acordo com Diehl (1996), a sociedade nacional-socialista

caracterizava-se pela ritualização, e a saudação “Heil Hitler” passava a ser obrigatória para

toda a sociedade. A autora ainda afirma que o gesto era tido como um ato patriótico de união.

13
“Líder militar e político da República Romana. As suas conquistas na Gália estenderam o domínio romano até
o Oceano Atlântico: um feito de consequências dramáticas na história da Europa. No fim da vida, lutou numa
guerra civil com a facção conservadora do senado romano, cujo líder era Pompeu. Depois da derrota dos
optimates, tornou-se ditador vitalício e iniciou uma série de reformas administrativas e económicas em Roma”.
Fonte http://pt.wikipedia.org/wiki/J%C3%BAlio_C%C3%A9sar .Acesso em 21 de maio de 2008.
14
“Napoleão Bonaparte, em francês Napoléon Bonaparte, nascido Napoleone di Buonaparte, (Ajaccio, Córsega,
15 de Agosto de 1769 — Santa Helena, 5 de Maio de 1821) foi o dirigente efectivo da França a partir de 1799 e
adoptando o nome de Napoleão I foi Imperador da França de 18 de Maio de 1804 a 6 de Abril de 1814, posição
que voltou a ocupar rapidamente de 20 de março a 22 de junho de 1815. Além disso, conquistou e governou
grande parte da Europa central e ocidental”. Fonte http://pt.wikipedia.org/wiki/Napole%C3%A3o_Bonaparte.
Acesso em 23 de maio de 2008.
37

Para Diehl (1996), um ponto importante para a propaganda e expansão de Hitler na Alemanha

foram os eventos de massa para a difusão do nacional-socialismo. Grandes eventos foram

realizados, proporcionando a mobilização das massas. E, de acordo com autora, sem essas

mobilizações o nacional-socialismo não seria possível.

Num sistema em que as massas são convocadas permanentemente a participar de


forma estética e ritual, o nazismo reúne e organiza seu público nos eventos e
cerimônias, permitindo, desta forma, a presença física da população no cenário
político. No entanto essa presença é apenas decorativa. O que se forma no nacional-
socialismo é a ilusão de que a população faz parte da política. Porém a participação
objetiva alimentar o imaginário nacional-socialista onde ela se refugia e do qual
acredita ser co-autora. (DIEHL, 1996, p.116).

Conforme relata a autora, durante os eventos proporcionados pelo III Reich Hitler ocupava

lugar central na estrutura, podendo, assim, explorar seu carisma e fascínio para a atração do

público e cativar as massas. A aparência do Führer era sempre perfeita. Hitler utilizava em

seus discursos expressões teatrais, cuidadosamente ensaiadas. O Führer nunca sorria enquanto

discursava, mas em contato com o público fazia questão de transmitir uma imagem de

protetor.

A realidade passa a confundir-se com o teatro e a política com o espetáculo. Esse


teatro é comandado pelo Führer, de importância crucial para a nova organização
psicológica. Ele comanda a massa que é convidada a participar ritualisticamente. A
população, assim, indo às festas do partido e assistindo aos desfiles e Às paradas
militares. Ela se entrega completamente ao regime totalitário. Dessa forma, a massa
não consegue romper o elo fascinante que a prende às estruturas totalitárias do
nacional-socialismo, vivendo em um estado de torpor coletivo. (DIEHL, 1996,
p.138).

E é a partir da construção do espetáculo criado por Hitler, que se fez com seu poder de

persuasão algo que jamais foi visto no cenário público. O Führer utilizou-se do cinema, como

poder de massificação e construiu com a ajuda de Leni Riefenstahl documentários que

organizaram o pensamento alemão com relação a postura de Hitler.


38

Para entendermos melhor o propósito dos documentários da época, segundo Nichols (2005),

todo filme é um documentário. Ele os diferencia em documentários de satisfação de desejos,

ou seja, os chamados de ficção e documentários de representação social, os de não-ficção. Os

documentários de não-ficção são aqueles que representam aspectos da matéria de que é feita a

realidade social.

Literalmente, os documentários dão-nos a capacidade de ver questões oportunas que


necessitam de atenção. Vemos visões (fílmicas) do mundo. Essas visões colocam
diante de nós questões sociais e atualidades, problemas recorrentes e soluções
possíveis. O vínculo entre o documentário e o mundo historio é forte e profundo. O
documentário acrescenta uma nova dimensão à memória popular e à história social.
(NICHOLS, 2005, p.27).

Nichols (2005) observa que no documentário existem três diferentes formas de

representações. A primeira é a que oferece um retrato reconhecível do mundo e que representa

situações com total fidelidade. A segunda representação colocada pelo autor diz respeito aos

interesses dos outros, ou seja, alguns documentários podem assumir o papel de representação

pública. Muitos desses documentários podem ser financiados por instituições públicas. Em

terceiro lugar Nichols (2005) apresenta os documentários que podem representar o mundo da

mesma maneira com que um advogado representa os interesses de um cliente. Nesse caso os

documentários passam a intervir na opinião pública.

Entendemos, portanto, que os documentários exercem a função de representação auditiva e

visual histórica de um determinado ponto de vista de indivíduos, grupos e ou instituições. No

caso dos documentários, Nichols (2005) afirma que, para tornar possível a filmagem de um

documentário, é importante que as pessoas ali apresentadas, ou seja, os atores sociais daquele

filme se portem de maneira mais natural possível diante das câmeras. Segundo Nichols

(2005), um documentário pode ter efeitos imprevisíveis sobre os que estão representados nele.
39

A ética existe para regular a conduta dos grupos nos assuntos em que regras
inflexíveis, ou leis, não bastam. Devemos dizer às pessoas filmadas por nós que elas
correm o risco de fazer papel de bobas ou que haverá muitos que julgarão sua
conduta de maneira negativa? (NICHOLS, 2005, p.35).

E ainda podemos concluir, de acordo com as análises de Nichols (2005), que alguns cineastas,

ao representarem pessoas, que não conhecem, correm o risco de explorá-las. Já aqueles que

trabalharam com pessoas conhecidas têm o dever de representá-las de maneira responsável,

mesmo que, segundo o autor, isso signifique sacrificar a própria opinião. Para Nichols (2005),

alguns cineastas se vêem em situações adversas quando irão representar pessoas de

instituições que são patrocinadoras do próprio documentário. Esse é o caso do documentário

O Triunfo da Vontade, encomendado por Hitler e seu partido nazista.

Outro ponto importante discutido pelo autor é de que o documentário define-se pelo contraste

com filme de ficção e que não é uma representação da realidade, mas sim uma representação

do mundo em que vivemos.

Assim podemos dizer que a representação também está ligada às características da voz

expressada pelo documentarista. Segundo Nichols (2005) se os documentários representam

questões encontradas no mundo em que vivemos, ele fala desse mundo através de som e de

imagens. A voz no documentário defende uma causa, e essa voz está diretamente relacionada

ao estilo do filme. Essa voz, segundo Nichols (2005), representa o ponto de vista social do

cineasta.

A voz do documentário não está restrita ao que é dito verbalmente pelas vozes de
“deuses” invisíveis e a”autoridades” plenamente visíveis que representam o ponto de
vista do cineasta – e que falam pelo filme – nem pelos atores sociais que
representam seus próprios pontos de vista – e que falam no filme. A voz do
documentário fala através de todos os meios disponíveis para o criador. (NICHOLS,
2005, p.76).
40

Essa voz proposta por Nichols (2005) também utiliza-se de fatores como a disposição de sua

oratória durante o filme. Para o autor, a disposição mais freqüente é a abertura que chame a

atenção do público, esclarecimento do que já se conhece sobre a questão a ser discutida e um

argumento a favor de uma causa e ou ponto de vista. O poder do documentário, para governos

e outros patrocinadores institucionais, está na capacidade de unir prova e emoção na

organização de som e imagens marcantes.

A produção de O Triunfo da Vontade, de Leni Riefenstahl, por exemplo, continua


sendo uma história controversa das ambições artísticas de Riefenstahl de fazer
filmes de grande apelo emocional, mas livres de intenções propagandísticas –
segundo relatos da própria Riefenstahl - , com a história da pressão do partido
nazista por um filme que gerasse uma imagem positiva num momento em que seu
poder ainda não estava inteiramente consolidado e sua liderança ainda não
inteiramente concentrada em Hitler – do ponto de vista da maioria dos historiadores
do cinema. As interpretações desse filme muitas vezes pegam o fio de uma ou outra
dessas histórias, elogiando a obra, como grande peça cinematográfica, ou
condenando-a, como exemplo acintoso de propaganda nazista. (NICHOLS, 2005,
p.93).

O documentário, em geral, trata do esforço do cineasta de nos convencer, persuadir em uma

determinada visão do mundo. Dessa maneira o documentário ativa a nossa percepção estética

e também nossa consciência social. Essa persuasão, como relata Nichols (2005), também

acontece pela capacidade que os documentários têm de transmitir, através das imagens, uma

impressão da realidade.

O autor afirma que o documentário somente acontece quando adquire voz própria.

Historicamente o autor ainda revela que é a partir da década de 1920 que o documentário

começa a andar com as próprias pernas. Sabemos que um acontecimento encenado pode ser

filmado para ser parte de um registro histórico de maneira observacional. Mas sabe-se que

esses eventos não existiriam se não fosse a presença das câmeras.


41

Essa inversão assumiu proporções gigantescas em um dos primeiros documentários


“observativos” Triunfo da Vontade, de Leni Riefenstahl. Depois de um conjunto
introdutório de legendas que montam o cenário para o comício do Partido Nacional-
Socialista alemão em Nuremberg, em 1934, Riefenstahl observa os acontecimentos
sem nenhum outro comentário. Os acontecimentos – predominantemente, desfiles –
ocorrem como se a câmera simplesmente gravasse de qualquer maneira o que teria
acontecido. Depois de duas horas de projeção, o filme pode dar a impressão de ter
registrado acontecimentos históricos fieis e irrefletidamente demais. (NICHOLS,
2005, p.151).

Nichols (2005) ainda argumenta que muito pouco teria acontecido se não fosse o partido

nazista ter a intenção de propagandear o seu comício. E ainda afirma que os acontecimentos

presentes em O Triunfo da Vontade (1934) foram cuidadosamente planejados, demonstrando,

assim, o poder que a imagem tem de representar o mundo histórico.


42

4 ANÁLISE
A burguesia vê, como no teatro e no cinema, no lixo da literatura e
na torpeza da imprensa, dia a dia, o veneno se derramar sobre o
povo, em grandes quantidades, e admira-se ainda do precário
"valor moral", da "indiferença nacional" da massa desse povo,
como se a sujeira da imprensa e do cinema e coisas semelhantes
pudessem fornecer base para o conhecimento das grandezas da
Pátria, abstraindo-se mesmo a educação individual anterior.
Adolf Hitler em Minha Luta

4.1 Metodologia

O presente trabalho retrata a construção da imagem de Hitler como líder carismático, e se

propõe a fazer uma análise dos documentários, O Triunfo da Vontade (1934), de Leni

Riefenstahl e Arquitetura da Destruição (1994), de Peter Cohen. É importante ressaltar que os

documentários não foram analisados com uma visão de técnica cinematográfica, mas sim

como arcabouço ilustrativo das teorias de Max Weber com relação à idéia de construção ou

não de um líder.

A hipótese a ser verificada é a de que Hitler usou de estratégias muito bem definidas para

alcançar seus objetivos, mas seu carisma é algo legitimado nas teorias de Weber. Acreditamos

que carisma pode ser um dom, utilizado para o bem ou para o mal. No caso de Hitler, a

utilização do carisma teve conseqüências históricas que marcaram a humanidade. A partir das

teorias de Max Weber podemos criar um arcabouço teórico que melhor explica a colocação de

Hitler como líder na Alemanha nazista.


43

4.2 Filmografia

4.2.1 O Triunfo da Vontade

Um documentário encomendado por Hitler e seu partido nazista, de 124 minutos, O Triunfo

da Vontade (1934), arquitetado por Leni Riefenstahl, cobre os acontecimentos ocorridos

durante o Sexto Congresso de Nuremberg em 1934. Com o intuito de documentar os

primeiros anos do partido nazista, para que as futuras gerações pudessem usufruir da história

obtida pelo III Reich, O Triunfo da Vontade se tornou ícone do cinema mundial.

O Triunfo da Vontade de Leni Riefenstahl é tido hoje como um dos grandes filmes

documentais de todos os tempos. Mesmo porque a cineasta Leni Riefenstahl para fazer a

filmagem utilizou de instrumentos nunca antes vistos em construções cinematográficas. Então

por si só o filme já causa efeito. Leni Riefenstahl nasceu na Alemanha em 1902, ou seja,

participou diretamente de todo o processo do nazismo na Alemanha. E em 1932 ela foi

escolhida por Hitler pra fazer um documentário sobre o 4º Congresso de Nurenberg. Esse

congresso acontecia anualmente e aproveitando toda a comossão popular rodou o filme e foi

paga pelo partido nazista para fazê-lo.

A visão de Leni Riefenstahl é explicitada em 12 cenas que alternam imagens celebrando a

raça, a unidade, a ordem e a disciplina com insistentes closes sobre Hitler, o personagem

principal de todo o documentário. Para que as filmagens acontecessem, foram utilizados

truques e artifícios cinematográficos nunca antes vistos até então. De elevadores içados a

topos de edifícios a patins, tudo foi feito pela cineasta para que se pudesse registrar os

melhores ângulos daquele evento. A cineasta conseguiu em menos de duas horas de filme

focar em Hitler a idéia de que ele seria a salvação do povo alemão.


44

4.2.2 Arquitetura da Destruição

No documentário Arquitetura da Destruição (1992), o diretor Peter Cohen exibe as táticas

utilizadas por Hitler para difundir a ideologia nazista. É importante ressaltar que o

documentarista em questão é um cineasta sueco, que nasceu um ano após o término da

Segunda Guerra Mundial. Seu pai foi um judeu alemão perseguido pelo regime nazista.

Portanto o cineasta narra com muita propriedadde a apropriação do líder da Alemanha.

Em um momento de decadência pós Primeira Guerra Mundial, no qual a Alemanha havia sido

derrotada, o povo alemão precisava de um apoio e encontrou-o em Hitler. Nesse período,

Adolf Hitler foi o próprio Messias encarregado de reerguer aquele país.

Como forma de traçar a trajetória de Hitler, Peter Cohen apresenta gravuras compostas por

Hitler, (que, como já citado nos capítulos anteriores, sempre sonhou em ser artista plástico,

trabalhar com artes, mas na verdade era tido como um artista medíocre). Mesmo assim, suas

gravuras, como mostra Cohen, posteriormente viraram projetos de grandes obras

arquitetônicas na Alemanha nazista. O documentário feito no ano de 1992 é tipo como um dos

clássicos quando se trata da narração historiográfica de Hitler como arquiteto principal de

toda a barbárie ocorrida na Alemanha.

Um dos pontos chaves do documentário é a apresentação em meio a toda crise, no período

entre guerras, de uma exposição de Arte Degenerada15. Para Hitler toda e qualquer obra de

15
“Termo utilizado pelo regime nazista da Alemanha para descrever virtualmente toda a arte moderna. Tal arte
foi banida com base de que era não-germânica ou de natureza "judia-bolchevique", e aqueles identificados como
artistas degenerados estavam sujeitos a sanções. Tais incluíam ser despedido do magistério, ser proibido de
exibir ou vender a própria arte e, em alguns casos, ser proibido inteiramente de produzir arte”. Fonte
http://pt.wikipedia.org/wiki/Arte_degenerada. Acesso em 24 de maio de 2008.
45

arte moderna era medíocre e relacionada diretamente ao bolchevismo e aos judeus. Assim

como apresentado no documentário, essas obras, para Hitler, mostravam o pior da raça

humana, deformações, doenças mentais e genéticas.

Assim como Cohen apresenta em Arquitetura da Destruição, Hitler se desfez de toda aquela

“parafernália” moderna e implantou obras de arte renascentistas que enfatizavam a beleza e a

pureza da raça humana, querendo assim purificar a mente dos alemães e reformar o que o

cineasta nomeia de Medicina Nazista. É a partir desse momento que Cohen apresenta todas as

atrocidades absurdas feitas por médicos nazistas com o intuito de purificar a raça ariana.

Relatórios médicos eram forjados e muitas pessoas com bom estado de saúde eram registradas

como loucas, e, então, eliminadas por não se encaixarem nos padrões estéticos da beleza

ariana. O filme mostra as estratégias de Hitler para concretizar sua arquitetura e de como

pretendia dar dimensão à sua megalomania.

4.3 Análise dos documentários

4.3.1 Um espetáculo cinematográfico hipnótico e terrificante

O documentário O Triunfo da Vontade, rodado em Nuremberg em 1934, durante o Congresso

do Partido Nazista, é um dos documentários mais comentados no meio cinematográfico. A

cineasta Leni Riefenstahl usou e abusou de novas técnicas cinematográficas para colocar a

imagem de Hitler como salvador do povo alemão.

Como descrito no capítulo três toda forma de documentário nos mostra uma direção, uma

visão do mundo e da realidade. E é a partir da visão do cineasta que podemos entender

questões sociais, históricas e ou culturais. Assim como sabemos Leni Riefenstahl foi
46

contratada para criar um documentário sobre o Congresso do Partido Nazista, mas ao mesmo

tempo tinha como dever mostrar ao mundo como era a Alemanha nazista e por quem ela era

doutrinada.

Com o intuito de representar de maneira mais “messiânica” possível a imagem de Hitler, a

cineasta não poupou esforços para tornar O Triunfo da Vontade um documentário onde

encontramos imagens e argumentos que fazem-se reais diante de uma realidade maquiada.

Podemos aqui afirmar que o documentário de Riefenstahl utilizou-se de inúmeros truques de

câmeras e até mesmo teatros (que contavam com a participação do povo alemão), para que

melhor fosse vendida a imagem do Führer. Em determinados momentos do filme o

movimento coordenado das tropas nazistas com a trilha sonora deixam claro que os habitantes

da cidade estavam em um estado de êxtase diante de Hitler e seus discursos teatrais.

O que Leni Riefenstahl fez foi traçar um perfil do poder de Hitler, explorando as conquistas, a

consolidação e a expansão de seu poder carismático diante das massas. Construir o perfil do

Führer em O Triunfo da Vontade além de fazer uma leitura política de tudo o que acontecia na

época apresentou uma imagem messiânica de Hitler. Afinal, desde o primeiro momento do

documentário a cineasta abusa da grandiosidade de um espetáculo ambicioso.

Ao que tudo indica Hitler foi sem duvida um carismático consciente, ou seja ele sabia

exatamente o que queria e como conseguiria realizar seus planos. A idéia de uma líder

carismático é observada em O Triunfo da Vontade em que Hitler exerce um fascínio

magnético sobre todos os que estão ao seu redor, grita discursos (hoje incabíveis), mexe os

braços como se regesse uma orquestra e faz-se obedecer por inúmeras pessoas.
47

Podemos detectar um fanatismo quase que religioso por Hitler que em alguns momentos do

filme é ovacionado até mesmo por crianças. A cena que mais chama a atenção é um bebê no

colo de sua mãe fazendo o famoso gesto nazista para Hitler enquanto ele passava. A narrativa

utilizada por Riefenstahl traz ao público um Hitler forte e poderoso capaz de calar uma

multidão enquanto fala.

Em O Triunfo da Vontade é notável que a voz exercida pela documentarista defende uma

causa, o regime nazista e Hitler. O papel de Leni Riefenstahl na propagação do nazismo na

Alemanha. Para muitos a cineasta fez com que a imagem de Hitler tivesse uma representação

irreal, ou seja, mostrou um Hitler com ideais positivistas, em que o líder aparece sempre como

salvador e indivíduo bem feitor, o que na verdade seria o contrário.

A imagem negativa do contexto histórico, já relatado no capítulo dois, em que o povo alemão

estava em meio a falta de coerência cultural, derrotas pós-guerra faziam com que a Alemanha

buscasse sua unificação. Assim a idéia de um líder ditador para a Alemanha era como tida

como a salvação, mesmo que de uma forma cega para aquele país.

Dentre os elementos analisados em primeira ordem podemos ressaltar as imagens em que

Hitler aparece relacionado diretamente com a bandeira do nazismo e com a águia. Ainda

dentro dos elementos, destacam-se os narrativos nos quais se podem constatar os discursos

promovidos por Hitler em praça pública. Neles, o Führer apela para trunfos como doenças, a

fim de amedrontar os alemães quanto ao purismo da raça ariana.

A imagem composta por Riefenstahl de um líder salvador em seu documentário é realçada a

partir, por exemplo, de trilha sonora que tem papel de realçar os elementos que constroem a
48

imagem de Hitler. Com óperas de Wagner, Leni Riefenstahl mescla cenas de: imagens de

endeusamento da raça ariana, ou a população devotada a um messias ícone de disciplina e

força. Através de estudos relacionados a Weber (1963), podemos constatar, em um primeiro

entendimento, que a figura de um líder carismático não é muito comum, e que muitas vezes

esse líder passa a ser o próprio Deus na Terra para determinados grupos. E é exatamente o que

podemos notar no documentário de O Triunfo da Vontade.

Observamos que logo nos primeiros momentos do documentário, no dia 5 de setembro de

1934, exatos 20 anos após a Primeira Guerra Mundial, 16 anos após todo o sofrimento

alemão, Hitler voa sobre o céu de Nuremberg. E logo no início do documentário já se nota

como Riefenstahl elevou Hitler ao mais alto pedestal. Cenas filmadas de dentro do avião

mostram o céu de Nuremberg: grandes palacetes e casas imponentes apresentam a tentativa de

mostrar uma Alemanha fortificada. Do alto do avião já se podia notar homens marchando e a

população se arrumando para a chegada do Führer.

Logo quando desce do avião Hitler se depara com uma população enaltecida, inclusive as

crianças que ali estavam. É importante ressaltar que em vários momentos do documentário

Riefenstahl utiliza crianças e mulheres sorridentes para dar um ar delicado ao acontecimento.

Mulheres e crianças se apresentam em um fanatismo incomum, ouvem-se gritos de saudação

à chegada de Hitler, que acena animado.

Um momento interessante de se destacar no documentário é que Hitler sempre conseguiu

atingir seu público independente de qual fosse. Algumas cenas, como crianças subindo nas

pontas dos pés para que pudessem ver melhor o Führer, são impressionantes. Em

determinados momentos Hitler até apresenta semblantes angelicais, se é que isso é possível,
49

diante de senhoras com filhos no colo. Mas ao mesmo tempo, diante de seu exército Hitler se

transforma num homem poderoso capaz de calar uma multidão apenas com um olhar.

Outro momento impactante do filme é em meio a uma carreata em que Hitler se apresenta

ereto, fardado, e com semblante fechado uma criança de colo oferece um buquê de flores para

o Führer que por sua vez, retribui com um sorriso. Mas como sorrisos não eram o forte de

Hitler, Riefenstahl resolveu usar e abusar de imagens de crianças sorridentes e mulheres que

acenam com lencinhos brancos como se Hitler fosse um desses atores do cinema

hollywoodiano.

Assim podemos comprovar mais uma característica de liderança carismática em que o povo

demonstra devoção, amor incondicional ao Führer que mais parecia um messias. Como no

exemplo da imagem da criança no colo da mãe que praticamente pede a benção de Hitler em

meio a um enorme espetáculo.

Nota-se que a todo momento a cineasta tenta ressaltar que quem tem o poder é Hitler e que

somente ele poderá salvar a Alemanha do resto do mundo. Em determinados momentos Hitler

é ovacionado por centenas de pessoas, não importando o local ou horário. Em frente ao hotel

em que Hitler se hospeda em meio à escuridão, milhares de pessoas fazem vigília e bandas

tocam em homenagem ao Führer que observa atentamente da janela. Logo acima de sua

janela, no topo do hotel, a imagem da suástica se ilumina e mostra como Nuremberg se

preparou para sua chegada.

O Triunfo da Vontade também faz uma espécie de propaganda de como o III Reich tratava

seus soldados. Em uma das cenas a juventude nazista é apresentada em um acampamento fora
50

da cidade de Nuremberg para treinamento militar. Milhares de barracas e de jovens estão

enfileirados, milimetricamente, em campo aberto. Jovens tocam instrumentos, limpam seus

sapatos e uniformes, se barbeiam, brincam e se alimentam com uma felicidade aparente. A

comida parece farta, claramente tudo oferecido pelo Partido Nazista.

Durante todas as quase duas horas de documentário é notório que a cineasta tentou montar,

com a melhor precisão possível, como o povo alemão era feliz com Hitler no poder. Em

determinado momento do filme Hitler faz a revista dos soltados. Todos enfileirados e

fardados à espera que seu Führer lhes cumprimentassem. De fato é o que acontece: ele olha

nos olhos dos primeiros da fila e faz cara de quem gosta do que vê afinal seus companheiros

são jovens e arianos.

Um dos últimos momentos de O Triunfo da Vontade em uma cena de plano aberto, ao ar

livre, soldados gritam um texto, claramente decorado como um teatro, todos imóveis seguindo

um mesmo ritmo de fala, onde, em determinados momentos, alguns soldados falam

diretamente olhado para a câmera. Eles dizem que estão a serviço do III Reich e cantam o

hino da Alemanha. Enquanto isso, Hitler observa, de um palanque ao alto, com ar satisfeito, e

começa seu discurso que deixa as pessoas em estado de êxtase.

Gritando e gesticulando muito Hitler pede que os alemães lutem pelo país com toda devoção

de suas almas. Diz ainda que eles precisam aceitar privações sem nunca decair e sempre

serem corajosos em nome de sua honra e pátria. Enquanto isso as imagens mostram soldados

jovens, quase crianças, compenetrados no que o Führer transmite. Em seus discursos, fica

claro nas imagens do documentário que Hitler ficava “possuído” por algo inexplicável.
51

Sempre com a mesma imagem: fardado, com chicote, um pastor alemão ao lado o Führer

mantinha a característica de semideus.

4.3.2 A tentativa de estetização de um país

Diferentemente de O Triunfo da Vontade de Leni Riefenstahl, o documentário Arquitetura da

Destruição de Peter Cohen foi criado em 1992 após todo o fato histórico que norteia este

trabalho ter acontecido. Arquitetura da Destruição é tido como um dos melhores estudos

sobre o Nazismo. Com imagens verídicas, o cineasta mostra toda a trajetória de Hitler até o

fim da Segunda Guerra Mundial com a sua queda.

Como sabemos e já discutimos anteriormente, todo documentário mostra a visão de uma

realidade e essa se dá a partir do olhar minucioso do documentarista. Ainda podemos pensar

que o discurso de um filme nos moldes de um documentário é uma narrativa composta por

imagens que serviram de base para afirmar a visão do documentarista.

A princípio, o filme revela a idéia de criação de uma nova raça, pura e livre de anomalias.

Para ilustrar esse fato Cohen apresenta filmes gravados na época contra a arte degenerativa.

Essa arte, como já citada anteriormente, era toda e qualquer obra que tinha cunho moderno.

Hitler associava muitas dessas obras com pessoas doentes e com grandes anomalias. Dessa

forma, o documentarista exprime de maneira direta a realidade dos fatos que circundavam a

trajetória de um líder carismático que, com seu poder de persuasão, disfarçou inúmeras

atrocidades.
52

Um dos exemplos apresentados por Cohen é o filme Vítimas do Passado, que era divulgado

nos cinemas por toda a Alemanha. O filme nazista tinha o intuito de mostrar para a população

que todas as obras da modernidade eram tendenciosas à representação e tolerância do

bolchevismo e dos judeus. Além disso, as imagens mostram que a arte moderna confrontava

os valores e ideais de beleza e saúde almejados pelo III Reich. Como Hitler era contra a arte

moderna, resolveu assim criar sua própria galeria de arte em que divulgava apenas o que

achava realmente importante e belo para o povo alemão. Dessa forma, como mostra Peter

Cohen, todas as obras tidas como arte degenerada foram confiscadas.

O filme é um olhar crítico sobre tudo o que aconteceu durante o período em que Hitler esteve

no poder. De fato, podemos perceber que o tipo de narração, de discurso utilizado por Peter

Cohen é bem diferente do que Leni Riefenstahl apresentou em seu documentário que trazia

Hitler como um semideus. Portando, diferentemente de O Triunfo da Vontande, em que o

Führer aparece como Messias, em Arquitetura da Destruição, Hitler é tido como culpado por

toda a desgraça ocorrida. Alguns momentos retratados por Peter Cohen são de total relevância

para esse trabalho, já que orientam historicamente os passos de Hitler.

Com a idéia de pureza e beleza ariana Hitler resolve construir uma nova Alemanha ainda mais

genuína. Novas construções são realizadas e Hitler passa a ser o próprio arquiteto das

transformações. Em algumas cenas o cineasta mostra o Führer abaixado, com olhar fixo em

enormes maquetes de seus sonhos que cada vez mais tinha proporções inacreditáveis. O

Führer queria reconstruir Berlim e a base de seus ideais foi muito bem retratada pelo cineasta

com gravuras feitas pelo próprio Hitler. A maior parte das gravuras pintadas pelo ditador se

transformou em projetos que tinham a finalidade de embelezar o país.


53

Um momento importante dessa idéia de megalomania de Hitler foi quando ele resolveu fazer

uma reforma em sua casa. Desenhou o projeto querendo assim transformar sua residência em

um castelo. As imagens das obras são apresentadas no documentário de Cohen e convalescem

de um comentário árduo – a obra obviamente não deu certo, erros no projeto.

Com o exemplo anterior podemos aqui concluir que o efeito do documentário de Peter Cohen

é diferente do que Leni Riefenstahl abordou. O documentarista lança mão da técnica de

franqueza e intimidade com o assunto. Ele se coloca como um documentário que ao mesmo

tempo pode ser objetivo e subjetivo. E é exatamente nessa subjetividade de seu discurso que

Peter Cohen faz com que cresça a sua credibilidade diante de uma análise histórica. Assim

como vimos no terceiro capítulo, a voz do documentário atesta o caráter do cineasta que,

como Peter Cohen, utiliza a narração com imagens, microdocumentários e fotografias

fundidas em uma locução com autoridade teórica.

Peter Cohen retratou o poder de liderança e dominação de Hitler no exemplo da eutanásia de

uma criança. A primeira morte por indução na Alemanha aconteceu quando uma criança

nasceu cega, sem uma perna e com uma anomalia nos braços. Hitler muito rapidamente

mandou matar a criança e obrigou o médico a assinar e forjar o atestado de óbito. Mais tarde,

como apresenta Cohen, esses casos obviamente aumentariam.

Ainda sobre a eutanásia, o documentarista apresenta uma cópia do primeiro Programa de

Eutanásia16 do país, assinado no dia 1 de setembro de 1939, data que coincide com o início da

guerra. Para o documentarista, a data foi escolhida porque a guerra chamaria mais atenção do

16
“Prática pela qual se abrevia a vida de um enfermo incurável de maneira controlada e assistida por um
especialista”. Fonte http://pt.wikipedia.org/wiki/Eutan%C3%A1sia. Acesso em 21 de maio de 2008.
54

que o programa, o que de fato aconteceu. Foram criados formulários médicos, estes

apresentados no documentário, para que durante as consultas os médicos os seguissem.

Dentre as perguntas rotineiras estavam: religião, raça, aparência e se o indivíduo era ou não

judeu. Dependendo da resposta, a pessoa, doente ou não, era assassinada.

Uma das cenas mais impactantes do documentário são as câmeras de gás, onde eram jogados

os corpos de pessoas tidas como não-puras. No documentário, Cohen relembra que em

determinado período tantas pessoas eram exterminadas que a fumaça que saía das chaminés

era tamanha que muitas vinham com fios de cabelos das vítimas. Com essa nova informação,

representada por imagens marcantes, Hitler, que antes é tido como um Messias salvador, na

visão do documentarista se transforma em um monstro capaz de cometer tamanha brutalidade

às custas de seu poder.

Como líder, Hitler tinha suas estratégia de auto-elevação diante das massas; assim, em meio à

guerra, foi a Paris e gravou sua visita em um mini documentário. Essas cenas são apresentadas

em Arquitetura da Destruição, mas com uma visão bem diferente da que foi apresentada na

época. Cohen afirma que as filmagens foram feitas em uma Paris deserta, eram por volta das 6

horas da manhã, e por esse motivo Hitler pôde desfilar pelo Arco do Triunfo e pela Torre

Eiffel em carro aberto. Tudo foi milimetricamente produzido e encenado.

Arquitetura da Destruição mostra o outro lado da história, apresenta o lado mais sombrio e

perverso de toda uma farsa teatral de Hitler e seu Nacional Socialismo. É nítido nesse

documentário que todas as idéias do Führer foram colocadas em prática. Uma delas está

relacionada com sua ida a Paris. Durante o documentário Cohen comenta que, ao partir de
55

Paris, Hitler comentou que sempre sonhou em conhecer a Cidade Luz, mas quando Berlim

estivesse reformada Paris se tornaria a sua sombra.

Outro ponto importante do documentário é quando Hitler decide utilizar a eutanásia em seus

próprios soldados feridos durante os ataques com a União Soviética. O Führer propõe assim a

política de extermínio: judeus, ciganos, oficiais políticos e soldados feridos eram mortos pela

SS. O documentarista apresenta os primeiros campos de extermínio e os caminhões de gases

onde eram presos os refugiados. Eram verdadeiraS fábricas de cadáveres. Como comenta

Cohen, em uma das cenas de campos de refugiados, as fábricas de morte faziam o saneamento

antropológico na Alemanha.

Fazendo uso da metalinguagem, dentro do próprio documentário Cohen apresenta pequenos

documentários feitos no período do genocídio. Um deles se chamava O Judeu Eterno, em que

os nazistas comparavam o povo judeu a ratos imundos. E ainda em um documentário que foi

divulgado em todos os cinemas alemães da época, denominado Pequena Guerra: modo

efetivo de matar as pragas, os nazistas mostravam donas de casa desinfetando seus lares com

gases, que eram totalmente eficientes, numa alusão ao antisemitismo ligado a uma questão de

higiene.

Dessa forma Arquitetura da Destruição mostra como Hitler utilizava de técnicas de lavagem

cerebral no povo alemão com respeito à formação de um novo homem. Hitler foi até o fim

com suas idéias e fantasias, envolvendo a Alemanha e todos aqueles que estavam diretamente

ligados àquele país. Com tudo isso, acreditamos que o documentário de Peter Cohen traz à

tona um ponto de vista importante sobre o poder que tem um líder. Sem dúvidas, Hitler foi

um dos maiores líderes carismáticos, mas passou de super-homem, semideus e messias a


56

genocida paranóico. Para finalizar seu documentário Peter Cohen, utiliza uma das imagens

mais impactantes da história, que é de Berlim totalmente destruída pelos ataques soviéticos:

absolutamente nada restou do sonho de Hitler.


57

5 CONCLUSÃO

Se, no começo e durante a Guerra, tivéssemos submetido à


prova de gases asfixiantes uns doze ou quinze mil desses
judeus, desses corruptores de povos, prova a que, nos campos
de batalha, se submeteram centenas de milhares dos nossos
melhores operários alemães de todas as Categorias, não se
teria visto o sacrifício de milhões de nossos compatriotas das
linhas da frente. A eliminação de doze mil patifes, no momento
oportuno, teria talvez influído sobre a vida de um milhão de
homens honestos que muito úteis poderiam 'ser à nação de
futuro.
Adolf Hitler em Minha Luta

Durante toda a vida, Hitler se empenhou em dissimular e em idealizar um personagem para si

mesmo. Não há outro exemplo na história de um líder que tenha se dedicado tão

metodicamente a estilizar a própria imagem e a torná-la humanamente indecifrável. Sua vida

pública nada mais foi do que um grande teatro em que os maiores personagens foram as

vítimas de sua loucura.

Hitler tinha total domínio sobre sua vocação diante de milhares de pessoas e principalmente

da virtude do poder que viam nele. Soube colocar em prática a receita de como ser um

profeta, já que tinha o elemento-chave para achar que conquistaria o mundo, o fascínio do

carisma.

O Führer tornou-se a sua própria lenda e diante de suas dissimulações e peças teatrais, que por

sua vez, eram muito bem elaboradas, mergulhou em seu próprio mundo fantasioso. Assim

como entendemos que um líder carismático tem a capacidade de dominar toda uma nação,

essa mesma nação espera de seu líder respostas eficazes e eficientes para estar em tal posto.

Hitler sabia muito bem como fazer com que o povo alemão o escolhesse e aceitasse como

líder.
58

A hipótese de que ambos os documentários, mesmo que um seja de cunho propagandista e o

outro analítico de um fato histórico, constroem a imagem de Hitler como um Líder

Carismático, de acordo com as categorizações de Max Weber foi confirmada.

Hitler utilizou-se de todas as estratégias comunicacionais existentes na época (cinema, rádio,

jornais e folhetins) para propagandear seus ideais e tentar dominar o mundo. O cinema, como

foi destacado nesta pesquisa, foi sem dúvida a maior “jogada” do Führer, já que muitas

pessoas só ficavam sabendo dos acontecimentos através dos telões. Criar um filme, no estilo

documentário, em meio a um Congresso do Partido Nazista que atendia cerca de 700.000

visitantes, com o apoio de mais de 170 trabalhadores, entre cinegrafistas, assistentes de

câmera, em 1934, realmente é algo digno de nota.

Em O Triunfo da Vontade, Hitler é um poderoso messias, perfeito para as mulheres, ídolo

para as crianças e exemplo de força e soberania para os homens. É dessa maneira que a

cineasta Leni Riefenstahl apresenta a adoração e comoção de toda uma nação diante do líder

que lhes trará proteção. Contrariando a idéia do messias em Arquitetura da Destruição, Peter

Cohen retrata anos depois do término da Segunda Guerra Mundial fatos espantosos desse

mesmo messias.

Afinal, Hitler, ao que tudo indica, não passou de um personagem no qual aos poucos a famosa

luz própria foi se apagando. Ser um líder requer não somente ser uma imagem, mas se firmar

em atos que comprovem e reafirmem sua capacidade de liderança. Como comentamos no

primeiro capítulo desse estudo, ser um líder carismático é mais complexo do que parece. Ao

que tudo indica o peso da derrota de um líder é muito mais demorado de se absorver do que o

simples fato de ser um Führer.


59

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BERGER Peter L.; LUCKMANN Thomas. A construção social da realidade. Petrópolis:


Vozes, 1996.
COUTO, Sérgio Pereira. Dossiê Hitler. São Paulo: Universo dos Livros, 2007.
DIEHL, Paula. Propaganda e Persuasão na Alemanha Nazista. São Paulo: Annablume, 1996.
FEST, Joachim C. Hitler, v.1. 2ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006.

FEST, Joachim C. Hitler, v.2. 2ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006.

FURHAMMAR, Leif; ISAKSSON, Folke; MONTENEGRO, Júlio Cezar. Cinema e política.


Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001.
HITLER, Adolf. Minha Luta. São Paulo: Moraes, 1983.
JIMÉNEZ, Pablo Corés. A estratégia de Hitler: o messias do Apocalipse: as raízes ocultas do
nacional-socialismo. 2ª ed. São Paulo: Madras, 2007.
KRACAUER, Siegfried. De Caligari a Hitler: uma história psicológica do cinema alemão.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1988.
LAMBERT, Angela. A história perdida de Eva Braun. 1ª ed. São Paulo: Globo, 2007.
LINDHOLM, Charles. A sociologia do irracional: Max Weber e Émile Durkheim. In:
LINDHOLM, Charles. Carisma – Êxtase e perda de identidade na veneração ao líder. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1993.
NICHOLS, Bill. Introdução ao Documentário. São Paulo: Papirus, 2005.
PENAFRIA, Manuela. O Documentarismo do Cinema. Disponível em
<http://www.bocc.ubi.pt/>, acessado em 15/09/2007.
PENAFRIA, Manuela. O ponto de vista no filme documentário. Disponível em
<http://www.bocc.ubi.pt/>, acessado em 15/09/2007.
PENAFRIA, Manuela. Realismo Documentário, Teoria da Amostragem e Semiótica
Peirceana. Disponível em <http://www.bocc.ubi.pt/>, acessado em 23/02/2007.
PESSOA, Fernão R.. O que é Documentário? Disponível em <http://www.bocc.ubi.pt/>,
acessado em 10/08/2007.
RIBEIRO, Júnior João. O que é Nazismo. 2ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1987.
RUIZ, João Álvaro. Metodologia científica: guia para nos estudos. São Paulo: Atlas, 1996.
WEBER, Max. Os três tipos puros de dominação legítima. In: COHN, Gabriel (org.). Max
Weber: sociologia. 3ª ed. São Paulo: Ática, 1987. pp. 128-141. (Col. Grandes Cientistas
Sociais).
WEBER, Max; GERTH, H. & MILLS, Wright (Orgs.), Max Weber: Ensaios de Sociologia. 6ª
ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1963. pp. 283-291.
60

ANEXOS

You might also like