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16
maio
2009
ano II
ficina
SAMIZDAT 16
maio de 2009
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Sumário
Por que Samizdat? 6
Henry Alfred Bugalho
ENTREVISTA
Katia Suman e Claudia Tajes 8
MICROCONTOS
Henry Alfred Bugalho 14
Caio Rudá 14
Joaquim Bispo 15
RECOMENDAÇÕES DE LEITURA
Estados Unidos: A Formação da Nação 18
Guilherme Augusto Rodrigues
CONTOS
A Pedra do Olho Divino 30
Carlos Alberto Barros
Sonhos de Batata 36
Maria de Fátima Santos
A Luz de Delft 38
Joaquim Bispo
Gêmeos 40
Volmar Camargo Junior
Autor Convidado
Guisado 62
José Guilherme Vereza
TRADUÇÃO
A Seita de Fênix 64
Jorge Luis Borges
Olhos de Cão Azul 68
Gabriel García Márquez
Cronópios e Famas 74
Julio Cortázar
A Criação 78
Eduardo Galeano
TEORIA LITERÁRIA
Realismo Mágico, a Realidade à mercê da
Literatura 80
Henry Alfred Bugalho
CRÔNICA
O Milagre do Sol 90
Joaquim Bispo
O Fabuloso Destino de Amélie Poulain 93
Giselle Sato
A Visita do Saci 94
Henry Alfred Bugalho
POESIA
Laboratório Poético: um Ser Indefinido 97
Volmar Camargo Junior
Poemação 98
Caio Rudá
Haikais 99
Guilherme Augusto Rodrigues
Sementementalismo 100
Dênis Moura
6
6
E por que Samizdat? revistas, jornais - onde ele des tiragens que substituam
possa divulgar seu trabalho. o prazer de ouvir o respal-
O único aspecto que conta é do de leitores sinceros, que
A indústria cultural - e o
o prazer que a obra causa no não estão atrás de grandes
mercado literário faz parte
leitor. autores populares, que não
dela - também realiza um
perseguem ansiosos os 10
processo de exclusão, base- Enquanto que este é um mais vendidos.
ado no que se julga não ter trabalho difícil, por outro
valor mercadológico. Inex- lado, concede ao criador uma Os autores que compõem
plicavelmente, estabeleceu-se liberdade e uma autonomia este projeto não fazem parte
que contos, poemas, autores total: ele é dono de sua pala- de nenhum movimento
desconhecidos não podem vra, é o responsável pelo que literário organizado, não
ser comercializados, que não diz, o culpado por seus erros, são modernistas, pós-
vale a pena investir neles, é quem recebe os louros por modernistas, vanguardistas
pois os gastos seriam maio- seus acertos. ou q ualquer outra definição
res do que o lucro. que vise rotular e definir a
E, com a internet, os au- orientação dum grupo. São
A indústria deseja o pro- tores possuem acesso direto apenas escritores interessados
duto pronto e com consumi- e imediato a seus leitores. A em trocar experiências e
dores. Não basta qualidade, repercussão do que escreve sofisticarem suas escritas. A
não basta competência; se (quando há) surge em ques- qualidade deles não é uma
houver quem compre, mes- tão de minutos. orientação de estilo, mas sim
mo o lixo possui prioridades
a heterogeneidade.
na hora de ser absorvido A serem obrigados a
pelo mercado. burlar a indústria cultural, Enfim, “Samizdat” porque a
os autores conquistaram algo internet é um meio de auto-
E a autopublicação, como que jamais conseguiriam de publicação, mas “Samizdat”
em qualquer regime exclu- outro modo, o contato qua- porque também é um modo
dente, torna-se a via para se pessoal com os leitores, de contornar um processo
produtores culturais atingi- od iálogo capaz de tornar a de exclusão e de atingir o
rem o público. obra melhor, a rede de conta- objetivo fundamental da
tos que, se não é tão influen- escrita: ser lido por alguém.
Este é um processo soli-
te quanto a da grande mídia,
tário e gradativo. O autor
faz do leitor um colaborador,
precisa conquistar leitor a
um co-autor da obra que lê.
leitor. Não há grandes apa-
Não há sucesso, não há gran-
ratos midiáticos - como TV,
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Entrevista
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(ou falta de) é parcial. dono da Jovem Pan, o
Katia: Não vi. Tutinha Amaral, à Play-
boy, em que ele afir-
ma que na rádio dele
SAMIZDAT: [Para a nunca teve jabá, e sim
Claudia] Achei genial o “acordos comerciais”. A
trecho inicial da rese- Katia fez um trabalho
nha feita pelo Fabrício acadêmico - a sua dis-
Carpinejar ao seu A sertação de mestrado...
vida sexual da mulher tá lá no Lattes - precisa-
feia mente sobre esse assun-
A Vida Sexual da Mu- to, o jabá nas rádios FM
lher Feia (2005, Agir, no Brasil. A pergunta: o
136 págs.) já provocou mercado “artístico” fun-
gafes em algumas livra- cionaria sem o jabá?
rias. Algumas pensaram Katia: Funcionaria, claro.
que era auto-ajuda, um E de maneira muito mais
manual prático para as Eu pensei que talvez o saudável, sem o desequi-
mulheres pouco aben- livro pudesse chamar a líbrio de forças entre um
çoadas fisicamente. Ou- atenção, mas fiquei sur- artista independente e
tras acreditaram que se presa com a boa aceita- sem grana e um artista
tratava de uma biogra- ção dele. E mais ainda de uma grande gravadora
fia. Difícil conciliar a por ter tanta gente que se disposta a qualquer coi-
estante biográfica com identificou com o livro. sa para ter seu “produto”
a fotografia de Claudia executado nas rádios, se
Tajes, publicitária gaú- apresentando na TV, nas
cha, bela morena de 42 SAMIZDAT: [também capas dos suplementos
anos e autora de outros para a Cláudia] Antes culturais de jornais e
quatro livros de fic- de escrever um roman- revistas, etc.
ção, Dez quase Amores; ce, em que momento
decide se o protago- Mas a fila anda e o mun-
Dores, Amores e Asse- do está mudando muito
melhados; As Pernas de nista será masculino
ou feminino? Há um rápido. Hoje as grava-
Úrsula e Vida Dura. doras perderam a força,
planejamento para esse
tipo de coisa? perderam grana, os inde-
A pergunta: Como você, pendentes estão cada vez
Claudia: Eu gosto mais mais se impondo e a re-
enquanto autora, per- de protagonistas mascu-
cebeu a receptividade lação de forças se inver-
linos, mas às vezes me teu, a partir da internet e
do público ao romance? faltam ideias (e talento)
Não teve gente queren- da música digital. O jabá
para dar vida a um ho- está em extinção.
do o dinheiro de volta mem. Há pouco comecei
(pensando tratar-se de a escrever sobre um ator
“outro gênero de livro”)? pornô que tem o mem- SAMIZDAT: Encontrei
Claudia: A maior recla- bro pequeníssimo. Acho um dos romances da
mação que eu ouvi foi: que vai ser meu próximo Claudia na íntegra em
pô, me disseram que era livro, um dia. um site para leitura
uma comédia e é um online. Nesse caso, há
livro triste. E acho que é toda a referência aos
mesmo, dá até pra fazer SAMIZDAT: [Geral, mas copyrights, mas ain-
humor com a rejeição, direcionada para a Ka- da assim, não precisei
mas o assunto é amargo. tia]: Li a entrevista do pagar um centavo para
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lê-lo (eu li só dois ca- leiros contemporâneos, talento de cada um é que
pítulos, tá! prometo que ainda em atividade (i.e., decidem.
vou comprar o livro...). vivos), uma lista dos Katia: Acho que sim.
Que acham disso? cinco melhores escrito- Acho que escrever é uma
Claudia: Por mim, não res de ficção e os cinco habilidade que se pode
precisa pagar nada. Len- melhores poetas? desenvolver.
do já está bom! Claudia: Na ficção, só
Katia: Do ponto de vista medalhões: Rubem Fon-
seca, Dalton Trevisan, SAMIZDAT: Que per-
dos músicos, que é o que gunta deveria ter-lhes
conheço mais, sei que o Marçal Aquino, Moacyr
Scliar, Milton Hatoum e sido feita e não foi,
artista, historicamente, considerando que esta
nunca ganhou dinheiro ainda a Cíntia Moscovi-
ch. Poetas: sou bastante é uma entrevista elabo-
com a venda de discos. rada por aspirantes a
Não ganha aqui, não ga- ignorante no assunto.
Gosto muito do Fabrício escritores?
nha na Europa, nem nos
Estados Unidos. Artista Carpinejar e conheci na Claudia: Tem a clássica:
ganha dinheiro fazendo semana passada, graças existe espaço para tanto
show. Quem ganha di- ao pelotense Vitor Ramil, escritor no Brasil? E eu
nheiro com venda de dis- a poeta de Pelotas Angé- responderia: até acho que
co é a gravadora. Ora, se lica Freitas, que lançou não. Mas não é por isso
assim é, o artista se tiver o livro Rilke Shake em que a gente vai desistir.
uma distribuição grande 2007. Guria muito boa. Katia: Ai, essa eu vou
pirata, ou seja, vender Também leio a poesia das passar.
horrores nos camelôs, minhas amigas Martha
dificilmente vai reclamar Medeiros e Paula Taitel-
da vida. Porque vai ter baum.
muito mais gente queren- Katia: Ficção: Trevisan,
do ver seus shows. Rubem Fonseca, Daniel
Pellizzari, Chico Buarque
de Hollanda. Luis Fer-
SAMIZDAT: E a respeito nando Veríssimo. Poesia:
de copyright, copyleft Adélia Prado, Fabrício
e das licenças Creative Carpinejar, Gonçalo M.
Commons? Tavares (português é
Claudia: Ainda estou em quase brasileiro), Paula Coordenação da entrevista:
fase de consolidar algu- Taitelbaum e Martha
ma coisa. Se não me pa- Medeiros. Volmar Camargo Junior
garem mas distribuírem SAMIZDAT: Oficinas e
meus livros por aí, eu cursos de formação de
ainda me acho no lucro Perguntas feitas por:
escritores ou de “escri-
(é por isso que eu tenho ta criativa”, como por Carlos Barros
que trabalhar tanto em exemplo as do Assis
outra atividade...). Henry Alfred Bugalho
Brasil, funcionam? É
Katia: Sou totalmente a possível ensinar alguém Volmar Camargo Junior
favor. Liberar geral. a escrever, ou tais en-
contros servem para
“descobrir talentos”?
SAMIZDAT: Houve, dia
desses, o “Sarau das Claudia: É possível ensi-
Listas”. Vocês poderiam nar a escrever. A partir
eleger, entre os brasi- daí, a sensibilidade e o
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Microcontos
En búsqueda de Borges
Henry Alfred Bugalho
O cego caminhou pelas ruas, sem ver aquilo que Borges
não via.
Não viu o movimento nos cafés, nem a mais larga
avenida do mundo, nem os edifícios antigos, nem o obe-
lisco, nem a estátua de San Martin; não viu o Aleph, os
dançarinos de tango, os peleadores de faca, nem os heróis
de outrora; não viu as bandeirolas azuis e brancas, nem os
passeadores de cães, nem a Florida inchada de gentes; não
viu labirintos, espelhos, o Mesmo ou o Outro, similitudes
ou tigres.
Buscou Borges nas esquinas, nas mesas das cafeterias,
nas bibliotecas, nas linhas e nas entrelinhas, porém, não o
encontrou.
A semelhança que ele sempre cantou era mentira; só
havia diferença e passar dos anos. O cego não o encon-
trou, pois aquele se escondeu atrás do esquecimento do
tempo.
Buenos Aires era alheia a ele.
De resto, somente um nome e uma reputação.
Um quarto de
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loucura
Caio Rudá
http://www.journeywithjesus.net/Essays/TheScream.jpg
Joaquim Bispo
Vítor era um estudioso de estatísticas. Por elas, soube que atirando uma
moeda ao ar mil vezes, saem cerca de quinhentas «caras» e quinhentas «co-
roas». Por isso ele acreditava que quanto maior for uma série de resultados
– seis «caras» seguidas, por exemplo – maior a probabilidade de sair o oposto,
para repor a média de 50%. Resolveu transportar esse conhecimento para
algo rendoso.
Naquele dia, estava no casino à espera de grandes séries. Então, quando
outro jogador perdeu tudo, numa série de dez pretos, fez a sua aposta milio-
nária no vermelho. Saiu preto. Menosprezara aquele capítulo aparentemente
contraditório onde se dizia que a moeda (ou a roleta) não guarda memória
dos lançamentos anteriores e cada resultado tem, exactamente, a mesma pro-
babilidade de sair.
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Aposta forte
Joaquim Bispo
Infalível
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Joaquim Bispo
http://www.flickr.com/photos/monkeyc/165230047/sizes/l/
Estados Unidos:
A Formação da Nação
Guilherme Augusto Rodrigues
Passadas as guerras e
as dinastias Tudor e Stu-
art, muitas pessoas viram
na colônia uma esperan-
http://farm3.static.flickr.com/2132/2224082241_4cb36bd6bc_o.jpg
ça de recomeçar uma
vida melhor. Nesta época,
chegaram os puritanos.
Eles eram disciplinados,
organizados, conserva-
dores, sonhadores e com
ideias revolucionárias.
Lutavam contra a políti- Estados Unidos: A Formação
ca da Inglaterra e assim da Nação do
viraram guerreiros para w
Autor: Leandro Karnal
gr nl
verem o sonho de fun-
át
oa
dar uma nova terra, onde Editora: Contexto, 2005 is d
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Recomendações de Leitura
Final de Jogo,
de Julio Cortázar
Henry Alfred Bugalho
Editora: Alfaguara
http://www.artespain.com/wp-content/uploads/cortazar.jpg
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Recomendações de Leitura
Ficções,
de Jorge Luis Borges
Henry Alfred Bugalho
http://www.life.com/image/50541078
Ficciones
Editora: EMECÉ
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Recomendações de Leitura
Putas Assassinas,
de Roberto Bolaño
Caio Rudá
A despeito do que o seu quase xará mais famo- escolher o que, dentro das
leitor possa imaginar antes so. Enquanto o trabalho do narrativas, é reminiscência
de iniciar a leitura do ar- mexicano tem sido exibido, e o que é invenção. De todo
tigo, “Putas Assassinas” não com relativo sucesso, por modo, a impressão que se
é um livro erótico escrito décadas na TV brasileira, tem é que os 13 contos que
pelo comediante mexicano só agora o chileno se tem compõem o livro são sua
criador do Chaves. Trata-se tornado um conhecido do vida de cidadão do mundo
aqui de uma singular litera- leitor tupiniquim. - nascido no Chile, viajado
tura, escrita por um chileno “Putas assassinas” é uma por México, França e radi-
exilado após o golpe de ficção auto-biográfica. Ou cado por fim na Espanha
Pinochet, cujo nome tam- seria uma auto-biografia - fragmentada e contada
bém é (no) singular: Rober- ficcional? O fato é que Bo- como o que foi ou poderia
to Bolaño. Não é só um s laño parece brincar com o ter sido. Não há dúvidas,
ao fim do nome, contudo, leitor, dando-lhe o míster de portanto, de que a experiên-
que diferencia Bolaño de cia pessoal foi a base para
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Autor em Língua Portuguesa
A VELHA E A ARA
ARANHA
o tempo nunca chegou.
Está-se escrevendo, ainda
por mostrar a redigida
verdade. O tudo que foi,
será que aconteceu? Co-
meço na velha, sua en-
Mia Couto rugada caligrafia. Oculta
de face, ela entretinha
seus silêncios numa
casinha tão pequena, tão
mínima que se ouviam
as paredes roçarem,
umas de encontro às
outras. O antigamente ali
se arrumava. A poeira,
madrugadora, competia
com o cacimbo. A mu-
lher só morava em seu
assento, sem desperdiçar
nem um gesto. Em oca-
siões poucas, ela sacudia
as moscas que lhe cobi-
çavam as feridas das per-
nas. Sentada, imovente,
a mulher presenciava-se
sonhar. Naquela inteira
solidão, ela via seu filho
regressando. Ele se dera
às tropas, serviço de
tiros.
http://www.flickr.com/photos/mdu2boy/2710193086/sizes/o/
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por sua fantasia. Depois, uma prova de promessa. no sobrevoo das feridas,
em triste suspiro, a rou- Decidiu-se então a ve- estranharam nem serem
pa da ilusão voltava aos lha surpreender o autor sacudidas. Foi quando
guardos. da maravilha. A partir passos de bota lhe entra-
dessa tarde, seus olhos ram na escuta. Antoni-
- Depressa-te Antoni-
emboscaram o tempo, no nho! A velha esmerava-se
nho, a minha vida está-te
degrau de cada minuto. na sua imobilidade para
à espera.
Esquecida do sono e do que o regresso se com-
Mas era mais as es- sustento, não houve nun- pletasse, fosse o avesso
peras do que as horas. E ca sentinela mais atenta. de um nascer. E lhe vie-
o cansaço era sua única Até que, certa vez, , se ram as dores, iguais, as
carícia. Ela adormecia- escutou um rumor quase mesmas com que ele se
se, um leve sorriso me- arrependido, desses feitos havia arrancado da sua
ninando-lhe o rosto. E para ser ouvidos apenas carne. Encontraram a ve-
assim por nenhum dian- pelos bichos caçadores. lha em estado de retrato,
te. Desconhece-se a data, Por uma breve fresta se ao dispor da poeira. Em
talvez nem tenha havido, injanelava uma aranha. todo o seu redor, envol-
mas num dos seus olha- Era de um verde peque- vente, uma espessa teia.
res demorados, a velha nino, quase singelo. Com Era como um cacimbo,
encontrou um brilho vagaroso gesto a velha a memória de uma fu-
cintilando num canto do foi tirando o vestido do maragem. E a seu lado,
tecto. Era uma teia de caixote. Usava os mais sem que ninguém vis-
aranha. Ali onde apenas lentos gestos, fosse para lumbrasse entendimento,
o escuro fazia esquina, o bicho não levar susto. estava um par de botas
havia agora a alma de negras, lustradas, sem
- Qualquer uma coisa
uma luz, flor em fun- gota de poeira.
vai acontecer!
do de cinza. A velha
levantou-se para mais Era suspeita que ela
olhar o achado. Não bem sabia. Confirmou-se Fonte: http://www.
era a curiosidade que quando as duas, mulher lumiarte.com/luardeou-
lhe puxava o movimen- e aranha, se olharam de tono/miacouto1.html
to. Assustava-lhe a sua frente. E se entregaram
transparência demasiada. em fundo entendimento,
E, de logo, lhe surgiu a trocando muda conversa
pergunta que luz tecera de mães. A velha sentiu
aquele bordado? Não o bicho pedia-lhe que
podia ser obra de bicho. ficasse quieta, tão quie-
Não. Aquilo era trabalho ta que talvez qualquer
para ser feito por espíri- coisa pudesse acontecer.
to, criaturamente. A teia Então ela se fez exacta,
podia só ser um sinal, intranseunte. As moscas,
a boa Literatura
é fabricada
ficina
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Contos
Em seu costumeiro traba- os reflexos do sol lhe ofus- Algumas folhagens por cima
lho de carpir, Mané Santos caram a visão. “Que diacho disfarçando o local e seu te-
foi interrompido pelo tilintar de pedra brilhante é esta?”, souro já estava devidamente
http://www.flickr.com/photos/wlodi/252462355/sizes/o/
do metal da enxada batendo espantou-se. Tornou a pegar ocultado.
contra algo rígido sob a terra. a enxada. Deu um, dois... três O homem presumia estar
“Mais um pedregulho”, esbra- golpes e lascou um pedaço com algo extraordinário em
vejou. Quando cavoucou ao da rocha, do tamanho de um mãos. Só o que não podia
redor, notou que era maior punho fechado. O fragmento imaginar é que aquela des-
do que imaginava. Cavou assemelhava-se a um dia- coberta o destruiria e, junto
mais, até formar um buraco mante lapidado, porém, de consigo, levaria todo o povo-
de meio metro de diâmetro. forma irregular, o brilho era ado de Água Santa à perdi-
A superfície da pedra se intenso e a superfície extre- ção.
estendia por toda a abertura. mamente lisa. Verificando se
Mané Santos se agachou para ninguém o espiava, guardou
examinar de perto. Soprou a lasca no bolso e tratou de Quando a mulher de
a poeira que se acumulava e devolver a terra ao buraco. Mané Santos viu a pedra
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tristeza da senhora... eu fico. vel. Quanto mais cavavam, passaram a resolver diversos
Desde muito pequeno, maior se mostrava. Depois de problemas apenas usando o
Pedro Pitanga era conhecido conseguirem algumas deze- artefato. Se alguém dissesse:
por ser empreendedor. Uma nas de pedaços, se entocaram “Vai ter futebol no sábado?”,
de suas empreitadas mais dentro de casa e botaram-se um outro respondia: “Ama-
famosas foi quando trouxe o a trabalhar. Após vários tes- nhã tu me passa uma visão
fruto das pitangueiras para tes, compreenderam todo o que eu lhe digo”. Ou então:
Água Santa. A idéia lhe ren- funcionamento: duas pessoas “Vamos pro forró no Bento?”,
deu meses de zombaria e um possuíam a jóia; a primeira e a resposta: “Mais tarde te
bom prejuízo, já que nem sua pensava na segunda, via a passo uma visão pra confir-
lábia engenhosa foi capaz de imagem desta na pedra, de- mar”. Até o padre resolveu
convencer o paladar dos fre- pois via o cenário; a segunda, aderir à praticidade. Quem
gueses, que odiaram a fruta. por sua vez, tinha na pedra não podia ir à missa no
A despeito dessa frustração, a imagem da primeira, mas domingo tinha a chance de
nunca deixou de investir nas só via o cenário se pensasse assisti-la numa visão. Bas-
novidades – era um homem nela. Entendido o proces- tava pensar no sacerdote e
de mente científica. Quando so, foram à confecção dos pronto, lá estava a imagem
conseguiu a jóia, só pensava colares. No dia seguinte, uma da celebração. Inclusive, as
em como aquele artefato po- grande faixa apareceu em confissões via jóia também
deria trazer benefícios a seu frente à residência: se tornaram freqüentes.
povoado e, claro, como lhe “Conheça a mais nova ma- Outra que logo se adap-
daria algum dinheiro. Antes, ravilha da ciência: A PEDRA tou à novidade foi a “putinha
precisava descobrir os deta- DO OLHO DIVINO! Por um da venda”. Elaborou um útil
lhes do funcionamento, para preço justo, adquira uma lin- serviço de entrega chamado
isso, foi atrás da “putinha da da jóia de habilidades comu- “Visão Rápida”. Quem qui-
venda”. Do pescoço da moça, nicativas!” sesse comprar algo passava
pendia um colar semelhante A sociedade de Pedro uma visão e logo tinha as
ao da viúva. “Foi um presente Pitanga e da viúva estava compras entregues por um
do Manezinho”, disse com formada. Os moradores do ajudante da moça.
um sorriso descarado. povoado se encantaram com Com o tempo, as pessoas
Em sua casa, ao pensar a novidade, e até quem não de Água Santa passaram a
na “putinha”, Pedro Pitanga tinha dinheiro dava um jeito sair pouco à rua. Viam-se
viu a cena do bar novamente de conseguir a Pedra do apenas nos eventos sociais –
refletida na pedra. Foi aí que Olho Divino trocando por missas (vazias), forrós (pou-
entendeu. As duas jóias se um porco ou alguns litros cos), futebol (raro) –, indo ao
comunicavam. Para acioná- de cachaça pura. Na época, trabalho, ou nos serviços de
las, bastava ter uma à mão e não se conhecia telefone, de entrega que seguiram mo-
pensar em quem estivesse de maneira que a comunicação delo no sucesso do “Visão
posse da outra. “A ciência é pelas pedras tornou-se um Rápida”. Não que os mora-
espetacular!”, refletia maravi- sucesso estrondoso. Pedro dores deixassem de se rela-
lhado. E a partir da descober- Pitanga mostrou-se tão feliz cionar, mas faziam isso quase
ta, o mundo de Água Santa com os lucros que até re- que exclusivamente pelas
viveu uma revolução. solveu propor casamento à visões. Alguns nunca haviam
Pedro Pitanga tratou de sócia. “Para a prosperidade conversado antes e passavam
conseguir mais da jóia com dos negócios”, dizia. a ser grandes amigos através
a viúva. Quando viu o ta- A jóia trouxe grandes da jóia. Outros começavam a
manho da mina encontrada mudanças a Água Santa. Os namorar. Havia ainda aqueles
por Mané, pensou: “Estamos habitantes mudaram mui- que ficavam horas e horas da
ricos”. A rocha era inesgotá- tas de suas rotinas diárias e madrugada passando visões,
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ceberam que podia ser usada não havia acabado. Os sobre- mo das safadezas dos fale-
com más intenções e, com viventes tinham certeza de cidos maridos. Decidiu que
isso, trazer desgraça ao povo. que, quando o fazendeiro vol- Água Santa seria seu túmulo.
Contudo, essa nova opinião tasse, seria com força total.
não impediu que lutassem “Mas, como continuar sem
para defendê-la quando um Pedro Pitanga?”, era o que se A cena derradeira foi
fazendeiro ambicioso quis perguntavam. A resposta veio única: homens, mulheres
reivindicá-la. O homem da reincidente viúva, Dona e crianças, portando ar-
chegou dizendo que aquelas Pitanga. A mulher amava mas, corriam na direção do
terras eram dele e que, por aquele lugar, foi nele que inimigo. No peito de cada
conseqüência, a mina da jóia fez sua vida, não iria deixar um, brilhava a Pedra do
também lhe pertencia. Foi quem quer que fosse tirar o Olho Divino. À frente, Dona
quando começou o que, pos- que lhe pertencia. Depois de Pitanga comandava o avanço
teriormente, ficou conhecida um discurso inflamado, fa- erguendo seu antigo facão. O
como a Guerra da Pedra. lando de patriotismo, de dig- megafone avisou: “Se continu-
nidade, de honra à alma do arem, abriremos fogo”. Não
Pedro Pitanga ficou indig- pararam. “Parem agora ou
nado com a história do ho- marido e da preciosa Pedra
do Olho Divino, conseguiu atiramos”. A resposta veio da
mem desconhecido e conven- líder: “Povo de Água Santa,
ceu toda Água Santa de não convencer os poucos que res-
taram (que não chegavam a em frente, por nossa jóia!”
cair na conversa. O fazendei-
ro não se abalou e prometeu quarenta, juntando mulheres O massacre foi consuma-
voltar com reforços. Em uma e crianças) a uma última e do: últimos rebeldes mortos;
semana, Pedro já havia arma- heróica defesa de suas terras. poucos do exército feridos.
do todo o povoado, deixando Poucos dias se passaram, Enquanto tiravam os colares
todos preparados para as dos corpos, grandes máqui-
como um curto período de
piores provações. A todo o nas começavam a demolir as
trégua, até que o povo de
custo, iriam defender a Pedra casas. Em poucos dias, não
Água Santa avistou seu novo
do Olho Divino, já considera- se via mais nenhuma cons-
inimigo. Era de se estranhar
da seu patrimônio cultural. trução, apenas uma grande
que os poderes governamen-
área desmatada tendo uma
A Guerra da Pedra foi tais ainda não tivessem se
brilhante rocha sobressaindo
sangrenta, com vários mortos importado com a jóia. Mas,
na superfície. Água Santa
de ambos os lados, porém, os quando resolveram agir,
foi dizimada e, no seu lu-
abatidos de Água Santa eram foram decisivos. O exército
gar, construído um grande
mais numerosos. Ao término chegou com tanques e ca-
laboratório. As pesquisas
de três dias, os homens do nhões. Vários soldados já
procuravam desvendar o
fazendeiro foram expulsos, se colocavam em posição
funcionamento da Pedra do
mas, a um preço muito alto: de batalha. Pelo megafone,
Olho Divino, a fim de desen-
Pedro Pitanga morrera na o comandante informou a
volver novas tecnologias para
frente de batalha. situação: “Em nome da pros-
a indústria de comunicação.
peridade do país, estas terras
Todo o povoado chorou a Algo de que Pedro Pitanga,
serão desabitadas e isoladas.
morte do “grande benfeitor”. como um homem de mente
O local se tornará uma área
E muitos, de tão abalados, re- científica, se orgulharia.
de pesquisas científicas com
solveram fugir para não aca-
acesso restrito. Caso os habi-
bar como o pobre homem. O
tantes não cooperem, temos
padre, intervindo, alertou da
ordem para abrir fogo”. As
inutilidade da guerra e disse
palavras inflamaram o cora-
não ficar para ver o seu final.
ção de Dona Pitanga – nunca
De fato, a Guerra da Pedra sentira tanto ódio, nem mes-
O Rei dos
Judeus
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Contos
Sonhos de batata
Amanheci dentro da caixa de acordar na caixa em que ombro. Cheiram a terra e a
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das batatas. Uma caixa de as guardei, coberta de todos caca de cavalo. De um modo
madeira em ripas mal apara- os lados pelas ditas, ainda muito menos intenso, sinto o
das, que coloquei ontem na remeladas de terra seca. Aqui odor agradável do presunto.
dispensa. Tenho as pernas estou eu amanhecendo entre Tenho a coxa direita assente
encolhidas e o braço direito elas. sobre dois tubérculos, um
debaixo da cabeça. Deitada Olho em volta, quase bocadinho maiores: daqueles
de lado, devo parecer um receando estar tão desper- que costumo escolher para
feto, enroladito entre os tu- ta. A porta da dispensa está assar e comer com molho.
bérculos de cor acastanhada. fechada. Fui eu que a fechei Estou bem acordada, disso
Batatas novas, trazidas por por receio do cão, pois que não duvido, mas não dormi
uma amiga de uma courela pendurei, na noite anterior, a noite inteira neste local,
onde o pai as semeia para umas quantas chouriças e que eu sei que li uma dú-
sua entretenha. Ele não as um osso de presunto numa zia de páginas de um livro
vende: distribui pelos filhos e corda de modo que ficassem e adormeci deitada bem ao
pelos amigos que estão mais fora do alcance do cachorro. meio da cama, com as pernas
por perto. Já pensou, segundo E mesmo assim, fechei a por- tapadas com o lençol, que o
conta a filha, dar aos pobres ta e, por excesso de cuidado edredão de flores encarnadas
da vila, mas diz ele, que pre- ou parvoíce, rodei a chave. escorregara para o chão. Não
fere fazer um bem que lhe E agora, não sei como é que sei como, estou aqui. Tento
fique sem agradeceres e sem saio. levantar-me, mas não me
lembranças. Terá suas razões, Tenho um monte de desloco nem um pedacinho,
o homem, que nunca pelas batatas sobre a minha testa por maior que seja o esforço.
batatas me lembraria dele e duas depositadas na cova Reparo que apenas penso
não fosse dar-se este insólito entre a orelha esquerda e o como gente, que é só isso: no
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Contos
A luz de Delft
Joaquim Bispo
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Contos
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Volmar Camargo Junior
Gêmeos
Eram gêmeos, um macho e casa, basta dizer que antes de por um riacho.
uma fêmea. ser uma habitação, o colos- Os órfãos cresceram sem
Ainda bebês, dependentes, sal edifício era um ser vivo, o conhecimento de coisas
dominados pelos ímpetos um autômato dotado da fria como senso comum ou
animais da sobrevivência, e desejada inteligência das auto-limitação. Tudo o que
ficaram órfãos. Viviam em máquinas. Servia aos seus sabiam devia-se somente às
um ambiente que era resulta- habitantes sem a necessidade suas necessidades. Uma vez
do de muitas das aspirações de operação, a casa permane- que não havia uma força
de toda a humanidade. O cia atenta aos movimentos e exterior que lhes ditasse
mundo nunca tomou conhe- desejos dos irmãos gêmeos. as leis que regem o existir,
cimento da maravilhosa casa E além dos bebês, nada mais as crianças eram capazes
em que foram abandonados. era importante. de prodígios. Para nós, tais
As crianças, por sua vez, E, por mais absurdo que capacidades seriam absurdas
jamais souberam que havia nos pareça, essa maravilhosa e maravilhosas. Para eles,
outros seres humanos além habitação abrigava em seu não passavam de respos-
deles próprios. A respeito da interior um bosque cortado tas naturais ao ambiente.
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caiu de um penhasco que O macho olhava cons- trar o lugar desconhecido
não estivera lá nos dias ante- tantemente para o céu, para além das árvores. Em vão.
riores. as árvores, para os animais, A fêmea sentia-se muito
Os gêmeos estavam mui- e nenhuma dessas coisas mal planando como faziam
to distantes um do outro, respondia ao que ele mental- antes, e por isso, passaram a
sofrendo com a mágoa e mente lhes perguntava: locomover-se outra vez com
outros dos sentimentos que “O que há além desse os pés. Os ciclos inteiros da
nunca tiveram, como sauda- bosque?”. lua passaram oito vezes, e
de e remorso, quando foram a barriga da fêmea, maior
A fêmea olhava para a a cada lua cheia, permitia-
avisados por algo vindo própria barriga. Sentiu que o
das profundezas de seus lhe mover-se cada vez mais
sangue que surgia de dentro devagar. Então, no momento
inconscientes: a mãe estava dela a cada ciclo da lua –
em apuros. Imediatamente em que o casal de consortes-
pois eles conheciam bem a irmãos soube, pela silenciosa
foi-lhes restituído o poder lua, e não sei explicar como
de deslocar-se sem tocar no afinidade que tinham, pa-
isso era possível – parou de raram. A fêmea deu à luz a
chão, e de saberem precisa- vir. Seus seios doíam um
mente onde o outro estava. dois bebes.
pouco, mesmo às carícias
E por todos os lugares que mais delicadas do irmão. E, A casa-máquina sabia exa-
alguma vez estiveram naque- de dentro da única porção tamente o que estava aconte-
le bosque, e em muitos que inacessível de sua intimida- cendo. Programada há tanto
nem eles sabiam existir, em de, a fêmea soube algo que tempo que nem no mais re-
nenhum deles encontraram o macho jamais saberia se moto compartimento de sua
a mãe. Então, pela primeira ela própria não lhe contasse, memória de máquina havia
vez desde que se lembravam, mesmo que ele que fosse o um registro, a casa preparou
sentiram uma dor incapaz mais prodigioso ser existen- tudo. Era o seu dever permi-
de ser contada, ou passível te. A fêmea sentia-se como tir que os irmãos gêmeos, e
de ser reproduzida por quem aquela fêmea estranha que apenas eles, vivessem plena-
não a sofre. habitava um lugar em seu mente suas existências.
Para tentar diminuir a dor pensamento, e que ela e o ir- Eram gêmeos, um macho e
que sentiam, buscaram-se mão fizeram existir. A fêmea uma fêmea.
outra vez. E se acariciaram seria mãe. Ainda bebês, dependentes,
como nunca haviam feito O macho não se conteve dominados pelos ímpetos
antes. de alegria, uma alegria indi- animais da sobrevivência,
O tempo passou, e a mãe zível, que nunca havia senti- ficaram órfãos. Viviam em
tornou-se outra vez uma do, assim que suas mentes se um ambiente que era resulta-
lembrança. Os gêmeos per- comunicaram. E cresceu den- do de muitas das aspirações
cebiam-se muito diferentes. tro dele a absurda vontade de toda a humanidade. O
Por um lado, estavam mais de conhecer os limites de seu mundo nunca tomou conhe-
próximos um do outro. Por habitat. Era uma coisa abso- cimento da maravilhosa casa
outro, sentiam-se cada vez lutamente nova, e sabiam que em que foram abandonados.
mais desejosos de ir até os eram capazes de gerar vida. As crianças, por sua vez,
limites do bosque. Desejavam Estava imbuído de algo que jamais souberam que havia
que além das árvores, talvez sabia ser, mas para o qual outros seres humanos além
depois de onde nascia o rio, não tinha um nome próprio, deles próprios.
existisse o lugar para onde a o que as pessoas comuns
mãe tivesse ido. Porém, desde chamam “paternidade”.
que se recordavam, era a pri- Decidiram partir juntos
meira vez que um desejo seu em busca dos limites, encon-
não se realizava.
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A Oficina Editora é uma utopia, um não-
lugar. Apenas no século XXI uma vintena
de autores, que jamais se encontraram
fisicamente, poderia conceber um projeto
semelhante.
O livro, sempre tido em conta como uma
das principais fontes de cultura, tornou-se
apenas um bem de consumo, tornou-se um
elemento de exclusão cultural.
A proposta da Oficina Editora é resgatar o
valor natural e primeiro da Literatura: de bem
cultural. Disponibilizando gratuitamente
e-books e com o custo mínimo para livros
impressos, nossos autores apresentam
a demonstração máxima de respeito à
Literatura e aos leitores.
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Contos
Sei do que sou acusado. lo. Não me estenderei muito e mais malas, mal me re-
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Nestes últimos dias, vocês sobre o assunto, mas é notó- cordava do códice. Mas, há
viram quantas mentiras rio que há na minha biblio- um mês, organizando mi-
disseram sobre mim, de que teca a primeira edição de “O nha biblioteca, descobri este
sempre fui um homem vio- Contrato Social” de Rousseau, incrível exemplar e comecei
lento, de que havia ameaçado uma Bíblia do século XII, o a estudá-lo. Talvez vocês não
minha mulher várias vezes manuscrito de Die Welt als saibam, mas o grego bizan-
antes. Mentiras! Mentiras! Wille und Vorstellung de tino não é muito diferente
Vejo a minha cunhada Schopenhauer, entre milhares do koiné, o grego bíblico, do
ali, sentada, me fulminando de outras raridades, inveja qual possuo razoável domí-
com o olhar. Foi o ódio dela para colecionadores ao redor nio.
por mim que me arrastou ao do globo. O material não era muito
tribunal, a querer minha exe- Ano passado, empreendi interessante por si, um relato
cução. Eu a entendo, também uma viagem de negócios a da fundação e queda duma
quereria a mesma coisa se Istambul; vagando pelas ruas seita herética na Capadócia,
minha irmã fosse assassina- da cidade, adentrei um anti- entre os séculos X e XII, que
da; também adoraria ver meu quário. Entre inúmeros arti- acreditava que Jesus fosse,
cunhado morto, se cresse ser gos interessantes, chamou-me na verdade, um enviado de
ele o culpado. a atenção um códice em Satanás. O argumento dos
Mas sou inocente, juro, grego bizantino, com belíssi- hereges não era dos mais
ouçam-me e julguem por si mas ilustrações e iluminuras, convincentes: por ser Satanás
próprios. que adquiri pela bagatela de o senhor do mundo material
cinqüenta libras. (Jó 1: 7), apenas ele poderia
Todos aqui conhecem mi- conceder poder a um mortal
nha reputação como bibliófi- Em meio a tantas aqui-
sições desta viagem, malas para curar doenças, multi-
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Contos
As bases da criação
José Espírito Santo
(era assim que o trata- “O pior é quando o can do, or nothing I can
vam) acabaria por mudar. chefe Pereira dá nos azei- say
Adaptar-se ia e assumiria tes. Mas a gente finge que
gradualmente comporta- é moco, que não ouve, That folks don’t criticize
mentos mais consentâne- damos-lhe um descon- me
os, com padrões sociais to…” continuava o bom E a gaja continuava…
não patológicos. No en- do Vitorino, preocupado
tanto, passaram-se anos e em instruir o neófito nas But I’m goin’ to, do just
o SER foi crescendo sem lides da casa. as I want to anyway
que tivesse ganho tais
E ele concordava, a And don’t care if they
características. Era so-
tudo anuía silenciosa- all despise me
nhador, um idealista por
mente. Ora apresentava
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Pensou como seria caiu na asneira de dizer pá. Deixa-te disso que a
bom que ela se calasse gente aqui é funcionário
por uns instantes. Talvez “É pá, deixa cá ver essa e não tem de fazer existir
por brincadeira, puxou bola para eu dar um o que não existe. Temos
do bloco de notas e dese- chuto como o Cristiano é que fazer existir o que
nhou-a muda, com uma Ronaldo” existe, entendes? Passar
fita grossa a tapar a boca Virou-se para o outro carimbo…”
e bem amarrada a uma fuzilando-o com o olhar.
das colunas de modo E arrematou, matando
Disse qualquer coisa definitivamente a conver-
a não poder dançar. O esquisita de que já não
pandemónio que acon- sa “Além disso, o que é
me lembro bem. Só sei que ganhas com isso de
teceu depois - viu como que o pobre do alenteja-
por magia serem execu- criar? Serve para alguma
no virou-se e, rabo entre coisa? “
tados os seus desejos, a as pernas, enfiou-se atrás
realidade moldando-se da secretária. Nessa tarde
aos seus desenhos - deu- nem daria mais um pio.
lhe certezas quanto ao INTERNAMENTO
desígnio que lhe cabia. No dia seguinte apa-
receu túnica e sandálias, Iam-lhe aturando as
Soube então que todas as
passando o tempo todo madurezas e suportando
tentativas para o demover
(manhã toda) a rabiscar todas as incongruências,
seriam inúteis.
e a distribuir os papéis manias e obsessões até
com desenhos esquisitos. que chegou o dia em que
Disse que tinha descober- foi atingido o limite, caiu
CONFLITOS a gota de água que fez
to algo de novo, que sabia
O cabelo esbranquiçou fazer uma coisa até ali transbordar repentina-
completamente e deixou nunca vista e à qual deu mente o copo. Parece que
crescer a barba, uma o nome “Criar”. uma das criações mais
barba branca e farta, de exóticas – o pequeno
pelos fininhos, que lhe “E como é que funcio- casal de “quase nudistas”
tapava quase totalmente na isso de criar?” pergun- - foi-se à maçã raineta
o pescoço. Desinteressou- tou o Benevides, cheio de que o chefe Pereira reser-
se completamente dos manha, com esperteza vava para comer à hora
temas de conversa habi- beirã. do lanche. O desgraçado,
tuais. Se lhe falavam do quando lhe deu a fome,
“É simples” respondeu. procurou, procurou e
Benfica, retorquia “Terra”. “Imagina uma coisa que
Se lhe falavam de mulhe- nada…
não existe. Pois bem…
res, mostrava enfado e a gente vem e faz com Nessa mesma tar-
respondia “Génese”. Se o que exista. Depois dize- de, chamaram a equipa
interpelavam sobre polí- mos à coisa que fomos constituída pelo psiquia-
tica então fazia cara feia nós que fizemos isso – tra e dois paramédicos.
e proferia enfaticamente que a criámos” O Deus (João de Deus)
“Paz e Bem”. As coisas ainda gritou pela bola
pioraram quando trouxe O outro não parecia lá que nem um desalmado.
a bola para o escritório e muito convencido e argu- Pela Jóia. A sua jóia. Que
o desgraçado do Antunes mentou enfaticamente “É sem ela – foco de todo o
http://www.flickr.com/photos/ooocha/2630360492/sizes/l/
esquecida e só, por vários nária (a terceira). Frustra-
dias. Até que chegou o dos que estavam os pla-
substituto. nos de criação, por falta
de oportunidade (má
O substituto era um sorte o casal ter comido
gajo da Buraca, baixo e a fruta), sobraram apenas
atarracado, adepto faná- as bases, sementes rudes,
tico do FCPê. Sopinha imperceptíveis. E sen-
de massa, metia “xis” em do assim, restava à bola
tudo o que pegava: “Xou permanecer bailando em
xim! Xim Xenhor, já xtá o torno do astro rei e espe-
que me mandou. Ah… rar muito tempo - quase
ora essa, não xateia nada, uma eternidade. Porque
a xente xtá cá é pra enquanto a criação é
ixo…”. O Benevides rápida e normalmente
quando queria entrar consiste em acto decidi-
com ele, perguntava-lhe do e espontâneo, evoluir
sempre como é que se é bem mais complexo e
escrevia chato, se era com exige decididamente mui-
xis ou cê e agá. to mais tempo.
Quando o gajo viu a
jóia, a bola, disse logo
“Atão vomexês tinham
aqui o esférico e não me
diziam nada?” ficina
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Contos
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Mariana Valle
Juliana e o coelho
Juliana era casada há E não é que ele era em que dormiria com
cinco anos, mas se sentia mesmo supimpa? Fazia o marido. E quando ele
sozinha. Maurício viajava serviço duplo, atacava chegava em casa, doido
muito a trabalho. Então em todas as frentes. E para matar a saudade da
ela resolveu que merecia assim Juliana se refeste- esposa, recebia um bando
um vibrador. Ao ver um lava todas as noites em de desculpas da mulher
episódio do seriado Sex que Maurício estava fora. já saciada. Um dia era
and the city, decidiu: que- Mas aquele negócio era dor de cabeça, no outro
ria o tal do rabitt, usado tão bom que ela passou a cansaço... Até inventar
pela Charlotte. usá-lo inclusive nos dias que estava “naqueles dias”,
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Contos
Misantropia infecciosa
Léo Borges
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– Falaram que é uma berço! O menino evita as – Vendeu pouquíssimo.
doença raríssima. Sem- pessoas como se fôssemos No início idolatraram-no,
pre desconfiei. Ele não se leprosos. Ele deve ter parte mas logo caiu no esqueci-
dá com ninguém, só com com o capeta e a história mento.
esses cachorros malditos. dos cães só reforça minha
Vai ver é transmissível por teoria. Desde que seu livro – Isso mesmo. Quem
contato ou, até pior, pelo foi lançado que os ataques leria tal heresia? Cães que
ar! Eu é que não fico mais dos cachorros às pessoas se atacam pessoas impiedosa-
por aqui sem alguma razão tornaram coisa habitual. mente...
– disse uma das mulheres
– O livro que ele es- – Engraçado que dos
da roda, ficando por ali
creveu parece que foi cachorros do vilarejo esse
sem alguma razão.
ignorado pelos intelectuais menino é o único a não
– Também ouvi isso. por conta disso. O que ele fugir...
Um intelectual, aquele que narra é uma trama de ca-
– É mesmo. E os cães
perdeu a mão, diagnosti- chorros brutais que despe-
também não correm dele.
cou a enfermidade como daçam suas vítimas. Coisa
Brincam, até.
sendo doença que vem de absurda!
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gráfica local – sujeito este mente com aleijados – era outra utilidade eles possuí-
que viria a perder o nariz algo, acreditavam, que lhes am? Andrews viu que teria
alguns dias depois. Ao ler emprestava grande status. de usar muita imaginação
a obra crua, o sofisticado nesta nova obra. Não para
homem teria exclamado: Andrews foi para o inventar persuasivos cães
“magnífico!”. O que ele não pátio brincar com alguns falantes, mas para conse-
sabia é que, após a publica- dos cachorros enquanto guir dar algum sentido à
ção, os ataques sangrentos pensava na confecção de vida dos intelectuais.
começariam. outro livro para prover
algum acalanto às súplicas As pessoas souberam
A irmã, acompanhando da irmã. Teria de ser um que Andrews estava prepa-
toda aquela situação, dizia livro obediente aos ditames rando novo livro e especu-
para Andrews: mercantis: quanto mais lavam se nesta nova versão
contrário aos padrões do os cães seriam dóceis,
– Você pode não falar jovem escritor viesse, mas domesticáveis e obedientes.
com ninguém, pode não comercializável seria. Algo A mais feliz de todas era
querer conversar com que abastecesse com eterno a irmã, que agora tinha
ninguém, pode ser vetor entretenimento as mentes certeza de que ficaria rica.
desta doença, mas eu não daquela cidade e que, com O grupo dos intelectuais
o discrimino. Sei, mais que isso, fizesse dinheiro jorrar aplaudiu a idéia, pois viu
todo mundo, que você é in- para a família. No novo que o incrível menino es-
teligente e pode provar sua arranjo os cães não po- tava amadurecendo, apa-
vocação. Escreva outro li- deriam ser ferozes. Deve- rentemente parando de se
vro. Um livro decente, que riam ser mansos, tal como misturar com cães fétidos
prenda as pessoas de tal declarava o líder religioso, e, principalmente, dando
forma que elas não consi- cuja metade do abdômen mostras de que pretendia
gam se afastar das folhas. fora dilacerada por um já se unir à classe, deixando-a
Um livro diferente deste esperado ataque canino: “os mais forte, quiçá com
primeiro, que era bom, mansos é que herdarão o possibilidades de se tornar
mas cujo teor violento não Reino dos Céus!”. potência política.
agradou aos formadores
de opinião. Que sirva de Decidiu que iria além: Quando os papéis de “A
estímulo a nossa situação os cachorros-personagens matilha quimérica” ficaram
de poucas possibilidades. não atuariam somente prontos, a irmã foi corren-
Nossa família carece de como fofos coadjuvantes, do levá-los para o soberbo
recursos, você sabe. Preci- seriam o motor da mudan- editor sem nariz que, ao
samos ganhar dinheiro e ça, agiriam como verda- ver o material, exultou: “es-
estar perto da nata social. deiros insignes, trajando plêndido!”. Teve certeza de
Você não pode desperdiçar cartolas e fraques. E foi aí que todos, assim como ele,
este talento com cachorros que surgiram os primeiros leriam. Só não sabia que
raivosos! problemas. O menino teve não parariam mais de ler.
dificuldade para iniciar o
Ele não respondia. O livro por não saber exa- A irmã foi a primeira a
asco que sentia dos huma- tamente quais as atribui- ter acesso à obra pronta.
nos chegava à irmã com ções dos nobres e ilibados Sentou-se na cadeira da
pouca intensidade. Com cidadãos de destaque. Qual sala e submergiu na admi-
ela, o sentimento predo- era o papel deles na socie- rável trama com grande
minante era de pena. Dó dade? Não curavam, pois atenção. Não parou mais.
daquela menina magra e não eram médicos. Não
de andar curvado que que- – Andrews, sua irmã
construíam pontes, pois
ria ser atraente e elegante gostou mesmo do livro! Ela
não eram engenheiros.
como as amigas abastadas. acreditou em você e você
Não faziam doces, pois não
Muitas dessas namoravam provou que estava certa:
eram confeiteiros. Além
os intelectuais da cidade, está relendo “A matilha
de afirmar que os ou-
porque isto – apesar do quimérica” pela quarta
tros estavam doentes, que
incômodo que sentiam por vez. Ele será um sucesso!
seriam misantropos, que
estarem lidando intima- Com as vendas dessa obra
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Contos
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Barbara Duffles
O grito de Joana
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Contos
O Admirador
Parte 2: Pesadelo?
Maristela Scheuer Deves
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Contos
Helena http://www.flickr.com/photos/karenhorton/3293753177/sizes/o/
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Autor Convidado
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a boa Literatura
é fabricada
ficina
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Tradução
A Seita de Fênix
64 SAMIZDAT maio de 2009
64
Aqueles que escrevem tirando esta espécie de em um meio judaico se
que a seita de Fénix teve ubiquidade, muito pouco pareçam aos judeus não
sua origem em Heliópolis têm em comum uns com prova nada; o inegável é
e a derivam da restaura- os outros. Os ciganos são que se parecem, como o
ção religiosa que se suce- charlatães, caldeireiros, infinito Shakespeare de
deu à morte do reforma- ferreiros e adivinhadores Hazlitt, a todos os homens
dor Amenófis IV, alegam da boa sorte; os sectários do mundo. São tudo para
textos de Heródoto, de só exercem felizmen- todos, como o Apósto-
Tácito e dos monumentos te as profissões liberais. lo; dias atrás, o doutor
egípcios, mas ignoram, Os ciganos configuram Juan Francisco Amaro, de
ou querem ignorar, que um tipo físico e falam, Paysandú, ponderou sobre
a denominação de Fénix ou falavam, um idioma a facilidade com que se
não é anterior a Hrabano secreto; os sectários se acriollavam.
Mauro e que as fontes confundem com os de-
É dito que a histó-
mais antigas (as Saturnais mais e a prova é que não
ria da seita não registra
de Flávio Josefo, digamos) sofreram perseguições. Os
perseguições. É verdade,
só falam da Gente do ciganos são pitorescos e
mas como não há gru-
Costume, ou da Gente do inspiram os maus poetas;
po humano no qual não
Segredo. Já Gregorovius os romances, as estampas
figurem os partidários da
observou, nos coventículos e os boleros omitem os
Fênix, também é certo que
de Ferrara, que a menção sectários... Martín Buber
não há perseguição ou ri-
da Fénix era raríssima na declara que os judeus são
gor que estes não tenham
linguagem oral; em Gene- essencialmente patéticos;
sofrido ou executado. Nas
va, tratei com artesãos que nem todos os sectários o
guerras ocidentais e nas
não me compreendiam são e alguns abominam o
remotas guerras da Ásia
quando inquiri se eram pateticismo; esta pública
verteram seu sangue se-
homens da Fénix, mas que e notória verdade basta
cularmente, sob bandeiras
admitiram, em seguida, para refutar o erro vulgar
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até o fim de seus dias. cera ou a goma-arábica. se desprezam ainda mais.
Certa vez, além do Segre- (Na literatura se fala de Gozam de muito crédito,
do, houve uma lenda (ou limo; costuma-se usar este em troca, aqueles que de-
talvez um mito cosmogô- também). Não há templos liberadamente renunciam
nico), mas os superficiais dedicados especialmente ao Costume e logram
homens da Fênix a esque- à celebração deste culto, um comércio direto com
ceram e hoje só guardam mas uma ruína, um sotão, a divindade; estes, para
a obscura tradição de um ou um saguão são consi- manifestarem este comér-
castigo. De um castigo, de derados lugares apropria- cio, fazem-no com figuras
um pacto ou de um pri- dos. O Segredo é sagrado, da liturgia e assim John of
vilégio, porque as versões mas não deixa de ser um the Rood escreveu:
diferem e apenas deixam pouco ridículo; seu exer-
Saibam os Nove Fir-
entrever o veredicto de cício é furtivo e ainda
mamentos que o Deus É
um Deus que assegura a clandestino, e os adeptos
deleitável como a Cortiça
uma estirpe a eternidade, não falam dele. Não há
e o Limo.
se seus homens, geração palavras decentes para
após geração, executam nomeá-lo, mas se entende Mereci em três con-
um rito. Comparei os que todas as palavras o tinentes a amizade de
informes dos viajantes, nomeiam, ou, melhor di- muitos devotos da Fénix;
conversei com patriar- zendo, que inevitavelmen- consta-me que o Segredo,
cas e teólogos; posso dar te o aludem, e assim, no a princípio, lhes pareceu
fé que o cumprimento diálogo, eu havia dito uma frívolo, penoso, vulgar e
do rito é a única prática coisa qualquer e os adep- (o que é ainda mais estra-
religiosa que observam os tos sorriram, ou se inco- nho) incrível. Não se con-
sectários. O rito constitui modaram, porque senti- formavam em admitir que
o Segredo. Este, como já ram que eu havia tocado seus pais houvessem se re-
indiquei, se transmite de o Segredo. Nas literaturas baixado a tais práticas. O
geração em geração, mas germânicas, há poemas raro é que o Segredo não
o uso não requer que escritos por sectários, cujo se tenha perdido há tem-
as mães o ensinem aos sujeito nominal é o mar po; a despeito das vicissi-
filhos, nem tampouco os ou o crepúsculo da noite; tudes do orbe, a despeito
sacerdotes; a iniciação ao são, de algum modo, sím- das guerras e dos êxodos,
mistério é tarefa dos in- bolos do Segredo, ouço re- chega, tremendamente, a
divíduos mais baixos. Um petir. Orbis terrarum est todos os fiéis. Alguém não
escravo, um leproso ou speculum Ludi reza um vacilou em afirmar que já
um pedinte se fazem de adágio apócrifo que Du é instintivo.
mistagogos. Também uma Cange registrou em seu
criança pode doutrinar Glossário. Uma sorte de
outra criança. O ato, em horror sagrado impede a fonte: http://
si, é trivial, momentâneo e alguns fiéis a execução do books.google.com/
não requer descrição. Os simplíssimo rito; os outros books?id=7vUfapNfESkC
materiais são a cortiça, a os desprezam, mas eles
www.revistasamizdat.com 67
Tradução
Olhos de Cã
http://www.flickr.com/photos/77682540@N00/2623969513/sizes/o/
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mão grande e trêmula que quietos no corpete: “Porque Então, quando o sangue me
ficara aquecendo antes de está com a cara voltada para golpeia por dentro, é como
sentar-se ao espelho. E disse: a parede”. Então, fiz girar se alguém estivesse me cha-
“Você não sente frio”. E eu a cadeira. Tinha o cigarro mando com os nós dos dedos
lhe disse: “Às vezes”. E ela me apertado na boca. Quando no ventre e sinto meu pró-
disse: “Deve senti-lo agora”. parei diante do espelho, ela prio som de cobre na cama.
E então compreendi porque estava outra vez perto da É como se fosse como você
não havia conseguido ficar luminária. Agora tinha as disse: de metal laminado”.
sozinho na cadeira. Era o mãos abertas sobre o lume, Aproximou-se mais da lumi-
frio que me dava certeza de como duas asas abertas de nária. “Eu gostaria de ouvi-la”,
minha solidão. “Agora sin- galinha, assando-se e com o disse. E ela disse: “Se alguma
to”, eu disse. “E é incomum, rosto sombreado por seus vez nos encontrarmos, ponha
porque a noite está quieta. próprios dedos. “Acho que o ouvido nas minhas costelas,
Talvez me tenha enrolado vou ficar resfriada”, disse. quando eu estiver dormin-
o lençol”. Ela não respon- “Esta deve ser uma cidade ge- do sobre o lado esquerdo, e
deu. Começou outra vez a lada”. Voltou o rosto de perfil me ouvirá ressonar. Sempre
se mover até o espelho e e sua pele de cobre a verme- desejei que o faça alguma
rodopiei em direção a ela. lho se tornou repentinamente vez”. Ouvi-a respirar fundo,
Sem vê-la, sabia o que esta- triste. “Faça algo contra isto”, enquanto falava. E disse que
va fazendo. Sabia que estava disse. E ela começou a se durante anos não havia feito
outra vez sentada diante do despir, peça por peça, come- nada diferente disto. Sua vida
espelho, vendo minhas costas çando por cima; pelo corpete. era dedicada a me encontrar
que haviam tido tempo para Eu lhe disse: “Vou me virar na realidade, através desta
chegar ao fundo do espelho para a parede”. Ela disse: frase identificadora: “Olhos
e ser encontradas pelo olhar “Não. De qualquer modo, me de cão azul”. E, pela rua ia
dela que também havia tido verá como me viu quando dizendo, em voz alta, que
o tempo exato para chegar estava de costas”. E não havia era uma maneira de dizê-lo
ao fundo e regressar (antes acabado de falar quando já à única pessoa que poderia
que a mão tivesse tempo de estava desnuda quase por entender:
iniciar a segunda volta) até inteiro, com o lume lam- “Eu sou aquela que che-
os lábios que estavam agora bendo-lhe a comprida pele ga em seus sonhos todas as
untados de carmim, desde a de cobre. “Sempre quis vê-la noites e lhe digo isto: Olhos
primeira volta da mão diante assim, com o couro da barri- de cão azul”. E disse que ia
do espelho. Eu via, à minha ga cheio de profundos furos, aos restaurantes e dizia aos
frente, a parede lisa que era como se lhe houvessem sido empregados, antes de orde-
como outro espelho cego de feitos a pauladas”. E antes nar o pedido: “Olhos de cão
onde eu não a via — senta- que eu me desse conta que azul”. Mas os empregados lhe
da às minhas costas — mas minhas palavras se haviam faziam uma respeitosa reve-
imaginando-a onde estaria se tornado torpes diante de rência, sem que houvessem
em lugar da parede houvesse sua nudez, ela ficou imóvel, se lembrado nunca terem
sido posto um espelho. “Te aquecendo-se na órbita da dito isto em seus sonhos.
vejo”, eu lhe disse. E vi na luminária e disse: “Às vezes, Depois escrevia nos guarda-
parede como se ela houvesse acredito que sou metálica”. napos e inscrevia com a faca
erguido os olhos e houvesse Guardou silêncio por um no verniz das mesas: “Olhos
me visto de costas na cadeira, instante. A posição das mãos de cão azul”. E nos vidros
ao fundo do espelho, com a sobre o lume variou leve- embaçados dos hotéis, das
cara voltada para a parede. mente. Eu disse: “Às vezes, estações, de todos os edifícios
Depois, eu a vi baixar as em outros sonhos, acreditei públicos, escrevia com o in-
pálpebras, outra vez, e ficar que você não era senão uma dicador: “Olhos de cão azul”.
com os olhos quietos em seu estatueta de bronze no canto Disse que uma vez chegou a
corpete; sem falar. E voltei a de algum museu. Talvez por uma farmácia e identificou
dizer-lhe: “Te vejo”. E ela vol- isto você sinta frio”. E ela o mesmo cheiro que havia
tou a erguer os olhos desde disse: “Às vezes, quando ador- sentido em sua casa, uma
seu corpete. “É impossível”, meço sobre o coração, sinto noite, depois de ter sonhado
disse. Eu perguntei por quê. que o corpo se torna oco e comigo. “Deve estar perto”,
E ela, com os olhos outra vez a pele como uma lâmina. pensou, vendo o piso limpo
http://dayya.files.wordpress.com/2008/05/untitledsalvador-dali.jpg
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como se o houvesse escrito fiquei olhando-a subitamente. pouco a porta e um arzinho
num papel e houvesse apro- Olhei-a de cima a baixo e frio e tênue me trouxe um
ximado o papel do lume en- ainda era de cobre; mas não cheiro fresco de terra vegetal,
quanto o lia: “Estou ficando”, mais de metal duro e frio, de campo úmido. Ela falou
e ela houvesse ficado com o mas de cobre amarelo, bran- outra vez. Eu dei a volta, mo-
papelzinho entre o polegar e do, maleável. “Gostaria de vendo ainda a porta montada
o índice, virando, enquanto tocá-la”, voltei a dizer. E ela em dobradiças silenciosas, e
se consumia e eu acabava de disse: “Poria tudo a perder”. lhe disse: “Acredito que não
ler: “...com calor", antes que Eu disse: “Agora não importa. há corredor algum aqui fora.
o papelzinho se consumis- Bastará que viremos o tra- Sinto o cheiro do campo”.
se por completo e caísse ao vesseiro para que voltemos E ela, um pouco distante já,
chão enrugado, diminuído, a nos encontrar”. E estendi disse-me: “Conheço isto mais
convertido em insignificante a mão por cima da luminá- do que você. O que acontece
pó de cinza: “Assim é me- ria. Ela não se moveu. “Poria é que lá fora há uma mulher
lhor”, disse. “Às vezes, tenho tudo a perder”, voltou a dizer, sonhando com o campo”.
medo de vê-la assim. Tre- antes que eu pudesse tocá-la. Cruzou os braços sobre o
mendo junto à luminária”. “Talvez, se você der a volta lume. Continuou falando: “É
Víamo-nos há vários anos. por detrás da luminária, des- essa mulher que sempre de-
Às vezes, quando já estáva- pertaríamos sobressaltados, sejou ter uma casa no campo
mos juntos, alguém deixa- quem sabe em qual parte e nunca pôde sair da cidade”.
va cair lá fora uma colher do mundo”. Mas eu insisti: Eu me lembrava ter visto
e despertávamos. Pouco a “Não importa”. E ela disse: a mulher em algum sonho
pouco, fomos compreenden- “Se virássemos o travesseiro, anterior, mas sabia, já com a
do que nossa amizade estava voltaríamos a nos encontrar. porta entreaberta, que dentro
subordinada às coisas, aos Mas você, quando despertar, de meia hora tinha de descer
acontecimentos mais simples. terá esquecido”. Comecei a para o café-da-manhã. E dis-
Nossos encontros termina- me mover até o canto. Ela fi- se: “De toda maneira, tenho
vam sempre assim, com o cou atrás, aquecendo as mãos que sair daqui para acordar”.
cair de uma colher na ma- sobre o lume. E eu ainda Fora, o vento soprou por
drugada. não estava perto da cadeira um instante, depois ficou
quando ouvi-a dizer, às mi- quieto e se ouviu a respi-
Agora, junto à luminária, nhas costas: “Quando acordo
fitava-me. Eu me lembrava ração de um dormente que
à meia-noite, fico rodando na acabava de dar a volta na
que antes também havia me cama, com os fios do traves-
fitado assim, desde aquele cama. O vento do campo
seiro queimando-me o joelho cessou. Já não havia mais
remoto sonho no qual girei e repetindo até o amanhecer:
a cadeira sobre suas pernas cheiros. “Amanhã, eu a reco-
‘Olhos de cão azul’”. nhecerei por isto” disse. “Eu a
posteriores e parei diante de
uma desconhecida de olhos Então parei com a cara reconhecerei-a quando vir na
cinzentos. Foi neste sonho contra a parede. “Já está ama- rua uma mulher que escreve
que lhe perguntei pela pri- nhecendo”, disse, sem fitá-la. nas paredes: ‘Olhos de cão
meira vez: “Quem é você?” E “Quando deram as duas, eu azul’”. E ela, com um sorriso
ela me disse: “Não me lem- estava acordado, e isto faz triste — que era um sorriso
bro”. Eu lhe disse: “Mas acre- muito tempo”. Eu me dirigi de entrega ao impossível, ao
dito que nos vimos antes”. E até a porta. Quando tinha inalcançável —, disse: “No
ela disse, indiferente: “Acre- pegado a maçaneta, ouvi entanto, não se lembrará de
dito que alguma vez sonhei outra vez sua voz igual, inva- nada durante o dia”. E vol-
com você, com este mesmo riável: “Não abra esta porta”, tou a pôr as mãos sobre a
quarto”. E eu lhe disse: “É disse. “O corredor está cheio luminária, com o semblante
isso. Já começo a me lem- de sonhos difíceis”. E eu lhe obscurecido por uma névoa
brar”. E ela disse: “Que curio- disse: “Como você sabe?” E amarga: “É o único homem
so. É certo que nos encontra- ela me disse: “Porque há um que, ao despertar, não se lem-
mos em outros sonhos”. momento estive ali e tive bra de nada do que sonhou”.
que retornar quando desco- 1950
Deu duas tragadas no ci- bri que estava adormecida
garro. Eu ainda estava parado sobre o coração”. Eu tinha a fonte: http://www.lajiribilla.co.cu/2007/
diante da luminária, quando porta entreaberta. Movi um n306_03/elcuento.html
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Tradução
Cronópios e Famas
Julio Cortázar
tradução: Henry Alfred Bugalho
http://www.flickr.com/photos/deboni/2959228565/sizes/o/
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76 SAMIZDAT maio de 2009
76
Julio Cortázar múltiplas formulações. É assim
que sua narrativa constitui um
(Bruxelas, 1914 - Paris, 1984)
questionamento permanente da
Escritor argentino. Nascido em
razão e dos esquemas convencio-
Bruxelas, filho de pais argen-
nais de pensamento.
tinos, aos quatro anos, Julio
Cortázar se mudou com eles O instinto, o azar, o gozo dos
para a Argentina, para morar na sentidos, o humor e o jogo
província andina de Mendoza. terminam por se identificar com
a escrita, que é, por sua vez, a
Depois de completar seus estu-
formulação do existir no mundo.
dos primários, cursou magistério
As rupturas de ordem cronoló-
e letras e durante cinco anos foi
gica e especial tiram o leitor de
professor rural. Posteriormen-
seu ponto de vista convencional,
te, foi para Buenos Aires e, em
propondo-lhe diferentes possibi-
1951, viajou a Paris com uma
lidades de participação, de modo
bolsa. Ao término dela, seu tra-
que o ato de leitura é convocado
balho como tradutor da Unesco
a completar o universo narrati-
lhe permitiu permanecer definiti-
vo.
vamente na capital francesa.
Tais propostas alcançaram suas
Nesta época, Julio Cortázar já
mais perfeitas expressões nos ro-
havia publicado em Buenos Aires
mances, especialmente em “Jogo
o livro de poemas “Presencia” à cerimônia de posse presiden-
da Amarelinha”, considerada
com o pseudônimo de Julio cial de Salvador Allende e, mais
uma das obras fundamentais da
Denis, o poema dramático “Los tarde, foi a Nicarágua para
literatura em castelhano, e em
reyes” e a primeira de suas nar- apoiar o movimento sandinis-
seus contos, entre eles “Casa
rativas breves, “Bestiário”, nas ta. Como personagem público,
tomada” e “A baba do diabo”,
quais admite a profunda influên- interveio com firmeza em defesa
ambos adaptados ao cinema, e
cia de Jorge Luis Borges. dos direitos humanos e foi um
“O perseguidor”, cujo protago-
A literatura de Cortázar parte nista evoca a figura do saxofo- dos promotores e membros mais
do questionamento essencial, nista negro Charlie Parker. ativos do Tribunal Russell.
aproximando-se de reflexões Como parte deste compromisso,
Rapidamente, Julio Cortázar se
existencialistas, em obras de escreveu inúmeros artigos e li-
converteu numa das principais
marcado caráter experimental, vros, entre eles “Dossiê Chile: O
figuras do chamado “Boom” da
que o tornam um dos maio- livro negro”, sobre os excessos
literatura hispano-americana e
http://www.archipelagobooks.org/archimages/julio%5B1%5D.jpg
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Tradução
http://www.flickr.com/photos/antiguadailyphoto/3159358207/sizes/o/
Eduardo Galeano
tradução: Henry Alfred Bugalho
A Criação
A mulher e o homem so- lavam e armavam muito Fonte:
nhavam que Deus os estava alvoroço, porque estavam Eduardo Galeano, Memo-
sonhando. loucos de vontade de nas- ria del fuego I. Los naci-
Deus os sonhava, en- cer. Sonhavam que no mientos, Casa de las Améri-
quanto cantava e agitava sonho de Deus a alegria era cas, La Habana, 1988.
suas maracas, envolto em mais forte que a dúvida e o
mistério; e Deus, sonhando, Eduardo Galeano, Memo-
fumo de tabaco, e se sentia ria del fuego II. Las caras y
feliz e também estremecido os criava, e cantando dizia:
las máscaras, Casa de las
pela dúvida e pelo mistério. — Rompo este ovo e Américas, La Habana, 1990.
Os índios makiritare nasce a mulher e nasce o
homem. E juntos viverão Eduardo Galeano, Memo-
sabem que, se Deus sonha ria del fuego III. El siglo del
com comida, frutifica e dá e morrerão. Mas nascerão
novamente. Nascerão e viento, Quinta edición, Siglo
de comer. Se Deus sonha Veintiuno Editores, México,
com a vida, nasce e dá nas- voltarão a morrer e outra
vez nascerão. E nunca mais 1987.
cimento.
deixarão de nascer, porque
A mulher e o homem a morte é mentira.
sonhavam que no sonho de fonte: http://www.patria-
Deus aparecia um grande grande.net/uruguay/edu-
ovo brilhante. Dentro do ardo.galeano/memoria.del.
ovo, eles cantavam e bai- fuego/index.html
O lugar onde
a boa Literatura
é fabricada
ficina
www.revistasamizdat.com 79
www.oficinaeditora.org
Teoria Literária
Realismo mágico
a realidade à mercê da Literatura
Henry Alfred Bugalho
http://www.freedomarchives.org/images/Fidel_Che.jpg
americana, quando autores Cubana: o evento histórico que atraiu a atenção mundial para a Amé-
como Cortázar, Garcia Mar- rica Latina e que tornou Cuba um modelo ideológico para os países
subdesenvolvidos; associado ao início do Boom latino-americano.
quez, Vargas Llosa, Carlos
Fuentes e Alejo Carpentier O mágico na Literatura que os autores eram pesso-
despontaram no cenário as como outras quaisquer e
literário internacional e se O aspecto extraordinário buscavam em suas épocas e
tornaram as estrelas da vez. e fantástico sempre este- no comportamento de seus
ve presente na Literatura. contemporâneos a inspira-
Para compreendermos
Desde a relação íntima
http://www.flickr.com/photos/jb1/2198322192/sizes/o/
www.revistasamizdat.com 81
romano, fosse no contexto
cristão, com uma divindade
todo-poderosa, a tradição li-
terária expressou, em vários
momentos, suas mensagens
através do fantástico: Dante
desceu aos infernos, con-
duzido pelo poeta romano
Virgílio, para se encontrar
com sua Beatrice; as lendas
do ciclo arturiano apresen-
taram cavaleiros em busca
do mítico Santo Graal; em
Rabelais, os gigantes Gar-
gântua e Pantagruel atraves-
savam a França, guerreando
e festejando, e partiram em
busca de Théleme, uma
abadia fictícia onde pode-
riam encontrar a verdade;
Fausto entregou a alma a
Mefistófeles em troca da
sabedoria.
De fato, o fantástico não
permeava apenas as obras O realismo na Literatura
ficcionais, mas também nar-
rativas que se pretendiam É impossível de se de-
verídicas. Em Heródoto, o terminar o momento exato
extraordinário estava pre- em que a razão passou a
sente todo o tempo, mes- ter a primazia. No entanto,
clado a eventos históricos, é evidente que entre o final
e a própria Bíblia propaga do século XV e o come-
tradições orais calcadas ço do século XVIII, houve
no fantástico, tais como os profundas transformações
milagres e ressurreição de nos saberes, na cultura e
Jesus. na política da civilização
ocidental.
E esta predominância do
mágico não era um proble- As grandes navegações
ma para autores e leitores, significaram uma mudança
até o Racionalismo entrar nos planos político e eco-
em cena e, como afirmou nômico, enquanto que nos Topo: a descida de Dante ao
Descartes, daquele ponto campos especulativos, as re- Inferno.
em diante só se poderia flexões de René Descartes,
confiar no “certo e indubi- as descobertas de Copérni-
Acima: René Descartes, filósofo e
tável”, e não mais em meras co, Galileu e Newton, trou- matemático considerado o inaugu-
fantasias (Meditações Meta- xeram uma cisão com os rador do Racionalismo.
físicas, 1641). conhecimentos de outrora.
www.revistasamizdat.com 83
Kafka e o mundo Não é à toa que Nietzs- Topo à esquerda: Franz Kafka,
inexplicável che se tornaria referência autor de “Metamorfose” e “O
para toda uma geração fu- Processo”.
Mas a transição para o tura de pensadores e artis- Acima: Friedrich Nietzsche, arau-
século XX expôs as fragili- tas e apontaria para novos to da contemporaneidade, destrui-
dades da razão. rumos criativos. dor de ídolos e inspiração para
inúmeros filósofos e escritores do
Nietzsche talvez tenha Nas Artes e na Literatu- século XX.
sido o primeiro grande ra, a virada para o século
intelectual a identificar a diante de sua representa-
XX foi de profundas trans-
razão como deturpadora, ção. Artistas como Picasso,
formações e de acirrado
em oposição aos sentidos. Kandinsky, Dalí, Braque, se
ataque à tradição. Durante
A razão distorceria a rea- descolam do realismo e re-
a primeira metade do sécu-
lidade, ao tentar unificá-la criam a realidade de outra
lo, incontáveis movimentos
em conceitos e buscar uma maneira. O mesmo fenôme-
de vanguarda proliferaram
essência para as coisas. no também ocorreria em
pela Europa e Estados Uni-
outros campos artísticos,
O filósofo alemão retraça dos, imbuídos dum único
como na música, na escul-
o domínio da razão desde compromisso: arrastar a
tura, na fotografia, e princi-
Sócrates até seus tempos, Arte para fora de seu con-
palmente na literatura. Este
sob a inquestionável influ- formismo, testar seus limi-
foi o momento de buscar o
ência de Kant e Hegel, e tes e renová-la.
real na finitude do Homem,
desfere golpes letais contra É neste ponto que a reali- dentro de sua própria psi-
o pensamento ocidental. dade novamente se encolhe que e do tempo intangível.
www.revistasamizdat.com 85
Kafka, Edgar Allan Poe e comprometimento político que talvez condense melhor
Joyce, Borges condensou e também pelo equivocado o espírito da literatura do
o espírito duma geração apoio ao governo peronista Boom, “Cem Anos de So-
em crise e sublimou este e ao golpe militar de Pino- lidão”, de Gabriel García
esfacelamento da noção de chet no Chile. Márquez, de 1966.
verdade e referência em Em 1960, a obra de Bor- Na obra “Spanish Ameri-
seus contos. ges já havia sido traduzida can Fiction”, o pesquisador
Não é acidentalmente para inúmeros idiomas e Donald L. Shaw apresenta
que, posteriormente, Borges era acolhida pela crítica e as seguintes características
seria acolhido pelos teó- público internacional. da literatura do Boom:
ricos estruturalistas, que Este escritor, que durante
encontrariam em seus tex- praticamente toda a vida “1. O desaparecimento do
tos a expressão desta cisão, lutou contra problemas velho romance “criollista”, ou
deste corte epistemológico. de visão e morreu com- “telúrico”, de tema rural, e o
O universo de Borges não pletamente cego, enxergou surgimento do neo-indigenis-
era utópico, posto que não mais longe do que muitos mo de Asturias e Arguedas.
apresentava um mundo de seus contemporâneos, e
idealizado, nem distópico, já traçou o caminho para a 2. O desaparecimento do ro-
que não representava uma geração seguinte, que con- mance “engajado” e o surgi-
outra realidade decadente e quistaria o mundo com mento do romance “metafísico”.
opressora, mas sim parató- suas histórias extraordiná- 3. A tendência a subordinar a
pico (Foucault, no prefácio rias. observação à fantasia criadora
de “As Palavras e as Coisas”), e à mitificação da realidade.
no qual, em alguns casos,
4. A tendência de enfatizar
nem as regras físicas da O Boom e seus aspectos ambíguos, irracionais
nossa realidade vigoravam, estilhaços e misteriosos da realidade e da
tal qual ocorre no conto
personalidade, desembocando,
“Tlön, Uqbar, Orbis Tertius” Num intervalo de pou- às vezes, no absurdo como me-
ou na antologia “O Livro cos anos, vários autores da táfora da existência humana.
dos Seres Imaginários”, América Espanhola publica-
escrito em parceria com ram seus livros e se torna- 5. A tendência a desconfiar do
Margarita Guerrero. ram sucesso de vendas e conceito de amor como supor-
te existencial e de enfatizar, em
Para Borges, a literatura crítica.
troca, a incomunicabilidade e
era um “orbe autônomo”, Há pouco consenso sobre a solidão do indivíduo. Antir-
descolado da realidade, e qual livro teria inaugurado, romantismo.
onde tudo é possível de de fato, a geração do Boom,
acordo com a vontade do mas “O Jogo da Amareli- 6. A tendência a desprover
autor. nha” de Julio Cortázar é de valor o conceito de morte
num mundo que, por si só, é
Esta falta de engajamento, um forte candidato, ao lado
infernal.
que transparecia neste ideal de “A Cidade e os Cachor-
duma literatura voltada ros” de Mario Vargas Llosa, 7. A revolta contra toda a es-
para a própria literatura, ambos publicados em 1963. pécie de tabu moral, sobretudo
seria o calcanhar de Aqui- Numa sucessão vertiginosa, aqueles relacionados à religião
les de Borges, cotado várias vieram as principais obras e à sexualidade. A tendência
vezes para receber o prê- de Carlos Fuentes — “A paralela a explorar a tenebro-
mio Nobel, mas repudiado Morte de Artemio Cruz” e sa magnitude de nossa vida
por causa de sua falta de “Aura” — e aquele romance secreta.
www.revistasamizdat.com 87
“Cem Anos de Solidão”, do co- Elena Poniatowska, António
lombiano Gabriel García Márquez Skármeta, Gustavo Sainz e
é considerado como o apogeu do Manuel Puig — em mui-
Boom. O autor recebeu o Nobel de
tos casos, com uma escrita
Literatura em 1982.
tipo exportação, visando o
acabaram coagidos a se in- público internacional, que
serir nas temáticas e formas já sabia o que esperar da
adotadas pelos autores do literatura latino-americana.
Boom, sob o risco de serem
Além destes, na contra-
rechaçados como párias.
mão do realismo mágico,
O próprio Cortázar aler- surgiu um grupo de es-
tou sobre os perigos de se critores, encabeçados por
considerar que todo escri- Alberto Fuguet, agregados
tor latino-americano seria, pelo movimento McOndo,
naturalmente, um grande uma corruptela do nome da
prosador, e que o sucesso cidade fictícia de Macondo,
entre os autores latinos de alguns e o orgulho não criada por García Márquez.
foram as casas editoriais deveriam ofuscar as possi-
Fuguet define McOndo
espanholas, mas, sem dúvi- bilidades criativas.
assim:
da, a entrada no mercado
Foi no rastro do Boom,
norte-americano foi funda-
ou em oposição a ele, que
mental para a propagação e “(...) Chegamos a pensar que
a geração literária seguinte
consolidação do Boom. a América Latina era uma
teve de encontrar sua iden-
Em 1970, os EUA e o tidade. invenção dos departamentos
mundo já haviam sido de espanhol das universidades
conquistados pela literatura norte-americanas. Saímos para
hispânica da América. No Pós-Boom e a geração conquistar McOndo, e só des-
entanto, considera-se que McOndo cobrimos Macondo. Estávamos
o final do Boom, e a con- em sérios problemas. As árvo-
sequente transição para a Este artigo não esta- res da selva não nos deixavam
geração pós-Boom, tenha ria completo se não nos ver a ponta dos arranha-céus.
ocorrido exatamente nesta detivéssemos, por alguns (...)
época, quando os abusos do instantes, para observar os O nome (marca-registrada?)
regime castrista em Cuba efeitos do Boom. Os au- McOndo é obviamente um
começaram a abalar a con- tores exponenciais, como chiste, uma sátira, uma brin-
fiança da intelectualidade Cortázar, García Márquez, cadeira. Nosso McOndo é tão
na experiência comunista Vargas Llosa e Carlos Fuen- latino-americano e mágico
na América. tes continuaram escrevendo, (exótico) quanto o Macondo
Contudo, sem dúvida, o e fazendo sucesso, mesmo real (que, no final das contas,
Boom significou a inserção após o término do Boom. não é real, mas sim virtual).
da literatura latino-ameri- E adotando várias das Nosso país McOndo é maior,
cana no cenário interna- técnicas e/ou características superpovoado e cheio de con-
cional, ao mesmo tempo da narrativa deles, alguns taminação, com rodovias, me-
que se projetou como uma outros autores consegui- trô, tv-a-cabo e subúrbios. Em
maldição para as gerações ram romper a barreira do McOndo, há McDonald’s, com-
vindouras de escritores da anonimato, entre eles Isabel putadores Mac e condomínios,
América Espanhola, que Allende, Laura Esquivel, além de hotéis cinco estrelas
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Crônica
O Milagre do Sol
Joaquim Bispo
http://www.flickr.com/photos/pagedooley/3344239832/sizes/l/
www.revistasamizdat.com 91
às cinco da tarde é quente.
A procissão movia-se deva-
gar em frente da Sé. Então,
comecei a ouvir algumas
pessoas – uma aqui, outra ali
– a chamar a atenção para
o sol, a apontar, a dizer que
viam o sol a girar. Uns e ou-
tros olhavam, tentando ver o
fenómeno. O entusiasmo não
era grande. Olhei também, de
relance. O sol era uma bola
de fogo, como habitualmente,
perigoso para os olhos como
sempre. O «milagre do sol» de cionista:
Então, julguei compreen- 1917 tem aspectos difíceis «Não há conflito entre
der tudo. Eu estava farto de de enquadrar numa única ciência e sobrenatural. Se
assistir a milagres do sol, explicação. Há até quem fale houvesse fantasmas, fadas,
cada vez que jogava ténis em Ovnis. Eu, por mim, fico duendes, a ciência teria de os
quando, tendo que acompa- dividido. Por um lado, gosto investigar. O problema não é
nhar alguma bola alta, dava de cultivar uma atitude de da ciência, mas do Universo
com os olhos no sol: a minha abertura, conforme aprendi que nos calhou, que não veio
retina ficava maculada com do astrónomo francês do equipado de sobrenatural.»
uma mancha, onde o sol século XVIII, Laplace:
a queimara e, durante um «Estamos tão longe de
bocado, uma mancha com a Fontes:
conhecer todas as forças da
mesma forma e de uma cor Natureza e suas múltiplas Seomara da Veiga Ferreira,
arbitrária, sobrepunha-se a modalidades de acção, que As Aparições em Portugal
tudo o que eu olhava. Para seria pouco filosófico ne- dos Séculos XIV a XX, Reló-
mim, aquela gente estava a gar a existência de certos gio d’Água, 1985.
queimar a retina irrespon- fenómenos apenas porque http://pt.wikipedia.org/
savelmente, e foi isso que não podem ser explicados wiki/O_Milagre_do_Sol
disse a algumas pessoas, no estado actual dos nossos
http://www.fatima.org/
levemente receoso de que conhecimentos.»
port/essentials/facts/pmiracle.
me considerassem herege.
Por outro, irritam-me as asp
Ninguém ficou escandaliza-
explicações de base sobre-
do ou irritado, talvez só um
natural, que, até agora, só
pouco pesaroso de que o seu
nos fizeram perder tempo
desejo não se concretizasse.
precioso na compreensão do
Eu próprio fiquei um pouco
Universo. Gostei do que ouvi
desapontado, embora não
há dias a um cientista evolu-
esperasse outra coisa.
http://www.moviemachine.nl/images/movies/amelie_poulain015.jpg
Giselle Natsu Sato
www.revistasamizdat.com 93
Crônica
A Visita do Saci
Henry Alfred Bugalho
http://www.flickr.com/photos/jmarconi/1164617430/sizes/o/
www.revistasamizdat.com 95
— Gente, olha lá pra Especularam que havia
porta! sido vovó quem havia
saído, à noite, para ir
E, como era de se
ao banheiro (que era
esperar, havia a silhue-
no quintal), mas ela
ta descascada do Saci,
jurou de pés juntos que
contudo, havia dois
não tinha acordado de
novos elementos: agora
madrugada. Portanto,
ele tinha a perna única
indubitavelmente, era o
e, aparentemente, saía
Saci quem havia entra-
fumacinha do cachim-
do.
bo dele.
Laboratório Poético:
um ser indefinido
Volmar Camargo Junior
Incógnita
um diabinho empoeirado se esgueirava
http://www.flickr.com/photos/paperpariah/2417142640/sizes/o/
entre as pernas das cadeiras
debaixo das camas, à hora do banho
Fera (Vermelho-gente)
tinge-te, fera, de vermelho-gente
quente troféu vivo de tua caça
dure a tua raça, fera, eternamente
www.revistasamizdat.com 97
Poesia
Poemação
Caio Rudá
http://simonerossi.files.wordpress.com/2009/03/mela-magritte-21.jpg
I.
O poema é uma maçã
que despenca da árvore,
ao sopro do vento, e
chega, seu único propósito,
ao chão.
II.
Me admira o homem
com sua astúcia
fazer da maçã
objeto não de único objetivo.
Ah! E no outono
abre uma tímida rosa http://www.flickr.com/photos/rheinland1977/458847518/sizes/l/
revela-se a vida.
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Poesia
Sementementalismo
Dênis Moura
http://www.flickr.com/photos/10202475@N02/2439540698/sizes/o/
E o Sol aquece e a chuva lhe modera;
E entre o dia e a noite se pondera
Em juntos vivermos unicamente.
SAMIZDAT
Edição, diagramação e capa
Revisão
Joaquim Bispo
Ex-técnico de televisão, xadrezista e pintor amador,
licenciado recente em História da Arte, experimenta
agora o prazer da escrita, em Lisboa.
episcopum@hotmail.com
www.revistasamizdat.com 101
Assessoria de imprensa
Mariana Valle
Por um amor não correspondido, a carioca de
Copacabana começou a poetar aos 12 anos. Veio o
beijo e o príncipe virou sapo. Mas a poesia virou sua
amante. Fez oficina literária e deu pra encharcar o
papel com erotismo. E também com seu choro. Em
reação à hipocrisia e ao machismo da sociedade.
Atuou como jornalista em várias empresas, mas foi
na TV Globo onde aprimorou as técnicas de reda-
ção e ficção. E hoje as usa para contar suas próprias
histórias. Algumas publicadas em seu primeiro livro
e outras divulgadas nos links listados em seu blog
pessoal: www.marianavalle.com
Coordenação de Entrevista
102 SAMIZDAT
102 SAMIZDATmaio
maiode
de2009
2009
102
Colaboração
http://www.photoshoptalent.com/images/contests/spider%20web/fullsize/sourceimage.jpg
Caio Rudá
Bahiano do interior, hoje mora na capital. Estuda
Psicologia na Universidade Federal da Bahia e espera
um dia entender o ser humano. Enquanto isso não
acontece, vai escrevendo a vida, decodificando o enig-
ma da existência. Não tem livro publicado, prêmio,
reconhecimento e sequer duas décadas de vida. Mas
como consolo, um potencial asseverado pela mãe.
Barbara Duffles
Jornalista, escritora e roteirista, é autora do livro
“Não Abra” e do blog “Não Clique”. Apesar das nega-
tivas, esta carioca quer, sim, ser lida - como todo es-
critor. Tem dias de conto, de crônica e de pílulas sem
sentido. Suas paixões: cinema e livros com cheiro de
novo - se bem que adora se perder nos sebos da vida.
Carlos Barros
Paulistano, filho de nordestinos, desenhista desde
sempre, artista plástico formado, escritor. Começou
sua vida profissional como educador e, desde então,
já deixou seu rastro por ONG’s, Escolas e Centros
Culturais, através de trabalhos artísticos e pedagó-
gicos – experiências que têm forte influência sobre
seus escritos. Atualmente, organiza oficinas de ilus-
tração para crianças, estuda pós-graduação em Histó-
ria da Arte e escreve para publicações na internet.
carloseducador@hotmail.com
http://desnome.blogspot.com
www.revistasamizdat.com 103
Dênis Moura
Paulistano de pia, cearence de mar e poeta de
amar. Viaja tanto o céu estrelado quanto o ciberes-
paço, mais com bits de imaginação que com telescó-
pios. Pensa que tudo se recria a cada Big Bang, seja
ele micro, macro ou social. Luta pela justiça, a paz e
a igualdade, com um giz na mão e uma pistola na
outra. É Tecnólogo a sonhar com Telemática social,
com a democracia participativa eletrônica, onde o
povo eleja menos e decida mais. Publica estes dias
sua primeira obra, um Romance de Ficção Científi-
ca, e deixa engavetadas suas apunhaladas poesias. É
feito de bits, links e teia pra que não desmaterialize,
o clique, o blogue e o leia!
Giselle Sato
Autora de Meninas Malvadas, A Pequena Baila-
rina e Contos de Terror Selecionados. Se autodefine
apenas como uma contadora de histórias carioca.
Estudou Belas Artes, Psicologia e foi comissária de
bordo. Gosta de retratar a realidade, dedicando-se
a textos fortes que chegam a chocar pelos detalhes,
funcionando como um eficiente panorama da socie-
dade em que vivemos.
Guilherme Rodrigues
Estudante de Letras na Universidade do Sagrado
Coração, em Bauru, onde sempre morou. Nutre gran-
de paixão por Línguas, Literatura e Lingüística, áreas
a que se dedica cada vez mais.
http://www.photoshoptalent.com/images/contests/spider%20web/fullsize/sourceimage.jpg
público e amante da literatura. Formado em Comu-
nicação Social pela FACHA - Faculdades Integradas
Hélio Alonso, participou da antologia de crônicas
“Retratos Urbanos” em 2008 pela Editora Andross.
Maristela Deves
Gaúcha nascida na pequena cidade de Pirapó, co-
meçou a sonhar em ser escritora tão logo aprendeu a
ler. Escreve principalmente contos nos gêneros misté-
rio, suspense e terror, além de crônicas.
Pedro Faria
Estuda Matemática na Universidade Estadual do
Rio de Janeiro, músico amador e escritor quando dá
na telha. Nascido e criado no Rio.
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Também nesta edição, textos de
Joaquim Bispo
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