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Eça de Queirós

Os Maias
O Espaço
• Físico
• Social
• Psicológico

«Entravam então no peristilo do Hotel Central – e


nesse momento um coupé da Companhia, chegan-
do a largo trote do lado da Rua do Arsenal, veio
estacar à porta.
…E no silêncio a voz de Craft murmurou: - Très
chic.»

Disciplina de Português

Maio de 2009
Os Maias – O Espaço

Índice
Introdução ...................................................................................................... 2
Espaço Físico ............................................................................................... 2
• Santa Olávia ............................................................................................................. 2
• Paços de Celas ...................................................................................................... 2
• O Ramalhete ............................................................................................................ 3
• Outros Espaços ..................................................................................................... 3
Espaço Social .............................................................................................. 4
• Ambientes ................................................................................................................. 4
• Figurantes (personagens-tipo) ..................................................................... 4
Espaço Psicológico................................................................................... 5
Conclusão ...................................................................................................... 5
Bibliografia .................................................................................................... 6

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Os Maias – O Espaço

Introdução
O espaço é uma das classes narrativas, à qual lhe é atribuída uma fun-
ção crucial no enredo d’Os Maias. O autor dá-lhe especial ênfase ao debater-
-se principalmente pela descrição pormenorizada e muito completa de todo
o tipo de espaços, desde os móveis de uma certa divisão, com a sua devida
simbologia, até ao comportamento de uma personagem-tipo inserida no seu
meio social. Deste modo, é possível dividir o espaço em três tipos: espaço
físico, social e psicológico.
O espaço físico não é mais do que o conjunto de locais onde a acção se
desenrola e onde os personagens se inserem, o palco desta história. O
espaço social, que desempenha talvez a função mais importante, inclui os
ambientes e todo um grupo de figurantes/personagens que os acompa-
nham. Representa o paradigma sócio-religioso português, cumprindo um
papel eminentemente crítico desta rede social. Por último, tem-se o espaço
psicológico, formado pelas variações constantes de consciência das perso-
nagens, manifestando-se nos momentos de maior densidade dramática.

Espaço Físico
O espaço físico exterior acompanha o percurso da personagem central,
Carlos, e é motivo para a representação de atributos inerentes ao espaço
social. Por outro lado, os espaços interiores estão de acordo com o estilo
realista de Eça: a interacção do homem e o ambiente que o rodeia.
Os espaços geográficos mais relevantes são Coimbra, Lisboa e Santa
Olávia e ligam-se às vivências da personagem central, Carlos, em diferentes
fases da sua vida.
• Santa Olávia
Situada à beira do Douro, no lugar de Resende, é o lugar de eleição de
Afonso da Maia. Santa Olávia simboliza a fertilidade da terra onde abunda a
água, tendo dado a Carlos a educação e o vigor físico inglês que o caracteri-
zam. Um espaço rural e sadio que se opõe à cidade, e associa-se à regene-
ração dos dois varões da família. É o símbolo da vitalidade que contraria
Lisboa “a cidade inflamada”, absorvendo o mal que esta faz, servindo de asi-
lo quando algo de mau se dá. A seguinte citação caracteriza bem a quinta:
“(…) que o [Afonso] prendera mais a Santa Olávia fora a sua grande riqueza de águas
vivas, nascentes, repuxos, tranquilo espelhar de águas paradas, fresco murmuro de águas
regantes… E a esta viva tonificação de água atribuía ele o ter vindo assim, desde o começo
do século, sem uma dor e sem uma doença, mantendo a rica tradição de saúde da sua famí-
lia, duro, resistente aos desgostos e anos – que passavam por ele, tão em vão, como passa-
vam em vão, pelos seus robles de Santa Olávia, anos e vendavais.” (Cap. I)

• Paços de Celas
Presente de Afonso para o neto, este espaço assiste à passagem da
adolescência para a maturidade de Carlos. É a sua residência enquanto ele
estuda na universidade, em Coimbra e a sua primeira manifestação de arte,
com a toda a decoração da nova casa a seu encargo. Conhece aqui o seu
primeiro amor, Hermengarda. Os Paços são palco de festas e soirées que
tem com os restantes estudantes, incluindo João da Ega (ele próprio encar-
regou-se de dar o nome à casa), onde se põe ocorrente das últimas tendên-
cias culturais, principalmente estrangeiras, e até de ideias revolucionárias:

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Os Maias – O Espaço
“(…) Ao princípio este esplendor tornou Carlos venerado dos fidalgotes, mas suspeito
aos democratas; quando se soube, porém, que o dono destes confortos lia Proudhon,
Augusto Comte, Herbert Spencer, e considerava também o país uma choldra ignóbil — os
mais rígidos revolucionários começaram a vir aos Paços de Celas tão familiarmente como
ao quarto do Trovão, o poeta boémio, o duro socialista, que tinha apenas por mobília uma
enxerga e uma Bíblia.” (Cap. IV)

• O Ramalhete
Lisboa é o centro da vida social, política, económica e cultural, fazendo
desta casa um lugar privilegiado. Localizado no, até então, bairro chique de
Benfica, o Ramalhete é a referência e a habitação primordial da família Maia
em Lisboa. É nesta casa que se dão os acontecimentos (rusgas policiais) que
levam Afonso da Maia ao exílio, que regressa para continuar a educar Pedro.
Contudo, o ramalhete cai na degradação novamente, palco da morte de Maria
Runas e suicídio de Pedro.
Requalificado por Carlos, vindo de Coimbra, determina novamente o
Ramalhete como domicílio da família. É então empreendida uma exótica
redecoração que rejuvenesce o interior de toda a mansão, espelho da apura-
da estética de Carlos causada pela vanguardista educação inglesa ensinada
em Santa Olávia.
“(…) inesperadamente, Carlos apareceu em Lisboa com um arquitecto-decorador de
Londres e (…) entregou-lhe as quatro paredes do ramalhete, para ele ali criar, exercendo a
seu gosto, um interior confortável de luxo inteligente e sóbrio” (Cap. I)
“(…) Defronte era o bilhar, forrado de um couro moderno trazido por Jones Bule, onde
(…) esvoaçavam cegonhas prateadas. E, ao lado, achava-se o fumoir, a sala mais cómoda:
as otomanas tinham a fofa vastidão de leitos; e o aconchego quente, e um pouco sombrio
dos estofos escarlates e pretos era alegrado pelas cores cantantes das faianças holande-
sas.” (Cap. I)
Parecendo símbolo de uma ruptura com o passado trágico, o Ramalhete
representará, em seguida, uma descida sem retorno dos dois varões, em
direcção ao destino fatídico da morte de Afonso, em virtude do desgosto
causado pela relação incestuosa entre os seus netos.

• Outros Espaços

Recurso para evasão Preconiza a dualidade


de problemas. Europa Consultório de espírito: homem do
Estrangeiro
como origem do pro- de Carlos mundo e ao mesmo
gresso e das ideias. tempo da ciência
Um paraíso natural Casa de
Revela a personalidade
Sintra como extensão lis- Maria
da irmã de Carlos
boeta. Eduarda
Reflecte a sensuali- Ponto de encontro. Crí-
A Vila Balzac
dade de Ega. Eventos tica à hipocrisia da
Espaço carregado de Sociais sociedade de aparên-
A Toca simbolismo. Consu- (transição para o cias. Visibilidade da
(Olivais)
Olivais) mação de relações espaço social) degradação moral e da
proibidas. ignorância.

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Os Maias – O Espaço

Espaço Social
Esta época de grandes convulsões sociais e científicas – a Regeneração,
e o meio social lisboeta aparecem-nos retratados ao longo desta obra, atra-
vés de ambientes e cenários onde “representam” determinadas personagens
que carecem de caracterização pessoal, para melhor representarem os seus
papéis de personagens-tipo, ou seja, de afigurarem os bons e os maus hábi-
tos, as qualidades e os defeitos, as mentalidades retrógradas ou progressis-
tas de certo grupo social, profissional ou cultural.
Ao longo do romance surgem momentos de pausa onde uns ou outros
destes figurantes se reúnem, manifestando não a sua individualidade, mas
aqueles tiques, deformações e limitações que caracterizam as qualidades e
suas classes sociais. Constituem, então, o espaço social os figurantes (per-
sonagens-tipo e os locais de convívio.
• Ambientes
O Jantar no Hotel Central
O contacto de Carlos com a sociedade de elite, a crítica literária e a lite-
ratura, a situação financeira do país e a mentalidade limitada e retrógrada.
As corridas de cavalos
O desejo de imitar o que se faz no estrangeiro e o provincianismo do
acontecimento.
O jantar em casa do Conde de Gouvarinho
Permite, através da falas das personagens, observar a degradação dos
valores sociais, o atraso intelectual do país, a mediocridade mental de algu-
mas figuras da alta burguesia e da aristocracia e a superficialidade das opi-
niões de Sousa Neto, o representante da administração pública.
O episódio na redacção do jornal A Tarde.
A parcialidade do jornalismo da época e a influência política adjacente.
O sarau literário do Teatro da Trindade
A superficialidade dos temas de conversa, a insensibilidade artística e a
iliteracia estética, a ignorância dos dirigentes, a oratória vazia dos políticos e
os excessos do Ultra-Romantismo.
• Figurantes (personagens-tipo)
As Educação
Pedro ou Eusébio, correspondem eles próprios a um tipo de educação
que absorveram enquanto crianças – a educação portuguesa tradicionalista,
altamente católica, caracterizada por um afecto incondicional materno, passi-
vidade em relação à vida, uma vida condenada a uma tristeza crónica (que
provocou suicídio), etc. Por exemplo, Pedro encontrava refúgio no colo das
empregadas, ao mesmo tempo que o padre lhe ensinava os inimigos da
alma, ou Eusebiozinho sendo dominado pelas figuras femininas de mamã e
titi enquanto se isolava a ler um livro, vítima da sua fobia social. Por outro
lado, tem-se Carlos, resultado de uma educação à inglesa que o avô, desde
logo, instaurou de modo a não perpetuar aquilo que havia acontecido ao
filho. Deste modo, Carlos afigura-se de boa constituição física, produto de
banhos de água fria, uma dieta rigorosa, podendo «correr livremente, pular,
cair, subir às árvores». Tudo isto gera uma vida adulta ociosa que viola as
leis morais ao praticar incesto.
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Os Maias – O Espaço
Na seguinte tabela apresentam-
apresentam-se outras figuras:
PERSONAGEM PAPEL NA OBRA E REPRESENTATIVIDADE
REPRESENTATIVIDADE SOCIAL
SOCIAL
Defensor do Romantismo, opositor do naturalismo, bondoso e
Alencar
idealista. Adjuvante da relação Pedro/Maria.
Oposto de Alencar, defensor do naturalismo e da ciência lite-
Ega
rária. Adjuvante da relação Carlos/Maria
Ministro do Reino, político incompetente, descuidado em rela-
Conde de Gouvarinho
ção à relação extraconjugal da mulher.
Condensa de Gouvarinho Provocante, adultério nas camadas mais abastadas.
Democrata e simpatizante do comunismo, portador da catas-
Guimarães
trófica carta.
Directores dos jornais corruptos – símbolos de jornalismo
Neves e Palma Cavalão
parcial e político.
Steinbroken Entusiasta de Inglaterra e das ideias estrangeiras.
Cruges Um homem moralmente são e artisticamente avançado.
Jacob Cohen Judeu banqueiro, representante da alta finança.
Inglês culto, rico, boémio, coleccionador de antiguidades,
Craft
senhorio da casa onde se consuma o incesto.

Espaço Psicológico
A representação do espaço psicológico, vai-se acentuando ao longo da
obra, à medida que a intriga se complica e aproxima-se do desenlace. É este
o espaço mais íntimo das personagens, dado que está relacionado com o
estado de espírito das personagens, representa as emoções sentimentos,
visões pessoais, sonhos e reflexões. Manifesta-se principalmente em
momentos de maior densidade dramática. É sobretudo sobre Carlos que o
narrador se debruça para dar origem a este espaço.
Este espaço é-nos claramente transmitido pelo narrador, o qual muito
frequentemente se coloca na mente e visão das personagens, descrevendo o
exterior, quer as pessoas ou os espaços, mediante o estado de espírito da
personagem. Bons exemplos são aqueles em que as personagens estão
apaixonadas, nomeadamente Carlos e Pedro que parecem ver as suas ama-
das como se fossem divindades, caracterizando, de forma cega, obstruída
pelo amor, formas físicas espectacular e idilicamente.

Conclusão
De todos estes espaços, notoriamente, o que toma mais importância é o
espaço social porque, para além da sua interacção com as personagens, tem
uma função muito mais implícita, cuja função é a da sátira e da crítica social,
que confere a Os Maias um estatuto semelhante a uma crónica de costumes.
O espaço físico não é fictício, seguindo os parâmetros realistas, o que acom-
panha o percurso da personagem principal, Carlos e é motivo para a repre-
sentação de atributos inerentes ao espaço social. Os interiores estão
também de acordo com o saber naturalista – a interacção entre o homem e o
ambiente que o rodeia.
Por fim, o espaço psicológico confere à história uma caracterização mui-
to mais rica do espaço, já que não se fica pela descrição real da “cena”,
expandindo-se para o que o instável íntimo psicológico percepciona. Ainda
assim, a presença deste espaço implica, como é óbvio, subjectividade, cuja
presença põe os preceitos naturalista, uma vez mais em causa.
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Os Maias – O Espaço

Bibliografia
• ARRUDA, Lígia (1998). Os Maias de Eça de Queirós. 2.a edição, S. João do
Estoril: Edições Bonanza.
• PINTO, Elisa; BAPTISTA, Vera; FONSECA, Paula. Plural – 11º ano. 1.a edi-
a
ção, 4 reimpressão, Lisboa: Lisboa Editora.
• http://pt.wikipedia.org/wiki/os_maias
• http://pt.wikipedia.org/wiki/e%C3a_de_queir%O6s
• http://pt.wikipedia.org/wiki/naturalismo_e_realismo

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