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Anfsio Franco fo de Obios, O Man Jey Ce mes prepanra o invest BB cadore grande hist ‘tura antiga Vitor sigdo na G: criador da pin io mais uma expo- ade Pintura do Rei D- da Ajuda, quando se s cederam varios episédios «rocamboles: cose. A esse tempo, o entusiasmo de Vitor Sertio era contagiante. Qutra coisa Jesus Salvador do Muro, dle weph em Obidos « datada 1682. Josefa e a Bruxa nao seria de esperar, € assim que Vitor Serrio trabalha, envelvendo-se de corpe 2 alma nos projectos. No turhilhio das clescobertas € recenseamento de obras da pincura, tarefa 0 fez deslocar-se a todas as paragens de Rortugal onde se sus- peitava existir um quadio de Josefa, ou tum documento que esclarecesse algo mais atora portuguesa Josefa & custa da nossa sobre a vida apaixonante da estima ar tista, Vitor Serio a todas as soicitagie espondia cada ver mais exausto, Este cansago, no entanto, nunca o fee esmo. recer, pelo contrério, parecia alimentado por uma vontade e forca sobrenaturas. Chegou mesmo a colocars no semansioO indepe nte, que na al- tura tomou a iniciativa cle promaver este tipo cle eventos de interesse nacional gra- tuitamente, pedindo a todas as pessoas que julgnssem ter uma obra de Josefa de Obidos que comunicassem 0 facto para a Galeria. Neste vai nao vai, ki se desdobrava 0 Vitor em consultas gratuitas com 0 nico intuito de aumentar 0 accrvo conheside da pintora, Neste ponto,¢ indispensivel cenakecer a formna correcta e puramente apaixonada com que Vitor Serio o fe. Porque sto de se gostar verdadeiramen- te de pintura, seja-se investigador ou eo leccionador, nada tem que ver com inte- resses pecuniaries. O grande investimento feito, nestes casos, 6 no puro prazer da fruicdo estética. B.a Josefa, mais do que apenas esse prazes, provoca em todos nds um earinho que teré, antes de tudo, aver ‘com a nossa memtia colectiva e de certo modo com as nossas recordagées infan- tis, num verdadeiro processo frendiano que Joaquim Caetano tio claramente clareceu: em niimero anterior desta re- vista («Arte Ibérica» n® 13, Abril de 1998), quando foi vento em hasta pie blica por 30 mil cantes um Menino idén- tico ao que vendeu a Leiria & Nasei- mento no passado dis 16 de Jan Eram de todo o génera as obras que os particulares julgavam sec de Josefa, desde obras pintadas sobre vidro a outras cuja sutoria no passava de mera imaginacdo de proprictérios que a todo 0 custo in- tentavam levar o investigador a aurenti- carlhes a obra. Leda engano de quem gostaria de ver sumentado largamente 0 seu patrimonto, E que quem tinham pela frente era «somente> um dos mais sérios a autorizados investigadores porrugueses Julgo mesmo ser ele a pessoa mais capa citada para, apenas a um golpe de vista, Identificar imediatamente a autoria de toa parte das pinturas antigas portugu sas. Teve, por isso, muitas vezes de afas- tar respeitosamente as ilusoes de quem julgava possuir obra: de Josefa. No meio deste processo de verdadeira Joucura resolvernos entie an Joaquim Caetano e 0 Nuno Saldanhy— econdimentar» ainda mais vida 0 nosso amigo Viter. Assim fzemos: pedi & minha ie que copiasse uma das Naturezas Mortas de Josefa, as quai, 2 époea, se vendiam reprodugées em poster no Museu de Arte Antign. Depois de ter sido copiada para uma tela recente, a obra foi submetidh a verdadeiros trates de pole: sobre a tinta foi aplicado um verniz que rapidamente estalou com uma breve pas- sagem no forno a alta temperatura; ret rata da grade, foilbe colada na parte pos- terior uma tela grosseira que initava as ntigas sobre a qual nova camada de cola se deu e em cinra dela foi despejado todo © contetido de um saco de aspirador: A grade foi envelheckla por um marcenei. ro que efa meu mestre num curso de res- auto de mobilidcio que entio vesistia © que tinha ganho a sua vida falsficando inSveis por tertas de Franga. Nesta grade tragémos uma assinatura do pai de Jose- fa, Baltazar Gomes Figueira, gura que, talvez mais do que a prépria pintora, 6s tava a despertar interesse do Vitos, quer pela qualidade das suas obras, quer pela importincia que deveria ter tido na for: magao da filha, Depois de tudo monta- do a obra estava iereconhecivel, diria mais, parecia saida das eaves de uma cesa atingida por um bombardeamento. En- ‘retanto, o Castano ia preparundo © Vitor Serrio, dizendo-lbe que eu tinha perdi- do acakeca e que the ia oferecer para e0- memoragio do seu aniversirio um pre- sente espantoso, Chegado o dia, coloeémos 0 quadro no escritério da casa em que todos viviamos naxquele tempo, onde a lus era & que con- vinha 3 pintura tenebrista. Quando acompanhamos o Vitor até esta sala ele apanhou um valente susto:a cara empa- lidecenw-se-lhe e de nvios prostradas per- deu a fala, os olhos nfo se despegando da obra. Mas por isso mesmo e porque como jé referi ele €, sem margens para ddvida, o melhor observador de pintuca antiga portuguesa que conhego, este es- tado durou apenas alguns segundos e ene reben’imos todos a ir A gongalha- da. Prosseguia o Vitor na sua laboriosa in- vestigacio, quando tecebeu em casa uma estranha missiva de uma serthora espa- rola que se arrogava saber mis do que ele sobre a pintora portuguesa, ofere- cendo-se para redigit todas as flchas do catilogo da exposigio. Respondeucthe o nosso amigo com simpatia ¢ respeito, €2 correspondencia intensiicou-se. Foi per cekendo, contudo, que muito do seu saber sobre Josef nfio pod ter hases po- sitivas, mas antes sobrenacurais. Um dia contouthe que o espitito da pintor tinha baixaclo sobre ela, tendo entao, «encar- nada desta certeza, comegado a dar ine formagies hiogrifcas e Ihorais na pric meira pessoa, Ora, ff ndo bastava 0 trae balho que o investigador tinha, acres centavam-se agora pistas vindas do Alem pedindo-the que ele se deslocasse a de- terminacla localidade pois, como dia a «brux, «eu pintet para Cos e para a Eri ceitar, E lise desdobrou o Vitor em aul acorrendo acs diversos sitios que ela in- ventava, nv fosse por um aeaso ex- traordindtio ter rac! © mais intrigante no meio de tudo isto € que a sbruxa» sabia a data exacta do naseimento de Josefa quando apenas se desconflava que tivesse sido em Sevilba por volta de 1630. Por essa razio, resol- veu 0 incansivel investigador deslocar- se Acapital da Andaluzia para «esstava- tar» os mais recénditos arquivos. Como eu, na altura, tinha tempo para devaneios © por que me interessava conhecer i thor a cidade do Guadalquivir, j4 que & daca facia uns estudos sobre zulejara se- vilhana 8 conta de um trabalho que jé entto desenvolvia sobre a Quinta da Ba- calhoa, cesolvi acompanhédo. Instalémo- ‘nos numa casa que 6 Professor e grande escudioso de azulejaria sevilhana Alfor- 4 Pleguezcelo amavelmente colocou 2 nossa dsposicio, Apis uma noite de ami- gavel convivio, dirigimo-nos com fmpe- to pam o arquivo de protocolos, E fick mos surpresos com a visio kafkiana que se nos deparou. Como se poderia cons servar 0 arquivo naquele estado, se a ci- dade se preparava para receber mais uma esposigfo universal comemorando a che gada de Colombo ao nave mundo? Claro std que 0 Arquivo de Améticas subsi- dliado pelos Estados Unidos da América tinha jt boa parce da documentagio in- formatizada e o arquivo, em ediffcio bem conservad, era des mais modernos da Europa. Mas este, escondido no meio da cidade velha, era vordacleiramente uma lastima. A entrada, um sujeito despreo- cupado e de aspecto sebento recebia a identificacao do investigador através de um postigo de vidros. A partir do mo ‘mento em que o sujeito fechava a vidra ae se aconchegava na sua cadeira em penada, resguardando-se do mundo na ccaixa de vidro que o cercava, ficamos ene tregues A nossa sorte. Ninguém nos pediu que preenchéssemos um pedido, porque também nao havia ninguém para ir bu: sestantes. E que estantes! arquivo estava instalado num antigo car os live convento desamortizade € o lugar onde se guardavam os livros era exactamente aigreja do antigo convento. As estantes exguiam-se direitas & absbada parccen do nfo ter fim, na realidade deveriam ter uns quinze metros de altura. Quem qui sesse ir buscar um livro tinha de trepar por um periclitante escadote que a par: tirde metade ndo parava de vibrat. Foi o aque tive de fazer. Mas, oh mis sorte! Exac tamente no lugar onde o Vitor Serrao jul- 1 0 livro do assento paroquial nento de Josefa, por volta das anos trinta da centiiria de seiscentos, abria-se um enorme buraco na absbada da igrefa chovendo assim copiosamente sobre a temerosa escada, Enchi-me de da chuva em parho, la fi subindo e tre mendo até chegar ao livro do ano pre tendido que ficav: coragem, e de gabardina vest Josels de Ayala, Nacireze Me sn Potes, 6leo ) tela, 450, solo, Mas o pior ainda estava para Os livios consultavam-se em cima de tuma enorme mesa coaventual bordeje da por estudantes da universidade que na altura faciam um levantamento do- cumencal da prataria sevilbana. Viviam numa verdadeia rereilia com sa tantes para tomar café, Ora aconteceu, ppara mal dos meus pecados, que o Vitor, 2 hora do alinoco, telefemou para casa e em conseyuenels, reve que repressarime- diatamente para Lisboa com a incumbéncia de procurar o regi to paroquial de Josefa. Quando voltei do almogo, encontrei no meu hugar um mon- tinho de rebucadss e percebi que era uma forma simpética que os estudantes ar ranjaram para se aproximarem de min Entdo cometi o mais ode toda pois pensei que se ree pondesse & provocacio jamais teria tempo para trabalhar com as constantes idas ao café. Na verdade, tinha muito poucos esta aventur: das para permanecer em Sevilla e agora uma enorme responsabilidade sobce es ‘meus ombros. Nio comni, portanto, os re- bucades. A noite caiu e 0 senbor da trada anuneia que tinhamos de deixar 0 arquivo e voltar a colocar os livros nas estantes. Mas, por desgraga, 0 arquivo vio tinha luz e como nfo tinha travado ©. 1660 685 mn conhecimento com ninguém nio pode- ria dispar de uma das lantemas que os chabitués», sabendo das con: teabolho, sempre trazem consigo. Tive de trepar o escadote na mais completa es- curidao, Nao vendo conseguido encon- trar 0 registo, corti ao arquivo da Cate- tral que abria a0 fim do dia, para at nada ‘encontrar, aumentando assim a minha frustracio. A verdade & que nao se trarou de erro nosso, nem tio-poueo de mé fortuna, mas de um «amor» arcente em mé hi alguns dias, Vito cido. Passed recebeu em casa uma carta «bruxa» revelava o segredo da vinhagé to paroguial de Josefa que, por alguma razio inexplicével, ela guardava consigo. Josefa de Ayala e Cabrera tinha nascido no a 20 do més de Fevereiro do ano de 1630, tendo sido baptizada na pardouia de S. Vicente de Sevilha. Registe-sel = s: uma fotocépia com o assen- Nota: Quando no in 26 de Jnl de 1991 inau- rou a exposigfo Josefa de Obidos & Barroco na Galeria do Ret D. Luts, 8 a, fo visto um corvonegto que tentava entrar por uma dds janelas do Pakcio. A ebruxan, apesar de ter st em pes recebalo convite, no fs tse 08

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