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P rojeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoriam)
APRESENTAQÁO
DA EDIQÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos estar
preparados para dar a razáo da nossa
esperanca a todo aquele que no-la pedir
(1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos conta


da nossa esperanca e da nossa fé hoje é
mais premente do que outrora, visto que
somos bombardeados por numerosas
correntes filosóficas e religiosas contrarias á
fé católica. Somos assim incitados a procurar
consolidar nossa crenga católica mediante
um aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


r— Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
'] controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
i dissipem e a vivencia católica se fortalega no
Brasil e no mundo. Queira Deus abencoar
""" este trabalho assim como a equipe de
Veritatis Splendor que se encarrega do
respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Estéváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.

A d. Estéváo Bettencourt agradecemos a confiaca depositada


em nosso trabalho, bem como pela generosidade e zelo pastoral
assim demonstrados.
i».:—.

Ai f/icí

Ano xl Dezembro 1999

«Nao acabarei, mas serei transfigurado»

Os mártires de Cunhaú e Aruacú

Os Apócrifos: Que sao?


Evangelho de Nicodemos: A descida de Jesús aos
Infernos

A Igreja proibiu a leitura da Biblia?

"Neopentecostas" por Ricardo Mariano

"Deus. A Evidencia" por Patrick Glynn

"Deus. Urna Biografía", por Jack Miles

Celibato

Existe Deus?

índice Geral 1999


PERGUNTE E RESPONDEREMOS DEZEMBRO1999
Publica9áo Mensal N"451

Diretor Responsável SUMARIO


Estéváo Bettencourt OSB
«Nao acabarei, mas serei
Autor e Redator de toda a materia
transfigurado» 529
publicada neste periódico
O desconhecido vem á tona:
Diretor-Administrador: Os mártires de Cunhaú e Araucu 530
0. Hildebrando P. Martins OSB Historia e lenda:
Os Apócrifos: Que sao?
Adm¡nistra9io e Distribuicáo: Evancfelho de Nicodemos: A descida de
Edicóes "Lumen Christi" Jesús aos Infernos 535
Rúa Dom Gerardo, 40 - 5° andar - sala 501 Responda a Historia:
Tel.: (021) 291-7122 A Igreja proibiu a leitura da Biblia? 547
Fax (021) 263-5679
Documentarlo importante:
"Neopentecostais" por Ricardo
Enderece» para Correspondencia:
Mariano 553
Ed. "Lumen Christi"
Caixa Postal 2666 A descoberta da (é:
CEP 20001-970 - Rio de Janeiro - RJ
"Deus. A Evidencia" por Patrick Glynn... 566

"Deus. Urna Biografía" por Jack Miles ... 574


Visite o MOSTEIRO DE SAO BENTO
Celibato 575
e "PERGUNTE E RESPONDEREMOS"
na INTERNET: http://www.osb.org.br Existe Deus? 576
e-mail: LUMEN.CHRISTI @ PEMAIL.NET índice Geral 1999 577

COM APROVACÁO ECLESIÁSTICA

NO PRÓXIMO NÚMERO:

A Igreja pede perdáo das faltas de seus filhos. - Escrúpulos: que sao? Como Curá-Ios? -
Bigamia e Cristianismo. - Farsa e Paraísos Fiscais. - «Será mesmo cristáo o Catolicis-
moRomano?»-«Excluire¡meul rmáo? »

(PARA RENOVACAO OU NOVA ASSINATURA: RS 35,00).


(NÚMERO AVULSO R$ 3,50).

O pagamento poderá ser á sua escolha:

1. Enviar em Carta, cheque nominal ao MOSTEIRO DE SAO BENTO/RJ.

2. Depósito em qualquer agencia do BANCO DO BRASIL, para agencia 0435-9 Rio na


C/C 31.304-1 do Mosteiro de S. Bento/RJ, enviando em seguida por carta ou fax.
comprovante do depósito, para nosso controle.

3. Em qualquer agencia dos Correios, VALE POSTAL, enderecado as EDICÓES "LUMEN


CHRISTI" Caixa Postal 2666 / 20001-970 Rio de Janeiro-RJ

Obs.: Correspondencia para: Edicoes "Lumen Christi"


Caixa Postal 2666
20001-970 Rio de Janeiro - RJ >
«NAO ACABAREI, MAS SEREI TRANSFIGURADO»

Mais um fim de ano, com seus cansados e apertos... Desta vez, associado
á consciéncia de fim de milenio, que tem apavorado tanta gente; sao militas as
previsóes de catástrofes e calamidades nunca vistas, que felizmente o passar do
tempo vai dissipando ou desmentindo.

O cristáo, colocado no turbilháo do momento, vé a realidade com outros


olhos. Ele sabe que nao acaba, apesar das aparéncias. Ele sabe que é um
caminheiro, chamado por Alguém (que nao falha) para a Vida e a Vida plena. Ele
passa pelas estradas deste mundo, de etapa em etapa, até chegar á plena res-
posta para as suas aspiracóes congénitas á Verdade, ao Amor, á Felicidade...
Com outras palavras aínda: o cristáo sabe que a sua vida é como urna sementé
que vai desabrochando aos poucos até atingirá sua grande estatura; é como um
cone que se abre sempre mais até chegar as dimensóes definitivas.

Ele passa do provisorio para o duradouro, da penumbra da fé para a Luz


da visáo, do exilio para a Patria. Quanto mais próximo está do termo último, tanto
mais se vé penetrado pelo fulgor do Eterno; a nave que se aproxima do porto, é
tanto mais tranquila quanto mais navega ñas aguas desse porto. A larva contida
dentro do casulo se revelará plenamente como borboleta quando tiver que deixar
o seu involucro; ela se transfigurará.
O Apostólo Sao Paulo é o arauto dessa tendencia dinámica e incansável
em demanda dos bens definitivos, ao escrever:

"... para verse alcango a ressurreigáo de entre os morios. Nao que eujá a
tenha alcangado ou que já seja perfeito, mas vou prosseguindo para ver se o
alcango, pois que tambémjá ful alcangado por Cristo Jesús. Irmáos, eunáojulgo
que eu mesmo o tenha alcangado, mas urna coisa fago: esquecendo-me do que
fica para tras e avangando para o que está adiante, prossigo para o alvo, para o
premio da vocagáo do alto, que vem de Deus em Cristo Jesús" (Fl 3, 11-14).
Na base destas consideracóes, o cristáo reconhece que todo fim é um
recomeco ou é um continuar... mais experimentado e mais maduro, mais seguro
do que isto significa. O que possa haver de sinistro, nao o abate, pois ele corre
atendendo a um chamado do Alto.

"És táojovem quanto a tua fé. Táo velho quanto a tua descrenga.
Táo jovem quanto a tua confianga em ti e a tua esperanga. Táo velho
quanto o teu desánimo.
Serás jovem enquanto te conservares receptivo ao que é belo, bom e
grande. Receptivo ás mensagens da natureza, do homem e do Infinito.

E, se um día teu coragáo for atacado pelo pessimismo e corroído pelo


cinismo, que Deus se compadega de tua alma de velho!"
(General Douglas Mac-Arihur)

Que o próximo Natal, renovando o nascimento do Menlno-Deus em


cada coracáo, contribua para fortalecer a perene juventude de cada leitor
por todo o ano 2000 e mais...!
E.B.

529
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS"

Ano XL - Ns 451 - Dezembro de 1999

O desconhecido vem á tona:

OS MÁRTIRES DE CUNHAÚ E URUAQÚ (RN)

Em síntese: No século XVII registraram-se dois casos de martirio


de populagóes do Rio Grande do Norte, casos que ficaram sob silencio
até época recente. Nos últimos decenios foram trazidos á tona os docu
mentos que referem os pormenores da historia respectiva; visto tratarse
de auténticos mártires, vítimas da sanha calvinista holandesa, os dados
foram levados a Santa Sé em vista do Processo de Beatificagáo. Este,
alias, já chegou a termo com o reconhecimento de genufna morte "por
odio á fé" (martirio), de modo que se espera para o ano 2000 a Beatifica
gáo desses heróis do Senhor Jesús.

Após as devidas investigacóes foi constatado o tato de que muitos


fiéis católicos foram massacrados no século XVII em Cunhaú e Uruacú
(RN) sob a perseguicáo dos holandeses invasores calvinistas. Até o sé-
culo XX tal historia ficou na penumbra (talvez por nao se imaginar que
podia ter havido mártires no Brasil católico); todavía nos últimos deceni
os o documentário respectivo foi trazido á baila e analisado
criteriosamente, de modo que foi possível chegar á conclusáo de que
também no Brasil o sangue foi derramado por fidelidade a Cristo. Tal fato
deverá ser proclamado ao mundo inteiro na cerimónia de Beatificacao
dos mártires do Rio Grande do Norte no decurso do ano 2000.

Visto que é pouco conhecida a historia desses feitos heroicos, será


ela apresentada sumariamente ñas páginas que se seguem.

1. Em Cunhaú

É notorio o fato de que o Nordeste do Brasil desde o Ceará até


Sergipe, foi invadido por navegadores holandeses, que dominaram a re-
giáo de 1630 a 1654, ou seja, durante vinte e quatro anos.

530
OS MÁRTIRES DE CUNHAÚ E URUAQÚ (RN)

Os holandeses, calvinistas como eram, vinham acompanhados de


seus pastores, dispostos a ensinar aos indios o Credo calvinista. Isto
originou, para os fiéis católicos da regiáo, urna situacáo penosa; foi
supressa a liberdade de culto, em favor da perseguicáo religiosa.

Tal é o contexto no qual se situam os dois episodios de martirio


ocorridos em 1645.

Em Cunhaú, um pastor protestante comecou a pregar ao povo a


doutrina calvinista. Prometia poupar a vida a todos, caso abjurassem a fé
católica. Contudo a populacáo local opós-lhe resistencia, conservándo
se fiel á sua fé. Eis entáo que no domingo 16 de julho de 1645, festa de
Nossa Senhora do Carmo, na cápela da Vila de Cunhaú concentravam-
se aproximadamente setenta pessoas para participar da Santa Missa.
Um dia antes, chegara a Cunhaú um emissário do Governo holandés
sediado em Recife, alertando o povo a respeito do perigo que corría ao
se declarar católico. Dado que o resultado da advertencia fora nulo, os
invasores programaram a represalia. O Padre André de Soveral, com
seus noventa anos de idade, iniciou a S. Missa num clima de respeito e
piedade. De repente, porém, ouviu-se o barulho de vozes que gritavam
do lado de fora da cápela. Ninguém sabia de que se tratava. Na verdade,
eram soldados holandeses, armados de sabré, a chefiar um grupo de
indios canibais que haviam sido adestrados para invadir a cápela. Logo
após a consagracáo do pao e do vinho, holandeses e indios entraram em
algazarra no recinto sagrado, ameacando os fiéis em altas vozes. Fecha-
ram-se as portas da cápela e os intrusos comecaram a massacrar os
fiéis, impossibilitados de fugir. A principio os católicos surpreenderam-
se, mas logo compreenderam o fato e houveram por bem deixar que os
massacrassem sem resistir; muitos ajoelharam-se e pediram perdáo dos
pecados. O Pe. André de Soveral procurava reconfortar a todos os que a
ele acorriam pedindo a absolvicáo sacramental. Mas também o sacerdo
te foi apreendido, embora pedisse aos indios que o reconhecessem como
ministro sagrado; alguns indios recuaram, mas outros, comandados pe
los calvinistas, se precipitaram sobre ele e o mataram a golpes de sabré.

O chefe da carnificina foi um alemáo que se pusera a servico dos


holandeses com o nome de Jacob Rabbi.

Terminado o massacre, os algozes se retiraram, deixando os cadá


veres estendidos no chao da cápela. Um relato da época refere que os
indios canibais devoraram as carnes das vítimas.

Instaurou-se entáo sobre a vila de Cunhaú um silencio sepulcral,


pois os sobreviventes tinham pavor de que também eles viessem a ser
agredidos pelos indios.

531
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

2. Em Uruagú

O impacto causado pelo massacre de Cunhaú abalou toda a re-


giáo. A historia subseqüente é narrada em duas versoes.

2.1. Versáo A

Quando a trágica noticia chegou a Natal, principal vila do local, o


medo foi grande. Entáo um grupo de doze católicos, chefiados pelo Pe.
Ambrosio Francisco Ferro, pároco de Natal, procurou o Forte dos Reis
Magos como refugio. Outro grupo, mais numeroso, ou seja, cerca de
setenta pessoas, sem contar os escravos e as criancas, procuraram um
local mais distante da vila, situando-se finalmente numa faixa de térra ás
margens do Rio Grande (Rio Uruacú), onde construiram um abrigo bem
fortificado e tomaram o nome de Comunidade Potengi.

Todavía também essa Comunidade foi atacada por indios arma


dos, comandados por famoso chefe indígena e acompanhados por sol
dados holandeses. Mataram todos os habitantes da fortaleza, inclusive o
Pe. Ferro e pessoas influentes da vila de Natal. Relatam os cronistas que
a uns cortaram os bracos e as pernas, a outros degolaram, a mais outros
arrancaram as orelhas ou arrancaram a língua antes de os matarem.
Também se refere que alguns cadáveres foram esquartejados: a Mateus
(ou Matías) Moreira arrancaram o coracáo pelas costas; quando sentia a
aproximacáo da morte, este intrépido fiel católico ainda teve forcas para
gritar em alta voz: "Louvado seja o Santíssimo Sacramento!".

As crónicas relatam ainda que os ataques em Uruacú duraram qua-


tro dias ou talvez mais. Foi preciso que Jacob Rabbi mandasse buscar
duas pegas de artilharia pesada no forte dos Reis Magos, a fim de poder
destruir por completo aquele arraial de católicos, que se defenderam como
puderam. A ninguém foi dado escapar do massacre.

Tal é a versáo dos fatos como se encontra no livro UO Valeroso


Lucideno" da autoría de Frei Manuel Calado, publicado em Lisboa no ano
de 1648. Frei Manuel escreveu na época mesma da dolorosa ocorréncia.

Existe outra versáo do episodio, substancialmente idéntica á ante


rior, mas portadora de pormenores próprios. Encontra-se no livro "Os
Holandeses no Brasil" de Mons. Paulo Heróncio, que refere o seguinte:

2.2. Versáo B

O Pe. Ambrosio Francisco Ferro, vigário de Natal, acompanhado


de outras pessoas, refugiou-se no Forte dos Reis Magos, que na época
era chamado "Forte Ceulen". Um grupo maior, de aproximadamente se
tenta pessoas, dirigiu-se para Uruacú, onde fundaram um arraial. Este

532
OS MÁRTIRES DE CUNHAÚ E URUACÚ (RN)

grupo consegulu dezessete armas de fogo e algumas facas, que levaram


consigo, a fim de fazer frente a possível ataque dos calvinistas e dos
indios. Os holandeses receavam que aquele arraial se tornasse um pon
to de resistencia ao dominio dos invasores, de modo que decidiram pór-
Ihe fim. Confiaram o empreendimento a Jacob Rabbi. O arraial foi cerca
do, o que deixou a populacáo em pánico na expectativa de um ataque.
Este, de fato, ocorreu, mas sem éxito. Frustrado nessa primeira tentativa,
Rabbi aproximou-se da cerca do arraial e pós-se a falar aos moradores!
afirmando que estava do lado deles. Este encontró permitiu a Jacob Rabbi
avahar as possibilidades de resistencia dos assediados.

Quatro dias após tal encontró, o arraial amanheceu cercado. Deu-


se novo ataque, ao qual resistiram os católicos: os dezessete mosquetóes
que a comunidade possuia, abriram fogo contra os assaltantes. Foi en-
táo que Jacob Rabbi mandou buscar duas pecas de artilharia pesada no
Forte Ceulen e disparou contra os moradores do arraial; intimou-os a se
renderem, sob pena de serem todos passados ao fio de espada. Os cató
licos nao abjuraram a sua fé, mas difícilmente podiam resistir á agressáo.
O arraial foi invadido e ocupado pela tropa de Jacob Rabbi, que danificou
a fortificacáo. Mesmo assim os que nao morreram, ainda tentaram desa
fiar a furia do invasor. O Governo holandés de Recife tomou conhecimen-
to dos fatos e decidiu investir mais fortemente contra os católicos.

Os que estavam refugiados no Forte Ceulen, liderados pelo Pe.


Ferro, juntaram-se aos do arraial de Uruacú. Nova investida holandesa
realizou-se contra os católicos resistentes de Uruacú. O comandante da
tropa invasora mandou que todos se despissem em sinal de humilhacáo.
Sem vestes, ajoelharam-se e comecaram a rezar. Um ministro protestan
te, que acompanhava a tropa, suplicou-lhes que abjurassem a fé católi
ca, mas sem éxito. Comecou entáo a tortura das setenta pessoas (apro
ximadamente) sitiadas: a uns cortaram a língua; a outros, rasgaram as
carnes das costas; a mais outros arrancaram os olhos ou deceparam os
bracos. Duzentos indios que estavam escondidos na mata, invadiram o
acampamento, sempre sob o comando de Jacob Rabbi. Após a matan-
ca, foram esquartejados os cadáveres.

Mais pormenores encontram-se na crónica:

Um indio suspendeu com a máo esquerda a filha de Antonio Vilela,


e com a direita vibrou o tacape, esfacelando-lhe o cránio. Um soldado
holandés dividiu em duas partes o corpo da filha de Francisco Dias.

Duas filhas de Estéváo Machado foram horrivelmente massacra-


das. A outra, a mais velha, foi pelos holandeses entregue aos indios em
troca de um cachorro de capa.

533
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

O cadáver da mulher de Manuel Rodrigues, estendido no chao,


teve as duas máos amputadas.

Viam-se, amarrados ás árvores, corpos sem cabera; viam-se tam-


bém visceras cortadas, penduradas no ventre dos cadáveres, alguns
coracóes espetados em estacas.

Era o dia 3 de outubro de 1645.

Somente quinze dias depois, os holandeses mandaram sepultar


aqueles restos mortais.

Tais sao os feitos heroicos que últimamente vieram á tona e se


tornam motivo de santa ufania para o povo católico do Brasil; este há de
se sentir herdeiro de rico patrimonio espiritual e pertencente a urna gran
de familia onde nao faltam heróis e santos. O que se requer agora, é que
cientes da nobreza de sua linhagem, os católicos nao a desdigam nem
atraicoem, mas, ao contrario, mais a abrilhantem por um teor de vida
digno de filhos de Santos.

MELHORAR O MUNDO: COMO?

Um dentista vivía preocupado com os problemas do mundo e esta-


va resolvido a encontrar meios de melhorá-los. Passava dias em seu la
boratorio em busca de respostas para suas dúvidas.

Ceño dia, seu filho de sete anos invadiu o seu santuario decidido a
ajudá-lo a trabalhar. O dentista nervoso pela interrupgáo, tentou que o
filho fosse brincar em outro lugar. Vendo que seria impossfvel remové-lo,
o paiprocurou algo que pudesse seroferecido ao filho com o objetivo de
distrair sua atengáo. De repente deparou-se com o mapa do mundo, o
que procurava! Com o auxilio de urna tesoura, recortou o mapa em varios
pedagos e, junto com um rolo de fita adesiva, entregou ao filho dizendo:
- Vocé gosta de quebra-cabegas? Entao vou Ihe dar o mundo para
consertar. Aqui está o mundo todo quebrado. Veja se consegue consertá-
lo bem direitinho! Faga tudo sozinho.

Calculou que a crianga levaría dias para recompor o mapa. Algu-


mas horas, depois, ouviu a voz do filho que o chamava calmamente:

- Pai, pai, já fíz tudo. Conseguí terminar tudinho! A principio o pal


nao deu crédito ás palavras do filho. Seria impossfvel na sua idade ter
(Continua na pág. 546)

534
Historia e lenda:

OS APÓCRIFOS: QUE SAO?


EVANGELHO DE NICODEMOS: A DESCIDA DE
JESÚS AOS INFERNOS

Em síntese: Os apócrifos sao livros que nao se iiam em público ou


na Liturgia, mas podiam ser usados na leitura particular; dai apókryphoi
= ocultos. Há apócrifos do Antigo e do Novo Testamento; tém semelhan-
ca com a literatura canónica ou catalogada pela Igreja, mas nao foram
reconhecidas como Palavra de Deus por cederem á fantasía ou a heresi-
as, embora contenham verdades de fé nao transmitidas explicitamente
pelos livros canónicos: cf. Jo 20, 30s; 21, 24. Ñas páginas seguintes é
apresentado um trecho de apócrifo, a guisa de amostra.

Durante sáculos a literatura apócrifa fo¡ menosprezada como por


tadora de lendas e heresias. Últimamente, porém, va¡-se valorizando tal
tipo de escritos, por tres motivos:

1) contém verdades que foram reconhecidas como artigos de fé,


tais como a Assuncáo de Maria aos céus, a perpetua virgindade de Ma
ría...

2) referem o pensamento dos antigos cristáos, pois datam dos sé-


culos II/IV;

3) transmitem a doutrina de correntes heréticas, que se aproveita-


ram desse modo de escrever para disseminar seus erros,... erros que,
sem dúvida, é importante conhecer.

Eis por que, a seguir, apresentaremos breve nocáo do que vém a


ser os apócrifos, assim como um trecho-espécimen dos mesmos.

1. Apócrifos: que sao?

O vocábulo "apócrifo" designava, entre os greco-romanos, livros


destinados a um círculo particular de leitores. Os cristáos adotaram o
termo para significar escritos suspeitos de heresia e, por isto, nao reco-
mendáveis: nao podiam ser lidos em público na Liturgia. Distinguem-se
dos livros canónicos ou livros que foram incluidos no canon ou no catálo
go das Escrituras Sagradas. Os protestantes os chamam "pseudo-
epígrafos" (= livros falsamente intitulados).

535
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

Existem apócrifos do Antigo Testamento (3/4 de Esdras, 3/4 dos


Macabeus, Assuncáo de Moisés, Testamento dos Doze Patriarcas...) e
do Novo Testamento (Evangelho de Nicodemos, Protoevangelho de Tiago,
Evangelhos da Infancia de Jesús...).
A partir do século V, os escritores da Igreja rejeitaram globalmente
os apócrifos. Todavía nos últimos doís séculos foram descobertos varios
manuscritos de apócrifos cristáos - o que provocou o interesse pelo es-
tudo desse tipo de literatura. Em conseqüéncia, nos dias atuais estima
se a bibliografía apócrifa, pois dá a conhecer o pensamento e a historia
dos antigos cristáos; em mais de um acontecimento transmitido única
mente por apócrifos podemos ver urna antiga e auténtica tradicáo crista,
que de algum modo completa o quadro de historia que as fontes oficiáis
nos revelam. Deve-se até notar que alguns artigos da fé ai tém a sua
explícita afirmacáo: tais seriam a descida de Jesús aos infernos ou á
mansáo dos morios (nos Evangelhos sobre a Paixáo, Morte e Ressurrei-
cáo de Cristo), a virgindade perpetua de Maria (nos Evangelhos sobre a
Natividade e a Infancia de Jesús), a Assuncáo corporal de Maria (nos
Evangelhos sobre a Dormicao)... Além disto, os apócrifos transmitem os
nomes dos genitores de Maria - Joaquim e Ana - venerados como San
tos aos 26 de julho; a Apresentacáo de Maria no Templo aos tres anos de
idade, celebrada na Liturgia aos 21 de novembro; o nascimento de Jesús
numa gruta com a presenca do boi e do burro; os nomes dos tres magos,
tidos como reis - Gaspar, Belquior e Baltasar; os nomes dos dois ladróes
crucificados com Jesús, a saber: Dimas e Gesta; o nome do soldado ou
centuriáo que abriu o lado de Jesús: Longino (o que vem do grego
logchos, lanca); a historia de Verónica, que enxugou o rosto de Jesús...
A arte crista valeu-se muito dos apócrifos. Sejam recordados os
icones bizantinos, a Divina Comedia de Dante Alighieri, o Paraíso Per
dido de Milton, a Messiade de Klopstock. É de lembrar ainda que até o
fim do século IV houve cristáos que atribuiram a alguns apócrifos (a
Didaqué, as epístolas do pseudo-Barnabé, o Pastor de Hermas...) o va
lor de palavra inspirada. As dúvidas cessaram em 393, quando o Conci
lio regional de Hipona definiu o catálogo (canon) sagrado como ele é
hoje na Igreja Católica, com seus 73 livros; a mesma definicáo foi repeti
da pelos Concilios de Cartago III (397), Cartago IV (419), Trulos (692),
pelo Concilio geral de Florenca (1442), pelo de Trento (1546) e pelo do
Vaticano I (1870).

Os Evangelhos apócrifos tém sido editados em portugués pela


Editora Vozes de Petrópolis, que publicou o Proto-evangelho de Tiago ou
a Historia das Natividades de Maria e de Jesús, a Historia de José o
Carpinteiro e o Evangelho do pseudo-Tomé. A Editora Paulus publicou
em 1999 varios segmentos dos Evangelhos Apócrifos (Evangelhos

536
OS APÓCRIFOS: QUE SAO?
EVANGELHO DE NICODEMOS: A DESOÍDA DE JESÚS AOS INFERNOS 9

Apócrifos) aos cuidados de Luigi Moraldi (edicáo bem apresentada e


muito ilustrativa). Em espanhol, a BAC (Biblioteca de Autores Cristianos)
publicou o seu volume 148 com o título Los Evangelios Apócrifos (edi
cáo crítica e bilingüe).

Segue-se um espécimen de texto apócrifo, em que se mesclam


historia e fantasía. Os antigos exprimiam verdades dentro de urna roupa-
gem imaginosa, que tem de ser reconhecida como tal ou como mero
canal portador da fé dos antigos, fé que, no caso, tem sua base bíblica e
foi assumida pelo magisterio da Igreja.

2. A "Descida de Jesús aos Infernos"

O texto de 1Pd 3, 18s fala desse evento em linguagem lacónica e


figurada:

"Cristo morreu urna vez pelos pecados, o justo pelos injustos, a fim
de vos conduzira Deus. Morto na carne, foi vivificado no espirito, no qual
foi também pregar aos espíritos que estavam emprisao". Cf. Rm 10, 7; Ef
4, 9; Hb 13, 20.

O autor sagrado quer dizer que, entre a sua morte e a sua ressur
reicáo, Jesús anunciou aos justos do Antigo Testamento a realizacáo da
obra da Redencáo, que eles aguardavam no assim chamado "Limbo dos
Pais". Os antigos imaginavam que debaixo da térra se achava a mansáo
dos morios ou o cheol, em cuja orla (bainha, limbo) superior se encontra-
va o compartimento dos justos do Antigo Testamento na espera da Re
dencáo, para poderem participar da bem-aventuranca celeste. A verda-
de, professada pela Escritura, foi "embelezada" pela literatura apócrifa,
na qual existem algumas versóes - ora mais, ora menos fantasiosas - do
evento. Escolheremos a versáo do Evangelho de Nicodemos, que data
do fim do século I ou do inicio do século II; o texto original é grego.

A segunda parte do Evangelho de Nicodemos tem por título "A


Descida de Jesús aos Infernos", entendendo-se por "Infernos" urna
pretensa regiáo infra (donde inferno) ou subterránea, onde estariam
esperando os justos pré-cristáos. Em síntese tem o seguinte conteúdo:

Sao protagonistas duas pessoas ressuscitadas por Jesús e liberta


das dos infernos quando Ele desceu até lá, após a sua morte; tais sao os
dois filhos do velho Simeáo, que acolheu Jesús em seus bracos no Tem
plo (cf. Le 2, 25-32). - O enredo comeca com José de Arimatéia, que
aparece no Sinedrio ou no tribunal dos judeus e afirma quanto segué: o
fato extraordinario registrado nos últimos dias nao é tanto a ressurreicáo
de Jesús quanto a verificacáo de que Ele nao ressuscitou sozinho; res-
suscitaram, entre outros, os dois filhos de Simeáo, falecidos recentemente
e conhecidos de todos, os quais voltaram vivos para Arimatéia ou para a

537
10 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

sua cidade de origem. Ao ouvir isto, o Sinedrio, estando presentes


Nicodemos e Gamaliel, manda chamar os dois homens citados para que
deponham sobre o que Ihes aconteceu depois de morios. Comparecen)
entáo os dois; juram fidelidade aos fatos, pedem papel, pena e tinta, e
descrevem como foram ter aos infernos e como Jesús lá desceu para os
libertar; juntamente com eles, saíram muitos outros vultos importantes,
entre os quais o patriarca Adáo, seu filho Sete, Davi, Isaías, Joáo Batista...
É descrita a convulsáo ocorrida naquela ocasiáo, pois o Hades (mansáo
dos morios, em grego) foi abalado; Satanás, que era o chefe do Hades
ou o Senhor da Morte foi derrotado. Jesús terá ordenado ao Hades (ou á
mansáo dos morios): "Prende Satanás e conserva-o atado até a minha
segunda vinda ou a parusia no fim dos tempos!". A todos os outros habi
tantes da regiáo terá dito Jesús: "Vinde após mim, vos todos que morrestes
por causa do lenho (árvore proibida) tocado por Adáo no paraíso!". Che-
gando ao céu (paraíso), lá encontraram Henoque, Elias e o bom ladráo,
que, conforme a tradicao, foram diretamente para a bem-aventuranca
celeste. - Acontece ainda que, depois de ressuscitados, os dois filhos de
Simeáo e muitos outros justos foram ao Jordáo para lá serem batizados.

Terminado o relato escrito, um dos dois relatores entregou o texto


ao Sumo Sacerdote e o outro a José e a Nicodemos.

Eis o texto em versáo portuguesa, tal como Luigi Moraldi a apre-


senta em sua obra Evangelhos Apócrifos, pp. 327-336:

[1,1] Convite de José. Disse José: "E por que vos admiráis de que
Jesús tenha ressuscitado? Isso nao é nenhuma maravilha; a maravilha
está no fato de que nao foi só ele que ressuscitou, porque muitos outros
mortos ressuscitaram e apareceram, em Jerusalém, a muitas pessoas. E,
se até agora nao conheceis outros, conheceis ao menos Simeáo, que
recebeu Jesús, e seus dois filhos, que ele ressuscitou; ao menos esses
conheceis. Nos os sepultamos recentemente, e agora seus sepulcros
foram vistos abertos, e eles estáo vivos e habitam em Arimatéia".
Mandaram entáo alguns homens, os quais viram seus sepulcros
abertos e vazios. José exclamou: "Vamos encontrá-los em Arimatéia".

[2] Dois ressuscitados. Levantaram-se, entáo, os sumos sacer


dotes Anas e Caifas, José, Nicodemos, Gamaliel e outros com eles e
foram a Arimatéia e encontraram aqueles dos quais tinha talado José.
Fizeram urna oragáo, saudaram-se mutuamente, voltaram com eles para
Jerusalém, conduziram-nos para a sinagoga e trancaram as portas; de
pois puseram no meio o Antigo (Testamento) dos judeus, e os sumos
sacerdotes Ihes disseram: "Queremos que juréis pelo Deus de Israel e
porAdonai e digáis assim a verdade sobre o modo pelo qual fostes res-
suscitados e sobre quem vos fez ressurgir dos mortos".

538
OS APÓCRIFOS: QUE SAO?
EVANGELHO DE NICODEMOS: A DESCIDA DE JESÚS AOS INFERNOS 11

[3] Ouvindo isso, os homens que tinham ressuscitado fizeram o


sinal da cruz no rosto e disseram aos sumos sacerdotes: "Daí-nos papel,
tinta e pena!" Depois que Ihes foram dados, sentaram-se e escreveram
assim:

[2,1] Senhor Jesús Cristo, ressurreigáo e vida do mundo, dá-nos a


graga de falar de tua ressurreigáo e das obras maravilhosas que fizeste
no Hades.

Abraáo, Isaías, Joáo Batista. Habitávamos entáo no Hades com


todos os moños da eternidade. Ena hora de meia-noite naqueles lugares
escuros surgiu e resplandeceu urna luz como a do Sol, ficamos todos
iluminados e nos vimos um ao outro.

Súbitamente nosso pai Abraáo e com ele os patriarcas e os profe


tas ficaram chelos de alegría e disseram um ao outro: "Esta luz vem de
grande luzeiro".

O profeta Isaías, que estava presente, disse: "Esta luz vem do Pai,
do Filho e do Espirito Santo, como profetizei quando estava entre os vi
vos, dizendo: 'A térra de Zabulón e a térra de Neftalí, o povo sentado ñas
trevas, viu urna grande luz'".

[2] Depois, do deserto para lá, para o meto deles, veio um asceta, e
os patriarcas Ihe perguntaram: "Quem és tu?" Ele respondeu: "Eu sou
Joáo, o último dos profetas, aquele que aplanou os caminhos do Filho de
Deus e anunciou ao povo a penitencia para a remissáo dos pecados.
Veio a mim o Filho de Deus e, vendo-o, de longe, eu disse ao povo: 'Eis o
Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo'. Com minhas máos eu o
batizeino rio Jordáo e vi, comopomba, o Espirito Santo descer sobre ele
e ouvi a voz de Deus Pai dizera ele: 'Este é meu Filho dileto, no qual me
comprazi'. Por isso ele me mandou também a vos, para anunciar-vos que
o unigénito Filho de Deus vem aqui embaixo, a fim de que quem eré nele
seja salvo, e quem nao eré seja condenado. Digo, pois, a todos vos que
o veneréis, logo que o virdes, já que a vos só agora é concedido um
tempo de penitencia por vos, pelos ídolos que venerastes no mundo váo
e pelos pecados que cometestes; e é impossível que isso acontega em
outro tempo".

[3] os homens que tinham ressuscitado...: para a recensáo latina A, sao eles Leudo
e Carino.
[2,1] na hora de meia-noite: trata-se provavelmente ou da noite que se seguiu á
morte de Jesús (já Ireneu ensinou que Jesús permaneceu ñas "partes inferiores da
térra" desde a hora da morte até a ressurreigáo, Adv. haeres., V, 31), ou da noite da
ressurreicáo.
[1-2] Os textos bíblicos aqui citados sao: Is 8, 23; 9, 1 (texto citado também por Mt
4, 150;Jo1,29;Mt3, 16s.

539
12 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

[3,1] (19) Adáo e a árvore da misericordia. Enquanto Joáo esta-


va assim ensinando aqueles do Hades, o prímeiro criado e o prímeiro pai,
Adao, ouviu, também ele, e disse a seu filho "Set, meu filho, quero que
digas aos prímeiros país e aos profetas onde te mandei quando caí na
doenga da qual moni".

Disse entáo Set: "Profetas e patriarcas, ouvi! Meu paiAdáo, o pri-


meiro criado, quando chegou ao fim, mandou-me fazer urna oragáo a
Deus na ¡mediata proximidade da porta do paraíso, a fim de que eu fosse
conduzido por um anjo a árvore da misericordia, para pegar o óieo e ungir
meu pai, e fazé-lo ressurgir de sua enfermidade. E foi o que fiz.

Depois da oragáo veio um anjo do Senhor e me disse: 'Que coisa


pedes, Set? Pedes o óleo que faz ressurgir os enfermos ou a árvore da
qual escorre esse óleo para a enfermidade de teu pai? Isso agora nao se
pode encontrar. Vai, pois, e dize a teu pai que, depois que se completa-
rem cinco mil e quinhentos anos da criagáo do mundo, descera sobre a
térra o unigénito Filho de Deus feito homem: ele o ungirá com esse óleo
e ele ressurgirá; com agua e Espirito Santo limpará tanto a ele quanto a
seus descendentes e entáo curará de toda doenga. Agora, porém, isso é
impossívef".

Ouvindo isso, os patriarcas e os profetas se alegraram muito.

caí na doenga...: literalmente, o texto diz "cat para morrer". Assim quando chegou
é, literalmente, "caindo para acabar-se".
anjo...: ñas recensoes latinas ele é indicado como Miguel.
A narracáo inspirou urna lenda medieval difundida. Sentindo aproximar-se a morte,
Adáo lembrou-se de que Deus, exilando-o do paraíso terrestre, tinha-lhe prometido
óleo da árvore da misericordia, e enviou Set ao querubim que guardava a árvore da
vida. Set seguiu um caminho verdejante que ainda conservava as pegadas de Adáo
e Eva, porque, afastando-se do paraíso, eles tinham os pés abrasados; numa gran
de luz com chamas que se levantavam até o céu reconheceu ele as muralhas do
paraíso; prostrou-se diante do querubim e Ihe pediu o bálsamo da misericordia. O
anjo Ihe respondeu que olhasse para o céu por tres vezes. Na primeira vez, Set viu o
paraíso cheio de luz, de alegría e de perfume; no meio havia uma fonte, da qual
saíam quatro ríos á sombra de uma árvore belíssima cheia de folhas e frutos. Na
segunda vez, Set viu a árvore sem folhas, sem frutos e até sem casca, circundada
por uma odiosa serpente. Na terceira vez viu que a árvore se elevava até o céu e
tinha em cima um menino extraordinariamente belo, enquanto a serpente estava em
fuga. O anjo explicou a Set que a serpente era o demonio, vencido pelo Filho de
Deus, e a árvore seca simbolizava a condicáo do homem depois do pecado; depois
Ihe deu tres sementes de árvore do paraíso para que ele as levasse a Adáo; elas
foram colocadas em sua boca, quando ele morreu, e délas nasceu a árvore da cruz
(cf. Imago mundi..).
Um peregrino do século XI (Adelfo), visitando a Térra Santa, refere que, na época
de Salomáo, essa árvore estava á beira de um curso de agua e que a rainha de Sabá
nao quis passar perto déla, sabendo que um dia seria irrigada com o sangue do

540
OS APÓCRIFOS: QUE SAO?
EVANGELHO DE NICODEMOS: A DESCIDA DE JESÚS AOS INFERNOS 13

[4,1] Altercagáo entre Satanás e o Hades. E enquanto todos se


regozijavam com essa alegría, veio Satanás, o herdeiro das trevas, e
disse ao Hades: "Ó tu, que devoras tudo e és insaciável, ouve as minhas
palavrasl Por artificio meu, os judeus puseram na cruz ceño Jesús, da
estirpe dos judeus; ele chama a si mesmo de Filho de Deus, mas é ho-
mem, e agora, que está acabado, está prestes a ser fechado aquí Sei
que ele é homem e ouvi-o dizer: 'A minha alma está terrivelmente triste
até a morte'. No mundo de cima, quando vivia com os moríais, fez-me
muito mal. Onde quer que encontrasse servos meus, perseguia-os, e
curava, só com urna palavra, aqueles que eu tinha tornado ahijados,
cegos, leprosos, coxos e semelhantes, e, só com a palavra, deu vida a
muitos queja estavam prontos para ser sepultados".

[2] O Hades disse: "É mesmo táo poderoso que, só com a palavra,
faz tais coisas? E, se é assim, podes tu resistir a ele? Parece-me que
ninguém poderá resistir-lhe. Tu dizes que ouviste que ele estava temero
so da morte; mas ele disse isso para rir e zombar de ti, querendo agarrar
te com máo forte. E ai, ai de ti eternamente, para sempre!"

Satanás respondeu: "Ó tu, que devoras tudo e és insaciável, tens


tanto medo por causa do que ouviste a respeito de nosso inimigo co-
mum? Eu nao tive medo, mas o entreguei aos judeus, que o pregaram na
cruz e Ihe deram para beber vinagre e fel. Prepara-te, pois, para agárra
lo fortemente quando ele vier".

[3] O Hades respondeu: "Ó herdeiro das trevas, filho da perdigáo,


diabo, tu me disseste agora mesmo que, só com a palavra, ele deu vida a
muitos queja estavam prontos para ser sepultados; se ele livrou outros
do sepulcro, como e com qual torga poderá ser segurado junto de nos?

Na verdade, pouco tempo atrás eu engoli um morto de nome Lázaro,


e pouco tempo depois alguém dentre os vivos o arrancou de minhas
visceras, só com a palavra. Pensó que este seja aquele do qual talaste.
Temo, pois, que, se o recebermos aqui, poremos em perigo também os
outros. Engoli todos os homens desde o comego, mas eis que estao agi
tados, e sinto dores no estómago. Para mim nao é um bom sinal aquele
Lázaro, que me foi arrebatado; ele fugiu de mim nao como morto, mas
como águia; a térra o expeliu para fora instantáneamente assim. Escon-

Salvador do mundo, e que os judeus a puseram depois num tanque, que se tornou
miraculoso (cf. Jo 5, 2-9).
[4,1] O texto bíblico citado é de Mt 26,38. As ¡déias fundamentáis expressas nestes
capítulos ocorrem muitas vezes nos escritos dos Padres e dos escritores eclesiásti
cos (cf. Cesário de Arles, De paschali...). Agostinho escreve que a libertacáo de
Adáo das cadeias do Inferno ó crida por quase toda a Igreja, embora as Escrituras
canónicas nao falem déla (cf. Ad Evodiurn 99).

541 .
14 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS' 451/1999

juro-te, por isso, por tudo o que é caro atiea mim, que nao o conduzas
para aquí embaixo. Porque pensó que (se ele vier) vira para ressuscitar
todos os morios. Digo-te isto: pelas trevas que nos cercam, nao o tragas
para aqui embaixo, do contrario nao permanecerá em mim mais nenhum
morto".

[5,1] Abrí as portas! Enquanto Satanás e o Hades falavam assim


entre si, ouviu-se urna voz forte como trováo, a qual dizia: "Levantai vos-
sas portas, ó principes, abrí vossas portas eternas, e entrará o reí da
gloria". O Hades ouviu e disse a Satanás: "Sai e resiste-lhe, se podes!"
Satanás saiu, e o Hades disse aos seus demonios: "Reforgai bem as
portas de bronze, colocai as trancas de ferro, observai todas as i'echadu
ras e vigiai todos os pontos. Se ele entrar aqui, ai de nos!"

[2] Ouvindo isso, os primeiros país comegaram a desprezá-lo, di-


zendo: "Ó tu, que devoras tudo e és insaciável, abre, a fim de que possa
entrar o rei da gloria!"

O profeta Davi disse: "Nao sabes, ó cegó, que, quando eu vivia no


mundo, profetizei esta palavra: 'Levantai vossas portas, ó príncipes?'"

Isaías disse: "Iluminado pelo Espirito Santo, eu previ e disse: 'Os


morios ressurgiráo, e aqueles que estáo nos túmulos seráo despertados,
e se alegraráo os que se encontram na térra'; e: 'Onde está teu aguilháo,
ó morte? Onde está tua Vitoria, ó Hades?'"

[3] Veio ehtáo urna voz que dizia: "Abrí as portas!"

Ouvindo essa voz pela segunda vez, o Hades respondeu como se


nao o conhecesse, dizendo: "Quem é esse rei da gloría?" Os anjos do
Senhorlhe responderam: "Um Senhor forte e poderoso, um Senhor po
deroso na guerra!"

A essas palavras, as portas de bronze foram logo quebradas e re-


duzidas a pedagos, as barras de ferro foram pulverizadas, e todos os
mortos, ligados com cadeias, foram libertados, e nos com eles. E entrou,
como um homem, o rei da gloria, e foram iluminadas todas as trevas do
Hades.

[6,1] Satanás ligado até a segunda vinda. O Hades Ihe gritou


logo: Tomos vencidos, ai de nos! Mas quem és tu, que tens tal autorida-
de e poder? Quem és tu, que, sem pecado, vieste aqui? Tu, que pareces

[5,1] Cf. SI 24, 7.


[2] Como o texto de Is 26, 19; 25, 8, retomado já por Sao Paulo, 1Cor 15, 55.
[3] Cf. SI 24, 8.

542
OS APÓCRIFOS: QUE SAO?
EVANGELHO DE NICODEMOS: A DESOÍDA DE JESÚS AOS INFERNOS 15

pequeño e podes fazer grandes coisas; és humilde e alto, servo e senhor,


soldado e rei, e exerces tua autoridade sobre os mortos e os vivos?

Foste pregado na cruz, depositado no sepulcro, e agora estás livre


e destruíste todo o nosso poder. És tu Jesús, do qual nos falou o
arquissátrapa Satanás e que, por meio da cruz e da morte, estás para
herdar o mundo todo?"

[2] Depois o rei da gloría agarrou pela cabega o arquissátrapa Sa


tanás e o entregou aos anjos, dizendo: "Prendei-lhe com cadeias de ferro
máos e pés, pescogo e boca. Depois entregai-o ao Hades, dizendo: 'Con-
serva-o preso até minha segunda vinda!'"

[7,1] Preso Satanás, o Hades Ihe disse: "Ó Beelzebul, herdeiro do


fogo e do tormento, inimigo dos santos, que foi que te forgou a determinar
a morte, na cruz, do rei da gloria, de modo que viesse destronar-nos?
Olha em volta e vé que nao nos restou nenhum moño e que, todos os que
ganhaste por meio do lenho do conhecimento, perdeste pelo lenho da
cruz e que toda a tua alegría se transformou em tristeza; querendo dar a
morte ao rei da gloria, deste a morte a ti mesmo. Tendo-te eu recebido
para manter-te bem seguro, aprenderás por experiencia quais males te
enviarei.

[2] Ó arquidiabo, principio da morte, raiz do pecado, acabamento


de todo mal, que coisa encontraste de mal em Jesús para te empenhares
em sua destruigáo? Como ousaste fazer mal tao grande? Como pudeste
ansiar por introduzir nestas trevas tal homem, deixando que ele tirasse
de ti todos os que morreram desde o inicio?"

[8,1] O rei da gloría e Adáo. Enquanto o Hades falava assim com


Satanás, o rei da gloría estendeu a máo, agarrou e pos de pé o primeiro
pai, Adáo; dirigiu-se, depois, a todos os outros e disse: "Para tras de mim,
vos todos que morrestes por causa do lenho tocado por este! Eis que eu
vos fago ressurgir por meio do lenho da cruz".

Assim sendo, mandou-os todos para fora, enquanto nosso primeiro


pai, Adáo, foi visto cheio de alegría e dizendo: "Agradego-te por tua gran
deza, ó Senhor, tirando-me do profundíssimo Hades". Também todos os
profetas e os santos disseram: "Agradecemos-te, ó Cristo, Salvador do
mundo, porque tiraste nossa vida da corrupgáo".

[2] Depois que eles se tinham expressado assim, o Salvador aben-


goou Adáo com o sinal da cruz na fronte, fez a mesma coisa aos patriar
cas, profetas, mártires e prímeiros país e, tomando-os, subiu do Hades.

[8,2] É citado o S1118,26, com o qual Jesús foi saudado na entrada em Jerusalém
(Mt21,9).

543
16 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

Enquanto ele continuaba o caminho, os país o seguiam, salmodiando e


dizendo: "Bendito aquele que vem no nome do Senhorl Aleluia! A ele a
gloria de todos os santos".

[9,1] Encontró com dois anciáos. Prosseguindo o caminho para


o paraíso, segurou pela máo o primeiro pai, Adáo, e confiou-o e todos os
justos ao arcanjo Miguel. Quando entravam pela porta do paraíso, vieram
ao seu encontró dois anciáos, aos quais disseram os santos pais: "Quem
sois vos, que nao passastes pela morte, nem descestes ao Hades, mas
vivéis no paraíso com alma e corpo?"

Um deles respondeu: "Bu sou Henoc, aquele que agradou a Deus,


pelo qual fui transferido para cá. E este é Elias, o tesbita. Viveremos até
o fim do mundo, quando seremos mandados por Deus para resistirmos
ao anticristo e sermos morios por ele. Mas também para ressuscitarmos
depois de tres dias e sermos tomados ñas nuvens e irmos ao encontró do
Senhor".

[10,1] Encontró com o bom ladráo. Estavam eles falando assim


quando veio outro homem, humilde, carregando urna cruz sobre os om-
bros. Perguntaram a ele os santos pais: "Quem és tu, que tens a aparen-
cia de predador?" Respondeu-lhes: "Como dizeis, no mundo eu era pre-
dador e ladráo, por isso os judeus me prenderam e me condenaram á
morte na cruzjunto com nosso Senhor Jesús Cristo. Enquanto ele pendía
da cruz, eu, vendo os sinais que se realizavam, acreditei nele e Ihe disse:
'Senhor, nao te esquegas de mim quando reinares!' E logo ele me res
pondeu: 'Em verdade, em verdade, eu te digo que hoje estarás comigo
no paraíso'.

[2] Carregando, pois, minha cruz, vim para o paraíso, encontrei o


arcanjo Miguel e Ihe disse: 'O Senhor nosso Jesús, que foi crucificado,
mandou-me para cá; conduze-me, pois, á porta do Éden'. Quando a es
pada flamejante viu o sinal da cruz, abríu-me e entrei. Entáo o arcanjo me
disse: 'Espera um pouco, já que está vindo Adáo, o primeiro pai do géne
ro humano, com os justos para entrar aqui. E agora, vendo-vos, vim ao
vosso encontró'".

Quando os santos ouviram essas coisas, gritaram todos em alta


voz: "Grande é o Senhor nosso e grande é seu poder!"

[11,1] Os ressuscitados batizados no Jordáo. Nos dois, irmáos,


vimos e ouvimos todas essas coisas e fomos mandados pelo arcanjo
Miguel e encarregados de anunciara ressurreigáo do Senhor, mas, antes

[10,1] Cf. Le 23, 43.


[11,1] O amor de Deus Pía...: cf. 2Cor 13, 13.

544
OS APÓCRIFOS: QUE SAO?
EVANGELHO DE NICODEMOS: A DESCIDA DE JESÚS AOS INFERNOS 17

aínda, fomos incumbidos de ir ao Jordáo e ser batizados; para lá nos


dirigimos e fomos batizados com outros morios ressuscitados.

Depois viemos a Jerusalém e terminamos a Páscoa da ressurrei-


gao.

Mas agora nao nos podemos entreter neste lugar. O amor de Deus
Pai, a graga do Senhor nosso Jesús Cristo e a comunháo do Espirito
Santo estejam com vos todos.

[2] Eles escreveram assim, selaram os rolos e entregaram um ao


sumo sacerdote, e o outro a José e Nicodemos.

E logo desapareceram, para a gloría do Senhor nosso Jesús Cris


to. Amém.

O relato, fantasioso como é, tornou-se a paráfrase popular de 1Pd


3, 18s. É genuino espécimen da literatura apócrifa.
Eis, do mesmo evento, urna versáo mais breve, tirada da homilía
de um autor anónimo para o Sábado Santo, Patrología Grega, ed. Migne,
43, 439.451.462s.:

«Que está acontecendo hoje? Grande silencio na térra. Grande


silencio e poristo solidáo. Grande silencio, porque o Rei está dormindo: a
térra atemorizou-se e calou, porque o Deus feito homem adormeceu e
acordou os que dormiam há sáculos. Deus morreu na carne e despertou
a mansao dos morios. Vai antes de tudo á procura de nosso primeiro pai,
a ovelha perdida. Faz questáo de visitar os que estáo mergulhados ñas
trevas e na sombra da morte. Deus e seu Filho váo ao encontró de Adáo
e Eva cativos, agora libertos dos sofrimentos.

O Senhor aproximou-se deles, empunhando a cruz vitoriosa. Ao


vé-lo, Adáo, nosso prímeiro pai, cheio de espanto bate no peito e clama
para todos: 'O meu Senhor está no meio de nos'. E Cristo respondeu a
Adáo: 'E com teu espirito'. E, segurando-o pela máo, disse:

'Acorda, tu que dormes, levanta-te dentre os morios e Cristo te ilu


minará. Eu sou o teu Deus que por tua causa me tornei teu filho; por ti e
por aqueles que nasceram de ti, digo agora e, no meu poder, ordeno aos
que estavam nos grilhóes: Sai! e aos que estavam ñas trevas: Enchei-
vos de luz! e aos entorpecidos: Levantai-vos! A ti ordeno: Acorda, tu que
dormes, porque nao te criei para permaneceres acorrentado na mansao
dos morios. Levanta-te dentre os mortos; eu sou a vida dos mortos. Le
vanta-te, obra de minhas máos: levanta-te, ó minha imagem, tu que foste
criado a minha semelhanga. Levanta-te, saiamos daqui; tu em mim e eu
em ti...

545
18 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

Por ti, eu, o teu Deus, me tornei teu filho; por ti, eu, o Senhor, tomei
tua forma de escravo. Por ti, eu, que estou ácima dos céus, vim á térra e
até mesmo sob a térra; por ti, feito homem, tornei-me como alguém sem
apoio, que jaz entre os mortos. Por ti, que deixaste o jardim, ao sair de
um jardim fui entregue aos judeus e, num jardim, crucificado.

Vé em meu rosto os escarros que por ti recebi, para restituir-te o


primeiro sopro de vida. Vé as minhas faces esbofeteadas para restaurar,
segundo a minha imagem, tua beleza corrompida.

Vé em meus ombros a flagelacáo que suportei para retirar dos teus


o peso dos pecados. Vé minhas máos pregadas á árvore da cruz para
teu bem, como um dia estendeste a tua para o mal na árvore do paraíso.

Adormecí na cruz e por tua causa a langa traspassou meu lado,


como Eva surgiu do teu ao adormeceres no paraíso. Meu lado curou a
dor do teu lado. Meu sonó vai arrancar-te do sonó da morte. Sustive com
a minha espada a que se voltava contra ti.

Levanta-te, vamo-nos daqui. A ti o inimigo retirou da térra do para


íso; eu, porém, nao volto a colocar-te no paraíso, mas num trono celeste.
O inimigo arrebatou-te a árvore, símbolo da vida; eu, porém, que sou a
vida, me uni a ti...

Está preparado o trono dos querubins; alertas e a postos os men-


sageiros, disposto o tálamo e preparadas as iguarias; as mansóes e os
tabernáculos eternos estáo adornados, abertos os cofres de todos os
bens e o reino dos céus foi preparado antes dos séculos'».

(Continuagáo da pág. 534)

conseguido recomporum mapa que jamáis havia visto. Relutante, o den


tista levantou os olhos de suas anotagóes, certo de que veria um trabaiho
digno de urna crianga. Para sua surpresa, o mapa estava completo.

Todos os pedagos haviam sido colocados nos devidos lugares.


Como seria possível? Como o menino havia sido capaz?

- Vocé nao sabia como era o mundo, meu filho, como conseguiu?

- Pai, eu nao sabia como era o mundo, mas quando vocé tirou o
papel da revista para recortar, eu vi que do outro lado havia a figura de
um homem. Quando vocé me deu o mundo para consertar, eu tentei mas
nao conseguí. Foi ai que me lembrei do homem, virei os recortes e come-
cei a consertar o homem que eu sabia como era. Quando conseguí con
sertar o homem virei a folha e vi que havia consertado o mundo.

546
Responda a Historia:

A IGREJA PROIBIU A LEITURA DA BÍBLIA?

Em síntese: Ouve-se, por vezes, dizer que a Igreja Católica proi-


biu a leitura da Biblia. A resposta há de ser deduzida de um percurso da
historia. Ora está averiguado que, nos primeiros sáculos, muito se reco-
mendava a leitura do texto sagrado. Na Idade Media e em épocas poste
riores (especialmente no sáculo XVI) surgiram heresias que traduziam a
Biblia do latim para o vernáculo instilando no livro sagrado idéias contra
rias a reta fé. Daí proibigóes, formuladas por Concilios, de se utilizar a
Biblia em lingua vernácula, a nao ser que o leitor recebesse especial
autorizacáo para fazé-lo. Ainda no sáculo XIX a Igreja via ñas tradugoes
vernáculas da Biblia o canal de concepgdes heréticas. Todavía a partir
do Papa S. Pió X (t 1903) deu-se urna volta ás fontes, que incluiu a
recomendagáo da leitura da Biblia, por parte de todos os fiéis, em lingua
vernácula. No momento presente, dado que existem boas edigóes da
Escritura ñas línguas vivas, a Igreja fomenta o recurso assiduo á Palavra
de Deus escrita e lida no concertó da Tradigáo da Igreja.

Diz-se por vezes que a Igreja Católica proibiu aos fiéis a leitura da
Biblia. A afirmacáo, porém, costuma ser vaga ou destituida de documen-
tacáo de modo que nao se sabe até que ponto possa ser verídica. Eis por
que se impóe o estudo deste assunto.

1. Ateoséculo XVI

Por toda a Antigüidade o Livro Sagrado era recomendado á leitura


dos cristaos. S. Jerónimo (t 420) é um dos mestres que melhor repre-
sentam esta atitude pastoral, escrevendo a Eustóquio, filha de Santa
Paula:

"Lé com freqüéncia e aprende o melhor que possas. Que o sonó te


encontré com o livro ñas máos e que a página sagrada acolha o teu rosto
vencido pelo sonó" (PL 22,404).

Na Idade Media apareceram correntes dualistas e heréticas que se


valiam da Biblia para apoiar suas concepcóes erróneas. Tal foi, por exem-
plo, o caso dos cataros, avessos á materia como se esta fosse, por si
mesma, má. Em conseqüéncia, o Concilio de Tolosa (Franca) em 1229
proibiu o uso de traducoes vernáculas da Biblia. Esta disposicáo foi re-

547
20 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

tirada pelo Concilio da Tarragona (Espanha) em 1233. A mesma proibi-


cáo aparece num decreto do rei Jaime I da Espanha em 1235: "Ninguém
possua em vernáculo os livros do Antigo e do Novo Testamento".

No século anterior, os Valdenses (de Pedro Valdo, Pierre de Vaux)


apoiavam-se na Biblia traduzida para o provencal a fim de negar o purga
torio, o culto dos Santos, o servico militar, o juramento...; só admitiam os
sacramentos do Batismo, da Penitencia e da Eucaristía.

No século XIV, John Wiclef (1320-84) em Oxford estabeleceu como


única norma de fé a Escritura traduzida para o inglés; interpretando sub
jetivamente a Biblia, negava a autoridade do Papa, a confissáo auricular,
a transubstanciacáo eucarística, o culto dos Santos...; provocava assim
grande agitacáo entre os fiéis. Por isso o Sínodo de Oxford (1408) proibiu
a publicacáo e a leitura de textos vernáculos da Biblia nao autorizados. O
mesmo se deu no Sínodo dos Bispos alemáes em Mogúncia (1485).

2. Do século XVI ao século XIX

As novas idéias que surgiram no decorrer da Idade Media, chega-


ram ao seu auge na Reforma protestante do século XVI. Esta proclamou
a Biblia como única autoridade decisiva em materia de fé e de costumes;
cada crente é livre para interpretá-la segundo "o livre exame" ou a sua
intuicáo subjetiva. Tais principios haviam de esfacelar o Cristianismo; logo
tres reformadores (Lutero, Zvínglio e Calvino) fundaram tres novas mo
dalidades de Cristianismo no século XVI; por sua vez, as comunidades
reformadas foram reformadas e reformadas sucessivamente, derivándo
se deste processo centenas de denominacóes protestantes independen-
tes urnas das outras, porque dependentes da inspiracáo subjetiva do res
pectivo fundador.

Ademáis os principios da Reforma protestante fazem violencia á


própria Escritura, porque a desligam da Tradicáo oral, que Ihe é anterior
e sem a qual a Biblia nao pode ser devidamente entendida; cf. 2Ts 2, 5s.
15; 3, 6...

Eis por que o Concilio de Trento (1543-65) tomou medidas que


preservassem os fiéis católicos dos males acarretados pelas proposi-
coes dos reformadores; assim

a) declaróu auténtica (isenta de erros teológicos) a Vulgata latina,


traducáo devida a S. Jerónimo (t 420) e muito difundida entre os cris-
táos. Assim se dissiparia a confusáo existente entre clérigos e leigos,
que, em meio a múltiplas traducóes, já nao sabiam encontrar a pura
mensagem bíblica. - O Concilio nao quis afirmar que a traducáo da Vulgata
é lingüísticamente perfeita, mas tomou urna providencia necessária no
século XVI;

546
A IGREJA PROIBIU A LEITURA DA BÍBLIA?

b) rejeltou o principio do livre exame da Biblia. Esta só pode ser


entendida se iluminada por instancias objetivas, especialmente pela Tra-
dicáo, que o magisterio da Igreja formula com a assisténcia do Espirito
Santo;

c) proibiu edicóes da Biblia sem o nome do autor responsável pela


edicáo. Proibiu também a difusáo do texto bíblico sem a autorizacáo do
Bispo diocesano;

d) estimulou o reflorescimento dos estudos bíblicos nos colegios,


conventos e mosteiros.

O Concilio de Trento definiu mais urna vez o Canon Bíblico incluin-


do os deuterocanónicos (Tb, Jt, Sab, Br, Eclo, 1/2 Me), como já o tinham
feito os Concilios do século IV. A prova de que o Concilio nada inovou é
que o próprio Lutero traduziu os deuterocanónicos para o alemáo; com
efeito, na sua edicáo da Biblia datada de 1534 encontra-se o texto dos
sete deuterocanónicos, assim como os fragmentos de Ester 10,4-16,24,
de Daniel 3,24-90; 13,1-14,42 e ainda a "Oracáo de Manassés" (Oracáo
que a Tradicao crista nao incluí no seu canon). A persistencia desses
livros ñas edicoes protestantes bem mostra que nao foi o Concilio de
Trento que os introduziu no catálogo bíblico, mas Lutero e a Tradicao
protestante os receberam da Tradicáo crista medieval e antiga ou mes-
mo dos judeus de Alexandria. Foi somente no século XIX que as Socie
dades Bíblicas protestantes deixaram de incluir nos seus exemplares da
Biblia os livros deuterocanónicos1.

No tocante ás traducóes da Biblia, o Papa Paulo V em 1564 apro-


vou as seguintes normas:

Regra III: "... (o uso) das tradugoes dos livros doAntigo Testamen
to poderá ser concedido, a juízo do Bispo, únicamente a homens doutos
e piedosos sob a condigáo de que tais traducóes sejam usadas apenas
para esclarecer a Vulgata e melhor entender a S. Escritura... O uso das
tradugoes do Novo Testamento realizadas por autores da primeira clas-
se2 a ninguém seja concedido, porque sua leitura costuma acarretar para
os leitores pouca utilidade e grande perigo".

Regra IV: Tendo-se evidenciado pela experiencia que, se se per


mite a leitura da Sagrada Escritura em língua vernácula de maneira ordi
naria e indiscriminada, costuma originarse, em virtude da temeridade

' A Sociedade Bíblica de Londres, combatida na Inglaterra por estar publicando os


Hvros deuterocanónicos, insistiu em seu procedimento e, para assegurá-lo, fundou a
"Sociedade Bíblica Francesa e Estrangeira", que continuou a editar os sete livros
impugnados pelos protestantes, mas que finalmente cedeu ás pressóes contrarias.
1 Tratase de autores mencionados nominalmente em outro documento.

549
22 TERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

dos homens, mais detrimento do que utilidade; é necessário neste parti


cular seguir o jufzo do Bispo ou do Inquisidor, a fim de que, ouvido o
pároco ou confessor, se conceda a leitura da Biblia em língua vernácula
aqueles que se possa prever retiraráo de tal leitura aumento de fé e de
piedade sem prejuízo algum espiritual" (D.S., Enquirídio 1853s).

Estas disposicoes hao de ser entendidas dentro das circunstanci


as históricas em que foram promulgadas; visavam á preservacao da fé
ameacada pelo uso capcioso da Biblia no século XVI. Tiveram por con-
seqüéncia a pouca difusáo do texto sagrado entre os católicos e a falta
de contato da piedade posterior com as suas fontes bíblicas; tornaram-
se, por isto, ponto nevrálgico na disciplina da Igreja, de tal modo que os
jansenistas dos séculos XVII/XVIII as impugnaram.

No século XIX multiplicaram-se as Sociedades Bíblicas protestan


tes, cuja finalidade era difundir a Biblia em traducóes vernáculas. Com-
preende-se que, na base dos principios adotados no século XVI, a Igreja
se opusesse a tais iniciativas, consideradas como perigosas para a reta fé.
A primeira advertencia deu-se em 1816. Ao arcebispo católico que
recomendava aos seus fiéis a Sociedade Bíblica fundada em Sao
Petersburgo na Rússia, escrevia o Papa Pió Vil:

"A Igreja Romana, segundo as prescrigóes do Concilio de Trento,


reconhece a edigáo Vulgata da Biblia e rejeita tradugóes feitas para ou-
tros idiomas, se nao estiverem acompanhadas de notas provenientes dos
escritos dos Padres e dos doutores católicos, a fim de que táo grande
tesouro nao seja exposto as corruptelas das novidades...

Se nao poucas vezes lamentamos que tenham falhado na interpre-


tagáo das Escrituras homens piedosos e sabios, como nao deveremos
recear grandes riscos se se entregarem as Escrituras traduzidas em ver
náculo ao povo ignorante, que, na maioria dos casos, carece de discerni-
mento ejulga com temerídade?" (D.S., Enquirídio 271 Os).

Em 1844 o Papa Gregorio XVI escrevia:

"Nao ignoráis quanta diligencia e sabedoria sao necessárias para


se traduzir fielmente a Palavra de Deus; em conseqüéncia, nada há de
mais fácil do que ñas tradugóes vernáculas, multiplicadas pelas Socieda
des Bíblicas, se introduzirem erros gravíssimos, seja por imprudencia,
seja por fraude de tantos tradutores; tais erros, alias, permanecem ocul
tos, para a perdigáo de muitos, dada a multidao e a variedade de tais
Sociedades. Ás Sociedades Bíblicas pouco ou nada interessa o fato de
que os homens que léem a Biblia em vernáculo, caiam em um ou outro
erro; mais Ihes importa que acostumem aospoucos a exercer o livre exa-

550
A IGREJA PROIBIU A LEITURA DA BÍBLIA? 23

me a respeito do sentido das Escrituras e a menosprezar as tradigoes


divinas contidas na doutrina dos Padres e guardadas na Igreja Católica,
repudiando assim o próprio magisterio da Igreja" (D.S. Enquirfdio n°2771).
Declarado semelhante foi proferida pelo Papa Pío IX em 1846.
Tal posicáo da Igreja manteve-se até o comeco do século XX. Era
motivada por circunstancias contingentes e se revestía de caráter disci
plinar, nao dogmático. Era, pois, reformável desde que desaparecessem
as razóes que inspiraram as apreensoes decorrentes da difusáo do texto
sagrado em língua vernácula. Ora realmente no século XX foi-se alteran
do o contexto histórico. O Papa S. Pió X (1903-14) deu inicio a urna reno-
vacáo da piedade da Igreja, que fora profundamente marcada pela répli
ca ao protestantismo, ao jansenismo e a heresias dos últimos séculos; a
atitude defensiva ou presen/adora nao podía deixar de empobrecer a pi
edade católica; fora necessária, mas nao se podía manter por más tem-
po; nem havia no século XX razóes para manté-la. A volta ás fontes, que
deve sua inspiracáo remota a Sao Pió X, compreenderia a restauracáo
do espirito litúrgico, o recurso freqüente á S. Escritura e a renovacao da
catequese. Conscientes disto, entramos na historia do século XX.

3. No século XX

Em 1920, o Papa Bento XV quis comemorar o 15° centenario da


morte de S. Jerónimo publicando a encíclica Spiritus Paraclitus, na qual
escreveu:

"Pelo que Nos toca, Veneráveis Irmáos, á imitagáo de Sao Jerónimo


jamáis deixaremos de exortar todos os fiéis cristáos a que leiam todos os
dias principalmente os Santos Evangelhos de Nosso Senhor, os Atos e
as epístolas dos Apostólos, tratando de converté-los em seiva do seu
espirito e em sangue de suas vetas" (Enquirfdio Bíblico n" 477).
Quanto ás disposícóes para bem aproveitar a leitura bíblica, o Pon
tífice as resumía nestes termos:

"Todo aquele que se aproxima da Biblia com espirito piedoso, fé


firme, ánimo humilde e sincero desejo de aproveitar, nela encontrará e
poderá degustar o pao que desee dos céus" (E.B. n" 489).

A atitude de Bento XV representava algo de novo na Igreja posteri


or ao Concilio de Trento, mas estava na linha de conduta pastoral do
Papa anterior, Sao Pío X.

Pouco mais de dois decenios decorridos, o Papa Pió XII, na sua


encíclica Divino Afilante Spirltu, recomendava por sua vez a difusáo da
Biblia entre os fiéis:

551
24 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

"Os prelados favoregam e prestem ajuda ás piedosas associagóes


cuja finalidade é difundir entre os fiéis os exemplares das Sagradas Le
tras, principalmente dos Evangelhos, e procuren) que ñas familias cristas
se faga ordenada e santamente a leitura diaria das mesmas; recomen-
dem eficazmente a S. Escritura traduzida para as línguas vernáculas com
a aprovagáo da Igreja" (E.B. n" 566).
A orientado dos Pontífices foi assumida pelo Concilio do Vaticano
II (1962-65), especialmente em sua Constituicao Dei Verbum, c.6, que
trata da S. Escritura na vida da Igreja: um forte estímulo ai é dado á
freqüentacao cotidiana da Escritura por parte dos fiéis, como também á
difusáo do texto sagrado em línguas vernáculas:
"Este Sagrado Concilio exorta com ardor e insistencia todos os fi
éis, mormente os Religiosos, a que aprendam a eminente ciencia de Je
sús Cristo (Fl 3, 8) mediante a leitura freqüente das Divinas Escrituras,
porque a ignorancia das Escrituras é ignorancia de Cristo. Debrucem-se,
pois, gustosamente sobre o texto sagrado, quer através da Sagrada Li
turgia, rica de palavras divinas, quer pela leitura espiritual, quer por ou-
tros meios que se vio espalhando..., com a aprovagáo e o estimulo dos
pastores da Igreja. Lembrem-se, porém, de que a leitura da S. Escritura
deve ser acompanhada da oragáo, para que seja possivel o coloquio
entre Deus e o homem; com Ele falamos quando rezamos; a Ele ouvimos
quando lemos os divinos oráculos.
Compete aos sagrados pastores, depositarios da doutrina apostó
lica, instruir oportunamente os fiéis que Ihes foram confiados, no reto uso
dos livros divinos, de modo particular do Novo Testamento, e sobretudo
nos Evangelhos. E isto por meto de tradugóes dos textos sagrados, que
devem ser acompanhados de notas necessárias e verdaderamente sufi
cientes para que os filhos da Igreja se familiarizem de modo seguro e útil
com a Sagrada Escritura e se embebam do seu Espirito" (n° 25).
Como se vé, nao poderia ser mais favorável ao uso da S. Escritura
a atitude da Igreja contemporánea. As palavras de S. Jerónimo (t 420)
tornaram-se norma da autoridade eclesiástica. As restrigóes foram im
postas nao ao texto latino, mas ás tradugóes vernáculas, em virtude de
fatores contingentes; a Igreja, como Máe e Mestra, senté o dever de zelar
pela conservacsio incólume da fé a Ela entregue por Cristo e ameacada
pelas interpretares pessoais de ¡novadores da pregacáo; eis por que
Ihe pareceu oportuno reservar o uso da Biblia a pessoas de sólida forma-
cáo crista nos séculos em que as heresias pretendiam apoiar no texto
sagrado as suas proposicóes perturbadoras. É, pois, para desejar que os
estudiosos entendam os porqués da atitude da Igreja dos século XVI-XIX
e hoje se sintam convidados a difundir a S. Escritura em comunháo com
a Igreja e a sua Tradicáo.

552
Documentarlo importante:

"NEOPENTECOSTAIS"
por Ricardo Mariano

Em síntese: Ricardo Mariano é sociólogo que se diz ateu e


pesquisou na área das comunidades eclesiais neopentecostais, das quais
a principal é a Universal do Reino de Deus. Póe em relevo tres pontos
significativos: a "guerra santa" contra o diabo, a Teología da Prosperída-
de (que implica a doagáo do dfzimo e de ofertas de alto valor) e a
liberalizagao dos usos e costumes (implicando entrada na vida política).
O artigo abaixo explana o tópico "guerra santa" do livro em foco.
* * *

Ricardo Mariano é sociólogo que se diz ateu (p. 20) e escreveu


urna tese de Mestrado no Departamento de Sociología da USP em 1995.
Reelaborou sua dissertacáo, enriquecendo-a com novos dados e publi-
cou-a com o título Neopentecostais. Sociologia do novo
Pentecostalismo no Brasil1. O trabalho versa sobre as comunidades
eclesiais neopentecostais protestantes e tenciona mostrar como evoluiu
0 pentecostalismo fundado no comeco do sáculo XX nos Estados Uni
dos; assume tres notas características: 1) a "guerra santa" contra o diabo
tido como causador de todas as desgracas que acometem o ser humano;
2) a Teología da Prosperidade, que promete bem-estar material a quem
pague dízimo (que pode ir até 30% do salario ou dos rendimentos) e faca
vultosas ofertas á igreja; 3) liberalizacáo dos costumes, que torna os cren-
tes mais abertos para o mundo de hoje, especialmente para a atividade
política. O livro é farto em documentacáo, colhída em entrevistas, partici-
pacáo nos cultos, leituras de jomáis e revistas..., de modo que desvenda
aspectos muito expressívos da realidade neopentecostal, aptos a expli
car o extraordinario avanco dessas comunidades no Brasil e na América
Latina em geral.

Ñas páginas subseqüentes será exposto quanto R. Mariano pro-


póe a respeito da "guerra santa" contra o diabo. A dissertacáo do autor é
objetiva e isenta de preconceitos, porquanto Ricardo Mariano professa o
ateísmo e nao quer ser senao frío sociólogo.

1. Dois reinos antagónicos

Para Ricardo Mariano, o neopentecostalismo comeca na segunda


metade dos anos 70, cresce e se fortalece no decorrer das décadas de

1 Ed. Loyola, Sao Paulo 1999, 160 x 230mm, 246 pp.

553
26 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

80 e 90. Compreende: a Igreja Universal do Reino de Deus (a mais signi


ficativa, fundada no Rio em 1977), a Internacional da Graca de Deus (Rio
1980), a Comunidade Cristo Vive (Rio 1986), a Comunidade Sara Nossa
Térra (Goiás 1976), a Comunidade da Graca (Sao Paulo 1979), a Comu
nidade Renascer em Cristo (Sao Paulo 1986) e a Igreja Nacional do Se-
nhor Jesús Cristo (Sao Paulo 1994).

Os neopentecostcus acreditam que o universo está dividido em dois


reinos: o espiritual e o material. O reino espiritual é habitado por seres
espirituais: Deus, o Diabo, anjos e demonios, em luta constante entre si.
O reino material é o nosso mundo, habitado pelos homens e pelas de-
mais criaturas; é o campo de batalha da guerra espiritual. O que ocorre
no mundo material, deriva-se da guerra travada entre as forcas de Deus
e as do Diabo no mundo espiritual. Dessa guerra os homens, conscien
tes ou nao, participam. Os fiéis colocam-se do lado de Deus e julgam ter
poder e autoridade, a eles concedidos por Deus, para, em nome de Cris
to, sobrepujar as obras do Maligno. O Diabo e seus seguidores agem
neste mundo de maneiras muito diversas: o espiritismo e os cultos afro-
brasileiros sao por eles manipulados para levar os seres humanos á per-
dicáo; a Igreja Católica também parece infestada pelo demonio, segundo
os neopentecostais, que Ihe movem ferrenha campanha. Além disto, con
forme Edir Macedo, os demonios se apoderam das pessoas utilizando
variados artificios: assim levam-nas a participar de centros espiritas, de
trabalhos e despachos, comidas sacrificadas aos ídolos. Os possessos
do demonio apresentam síntomas, que, segundo Macedo, sao os dez
seguintes: nervosismo, dores de cabeca constantes, insónia, medo, des-
maios ou ataques, desejo de suicidio, doencas cujas causas os médicos
nao descobrem, visóes de vultos ou audicáo de vozes, vicios e depres-
sáo. Dada a trivialidade de alguns desses síntomas, qualquer ser huma
no pode-se considerar um possesso virtual, quando nao um possesso de
fato e em tempo integral.

Em suma, os demonios sao responsáveis diretos por urna infinida-


de de males, infortunios e sofrimentos. Visto que os neopentecostais ¡den-
tificam esses malfeitores com as entidades dos cultos afro-brasileiros,
travam combate cerrado contra a macumba com seus exus, orixás, gui
as, pretos-velhos...

Observa R. Mariano que, ao combater a umbanda, o candomblé e


o espiritismo, os neopentecostais estáo assumindo as crencas dos seus
adversarios; com efeito, estao acreditando na eficacia dos trabalhos e
despachos; acatam o panteáo afro-brasileiro; falam com as entidades e
as conjuram a que deixem de importunar seus "cávalos" ou suas vítimas.
Quando combatidos, nos cultos da Igreja Universal, os demonios sao
identificados pelos respectivos nomes, como os denominam os próprios

554
"NEOPENTECOSTAIS" 27

pais e máes-de-santo; os diferentes tipos de sofrimento e infortunio dos


crentes sao atribuidos estereotipadamente á acáo de tal ou tal entidade
demoníaca. - Eis como o relata Ricardo Mariano em trecho muito signifi
cativo, que vai, a seguir, transcrito:

2. Como se dá a "guerra santa"

«Como exemplo, relato a oragáo para a prosperidade financeira


feita no templo de Santa Cecilia, sede regional da Universal, em 19.8.90:
com urna suave música de fundo, os fiéis, em pé, de olhos fechados,
alguns contritos, outros gesticulando os bragos ardorosamente, falam com
Deus, seguindo as ordens do pastor. Enquanto isso, os obreiros cami-
nham pela igreja perscrutando nos semblantes dos fiéis possíveis sinais
de possessáo ou a presenga de demonios escondidos. E o pastor ora:
'Que o Senhor venha atender aos nossos pedidos. Venha-nos dar pros
peridade, saúde... (agora em tom colérico, tal como o fiel da Universal
deve tratar os demonios e se dirigir a eles). Eu quero que os espfritos
malditos, os demonios que estáo na vida destas pessoas colocando a
miseria, os problemas, o desemprego, saiam! Podem se manifestar, va
mos! Manifesta o Tranca-Rua! Vocé que está trancando os aumentos
salaríais das pessoas! Vocé que está tirando a felicidade das pessoas!
Vocé que está no estómago, ñas pernas, na cabega, na vida financeira,
vá saindo! Os Exus-Caveira, o Oxalufá, a Pomba-Gira, sai, sai! Vocé que
está colocando o virus da Aids, a gastrite, a infelicidade, pode-se mani
festar agora! O Lucifer, a María-Bonita, a Pomba-Gira Sete Gargalhadas
do Bordel, podem manifestarse agora! O Exu-Veludo Veludinho, o Pre-
to-Velho, a María-Conga vao-se manifestando! Voces váo ser queima-
dos, queimados, queimados! Vamos, comega a manifestarse agora, va
mos. Vocé que coloca carogo no seio, coloca cáncer, sai agora! Vai sen
do queimado agora, em nome de Jesús! Vai queimando, Jesús, todo mal,
toda doenga, toda enfermidade. Vocé que está no esposo, na esposa,
nos pais, nos filhos, nos primos, vai queimando! Vocé que trabalha ñas
encruzilhadas, ñas praias, no roncó, vai manifestando agora, saia, saia'.
Em seguida, pede a todos que digam: 'Senhor Jesús, eu quero que as
minhas máos sejam abengoadas agora para eu ser abéngoado e quei-
mar todos os problemas'. Benzidas as máos, ordena aos fiéis que segu-
rem ou coloquem as máos em objetos que simbolizem a prosperidade
financeira, como carteira, bolso, taláo de cheque; orem com fé e pegam o
aumento salarial, o bem material desejado. Por fim, acompanham o pas
tor, amaldigoando e expulsando toda miseria e todo mal. Esbravejam 'Sai,
sai!m(pp. 128s).

Observa R. Mariano:

"Embora as possessóes demoníacas nao constituam novidade nos


meios cristáos e pentecostais, com o surgimento dos neopentecostais,

555
28 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

essas manifestagóes, dadas sua freqüéncia e relevancia, adquiriram nova


dimensáo. Em materia de manifestagáo extática, já nao se pode mais
dizerque a marca distintiva de certos segmentos neopentecostais seja a
glossolalia, mas sim o transe de possessáo. De táo enfatizada que é, a
possessáo demoniaca tomou-se indissociável da imagem e da identida-
de das igrejas Universal e Internacional da Graga. De tanto invocar de
monios para se manifestarem nos cultos, conseguiram transformar, ritual
e doutrinariamente, o transe de possessáo em sua marca. Daf que, em
sua origem, 'a Universal era considerada casa de macumba', conforme
o pastor Silvério Prazeres Costa, líder da igreja em Portugal" (pp. 129s).

Nao por mera coincidencia a sexta-feira é dia de libertacao ou de


exorcismo. Com efeito; sexta-feira é o dia em que a Umbanda pratica
seus ritos de expulsáo das entidades malignas:

"A sexta-feira é conhecida na Umbanda como o dia das giras de


Exu, que se dáo geralmente á noite. A meia-noite, 'hora grande'de sexta
para sábado é o momento em que os Exus se manifestam e trabalham. É
justamente nesta mesma hora que ñas igrejas estáo sendo realizadas as
cerimónias onde esses Exus sao invocados para, em seguida, serem
expulsos, dos cornos das pessoas presentes" (p. 130).

Continua R. Mariano a sua descricáo longa e minuciosa, que me


rece atencáo:

«Na prática, o ritual de libertagao de possessos ocorre em quase


todos os cultos da Universal. A libertagao se dá durante a oragáo para
que os fiéis recebam gragas e se libertem dos males. Enquanto os fiéis,
de olhos fechados e em pé, oram repetindo a oragáo proferida pelo pas
tor, os obreiros caminham pelo templo, orando e olhando fixamente para
cada um dos presentes, em busca de demonios escondidos. Diante de
qualquer indicio, como um pequeño tremor do corpo, lágrimas, descon
forto físico, mal-estar, o obreiro avanga sobre o fiel, segura sua nuca,
impoe urna das máos sobre sua cabega, muitas vezes girando-a frenéti
camente para os lados e para tras (tirando-lhe o equilibrio, o que, ao lado
da privagao do sentido da visáo, contribuí para a possessáo)', e esbraveja
ao pé de seu ouvido para que o demonio se manifesté. Boa parte dos
virtuais possessos nao se rende a esse apelo. Os que entram em transe
podem ser libertos tanto em seus lugares de assento quanto depois de
levados e exibidos á frente da congregagáo. Os casos de possessáo
mais renitentes, cuja libertagao exige mais tempo e maior esforgo físico
dos obreiros na "¡uta corporal" com os possessos, ora sao encaminhados

1 Tratase de urna pretensa possessáo ou urna imaginada possessáo. (N. do Reda-


tor)

556
"NEOPENTECOSTAIS" 29

ao pulpito, ora para aposentos privados do templo. Esta saída é menos


satisfatória; ocorre quando os incessantes gritos histéricos do 'possesso'
e a tenaz resistencia do 'demonio' em desmontar de seu 'cávalo' atrapa-
Iham o culto e colocam momentáneamente em xeque a eficacia do ritual
exorcista.

Quando o possesso é levado ao pulpito, já com o demonio subme-


tido a autoridade divina e amarrado para que nao machuque nem prejudi-
que mais seu 'cávalo', a estrutura do ritual exorcista que se estabelece
com os deuses e espíritos inimigos geralmente apresenta enredo fixo.
Prímeiro, o pastor entrevista o demonio para identificar seu 'nome', inva-
riavelmente urna entidade dos cultos afro-brasileiros. Segundo, pergunta
como ele se apossou daquela pessoa. Terceiro, procura descobrir os males
e sofrimentos que ele está provocando na vida (familiar, financeira...) da
vftima. No quarto e derradeiro passo, o ritualperde o caráterde talkshow
com o demonio. Depois de humilhá-lo, o pastor expulsa-o em nome e
para a gloria de Cristo. Mario Justino relata que ele e outros pastores da
Universal, para provar seu poder sobre os demonios, faziam que as pes-
soas [em transe] andassem dejoelhos ao redor da igreja, ou batessem a
cabega nos nossos pés, ou latissem ou ainda que imitassem galinhas,
porcos e outros animáis'. Quando o suposto demonio reluta em sair, o
pastor pede a ajuda da píatela, que bate firme os pés no chao, ergue as
máos em diregáo ao possesso e brada 'Sai, sai, queima, queima!'. Para
exemplificar como se processa tal diálogo sincrético, descrevo ritual
exorcista da Igreja Universal.

Os fiéis cantam: 'Tranca-Rua e Pomba-Gira fizeram combinacáo /


combinaram acabar com a vida do cristáo/torce, retorce, vocé nao pode,
náo/eu tenho Jesús Cristo dentro do meu coragáo'. E mais este corinho:
'O nome de Jesús é poderoso/nao há quem possa derrotar /o demonio
sai, a doenga sai / quando o nome de Jesús vem operar'. Depois da
oragáo, da manifestagáo e libertagáo de demonios, o pastor indaga quem
se está sentindo melhor. A maioría dos presentes levanta a mño em sinal
afirmativo. Nisso, urna mulher há pouco liberta novamente fica possessa,
do modo característico, isto é, com os olhos fechados, corpo retorcido,
emitindo ora grunhidos guturais, ora gritos histéricos, os bragos voltados
para tras e as máos em forma de garra. Logo o demonio é amarrado e a
possessa levada ao pulpito. O pastor pergunta, gritando, qual é o nome
do demonio que a está possuindo. Vencida a resistencia inicial, recebe a
resposta, com a voz cavernosa de sempre: 'Exu Capa-Preta'. Insolente, o
Exu diz odiá-lo. O pastor, entáo, escarnece dele, dizendo estar tremendo
de medo. Todos riem. O pastor indaga o que Exu está fazendo na vida da
possessa. 'Estou matando-a aos pouquinhos', responde ele. Segurando-
a pelos cábelos, o pastor pergunta com qual doenga ele a afligiu, desco-

557
30 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

bre que sao varias as doengas que a acometem. Interroga também o


marido da possessa, presente ao culto. Este menciona varias enfermida-
des, a elevada quantia gasta com remedios e hospitais, cita nomes de
exames laboratoriais sofisticados e de médicos famosos consultados e
lamenta, apesar dos gastos e esforgos, os pífios resultados obtidos até
entáo. Do alto de sua experiencia com o fenómeno, o pastor diagnostica
que o problema é de natureza espiritual. Em seguida, comega por retirar
Lucifer, rei dos demonios. Diante da resistencia deste, persiste, agora
com o auxilio dos fiéis que batem ospés no chao enquanto bradam 'Quei-
ma, queima!', até o pastor amarrar Lucifer, deixá-lo dejoelhos e obrígá-lo
a admitir, oralmente e por mais de urna vez, estar derrotado por Jesús.
Depois de humilhá-lo, ordena a ele que retire todo o mal posto no fiel e
desfaga os pontos. Pede para Jesús queimar o Lucifer, o Capa-Preta,
toda a legiáo de demonios e as enfermidades. 'Queima agora!', esbraveja.
Após a expulsáo do Exu Capa-Preta, o pastor diz que ela está curada em
nome de Jesús e a orienta para que se dirija á obreira. Saciados com
mais esta pujante vitória de Jesús, todos cantam entusiasmados. Apro-
veitando o clima de regozijo, o pastor pergunta quem trouxe o envelope
com as ofertas...» (pp. 130-132).

Eis outro relato interesante:

«Em programa de radio, depois de afirmar que no culto dominical


ouvira um 'coro de anjos' e após imitar a voz de um deles, a bispa Sónia
Hernandes travou o seguinte diálogo - que demonstra como as crengas
pentecostais, longe de destruirem, por seu exclusivismo e caráter
transnacional, as crengas preexistentes e o imaginario religioso popular,
podem reinterpretá-los e incorporá-los - com o vice-presidente da Re-
nascer, na época, pastor Osvaldo Beríoni.

Sónia - Vocé já soube de algum caso de gente ser transformada


em bicho?

Bertoni - Vocé está falando de lobisomem?

Sónia — É, esses negocios de mulas-sem-cabega por ai.


Bertoni - Eu já soube. Eu atendí a urna vida que presenciou isso
com o pai déla (...) É verdade. O homem era envolvido com feitigaria.
Praticava as feitigarias de Sao Cipriano, que é um livro maldito (...) Ela
tinha 7 anos de idade, quando um día veio urna pessoa para matar o seu
pai. A máejá havia falado a ela: 'Tome cuidado com o seu pai, porque ele
se transforma em moita, cerca, árvore, arbusto!' E naquele día ela viu seu
pai sair correndo quando soube que a pessoa vinha matá-lo. Corréu para
o curra! de vacas. Ela corréu atrás. Mas, naquele momento, ele se trans-
formou numa vaca e entrou no meio do rebanho.

558
"NEOPENTECOSTAIS" 31

Sónia - Ah nao!

Bertoni - Verdade. Esta vida ficou detonada. Agora ela tem qua-
renta e poucos anos (...) Ela viu o pai virar urna vaca. E aquele homem,
aqueta vaca, nao sei como é que eu chamo, ficou lá no meio até o fím da
tarde, porque o homem que quería matá-lo nao ia embora. Quando o
homem desistiu, ai, ela ali vendo, o pai déla voltou do meio de urna vaca.
Isso causou trauma, desgraga, um problema táo grande (...) Essa vida
teve todos os problemas possíveis. Quando nos a atendemos, ela }á ha-
via encontrado o Senhor havia algum tempo, mas sua vida estava amar
rada (...) A contaminagáo foi táo grande, o pai tinha feito oferecimento
para estes demonios todos (...) Oprocesso de libertagáo déla durou urnas
quatro horas (...) Ao passar pela libertagáo, Deus comegou a realizar
coisas grandiosas através déla (...) Aconteceram curas interiores nela.
Jesús tratou e restaurou aqueta vida (Radio Imprensa Gospel FM,
3.12.92)» (pp. 142s).

Nao é necessário comentar dizeres que, por si mesmos, atestam


lamentável grau de cegó fanatismo.

Passemos a outro aspecto da questáo.

3. Reflexos na política

Ás pp. 144s do livro em foco lé-se:


«Prato cheio para os políticos evangélicos, a crenga nos espíritos
terrítoriais tem-se prestado ao uso eleitoreiro. Justificam seus defenso
res, candidatos a cabos eleitorais, que a eleigáo de evangélicos para os
altos postos políticos da nagáo trará béngáos sem fim á sociedade. Além
de desalojar parlamentares infléis, idólatras, macumbeiros e adeptos de
práticas pagas, parcialmente culpados pelas terríveis maldigoes que re-
caem sobre o país37, os políticos evangélicos, eleitos, teriam a privilegia
da oportunidade de poder interceder, nos planos material e espiritual,
diretamente no próprio local onde se alojam poderosos demonios
terrítoriais que tanto oprímem os brasileiros.

Diante de tres centenas de pastores reunidos no Hotel CaesarPark,


Sao Paulo, dia 20 de agosto de 1994, Sónia Hemandes, com frases do
tipo 'A Palavra de Deus nos fala que, quando um servo de Deus assume

37 Segundo Neuza Itioka, para quem "os demonios podem entrar através dos olhos"
de quem assiste aos programas de TV, a "crise brasilelra tem fundo espiritual". Culpa
da colonizacáo católica, mas também de gente de destaque no cenarlo político e
empresarial do país, como Antonio Carlos Magalháes, Roberto Marinho e Fernando
Collor, que, segundo ela, "teriam feito pacto com o diabo por 50 anos" (Nvolce, 31,
1996).

559
32 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

o comando, todo opovo é abengoado', conclamou os presentes a apoiar


a candidatura de Quércia á Presidencia da República, mesmo que tives-
sem objegóes quanto a sua idoneidade e competencia, porque sua vice,
Iris Resende, era evangélica de primeira hora38.

Em campanha para eleger-se para o Congresso Nacional em 1994,


o pastor Lamartine Posella fez declaragao que tipifica o pensamento po
lítico-religioso dos neopentecostais: 'Pensó que o caos social, político e
económico é decorréncia, numa primeira instancia, das maldigóes esplrí-
tuais que repousam sobre nosso país (a idolatría, o espiritismo, o com
pleto repudio a Deus, enfim, por parte de milhóes de brasileiros). Tais
maldigóes espirituais repercutem diretamente no mundo tangível e se
expressam em morte, miseria, fome, prostituigáo, esfacelamento moral
da familia e das instituigóes políticas e económicas. A transformagáo do
Brasil, assim, há de comegar necessariamente pela restauragáo espiritu
al da nagáo, passando pela santificagáo da igreja e de cada crente'
(Integragáo Crista, n° 13, 1996)».

Na defesa da candidatura de Francisco Rossi (PDT/SP) ao gover-


no do Estado de Sao Paulo, em 1994, a pastora Valnice Milhomens, líder
do Ministerio da Palavra da Fé, alinhavou seus argumentos no campo da
guerra espiritual: 'É inevitável concluir que a raiz dos nossos problemas é
de ordem espiritual. Satanás tem conquistado direitos legáis de nos opri
mir, como nagáo, por causa das transgressoes a Constituigáo do Reino
de Deus (...) O reino terreno é diretamente controlado pelo reino espiritu
al. Deus deu a Térra aos filhos dos homens, e as forgas espirituais bus-
cam influenciá-los. O homem nao tem poder em si mesmo, pelo que ou
ele se sujeita a Deus, ou a Satanás (...) Diante do exposto, é de suprema
importancia elegermos governantes que reconhegam a Deus como Su
premo e de fato dependam d'Ele e consultem a sua Palavra (...) Estamos
nao apenas apoiando a candidatura do Dr. Francisco Rossi, mas empe-
nhando-nos em batalha espiritual, intercessáo e apoio, para que este
servo de Deus chegue ao governo do Estado e o nome do Altíssimo seja
glorificado' (Gospel News, 5, outubro de 1994: 10)».

Síntoma da guerra espiritual, a expressáo imperativa 'Tá amarra


do', dirigida ao Diabo para bloquear ou impedir sua agáo, tornou-se cor-
riqueira nos cultos neopentecostais. Diante de qualquer embarago, cons-
trangimento ou dificultades, pastores e fiéis soltam logo um 'Tá amarra
do', geralmente com seu complemento 'em nome de Jesús', que funciona
como verdadeiro amuleto verbal. Imbuidos de poder talismánico ou pro-

38 A estrategia de Quércia surtiu efeito, visto que teve seu melhor desempenho
eleitoral, de 8,3%, entre os evangélicos, enquanto na populagáo alcangou apenas
5,1% (Pierucci & Prandi, 1996:227, Tabela 5).

560
"NEOPENTECOSTAIS" 33

tetor, existen) até adesivos com a expressáo 'Tá amarrado em nome de


Jesús' acompanhada da gravura de urna corda em forma de nos39. Eliade
já nos advertiu: 'Em todos os lugares do mundo, os nos sao usados como
amuletos'. Tais adesivos com dizeres de amarras e gravuras de nos lem-
bram as flámulas do Salmo 91 e o ato de deixar a Biblia abena neste
capítulo em algum cómodo ou móvel da casa, prática tradicional nos meios
pentecostais, para evitar incidentes e opressáo satánica» (pp. 144s).
Eis agora outra pretensa modalidade de defesa dos crentes contra
os ataques do Maligno:

4. Objetos "bentos"

"A Igreja Universal e a Internacional da Graca distribuem aos fiéis


objetos ungidos dotados de poderes mágicos ou miraculosos, ato que as
aproxima de crengas e práticas dos cultos afro-brasileiros. Depois de
ungidos, os objetos sao apresentados aos fiéis como imbuidos de poder
para resolver problemas específicos, em rítuais diversificados, tendo por
referencia qualquer passagem oupersonagem bíblicos. Dotados de fun-
góes e qualidades terapéuticas, servem para curar doengas, libertar de
vicios, fazer prosperar, resolver problemas de emprego, afetivos e emoci
onáis40. Nao encerram caráter meramente simbólico, como alegam os
pastores quando inquiridos pela imprensa e por outros interlocutores. Para
os fiéis, cujos parcos recursos sao desembolsados em troca de béngáos
ñas córrentes de oragáo das quais participam dias ou semanas
ininterruptamente, tais objetos, pelos quais esperam ter seus pedidos aten
didos, contém urna centelha do poder divino.
Embora os meios pentecostais tradicionalmente se oponham ao
uso de objetos sagrados (exceto a Biblia) dotados de poder mágico e
terapéutico, para nao sucumbirem á idolatría, a Universal e a Internacio
nal, mediante pagamento de ofertas estipuladas, distribuem aos fiéis ro
sas, azeite do amor, perfume do amor, pó do amor, saquinho de sal, anuda,
saígrosso, alianga, lengo, frasquinhos de agua do Rio Jordáo e de óleo
do Monte das Oliveiras, nota abengoada (fotocopia de cédula benzida),
arela da praia do Mar da Galiléia, agua fluidificada, cruz, chave, pente,
sabonete. Tal como na umbanda, recomendase que eles sejam ora colo-

39 Eliade (199V 89-122) nos mostra que a existencia de deuses amarradores e da


simbologia dos nos é muito antiga. Está presente ñas religióes e mitologías indo-
européias, na india antiga, no Irá etc. Segundo ele, os nos e as amarras benéficas
funcionam como "meios de defesa contra animáis selvagens, contra as doengas e os
feiticos, contra os demonios e a morte".
40 Aos domingos a Universal faz a corrente do amor para resolverproblemas afetivos
e conjugáis. A Folha Universal de 29.01.95 relatou que um templo da igreja, em
Ribeiráo Preto, aos domingos, realizava a corrente "Noite do meu bem".

561
34 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

cados na comida, orajogados num rio, ora passados no corpo, ora guar
dados na carteira, carregados no bolso e daí por diante.

Basta um único programa de TV da Internacional da Graga de me


ados dos anos 80, transcrito por Hugo Assmann (1986: 100-103), para
revelar varias práticas mágicas, similares as da umbanda e de ben'zedei-
ras. Citarei tres délas. Pastor Gilberto convida os telespectadores a bus
car o 'sabáo abengoado' na congregagáo de Caxias, com o qual iriam
'lavar a pega de roupa daquela pessoa que está internada, que está com
Exus em cima, está com Tranca-Rua, com Omolu, alguém que colocou
seu nome lá no cemitério na cabega de defunto fresco'. Fala ainda da
cura da fiel que irla amputar a perna: 'Olha, a Sra. vai pegar tres
petalazinhas dessa rosa, fazerum cha, um banho e vai durante sete días
de manhá banhar a perna em nome de Jesús com toda a fé. E ela fez isso
e nao precisou mais cortar a perna'. Em resposta a um pedido de oragáo
para cura de epilepsia, R. R. Soares revelou: 'Eu fui responder a carta
(...) me deu uma voz que disse: manda ele colocar essa carta sete dias
debaixo do travesseiro. Assim eupus na carta (...) Um tempo depois che-
gou a resposta (...) Colocamos a carta debaixo do travesseiro da esposa.
Aos sete dias saímos pro culto, o demonio deu uma manifestagao como
nunca. Foi embora e minha esposa curou'" (pp. 133s).

Por último, seja feito o seguinte registro:

5. Perturbada a ordem pública

Ricardo Mariano colecionou varias noticias da imprensa que rela-


tam incidentes públicos provocados pela "guerra santa":

"Há poucos dias, uma mulher usando um turbante próprio dos


umbandistas foi expulsa por evangélicos do ónibus em que viajava, na
zona norte do Rio" (Veja, 30.11.88).

"(...) moradores da travessa Santa Martinha, na Aboligáo, denunci-


aram ontem os freqüentes ataques praticados contra o Centro Espirita
Irmaos Freída Luz, vizinho do templo. Ontem, ainda traumatizados e apa-
vorados com a violencia do día anterior - quando cerca de 500
freqüentadores da Igreja Universal fecharam a rúa e agrediram a pedra
das os umbandistas -, os moradores pediram providencias as autorida
des para que sejam evitados novos conflitos"(O Globo, 7.7.89).

"O Procurador-Geral da República, Aristides Junqueira Alvarenga,


encaminhou despacho a segáo da Procuradoria no Rio de Janeiro, pe-
dindo abertura de inquérito contra a Igreja Universal do Reino de Deus,
por calúnia e difamagáo aos cultos afro-brasileiros. Foram citados no
despacho os pastores evangélicos Edir Macedo, da Igreja Universal do

562
"NEOPENTECOSTAIS" 35

Reino de Deus, do Rio, e Gilmar Teixeira Rosas, da Universal do Reino


de Deus, de Salvador. Entre as agressóes, constam violencias físicas
contra membros das religióes afro, tentativas de invasáo de terreiros, //-
vros anunciando ligagóes do candomblé com o diabo e programas
radiotelefónicos afro que sao vilipendiados" (Aconteceu, 523, 7-13.11.89).

"Em agosto de 1990 um pastor da Universal, no templo de Santa


Cecilia (SP), disse que a estatua de lemanjá na Praia Grande, litoral sul
de Sao Paulo, estava sem urna das máos. Em seguida, rindo, afirmou
que isto foi o resultado de urna paulada só".

"O pai-de-santo Nelson de Omulu (disposto a reagir) relata agres


sóes cometidas por membros da Universal contra os cultos afro: 'Primei-
ro, eles só atacavam ñas radios. Depois comegaram a invadir terreiros.
Agora, eles resolveram bagungarnossas festas. Aconteceu isso na festa
do final do ano passado, quando o Bispo Macedo e seus seguidores (cer
ca de 15 mil) invadiram a Praia do Leme, com aqueles alto-i'alantes, para
destruir nossas homenagens a lemanjá. Na festa da crianga, que a gente
realizou na Quinta da Boa Vista, os evangélicos quebraram varias ima-
gens e queimaram até roupas de santo' (O Globo, 23.10.88)".

"(...) o auxiliar de marceneiro José Targino, de 30 anos, adepto da


seita do 'bispo' Macedo, matou, com um golpe de maneta, o biscateiro
Josimar Vaz dos Santos, de 40 anos, umbandista (...) na Rocinha. Se
gundo a policía, há algum tempo José Targino, como membro da Igreja
Universal, vinha tentando fazercom que Josimar abandonasse a umbanda
e entrasse para a sua seita. A insistencia de Targino e as recusas de
Josimar acabaram porgerar urna inimizade entre os dois; após urna dis-
cussáo mais seria, José Targino aproveitou-se de que Josimar estava
dormindo sozinho em seu barraco, anteontem á tarde, e arrombou a por
ta, matando-o com urna marretada na cabega (Veja, 25.4.90)".
"A Igreja Universal... nos cultos, ñas radios e na Folha Universal
ataca o Papa (até xingando-o de 'papa do diabo'), como fez o entáo pas
tor Carlos Rodrigues, o Vaticano, a CNBB, o culto a María (mariolatria), a
idolatría, acusa padres e bispos de homossexualismo e pedofilia. Até o
episodio do 'chute', porém, nenhum embate mais grave ocorrera entre
elas, apenas escaramugas, nos moldes das citadas abaixo.

"O arcebispo de Sao Luís, dom Paulo Pontes, pediu a Secretaría


de Seguranga Pública garantías contra os fiéis da Igreja Universal do
Reino de Deus, que provocaram tumultos durante a procissáo do Senhor
Morto, na Sexta-feira da Paixáo, e ameagaram repetiros atos de protesto
na procissáo de Corpus Christi, em 25 de maio (O Estado de S. Paulo,
29.3.89)".

563
36 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

"O ambiente em Juazeiro do Norte é tenso em conseqüéncia da


troca de acusagóes entre os devotos do Padre Cicero e os pastores e
seguidores da Igreja Universal do Reino de Deus (O Estado de S. Paulo
18.8.89)" (pp. 123s).

Pergunta-se agora:

6. Que dizer?

Nao se requerem longos comentarios para enfatizar quáo aberrantes


sao as práticas dos neopentecostais, especialmente os da Igreja Univer
sal. A religiao torna-se ai um Pronto Socorro ou um Servico ao homem,
tomando caráter antropocéntrico, em lugar do clássico teocentrismo. "Há
certos setores, certas igrejas onde se fala mais em Satanás e nos demo
nios do que em Cristo e em Deus" (p. 133).

Em particular deve-se notar o seguinte:

1) Os anjos maus (demonios) da Biblia nao devem ser confundidos


com as entidades dos cultos afro-brasileiros. Nao existem orixás, exus,
pomba-gira, preto velho, caboclo... O demonio, porém, existe nao como
um anti-deus, mas como urna criatura a quem Deus permite tentar o ho
mem para levá-lo ao pecado; as tentacoes sao acompanhadas pela Pro
videncia Divina, que dá ao homem a grapa de resistir e de assim conso
lidar a sua fidelidade ao Senhor.

2) Nao se deve crer que todas as desgracas ocorrentes ao homem


sao provocadas pelo Maligno. O que este quer, é o pecado do homem,
única desgraca realmente mortal (que mesmo assim pode encontrar per-
dao da parte de Deus).

3) A Igreja Católica pratica o exorcismo após averiguar cuidadosa


mente o dito caso de possessáo diabólica. Desde que haja suspeita fun
damentada de possessáo, o Bispo local designa um sacerdote que apli
ca o exorcismo solene, o qual incluí jejum, oracóes... Tais casos sao ra
ros, pois hoje em dia a psicología das profundidades e a parapsicoiogia
explicam racionalmente muitos fenómenos outrora atribuidos ao demonio.

4) A alegacáo de que há demonio na origem de cada desgraca é


copiosa fonte de renda para a Igreja Universal. Escreve Ricardo Mariano:
"Os pastores praticamente nao tém folga. Estáo sempre atarefados
com quatro, cinco cultos diarios, aconseihamento pastoral, programas de
radio, vigilias e, no final do expediente, com montanhas de cédulas de
dinheiropara contar" (p. 61).

"Para ser consagrados, os pastores precisam de ser casados, tera


vocagáo ministerial comprovada pelo Espirito Santo e, sobretudo, serbons

564
"NEOPENTECOSTAIS" 37

arrecadadores de dízimos e ofertas, aptidao vista pela lideranga como


sinal inequívoco de que seu ministerio está 'abengoado'por Deus" (p. 62).
5) A pregacáo da Igreja Universal encontra eco especialmente ñas
carnadas mals pobres e menos cultas da populacáo; trata-se de pessoas
pouco afeitas ao senso crítico e muito carentes de atendimento. Escreve
R. Mariano:
"Segundo a pesquisa Novo Nascimento, extenso survey realiza
do pelo ISER no Grande Rio em meados dos anos 90, 63% dos fiéis da
Universal ganham menos de dois salarios mínimos e 28% entre dois e
cinco salarios. Ou seja, 91% recebem mensalmente menos de cinco sa
larios. 50% tém menos de quatro anos de escolaridade e 85% nao pas-
saram do primario... Porpiores que sejam os indicadores sociais brasilei-
ros, os membros da Universal tém renda e escolaridade bem inferiores
as da populagáo. Sao portanto os muito pobres e marginalizados que
fazem a fortuna da Universal" (p. 59).
6) O fenómeno neopentecostal assim analisado bem evidencia que
o senso religioso desligado do raciocinio ou reduzido á fantasía e á
emotividade pode degenerar, servindo de fonte de exploracáo para quem
o saiba espertamente aproveitar. É, pois, indispensável que o fiel cristáo
procure aprofundar seus conhecimentos religiosos, a fim de nao se tor
nar vítima de pregadores dotados de inflamada dialética, mas portadores
de falsa mensagem. A Religiáo é, por sua etimología, a re-lígacáo do
homem com Deus; é o culto de adoragáo e louvor a Deus, que certamen-
te redunda em beneficio do fiel. "Conhecer a Deus é viver, e servir a Deus
é reinar", diz o Missal Romano.

NATAL - UM PRESENTE PARA O ANO INTEIRO DE 2000

Caro(a) leitor(a), se esta revista Ihe disse alguma coisa, pense


em tantos irmáos e irmás que estao á procura de sentido para a sua
existencia e agradeceriam um pouco de luz para a sua caminhada.
Por que nao Ihes oferecer urna assinatura de PR, que tornará vocé
presente ao seu destinatario todos os meses de 2000? Urna dádiva
de ordem intelectual ou de ilustrac.áo da mente as vezes aínda é
mais útil do que um presente material, de valor passageiro. As idéi-
as nao morrem; tém juventude permanente e dinamizam a vida.
Também estáo á d¡sposi?áo dos amigos os Cursos da Escola
"Mater Ecclesiae", devendo sair em Janeiro 2000 o 17° Curso, que
versará sobre TEOLOGÍA FUNDAMENTAL. Pedidos á Caixa Postal
1362, 20001-970 Rio (RJ).

565
A descoberta da fé:

"DEUS. A EVIDENCIA"
por Patrick Glynn

Em síntese: O autor do livro é Ph. D., formado em Harvard (U.S.A.)


e Cambridge (Inglaterra). De ateu que era, tornou-se homem de fé, guia
do pela evidencia da verdade que seus estudos Ihe propiciaram, ao
pesquisar a grandeza e harmonía do universo, o psiquismo humano feito
para os valores transcendentais e o vazio da sociedade que, sem fé,
procura prazernas drogas e no abuso da sexualidade. Patrick Glynn enun
cia os dados da ciencia que o levaram a descobrir e reconhecer a exis
tencia de Deus.
* * *

Patrick Glynn é Diretor Associado e Académico residente da George


Washington University Institute for Communitarian Policy Studies em
Washington D. C. Estudou Literatura, Filosofía e Historia em Harvard e
Cambridge, chegando ao título de Ph. D. Escreveu o livro "Deus. A Eviden
cia. A Reconciliacáo entre a Fé e a Razáo no Mundo atual"1, livro em que
apresenta quatro razóes que o levaram a passar da incredulidade para a fé:
- os físicos descobrem urna ordem inexplicável no universo;
- os médicos relatam o poder de cura da oracáo;

- as experiencias no limiar da morte mostram aos psicólogos que a


fé estimula a saúde mental;

• os sociólogos reconhecem as conseqüéncias deletérias de urna


sociedade desprovida de valores espirituais.

O livro é altamente interessante, vista a sinceridade com que o


autor aborda as relacóes entre a ciencia e a fé; a própria evidencia decor-
rente de serios estudos levou o autor por si mesmo a professar a fé em
Deus. Ñas páginas que se seguem, apresentaremos alguns dos dados
que P. Glynn propóe como persuasivos de que a fé nao está ligada á
ignorancia e o ateísmo nao é urna característica necessária do cientista.
1. "Um Universo nem táo aleatorio"

Tal é o título do capítulo 1 °, no qual Patrick Glynn se associa aos


físicos que afirmam "o principio antrópico", a saber: "as ¡numeras leis da
Física foram orquestradas ordenadamente desde o inicio do universo até

1 Tradugáo de Pedro Marcelo Sá de Oliveira e Glorgio Oronato Capelii. - Ed. Madras,


Rúa Paulo Gongalves 88, 02403-020 Sao Paulo (SP), 140 x 210 mm, 190 pp.

566
"DEUS. A EVIDENCIA" 39

o aparecimento do homem; o universo em que habitamos aparenta ser


explicitamente planejado para o surgimento dos seres humanos" (p. 29).
Brandon Cárter e outros dentistas descobriram urna serie de misteriosas
coincidencias ou acidentes de sorte no universo, cujo único denominador
comum era preparar o aparecimento do homem. A mais leve alteracáo
das forcas fundamentáis da Física - gravidade, eletromagnetismo, a só
lida energía nuclear ou a fraca energía nuclear- teria como resultado um
universo irreconhecível: universo formado de helio, sem prótons ou áto
mos, sem estrelas, universo que desmoronaría sobre sí mesmo antes
dos primeiros momentos de sua existencia. Modificar as proporcóes exa
tas da massa das partículas subatómicas em relacáo urnas as outras
traria efeitos semelhantes. Mesmo a base da vida, como carbono e agua,
depende de urna fina sintonía extraordinaria em nivel subatómico, coinci
dencias estranhas nos valores, para as quais os físicos nao possuem
explicacao" (p. 334). Patrick Glynn apresenta alguns exemplos dessa fina
sintonía sem a qual nao havería o universo:
"A gravidade é cerca de 1039 vezes mais fraca que a forca eletro-
magnética. Se a gravidade fosse 1033 vezes mais fraca, as estrelas teri-
am um bilháo de vezes menos massa e queimariam um milháo de vezes
mais rápido.
A fraca energía nuclear tem 1028 vezes a forga da gravidade. Se a
fraca energía nuclear fosse levemente mais fraca, todo o hidrogénio no
universo se teria transformado em helio (impossibilitando a existencia de
agua, por exemplo).
Urna forte energía nuclear (de 2%) teria impedido a formagáo dos
prótons, produzindo um universo sem átomos. Decrescendo seu valor
em 5%, feriamos um universo sem estrelas.
Se a diferenga em massa entre um protón e um neutrón nao fosse
exatamente a que é - cerca de duas vezes a massa de um elétron -,
entáo todos os néutrons se transformariam em prótons e vice-versa. E
diríamos 'adeuzinho' á química como a conhecemos -eá vida.
A natureza propriamente dita da agua - táo vital para a vida - é
algo misterioso... A agua, única entre as moléculas, é mais leve em esta
do sólido que em estado líquido: o gelo ílutua. Se isso nao acontecesse,
os océanos congelariam de baixo para cima e a Térra, agora, estaría
cobería de gelo sólido. Por sua vez, essa propriedade pode ser atribuida
a propriedades exclusivas do átomo de hidrogénio.
A síntese do carbono - o núcleo vital de todas as moléculas orgá
nicas - em urna escala de importancia, envolve aquilo que os dentistas
denominam urna 'estarrecedora' coincidencia na proporgáo da energía
forte (strong forcé) para o eletromagnetismo. Essa proporgáo permite
567
40 TERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

ao Carbono 12 atingir um estado estimulado de exatidáo da ordem de


7,65 MeV na temperatura típica do centro das estrelas, o que cria urna
ressonáncia que envolve o Helio 4, o Berilo Seo Carbono 12, possibili-
tando a ligagáo necessária que ocorre durante urna janela diminuta de
oportunidade, que dura 1017 segundos" (p. 35).

Comenta Patrick Glynn:

"A profundidade do misterio envolvido aqui foi apresentada da me-


Ihor maneira pelo astrónomo Fred Hoyle, um antigo propositor da teoría
do estado estático:

'Tudo o que vemos no universo de observagoes e fatos, em oposi-


gáo ao estado mental dos esquemas e suposigóes, permanece
inexplicado. E mesmo em seu supostamente primeiro segundo, o univer
so em si nao é casual. Isso quer dizer que o universo precisa saber com
antecedencia o que irá acontecer antes de saber como iniciar a si pró-
prio. Porque, de acordó com a Teoría do Big-Bang, por exemplo, em um
período de 1O43 segundos o universo precisa saber quantos tipos de
neutríno iráo existir no período de 1 segundo. Isso funciona de modo a
iniciar a expansáo na taxa exata para adequar-se ao número final de
tipos de neutríno'.

O conceito de Hoyle sobre a necessidade do universo em 'saber


com antecedencia' resultados que viríam posteriormente, captou a pro
fundidade do misterio. A sintonía fina de valores e proporgóes aparente
mente heterogéneos, necessáríos para ir do Big-Bang á vida conforme a
conhecemos, envolve urna coordenagáo intrincada sobre ampias dife-
rengas na escala - desde o nivel intergalático ao subatómico -, e através
de sistemas de tempo de varios bilhóes de anos" (p. 36).
Ora isto tudo aponta para a Inteligencia Criadora.
2. As manifestares da psyché humana

O cap. 2o do livro trata da influencia da fé e dos valores religiosos


no comportamento humano, influencia averiguada pela Psicología Con
temporánea; longe de causar alienacáo, a fé bem atendida (nao crendice
nem supersticáo) contribuí poderosamente para estruturar sadiamente a
personalidade. - Eis o que afirma Patrick Glynn:

"O Fator 'Fé'

Na raíz da psicología moderna encontrava-se urna ambigao digna


do Dr. Fausto: substituir a compreensáo da religiáo tradicional por um
mecanismo totalmente novo, 'livre de valores', devido á vida mental ba-
seada completamente na ciencia. Essa ambigao foi anunciada há tem-
pos, no sáculo XVII, por Thomas Hobbes - o primeiro pensador moderno
a tentar aplicar os métodos das novas ciencias físicas as vidas social e

568
"DEUS. A EVIDENCIA" 41

mental. (A negagáo da alma, por Hobbes, valeu-lhe ampia condenagáo


como ateísta).

Os comentarios de Freud sobre religiáo e ciencia consistiram sim-


plesmente em urna declaragáo repetida desse tema moderno e original
do lluminismo. Mas, com a proximidade dos ventos do sáculo XX, o
paradigma psicológico moderno, após a fase de ruptura com a Igreja, é
um estado de colapso intelectual. Longe de confirmarem as diversas teo
rías modernas sobre a vida mental, décadas de pesquisa e prática clínica
demonstraram, na verdade, com freqüéncia, a impossibilidade de formu
lar urna visáo coerente da vida humana sem moral nem horizonte religio
so. De forma lenta, mas acertada, a psicología moderna encontrase tar
díamente redescobrindo a alma.

Tomemos a própria pesquisa sobre a crenga religiosa. O veredicto,


aqui, é avassalador. Fica difícil encontrar urna relagao de interdependencia
mais consistente entre a saúde mental e a sólida fé religiosa. Eis alguns
exemplos da descoberta:

Suicidio - Em 1972 um estudo ampio descobriu que as pessoas


que nao freqüentavam igrejas tinham quatro vezes mais probabilidade de
cometer suicidio que os participantes mais freqüentes. Um exame de doze
estudos sobre a relagao entre o compromisso religioso e o suicidio en-
controu urna correlagáo negativa em todos os doze casos. Descobriu-se
que a ausencia no comparecimento á igreja aumenta os índices de suicidio.

Vicio em Drogas - Estudos numerosos mostraram urna correla


gáo inversa entre o compromisso religioso e o vicio em drogas. Um le-
vantamento com cerca de 14.000 jovens descobriu que o vicio varia na
proporgáo direta da forga do compromisso religioso, sendo que osjovens
religiosamente mais conservadores sao os que apresentam as menores
taxas de vicio. Os autores concluiram que a religiáo era a melhor forma
de coibir os padróes de vicio.

Alcoolismo - Diversos estudos descobriram que o alcoolismo é


muito maior entre aqueles com pouco ou nenhum compromisso religioso.
Um estudo descobriu que aproximadamente 90% dos alcoólatras perde-
ram o interesse na religiáo em sua juventude.

Depressáo e Estresse - Varios estudos descobriram que altos


índices de compromisso religioso encontram-se relacionados a níveis mais
baixos de depressáo, de estresse e maior aptidáo para lidar com o
estresse. Pessoas religiosas apresentam urna recuperagáo de cirurgia
mais rápida que os ateus e agnósticos.

Divorcio - Muitos estudos encontraram urna sólida correlagáo in


versa entre a freqüéncia em igreja e o divorcio.

569
42 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

Satisfagáo Matrimonial e Sexual - Um estudo de 1978 descobriu


que o comparecimento á igreja previa satisfagáo matrimonial de modo
mais eficaz que outra variável. Casáis em matrimonio de tonga duragáo,
que passaram pela pesquisa em outros estudos, relacionaram a religiáo
como urna das 'prescrigoes' mais importantes para um casamento feliz. O
mais extraordinario: urna análise de dados partindo de urna pesquisa
maciga entre leitores da revista Redbook nos anos setenta descobriu
que 'varías mulheres religiosas relataram urna maior felicidade e satisfa
gáo com o sexo matrimonial do que as mulheres de prática religiosa mo
derada ou sem prática religiosa'. Assim, as pessoas religiosas, de forma
exata, parecem desfrutar mais do sexo matrimonial!

Felicidade e Bem-Estar Psicológico no Ámbito Geral - Aqueles


que professam urna fé de modo mais sólido relatam maior felicidade no
ámbito geral, bem como satisfagáo com a vida. Em urna pesquisa do
Instituto Gallup, os entrevistados com sólido compromisso religioso con-
cordavam duas vezes mais em que 'Minha fé religiosa é a influencia mais
importante em minha vida' do que aqueles com um mínimo de compro
misso espiritual, para descreverem a si mesmos como 'muito felizes'.

Para termos certeza, existem excegóes para toda a regra, e sem


dúvida podemos encontrar casos em que perspectivas extremadas sobre
a religiáo encontram-se ligados á psicopatologia. Mas as estatfsticas for-
mam urna declaragáo poderosa sobre as condigóes típicas da humanida-
de. Para resumir, se a religiáo é urna 'neurose obsessiva', devemos es
perar que sejamos todos 'neuróticos' dessa maneira" (pp. 60-63).

O autor volta-se para outro traco do comportamento humano estri-


tamente relacionado com os valores religiosos:

"Urna Vida sem Valores

Interessante verificar que os dados que relacionam o compromisso


religioso com o bem-estar mental sao refletidos com crescente evidencia
por urna avassaladora relagáo entre conduta lasciva e vida infeliz, ou
aquilo que podemos chamar, em urna linguagem mais franca, pecado e
angustia. Um dos exemplos mais notáveis vem de The New Harvard
Guide to Psychiatry (que nao é um texto religioso), publicado em 1988.
Em um capítulo sobre adolescentes, o editor, professor psiquiatra da Es
cola Médica de Harvard, colocou em pormenores algumas das conse-
qüéncias perniciosas, sobre a psicología e a saúde, da revolugáo sexual
e da promiscuidade entre osjovens dos anos sessenta, setenta e oitenta:

'Muitos dos que trabalharam com adolescentes durante a última


década tém percebido que a liberdade sexual nao tem levado, de forma
alguma, a maiores prazeres ou a relagóes mais consistentes entre os
sexos, ou a urna libertagáo estimulante das inibigóes asfixiantes. A expe-

570
"DEUS. A EVIDENCIA" 43

rienda clínica tem mostrado que a permissividade leva, com freqüéncia,


a relacionamentos vazios, a um sentimento de desrespeito a si próprio e
inutilidade, epidemia de doengas venéreas, um rápido aumento dos índi
ces de gravidez nao desejada. Os clínicos que trabalham com estudan-
tes de Faculdades comegaram a comentar esses efeitosjá há vinte anos.
Notaram que os estudantes que se encontravam dentro dessa nova íiber-
dade sexual achavam-na insatisfatória e sem sentido... Um estudo mais
recente com estudantes normáis de Faculdades (que nao se encontram
sob os cuidados de um psiquiatra) revelou que, embora seu comporta-
mentó sexual de modo geral parecesse uma tentativa desesperada de
superar úm sentimento profundo de solidáo, descreveram seus relacio
namentos sexuais como menos do que satisfatórios e proporcionando
pouco da proximidade emocional que desejavam... descreveram senti-
mentos difusos de culpa e a preocupagáo de que estivessem usando outras
pessoas e também sendo utilizados como 'objetos sexuais'" (pp. 63s).

Mais adiante concluí o autor:

"A psicología moderna no final do século XX, longe de substituir a


reiigiáo, parece reconciliarse com ela - importando para dentro da teoría
psicológica muitas das idéias religiosas e categorías moráis que haviam
sido banidas como vestigios de uma visáo do mundo obsoleta e nao ci
entífica. Claro que existiu sempre um elemento alternativo de raciocinio
entre os teóricos da psicología bem menos hostil á reiigiáo do que Freud
era. As diferengas entre Jung e seu antigo mentor a respeito desse tema
sao bem conhecidas. 'Dentre todos os meus pacientes na segunda meta-
de da minha vida', observou Jung em 1932, '... nao houve nenhum cujo
problema, em último recurso, nao fosse encontrar uma perspectiva religi
osa para a vida. É seguro dizer que cada um deles se sentía doente por
ter perdido aquilo que as religioes vivas de cada era tém dado a seus
seguidores e nenhum deles curou-se de verdade sem ter recuperado sua
perspectiva religiosa'. Jung exerceu papel indireto na criagáo dos Alcoó-
licos Anónimos, entre os quais o reconhecimento de um 'Poder Superior'
forma um alicerce central do mais famoso tratamento de éxito para o al-
coolismo. Erich Fromm era um agnóstico, com uma visáo bem menos
crítica da reiigiáo, que absorveu importantes conceitos religiosos em sua
teoría da personalidade - em especial, a idéia do ágape ou do amor in
condicional, no Novo Testamento. Viktor Frankl, sobrevivente deAuschwitz,
formuiou uma marca registrada de terapia existenciai que incorporava os
conceitos espirituais na terapia, por meio de um estilo exclusivo. Seu
livro Man's Search for Meaning foi um dos mais populares do século.
Durante os anos setenta, Abraham Maslow foi o pioneiro da investigagáo
psicológica das experiencias místicas ou 'de pico' - tratando-as nao como
instancias de um 'narcisismo primario', como Freud tería feito, mas como
manifestagóes de uma forma superior de consciéncia" (pp. 66s).

571
44 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

E aínda a respeito da psicanálise freudiana:

"Um número crescente de psicólogos e psiquiatras comega a reco-


nhecer os dados que mostram o forte elo positivo entre o compromisso
religioso e a saúde mental. 'Enquanto Freud repudiava a religiáo, julgan-
do-a algo pouco mais do que urna ilusáo neurótica, o criterio que está
surgindo na psicología é que pelo menos algumas variedades de experi
encia religiosa se mostram benéficas á saúde mental', publicou em 1991
o New York Times. 'O resultado é que um número crescente de psicólo
gos está descobrindo a religiáo, se nao em sua vida particular, pelo me
nos em seus dados. O que antes, na melhor das hipoteses, era um tópico
que nao se adaptava á psicología, renasceu como urna evidencia respei-
távelpara a pesquisa científica'.

Paralelamente a esses desenvolvimentos, surgiu urna modificagáo


institucional. O uso da psicanálise tradicional encontrase em declfnio,
em parte pela redugáo na confianga de sua eficiencia, em parte porque
os seguradores ficaram menos dispostos a pagar pelos tratamentos de
morados que acarretam. Enquanto isso, urna das maiores fontes de de-
senvolvimento na industria da saúde mental surgiu nos assim chamados
Conselhos Cristáos das Congregagóes - patrocinados pela Igreja e com
urna orientagáo religiosa; esses centros de conselho misturam explícita
mente técnicas da psicoterapia secular aos temas religiosos. Urna das
maiores organizagóes que oferecem terapia com orientagáo religiosa, a
New Ufe atua hoje em setenta clínicas em cinqüenta cidades dos Esta
dos Unidos. A Associagáo Norte-Americana de Consultores Cristáos, urna
organizagáo formada por terapeutas, em sua maioria protestantes, pas-
sou de 751 membros em 1991 para mais de 14.000 em 1995. 'Alguns dos
maiores entusiastas defendem que o Conselho seja dirigido de modo
espiritual', escreve o psicólogo Lewis Andrés; 'sao médicos e executivos
de seguradoras que acreditam no poder da fé para ajudar muitos pacien
tes a lidar com doengas que ameagam sua vida'.

Em resumo, a preocupagáo do meio do século XX de que a psico


logía moderna suplantaría a religiáo nao vingou" (p. 68).

3. A Fé e os Médicos

O capítulo 3o do livro tem o titulo ácima. Aborda as relacóes entre


fé e saúde física e psíquica. Sao palavras de P. Glynn:

"Conectados pela Oracáo

Algumas das descobertas mais interessantes que surgiram desta


nova pesquisa estáo relacionadas com os beneficios da oracáo. Claro
que a oracáo nao tem lugar no paradigma freudiano. De modo geral, nao
se trata de algo que tem seu lugar no consultorio do médico moderno...

572
"DEUS. A EVIDENCIA" 45

Contudo, os dados mostram que a oracáo desempenha funcáo impor


tante na vida da vasta maioria dos norte-americanos. Diversas pesqui
sas de opiniáo pública indicaram que mais de 90% das mulheres e 85%
dos homens fazem oracóes. Mais de tres quartos dos norte-americanos
fazem oracóes pelo menos urna vez por semana, e cerca de 60%, urna
vez ao dia. De modo paradoxal, mesmo entre os 13% da populacáo que
se descreve como ateísta ou agnóstica, urna entre cinco pessoas afirma-
ram rezar diariamente. E em urna pesquisa do Gallup, patrocinada pela
Time, 95% responderam 'sim' á seguinte pergunta: 'Suas oracóes já fo-
ram atendidas alguma vez?'

Será que nos, os 95% de norte-americanos que acreditam que al


guma vez nossas preces foram atendidas, estamos sofrendo de alucina-
gao coletiva? Em caso afirmativo, a pesquisa médica mostra que isso é
urna das mais benéficas alucinagóes que urna pessoa possa ter. A ora-
gao vem produzindo beneficios enormes, tanto em escala macroscópica
quanto microscópica. Ou seja, as pesquisas de opiniáo mostram, de ma-
neira consistente, urna sólida relagáo entre a oragáo freqüente e o bem-
estar relatado pelas pessoas. E a pesquisa de laboratorio revelou urna
conexáo entre determinados estados meditativos ou de devogáo e os
melhoramentos nos indicadores fisiológicos e na saúde geral" (pp. 77s).

O capítulo 4o do livro, intitulado "Insinuacóes de Imortalidade", tra


ta dos relatos de pessoas que estiveram em coma profundo e recupera-
ram lucidez de mente. Tal assunto já foi abordado em PR 447/1999, pp.
367-375; os relatos atestam que os pacientes entrevistados acreditam
numa vida postuma e a imaginam suave e feliz; todavía nao se pode, por
causa disso, dizer que o além é precisamente aquilo que tais pacientes
descreveram; é, antes, o indizível.

4. Conclusáo

O livro de Patrick Glynn demonstra que o elemento religioso nao é


algo de acidental ou momentáneo para o ser humano, mas é um fator
constitutivo ou integrante de qualquer personalidade. O capítulo 1 ° do
livro vem corroborar, em termos de ciencia moderna, a quinta via de S.
Tomás de Aquino, que, para provar a existencia de Deus, parte da ordem
existente no universo. Os demais capítulos reforcam o argumento antro
pológico, que se fundamenta na estrutura e ñas aspiracóes ¡natas do
psiquismo humano. Ver nosso Curso de Filosofía, Módulos 43, 44 e 45.

A obra de P. Glynn vem a ser um marco na historia do pensamento,


pois díssipa muitos preconceitos nocivos á cultura humana. "Por 150 anos,
os cientistas mantiveram-se presos ao estreito paradigma ateístico, mas
em quatro áreas significativas tal paradigma está-se partindo como gelo
na primavera" (Michael Novak, ñas orelhas do livro).

573
DEUS. UMA BIOGRAFÍA
por Jack Miles1

Eis um livro que contrasta com o de Patrick Glynn: enquanto este


descobre o Deus real que se manifesta no mundo e no homem, Jack
Miles considera o Deus do Antigo Testamento como mera figura literaria
sem se interessar pela existencia real do mesmo, e tenta caracterizar
esse personagem literario tal como ele aparece em cada livro do Antigo
Testamento: é Criador em Génesis 1-3; é Destruidor em Génesis 4-11; é
Amigo da Familia em Génesis 25,12-50,18; é Libertador em Éxodo 1,1-
15, 21; Legislador em Éxodo 15,22-40, 38; é Suserano em Levítico, Nú
meros, Deuteronómio, é... Algoz em Isaías 1-39; é Santo em Isaías 40-
66; é Satanás em Jó; é Adormecido no Cántico dos Cánticos; é Rondó
Perpetuo em Crónicas.

Jack Miles é ex-jesuíta, que estudou na Universidade Gregoriana


em Roma. Atualmente exerce a profissáo de jornalista e membro do cor-
po editorial do Los Angeles Times: além do mais, é Doutor em Línguas
do Oriente Próximo pela Universidade de Harvard (U.S.A.). Na obra em
foco poe de lado o senso religioso e considera Deus qual protagonista
dos livros do Antigo Testamento, como consideraría o Hamlet de
Shakespeare; cf. pp. 32s. Diz textualmente:

"Quando ¡he perguntaram se acreditava em Deus, o psicólogo Cari


Jung deu urna resposta famosa: 'Nao acredito. Sei'. É possível 'saber'
Deus? Deixo esta pergunta sem resposta. O que afirmo é simplesmente
que a vida de Deus, conforme se encontra ñas páginas da Biblia, pode
ser narrada. Este livro pretende ser essa narrativa" (p. 37).

Cético, ao menos em aparéncia, o autor parece brincar com valo


res sagrados, chegando á sátira e á blasfemia:

"Para Deus, a busca de urna auto-imagem (o homem) nao é urna


indulgencia inútil e opcional, mas sim a única e indispensável ferramenta
de que dispóe para sua autocompreensao. Aínda que ninguém tenha pin
tado seu retrato, vocé, como ser humano, sabe quem vocé é... Sua histo
ria o fez e ao mesmo tempo fez de vocé um fato evidente para vocé mes
mo. Deus, no comeco da Biblia, ainda nao tem historia e é, portanto,
menos do que evidente para si mesmo... Deus é um protagonista que
recebe sua historia da vida do seu antagonista...

A fertilidade e automultiplicagáo da humanidade deixam Deus cheio


de raiva, e gera-se um confuto que toca adiante a agáo dramática. Deus

1 Tradugao de José Rubens Siqueira. Companhia das Letras, Sao Paulo 1997, 160 x
230mm, 497 pp.

574
DEUS. UMA BIOGRAFÍA 47

descobre, a posteriori, que a fertilidade sem peías nao era bem o que
tinha em mente. Destrói a críagáo com um enorme diluvio só para desco-
brir que a destruigáo também nao era o que tinha em mente. Promete a
Noé e sua familia, únicos sobreviventes humanos, que nunca mais des
truirá o mundo, mas está agora táo dilacerado que sua promessa nao soa
inteiramente convincente" (p. 110).
É para desejar, em suma, que, se alguém quer fazer exercícios de
literatura e estilística, os faca com obras ditas "leigas" ou "profanas" e
respeite os valores sagrados, evitando ofender a fé de seus semelhan-
tes. - Em 1997, o livro já estava na terceira impressáo! O sarcasmo sem-
pre tem sua clientela.

CELIBATO
José Augusto Rittes1

Nao raro ouve-se esta indagacáo impertinente: Por que nao deve o
sacerdote casar-se?
Costumo responder a esta pergunta dizendo que nem mesmo nos,
médicos se desejamos ser um verdadeiro dedicado profissional, princi
palmente um clínico geral de adultos ou de criancas, nao deveríamos
contrair matrimonio...

Se o padre busca cuidar do próximo mais pela saúde da alma, o


médico busca cuidar do próximo mais pela saúde do corpo... Eis por que
dizem que a Medicina é, também, um Sacerdocio.
Eu por ser médico e ter constituido também urna familia, fui impe
dido de ser o clínico que sempre sonhei... e deixei de ser aquele esposo
e pai que eu almejara... por mais que lá e cá me esforcasse intensamen
te. Eis por que vim para Atibaia, mal chegando a sessenta anos de idade,
quase completamente esgotado.
Quem póe dúvida quanto a isso, mal imagina como é a vida de um
verdadeiro chefe de familia, nem como é o viver de um dedicado clínico
geral, e muito menos sabe como é a vida de um santo sacerdote.
Essas duas vocacóes sao por demais sublimes e exigentes para
ser exercidas por alguém que já tenha a elevada incumbencia de bem
cuidar dos próprios familiares.

<ARedagáo de PR agradece ao Dr. José Augusto Rittes a gentileza da colaboragao.

575
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

EXISTE DEUS?1

Havia um rapaz, discípulo de famoso ermitáo, seu mestre e queri


do amigo, que vivia angustiado ante a dúvida da existencia de Deus.
Certo día, disse ele ao ermitáo:

- Mestre, tudo o que eu mais desejava na vida, era crer na existen


cia de Deus, mas nao há prova déla. Isso me atormenta muito.
O ermitáo o levou entáo a um grande saláo de exposicáo de um
colegio, em que se estudava e onde estavam á mostra os melhores tra-
balhos do ano em todas as áreas do conhecimento humano.
Parou entáo o mestre diante de urna pequeña maquete da Vía Lác
tea, toda feita de isopor e pintada á máo, com o sol ao centro, os planetas
em volta e, bem ácima, a lúa e as estrelas, tudo bem disposto por
finíssimos arames. Também se viam cometas, estrelas cadentes e a Tér
ra com seus continentes e océanos era representada de maneira quase
perfeita. H

- Vés esse trabalho? Sabes o que ele reproduz?


- Sim, disse o rapaz. É parte do Universo.
- Pois bem, agora multiplica por milhóes essa maquete e ainda
assim nao terás o Universo todo.
E o rapaz indagou:

- Mestre, quem foi o construtor de táo bela obra? Quem dispós


esses planetas alinhados e o sol no centro com tamanha perfeicáo? Gos-
taria de cumprimentar esse inventor.
E o ermitáo Ihe respondeu:

- Ninguém. Isso que tu vés representa algo que veio do nada.


- Impossível, retrucou o jovem. Tem de haver um inventor para
obra táo magnífica! Isso nao pode ter vindo do nada.
- Pois, se tu me dizes que Deus nao existe, entáo eu te digo que
isso veio do nada.

E o jovem discípulo, entendendo a mensagem, caminhou cabisbai-


xo em direcáo a urna montanha próxima dali. Chorou, olhou o céu e disse:
- Como pude ter tido a ousadia de duvidar de Ti!
1A Redagáo de PR agradece a colaboragáo do amigo Luiz Osear da Silva.
576
Pergunte

Responderemos

índice Geral de 1999


"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

ÍNDICE
(Os números á direita indicam, respectivamente, fascículo, ano de edicáo e página)

ABORTO: TESTEMUNHO aam***

^^sszsxxs^5S?£
MACONARIA DO OUTRO LADO DA LUZ" por WILLIAM
ANTICONCEPCIONAL adm,te.se ^c™™™™ ~ %$£ f *£
A^^^S^^
APÓCRIFOS: que sao? EVANGELHO DE NICODEMOSA6 45°/19"'p- 482"
ARG.LA: D,SPON,VEDLECSOCMOA.DE..JESUS ** INFERN0S ^J^ ^ 5^
ASEDEFNA^L:esímbo.osna,a.inoZ::=^^^^
no MUND"oATÜAL:"esVa't'ística:::::::;::: ZsÁlll' E1 S
«A VIDA DOS DIREITOS HUMANOS" por varios «taül tSjJSJ p.'
B

BARAM ROBERT: "JORNADAS ESPIRITUAIS" 449/1999 n por


BARROS, MARCELO: "O SONHO DA PAZ" 446/999* d 33p"
BEATIFICAgAO E CANONIZACÁO: SIGNIFICADO 447 S" o m
BIBLIA: A IGREJA PROIBIU A LEITURA? Z~ «I/JÜS,' p.' 547.'
C

•rJAMES parker jssrp- 337oa6-

é
CONVERTIDOS DO ATEfeMO Art:Z::ZZ
:::::::: «^^
i 5 D£ 25f
-
COPERNICO E GALILEU NA FOGUEIRA? 45W S D Ss
CRESCIMENTO DEMOGRÁFICO E NOVOS DIREITOS 45°"SK». P- «5.
CR,ST,AN,SMO: ,,9 BILHAO DE RÉIS
CRUZ: SINAL DO CRISTÁO

578
ÍNDICE GERAL DE 1999

451/1999. p. 530.

CURIA ROMANA: que é?

DeGRANDIS. PE. ROBERT. S.S.J. "A CURA PELA M.SSA" 444/1999 20i.
E!M°^CIA.^^Í.;^= :::::::::::::::::::::::::::::: Un*»: i 264. í. p. 566;

3. p. 574;
í, p. 154.
J, p. 357.
445/1999, p. 266.

-EDUCAQÁO SEXUAL: MITOS", por JOSH McDOWELL 444/1999. p. 209.


"ELE ESTÁ NO MEIO DE NOS", por urna Equ.pe da CNBB 448/1999. p. 393.
EMBRIÓES: MATAR? ••••■•• 448/1999* P 399
ESCRAVIDÁO NO BRASIL E IGREJA ■.—••■•"""•-—""• 448/1999. p.
EVANGELHO DE NIC0DEIKU8

EXORCISMO: NOTA DA CONGREGAQÁO PARA A^ ^

NOVO RITUAL 444/1999- P" 194-

FÁBULA DAS TRES ÁRVORES 1J1 999 o


PARIA JÚNIOR. RUBENS MÉDIUM JJ4««J P
FÁTIMA: APARICOES CONTESTADAS — 449/1999. p. ^
FECUNDAQÁO ARTIFICIAL: conseqüéncias 447/1999. p. 379.

%V^u^^L¡í:::== j¿
¡í:::== ^j¿
do dísínvolvímento ::::::::::::,»,,
^^ 445/i999;:277;
FRANC.SCO DE ASS.S: PERSONAL.DADE DO 2* M.LÉN.O JJJrt W9. P- «».
FRITZ. DR: SEGREDO 440/199^ p. 39.
^SSVJ 441/1999. p. 75.

;^
579
"PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

S^^^ü^vÍd^!r:z::
GORBATCHEV, M. E JOÁO PAULO II
tSSSSi
ZZZZ ^ÜS. p. 143.
H

HEADY, JAMES F. "O EXEMPLO DE UMA ESPOSA". 446/1999 D 31 o


HIPNOSE: EXPLICAQÁO CIENTÍFICA 440/1 «2* n lf
HOMEM EMULHER: COMPLEMENTARIDADE 447/1999 í qiJ'
HOMOSSEXUAL ADOTA CRIANCA 1 ••■■•
450/122' í' liy
*tou/1yyy, p, o¿/.

IGREJA CATÓLICA NA RÚSSIA ATUAL 448/19qq n A9.


DEMOCRACIA? 441/100? o
E ESCRAVIDÁO NO BRASIL .Z a11/]qqq n'
6 449/1QQQ o

na américa:" seítas";;;:"z::::z;;z;;;; íS/JS1 í


UNIVERSAL E TEOLOGÍA DA PROSPERIDADe"ZZ" 443/1999! p.
9. p.

9i p.
INFLACÁO DE SANTOS? ZZZZ -a« iStf9, p.

JOÁO PAULO II: ENCÍCLICA TÉ E RAZÁO" 441/1999 .


ELENCO DAS ENCÍCLICAS Z 44 999 n
OBRAS CARITATIVAS 448/999 f
UM FENÓMENO Z 447/1999 d
VIAGENS APOSTÓLICAS 441/199q* ÍT
VINTE ANOS DE PONTIFICADO 441/1999 o 17-
VISTO POR M. GORBATCHEV '
=01
EF

1 XII
446/1999, p. 329.

KARMA: que é?
H 442/1999, p. 100.
L

LÍNGUAS E CARISMA .. AA(,h QQQ


LOURDES: 66» MILAGRE REC0NHEcÍD0pÍlÁ"¡GREJa"".'.'."." 446/1999 Í
580
ÍNDICE GERAL DE 1999 53

«LUZ DO ALÉM" por RAYMOND MOODY JR 447/1999, p. 368.


M

MACOM PODE SER PADRINHO DE BATISMO? 449/1999. p. 476.


«MACONAR.A DO OUTRO LADO DA LUZ". P0^^^ 444/1999i p. 218.
449/1999, p. 476.

). P'
). P
í. P
MÁRTÍrÍS DE CUNHAÚ E ARUACÚ JJ^jJ. P- «-■
MATAR EMBRIOES? ""■•""•-•■•"• 448/1999! p. 393.
MATEUS. EVANGELHO COMENTADO 450/1999. p. 506.

MEDICINA EHIPNOSE 444/1999, p. 236

«kNCES ORDENACÁO DE MULI-


E BEATIFICAQÁO DE FREÍ GA
COMPROVADOS
O 669 MILAGRE DE LOURDES

«MINHA VIDA NÁOTEM SENTIDO..." •■•••• JJJJJ^ £ 201.


MISSAi CURA PELA "c-^Wfvir^/^ icciiq" 44Q/1999 D 440.

ESSHr:::::::==ff
MUNDO: COMO MELHORAR? *31'135>a' K<
N

-NEOPENTECOSTAIS" por RICARDO MARIANO 451/1999. p. 553.


NEUROL.NGÜÍSTICA: que é? T^ZI—. 451/1999! p. 535.
:LHU Ut " /(/11/1QQQ n 93
.-: Manifestó dos católicos austríacos 441/1 aaa. P-

581
"PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999

US , p. 353.

DAIGREJA Ó
"PÍLUUS DO DÍA SEGÜÍntE" 449/1999, p. 480.
PÍLULAS Í";¿i¡448/1"9 P 431
PÍLULAS DE FREÍ GALVÁO: que sao? ^ ^^ JJÍÍJS" P"
pío de pietralcina,
PIÓ XII E JUDEUS
beatificado 1 111ÍJS2"P>
449/1999, p.

j3SS§^^S§§!
PRESEPIO: símbolos natalinos

PRÓ-VIDA: TESTEMUNHO HlÁllí lo


PSICOGRAF.A OU ESCRITA AUTOMÁtÍcaZ^ZZZZZ ÍS 999,' p! f7.
Q

"QUE RUMO SEGUIREI?": RESPOSTA A UM JOVEM INDECISO . 447/1999, p. 381.


R

RACIONALISMO NA EXEGESE BÍBLICA ^n/-,QQO -,«


REENCARNAQÁO E FÉ CATÓLICA Al,"9> P" 393"

SANTOS: INFLApÁO? AA9I4


"SANTOS PADRES, SANTOSpbDRÍs»po;H¿RÁc,0 9' P'
SARAMAGO, JOSÉ: PREMIO NOBEL SILVE'RA JJJ2S' P>

LADO DA LUZ" 444/1999, p. 218.


582
ÍNDICE GERAL DE 1999

SCHOOYANS, MICHAEL, E DIREITOS HUMANOS


SC Jjafl W9. P; 15¿
Jj
R"
"SE EU NAO PUDER..." 444/1999, p. 235.
SEITAS NA AMÉRICA ..........j.....""-"-.. " 445^999, p. 278.
SEMEN HUMANO: DOACAO E VENDA 44?/19gg p 344
"SETUDO FOSSE PERMITIDO* 449/1999, p. 434.
SILENCIOS DE DEUS 443/1999, p. 176.
SÍMBOLOS NATAUNOS .....¿....¿.«."¡"--""--—" ";" 449^999, p. 434.

SUGESTÁO E NEUROLINGUISTICA

.. 446/1999, p. 336.
TEMPO - PRECIOSO •■•-■••• 443/1999, p. 172.
SSSÍSÍ I... «47*». p. 376.
u

-UMA VIDA OU MUITAS?" por CARLOS G. VALLES 442M999. p.


URUACU: mártires

VASECTOMIA COMPULSORIA EIGREJAUNIVERS^


VIDA HUMANA DIANTE DA TECNOLOGÍA E BIO ETIOA ggg
E DIREITOS

446/1999, p 317;
ZOLLI, RABINO ■"■ 446/1999, p. 329;
../..........".'.. 446/1999, P- 325.

EDITORIAIS

«ASPIRA. AOS DONS MA.S ELEVADOS...» (1Cor. 12, 31) 441/199^, p. 49.
DORES DO PARTO •"•""•"■■•.• ... 444/1999, p. 193.
ESTRANHA BEM-AVENTURANgA! 446/1999, p. 289.
FIDELIDADE
-JORRARAM SANGUE
^■;Va"»"VV"7q"*4SV
| AGUA.. (Jo 19 34s^;
..". 443/1999,
gg
p. 145.
52g
"NAO ACABEREI, MAS SEREI TRANSFIGURADO 449/1999, p. 433.
O AMOR Á VERDADE ■••• 448/1999, p. 385.
"O JUSTO VIVE DA FE" (Rm 1, 17) •••■■••■""• 442/1999, p. 97.
O PAI E SEUS DOIS HLHOS (Le 15, 11-32) —"¿-¿¿j _. 447/1999, p. 337.
"RESCATADOS POR ELEVADO PRECO... (1 Cor 6, 20) ^^ ggg ^ ^
"TARDE TE AMEI..." (Sto. Agostinho) 450/1 g9g p 481
-VEM PARA O PAI..."
583
— "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 451/1999
LIVROS APRECIADOS

ARNOULD, JACQUES, DARWIN, TEILHARD DE CHARDIN E


BARAM, ROBERT. &¡g^A¿£^

GLYNN. PATRÍCK D A ^» ¡555555555. 44M9* p. 331.

GRINGS, OADEUS DEUS PAI N°V° TESTAMENTO «3/r999, P- '68.


HIROSHI, TIKUMAGAWA, CURARÉ'A T¡ MESMO.' tÜÁpÍa"" 445""91"' *'7-
LE BOURGEOIS, Mr. ARMAND "QUESTÓES DOS """■"" <M6'1999' "• 30S-
MAQNAN1. QIOVANN!. JESÚS CONST^TOrVmKT^" "'"**■ *

MARiANO, RiCARDO,

VALOÉS, AR.EL ¿LVARE2,


BÍBLIA? vol. 4 445/1999, p. 269.

584
Acaba de sair um novo livro de:

Dom Bcnto da Silva Santos, O.S.B.

A imortalidade da alma no "Fédon" de Phtáo.


Coeréncia e legitimidade do argumento final (102a -107b).
Porto Alegre, EDIPUCRS, 1999, 126 p. {Colecao "Filosofía , n 89).

Sumario geral do livro:


CAPÍTULO I - Origens da concepto de alma e de suas quahhcacpes an
tes de Platáo.

CAPÍTULO II - A alma e sua imortalidade no "Fédon" de Platáo


CAPÍTULO III - O argumento final de Sócrates (102a - 107b)
CAPÍTULO IV - A mensagem ética do "Fédon": o significado da existencia
humana e o sentido da vida e da morte.

Prego: R$ 15,00.

Pedidos:
Ed. "Lumen Christi"
Mosteiro de Sao Bento
Caixa Postal: 2666
CEP: 20001-970
Centro - RJ

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R<c qc no
RENOVAQÁOOUNOVAASSINATURA(ANODE2000): * ^
NÚMERO AVULSO

PERGUNTE E RESPONDEREMOS ANO: 1998


Encadernado em percalina, 590 págs., com índice incluido.
(Número limitado de exemplares) R$ 50,00

INTERNET: e-mail: lumen christi @ pemail.net


www.osb.org.br
Dom Martinho Michler, O.S.B.
(Ravensburg 1901 - Rio de Janeiro 1988) .;

Abade durante vinte e um anos do Mosteiro de Sao Bento do Rio de


Jane.ro (1948 -1969), foi uma figura impar no cenário ec.esiástico bTas" eiro
TolTT f'UénCÍa S°bre aJUVentUde «»««m» décadas de 30e
TnlZ T^ J°VenS 3 COnsa3rarem-s- * Deus na vida religiosa. Seus
enanamente» no campo litúrgico anteciparam profeticamente o Vaticano II
do qualfo, padre conciliar, e deram incremento ao Movimento Litúrgico no
SZtr -° !.Sem raZá° qUe fOÍ Chamad° de >P^toto tío momento
htto&co eAIceu Amoroso Uma o cognominou de "oRomano Guardirido

O^ h P°r S6U f¡lh° 6Spíritual Dom Cler"^te


OSB. b.spo emento de riova Friburgo, será de grande interesse nao só
para os que estudam a Historia da Igreja em nossa Térra, mas também para os

~TrrSZvida consumida £
vida iw 9 S CenteülaS de fé esPaIhad^ Por Dom Martinho em
vida, se juntem agora muitas outras suscitadas nos Ieitores deste livro aO.

Livro publicado pelas Edicóes Lumen Christi. Com fotos. 180pp. R$12 OQ-
Pedidos pelo Reembolso Postal. Veja informacóes na 2a capa.

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