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Como ramo de Direito ao serviço da dinâmica negocial que dá suporte jurídico a vida
negocial, o direito das obrigações demarca-se dos Direitos Reais, estes, são um conjunto
normativo ao serviço da estática patrimonial.
O direito das obrigações, à imagem de outros ramos de Direito regula ainda relações
inter subjectivas (entre sujeitos determinados) como adiante veremos, ao direito de
crédito do credor corresponderá o dever de prestar do devedor.
5ª - O direito das obrigações tem uma forte ideologia ética, é, nesse sentido,
permeável. Isso é patente em varias figuras, como por exemplo na do Abuso de Direito,
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(especialmente na sua forma de Venire contra factum proprium) na responsabilidade
pré-contratual (art.227º, culpa in contrahendo) e outras. Todas estas figuras são
objectivações desse princípio basilar das obrigações que é a Boa-fé.
Como sabemos, o Código Civil é uma das fontes do direito das obrigações, o Livro II,
nos art. 397º a 1250º vai disciplinar toda a vida da relação obrigacional, com recurso por
vezes ás normas relativas à formação dos contratos.
O Livro II do código é composto por dois títulos. O primeiro refere-se ás obrigações em
geral, já o segundo trata dos contratos em especial.
Noção de Obrigação
A obrigação em sentido técnico vai ter como objecto uma prestação, um comportamento
imposto ao sujeito passivo, o devedor. Esse comportamento, ao qual o devedor está
obrigado visa satisfazer o interesse do credor (sujeito activo).
Importa agora fazer a distinção entre Obrigação e outras figuras, são elas:
•Dever jurídico
•Estado de Sujeição
•Ónus Jurídico
•Poder-dever
•Dever jurídico – Por dever jurídico entende-se a necessidade imposta pelo direito
objectivo, a uma dada pessoa, de observar determinado comportamento. É uma ordem,
um comando, uma injunção dirigida à inteligência e à vontade doa indivíduos, que, no
plano dos factos podem ou não proceder de acordo com ele. Como tal a imposição do
comportamento é normalmente acompanhada da cominação de algum meio coercitivo.
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Desde já verificamos que o dever jurídico, correspondente ao direito subjectivo não se
confunde com o lado passivo da relação obrigacional (este é sempre um dever de
prestação).
Aos deveres jurídicos podem corresponder, do lado activo da relação jurídica, direitos
de crédito, direitos reais, direitos de personalidade, etc.
Como exemplo do que acabamos de dizer ateste-se no seguinte: Ao direito de
propriedade (direito real por excelência) corresponde uma obrigação de abstenção
adstrita a todos os terceiros indeterminados, a chamada obrigação passiva universal que
se impõe erga omnes.
Podemos concluir que o dever jurídico é uma categoria bastante mais ampla que os
deveres de prestação, sendo que estes são abarcados por aqueles. Nas obrigações existe
sempre uma correlação intersubjectiva.
O titular passivo da relação nada tem de fazer para cooperar na realização do interesse
da contraparte, é precisamente na desnecessidade de consentimento do próprio para que
determinada relação se crie, modifique ou extinga na sua esfera jurídica que Botticher
coloca a tónica do direito potestativo.
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•Ónus Jurídico – É a imposição de observância de determinado comportamento a um
sujeito, de forma a alcançar ou manter uma vantagem ou evitar uma desvantagem. Ex.
Alguém compra um imóvel e procede ao registo com vista a torna a aquisição oponível
a terceiros.
a)O acto a que o ónus se refere não é imposto como um dever, logo, à sua inobservância
não está associada uma sanção.
É de referir a posição do Prof. Menezes Cordeiro que, ao invés do Prof. Antunes Varela,
estabelece diferenças entre ónus e encargo ou incumbência, para Menezes Cordeiro os
ónus satisfazem apenas os interesses do onerado.
São direitos conferidos no interesse, não do titular ou não apenas do titular, mas também
de outra ou outras pessoas e que só são legitimamente exercidos quando se mantenham
fieis à função a que se encontram adstritos.
Assemelham-se aos direitos subjectivos e, consequentemente, aos direitos de crédito, na
medida em que conferem ao respectivo titular o poder de exigir de outrem determinado
comportamento. No entanto distinguem-se dos direitos subjectivos patrimoniais porque
o titular não é livre no seu exercício, tendo obrigatoriamente que exerce-los, por um
lado e de faze-lo em obediência à função social a que o direito se encontra adstrito, por
outro.
1-Sujeitos
2-Objecto
3-Vinculo
3.1-Garantia
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O credor é a pessoa a quem se proporciona a vantagem resultante da prestação, o titular
do interesse que o comportamento do devedor visa satisfazer.
O credor é o amo e senhor da tutela do seu interesse. A tutela do seu interesse depende
da sua vontade, o funcionamento dela está subordinado à iniciativa do titular activo da
relação.
Apenas o credor tem direito à prestação, e esta apenas do devedor pode ser exigida.
A obrigação tem assim carácter relativo, porque vincula pessoas determinadas, ao
invés dos direitos reais ou direitos de personalidade que, como direitos absolutos que
são, valem em relação a um círculo indeterminado de pessoas (erga omnes).
No mais das vezes, existe apenas uma pessoa de cada lado da relação (um credor e um
devedor) neste caso a obrigação diz-se singular.
No entanto a obrigação pode ser plural, quer do lado activo quer do lado passivo quer,
simultaneamente do lado activo e passivo.
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O que se diz quanto aos sujeitos originários é igualmente valido para aqueles que lhes
sucedem na titularidade da relação.
Ex. Se A, credor de B, morrer e lhe suceder um único herdeiro, C, este ocupará o lugar
de A na relação creditória. Entendendo-se que a relação constituída entre o herdeiro (C)
e o devedor (B) é a mesma que existia na titularidade de A.
De forma idêntica se representam as coisas quando o credor cede o seu crédito a outrem
(vendendo-o, doando-o ou trocando-o) ou quando um terceiro, como o fiador, paga em
vez do devedor e a lei o investe (sub-roga) na posição do credor.
A obrigação, em casos como estes, mantém-se. Falamos então em transmissão da
obrigação (atinente a estas matérias veja-se os art. 577º e SS).
A conduta do devedor é o meio pelo qual o credor irá alcançar determinada posição
(meio através do qual o credor verá cumprida a satisfação do seu interesse).
A prestação será positiva ou negativa, isto é, consistirá tanto numa acção como numa
omissão.
A prestação é o fulcro da obrigação. Distingue-se do dever geral de abstenção próprio
dos direitos reais, já que o dever de prestar é um dever específico (apenas atinge o
devedor) ao contrário da obrigação passiva universal que se dirige a todos os terceiros.
A prestação de coisa
Prestação de
coisa
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Prestação de coisa – Aquelas cujo o objecto consiste na entrega de uma coisa. Por
exemplo, na hipótese de alguém comprar um bem, o vendedor obriga-se a entregá-lo
(art.879º).
Objecto imediato – consiste na própria conduta a adoptar pelo devedor, no próprio acto
de entrega da coisa.
Objecto mediato – consiste na coisa em si, no objecto da prestação, o bem sobre o qual
incide a compra e venda.
A Prestação de Facto
Infungibilidade natural
Infungibilidade convencional
Prestação de facto – São aquelas quem consistem em realizar uma conduta de outra
ordem, como na hipótese de alguém se obrigar a cuidar de um jardim (art.1154º).
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Prestações de facto material – São aquelas prestações em que a conduta que o devedor
se compromete a realizar é uma conduta puramente material, não destinada à produção
de efeitos jurídicos (ex. realizar ou não determinada obra).
Prestações de facto positivo (facere) – aquelas em que a prestação tem por objecto
uma acção.
a)Prestações fungíveis – aquelas em que a prestação pode ser realizada por outrem, que
não o devedor, podendo este fazer-se substituir no cumprimento, art.767º.
Prestações de facto negativo – Aquelas em que a prestação tem por objecto uma
omissão do devedor, estas subdividem-se em:
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Prestações instantâneas e duradouras
Prestações instantâneas – são aquelas cuja execução ocorre num único momento (ex.
entrega da coisa no contrato de compra e venda, art.879ºb).
a)Prestações instantâneas integrais – são as que são realizadas de uma vez só (ex.
realização da obra pelo empreiteiro, art.1208º).
Nas prestações instantâneas fraccionadas está-se perante uma única obrigação cujo
objecto é dividido em fracções, com vencimentos intervalados, pelo que há sempre uma
definição prévia do seu montante global e o decurso do tempo não influi no conteúdo e
extensão da prestação, mas apenas no seu modo de realização.
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de locação, sendo sempre em função do decurso do tempo que se determina o conteúdo
da sua obrigação.
A distinção entre prestações de resultado e prestações de meio veio a ser alvo de criticas
na doutrina, Gomes da Silva demonstra o fracasso da distinção. Com efeito, mesmo nas
obrigações de meios existe a vinculação a um fim, que corresponde ao interesse do
credor, e se o fim não é obtido presume-se sempre a culpa do devedor. Efectivamente,
em ambos os casos aquilo a que o devedor se obriga é sempre uma conduta (a
prestação), e o credor visa sempre um resultado, que corresponde ao seu interesse (art.
398ºnº2).
Por outro lado, cabe sempre ao devedor o ónus da prova de que realizou a prestação
(art.342º nº2) ou de que a falta de cumprimento não procede de culpa sua (art.799º)
Resulta dos art. 280º e 400º que a prestação, enquanto objecto da obrigação, não
necessita de se encontrar determinada no momento da conclusão do negócio, bastando
que seja determinável. Como tal distinguimos entre:
•Essa indeterminação pode resultar do facto de as partes não terem julgado necessário
tomar posição sobre o assunto, em virtude de existir regra supletiva aplicável, ou de
pretenderem aplicar ao negócio as condições usuais do mercado.
•Outras vezes resulta de as partes terem pretendido conferir a uma delas a faculdade de
efectuar essa determinação, porque só essa parte tem os conhecimentos necessários para
o poder fazer adequadamente.
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As partes podem acordar que essa informação seja fornecida à outra parte antes da
celebração do contrato. Nesses casos a prestação vem a ser determinada durante as
negociações, o que permite que esteja determinada no momento da conclusão do
negócio.
Quando, porem, essa circunstancia não ocorre, tal significa que as partes delegaram
numa delas a faculdade de determinar o conteúdo da prestação. Essa situação pode
qualificar-se como um poder potestativo, que tem como contrapolo um estado de
sujeição a contraparte vai ver o conteúdo da prestação ser determinado pela outra parte.
No entanto, e ao abrigo do art.400º, o poder de determinar a prestação nunca é absoluto.
Grande parte da doutrina estabelece que as prestações sem valor patrimonial são
validas, tal é perceptível na formulação do art.496º, que refere a ressarcibilidade por
danos não patrimoniais e de forma extensiva na norma do art.398º nº2.
A prestação, há-de, em suma, satisfazer uma necessidade séria e razoável do credor, que
justifique socialmente a intercessão dos meios coercitivos próprios do direito.
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Um outro requisito que também pode condicionar não a validade da prestação, mas a
aplicação das normas do Livro II é o Requisito de autonomia:
Também nos outros ramos de Direito existem inúmeras obrigações não autónomas:
b) Como outro exemplo agora no âmbito do Direito das Sucessões, veja-se a obrigação
que algum dos herdeiros pode ter de cumprir o legado, que é gerada por uma situação
testamentária anterior, art.2068º e SS.
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forma a esse requisito na definição do vínculo obrigacional, seguindo-se a orientação de
Vaz Serra; Contra, Guilherme Moreira). Porém, uma limitação surge neste âmbito:
não podemos aplicar as normas das obrigações autónomas (Livro II C.C.) às
obrigações não autónomas quando elas contrariem as normas especiais (específicas,
particulares, próprias) respeitantes às próprias obrigações não autónomas (e a sua
própria especificidade), desde logo pela regra geral de Direito que diz que a norma
especial prevalece sobre a norma geral.
Segundo Coelho da Rocha é o “vínculo legal pelo qual é alguém adstrito a dar, fazer ou
pagar alguma coisa”.
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sujeito a retenção por parte do credor (solutio retentio), logo, sem possibilidade de
repetição por parte do devedor, art.402º.
a) Situações em que a prestação pode ser efectuada por terceiros (ex. prestação de
facto fungível)
b) O caso em que o devedor (num contrato promessa) não celebre o contrato
prometido, e que por via de decisão judicial se possa superar a falta de
declaração do promitente faltoso.
Dimensão declarativa – Nesta fase o tribunal vem dizer que determinado direito existe
na pessoa do credor e o devedor está em incumprimento.
Segundo o art.601º o património é a garantia geral das obrigações. Com efeito, vista do
lado do devedor, a garantia traduz-se fundamentalmente na responsabilidade do
seu património pelo cumprimento da obrigação e na consequente sujeição dos bens
que o integram aos fins específicos da execução forçada (quem deve também responde).
•Caso se trate de uma obrigação de entrega a execução será para entrega de coisa certa,
art.928º C. Processo C: e 827º CC.
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•Caso a prestação seja de facto fungível a execução vai ser para a prestação de facto por
terceiro a expensas do devedor.
•Já a execução para entrega de quantia certa usa-se quando a prestação é de natureza
pecuniária. Esta processa-se através da penhora judicial do património do devedor e
subsequente venda, com vista à satisfação do crédito do devedor/s
•Caso a obrigação tenha por objecto um facto infungível o credor recorrerá à execução
por quantia certa para obter uma indemnização pelos prejuízos por ele havidos em
função do inadimplemento (isto porque tratando-se do um facto infungível só poderá ser
cumprido pelo próprio devedor).
A execução pode assegurar ao credor a satisfação integral do seu interesse, nos casos em
que a prestação seja de facto fungível, ou naqueles em que a natureza da obrigação seja
pecuniária.
No entanto o credor já não vê o seu interesse realizado nos casos em que a execução se
destina a indemnizar, diz-se, nestes casos, que a execução não proporciona a satisfação
integral do interesse do credor.
São disso exemplo os art. 605º e SS, onde se prevê a declaração de nulidade, a sub-
rogação do credor ao devedor, a impugnação pauliana e o arresto (art.406º C.
Processo C.).
Sempre que exista, é a acção creditória (acção de cumprimento e execução) que melhor
caracteriza a juridicidade do vínculo.
É a possibilidade de realização coactiva da prestação (ou de indemnização do prejuízo
pela sua falta) que mais expressivamente afirma o direito à prestação e impõe o dever de
a efectuar.
Cabe ainda referir que a lei pode dispensar a fase declarativa da acção de
cumprimento, permitindo ao credor a passagem directa à fase de execução, bastará
para isso que o credor faça prova que o seu direito existe, tem determinadas
características e que o devedor está inadimplente.
Esta prova pode ser feita através de sentença judicial ou através de certificação das
características do crédito (títulos executivos, art.46º C. Processo C.).
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Procedimento de injunção, art. 7º DL 269/98 – considera-se injunção a providencia
que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o
cumprimento das obrigações.
Tutela do credito
A tutela do crédito pode fazer-se noutras instâncias que não os tribunais ex. arbitragem,
(ad hoc ou institucionalizada) procedimentos de conciliação, etc...
Pode ainda efectuar-se pela via privada, isto é, através da fixação de cláusulas penais ou
compulsórias nos contratos, estas visam dissuadir o incumprimento.
A auto-tutela (nos termos do art.1º C. Processo C.) justifica-se não só quando completa
a tutela pública, mas também quando se torna necessária pelos condicionalismos da
tutela pública, ex. legitima defesa.
O traço mais saliente da distinção assenta no carácter relativo que têm as obrigações e
na natureza absoluta que revestem os direitos reais.
Direitos Reais
•Valem erga omnes, são jura excluendi omnes alios, isto é, ao direito real de um sujeito
corresponde uma obrigação passiva universal.
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Para Antunes Varela, o direito de preferência consiste no facto de o direito real
sacrificar toda a situação jurídica posteriormente constituída sobre a mesma coisa sem o
concurso da vontade do titular daquele, na medida que uma e outra sejam incompatíveis
entre si (prior tempore potior iure).
Direitos Obrigacionais
•Os direitos de crédito operam inter partes, isto é, apenas vinculam as pessoas
determinadas ou determináveis que são os sujeitos da relação. Valem, em princípio,
somente a favor do credor e contra o devedor.
•Os direitos de crédito vão concorrer com os demais direitos de crédito em relação ao
mesmo devedor (a menos que o direito de algum dos credores goze de especial
protecção, art.605º)
Como direitos relativos que são, dir-se-á que esgotam a sua eficácia na relação inter-
partes, como tal, terceiros não serão susceptíveis do violar a obrigação (com a sua
conduta).
Há, no entanto, situações em que terceiros, não estando vinculados à obrigação são
abrangidos pela relação. Com efeito, a relatividade essencial do direito de credito não
obsta a:
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A lei pode, para satisfazer interesses relevantes, impor ou permitir a oponibilidade a
terceiros de relações estruturalmente obrigacionais (por assentarem fundamentalmente
num dever de prestar e correlativo direito à prestação).
Assim sucede com a relação locatícia, que embora sendo de natureza obrigacional não
deixa de ser oponível pelo locatário ao terceiro adquirente do direito (normalmente de
propriedade) com base no qual o contrato foi celebrado, art.1057º, emptio non tollit
locatum.
A Função da Obrigação
Por um lado como realização do interesse do credor, por outro como comando que
impõe determinada conduta ao devedor.
Diz-nos o art.767º que a prestação pode ser efectuada por terceiro em lugar do devedor.
Nesta situação, não funciona o mecanismo da obrigação, mas atinge-se o fim ou
preenche-se a função para que ele foi instituído.
Entende-se, por isso, que o credor apenas possa recusar a prestação, na falta de acordo
que exclua a intervenção de terceiro, quando a substituição o prejudique.
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É ainda pelo interesse do credor que a lei manda pautar a resolução de alguns problemas
delicados, tais como:
A obrigação não vale apenas ou em função do comportamento que o credor pode exigir
do devedor a partir da data de vencimento da prestação.
Antes que a prestação debitória possa ser exigida ou seja efectivamente realizada, já o
poder jurídico do credor, economicamente considerado representa (sempre que a
prestação seja susceptível de avaliação pecuniária) um elemento actual do seu
património.
O valor patrimonial do crédito assenta na expectativa do seu cumprimento, reforçada
pela garantia geral que incide sobre o património do devedor ou pelas garantias
especiais que confiram ao credor uma posição de supremacia perante os demais
credores.
Através do poder de disposição, que em principio, integra todos os direitos
patrimoniais. O credor pode utilizar o valor económico do seu direito quer como objecto
de alienação ou de oneração, quer como instrumento de crédito.
O crédito é, por conseguinte, um objecto do comércio jurídico como qualquer outro
direito patrimonial.
As formais mais vulgares, através das quais se efectiva o poder de disposição do credor
nas obrigações civis são:
•O Penhor sobre o credito mediante o qual o credor constitui a favor de um dos seus
credores um direito de preferência no concurso em os demais credores, art.679º e SS.
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Cabe ainda referir o interesse do devedor, esse, será primordialmente o da extinção da
obrigação, preferencialmente através do cumprimento, art.779º, 539º, 543º nº2.
São os seguintes:
1-Autonomia Privada
2-Boa-fé
3-Tutela do Sujeito mais Débil
4-Proporcionalidade
5-Responsabilidade Patrimonial
6-Heteroresponsabilidade
7-Auto-responsabilidade
Por isso se pode dizer, segundo Menezes Cordeiro, que a autonomia privada é uma
permissão genérica de actuação jurígena. A autonomia privada é assim um espaço de
liberdade, já que, uma vez respeitados certos limites, poderão as partes livremente
desencadear os efeitos jurídicos que pretendem.
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Ao endeusamento da autonomia privada segue-se a constatação de que o contrato não
assentava numa igualdade jurídico-economica. Representava, segundo M. Villey, “a
distorção entre a teoria e a realidade”.
Com efeito, chegou-se à conclusão que o Estado, no interesse colectivo, não podia
permitir que a liberdade contratual se traduzisse num jogo desleal, em proveito do mais
forte.
Essa preocupação conduziu à intervenção do Estado e à contenção da liberdade
contratual.
O contrato, tal como foi idealmente concebido pelos liberais, como meio de
conformação de relações entre sujeitos juridicamente iguais economicamente idênticos
via-se ultrapassado.
a)No atinente à formação do contrato – vem-se assegurar que existe, por parte do
aderente, um conhecimento pleno do clausulado, art.5º e SS DL 446/85.
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O diploma, nessa distinção, estabelece uma lista (meramente exemplificativa) de
cláusulas absolutamente proibidas e clausulas relativamente proibidas.
De salientar que, no caso de uma cláusula não encontrar correspondência numa das
listas de cláusulas absoluta e relativamente proibidas, ela poderá sempre cair no âmbito
de aplicação do art.15º do DL 446/85, isto porque, como se disse as listas são
meramente exemplificativas, que não taxativas e exaustivas.
Plano da interpretação
Tem carácter colectivo, isto é, visa proteger interesses gerais, nesse sentido a eficácia da
decisão proferida pelo tribunal em sede de acção inibitória é ultra partes, com efeito, a
empresa ou entidade condenada a retirar a clausula não a poderá incluir em contratos a
celebrar futuramente.
No entanto esta eficácia não é absoluta, visto que, empresas que utilizem cláusulas
semelhantes, o poderão fazer até decisão transitada em julgado a elas aplicável.
O facto de, em sede de acção inibitória uma cláusula não ser proibida não significa que
em caso de controlo incidental não possa, ela, ser considerada invalida.
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O princípio de que há pouco referimos, de em caso de dúvida a interpretação ser no
sentido mais favorável ao aderente não procede em sede de acção inibitória, como
prescreve a norma do art.11º nº3 DL 446/85.
Como se disse, o princípio da boa-fé perpassa toda a vida das relações jurídicas
obrigacionais, vejamos:
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Fase de execução, art.762º nº2 – ex. o devedor descura a conservação do bem ou
utiliza em excesso a máquina alugada.
Fase da extinção, art.1222º nº1 e 437º – ex. exercício, em prazo razoável do direito de
resolução.
3º- Alem de indicar o critério pelo qual se deve pautar a conduta de ambas as partes, a
lei portuguesa aponta concretamente a sanção aplicável à parte que se afasta da conduta
exigível: “sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte”.
4º- A lei não se limita a proteger a parte contra o malogro da expectativa da conclusão
do negócio, cobrindo-a de igual modo contra outros danos que ela sofra no iter negotti.
Embora uma das vertentes da boa-fé abranja, sem dúvida, a cobertura das legítimas
expectativas criadas no espírito da outra parte, o art.227º, não aponta deliberadamente
para a execução específica do contrato, no caso de a conduta ilícita da parte ter
consistido na frustração inesperada da conclusão do contrato.
A lei respeita assim, até ao derradeiro momento da conclusão do contrato (salvo se
houver contrato promessa, art.830º), um valor fundamental, transcendente, do direito
dos contratos, a liberdade contratual.
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Limitação da indemnização por culpa in contrahendo
Da ideia que a lei (por mais censurável que seja a ruptura de negociações na eminência
da celebração do contrato) intencionalmente, não vai ao extremo da obrigatoriedade de
celebração ou execução específica do contrato decorre:
Tem vindo a admitir-se a responsabilidade pré-contratual como uma terceira via para a
responsabilidade civil (a par da responsabilidade extra-contratual e da responsabilidade
contratual)
A indemnização vai abranger os danos emergentes e o lucro cessante, o fundamental é
indemnizar os danos nexualmente ligados à actuação do lesante.
Abuso de Direito art.334º – não estamos perante uma violação de um direito de outrem
ou de uma ofensa a uma norma tuteladora de um interesse alheio, na verdade, trata-se
do exercício anormal de um direito próprio.
O art.334º prescinde da consciência por parte do agente que age abusivamente, basta
que objectivamente se excedam os limites da boa-fé, bons costumes ou fim social ou
económico desse direito.
Não basta, no entanto, que o simples exercício do direito cause prejuízos a outrem, para
que o exercício do direito seja abusivo é preciso que o titular, observando embora a
estrutura formal do poder que a lei lhe confere, exceda manifestamente os limites que
lhe cumpre observar em função dos interesses que legitimam a concessão desse poder.
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O art. 334º refere os limites impostos por:
Boa-fé e bons costumes (casos de venire contra factum proprium nulli conceditur) –
para determinar os limites, neste caso, teremos que atender ás concepções ético-
juridicas dominantes na colectividade.
Segundo Pessoa Jorge, a sanção contra o abuso de direito tem uma finalidade diferente
do recurso à equidade; Com esta pretende-se evitar a injustiça a que conduz, em certos
casos, a aplicação concreta da norma.
Já a sanção imposta pelo abuso de direito pretende impedir que a norma seja
desvirtuada no seu sentido e alcance.
Num caso afasta-se a norma, no outro quer-se aplicar a norma mas com plena fidelidade
ao seu espírito.
De qualquer modo, para que haja abuso de direito é necessária a existência de uma
contradição entre o modo ou fim com que o titular exerce o direito e o interesse/s que o
poder nele consubstanciado se encontra adstrito.
Abuso de direito
Almeno de Sá – uso para alem do valor que constitutivamente funda determinado direito.
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Dentro do abuso de direito (em violação da boa-fé) podemos configurar três variantes,
são as seguintes:
Conduta contraditória, o titular exerce o direito em distorção com a sua conduta passada
“Um comportamento não pode dirigir-se num sentido contrário da confiança suscitada na contraparte”
Protecção das expectativas da parte, resultantes do não exercício de determinado direito pela contraparte durante
um lapso razoável de tempo
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Tu Quoque
Ninguem pode recorrer à sua conduta reprovável para fundamentar um direito ou posição jurídica
Nesse sentido, “turpitudinem suam allegans non auditur”, ninguém pode alegar a sua
própria torpeza.
Este autor defende que a boa-fé deve obstar à invocação da invalidade por quem a
causa, isto se:
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Uma vez verificados estes requisitos, defende esta doutrina, a excepcionalidade da
impossibilidade da invocação da invalidade do negocio por quem causa o vicio.
3-Tutela do Sujeito mais Débil – verifica-se, actualmente, uma tendência, e por via de
acção do legislador, de assegurar uma igualdade entre as partes de forma a evitar o fosso
contratual entre prestações.
Com efeito a tutela do sujeito mais débil exerce-se através de restrições à liberdade
contratual, tanto no plano da liberdade de celebração do contrato como no plano da
fixação do seu conteúdo.
É uma importante restrição à liberdade de celebração, a obrigação de celebrar
contrato, obrigação de contratar.
Efectivamente uma das partes pode estar vinculada, por obrigação contratual ou legal, à
celebração de contrato com a outra parte.
Com base ainda na autonomia privada, as partes podem criar obrigações de celebração
de contratos, art.410º e SS; Podendo nesses casos considerar-se a celebração como
cumprimento de uma obrigação contratual livremente assumida, e que portanto, ainda se
funda na autonomia privada.
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Deve entender-se, por isso, como juridicamente consagrada, nesses casos, uma
obrigação de contratar, Elias em harmonia com o princípio previsto no art. 3º da Lei
23/96 de 26 de Julho.
Lei 24/96 de 31 de Julho – esta lei veio consagrar o direito à reparação dos danos
patrimoniais e não patrimoniais resultantes da prestação de serviços.
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- Direito de reparação
- Direito de substituição da coisa
- Direito à redução do preço
- Direito à resolução do contrato
Nesse sentido, o art. 3º nº2 estabelece prazos mais alongados para efectuar a reclamação
por defeitos técnicos.
-Ao exercício ponderado de direitos (art.336º nº3; 337º nº1 e 793º nº2).
A moderação que a lei faz ou pode fazer das cláusulas penais, art.812º. Como sabemos,
as cláusulas penais são disposições em que as partes, no âmbito da sua autonomia
privada, estabelecem as consequências do incumprimento contratual.
De acordo com este princípio, consagra-se o património do devedor como garantia geral
das obrigações, art.601º. Resulta desse facto a possibilidade conferida ao credor de
agredir o património do devedor caso este não cumpra.
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A ordem jurídica não poderia apenas reconhecer ao credor um direito à prestação e ao
devedor um dever de prestar sem assegurar por alguma forma a realização desse direito
ou cumprimento desse dever. Nesse sentido a norma do art.817º.
O recurso aos tribunais faz-se normalmente enquanto a prestação é possível, para exigir
essa mesma prestação. É o já nosso conhecido instituto da Acção para cumprimento e
execução.
Caso, porem, a realização da prestação já não seja possível em virtude de causa
imputável ao devedor, o credor apenas poderá reclamar um direito à indemnização. É o
que sucede nos casos de incumprimento definitivo, art.798º e 808º e de impossibilidade
culposa de cumprimento, art.801º.
No que concerne aos bens do devedor que não são susceptíveis de penhora, eles são
referidos nos art.822º e 823º C. Processo C.
Trata-se de bens que, por desempenharem uma função essencial à subsistência ou à
dignidade do devedor, ou em virtude da função a que estão afectos ser superior à da
garantia patrimonial dos créditos a lei não autoriza a execução para fins da satisfação
dos direitos de créditos.
A limitação pode ser positiva – o credor ou credores, apenas podem executar alguns dos
bens do devedor.
A limitação pode ser negativa – quando a lei exclui certos bens do devedor do poder de
execução da generalidade dos seus credores, só o permitindo a certos credores,
art.1184º.
32
Segundo postulado – é o de que apenas os bens do devedor podem ser objecto de
execução pelos credores, art.817º, regra geral.
No entanto esta regra sofre algumas excepções, a que nos faz referencia o art.818º.
Terceiro postulado – regra geral, todos os credores estão em igual posição. Essa regra
implica uma não hierarquização dos direitos de credito pela ordem da sua constituição,
tendo tanto os créditos mais antigos como os mais recentes a mesma possibilidade de
executar o património do devedor.
Com efeito, em caso de o património do devedor não chegar para pagar a todos, não há,
em princípio, hierarquização de credores, tendo o património do devedor que ser
rateado para todos se pagarem proporcionalmente (concurso de credores, art604º).
1ª- Quanto ao risco de variação do património do devedor, ele pode ser evitado através
da concessão aos credores, da possibilidade de reagir contra acções ou omissões do
devedor de onde possa resultar a diminuição do seu património.
33
São as denominadas garantias especiais das obrigações. Essas garantias podem ser
pessoais (fiança, art.627º) ou reais (604º nº2).
Sempre que exista uma razão de justiça, da qual resulte que o dano deva ser suportado
por outrem, que não o lesado, deve ser aquele e não a este que deve suportar o dano.
A transferência do dano do lesado para outrem opera-se mediante a constituição de uma
obrigação de indemnização, através da qual se deve reconstituir a situação que existiria
se não tivesse ocorrido o evento lesivo, art.562º.
A simples injustiça do dano sofrido não é, porem, suficiente para se ter direito à
indemnização.
Efectivamente, por muito injusta que seja a situação, em principio o Direito tem que
aceitar o veredicto do destina, não atribuindo indemnização a quem veio a suportar um
prejuízo material, a perder uma vantagem ou a sofrer danos morais em virtude de
qualquer circunstancia lesiva.
Dai que o dano seja normalmente suportado por quem o sofreu como fazendo parte do
risco geral da vida “casum sentit dominus, res perit dominus”, the loss lies were it falls.
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Imputação de danos – ocorre a imputação de danos sempre que a lei considera existir,
não apenas um dano injusto para o lesado, mas também uma razão de justiça que
justifica que esse dano seja transferido para outrem.
A situação de alguém estar numa situação que o Direito considera mais adequada à
suportação do dano causado do que aquele que o sofreu é denominada por
responsabilidade civil, art.483º e SS.
Cabe ainda referir os casos em que a imputação dos danos se baseia em permissões
legais de sacrificar bens alheios no interesse próprio que tem como contrapartida o
estabelecimento de uma obrigação de indemnização, art.81º nº2 e 339º nº2.
São situações em que alguém fica obrigado a aceitar um intervenção num direito seu,
obtendo por essa razão um direito a ser indemnizado.
35
Na imputação pelo risco, o fundamento reside numa concepção de justiça distributiva.
O caso mais importante de auto-responsabilidade tem que ver com a chamada culpa do
lesado, art.570º; Isto é, com as condutas descuidadas ou negligentes dos que sofreram
ou agravaram o dano.
Juridicamente, a culpa do lesado, permite aplicar (desfavoravelmente) o regime do
art.570º, isto desde que o lesante também tenha tido culpa, ou o art.505º nos casos em
que a conduta do lesado tenha sido determinante na verificação do acidente ou dos
danos.
36
Factos constitutivos de Obrigações
Podemos distinguir varias fontes de obrigações em função do facto que está na sua
origem.
- O contrato
- Os negócios jurídicos unilaterais
- Gestão de negócios
- Restituição do enriquecimento sem causa
- Responsabilidade civil
O contrato
Segundo Antunes Varela, contrato é, o acordo vinculativo, assente sobre duas ou mais
declarações de vontade (proposta/aceitação) contrapostas mas perfeitamente
harmonizáveis entre si, que visam estabelecer um composição unitária de interesses.
Já Almeida Costa refere duas ou mais declarações de vontade de conteúdo diverso mas
que se ajustam reciprocamente com vista à produção de efeitos jurídicos unitários.
Podemos ainda referir ainda o art.1º do projecto preliminar do código europeu dos
contratos que, em ligeiro paralelismo com a legislação italiana, refere que: contrato é o
acordo de duas ou mais pessoas destinado a constituir, regular, modificar ou extinguir
uma relação jurídica que pode comportar obrigações e outros efeitos mesmo que em
relação a uma só parte.
Existe, entre nós, doutrina que peleja que o elemento essencial do contrato é a
declaração, o acordo entre declarações, acordo esse destinado à produção de efeitos.
Dá-se assim a deslocação do acento tónico do elemento vontade para o elemento
declaração, (veja-se a contratação com autómatos).
37
A definição que nos é dada por Carlos Ferreira de Almeida vai nesse sentido, para este
jurista, contrato é: um acordo formado por duas ou mais declarações que produzem,
para as partes envolvidas, efeitos jurídicos conformes ao acordo obtido.
O contrato, pode hoje ser, não só fonte de obrigações (da sua constituição, transferência,
modificação ou extinção) mas de direitos reais, familiares e sucessórios.
O mesmo autor, defende que, para que haja contrato, as vontades que integram o acordo
contratual embora concordantes ou harmonizáveis têm que ser opostas, de sinal
contrário.
Com efeito, para Antunes Varela, quando as declarações são concordantes e paralelas
não há contrato, antes um acto colectivo ou acordo.
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De acordo com a concepção normativista do contrato, este é o mais genuíno expoente
da autonomia privada, precisamente porque através do instrumento contratual criam as
partes, por sua livre iniciativa, as normas reguladoras dos seus conflitos de interesses.
Antunes Varela afirma que esta tese dá flanco a inúmeras criticas, desde logo porque;
•À interpretação e integração das normas jurídicas são aplicáveis as normas dos art.9º a
15º, muito diferentes daquelas que vigoram para as declarações contratuais, art.236º a
239º.
•Enquanto as normas jurídicas podem, em princípio, ser alteradas por nova lei com
eficácia retroactiva, o mesmo não sucede com as cláusulas contratuais, cuja
interpretação e integração devem sempre ser realizadas à luz do direito vigente à data da
celebração do contrato.
Se as partes, por acordo, alterarem a convenção por elas anteriormente estabelecida, é
do novo contrato, e não do precedente que a alteração procede, ao invés do que sucede
se uma nova lei imperativa modificar o seu conteúdo.
Como tratamos, em sede dos princípios do Direito das Obrigações, uma coisa é, na
verdade, a faculdade reconhecida aos particulares de fixarem livremente, segundo o seu
critério, a disciplina vinculativa dos seus interesses, nas relações com os demais sujeitos
(Autonomia privada).
Outra coisa, embora estritamente ligada com aquela, é o poder reconhecido ás pessoas,
de estabelecerem, de comum acordo, as cláusulas reguladoras (no plano do Direito) dos
seus interesses contrapostos que mais convenham À sua vontade comum (Liberdade
contratual).
39
É a protecção da legítima expectativa criada pelo recebimento da proposta contratual no
espírito do destinatário que explica a irrevogabilidade da proposta durante o período
razoavelmente reservado à reflexão e decisão daquele, art.230º.
Etc...
Conteúdo do Contrato
- À lei (enquanto normas imperativas, logo, limitadoras das liberdade contratual, ou por
via de normas supletivas, lá, onde as partes nada tenham disposto).
O negocio jurídico é algo mais complexo que a soma de todas a regras que o compõem.
O conjunto desencadeia efeitos novos, que só aí podem ser explicados.
Por isso considerar o conteúdo em detrimento de sectores isolados surge mais realista e
permite um melhor conhecimento da realidade.
Do conteúdo deve distinguir-se o objecto; Este tem que ver, não com a regulação em si,
mas com o quid sobre que irá recair a relação negocial propriamente dita.
40
•As regras aplicáveis, por via dele, ás partes, constituem o seu conteúdo; Assim a
transmissão da propriedade e as obrigações de entrega da coisa e pagamento do preço,
art879º.
Composição do Conteúdo
Injuntivas – são aquelas que não podem ser afastadas pelas partes.
Elementos voluntários – estes têm que ver com as regras apontadas e fixadas pelas
próprias partes. Podem ser:
Tipo negocial
Plano pratico – o tipo negocial recorda que, na generalidade dos casos, as partes não se
afadigam a procurar regimes específicos para os seus interesses; Limitam-se a eleger um
negócio e a completar os elementos voluntários necessários. As tarefas de determinação
das regras aplicáveis podem assim, limitar-se à identificação do tipo negocial eleito
pelas partes.
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instrumentos, em si desconectados e que quando eleitos, integram elementos voluntários
eventuais.
Importa aqui referir, seguindo Mota Pinto, a ideia de relação obrigacional complexa,
esta complexidade ordenada e com âmbito bilateral é típica dos contratos duradouros
mas projecta-se igualmente noutros contratos (bancários, de consumo) e no seio da
obrigação de indemnização resultante de responsabilidade civil extracontratual, se
pensarmos nos deveres que surgem para o lesante e lesado após, e antes, da verificação
dos danos.
Na definição que nos é dada por Mota Pinto de relação obrigacional complexa
podemos distinguir:
1-deveres principais de prestação – do contrato surgem deveres que são aqueles que
imprimem um determinado cunho, isto é, que permitem distinguir o contrato de todos os
demais, ex. art.879º.
Com a realização dos deveres principais de prestação, a obrigação, normalmente
extinguir-se-á através do cumprimento.
42
4-deveres laterais de conduta – estes não são deveres de prestação, antes de conduta.
Não são propriamente dirigidos ao interesse do cumprimento mas estão ligados à
realização do fim perfeito do contrato e à protecção pessoal e patrimonial dos
contraentes.
São ainda deveres que não dependem da validade do contrato para se efectivarem, isto
porque, podem até existir na fase pré e pós-contratual, logo, a nulidade do contrato não
obsta à existência destes deveres.
A tipificação destes deveres não obedece a um modelo unitário, no nosso estudo iremos
adoptar a seguinte enumeração:
A violação culposa destes deveres não significa incumprimento já que não se tratam de
deveres de prestação, no entanto implica a violação do contrato, uma violação positiva,
portanto, gerando a responsabilidade.
43
Apesar da violação, e como não estamos ante a violação de deveres de prestação a parte
lesada não poderá recorrer à acção de cumprimento. No entanto, ser-lhe-á concedida a
possibilidade de resolver o contrato, caso este decorra de uma relação particularmente
estreita de confiança mútua e de leal colaboração e caso haja um comportamento que
afecte gravemente essa situação (Baptista Machado), ainda que o dever de
lealdade/fidelidade não seja um dever principal.
Deveres de lealdade/fidelidade
Menezes Cordeiro refere os actos preparatórios, assinalando que estes podem ser
materiais ou jurídicos, consoante se traduzem em simples modificações do mundo
material ou antes, impliquem acatividades de puro significado jurídico.
Acto preparatório material – serão por exemplo os contactos preliminares através dos
quais as partes procuram conhecer-se e indagar dos seus interesses na possivel
negociação.
A natureza jurídica dos preliminares já foi controvertida, tratava-se, à altura, de saber se,
no seu decurso, as partes eram inteiramente livres de agir, ou se, pelo contrário elas
deviam observar certas regras. A resposta é, hoje em dia, pacifica.
44
Portanto, actos preparatórios são um conjunto de actos que se insere no processo de
formação do contrato, mas não se reconduzem, quer à formação de uma proposta quer à
de uma contra-proposta.
Nesse sentido, Menezes Cordeiro refere uma “contratação mitigada”, na medida em que
traduz uma situação em que as partes já estabeleceram vínculos entre si, mas de
conteúdo fluido, tendo em vista uma futura negociação
Por exemplo, os acordos de negociação. Por via destes vêm as partes reduzir a escrito
um conjunto de princípios que desejam que norteiem o contrato; exprimem a vontade
das partes com vista à celebração do contrato.
No entanto, estes acordos não exprimem uma vontade de vinculação.
Contrato quadro – já é uma figura contratual, mas com uma natureza própria. Vai
estabelecer os parâmetros dentro dos quais se vão desenvolver as actuações das partes,
neste sentido vai se estabelecer o relacionamento futuro das partes.
Pacto de opção – é uma figura específica e que é admitida pela lei ao abrigo do art.
405º, no entanto, não é disciplinado por lei. É um acordo (contrato) através do qual uma
das partes emite uma declaração negocial com vista à formação de um contrato futuro.
Nesse sentido, fica a contraparte com um direito (potestativo) de celebrar ou não o
contrato. Esta figura é disciplinada pela legislação Italiana como proposta irrevogável;
não tem natureza preparatória.
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O contrato promessa contem já os elementos essenciais que irão integrar o contrato
pormetido.
Os contraentes (ou um deles) auto vinculam-se a um facere pessoal e jurídico, surgindo
para os promitentes (ou para um deles) o direito de exigir esse comportamento
declarativo.
A natureza obrigacional do contrato não é posta em causa na presença de uma cláusula
de tradição da coisa.
Subjacente à promessa está uma vontade séria e firme de vinculação, no entanto existem
ainda um conjunto de obstáculos materiais e/ou jurídicos impeditivos de uma imediata
contratação definitiva. O contrato prometido é então remetido para um momento
ulterior por razões materiais, jurídicas ou até de mera conveniência.
Segundo Antunes Varela o contrato promessa é a convenção pela qual ambas as partes,
ou apenas uma delas, se obrigam, dentro de certo prazo ou verificados certos
pressuposto, a celebrar determinado contrato.
Nesse sentido, o contrato promessa cria a obrigação de contratar, ou mais
concretamente, a obrigação de emitir a declaração de vontade atinente ao contrato
prometido. A obrigação assumida por ambas os contraentes ou por um deles (caso a seja
uma promessa unilateral) tem por objecto uma prestação de facto positivo, um facere
oportere. E o direito correspondente atribuído à contraparte traduz-se numa verdadeira
pretensão.
Venda a retro – o comprador não promete celebrar uma outra venda com o vendedor,
fica antes sujeito a que este, mediante uma simples notificação, resolva celebrar o
contrato sem necessidade portanto de qualquer nova declaração contratual por parte do
vendedor.
Pacto de opção – uma das partes emite logo a declaração correspondente ao contrato
que pretende celebrar; enquanto a outra se reserva a faculdade de aceitar ou declinar o
contrato dentro de certo prazo. Aceitando o contrato aperfeiçoa-se sem necessidade de
qualquer nova declaração da contraparte, ao contrario do que sucede na promessa
46
unilateral, onde se torna necessário um acordo posterior para dar vida ao contrato
definitivo.
Da promessa unilateral deriva para o não promitente uma verdadeira pretensão à
celebração do contrato prometido; do pacto de opção deriva um direito potestativo à
aceitação da proposta contratual emitida e mantida pela outra parte.
Sinal – consiste na coisa (dinheiro ou outra coisa fungível) que uma das partes entrega à
outra no momento da celebração do contrato ou em momento posterior, como prova da
seriedade do seu propósito negocial e garantia do seu cumprimento, ou como
antecipação da indemnização devida ao outro contraente, na hipótese de o autor do sinal
se arrepender do negocio e voltar atrás.
No primeiro caso diz-se um sinal de natureza confirmatória (arras confirmatórias), no
segundo caso diz-se um sinal penitencial.
Na promessa de compra e venda é que se presume, até prova em contrário, que reveste o
sentido de sinal, toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente
vendedor (art. 441º e 350º nº2), ainda que a título e antecipação ou princípio de
pagamento.
Este princípio é a directiva de ordem geral que a lei estabelece quanto ao regime do
contrato promessa e consiste em aplicar, como regra, aos requisitos e aos efeitos do
contrato promessa as disposições relativas ao contrato prometido.
47
O princípio da equiparação admite, no entanto duas excepções, são elas:
O artigo 410º nº3, ao sujeitar os negócios nele previstos a um regime excepcional vem
acautelar que o promitente-comprador não seja lesado pela promessa de compra de
construções ainda não legalizadas (nomeadamente as chamadas construções
clandestinas).
O STJ veio esclarecer quem poderia invocar a falta dos requisitos estabelecidos no art.
410º nº3, através do assento 15/94.
Este assento estabeleceu que a omissão das formalidades não pode ser invocada por
terceiros alheios ao negócio. Já o assento 3/95 determinou que também o tribunal não
poderia conhecer, oficiosamente a omissão desses requisitos.
Em ambos os casos o Supremo consagrou a doutrina propugnada por Calvão da Silva.
Com efeito o STJ veio a consagrar uma nulidade atípica, pois exclui da norma do art.
286º “todos os interessados”.
Calvão da Silva, na senda da protecção da parte mais débil, funda a sua doutrina nos
seguintes argumentos:
1 – O art. 220º in fine estabelece “quando outra não seja a sanção prevista na lei”, nessa
linha, também o art. 285º no inicio refere “na falta de regime especial”. Com efeito,
48
para este autor, a norma do nº 3 do art. 410º in fine, consagra e funda a referida nulidade
atípica.
2 – Se com esta norma (410º nº3) se visa a protecção do adquirente, não poderia aceitar-
se que a referida nulidade pudesse ser invocada por terceiros alheios ao negócio, que
assim vinham por em causa um contrato que poderia ser favorável ao promitente-
comprador.
No entanto, Antunes Varela refere que nenhuma sanção especial a lei civil comina para
a violação do art. 410º nº3; e que nenhum regime especial nela prevê, a não ser no que
estritamente se refere ao promitente culpado, ou presuntivamente culpado da omissão.
O ilustre jurista vai mais longe, com efeito, considera que a não possibilidade da
invocação da nulidade por terceiros decorrente da violação do art. 410º nº3 e a mesma
impossibilidade do tribunal de a conhecer oficiosamente se traduz numa violação, por
parte do STJ do art. 8º nº2.
Também Almeida Costa se insurge contra esta decisão, para este autor a omissão das
licenças de construção ou utilização deve ser do conhecimento oficioso do tribunal, já
que está aqui em causa a defesa de um interesse publico, a chamada ordem publica
económica de direcção.
a) Almeida Costa defende que o STJ aderiu à via da redução do negócio jurídico
49
A posição de Brandão Proença vai de encontro à tese defendida por Almeida Costa e
Carvalho Fernandes, que consideram que, tendo em conta o preceituado no art. 292º, a
redução do negócio se destina à manutenção da parte válida do mesmo, presumindo-se a
vontade hipotética das partes no sentido desta divisibilidade, presunção essa livremente
afastável pelo contraente que não esteja interessado na validade parcial do contrato
promessa celebrado, mediante a prova e alegação de factos ilisivos da presunção.
Por exemplo, não fará sentido aplicar o art.879º relativamente a um contrato promessa,
com efeito, a não aplicação das normas que tenham que ver com a eficácia real
(translativa ou constitutiva) ao contrato promessa é-nos conferida pelo art. 410. nº1 in
fine quando refere “ as que pela sua razão de ser, não se devem considerar extensivas ao
contrato promessa.
Portanto, é precisamente no capítulo dos efeitos da promessa que tem pleno cabimento a
segunda das excepções admitidas ao princípio da equiparação.
Com efeito, e no seguimento do que até aqui foi dito, não se consideram aplicáveis ao
contrato promessa as seguintes normas:
Alínea a) do 879º e na sequencia lógica da não aplicação deste preceito o art. 796º.
Ainda o art. 886º.
50
É igualmente inaplicável à promessa de venda de bens imóveis o nº1 do art. 1682 – A.
O contrato promessa tem uma mera eficácia obrigacional (inter partes) ao gerar um
direito de crédito, bilateral ou unilateral, à celebração do contrato prometido.
Ao partilhar da característica da relatividade, (art. 406º) o direito surgido apenas é
oponível às partes, podendo, em virtude dessa razão, ser posto em causa no caso do
promitente vendedor transmitir o seu direito real a terceiro alheio ao contrato promessa.
Art. 413º
Uma vez verificados estes requisitos a promessa, enquanto não for revogada, declarada
nula ou anulada ou não caducar, prevalece sobre todos os direitos (pessoais ou reais) de
constituição posterior em relação à coisa, tudo se passando, em relação a terceiros,
como se a alienação ou oneração prometida se houvesse realizado na data em que a
promessa foi registada.
Na falta dos requisitos exigidos, o contrato promessa, ainda que valido, terá eficácia
meramente obrigacional.
É especialmente nos casos em que o contrato promessa, podendo ter eficácia real carece
dos requisitos para tal exigidos, que mais se acentua a sua eficácia relativa
(obrigacional).
Os direitos nascidos do contrato não valem contra terceiros, não podem ser opostos a
terceiros, nem destes pode ser exigida qualquer indemnização pela eventual violação da
promessa.
51
Transmissão dos direitos e obrigações dos promitentes
Se para um dos contraentes a promessa cria apenas um direito de crédito, ele poderá
cedê-lo nos termos dos art.577º e SS. Já quando do contrato promessa lhe advenham ao
mesmo tempo direitos e obrigações, como no caso da promessa de compra e venda, ele
poderá ceder a sua posição contratual em conformidade com o art.424º e SS.
Durante muito tempo prevaleceu na doutrina a ideia de que a obrigação de emitir uma
declaração de vontade, nascida do contrato promessa, para ambos os contraentes ou para
um deles, como obrigação de facere que é, constituía um facto incoercível (nemo potest
precise cogi ad factum) e de que à falta de cumprimento do promitente, quando se
verifiquem os pressupostos necessários à responsabilidade do devedor, não poderiam
senão corresponder as sanções previstas na lei ou estipuladas pelos contraentes, (tais
como a perda do sinal, a restituição deste em dobro, uma indemnização pelos danos
sofridos pela contraparte) para a não realização irremediável e insuprível do contrato
prometido.
Por conseguinte, a única, ou pelo menos a principal sanção prevista para o não
cumprimento da promessa de contratar, tal como para o não cumprimento de qualquer
outra obrigação, era a da indemnização do credor pelos prejuízos que ele tivesse havido
em função do incumprimento.
A partir de certo momento, contudo, os autores começaram a distinguir entre
coercibilidade e fungibilidade da prestação a que o promitente faltoso se encontrava
adstrito, e a admitir que o tribunal pudesse suprir a falta de cumprimento, com o
fundamento de que a vontade de estipulação do acto prometido não era uma vontade
livre, antes vinculada, uma vontade de cumprimento.
Dirigida às necessidades do nosso tempo, foi consagrada a actual norma do art.830º.
Nos casos em que haja lugar à sua aplicação, tratar-se-á de uma verdadeira acção
declarativa constitutiva, na qual a parte fiel requer ao tribunal a obtenção de uma
sentença que produza os efeitos da declaração negocial omitida por parte do faltoso, isto
é, que supra a falta de manifestação de vontade da parte ofensora.
Será como se o próprio contrato prometido seja celebrado por via de sentença.
52
A problemática do Sinal (regime inicial do CC de 1966 e regime actual)
2 – Já se o faltoso fosse o contraente que recebera o sinal, ele tinha que restituir à
contraparte o dobro do que ela tivesse prestado, isto é, o dobro do sinal recebido, para
que no fundo a sanção por ele sofrida fosse igual à sanção aplicável ao outro contraente,
quando fosse este o faltoso. (art. 442º nº2, 2ª parte da versão inicial).
Além disso, na nova redacção dada ao art.830º, o legislador (eliminando o antigo texto
do nº2 dessa disposição) deixou de considerar a constituição de sinal e a estipulação de
cláusula penal como presunções de reserva do direito de arrependimento para ambos os
promitentes.
A eliminação desse preceito e a nova definição do campo de aplicação da execução
especifica da promessa (art.830º nº1, redacção de 1980) levaram os nosso tribunais
(esquecendo a redacção do novo art.442º nº2) a considerar admissível o recurso à
execução especifica (por parte do autor do sinal), quer tivesse havido ou não entrega de
sinal (ou estipulação de clausula penal), quer tivesse havido ou não tradição de coisa.
53
Como o direito de retenção goza, inclusivamente de preferência sobre a hipoteca
anterior que onere o (mesmo) imóvel (art.759º nº2) o promitente-comprador passou a
gozar duma tutela manifestamente excessiva e injusta.
Por via deste decreto-lei veio o legislador tentar corrigir a sua intervenção da disciplina
do contrato promessa efectuada pelo DL 236/80. O regime introduzido por aquele DL é
visível, desde logo na segunda sanção prevista no anterior diploma.
Portanto, o sinal consiste numa cláusula acessória dos contratos onerosos, mediante a
qual uma das partes entrega à outra, por ocasião da celebração do contrato, uma coisa
fungível (o Prof. Menezes Leitão propugna pela impossibilidade de o sinal consistir em
uma coisa infungível. Nota o ilustre jurista que, apesar de a lei não restringir
expressamente o sinal a coisas fungíveis, não é de todo em todo concebível que ele
consista numa coisa infungível, pois que não faria sentido, nesse caso, a sanção da sua
restituição em dobro), que pode ter natureza diversa da obrigação contraída ou a
contrair. O sinal funciona, então, como fixação das consequências do incumprimento,
uma vez que se a parte que constituiu o sinal deixou de cumprir a sua obrigação, a outra
parte tem o direito de fazer sua a coisa entregue. Se o inadimplemento partir de quem
recebeu o sinal, tem este que o devolver em dobro (art. 442º nº2 1ª parte). Caso, porém,
se verifique o cumprimento do contrato, a coisa entregue será imputada na prestação
devida – valendo como princípio de pagamento – ou restituída, caso essa imputação não
seja possível (442º nº 1).
No entendimento de Menezes Leitão, o sinal representa um caso de datio rei, pois que
transmite a propriedade com uma função confirmatória-penal, podendo, por isso,
qualificar-se como um contrato real simultaneamente quoad constitutionem e quoad
effectum, uma vez que terá eficácia real e a sua válida constituição necessita de um acto
real (ex. Mútuo, art.1142º).
A lei estabelece uma distinção no regime do sinal, consoante este seja aplicado
genericamente a todos os contratos, ou especialmente ao contrato de promessa. No
entanto o art. 442º não distingue entre estas duas situações, cabendo à doutrina fazê-lo.
Resulta da distinção doutrinária que o disposto no art. 442º nº1 e nº 2 primeira parte se
refere ao regime do sinal em geral (que não importa agora tratar); já o disposto no
442ºnº2 segunda parte incide especificamente sobre o funcionamento do sinal no
contrato de promessa.
54
A ratio da norma do art. 442º nº2 segunda parte reside no facto de, na década de 1980,
se ter verificado um período de forte inflação e especulação imobiliária, com a inerente
desvalorização das quantias em dinheiro e valorização dos bens imóveis. Facilmente se
entende que, a demora na efectivação dos contratos de promessa levava naturalmente a
que deixasse de existir correspondência económica entre o preço estipulado para o
contrato definitivo e a coisa prometida vender. A referida desvalorização pecuniária
acabava por tornar platónica a sanção da restituição do sinal em dobro, uma vez que a
valorização da coisa compensava o pagamento dessa indemnização à contraparte. Por
esses motivos, os promitentes vendedores eram torticeramente levados a incumprir os
contratos de promessa.
O DL 379/86 veio pôr termo à imprecisão verificada no seu antecessor (DL 236/80).
Com efeito, actualmente, o que o promitente-comprador pode exigir, em caso de
incumprimento pelo promitente vendedor, é a valorização obtida pela coisa entre o
momento da celebração do contrato e o momento do não cumprimento; valor que se
obtém subtraindo ao valor actual da coisa o preço convencionado, sendo que a este
montante acresce a restituição do sinal em singelo e da parte do preço que tenha sido
paga (442º nº2 segunda parte).
A promete vender a B e este promete comprar-lhe uma casa pelo preço de 50.000 euros,
pagando B 25.000 euros como sinal, e sendo efectuada a tradição da coisa.
Posteriormente, no entanto, o valor da casa sobe para 200.000 euros. Se A apenas
tivesse que restituir o sinal em dobro, entregaria a B 50.000 euros, e iria ganhar 150.000
euros, através da alienação da casa a terceiro, o que tornaria para ele o incumprimento
do contrato mais vantajoso do que o seu cumprimento.
Portanto, podendo B optar pela valorização da coisa, A teria de lhe pagar o seu valor
actual, com dedução do preço convencionado e restituir-lhe o sinal em singelo, isto é:
200.000 – 50.000 + 25.000 = 175.000 Euros. O que torna desvantajosa a opção pelo
incumprimento.
Nota Menezes Leitão que o regime estabelecido no art. 442º nº2 segunda parte visa,
primacialmente, evitar, nos casos em que houve tradição da coisa, que o funcionamento
tradicional do sinal se torne uma sanção platónica para o promitente vendedor. Trata-se,
pois, de uma disposição excepcional, destinada a corrigir um funcionamento
desvirtuado do sinal, que não pode, por isso, ser aplicada fora desse âmbito.
Caso não exista a constituição de sinal, o caso será diferente, pois que não ficará, o
promitente-comprador, limitado a uma indemnização pré convencionada, podendo
55
exigir quer a execução específica do contrato (art. 830º nº1) quer uma indemnização
pelos prejuízos havidos em virtude do incumprimento (art. 798º).
O art. 442º nº3 primeira parte estabelece que o recurso à execução específica é possível
em qualquer dos casos do número anterior. Com efeito, trata-se de uma disposição
errónea uma vez que nem sempre poderá o contraente não faltoso recorrer àquele
instituto, como aliás estabelece o art. 830º nº2, pois que havendo sinal, presume-se que
as partes efectuam uma estipulação contrária à possibilidade de recurso à execução, só
podendo funcionar quando as partes afastem aquela presunção ou se trate da hipótese
estabelecida no nº 3 do art. 830º.
Portanto, o que o 442º nº3 primeira parte quer referir é que a execução específica é
possível, haja ou não tradição da coisa a que se refere o contrato de promessa.
No caso do art.442º nº3 segunda parte, o legislador consagrou a solução defendida por
Menezes Cordeiro, em face do DL 236/80 e que vai no sentido de admitir que a oferta
do cumprimento da promessa, por parte do faltoso, paralisasse o direito ao aumento do
valor da coisa ou do direito pela outra parte, salvo nos casos previstos pelo art. 808º
(mecanismo qualificado pelo autor como “excepção do cumprimento do contrato de
promessa).
A questão suscitada pelo DL 379/86 (na redacção que deu ao art. 442º nº3) atinente à
exigência do incumprimento definitivo ou, pelo contrário da simples mora na
constituição dos direitos do promitente não faltoso.
A tese da aplicação do 422º nº2 aos casos de simples mora foi defendida pelos
Professores Antunes Varela e Menezes Cordeiro; em sentido contrário, propugnando
pela necessidade do incumprimento definitivo foi o entendimento dos Professores
Galvão Telles e Calvão da Silva.
56
simples mora, valendo esta como renuncia do promitente comprador a desencadear o
mecanismo do sinal em caso de incumprimento definitivo. Neste caso, o promitente-
comprador, ante a mora, avisa o promitente vendedor que caso venha a incumprir
definitivamente a obrigação, não poderá valer-se da estipulação da indemnização
através do sinal.
Perante esta opção, o promitente vendedor tem ainda como alternativa cumprir a
obrigação, a menos que se venha a verificar o incumprimento definitivo, pela perda de
interesse ou pela ultrapassagem suplementar do prazo de cumprimento (art. 808º), caso
em que terá sempre que pagar o aumento do valor da coisa.
Chega-se, desta forma, a uma grande harmonia de soluções. A perda do sinal ou a sua
restituição em dobro pressupõem o incumprimento definitivo (art. 422º nº2). Já a opção
pelo aumento do valor da coisa, na medida em que admita ainda um posterior
cumprimento, pode ocorrer em caso de simples mora. Aliás, esta opção vem referida no
art. 422º nº3 onde também se prevê a execução específica, cujo pressuposto é, como se
sabe a mora e não o incumprimento definitivo.
Cabe agora indagar sobre a natureza deste direito ao aumento do valor da coisa que se
reconhece ao promitente-comprador, que recebeu a tradição da coisa, em caso de
incumprimento da outra parte.
Antunes Varela defende que será uma espécie de sanção pecuniária compulsória, por
outro lado Galvão Telles refere que se trata de uma indemnização compensatória
destinada a ressarcir os prejuízos causados pelo incumprimento, atento o facto de surgir
com a exigência do sinal em dobro.
Para Menezes Leitão o princípio que serve de base a este regime é o da restituição do
enriquecimento injustificado. Efectivamente, perante uma situação em que o promitente
vendedor, tendo antecipadamente realizado a tradição da coisa, se enriqueceria à custa
do promitente comprador através da restituição do sinal em dobro, atenta a valorização
entretanto verificada na coisa entregue, a lei vem determinar que essa valorização possa
ser atribuída ao promitente comprador, em alternativa à indemnização convencionada.
O jurista refuta pois ambas as teses expostas, pois que, a tese defendida por Antunes
Varela esbarra no facto de, uma vez tratando-se de uma sanção pecuniária compulsória o
direito dever-se-ia extinguir sempre que o devedor de dispusesse a cumprir, e tal não se
verifica se estiverem reunidos os pressupostos que ditam a aplicação do art. 808º.
Passamos, por fim à análise das possíveis funções do Sinal no contrato de promessa
57
de sinal, tendo o sinal natureza penitencial, quando a sua estipulação funcione como
convenção contrária à execução específica.
Menezes Leitão propugna pela não consideração do sinal como sendo dotado de
natureza penitencial. Nota o jurista que, mesmo quando a lei admite que aquele vede o
acesso à execução especifica, efectivamente, o sinal só pode ser exigido em caso de
incumprimento definitivo da obrigação pela outra parte, funcionando como
predeterminação das consequências desse incumprimento. Não é, por essa razão, um
preço de arrependimento, não sendo por isso penitencial. Conclui-se, portanto, pela
natureza confirmatório-penal do Sinal.
Pacto de preferência é o contrato pelo qual alguém assume a obrigação de, em igualdade
de condições, escolher determinada pessoa como seu contraente, no caso de se decidir a
celebrar determinado negócio.
De modo geral pode dizer-se que os pactos de preferência são admitidos em relação à
compra e venda (art.414º) e relativamente a todos os contratos onerosos em que tenha
sentido a opção por certa pessoa sobre quaisquer outros concorrentes, art.423º.
Figuras próximas
58
Pacto de preferência VS pacto de opção
Forma
Se a preferência respeita a contrato para cuja celebração a lei exige documento autêntico
ou particular (ex. venda de imóveis), o pacto apenas será válido se constar de
documento escrito assinado pelo obrigado à preferência (visto que a contraparte, o
preferente, não é promitente) o disposto decorre da norma do art.415º que manda aplicar
o disposto no art.410º nº2.
Eficácia da preferência
59
Notificação para preferência (comunicação para preferir), art.416º
- Preço da coisa
- Modalidades de pagamento
- Eventualmente (a menos que exista um dever de sigilo) a pessoa do terceiro.
Como tal, reveste extrema importância a distinção entre notificação para preferência e
proposta contratual.
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Contra quem deve ser intentada a acção de preferência?
Segundo o Prof. Brandão Proença a tese mais acertada é a defendida por Antunes Varela
e Menezes Leitão, esta propugna pela necessidade do litisconsórcio necessário passivo,
isto é, a acção deve ser proposta contra o alienante e o terceiro.
Isto porque, deverá invocar-se o interesse que o obrigado à preferência tem de estar na
acção, sobretudo porque a demanda do preferente foi provocada exactamente pelo
obrigado à preferência.
A solução do litisconsórcio necessário passivo deve ser considerada como a que melhor
corresponde ao pensamento da lei (art. 9º nº3).
A procedência da acção de preferência tem como resultado a substituição do adquirente
pelo autor, com efeito retroactivo, no contrato celebrado.
Pode suceder que o obrigado à preferência pretenda alienar por um preço global, uma
ou mais coisas juntamente com a que é objecto da preferência (art.417º), ou que ele
receba, de terceiro, que pretende adquirir a coisa, a promessa de uma prestação
acessória que o titular do direito de preferência não possa satisfazer (art.418º).
No caso do art.417º nº1 (venda juntamente com outras coisas), não sendo justo agravar
os pressupostos da preferência acordados no pacto, concede-se ao respectivo titular da
preferência, a faculdade de restringir o seu direito à coisa a que o pacto se refere,
reduzindo o preço devido à importância que proporcionalmente corresponde a essa
coisa dentro do preço global estabelecido.
O obrigado pode, contudo, opor-se à separação (art.417º nº1 in fine) das coisas, se ela
envolver um prejuízo apreciável para os seus interesses. Nessa caso o preferente terá de
exercer o seu direito, se o não quiser perder, relativamente ao conjunto das coisas
alienadas, pelo preço global fixado.
61
Caso a prestação seja essencial e não haja intuito fraudulento das partes, a preferência
fica excluída, sem prejuízo da indemnização a que o preferente tenha direito (art.418º
nº1).
Se a prestação acessória, não fraudulenta, for avaliável em dinheiro o preferente que
pretenda exercer o seu direito terá de acrescentar o valor dela ao peço convencionado.
Pluralidade de preferentes
1ª – Aquela em que a preferência deve ser exercida conjuntamente por todos os seus
titulares (caso de dois ou mais herdeiros sucederem ao titular de direito que os
interessados consideram transmissível mortis causa, art.420º) e caso algum dos
interessados não possa ou não queira usar da preferência o direito dos restantes amplia-
se imediatamente a todo o objecto do pacto (fenómeno semelhante ao direito de não
decrescer, art.419º nº1).
2ª – Situação em que a preferência deve ser exercida por um só dos titularese não por
todos em conjunto.
Na falta de critério estabelecido pelo pacto, e caso não exista qualquer outro processo de
graduação dos interessados abrir-se-á licitação entre eles, a partir do preço estipulado,
revertendo o excesso para o alienante (art.419º nº2).
Os contratos em especial (titulo II do livro II, art. 874º e SS) correspondem ao que na
doutrina e também na jurisprudência se chama contratos típicos (ou nominados).
A disciplina específica traçada na lei para cada um dos contratos ditos típicos obedece a
um tríplice objectivo do legislador.
1º - Por se tratarem dos acordos negociais mais valorizados, a lei pretende auxiliar as
partes e os tribunais, fixando subsidiariamente a disciplina jurídica aplicável aos pontos
em que, não obstante a importância que revestem, as convenções das partes são
frequentemente omissas.
62
3º - Na disciplina de cada contrato típico figuram ainda as normas dispositivas, que
constituem o núcleo de longe mais numeroso das disposições reguladoras desse
contrato, em larga medida inspiradas na vontade presuntiva das partes.
Segundo Brandão Proença, contratos típicos são aqueles que, divido às exigências
peculiares da vida societária, estão previstos e regulados na lei.
Tipicidade social – serve para referir os contratos que, embora desprovidos de disciplina
legal, são de tal forma frequentes a ponto da doutrina os ter autonomizado.
Aqueles que as partes criam fora dos modelos traçados e regulados pela lei, ao abrigo
do princípio da liberdade contratual (art.405º nº1).
Os contratos atípicos desempenham uma enorme importância prática, dado
corresponderem a verdadeiras necessidades económico-sociais.
Regime
No que concerne ao seu regime, há que atender, desde logo, ao estatuído pelos
contraentes. Devem ainda aplicar-se os princípios gerais que regem toda e qualquer
contratação e as normas dos contratos típicos que mais se aproximem do contrato em
causa (ex. art. 1156º).
Todo o contrato típico possui uma função económico-social própria que se reflecte
numa estrutura privativa a que na doutrina italiana se dá o nome de causa do contrato e
que constitui o verdadeiro cartão de identidade de cada contrato típico.
Logo, sempre que na convenção celebrada entre as partes se instale um dos modelos
previstos na lei e as clausulas acrescentadas pelas partes não destruam o núcleo
essencial do seu acordo, nem lhe aditem qualquer outro dos esquemas legalmente
63
autonomizados, o contrato continuara a pertencer ao tipo correspondente a esse
esquema. Quando assim não suceda, a convenção negocial das partes entrará já n ovasto
domínio dos contratos atípicos.
Segundo este jurista os contratos podem ser nominados e inominados mas também
típicos e atípicos, senão vejamos:
O contrato dir-se-á nominado quando a lei o reconheça como categoria jurídica através
de um nomen iuris.
Por outro lado, o contrato será inominado quando a lei não o designe através de um
nomen iuris, não o reconhecendo assim nas suas categorias contratuais.
Esta classificação não deverá ser confundida com a distinção entre contratos típicos e
atípicos.
O contrato diz-se típico quando o seu regime se encontra previsto na lei, sendo atípico
quando tal não suceda.
Logo
Sendo que o contrato inominado é sempre atípico. De facto, não julga o jurista ser
possível a lei estabelecer um regime para certo contrato, sem lhe atribuir qualquer
designação, pelo que não poderá haver contratos inominados típicos.
Ex. A compra e venda (art.874º) é um contrato nominado e típico, pois que, além de
possuir um nomen iuris, tem estabelecido um regime jurídico na lei.
64
Em sentido inverso, a hospedagem é um contrato nominado e atípico, visto que, apesar
de a lei o reconhecer como categoria jurídica (art.755º al.b)) não estabelece qual o seu
regime.
Caso as partes celebrem um contrato que a lei desconheça por completo, tratar-se-á de
um contrato inominado e atípico.
Contratos Mistos
Denomina-se de contrato misto aquele que reúne em si regras de dois contratos total ou
parcialmente típicos (art.405 nº2).
Segundo Menezes Leitão, o contrato misto assume-se como contrato atípico, visto não
corresponder integralmente a nenhum tipo contratual regulado por lei.
Contratos mistos stricto sensu – aqueles contratos em que é usada uma estrutura
própria de um tipo contratual para preencher um função típica de outro tipo contratual.
Ex. A vende a B uma casa pelo preço de 1000 Euros. A estrutura utilizada é típica do
contrato de compra e venda (transferência de um direito contra um preço), mas o preço
é tão baixo que assume cariz meramente simbólico, desempenhado por isso o contrato a
função própria da doação (realização de uma liberalidade).
65
Em sede de contratos mistos coloca-se frequentemente a questão de saber qual o regime
que lhes deve ser aplicado, uma vez que as partes, ao reunirem no mesmo contrato
regras de dois ou mais negócios total ou parcialmente regulados na lei, provocam
sempre um conflito de regimes legais potencialmente aplicáveis.
Teoria da absorção – esta teoria defende que o conflito de regime deve ser resolvido
pela opção a favor de um único regime contratual; o que se pudesse considerar
dominante, e que absorveria as regulações respeitantes aos outros tipos contratuais.
Teoria da combinação – esta sustenta que o conflito entre regimes não deve ser
resolvido pela opção a favor de um deles, antes se deve realizar um aplicação
combinada dos dois regimes.
Teoria da analogia – esta teoria vem sustentar que o conflito de regimes contratuais
deve implicar a não aplicação de qualquer deles, configurando-se por isso o contrato
misto como um contrato integralmente atípico, não regulado por qualquer tipo
contratual, mas apenas pela parte geral do direito das obrigações; sendo as questões do
seu regime consideradas como lacunas na lei a resolver através da integração analógica,
com base na norma mais próxima em termos de situação de interesses e fim da lei.
Esta tem hesitado sobre a solução aplicável. Galvão Telles sustenta que os contratos
múltiplos ou combinados e os contratos de tipo duplo ou geminados se deveriam reger
pela teoria da combinação. Já ou contratos mistos stricto sensu (cumulativos) e os
contratos complementares se deveriam reger pela teoria da absorção.
Por outro lado, Antunes Varela, propugna que, sempre que a lei não estabeleça um
regime para o contrato misto, não será de estabelecer uma solução em abstracto, antes
havendo que ponderar em concreto, perante cada contrato misto se o seu regime deveria
ser estabelecido através da absorção ou da combinação.
Já Almeida Costa faz apelo aos critérios de integração dos negócios jurídicos (art.239º)
mas sustenta que deve ser em primeiro lugar averiguada a possibilidade de aplicação
analógica da disciplina de algum ou alguns contratos típicos (teoria da analogia).
Menezes Cordeiro, por seu turno, defende uma aplicação menos rígida da solução
proposta por Galvão Telles, entendendo, à semelhança de Antunes Varela, que a
ponderação concreta de cada contrato misto poderá ditar uma solução diferente da
resultante daquele modelo abstracto.
66
No entender de Menezes Leitão, apenas a teoria da analogia deve ser liminarmente
afastada.
Efectivamente, defender a exclusão simultânea da aplicação das regras dos dois regimes
implica desvirtuar a natureza do contrato misto, que passa a ser considerado um
contrato totalmente atípico, o que não corresponde à sua natureza, que é antes a da
reunião de regras de dois negócios total ou parcialmente típicos.
Menezes Leitão refere como sendo três as possíveis formas da união contratual.
União externa – fala-se nesta modalidade quando a ligação entre os diversos contratos
resulta apenas da circunstância de serem celebrados ao mesmo tempo, já que as partes
não estabeleceram qualquer nexo de dependência entre os diferentes contratos.
Ex. A afirma que apenas compra determinado computador se lhe for também vendida a
impressora X.
67
O Subcontrato
Nos contratos, a produção dos efeitos jurídicos resulta da livre decisão das partes ao
abrigo da autonomia privada. Consequentemente, qualquer destes tipos de eficácia
jurídica pode ser estipulado, podendo, por essa razão, falar-se em contratos
constitutivos, modificativos, transmissivos ou extintivos de direito e obrigações.
Para Menezes Leitão a mais importante classificação dos contratos
E a que distingue os contratos consoante o tipo de situações jurídicas a que dão origem.
Os contratos reais (quoad effectum) colocam um problema particular, uma vez que
pode suceder que a sua eficácia não seja imediata, o que sucede sempre que não estejam
preenchidos, no momento da celebração do contrato, os requisitos necessários para que
o contrato dê origem a uma situação jurídica de natureza real.
Note-se, antes de avançar-mos que os contratos reais que aqui analisamos são-no porque
têm eficácia real (quoad effectum) e não pelo facto de a sua perfeição necessitar de um
acto real de entrega (quoad constitutionem), como por exemplo os contratos de
comodato (art.1129º) de mutuo (art.1142º) e de depósito (art.1185º).
A regra geral é a de que a transmissão de direitos reais sobre coisa determinada ocorre
por mero efeito do contrato (art.408º nº1), consagra-se assim, o principio consensus
parit proprietatem, também chamado de sistema do titulo, isto significa precisamente
que a transmissão dos direitos reais ocorre apenas em virtude do próprio contrato, não
ficando dependente de qualquer acto posterior, como a tradição da coisa ou o registo.
68
Daqui resulta a importante consequência de que o adquirente da coisa, sendo
considerado proprietário a partir do momento da celebração do contrato sofre o risco da
sua perda ou deterioração a partir desse momento (art.796º nº1).
No entanto, esta transmissão da propriedade no momento da celebração do contrato
apenas ocorre relativamente a coisas que já possuam os requisitos necessários para,
sobre elas ser constituído um direito real, que só pode incidir sobre coisas presente,
determinadas e autónomas de outras coisas.
Caso as coisas ainda não possuam esses requisitos, refere-nos o art.408. nº2 que a
transferência da propriedade á diferida para momento posterior ao da celebração do
contrato.
69
A reserva de propriedade, art.409º (pactum reservati dominii)
Vaz Serra nota que a cláusula de reserva de propriedade não se confunde com a
promessa de venda, na qual os contraentes se obrigam a celebrar futuramente um venda.
Na reserva de propriedade, o contrato de alienação não carece já de nenhuma declaração
futura, apenas um dos seus efeitos fica diferido por vontade das partes, mas a produção
desse efeito dá-se logo que o evento previsto se verifica, independentemente de
qualquer nova declaração dos contraentes.
Com efeito é uma cláusula que naturalmente há-de convir, por excelência, às vendas a
prestações e às vendas com espera de preço.
Mais, a lei, para facilitar a transmissão dos bens e evitar que esta seja revertida, vem,
através ao art.886º, retirar ao vendedor a possibilidade de resolução do contrato por
incumprimento da outra parte (art.801º nº2), a partir do momento em que ocorra a
transmissão da propriedade e a entrega da coisa.
70
A clausula de reserva de propriedade pode ser celebrada em relação a quaisquer bens,
no entanto, a lei dispõe que, no caso de bens imóveis ou movei sujeitos a registo, só a
clausula constante do registo é oponível a terceiros (art.409º nº2).
Nos restantes casos não será exigida qualquer publicidade, para se poder opor a reserva
a terceiro, mesmo estando este de boa-fé e tenha obtido a propriedade por transmissão
do adquirente sob reserva.
Parece-nos que a existência de registo não deva ser requisito do exercício da cláusula de
reserva, pois que admitir essa dependência era atentar à própria natureza da cláusula de
reserva de propriedade.
A cláusula de reserva implica assim que, por acordo entre vendedor e comprador, a
transmissão da propriedade fique diferida para o momento do pagamento integral do
preço.
A função desse acordo não é, porém, permitir ao vendedor a continuação do gozo sobre
o bem (uma vez que este é entregue ao comprador) mas apenas defender o vendedor das
eventuais consequências do incumprimento do comprador.
Por outro lado, em caso de inadimplência por parte do comprador, o vendedor continua
a poder resolver o contrato nos termos do art.801º nº2, visto que a exclusão deste direito
pelo art.886º só se verifica se tiver ocorrido a transmissão da propriedade da coisa.
Ora para Menezes Leitão, a solução de que o vendedor, na venda com reserva de
propriedade, suporta o risco pela perda ou deterioração da coisa, mesmo após a entrega
ao comprador é claramente inaceitável, uma vez que a partir da entrega, o comprador
fica já integralmente investido nos poderes de uso e fruição da coisa, servindo a
71
manutenção da propriedade no vendedor apenas para assegurar a recuperação do bem,
em caso de não pagamento do preço.
Ora, devendo o risco correr por conta de quem beneficia do direito, parece claro que, a
partir da entrega, é por conta do comprador que o risco deve correr, não ficando este
exonerado do pagamento do preço em caso de perda ou deterioração fortuita da coisa.
Como tal, segundo Menezes Leitão, a qualificação da reserva de propriedade como
condição suspensiva deve ser rejeitada.
Não há assim qualquer condição, antes uma alteração da ordem de produção dos efeitos
negociais. Sem a reserva, a transmissão da propriedade ocorre antes do pagamento do
preço. Com a reserva, ela passa a ocorrer posteriormente a ele.
Como tal, não pode considerar-se o comprador como mero detentor, uma vez que a
celebração da compra e venda torna-o possuidor em nome próprio.
Esta expectativa real atribui-lhe, assim o poder de fruir a coisa, apenas lhe estando
vedada a sua disposição por tal ser incompatível com a função de garantia visada com a
conservação da propriedade no vendedor.
Distribuição do risco
Assim, tanto o vendedor como o comprador são titulares de situações jurídicas reais,
havendo que distribuir o risco de acordo com o proveito que cada um tirava da
respectiva posição jurídica.
Como o vendedor conservava apenas a propriedade com função de garantia, deve
apenas suportar o risco da perda dessa garantia. Pelo contrário, como o comprador já se
encontrava a tirar todo proveito da coisa, é a ele que competirá suportar o risco pela sua
perda ou destruição.
72
Efeitos dos contratos relativamente a terceiros
Como sabemos, a regra é a de que terceiros, alheios ao contrato, não são por ele
beneficiados e, por maioria de razão, também não serão prejudicados, altere stipulare
nemo potest (art.406º nº2).
Como tal, o contrato terá, em princípio, eficácia inter partes.
No entanto configuram-se algumas excepções a esta regra. Desde logo os contratos com
efeitos favoráveis directos (contrato a favor de terceiro), os contratos com efeitos
favoráveis reflexos (contrato com eficácia de protecção para terceiro) e ainda os
contratos com efeitos desfavoráveis (contrato promessa ou pacto de preferência, dotados
de eficácia real).
Cumpre, desde já, assinalar a diferença deste instituto face ao que a seguir será objecto
de estudo (o contrato a favor de terceiro)
No contrato com eficácia de protecção para terceiro, ao invés do que sucede no contrato
a favor de terceiro, não pode o terceiro abrangido exigir a prestação ao devedor, isto é,
através deste contrato não se confere a terceiro qualquer direito a uma prestação.
No entanto, legitimam um pedido indemnizatório se o devedor violar certos deveres
laterais de cuidado.
Para Mota Pinto, terceiros são aqueles que estão envolvidos (por força da sua situação
face ao credor, e da sua proximidade com a prestação) no círculo do contrato.
Note-se ainda que os perigos ligados a certa prestação podem afectar esses terceiros tão
fortemente como ao credor.
O contrato a favor de terceiro (art.443º e SS) pode ser definido como o contrato, através
do qual, uma das partes (o promitente) se obriga perante outra (o promissário) a efectuar
uma atribuição patrimonial em benefício de outrem, estranho ao negócio (o terceiro
beneficiário)
Refere Vaz Serra que o benefício do terceiro nasce directamente do contrato e não de
qualquer acto posterior, no entanto, o seu nascimento pode ser diferido para momento
subsequente, tal pode ocorrer por estipulação das partes ou determinação legal (art.451º
nº1).
73
Menezes Leitão nota que a atribuição patrimonial a realizar pelo promitente é
determinada pelo promissário, que tem de ter, em relação a ela, um interesse digno de
protecção legal (art.443º º1).
74
A lei segue a teoria do incremento, nos termos da qual a aquisição do terceiro se verifica
imediatamente em virtude do contrato celebrado entre promitente e promissário,
dispensando-se qualquer outra declaração negocial para esse efeito.
A lei prevê ainda a possibilidade de o terceiro aderir à promessa (art.447º nº1), esta
situação não se dirige a possibilitar ao terceiro adquirir o direito, pois que este é
adquirido automaticamente. A sua função é antes impedir a revogação da promessa, o
que pode ocorrer até a adesão ser manifestada (art.448º nº1).
Em principio essa revogação compete ao promissário. Poderá, eventualmente, necessitar
do consentimento do promitente se verificada a hipótese prevista no nº2 do art.448º.
Não obstante o que foi dito, caso o terceiro manifeste a sua adesão, pode a promessa,
ainda assim, ser revogada pelo promissario, isto se verificado o previsto no art.448º nº1
in fine, isto é, no caso de a promessa dever ser cumprida após a morte do promissario,
ou ainda, caso se trate de um liberalidade, se se verificarem os pressupostos da
revogação por ingratidão do donatário (art.450º nº2 e 970º).
75
Teoricamente a diferença entre as duas situações é a de que, na primeira, caso o terceiro
morra antes do promissario, os seus herdeiros o sucederem no seu direito sobre o
promitente.
No segundo caso, essa sucessão já não se verifica uma vez que o terceiro quando
morreu ainda não era titular de qualquer direito que pudesse transmitir aos seus
herdeiro, pelo que este só poderiam adquirir a prestação com base no próprio contrato a
favor de terceiro, ou seja, se também tivessem sido designados beneficiários a titulo
subsidiário.
A lei vem presumir que a estipulação das partes é no sentido de que o terceiro só
adquire o direito com a morte do promissario (art.451º nº2).
Normalmente qualquer uma destas presunções pode ser ilidida (art.350º nº2), através da
estipulação de qua a celebração do contrato faz adquirir imediatamente o direito,
determinando a morte do promissario apenas o vencimento da obrigação; ou através da
estipulação que só o terceiro (e não os seus herdeiros) poderá beneficiar da promessa.
Figuras próximas
O contrato a favor de terceiro não se confunde com o contrato realizado por meio de
representação, embora tenham alguns pontos de semelhança, nomeadamente o serem
ambos realizados no interesse de outrem, que não os directos intervenientes no contrato.
A pessoa que no instituto da representação fica fora das operações contratuais (o
representado) é o verdadeiro contraente, o titular da posição jurídica que decorre do
contrato, não é terceiro.
76
O contrato a favor de terceiro também se distingue do contrato realizado em nome
próprio, mas por conta de outrem (mandato sem representação, art.1180º e SS).
No caso do mandato sem representação nenhum direito nasce directamente do contrato
para terceiro; só numa fase ulterior, em cumprimento da relação de mandato, o
mandante tem o direito de exigir do mandatário (e do outro interveniente) a transmissão
dos direitos e obrigações que advieram deste, mas nessa altura assume toda a posição do
contraente, e não apenas a titularidade de um direito derivado de um contrato.
Também não há contrato a favor de terceiro quando o credor se limita a autorizar que a
prestação seja entregue a terceiro, que fica encarregue de a receber (art.770º Al. a)), ou
se reserva o direito de exigir que a prestação seja efectuada a terceiro.
Nestes casos, não há a intenção de atribuir ao terceiro um direito à prestação, ao invés
do que sucede no contrato a favor de terceiro.
Este é desde logo celebrado em nome próprio, ainda que em pro amico electo.
O contrato para pessoa a nomear é o contrato em que uma das partes se reserva a
faculdade de designar um outra pessoa que assuma a sua posição na relação contratual,
como se o contrato tivesse sido celebrado com esta última.
O Prof. Brandão Proença nota que, sendo um contrato realizado em nome próprio,
embora em pro amico electo, e com obediência básica a uma finalidade representativa,
surge com frequência no clausulado do contrato promessa.
Esta cláusula para pessoa a nomear é distinta da cláusula em que um contraente consinta
previamente na cessão da posição contratual do promitente-comprador.
Antunes Varela nota que não há, no contrato para pessoa a nomear, nenhum desvio ao
princípio da eficácia relativa (inter partes) dos contratos (art.406º nº2).
O contrato para pessoa a nomear produz todos os seus efeitos apenas entre os
contraentes. Só que enquanto não há designação do amicus electus os contraentes são os
outorgantes no contrato. Depois da designação o contraente passa a ser, de acordo com o
conteúdo do contrato, a pessoa designada (art.455º nº1).
Figuras próximas
1 - O contrato para pessoa a nomear não se identifica com o negócio celebrado por meio
de representante.
O negocio por meio de representação, segundo a vontade das partes, produz
imediatamente os seus efeitos na esfera jurídica do representado, ao passo que o
contrato para pessoa a nomear começa por produzir os seus efeitos em relação ao
interveniente no negocio, e apenas pode vir a produzi-los na esfera de outrem, que não
figura no acto como representado.
77
2 - Diferente é também o negócio feito por um dos intervenientes em nome da pessoa
que posteriormente se designará. Neste caso, o interveniente não é contraente, e o
negocio só produzira efeitos em relação à pessoa prevista se for por esta ratificado, ou
se o interveniente tiver, de facto, poderes de representação.
Não há, em qualquer dos casos, a alternatividade potencial de sujeitos que caracteriza o
contrato para pessoa a nomear (art.455º nº1 e 2).
Menezes Leitão nota que no caso do contrato para pessoa a nomear admite-se uma
dissociação subjectiva entre a pessoa que celebra o contrato e aquela onde vão
repercutir-se os respectivos efeitos jurídicos.
Na verdade, efectuada a nomeação, os efeitos do contrato vão repercutir-se directamente
na esfera do nomeado.
Não ocorre por isso qualquer transmissão entre o nomeante e o nomeado. Dá-se antes
um fenómeno de substituição de contraentes, uma vez que, após a nomeação, o
contraente nomeado adquire os direitos e assume as obrigações provenientes do contrato
a partir do momento da celebração dele (art.455º nº1).
A nomeação tem assim eficácia ex tunc, tudo se passando como se o nomeado fosse
parte no contrato desde o seu início.
78
Regime
Para produzir os seus efeitos, a nomeação deve observar determinados requisitos legais,
são eles:
1º - Deve ser feita por escrito ao outro contraente no prazo convencionado, ou na falta
de convenção, dentro de cinco dias a contar da data de celebração do contrato (art. 453º
nº1).
Menezes Leitão não encontra justificação lógica para esta solução. Nota o jurista que,
ao celebrar o contrato para pessoa a nomear, o contraente originário celebra o negócio
em nome próprio, não tendo que indicar o terceiro, pelo que não chega a exercer
quaisquer poderes representativos. Esse exercício só vem a ocorrer quando o terceiro é
nomeado, não se vendo, por isso, qual o fundamento para afastar a possibilidade de
utilizar para esse efeito uma procuração posterior à celebração de contrato.
A ratificação, no caso do contrato para pessoa a nomear constitui uma exigência
dispensável, já que não tendo sido exercidos até à altura, poderes representativo, não há
necessidade de proceder à sua atribuição retroactiva para se exercer a nomeação.
Natureza jurídica
Como faz notar Antunes Varela, é esta a tesa mais realista, porquanto se considere a
cláusula para pessoa a nomear como uma condição do contrato: de efeito resolutivo,
quanto à titularidade do interveniente; de efeito suspensivo, quanto à aquisição da
pessoa nomeada.
Galvão Telles refere que a condição não respeita propriamente aos efeitos na sua
objectividade, antes à pessoa do seu destinatário. Por isso se pode dizer com Cariota-
Ferrara, que o contrato para pessoa a nomear tem, quanto a uma das partes dois
sujeitos em alternativa.
79
Conclui-se pois, e no seguimento de Menezes Leitão que: a classificação como
representação anónima é duplamente incorrecta, pois que:
Também a doutrina que propugna pela consideração do contrato para pessoa a nomear
como contrato a favor de terceiro não procede. Com efeito, o objecto do contrato para
pessoa a nomear não é a atribuição de um benefício ao nomeado, pelo que a sua
aquisição não opera automaticamente como no contrato a favor de terceiro (art.444º
nº1), mas depende da sua vinculação voluntária ao contrato por procuração ou
ratificação (art.453º nº2).
Caducidade – esta opera ipso iure (automaticamente) por força da própria lei, isto, por
estar tendencialmente ligada ao decurso de um prazo ou outro evento objectivo
(impossibilidade superveniente).
Não tem força indemnizatória e, em principio, efeitos retroactivos. Provoca a extinção
do direito.
80
Negócios Unilaterais
Portanto:
Para que haja o dever de prestar e o correlativo poder de exigir a prestação, fora dos
casos em que a obrigação nasce directamente da lei (como sucede na gestão de negócios
no enriquecimento sem causa e na responsabilidade civil) é necessário o acordo entre o
devedor e o credor, duorum in idem placitum consensus.
Antunes Varela nota que basta considerar-mos o caso da doação para se confirmar o
acerto da ideia.
Com efeito, na doação, acto que se presta de modo especial à concepção de uma
vinculação fundada na exclusiva vontade do obrigado (visto dele nascerem apenas
benefícios para a outra parte) a lei exige, em termos expressos, a aceitação do donatário
como elemento constitutivo do negócio.
Justificação do principio
Antunes Varela refere que a explicação que mais é referida (para lá da razão histórica
fundada na tradição romanística) é a de que, não sendo razoável impor a quem que seja
um beneficio, contra a sua vontade (invito beneficium non datur) , não faria sentido que
na esfera jurídica do destinatário da declaração unilateral de vontade se criasse um
direito de crédito sem previa aceitação dele.
No entanto, e tal como referem Antunes Varela e Menezes Leitão, bastaria, para
acautelar a susceptibilidade do destinatário do negocio unilateral, reconhecer-lhe a
possibilidade de rejeitar o beneficio, quando, por qualquer razão não quisesse aceita-lo,
solução que aliás vigora no contrato a favor de terceiro, como nota Menezes Leitão.
Logo, não seria essencial condicionar o nascimento do crédito à prévia aceitação do
credor, pois que poderia este, extingui-lo mediante a comunicação da sua rejeição.
81
Os casos de irrevogabilidade da proposta e de aceitações presuntivas ou tacitas
como rompimento ou não do principio do contrato.
Como refere Brandão Proença, são acto que não quebram o principio do contrato, pois
são condutas declarativas que não geram obrigações mas criam apenas a presunção da
existência de um fonte causal – a chamada relação fundamental subjacente – sendo esta,
como nota Antunes Varela, a verdadeira fonte da obrigação.
Efeitos práticos destas declarações unilaterais são apenas o facto de ficar o credor
eximido da prova da existência da causa debendi, recaindo sobre o devedor (ou seus
herdeiros) o ónus de provar a inexistência, invalidade, extinção ou a carência de
fundamentos da relação fundamental.
82
Caso o devedor ou os seus herdeiros provarem um daqueles casos, a obrigação cai, não
lhe servindo de suporte bastante nem a promessa de cumprimento nem o
reconhecimento da divida.
Considerando o disposto, tem-se como válido que, em regra, o negócio unilateral não é
fonte de obrigações. No entanto existem excepções.
Noção – diz-se promessa pública a declaração feita mediante anúncio divulgado entre
os interessados, na qual o autor se obriga a dar uma recompensa ou gratificação a quem
se encontre em determinada situação ou pratique certo facto, positivo ou negativo.
A lei determina que essa situação implica imediatamente e sem necessidade de aceitação
do beneficiário, a vinculação do promitente a essa promessa (art.459º nº1).
Portanto, a promessa publica é um negocio unilateral constitutivo de obrigações não se
confundindo, por isso, com outras declarações negociais dirigidas ao publico (art.230º
nº3) estas apresentam-se como partes integrantes do processo de formação de um
contrato sendo que, apenas com a conclusão daquele se constituem obrigações.
Uma vez emitida, a declaração tem como efeito a constituição imediata de uma
obrigação, ficando o promitente desde logo vinculado à promessa (art.459º nº1), mesmo
ignorando quem é o beneficiário, que só virá a ser determinado posteriormente.
Está-se por isso, perante uma obrigação de sujeito activo indeterminado mas
determinável (art.511º), vindo a ocorrer essa determinação quando se souber quem se
encontra na situação prevista ouvem a praticar o referido facto.
Antunes Varela demonstra que o traço essencial da promessa publica, como declaração
unilateral, reside menos na sua irrevogabilidade do que no facto de a constituição da
obrigação prescindir da aceitação do credor – nascendo directamente da declaração do
promitente e não do facto ou situação a que a prestação prometida se refere.
Salvo declaração em contrario, não são excluídos da atribuição do direito, aqueles que
se encontrem na situação prevista ou tenham praticado o facto sem atender à promessa
ou na ignorância dela.
83
Caso a promessa não fixe um prazo de validade apenas se pode extinguir por revogação
(art.460º) sendo que esta é igualmente possível nas promessas com prazo estipulado,
caso exista causa justa para a revogação (art.461º nº1).
Concursos públicos
1º - Existência de um enriquecimento
2º - À custa de outrem
3º - Sem causa justificativa
Então, sempre que se verificasse a cumulação destes requisitos seria possível interpor
uma acção a exigir a restituição do enriquecimento sem causa.
No entanto, como faz notar Menezes Leitão, o problema é que esses requisitos são tão
amplos e genéricos que seria possível efectuar uma aplicação indiscriminada desta
cláusula geral, colocando em causa a aplicação de uma série de outras regras de direito
positivo.
Por esse motivo o legislador veio a consagrar a subsidiariedade do instituto (art.474º).
Esta norma (art.474º) pretende estabelecer que a acção de enriquecimento seja o ultimo
recurso a utilizar pelo empobrecido.
Estar-lhe-á, por isso, vedada a sua utilização no caso de possuir outro fundamento para
uma acção de restituição (como em caso de invalidade ou resolução do contrato), no
caso de a lei pretender que a aquisição à custa de outrem seja definitiva (usucapião,
prescrição) ou quando a lei atribui outros efeitos ao enriquecimento sem causa (como a
modificação do contrato, em caso de usura ou alteração das circunstancias).
84
As deslocações patrimoniais como campo de aplicação do enriquecimento sem
causa
Ex. Contrato bilateral em que uma das prestações já tenha sido efectuada, quando a
outra se tornou impossível (art.795º nº1).
Outras vezes, porém, o enriquecimento provirá de um acto jurídico não negocial, como
o pagamento, ou de um simples acto material, como os que integram a cada passo a
gestão de negócios.
Para abranger todos estes casos, sabido que eles so podem interessar à obrigação de
restituir quando criem uma vantagem de carácter patrimonial para o respectivo
destinatário, dir-se-ia que o campo de aplicação do enriquecimento sem causa reside nas
atribuições patrimoniais.
85
No caso do cumprimento junto do credor aparente, a deslocação viciada assenta na
prestação efectuada pelo devedor; é esta prestação que a restituição atinge, não para a
reconduzir ao património de onde ela saiu, mas ao do terceiro lesado (credor real).
(a completar)
A gestão de negócios
Figuras próximas
A gestão também não se confunde com o contrato a favor de terceiro; quer porque
também cria direitos do gestor em relação ao beneficiário, quer porque o benefício deste
se obtém por forma diferente da que é própria do contrato a favor de terceiro.
Interesse pratico
Por um lado a intervenção do gestor assente quase sempre numa atitude de altruísmo
moralmente louvável, de benemerência ou de autentica solidariedade humana pode ter
uma utilidade apreciável na conservação ou na exploração de bens que, de outro modo,
correriam o risco de perder-se, deteriorar-se ou manterem-se improdutivos, ou na
realização de actos cuja omissão poderia acarretar prejuízos irreparáveis.
Por outro lado a gestão nasce de um facto em princípio ilícito, constitui uma intromissão
não autorizada na esfera jurídica alheia que além de constituir um abuso, pode causar
prejuízo sério ao dono do negocio e que por estas razões, nem sempre será do agrado
deste.
Com efeito, culpa est immicere se rei al se non pertinent.
86
Requisitos da gestão de negócios.
Caso estejam em jogo interesses alheios que o gestor, erroneamente supõe serem seus,
também não há verdadeira gestão. Esta pressupõe não só a existência, mas também a
consciência e a vontade de dirigir negócio alheio.
O interesse é alheio, quando a necessidade que o acto visa satisfazer é de outrem e não
do próprio agente.
Aquele que age no seu interesse exclusivo pode fazê-lo por supor erroneamente que o
negocio lhe pertence – e neste caso, caso a gestão não seja aprovada pelo dono do
negocio, poderá haver recurso às regras do enriquecimento sem causa (art.472º nº1) –
ou fá-lo conscientemente (gestão imprópria ou falsa gestão) gerindo negocio alheio no
interesse próprio, ou seja, na intenção de carrear para o seu património os proveitos da
intromissão na esfera jurídica de outrem, ou sem se preocupar com a fixação da
fronteira entre os negócios próprios e os negócios alheios. Também neste caso não
recorremos às regras deste instituto, antes à responsabilidade civil, senão penal.
87
É essencial, portanto, que a actividade do gestor se destine a proteger um interesse
alheio, a satisfazer uma necessidade de outrem, não bastando para tal o conhecimento
de estar em jogo um interesse de terceiro.
Com efeito, havendo uma causa pela qual o agente esteja obrigado ou autorizado a
intervir no negócio alheio, os direitos e obrigações entre as partes são os derivados
dessa relação e não os do instituto da gestão.
Já se o agente supuser erroneamente que tem o dever de intervir, haverá lugar à
aplicação das regras da gestão, visto a actuação dele preencher os requisitos essenciais
da actividade do gestor.
Deveres do gestor
88
O dever de continuação da gestão terá, além do mais, a vantagem de afastar as
intromissões fáceis, precipitadas, em assuntos alheios.
O gestor deve orientar-se, na sua actuação, por aquilo que faria o dono do negócio, e
não por aquilo que provavelmente faria um proprietário perspicaz e diligente (bom pai
de família).
Pelo carácter espontâneo e altruísta da acção do gestor, pela gratuitidade normal da
actividade que ele despende, pelos riscos a que desnecessariamente se expõe, afigura-se
injusto exigir dele que ponha na direcção de interesses alheios maior zelo, diligencia e
aptidão do que na gestão do seu próprio património.
Por isso mesmo, na falta de indicação em contrario, deve aceitar-se neste ponto a tese da
culpa in concreto, muito embora se não possam desprezar as circunstâncias objectivas
em que o gestor iniciou ou desenvolveu a sua actividade.
É evidente que na actuação exigível do gestor, conforme com o interesse e a vontade
real ou presumível do dono do negocio cabem não só os deveres de prestação, mas
também os deveres acessórios de conduta, nomeadamente os chamados deveres de
protecção.
Ex. O gestor pensa, com fundadas razões, que a cultura mais rendosa a introduzir no
campo do vizinho seria a da vinha; mas sabes que o dono nunca a plantaria.
- A actuação do gestor será regular (isenta de culpa), se ele praticar um acto contrário à
vontade (real ou presumível) do dono do negócio, mas conforme ao interesse deste,
desde que a conduta (omissão) desejada pelo dominus seja contrária a lei, ordem pública
ou bons costumes (art.465º al a)).
- A conduta do gestor será igualmente regular, se ele omitir o acto ilícito que o dono
praticaria e optar pelo acto lícito que mais favorece os seus interesses.
89
O gestor deve abster-se de todos os actos que saiba ou presuma serem contrários à
vontade real ou presumível do dono, por mais favoráveis que fundadamente os julgue às
conveniências do interessado. Como deve renunciar aos actos que o dono não deixaria
de praticar, se tiver razões ponderosas para os considerar lesivos dos interesses em
causa.
Resumindo:
- Abstenção dos actos que, com pleno conhecimento de causa, o dono do negocio não
praticaria, por mais favoráveis que sejam aos seus interesses.
- Abstenção dos actos que o dono praticaria, mas que sejam condenados por um
judiciosa ponderação dos seus interesses.
- Pratica dos actos favoráveis que o dominus só não queria realizar por ignorância de
certos factos, conhecidos pelo gestor (art.1162º)
Com o dever de entrega dos valores obtidos, nos termos em que a lei o define, anda
estritamente associado um outro dever: o da prestação de contas (art.465º al e))
Deveres do dono do negocio para com o gestor (actio negotium gestorum contraria)
Pode haver aprovação sem ratificação, caso o dono não queira contestar os direitos
atribuídos por lei ao gestor, mas não se dispuser a chamar a si algum ou alguns dos
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negócios que este celebrou em seu nome; tal como pode haver ratificação sem
aprovação, se o dono quiser chamar a si os negócios que o gestor realizou em seu nome,
ou alguns deles, mas entender que aquele não respeitou a sua vontade ou não agiu em
conformidade com os seus interesses.
Responsabilidade civil
Cabe desde logo, e seguindo Antunes Varela, referir que na rubrica da responsabilidade
civil cabe tanto a responsabilidade proveniente da falta de cumprimento de obrigações
emergentes dos contratos, de negócios unilaterais ou da lei – responsabilidade
contratual – (nota o autor que a designação de responsabilidade contratual não é
inteiramente correcta, porquanto a obrigação de reparar o dano por ela abrangida nem
sempre resulta da violação de um contrato) como a resultante da violação de direitos
absolutos ou da pratica de certos actos, que embora lícitos, causam prejuízo a outrem –
responsabilidade extracontratual.
Por um lado, elas podem nascer do mesmo facto e transitar do domínio de uma para a
esfera normativa própria da outra. Por outro lado, é bem possível que o mesmo acto
envolva para o agente (ou omitente), simultaneamente, responsabilidade contratual (por
violar uma obrigação) e responsabilidade extracontratual (por infringir ao mesmo tempo
um dever geral de abstenção ou o direito absoluto correspondente), tal como é possível
que a mesma ocorrência acarrete para o autor, quer responsabilidade civil, quer
responsabilidade criminal, consoante o prisma sob o qual a sua conduta seja observada.
91
Responsabilidade por factos ilícitos, responsabilidade pelo risco e responsabilidade
por factos lícitos danosos.
Nota Antunes Varela que a tendência dos últimos tratadistas vai no sentido de alargar o
espectro de actuação da responsabilidade fundada no risco e na prática de factos lícitos
que, aproveitando a determinadas pessoas, causem prejuízos a outras.
Aqueles propugnam, ainda, pela ampliação dos seguros sociais, capazes de proverem à
reparação dos danos provenientes de actos (humanos) não culposos e de circunstancias
fortuitas ou de força maior ou dos casos em que o autor do facto ilícito danoso seja
desconhecido ou careça de meios para pagar a reparação.
O CC reconheceu expressamente as duas formas de responsabilidade extracontratual,
dando foros de autonomia à responsabilidade pelo risco (epigrafe da subsecção II do
CC), que tratou em subsecção própria, atendendo ao nexo especial de imputação em que
ela assenta.
Delimitou o campo de aplicação de uma e outra, mas não deixou de assinalar o carácter
excepcional da responsabilidade que não se baseia na culpa do agente ao afirmar nos nº
1 e 2 do art.483º que “só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa
nos casos especificados na lei”.
É necessário, desde logo, que haja um facto voluntário do agente, isto é, um acto
controlado pelo agente e não um mero facto natural causador de danos, pois só o
homem, como destinatário dos comandos emanados pela lei, é capaz de violar direitos
alheios ou agir contra disposições legais.
Esse facto tem de violar ilicitamente, isto é, tem de infringir objectivamente qualquer
das regras disciplinadoras da vida social. Portanto, é ilícita a conduta que viole direitos
absolutos ou interesses alheios tutelados por disposição legal.
Em 3º lugar terá de existir um nexo de imputação do facto ao lesante, seguidamente é
indispensável que à violação do direito subjectivo ou da lei sobrevenha um dano, pois
que sem este, não chega a pôr-se qualquer problema de responsabilidade civil (ao invés
do que sucede nos casos de crimes formais no direito penal)
Por ultimo a lei exige um nexo de causalidade entre o facto voluntário do agente e o
dano sofrido pelo lesado, de modo a poder afirmar-se, à luz do direito, que existe uma
razão de justiça que determina que deverá ser o lesante, e não o lesado, a arcar com as
92
consequências da lesão (danos), isto, é, o facto terá de ser causa do danos, sendo que, só
quanto a esse dano manda a lei indemnizar o lesado.
Este facto traduz-se, em regra num acto, numa acção, ou seja, num facto positivo que
importa a violação de um dever geral de abstenção, do dever de não ingerência na esfera
de acção do titular do direito absoluto.
Que o facto gerador de responsabilidade seja, em regra, um fato positivo, e não uma
omissão, resulta da circunstância de, fora do domínio contratual, as pessoas estarem as
mais das vezes obrigadas a absterem-se da pratica de actos que possam lesar o seu
semelhante e não a praticar actos positivos de cooperação com ele.
No entanto, pode traduzir-se também num facto negativo, numa abstenção ou numa
omissão (art.486º).
A omissão, como pura atitude negativa, não pode gerar física ou materialmente o dano
sofrido pelo lesado, mas entende-se que a omissão é causa do dano, sempre que haja o
dever jurídico especial de praticar um acto que, seguramente ou muito provavelmente,
teria impedido a consumação do dano.
Quando se alude a facto voluntário do agente, não se pretende restringir os facto
humanos relevantes em matéria de responsabilidade aos actos queridos, ou seja, àqueles
casos em que o agente tenha prefigurado mentalmente os efeitos do acto e tenha agido
em vista de sua obtenção. Há pelo contrário, inúmeros casos (ex. negligencia
consciente) em que não existe semelhante representação mental e todavia, ninguém
contesta a obrigação de indemnizar.
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Os actos danosos praticados por distracção ou falta do auto domínio normal não deixam
de constituir o agente em responsabilidade.
Por outro lado, não está inteiramente excluída a responsabilidade das pessoas que, por
carência da capacidade de exercício, não possuem uma vontade juridicamente relevante
no domínio dos negócios jurídicos, contanto que tenham capacidade natural de
entendimento e de acção (art.488º nº1).
O que está, alias, geralmente em causa, no domínio da responsabilidade civil, são puras
acções de facto, praticadas sem nenhum intuito declarativo (ex. agressões física,
apropriações ilícitas, intromissões em bens jurídicos alheios etc.).
Por isso, e como refere Larenz, facto voluntário significa apenas, facto objectivamente
controlável ou dominável pela vontade.
Para fundamentar a responsabilidade civil basta a possibilidade de controlar o acto ou
omissão; não é necessária uma conduta predeterminada, uma acção ou omissão
orientada para certo fim (uma conduta finalista).
b) ILICITUDE DO FACTO
Ex. Uma coisa é, com efeito, a calunia ou injúria (a afirmação de um facto que fere a
honra ou afecta o bom nome de alguém) e outra é o dano que a calunia causou (o
despedimento, a perda de clientes etc.).
Com efeito, a ilicitude reporta-se ao facto do agente, à sua actuação, não ao efeito
(danoso) que dele promana, embora a ilicitude do facto possa provir do resultado (ex.
lesão ou ameaça de lesão de certos valores tutelados pelo direito) que ele produz.
Formas da ilicitude
Ficam abrangidos por esta rubrica os casos mais nítidos de ilicitude civil e, por isso,
mais fáceis de determinar.
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Os direitos subjectivos aqui abrangidos (visto que o não cumprimento, o cumprimento
tardio e o cumprimento defeituoso dos direitos de credito são abrangidos pela
responsabilidade contratual) são, principalmente, os direitos absolutos, nomeadamente
os direitos sobre as coisas (corpóreas ou incorpóreas) ou direitos reais, os direitos de
personalidade os direitos familiares e a propriedade intelectual (direitos de autor e
direitos conexos e propriedade industrial).
Entre os direitos reais avulta o direito de propriedade, cuja violação pode revestir os
mais variados aspectos (a privação do uso ou fruição da coisa imposta ao titular, a
apropriação, deterioração ou destruição da coisa, a disposição ou subtracção dela, a
perturbação do exercício do direito do proprietário etc.).
Quanto aos direitos de personalidade, não restam duvidas de que a sua violação pode
dar lugar à obrigação de indemnizar. Assim sucede com a usurpação do nome, o uso não
autorizado da imagem de outrem etc.
Nos direitos de autor é mais frequente a violação dos direitos patrimoniais (ex. edição
não autorizada de certa obra, utilização indevida de uma patente etc.) do que do direito
moral (ex. publicação da obra com aditamentos não consentidos pelo autor etc.).
Vemos então que ao lado da violação de direitos subjectivos, prevê-se ainda a infracção
da norma destinada a proteger interesses alheios.
Trata-se da infracção das leis que, embora protejam interesses particulares, não
conferem aos respectivos titulares um direito subjectivo a essa tutela (a lei quer proteger
esses interesses, mas não quer deixar a respectiva tutela na livre disponibilidade das
pessoas a quem ela respeita); e de leis que, tendo também ou até principalmente em
vista a protecção de interesses colectivos, não deixam de atender aos interesses
particulares subjacentes (de indivíduos ou de classes ou grupos de pessoas).
Alem disso, a previsão da lei abrange ainda a violação das normas que visam prevenir,
não a produção do dano em concreto, mas o simples perigo de dano, em abstracto.
Situações há em que a norma violada protege interesses particulares, mas sem conceder
ao respectivo particular um direito subjectivo, só um outro interesse particular mais
forte se lhe sobrepõe. É o que sucede no caso previsto pelo art.1391º, que, protegendo o
interesse dos proprietários de prédios inferiores, não lhes concede um direito subjectivo,
em atenção ao interesse mais forte do proprietário do prédio superior (onde se situa a
fonte ou a nascente).
No entanto, caso sejam terceiros, que em violação daquele preceito lesem os interesses
dos proprietários dos prédios inferiores, haverá um acto ilícito, capaz de gerar
responsabilidade civil.
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Afigura-se, portanto, determinante saber se o interesse do lesado está ou não abrangido
pela norma.
Para que o lesado, em sede do segundo tipo de ilicitude, tenha direito a ser
indemnizado, três requisitos se mostram indispensáveis, são eles:
1 – Que à lesão dos interesses do particular corresponda a violação de uma norma legal.
2 – Que a tutela dos interesses do particular figure, de facto, entre os fins da norma
violada, isto é, é preciso que a tutela dos interesses privados não seja, portanto, um mero
reflexo da protecção dos interesses colectivos que, como tais, a lei visa salvaguardar.
O que conta não é o efeito da norma violada, mas o seu fim ou conteúdo. Não basta que
a norma também aproveite ao particular, é preciso que ela tenha também em vista a
protecção dele.
3 – Que o dano se tenha registado no círculo de interesses privados que a lei visa tutelar.
Ex. Uma criança trepou por um poste de linha eléctrica (colocado a uma altura inferior à
regulamentar) e foi vítima de um acidente. A empresa foi isenta de responsabilidade,
visto que se considerou que a altura mínima da linha, fixada no regulamento, não visa
impedir a escalada dos poste, antes obstar a que as coisas transportadas por pessoas ou
veículos circulando ao nível do solo, contactem com a linha.
O terceiro requisito não se verifica, por exemplo, quando uma postura administrativa
manda iluminar determinados recintos, para protecção dos operários que laboram em
certas fábricas ou das crianças que frequentam certa escola, e a falta de iluminação vem
a causar danos em pessoas estranhas (ex. assaltantes) que pelo recinto circulam
indevidamente.
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1º - Note-se que a obrigação de reparar o dano recai sobre o autor do facto,
independentemente de qualquer enriquecimento que ele tenha obtido. Se a ideia
objectiva da reparação chega para justificar a obrigação de restituir, no caso de
enriquecimento à custa de outrem, já não parece que baste para fundamentar o dever de
reparação do dano, quando este não enriqueça o lesante.
Precisamente porque a reparação constitui, em princípio, uma sanção é que o dever de
indemnizar pressupõe, em regra, a culpa do agente.
A juntar aos casos de violação do direito subjectivo ou da disposição legal que protege
interesses de outrem, há ainda que referir, como formas de comportamento antijurídico
capaz de determinar a obrigação de indemnizar, se não houver nem causa especial de
exclusão da ilicitude:
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reparações urgentes (art.1038º al e)) o titular do direito inferior deve ceder perante o
titular do direito superior.
Se em qualquer dos casos, não se verificar essa cedência, naturalmente que estará
preenchido o requisito da ilicitude para efeitos de responsabilidade civil, ficando quem
desrespeitou o dever de cedência sujeito a responder pelos prejuízos causados.
Almeida Costa veio considerar que embora a rega seja a da irrelevância da veracidade
ou falsidade do facto, sempre que a difusão corresponda a interesses legítimos deve
admitir-se a exclusão da responsabilidade com base na exceptio veritatis.
Já Menezes Leitão considera que a divulgação de factos falsos é sempre proibida, por
outro lado, a divulgação de factos verdadeiros poderá ser admitida, desde que tal se
efectue para assegurar um interesse público legítimo.
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controlar a sua veracidade ou acerto (caveat emptor), sem contar com a forte dose de
subjectivismo que perpassa muitas delas.
Omissões, art.486º
O dever imposto por lei tanto pode resultar de um norma perceptiva, que directamente
imponha certa acção, como provir indirectamente da norma que imponha a nossa
colaboração na prevenção de certo resultado, que é punido ou reprovado de outro modo
na lei.
A lei prevê que, para haver responsabilidade, a violação dos direitos subjectivos ou das
normas de protecção tem que ser realizada ilicitamente (art.483º), admitindo assim a
possibilidade de essa violação ser efectuada de forma lícita.
Essa situação ocorrerá sempre que o agente tenha actuado no âmbito de uma causa de
justificação, caso em que a ilicitude é, no caso concreto, excluída em virtude de o agente
se encontrar no âmbito de um situação específica que produz a justificação do facto.
Ao lado das duas causas gerais de exclusão da ilicitude, há ainda algumas causas
especiais justificativas do facto
Estas causas justificativas não são uma pura aplicação ou corolário do princípio de que
o exercício de um direito ou cumprimento de um dever legitimam a pratica do dano.
Elas constituem mais a expressão de um agere licere (de uma faculdade de agir) do que
o exercício de um verdadeiro direito subjectivo.
a) Exercício de um direito
b) Cumprimento de um dever
c) Legitima defesa
d) Acção directa
e) Estado de necessidade
f) Consentimento do lesado
Sendo que as duas primeiras são causas gerais e as restantes quatro causas especiais, de
exclusão da ilicitude.
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a) Exercício de um direito
Esta causa de justificação deve, porém, face à crescente funcionalização dos direitos
subjectivos, ser entendida em termos restritivos.
Há que salientar as limitações do exercício dos direitos subjectivos pelos institutos do
abuso de direito (art.334º) ou da colisão de direitos (art.335º), os quais restringirão a
operatividade desta causa de justificação.
Segundo Pessoa Jorge, desta causa de justificação apenas resulta que o titular não tem
que indemnizar os prejuízos que, causados embora pelo exercício do direito,
representem a frustração de interesses que, precisamente ao conceder esse direito, a lei
postergou.
No fundo, nota Menezes Leitão, o agente apenas se exonerará de responsabilidade se se
limitar a desfrutar das utilidades que correspondem ao exercício legitimo do seu direito,
não deixando de responder, verificados os demais pressupostos da responsabilidade, por
outros danos que provoque com a sua actuação.
b) Cumprimento de um dever
Para haver exclusão da ilicitude é porém, necessário que o dever seja efectivamente
cumprido, não bastando a simples colisão.
Assim, em caso de conflito, se o agente optar por não cumprir nenhum será responsável
pelo incumprimento de ambos.
É ainda necessário que a impossibilidade de cumprimento dos dois deveres não resulte
de uma culpa anterior do agente, caso em que este não deixará de ser responsabilizado.
100
Apesar de ser uma actividade de reacção (e não de ataque ou iniciativa como a acção
directa ou o estado de necessidade) a legitima defesa pode causar danos na pessoa ou no
património do autor da agressão, sobretudo quando haja excesso na reacção.
A defesa considera-se legitima, porque, não podendo o Estado, apesar de todo o arsenal
dos seus meios de prevenção, evitar a pratica de facto ilícitos, justo é que se reconheça
aos particulares a faculdade de, em certos termos, se defenderem de alguns deles pelos
seus próprios meios.
1) Agressão – que haja uma ofensa da pessoa ou dos bens de alguém (portanto uma
acção e não uma simples omissão
3) Necessidade da reacção – que não seja viável nem eficaz o recurso aos meios
normais de tutela.
Se a agressão é passada (não actual), já não se justifica a reacção, porque o dano está
consumado; se é futura, poderá recorrer-se normalmente aos meios coercivos próprios.
Para que seja contrária a lei, basta que a agressão o seja objectivamente, pouco
importando que o agressor seja ou não imputável e tenha ou não culpa.
A reacção do agente pode, ainda visar a defesa de terceiro, pois que, como nota Vaz
Serra, o terceiro pode não se encontrar em condições de reagir.
Além de ser lícito o acto de quem se defende (e de contra ele se não admitir a legitima
defesa do agressor), o autor é isento de responsabilidade pelos danos causados. Apenas
responderá se houver erro da sua parte acerca da verificação dos pressupostos que
legitimam a defesa e o erro não for desculpável.
O acto considera-se ainda justificado, mesmo que haja excesso na defesa, quando o
excesso provenha de perturbação ou de medo não culposo.
O excesso da reacção pode resultar da impropriedade do meio usado, como do facto de
o interesse do atacante ser manifestamente superior ao do defendente.
101
d) Acção directa, art.336º
1) Fundamento real – é necessário que o agente seja titular de um direito que possa
realizar ou assegurar.
4) Valor relativo dos interesses em jogo – através da acção directa não pode o
agente sacrificar interesses superiores aos que visa realizar ou assegurar.
É lícito o acto daquele que, para remover o perigo actual de um dano manifestamente
superior, quer do agente, quer de terceiro, destrói ou danifica coisa alheia.
Por igualdade ou por maioria de razão, deve considerar-se licito o acto daquele que, em
lugar de destruir ou danificar, se limita a usar (sem autorização) coisa alheia (estado de
necessidade defensivo no primeiro caso e atacante no segundo).
Note-se que no caso em que o agente, para salvar um interesse alheio, sacrifique um
interesse próprio, não é o instituto do estado de necessidade que se aplica, antes o da
gestão de negócios ou a responsabilidade civil lhe facultarão a indemnização dos danos
que sofrer.
102
Legitima defesa VS estado de necessidade
Porém, enquanto a legítima defesa exprime uma reacção ou repulsão contra a agressão
de outrem, no estado de necessidade actua-se ou por ataque ou como meio de defesa
contra um perigo não proveniente de agressão de outrem; no primeiro caso o perigo
resulta da agressão da pessoa contra quem se reage, enquanto no segundo o perigo é
devido, as mais das vezes, a caso fortuito, sendo o acto praticado contra interesses de
terceiro.
Como não há, porém, no acto praticado em estado de necessidade, ao invés do que
sucede na legitima defesa, uma agressão previa, e porque os interesses do titular da
coisa são legitimamente sacrificados, mas em proveito de outrem, impõe-se aqui, nuns
casos, e admite-se noutros a indemnização dos danos causados.
O facto de haver obrigação de indemnizar não exclui, como é sabido, a licitude do acto.
Esta tem interesse, entre outros motivos, por não se admitir contra o acto lícito a
legitima defesa, a qual pressupõe um acto contrário a lei.
Há obrigação de indemnizar, sempre que a situação de perigo foi provocada por culpa
exclusiva do autor da destruição, danificação ou uso da coisa alheia.
O tribunal pode condenar na indemnização, consoante os casos, que só o autor do acto,
quer só o acusador do estado de necessidade, quer ambos simultaneamente.
A obrigação de indemnização não se funda na ilicitude do acto (pois ele é licito) nem no
risco (porque o dano resulta de um acto voluntário do agente) resulta antes dum
princípio de justiça comutativa que manda compensar o titular do interesse justamente
sacrificado ao interesse superior.
103
c) NEXO DE IMPUTAÇÃO DO FACTO AO AGENTE (imputabilidade/culpa)
Para que o facto ilícito gere responsabilidade civil, é necessário que o autor tenha agido
com culpa.
É preciso, nos termos do art.483º, que a violação ilícita tenha sido praticada com dolo
ou mera culpa.
Agir com culpa significa actuar em termos de a conduta do agente merecer a reprovação
ou censura do direito.
A conduta do lesante é reprovável, quando, pela sua capacidade e em face das
circunstâncias concretas da situação, se concluir que ele podia e devia ter agido de outro
modo.
Sabido quem é susceptível desse juízo genérico de censura, importa saber se a pessoa
imputável, a que o facto é atribuído, agiu, no caso concreto, em termos que justifiquem
a censura.
Trata-se de saber se a pessoa podia e devia ter agido de modo diferente e em que grau o
podia e devia ter feito.
O que releva aos olhos da lei, é a existência ou falta desta dupla capacidade, no
momento em que o facto é praticado.
Há pessoas em que a lei presume a falta de tal capacidade no momento do facto
(menores de 7 anos e interditos por anomalia psíquica).
E há outras que, carecendo dela, são tratadas como se a possuíssem (os que
culposamente se incapacitaram de entender ou querer, sendo essa situação transitória).
Nos casos em que não há imputabilidade do autor material do facto, o lesado poderá
ressarcir-se, no entanto, à custa da pessoa obrigada à vigilância do agente, salvo se se
verificar alguma das circunstâncias prevista no art.491º in fine.
Poderá, no entanto, a lesão ficar sem reparação, isto nos casos em que não hajam
pessoas obrigadas à vigilância do agente ou que se verifique alguma das situações
previstas no art.491º.
104
Responsabilidade especial dos inimputáveis
Culpa – não basta a imputabilidade do agente para que o facto lhe seja imputado, é
necessário que o imputável tenha realmente agido com culpa, que haja certo nexo
psicológico entre o facto praticado e a vontade do lesante.
A culpa exprime um juízo de reprovabilidade pessoal da conduta do agente: o lesante,
em face das circunstâncias específicas do caso, devia e podia ter agido de outro modo.
É um juízo que assenta no nexo existente entre o facto e a vontade do autor e pode
revestir duas formas:
- Dolo
- Negligencia ou mera culpa
Segundo Menezes Leitão a culpa pode ser definida como o juízo de censura ao agente
por ter adoptado a conduta que adoptou, quando de acordo com o comando legal estaria
obrigado a adoptar conduta diferente.
Deve, por isso, ser entendida em sentido normativo, como a omissão da diligência que
seria exigível ao agente de acordo com o padrão de conduta que a lei impõe.
Nestes termos, o juízo de culpa representa um desvalor atribuído pela ordem jurídica ao
facto voluntário do agente, que é visto como axiologicamente reprovável.
105
enriquecimento do lesante; situação em que a indemnização não poderá ser inferior a
esse beneficio).
Fundando-se a responsabilidade no dolo, sendo por essa razão, mais forte o laço que
prende o facto à vontade do agente, o montante da indemnização terá de corresponder
sempre ao valor dos danos, não podendo o juiz arbitrar indemnização inferior.
Estabelece o art.497º que quando sejam várias as pessoas responsáveis pelos danos, o
direito de regresso entre os responsáveis existe na medida das respectivas culpas (…).
Modalidades de Culpa
Dolo – este aparece como a modalidade mais grave da culpa, aquela em que a conduta
do agente, pela mais estreita identificação estabelecida entre a vontade deste e o facto se
torna mais fortemente censurável.
- Dolo directo
- Dolo necessário
- Dolo eventual
Dolo necessário – não querendo directamente o facto ilícito, o agente prevê-o como
consequência necessária, segura, da sua conduta. O efeito ilícito e o resultado querido
estavam indissoluvelmente ligados, o agente conhecia esse nexo de causalidade e nem
por isso deixou de agir.
106
Portanto, o agente prevê a produção do facto ilícito, não como consequência necessária
da sua conduta, mas como um efeito apenas possível ou eventual.
Que teria feito o agente, se previsse o facto ilícito, não como mera consequência
possível, mas como efeito necessário da sua conduta; ter-se-ia abstido de agir, ou teria
persistido na actuação?
Formula positiva de Frank – de acordo com esta formulação, haverá dolo eventual se o
agente, tendo previsto o resultado da sua conduta como possível, conforma-se com esse
resultado, não alterando, consequentemente o seu comportamento.
Aqueles que propugnam pela teoria da vontade exigem, porem, algo mais do que a
indiferença do agente para servir de base à sua reacção hipotética.
Querem uma verdadeira adesão da vontade do agente ao resultado.
Com efeito, para Eduardo Correia, haverá dolo eventual sempre que o agente, ao
actuar, não confiou em que o tal efeito possível se não verificaria (o agente actua
conformando-se com o risco da conduta provocar o resultado).
Por outro lado, haverá negligência consciente quando o agente tenha actuado só porque
(infundadamente) confiou em que o resultado não se produziria.
No primeiro caso verifica-se o dolo eventual uma vez que a insensibilidade do agente
perante os valores que violou continua a merecer um juízo de forte reprovação.
No segundo há negligência consciente, porque o agente previu (como possível) a
produção do facto e não tomou as medidas necessárias para o evitar.
Elemento intelectual do dolo – alem do nexo entre o facto ilícito e a vontade do lesante,
nexo que constitui o elemento volitivo do dolo, este compreende ainda um outro
elemento, de natureza intelectual.
Para que haja dolo é essencial o conhecimento das circunstâncias de facto que integram
a violação do direito ou da norma tuteladora de interesses alheios e a consciência da
ilicitude do facto.
107
Os autores excluem apenas, em regra, da necessidade da consciência da ilicitude o
conhecimento da imoralidade do acto ou do carácter ofensivo dos bons costumes,
quando a ilicitude envolva qualquer destes aspectos.
Com efeito, estão em causa princípios de tal modo divulgados entre os membros da
comunidade, que repugna aceitar a invocação da sua ignorância como causa de exclusão
do dolo.
A mera culpa (consciente e inconsciente) exprime uma ligação da pessoa com o facto,
menos incisiva do que o dolo, mas ainda assim reprovável ou censurável. O grau de
censura será tanto maior quanto mais ampla for a possibilidade de a pessoa ter agido de
outro modo, e mais forte ou intenso o dever de o ter feito.
Qual o padrão pelo qual se afere a conduta do lesante; como se mede o grau de
diligencia que dele é exigível?
Será a diligencia que o agente costuma aplicar nos seus actos (diligentia quam in suis
adhibere solet) de que ele se revela habitualmente capaz (culpa em concreto) ou é antes
a diligência de um homem normal, medianamente sagaz, prudente, avisado e
cuidadoso?
Neste caso afere-se a culpa do lesante através da sua comparação com o arquétipo, isto,
um modelo do homem tipo, o padrão de um sujeito ideal (bonus pater familias).
O CC consagrou a tese da culpa em abstracto (art.487ºnº2) quando à responsabilidade
extracontratual, no entanto, afastou-se da anterior legislação, no sentido em que
consagrou a aplicação deste critério também ao regime da responsabilidade contratual
(art.799º nº2).
Este padrão abstracto, não deixa de exigir, no entanto, uma analise das circunstancias do
caso concreto, ou seja, do condicionalismo da situação e do tipo de actividade em causa.
Compreende-se que a diligencia exigida a um profissional qualificado na sua área não
seja a mesma que e que é exigida a um transeunte em passeio, e que a ocorrência de
uma situação de emergência implique uma apreciação da culpa distinta da que seria
efectuada numa situação normal.
108
A culpa como deficiência da vontade ou como conduta deficiente
Pode, no entanto, afirmar-se que a melhor opção de iure constituendo e a que mais
facilmente se coaduna com a opção da lei pelo critério da culpa em abstracto, é a que,
dando à diligencia exigível do homem o conteúdo mais amplo, define a mera culpa
como um conduta deficiente e não a restringe à condição de uma simples deficiência do
factor vontade no acto.
Pois que não seria justo que a inaptidão, a imperícia e a incompetência, em lugar de
onerarem o próprio agente, prejudicassem antes terceiros (pessoa ou património).
Com efeito, e ao invés do que sucede em sede de responsabilidade criminal, não releva
aqui punir o lesante.
O que está em causa na responsabilidade civil é uma questão de justiça comutativa, que
se resume ao nexo de imputação, isto é, saber quem é mais justo que suporte o dano; o
determinar se existe uma razão de justiça que imponha a outrem, que não o lesado, a
obrigação de reparar o dano por este sofrido.
Por outro lado, esta formulação de mera culpa constitui um incentivo para que as
pessoas, sobretudo no exercício da actividade profissional, procurem, na medida do
possível, corrigir as suas deficiências naturais ou a sua falta de competência, até se
aproximarem do homem comum, do tipo médio que a ordem jurídica toma como
referencia.
Entenda-se que, se a cada um fosse licito escusar-se ou eximir-se do mal causado a
outrem com a fraqueza da sua constituição, a sua deficiência intelectual, a sua especial
negação para certo tipo de acções ou com o facto de não ser suficientemente instruído,
dotado ou experiente, alegando que fez o melhor que pode, o principio na actuação dos
outros sofreria um golpe muito sério.
109
Ilicitude VS culpa
Distinguindo entre o dolo e a negligencia, tratando aquele com maior severidade que
esta, graduando a mera culpa de harmonia com a intensidade do dever que o agente
tenha em cada caso concreto de agir de outro modo e com a possibilidade real de o
fazer, a culpabilidade trata fundamentalmente do nexo entre o facto e a vontade do
agente.
Nos termos do art.487º nº1, incumbe ao lesado a prova da culpa do lesante, salvo
havendo presunção de culpa.
Nota Menezes Leitão que a dificuldade de realizar esta prova (probatio diabólica) e
estando o ónus a cargo do lesado, reduz em grande medida as possibilidades de este
obter indemnização, ao mesmo tempo que assegura a função sancionatória da
responsabilidade civil, só responsabilizando o agente perante uma demonstração
efectiva da sua culpa.
Por vezes, no entanto, a lei estabelece presunções de culpa. Nesses casos verifica-se
uma inversão do ónus da prova (art.350º nº1).
Apesar das presunções serem genericamente elidíveis (art.350. nº2) a verdade é que as
dificuldades de prova neste domínio tornam, em caso de presunção de culpa, muito mais
segura a obtenção de indemnização pelo lesado, levando assim a que na
responsabilidade por culpa presumida a função indemnizatória praticamente a função
sancionatória.
110
Alem da presunção de culpa na responsabilidade contratual, o CC prevê as seguintes
presunções de culpa:
Todas estas presunções de culpa correspondem a situações em que se verifica uma fonte
específica de perigo, cuja custódia se encontra atribuída a determinado sujeito,
resultando assim a sua responsabilização da violação de deveres de segurança do
tráfego, que lhes impunham evitar a ocorrência de danos resultantes dessa fonte de
perigo.
1) Danos causados por incapazes estando estes sob a custodia de outrem, art.491º
O art.491º estabelece a presunção de culpa daqueles que têm à sua vigilância, seja este
dever decorrente da lei ou de negócio jurídico, pessoas naturalmente incapazes. Desde
que, estes causem danos a terceiros.
As pessoas atingidas pela obrigação de indemnizar não respondem por facto de outrem
(pelo risco), antes por facto próprio, visto a lei presumir que houve falta (omissão) da
vigilância adequada (culpa in vigilando).
- Num dado da experiência, segundo a qual boa partes dos actos ilícitos praticados pelos
incapazes procede de um falta de vigilância adequada.
- Quer mediante a prova de que o dano se teria produzido ainda que o dever tivesse sido
cumprido (relevância negativa da causa virtual).
Nem todos os obrigados a vigiar outras pessoas estão sujeitos à presunção de culpa,
apenas aqueles cujo dever de vigilância é determinado em função da incapacidade
natural do vigiado.
À incapacidade natural não corresponde sempre a inimputabilidade, como tal, pode
cumular-se a responsabilidade do incapaz e da pessoa obrigada à sua vigia. Neste caso
respondem solidariamente (art.497º).
111
2) Danos derivados de edifícios e outras obras, art.492º
A solução estende-se ainda a outras obras, devendo considerar-se como tais, todas as
construções ligadas ao solo ou unidas ao prédio, mas não coisas móveis sem tal ligação
nem os produtos naturais ligados ao solo.
A presunção recai sobre o proprietário ou possuidor do edifício; presunção que se
transfere no caso de danos devidos exclusivamente a defeitos de conservação, para a
pessoa obrigada por lei ou negócio jurídico a conservar o edifício ou obra; desde que
não haja ao mesmo tempo culpa do proprietário ou possuidor (culpa in eligendo, culpa
in instruendo, culpa in vigilando) caso em que responderão solidariamente.
Também nesta situação se admite que quem tem contra si a presunção se exima de
responsabilidade. Terá para isso, de provar que não houve culpa sua ou que os danos se
continuariam a produzir mesmo que se tivesse adoptado a diligência devida.
Com efeito o autor discorda da referida orientação, pois que fazer recair esta prova
sobre o lesado equivale a retirar grande parte do alcance à presunção de culpa.
Refere Menezes Leitão que, salvo casos de fenómenos extraordinários, como
terramotos, a ruína de um edifício ou obra é um facto que por si só indicia o
incumprimento de deveres relativos à construção ou conservação dos edifícios, não se
justificando por isso que recaia sobre o lesado o ónus suplementar de demonstrar a
forma como ocorreu esse incumprimento.
Trata-se de uma responsabilidade subjectiva por culpa presumida contra quem tiver em
seu poder coisa móvel ou imóvel, com o dever de a vigiar, bem como contra aquele que
assumir a vigilância de quaisquer animais.
Nota Antunes Varela que se trata dos danos provocados pelas coisas ou pelos animais,
não dos danos causados pelo agente com o emprego das coisas ou dos animais, visto
nenhuma razão haver para excluir estes do regime geral da responsabilidade civil.
112
Ao dono ou possuidor do animal é, porém, aplicável o disposto no art.502º
(responsabilidade baseada no risco).
Com efeito, se a responsabilidade assenta, nesta caso, sobre a ideia que não foram
tomadas as medidas de precaução necessárias para evitar o dano, a presunção recai em
cheio sobre a pessoa que detém a coisa ou o animal, com o dever de os vigiar.
Essa pessoa será, por via de regra, o proprietário, mas muitas vezes o não será, podendo
tratar-se do comodatário do depositário etc.
A presunção legal de culpa pose ser afastada nos mesmos moldes que nos casos
anteriores (art.350º nº2).
d) DANO
Segundo Menezes Leitão, o dano terá de ser definido num sentido simultaneamente
fáctico e normativo, ou seja, como a frustração de uma utilidade que era objecto de
tutela jurídica.
Dano real – o dano real é a perda in natura que o lesado sofreu, e consequência de
certo facto, nos interesses (materiais, espirituais ou morais) que o direito violado ou a
norma infringida visam tutelar.
É, portanto, a lesão causada no interesse juridicamente tutelado, que reveste as mais das
vezes a forma de uma destruição, subtracção ou deterioração de certa coisa, material ou
incorpórea.
113
Dano patrimonial – este consiste no reflexo do dano real sobre a situação patrimonial
do lesado. Tratam-se de realidades distintas, embora estritamente ligadas entre si.
Menezes Leitão refere que o dano patrimonial corresponde à avaliação concreta dos
efeitos da lesão no âmbito do património do lesado, consistindo a indemnização na
compensação da diminuição verificada nessa património em virtude da lesão.
Uma coisa é a morte da vítima, as fracturas, as lesões que ela sofreu (dano real), outra
coisa são as despesas com os médicos, com o internamento, o funeral, os lucros que o
sinistrado deixou de obter em virtude da incapacidade.
Nota Antunes Varela que o dano patrimonial se mede, em regra, por uma diferença:
A diferença entre a situação real actual do lesado e a situação hipotética em que ele se
encontraria se não fosse o facto lesivo.
Dano emergente – pode, desde logo, consistir numa diminuição do activo ou num
aumento do passivo. Compreende o prejuízo causado nos bens ou nos direitos já
existentes na titularidade do lesado à data da lesão.
Lucro cessante – abrange os benefícios que o lesado deixou de obter por causa do facto
ilícito, mas a que ainda não tinha direito à data da lesão.
Fala-se nesta sede de dano patrimonial para abranger os prejuízos que, sendo
susceptíveis de avaliação pecuniária, podem ser reparados ou indemnizados, senão
directamente (restauração natural ou reconstituição especifica) pelo menos
indirectamente (mero equivalente ou indemnização pecuniária).
114
Danos patrimoniais indirectos – são aqueles que, embora atinjam valores ou interesses
não patrimoniais (o bom nome, a honra etc.), todavia, se reflectem no património do
lesado, por exemplo, diminuindo a sua clientela.
Resulta do que é dito que nem sempre o dano patrimonial resulta da violação de direitos
ou interesses patrimoniais: também a violação de direitos ou interesses não patrimoniais
se pode reflectir na perda de receitas ou na necessidade de despesas.
Danos não patrimoniais – são aqueles que são insusceptíveis de avaliação pecuniária,
pois atingem bens que não integram o património do lesado (saúde, bem estar,
liberdade). Como tal, a sua violação apenas pode ser compensada com a obrigação
pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação que uma indemnização.
A indemnização por danos não patrimoniais não elimina o dano sofrido, apenas permite
atribuir ao lesado determinadas utilidades que lhe permitirão alguma compensação pela
lesão sofrida.
O mesmo facto ilícito pode produzir simultaneamente danos patrimoniais e danos não
patrimoniais.
Dano directo – traduz-se nos efeitos imediatos do facto ilícito, a perda directa causada
nos bens ou valores juridicamente tutelados.
Do art.564º nº2 resulta, em primeiro lugar, que o facto de o dano ainda não se ter
verificado não é fundamento para excluir a indemnização, bastando-se o tribunal com a
previsibilidade da verificação do dano para a fixar.
No entanto, a fixação da indemnização naquele momento depende da determinabilidade
do dano futuro.
Efectivamente e segundo o art.661º nº2 CPC, caso o dano não seja logo determinável
em objecto ou quantidade a fixação da indemnização deverá ser remetida para execução
de sentença.
115
De novo a questão da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais e a solução do
problema no direito constituído.
O facto de a lei, através da remissão no art.496º nº3 para o 494º, mandar atender, na
fixação da indemnização, quer à culpa quer à situação económica do lesante, revela que
ela não aderiu, estritamente, à tese segundo a qual a indemnização se destina, nestes
casos a proporcionar ao lesado os meios económicos necessários para satisfazer ou
compensar com os prazeres da vida os desgostos ou sofrimentos que sofreram por
virtude da lesão.
Como nota Antunes Varela, nem todos os danos sobrevindos ao facto ilícito são
incluídos na responsabilidade do agente.
Com feito, exige-se entre o facto e o dano indemnizável um nexo mais apertado do que
a simples coincidência ou sucessão cronológica.
Não é pelo facto de o vidro se ter partido à passagem da viatura que se conclui ter sido o
veículo que partiu o vidro. É preciso, diz Carbonier, provar que o vidro foi partido por
uma pedra que a roda do veículo projectou na sua passagem.
116
Por conta dos responsáveis devem correr apenas os danos causados pelo facto, os danos
resultantes do facto (art.483º) e não todos os danos cronologicamente sobrevindos ao
facto.
Quais são, então, os danos que podem considerar-se causados pelo facto constitutivo da
responsabilidade?
Que relação deve existir entre o dano e o facto, para que este possa considerar-se como
causa daquele?
1 – Num aspecto positivo, quando ser diz que a vitima, para obter a indemnização tem
que alegar e provar o nexo de causalidade entre o prejuízo e o facto a que a lei liga certa
responsabilidade.
2 – Num aspecto negativo, para significar que o réu pode afastar a relação de
causalidade que parecia envolvê-lo, provando a existência de uma causa estranha que
lhe não é imputável.
Segundo esta teoria, seria causa de um evento toda e qualquer condição que tenha
concorrido para a sua produção, em termos tais que a sua não ocorrência implicaria que
o evento deixasse de se verificar.
De acordo com esta formulação, o que caracteriza o conceito de causa de um evento é
apenas a imprescindibilidade de uma condição para a sua verificação, não se
justificando estabelecer qualquer apreciação da relevância jurídica dessas condições,
uma vez que todas elas são equivalentes para o processo causal, mesmo que o evento só
resulte da acção conjugada de ambas.
Podemos, através do exemplo, atestar a fragilidade desta teoria, pois que, nestes casos
(concurso de responsabilidades) o que sucederia era uma de duas hipóteses:
1 – Serem ambas as empregadas responsabilizadas, uma vez que, se qualquer uma das
doses fosse retirada o resultado morte se não produziria.
2 – Serem ambas ilibadas, visto que nem uma nem outra, isoladamente, se podem
considerar causa sem a qual o resultado morte não se produziria.
117
Teoria da causalidade adequada
Como bem refere Antunes Varela, o que ao jurista cumpre averiguar é o ponto de vista
em que o direito se deve colocar para seleccionar, entre as varias condições de certo
evento danoso, as que legitimam a imposição, ao respectivo autor da obrigação de
indemnização.
Quando é que para tal efeito, o facto pode e deve ser tido como causa do dano?
Há que escolher, entre os antecedentes históricos do dano, aquele que, segundo o curso
normal das coisas, se pode considerar apto para o produzir, afastando aqueles que só por
virtude de circunstancias extraordinárias o possam ter determinado.
Que o facto seja condição do dano é requisito necessário; mas não é requisito suficiente
para que possa ser considerado como causa desse dano.
Podemos constatar, então, que o cerne da questão reside em saber quando é que um
facto pode, abstractamente considerado, ser apontado como causa de certo dano.
Para alguns autores o facto e causa adequada do dano, sempre que este constitua uma
consequência normal ou típica daquele, ou seja, sempre que, verificado o facto, se possa
prever o dano como uma consequência normal/natural ou como um efeito provável
dessa verificação.
Para outros, que propugnam por um formulação mais ampla, o facto que actuou como
condição do dano só deixara de ser considerado como causa adequada se, dada a sua
natureza geral, se mostrar de todo em todo indiferente (não apto à produção do dano)
para a verificação do dano, tendo-o provocado só por virtude das circunstancias
excepcionais, anormais, extraordinárias ou anómalas que intercederam no caso
concreto.
Essa será, com efeito, na falta de indicação em contrário, a orientação mais defensável
quanto aos casos em que a obrigação de reparar o dano assenta sobre um facto lícito do
agente.
118
Já no que concerne aos casos em que a obrigação assenta num facto ilícito culposo do
agente, assim não será.
Desde que o devedor ou o lesante praticou um facto ilícito, e este actuou como condição
de certo dano, compreende-se a inversão do sentido natural dos acontecimentos.
Já se justifica que o prejuízo recaia, em principio, não sobre o lesado, mas sobre quem
agindo ilicitamente, criou a condição do dano.
Essa inversão só deixa de ser razoável a partir do momento em que o facto ilícito se
pode considerar de todo em todo indiferente, na ordem natural das coisas, para a
produção do dano registado.
- Para que haja causalidade adequada, não é de modo nenhum necessário que o facto, só
por si, sem a colaboração de outros, tenha produzido o dano. Essencial é que o facto
seja condição do dano, mas nada obsta a que, como frequentemente sucede, ele seja
apenas uma das condições desse dano.
- Para que um dano seja considerado como efeito adequado de certo facto não é
necessário que ele seja previsível para o autor desse facto.
Se a responsabilidade depender da culpa do lesante, é imprescindível a previsibilidade
do facto constitutivo de responsabilidade., visto essa previsibilidade constituir parte
integrante do conceito de negligência, em qualquer das modalidades que esta pode
revestir.
Mas já não se exige que sejam previsíveis os danos subsequentes.
Essencial é apenas que o facto constitua em relação a estes uma causa (objectivamente)
adequada.
Segundo esta teoria, a distinção entre danos indemnizáveis e danos não indemnizáveis
deve ser feita, não em obediência ao pensamento da causalidade adequada do facto, mas
tendo em vista os reais interesses tutelados pelo fim do contrato, no caso da
responsabilidade contratual, ou pelo fim da norma legal no caso da responsabilidade
extracontratual.
119
Nestes moldes, a questão da determinação do nexo de causalidade acaba por se
reconduzir a um problema de interpretação do conteúdo e fim específico da norma que
serviu de base à imputação dos danos.
Para o jurista, é esta a melhor forma de determinação do nexo de causalidade, pois que a
obrigação de reparar os danos causados constitui uma consequência jurídica de uma
norma relativa à imputação de danos, o que implica que a averiguação do nexo de
causalidade apenas se possa fazer a partir da determinação do fim especifico e do
âmbito de protecção da norma que determina a consequência jurídica.
Faz-se apelo ao prognóstico objectivo que, ao tempo da lesão (ou do facto), em face das
circunstâncias então reconhecíveis ou conhecidas pelo lesante, seria razoável emitir
quanto à verificação do dano.
A indemnização só cobrirá aqueles danos cuja verificação era lícito nessa altura prever
que não ocorressem se não fosse a lesão.
Portanto, o autor da lesão (do facto) só será obrigado a reparar aqueles danos que não se
teriam verificado sem esse facto e que, abstraindo deste, seria de prever que não se
tivessem produzido.
Como refere Menezes Leitão, a causa virtual verifica-se sempre que o dano resultante
da causa real se tivesse igualmente verificado, na ausência desta, por via de outra causa,
denominada de causa virtual.
O jurista refere ainda que seria possível conceber três soluções jurídicas para esta
questão:
120
1) Relevância positiva da causa virtual – segundo esta, o autor da causa virtual
seria responsável pelo dano nos mesmos termos que o autor da causa real.
Antunes Varela é peremptório. Nota o jurista que, apesar de haver um facto ilícito (por
via de regra uma omissão) que actuou como causa real, operante, do dano. O agente é
isento de responsabilidade por exclusiva consideração da causa virtual do mesmo efeito
danoso.
Para o autor, bem como para a doutrina maioritária (ao invés de Pessoa Jorge), tratam-
se de normas excepcionais, que, em princípio, não comportam aplicação analógica.
Em todos os casos nelas previstos, concorrem para a produção do dano, não só o facto
(presuntivamente culposo) da pessoa em princípio responsável, mas também o facto de
terceiro (naturalmente incapaz) ou um facto acidental (sismo, explosão, etc.)
circunstancias que justificam o tratamento excepcional que a lei lhes concede.
121
Se a lei dá relevância à causa virtual em situações especificas, é como um causa
suplementar de exclusão da responsabilidade, que concede em situações restritas de
responsabilidade agravada.
Titularidade do direito à indemnização
Ex. A foi atropelado por B e sofreu ferimentos. Será este obrigado a indemniza-lo do
dano que lhe causou. Mas já não será obrigado a indemnizar C, dono do teatro onde A
deveria actuar na noite do acidente.
Não há, no nosso sistema, um direito à integridade do património, cuja violação possa
assegurar a indemnização.
É aos danos assim causados a terceiros, sem violação de nenhuma relação negocial ou
para-negocial e sem infracção de nenhum dever geral de abstenção ou omissão, que na
doutrina germânica se tem dado o nome de danos patrimoniais puros – e que não
encontram, por razões obvias cobertura directa, nem na responsabilidade extracontratual
nem na responsabilidade contratual.
Tanto o art.495º nº3 (danos patrimoniais) como o art.496º nº 2 (danos não patrimoniais),
podem dar lugar a dúvidas de interpretação e de aplicação pratica que cumpre examinar.
122
Quanto aos danos não patrimoniais, é liquido que apenas têm direito à indemnização os
familiares destacados no nº2 do art.496º, como liquido é também que os familiares do 2º
grupo (os ascendentes) só terão direito à indemnização se não houver cônjuge nem
descendente da vitima.
O facto de a lei afirmar que a indemnização cabe em conjunto, ao cônjuge e aos
descendentes da vitima não impede que o tribunal discrimine, como alias é seu dever, a
parte da indemnização que concretamente cabe a cada um dos benefícios, de acordo
com os danos por eles sofridos.
Serem chamados em conjunto significa apenas que os descendentes não são chamados
só na falta do cônjuge, como sucede com os beneficiários do 2º e 3º grupos, para os
quais vigora o princípio do chamamento sucessivo.
Fixou-se o prazo de prescrição em três anos, a contar do momento em que o lesado teve
conhecimento do seu direito, ou seja, a partir da data em que ele, conhecendo a
verificação dos pressupostos que condicionam a responsabilidade, soube ter direito à
indemnização pelos danos que sofreu.
Na intenção de aproximar a data de apreciação da matéria em juízo do momento em que
os factos se verificaram, a lei tornou o inicio do prazo independente do conhecimento da
extensão integral dos danos, podendo o lesado formular um pedido genérico de
indemnização, cujo montante exacto será nesse caso definido no momento posterior da
execução da sentença, quando não seja possível determinar logo a extensão exacta do
dano.
A lei tornou também o início da contagem do prazo independente do conhecimento da
pessoa do responsável.
123
Dos danos que cada um sofra na sua esfera jurídica só lhe será possível ressarcir-se à
custa de outrem quanto àqueles que, provindo de facto ilícito, sejam imputáveis à
conduta culposa de terceiro. Os restantes, quer provenham de caso fortuito ou de força
maior, quer sejam causados por terceiro, mas sem culpa do autor, terá de suporta-los o
titular dos bens ou direitos lesados (casum sentit dominus, res perit dominus).
Quem utiliza em seu proveito coisas perigosas, quem introduz na empresa elementos
cujo aproveitamento tem os seus riscos; quem cria ou mantém um risco em proveito
próprio, deve suportar as consequências prejudiciais do seu emprego, já que dele colhe
o principal beneficio (ubi emolumentum, ibi onus; ubi commodum ibi incommodum)
quem aufere os lucros da exploração industrial, justo é que suporte os encargos dela,
entre os quais se inscreve, como fenómeno natural e inevitável, o dos acidentes no
trabalho.
Como faz notar Menezes Leitão, o risco consiste num outro título de imputação de
danos, que se baseia na delimitação de um certa esfera de riscos pela qual deve
responder outrem que não o lesado.
Essa esfera de riscos pode ser estabelecida através de diversas concepções que por vez
se cumulam entre si.
a) Concepção do risco criado – cada pessoa que cria uma situação de perigo deve
responder pelos danos que resultem dessa situação.
124
O nosso direito adoptou uma concepção restritiva da responsabilidade pelo risco,
consagrando taxativamente a sua admissibilidade apenas nos casos previstos na lei
(art.483º nº2), o que tem vindo a funcionar como um travão ao desenvolvimento
jurisprudencial neste direito.
Em face do CC, são consideradas como situações de responsabilidade pelo risco:
Não se trata de uma presunção de culpa que ao comitente incumba elidir para se eximir
à obrigação de indemnizar; trata-se de a responsabilidade prescindir da existência de
culpa, nada adiantando, por isso, a prova de que o comitente agiu sem culpa ou de que
125
os danos se teriam igualmente registado, ainda que não houvesse actuação culposa da
sua parte.
No entanto, apesar da culpa do comitente não ser requisito essencial da
responsabilidade, pode influir no regime dela.
Caso haja culpa, tanto do comitente como do comissário, qualquer deles responde
solidariamente perante o lesado, mas o encargo da indemnização será depois repartido
entre eles (art.497º nº2 e 500º nº3 in fine), na proporção das respectivas culpas.
Havendo só culpa do comitente, apenas ele será obrigado a indemnizar, nos termos da
responsabilidade por factos ilícitos.
Caso haja culpa do comissário, o comitente que houver pago poderá exigir dele a
restituição de tudo quanto haja pago (art.500º nº3).
Como nota Menezes Leitão, esta responsabilidade objectiva apenas funciona na relação
com o lesado (relação externa), já que posteriormente o comitente terá na relação com o
comissário (relação interna) o direito de exigir a restituição de tudo quanto pagou, salvo
se ele próprio tiver culpa.
Pode por isso dizer-se, que esta responsabilidade tem por função especifica a garantia
do pagamento da indemnização ao lesado, dada a circunstancia de os comissários serem
pessoas normalmente desprovidas de património susceptível de suportar o pagamento
de elevadas indemnizações e actuando eles no interesse e por conta do comitente, deve
caber a este garantir ao lesado a indemnização.
Em consequência, a lei atribui ao lesado um pretensão directa contra o comitente, que
pode exercer isolada ou cumulativamente com a pretensão de indemnização que
adquiriu contra o comissário.
126
num acto isolado como numa função duradoura, ter carácter gratuito ou oneroso,
manual ou intelectual.
A comissão pressupõe uma relação de dependência entre o comitente e o comissário,
que autorize aquele a dar ordens a este, pois só essa possibilidade de direcção é capaz de
justificar a responsabilidade do comitente pelos actos do comissário.
A relação de subordinação pode ter carácter permanente ou duradouro, como quando
provem de um contrato de prestação continuada ou periódica; ou ser puramente
transitória, ocasional, limitada a actos materiais ou jurídicos de curta duração.
Casos há em que não existe inteira liberdade de escolha quanto à pessoa que realiza a
incumbência, ou em que o interessado delega noutra pessoa o encargo da escolha e,
todavia, se não pode duvidar da existência da comissão, por funcionar em pleno a
relação de subordinação ou dependência entre comitente e comissário.
b) Pratica do facto ilícito no exercício das funções – segundo o art.500º nº2, só existe
responsabilidade do comitente se o facto danoso for praticado pelo comissário no
exercício da função que lhe foi confiada, não importando que intencionalmente ou
contra as instruções daquele.
A razão deste requisito é clara; se a imputação ao comitente se justifica por ele ter
confiado ao comissário uma função que lhe cabia desempenhar, não deve a sua
responsabilidade extravasar da função que foi efectivamente confiada, funcionando esta
como delimitação da zona de riscos a cargo do comitente.
Para Antunes Varela, a lei, com a fórmula restritiva que adoptou, quis afastar da
responsabilidade do comitente os actos que apenas têm um nexo temporal ou local com
a comissão, isto é, o caso de o facto ter sido praticado no lugar ou no tempo em que é
executada a comissão, mas nada ter que ver com o desempenho desta, a não ser
porventura a circunstancia de o agente aproveitar as facilidades que o exercício da
comissão lhe proporciona para consumar o facto.
No entanto, nota ainda Antunes Varela que o facto de a responsabilidade do comitente
subsistir, ainda que o comissário proceda intencionalmente ou contra as instruções dele,
mostra que houve a intenção de abranger todos os actos compreendidos no quadro geral
da competência ou dos poderes conferidos ao dito comissário.
Menezes Leitão considera que a interpretação restritiva deste requisito, que considera
que a expressão “no exercício da função”, exclui os danos causados por ocasião da
função com um fim ou interesse que lhe seja estranho, exigindo-se assim um nexo
instrumental entre a função e os danos. Retira grande parte do alcance à
127
responsabilidade do comitente, e não tem suporte legal, já que a lei apenas se refere à
causação de danos no exercício da função, não exigindo também que os danos sejam
causados por causa desse exercício.
Por outro lado, incluem-se na responsabilização os danos intencionais e os danos
causados em desrespeito das instruções, em relação aos quais seguramente se poderia
sempre falar de um desvio aos fins pelos quais foi conferida a comissão.
Com efeito, para Menezes Leitão, será suficiente um nexo etiológico entre a função e os
danos, no sentido de que seja no exercício daquela que estes sejam originados.
Efectivamente, tirando o comitente proveito da função exercida pelo comissário, é justo
que responda por todos os danos que o comissário causa a outrem enquanto exerce essa
função.
Porque razão pode o comitente ser obrigado a indemnizar, sem ter agido com culpa?
Invoca-se uma consideração de natureza análoga à que serve de base ao regime especial
da responsabilidade em acidentes de trabalho: Se o comitente se serve de outra pessoa
para a realização de certo acto, colhendo as vantagens dessa utilização, é justo que sofra
também as consequências prejudiciais dela resultantes (cuius commoda eius
incommoda).
No entanto, esta razão, conquanto não seja descabida, não chega para explicar todo o
regime fixado na lei, visto que o comitente (ao invés da entidade patronal e do detentor
do veiculo) não suporta definitivamente o peso da indemnização.
Ele goza, em princípio do direito de regresso contra o comissário, para se ressarcir de
quanto haja pago (art.500º nº3).
128
b) Gozam seguidamente do direito de regresso contra o autor dos danos, a menos
que haja também culpa da sua parte.
Cabe, nesta sede, distinguir actos de gestão pública de actos de gestão privada.
Actos de gestão privada – aqueles que, embora praticados pelos órgãos, agentes ou
representantes do estado ou de outras pessoas colectivas públicas, estão sujeitos às
mesmas regras que vigorariam para a hipótese de serem praticados por simples
particulares.
São actos em que o estado ou a pessoa colectiva pública intervém como um simples
particular, despido do seu poder de imperium.
O art.502º refere-se aos danos causados por animais, mas estabelecendo, desta feita, um
princípio de responsabilidade objectiva (na medida em que a obrigação de indemnizar
não assenta necessariamente no pressuposto culpa) a cargo do respectivo utente.
É quanto a estes últimos que tem inteiro cabimento a ideia do risco: quem utiliza em seu
proveito os animais, que, como seres irracionais, são quase sempre fonte de perigos,
mais ou menos graves; deve suportar as consequências do risco especial que acarreta a
sua utilização.
Normalmente este fundamento da responsabilidade atinge o proprietário ou aqueles que,
como o usufrutuário ou o possuidor, têm um direito real de gozo sobre o animal (nada
impedindo que o utente do animal seja um incapaz). Porém, se o dono o ceder por
empréstimo a outrem, também o comodatário o utiliza em seu proveito, sendo justo que
responda pelos danos que a utilização do animal venha a provocar.
Já não responderá, entretanto, nos termos do art.502º a pessoa a quem o dono do animal,
tendo que ausentar-se, pediu que o guardasse.
129
Se o animal é alugado, a sua utilização passa a fazer-se tanto no interesse do locador
(que percebe a respectiva retribuição), como no do locatário que directamente se serve
dele no seu interesse, devendo ambos considerar-se responsáveis perante o terceiro
lesado.
O achador do animal perdido também não respondera pelos danos que ele causar,
enquanto se não decidir a utiliza-lo como seu.
Mesmo quando a causa próxima do dano seja um caso fortuito ou de força maior (ex. o
trovão que espanta o cavalo) o um facto de terceiro (ex. pessoa que açula o cão), a
responsabilidade do utente do animal persiste, desde que os danos verificados
correspondam ao perigo próprio da utilização do animal.
Também no domínio dos acidentes de viação, ou seja no capítulo dos danos causados
por veículos de circulação terrestre, vigora o princípio da responsabilidade objectiva,
fundada no risco.
Como nota Menezes Leitão, temos uma responsabilidade objectiva do utilizador de
veículos, limitada aos riscos próprios do veículo, responsabilidade essa que, em relação
a veículos a motor, reboques ou semi-reboques, a lei obriga que seja previamente
garantida por um seguro de responsabilidade civil automóvel, sem o que o próprio
veiculo não pode sequer circular.
Em regra, o responsável é o dono do veículo, visto ser ele a pessoa que aproveita as
especiais vantagens do meio de transporte e quem correlativamente deve arcar com os
riscos próprios da sua utilização.
130
Porém, se houver um direito de usufruto sobre a viatura, ou se o dono tiver alugado ou
emprestado o veiculo, ou se este lhe tiver sido furtado ou for abusivamente utilizado
(pelo motorista por exemplo), já a responsabilidade objectiva do dono se não justifica, à
luz dos bons princípios.
a) Direcção efectiva do veículo – nos termos do ar.503º, responde pelos danos que o
veiculo causar, quem tiver a direcção efectiva deste e o utilizar no seu próprio interesse.
A formula “ter a direcção efectiva” destina-se a abranger todos aqueles casos
(proprietário, usufrutuário, locatário, comodatário, adquirente sob reserva, autor do
furto do veiculo, etc.) em que, com ou sem domínio jurídico, parece justo impor a
responsabilidade objectiva a quem usa o veiculo ou dele dispõe.
Tratam-se das pessoas a quem especialmente incumbe, pela situação de facto em que se
encontram investidas, tomar as providências adequadas para que o veículo funcione sem
causar danos a terceiros.
A direcção efectiva é o poder real (de facto) sobre o veículo, mas não equivale à ideia
grosseira de “ter o volante nas mãos” na altura em que o acidente ocorre. Constitui o
elemento comum a todas as situações referidas, sendo a falta dele que explica ao mesmo
tempo, nalguns casos, a exclusão da responsabilidade do proprietário.
Tem a direcção efectiva do veículo a pessoa que de facto goza ou usufrui as vantagens
dele, e a quem, por essa razão, especialmente cabe controlar o seu funcionamento.
Dá-se o nome de detentor a quem tem a direcção efectiva do veículo.
Já não responde objectivamente, por lhe faltar a direcção efectiva do veículo, o
passageiro que se serve do táxi.
É neste sentido que o requisito deve ser entendido, e não na acepção de que o detentor
do veículo só responde se, no momento do facto danoso, o veículo estiver a ser utilizado
no seu interesse (imediato ou exclusivo).
131
Responsabilidade do comissário
Havendo culpa dele (porque se faz prova nesse sentido ou porque ele não consegue
elidir a presunção legal que tem contra si) responderão solidariamente, perante o
terceiro lesado, o condutor e o detentor do veículo, tendo este, se pagar, direito de
regresso contra aquele, nos termos do art.500º nº3.
A primeira parte do nº3 do art.503º estabelece uma presunção de culpa (abrangida pela
ressalva do art.487º nº1) do condutor do veículo por conta de outrem, pelos danos que
causar. Aplicável nas relações entre ele, como lesante, e o titular ou titulares do direito
de indemnização.
Sendo o veiculo conduzido pelo comissário, presume-se ser dele a culpa no acidente
que cause dano a terceiro, ao invés do que sucede no caso de a viatura ser conduzida
pelo próprio dono, em que a prova da culpa incumbe ao lesado (art.342º nº1).
132
Os comissários ou condutores de veículos por conta de outrem são na generalidade dos
casos, os camionistas das empresas, os chauffeurs particulares contratados, os
motoristas de táxi pertencentes a outra pessoa.
2 – Além disso, os condutores por conta de outrem são, por via de regra condutores
profissionais; pessoas de quem se deve exigir perícia especial na condução e que mais
facilmente poderão elidir a presunção de culpa com que a lei os onera, quando nenhuma
culpa tenham tido na verificação do acidente.
O condutor por conta própria não é abrangido pela presunção de culpa estabelecida no
art.503º; em contrapartida, encontra-se sujeito ao regime da responsabilidade objectiva
traçado no nº1 do art.503º e no art.505º.
Goza, é certo, do benefício dos limites máximos fixados no art.508º para a
responsabilidade sem culpa, cujo montante deve obviamente ser actualizado de iure
condendo, em função da desvalorização da moeda.
Caso o acidente se verifique, quando o comissário utilizar o veículo fora das sua
funções (contra a vontade do detentor ou sem ela) passa o condutor a responder
independentemente de culpa (nos termos do art.503º nº1). Ainda que habitualmente o
conduza por conta de outrem, art.503º nº3 in fine.
Se o veiculo circula contra ou sem a vontade do detentor, por ter sido abusivamente
utilizado, não há fundamento para lhe assacar a responsabilidade, visto ter sido para
afastar a responsabilidade do dono ou do utente do veiculo em casos desse tipo que no
nº1 do art.503º se pôs a obrigação de indemnizar a cargo de quem tenha a direcção
efectiva do veiculo.
133
Por um lado não há nenhum facto ilícito da sua parte; por outro, os danos havidos não
devem ser considerados como efeito adequado do acto de negligência que lhe é
imputável – ex. O detentor do veículo deixa-o aberto sendo-lhe o carro furtado.
Se, pelo contrário, o veículo for utilizado com autorização do detentor, que o aluga
ou empresta, a situação é diferente.
No caso de a pessoa responsável ter feito com uma seguradora, um contrato de seguro
par cobertura da sua responsabilidade civil em face de terceiro, terá a pessoa segurada o
direito de exigir que a seguradora assuma a obrigação de indemnização.
O seguro refere-se à pessoa que na apólice figura como assegurada, e não à própria
viatura. Além disso, a obrigação da seguradora só se concretizará se a pessoa segurada
usar do seu direito, salvo se o seguro for obrigatório, como hoje sucede com a
responsabilidade civil perante terceiros.
Danos indemnizáveis
Os danos que o responsável terá de indemnizar são os que tiverem como causa jurídica
o acidente provocado pelo veículo.
Há, porém, quanto aos danos causados por veículos, uma directriz especial.
É que a responsabilidade objectiva se estende apenas aos danos provenientes dos riscos
próprios do veículo, mesmo que este não se encontre em circulação (art.503º nº1).
134
Dentro da fórmula legal cabem tanto os danos provenientes dos acidentes provocados
pelo veículo em circulação, como os causados pelo veículo estacionado.
Quanto ao veículo em circulação, tanto faz que ele circule em via publica, aberta ao
trânsito em geral, como em qualquer recinto privado. E pouco importa mesmo que o
veículo circule fora de qualquer via, como o jeep que circula sobre terrenos que outras
viaturas não podem percorrer.
Beneficiários da responsabilidade
Tanto ás pessoas, como às coisas, transportadas mediante contrato são sem dúvidas
aplicáveis, quer as regras da responsabilidade próprias do contrato de transporte, quer os
princípios validos para a responsabilidade fundada na culpa, se ilicitamente for violado
algum dos direitos ou dos interesses legalmente protegidos dessas pessoas.
Mas não lhes será também aplicável o regime da responsabilidade objectiva que
vigora a favor de terceiros?
Entendeu-se, com fundadas razões, que assim como responde perante terceiros pela
conservação e bom funcionamento do veículo, o dono ou condutor deve oferecer um
garantia bastante próxima quanto às pessoas transportadas e quanto às coisas que elas
levem consigo.
A ideia fundamental em que assenta a teoria do risco aproveita assim às pessoas
transportadas mediante o respectivo contrato, em termos bastante próximos daqueles em
que se aplica a terceiros atingidos pelo veículo.
135
Pessoas transportadas gratuitamente
1 – ao lesado ou a terceiro
2 – ou quando resulte de causa de força maior estranha ao funcionamento do veiculo.
A questão principal reside, como nota Menezes Leitão, na hipótese de, não se
demonstrando a culpa do condutor, a culpa do lesado concorrer com o risco próprio do
veiculo.
136
Parece que neste caso, será excluída a responsabilidade do condutor do veiculo, não só
porque aponta nesse sentido o art.505º, mas também porque, em face do art.570º nº2, a
culpa do lesado exclui o dever de indemnizar em caso de culpa presumida, pelo que não
faria sentido que tal não sucedesse perante a responsabilidade pelo risco.
No que concerne a terceiro, também não se exigirá um acto culposo da sua parte,
bastando que um facto que a ele respeite seja considerado a única causa do dano em
termos tais que não se possa atribuir este a risco próprio do veiculo.
Caso haja culpa concorrente do condutor com a responsabilidade do terceiro, ambos
responderão solidariamente perante o lesado (art.497º e SS).
A colisão de veículos
É muito frequente, é matéria de acidentes de viação, a colisão de veiculo, que tanto pode
dar-se pelo choque quando ambos estão em circulação, como pelo abalroamento do
veiculo que esteja parado ou afrouxe a velocidade por outro em marcha.
2 – se apenas um é culpado, ainda que por culpa presumida e não elidida – apenas esse
responde pelos danos que causou, quer em relação ao dano do veiculo danificado, quer
em relação às pessoas transportadas num ou noutro veiculo e ás coisas neles
transportadas, quer em relação a outras pessoas ou coisas.
Caso não haja culpa de nenhum dos condutores, duas situações diferentes se podem ter
registado:
137
1 – apenas um dos veículos causa danos ao outro – neste caso, apenas o detentor do
veiculo causador de danos é obrigado a indemnizar na sequencia da teoria do risco, que
domina a matéria.
2 – ambos os veículos concorrem para o acidente – sendo os danos causados por ambos
os veículos, quer eles se estendam aos dois, quer atinjam um só, e não havendo culpa de
nenhum dos condutores, três soluções podem ser avançadas:
Pluralidade de responsáveis
Pode suceder que várias pessoas sejam responsáveis, perante os lesados, pelos danos
que eles sofreram.
Se o acidente não envolveu a culpa do condutor mas o veiculo pertencia a duas ou mais
pessoas, serão estas as responsáveis pelos danos causados, se não se verificar nenhuma
das causas de exclusão da responsabilidade.
Os danos podem ser causados em terceiros pela colisão de dois veículos. Neste caso,
perante o terceiro lesado, ambos os detentores dos veículos são responsáveis, quer haja,
quer não haja culpa do condutor, contanto que nesta ultima hipótese existam os
pressupostos da responsabilidade objectiva (art.507º nº1).
138
Em que termos se processa a responsabilidade?
Sendo certo que nestes casos não há direito, por parte do lesado, a duas ou mais
indemnizações, mas apenas a uma embora com diversos fundamentos.
1) se apenas um dos responsáveis teve culpa no acidente, o outro que pagou terá
direito de regresso contra ele pela totalidade (art.507º nº2 e 497º nº2) tendo o
culpado pago a indemnização, nenhum direito de regresso terá contra o outro
responsável.
Concorrência de responsabilidades
Há que distinguir, nesse aspecto, entre o plano das relações externas (relação entre cada
um dos responsáveis e o lesado) e o domínio das relações internas (relações entre os
dois ou mais responsáveis).
No plano das relações externas – dois pontos são aceites como líquidos pela doutrina e
pela jurisprudência.
1 - Os dois ou mais responsáveis pelo risco respondem solidariamente pelos danos que
o lesado tenha sofrido. A medida especial de protecção concedida pelo art.507º à vitima
que visa garantir os lesados contra as dificuldades de cobrança da indemnização de
algum dos responsáveis, tem pleno cabimento no caso de concorrência da
responsabilidade da entidade patronal com a do detentor do veiculo.
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O lesado poderá exigir a reparação dos danos acusados pelo acidente, seja da entidade
patronal, invocando o facto de ter sido atingido em serviço, seja do condutor ou do
detentor do veiculo, como responsáveis pelo risco da utilização deste.
No domínio das relações internas – há uma assinalável diferença de plano entre as duas
responsabilidades. Se é o detentor do veiculo quem espontaneamente ou a requerimento
do lesado paga a indemnização devida, nenhum direito lhe competirá contra a entidade
patronal.
Se pelo contrario a indemnização for paga, no todo ou em parte, pela entidade patronal,
ficará esta sub-rogada nos direitos do sinistrado.
A diversidade de tratamento revela que a lei não coloca no mesmo plano os dois riscos
com os quais o dano se relaciona.
O risco próprio do veiculo causador do acidente funciona como causa mais próxima do
dano do que o perigo inerente à laboração da entidade patronal.
Contrato de seguro – é o negocio jurídico pelo qual uma das partes (a seguradora) se
obriga a cobrir o risco que certo facto, futuro e incerto (o sinistro), constitui para a outra
parte ( o segurado) mediante a prestação certa e periódica (premio) que esta se
compromete a efectuar.
Este foi criado pelo decreto regulamentar 58/79 de 25 de Setembro e mantido pelo DL
522/85.
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A instituição do FGA representa um novo passo em frente no sentido da plena e efectiva
cobertura da indemnização devida às vitimas dos acidentes de viação.
Trata-se de acudir aos casos em que, como muitas vezes sucede, o responsável pelo
acidente não é conhecido (ex. Atropelamento e fuga), ou em que o condutor não tem
contrato de seguro valido ou a seguradora abre falência.
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