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Em 1967, pouca gente sabia o que a expressão capital de risco - ou, no inglês, venture
capital- significava ao certo. Mas foi exatamente neste ano que um visionário
chamado Arthur Rock tirou US$ 10 mil do próprio bolso, e arranjou US$ 2,5 milhões
com outros investidores, para ajudar dois sócios a fundar uma fábrica de circuitos
eletrônicos na Califórnia. Mais tarde, aquele projeto passaria a produzir uma peça
hoje conhecida como o cérebro dos computadores, o microprocessador, e a empresa
seria a líder deste segmento. Estamos contando a história da Intel, um bem-sucedido
case de venture capital, nascido de um projeto escrito numa única folha de papel, com
nove frases e três erros de digitação.
Quase quarenta anos depois, esses antigos visionários - agora chamados de venture
capitalists - conquistaram seu espaço no mundo das finanças. Só no Brasil, a
Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP) reúne 50
gestores de fundos que injetam recursos em empresas iniciantes ou em
desenvolvimento, esperando colher, no momento de sua venda, um retomo para lá de
apetitoso. Como conseguem isso? Não é uma tarefa fácil. No sonho de se depararem
com um diamante para ser lapidado, esses profissionais fazem de tudo para encontrar
negócios que, se não repetirem a façanha da descoberta de Arthur Rock, pelo menos
alcancem um naco do sucesso da gigante de tecnologia.
Ora, a proporção de dois empreendimentos aprovados num grupo de 300 não revelaria
um rigor exagerado por parte dos capitalistas brasileiros? Nem sempre, segundo
revela o presidente da ABVCAP, Marcus Regueira. O que acontece é que há poucos
fundos com esse perfil no Brasil. "Isso faz com que os gestores se tomem mais
elitistas", explica ele. É bem possível que existam entre os 258 projetos desperdiçados
pelo caminho boas oportunidades de negócios. Contudo, pelo fato de o País ainda
atrair poucos recursos voltados a esse tipo de investimento, muitas empresas são
deixadas de lado quando disputam a atenção com outras mais preparadas para
competir.
Basicamente, são cinco itens dos quais os gestores não abrem mão de contar num
empreendimento: ser um negócio financeiramente saudável. pertencer ao setor que
caracteriza o perfil do fundo (tecnologia, varejo, serviços etc.), demonstrar grande
capacidade de geração de caixa, ter uma equipe de bons gestores e, por fim, aceitar o
preço oferecido pelo fundo por uma participação acionária na empresa. "Sem essa
lista estar completa, dificilmente um contrato é assinado", acrescenta Regueira, que
também está à frente da FIR Capital.
Até este esperado momento acontecer, pode-se dizer que os gestores dos fundos
venture capital passam por uma verdadeira saga na qual não faltam histórias curiosas
e projetos sem pé nem cabeça. Em busca de algumas delas, a reportagem da Capital
Aberto pesquisou o que quatro gestores de venture capital, nacionais ou com
escritórios no Brasil, já encontraram pela frente. E descobriu que não é impossível,
por exemplo, deparar-se com cartas escritas a lápis ou batidas à máquina em busca do
dinheiro do fundo. Uma delas era de uma mãe pedindo recursos para abrir uma escola
infantil e dando como garantia sua prática para cuidar de crianças. Outro projeto
oferecia a oportunidade de o fundo comprar um terreno que, segundo as fontes do
vendedor; estaria bastante visado por uma igreja interessada em construir no local.
Na lista das idéias, digamos, um tanto extravagantes, merece destaque ainda uma
fábrica de cadeiras para grávidas que desejam fazer o parto de cócoras e um air bag
para motocicletas. Porém, de todos os projetos citados, o primeiro lugar no quesito
inusitado era justamente aquele que pedia um investimento, mas não contava para
qual finalidade. De acordo com o autor da revolucionária engenhoca, era necessário
manter o segredo do projeto, pois, caso contrário, "o fundo poderia roubar a sua
invenção".
Na Confrapar, o foco está no capital semente. Segundo seu diretor executivo Carlos
Guillaume, “Viemos ao mercado preencher essa lacuna. Estamos onde o
empreendedor mais precisa de capital: no começo.” A Confrapar investe apenas em
projetos de tecnologia da informação e comunicação que representam um alto
potencial de crescimento e demandam recursos inferiores a R$1M. “Atuar em
projetos, empresas que ainda não possuem receitas é ainda mais desafiador. É preciso
conhecer muito bem o mercado em que se atua, pois as possibilidades para a empresa
nascente são muitas. Pelo mesmo motivo, para a Confrapar, a equipe é a parte mais
importante do plano de negócios. Podemos mudar a direção do negócio, os
empreendedores não.”
Por fim, o quarto gestor ouvido pela reportagem foi Rodin Spielmann, diretor da
IdeiasNet. A própria holding de tecnologia contou com a ajuda de um fundo de
investidores para ser lançada, abrir o capital e estrear na bolsa no ano 2000. Para
formar a empresa, seus fundadores tiveram de escolher entre centenas de propostas
dos mais diferentes tipos, despejadas diariamente em sua mesa entre 1998 e 1999, no
final do boom da intemet. "Havia situações em que era preciso conversar com os pais
do empresário, porque se tratava de um menino menor de idade."
Quando o venture capitalist gosta do que vê, ele corre atrás de informações adicionais
como, por exemplo, a situação de seus fornecedores. Nessa primeira diligência, não é
raro alguns negócios serem descartados por conta de dividas judiciais, informalidade e
sonegação de impostos detectadas em alguma etapa da cadeia de produção. Também
acontece de a empresa estar 100%enxuta, mas não receber o aval dos analistas por
serem percebidas grandes chances de ela ser abatida pela concorrência. Encaixam-se
aí os projetos na área de serviços e varejo que não sobreviveriam a uma briga com as
grandes companhias do setor.
Porém, se tudo correu bem até este momento, o venture capitalist começa a discutir o
preço para a compra de uma determinada participação no negócio. Há fundos que
preferem ser majoritários - para dar o tom à gestão do empreendimento dali em diante
- e outros que gostam de ter uma participação fora do bloco de controle, pois
entendem o quanto a liderança do sóciofundador é importante para a empresa naquela
fase.
Cumpridas todas essas etapas, isto é, depois de quatro ou cinco meses de namoro, o
casamento é feito e o contrato, assinado. Os gestores do fundo injetam o capital
combinado e passam a acompanhar o negócio, seja através de um ou mais
conselheiros na administração, ou mesmo com um executivo na presidência. A seguir,
vem a chamada fase de maturação, quando a companhia começa a ganhar corpo e
engordar o caixa. Só esse periado leva, em média, de quatro a seis anos. Por fim,
quando acharem que a empresa está pronta para andar com as próprias pernas, ela será
oferecida a potenciais compradores e o fundo terá ou não o retorno do investimento
feito lá atrás.
A porta de saída aberta pela bolsa de valores, porém, vem gerando um efeito que, de
certa forma, muda a essência dos fundos venture capital. Atentos a essa promissora
oportunidade de liquidez, eles começam a procurar empresas que tenham a
capacidade de, alguns anos à frente, faturar no mínimo R$ 100 milhões por ano -
patamar de referência para uma empresa estar habilitada a lançar ações na bolsa.
Fundos como os da Eccelera, Intel Capital, Advent e a própria IdeiasNet passaram a
exigir, nos últimos dois anos, um limite mínimo de faturamento, de acordo com o
ramo do negócio, para iniciarem uma conversa com o empreendedor. Seria uma forma
de migrarem para investimentos de private equity - cuja característica é exatamente a
aposta em negócios mais estruturados-.