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10 • Brasília, quarta-feira, 12 de novembro de 2008 • CORREIO BRAZILIENSE

REFÉNS DO ABANDONO 8

Monique Renne/CB/D.A Press

Lares miseráveis
Ronaldo de Oliveira/CB/D.A Press Monique Renne/CB/D.A Press

MÃE COM AS DUAS FILHAS EM ZONA


DE PROSTITUIÇÃO DE NATAL:
CRIANÇA DE SEIS ANOS BRINCA
ENTRE AS MULHERES QUE FAZEM
PROGRAMA NA CAPITAL POTIGUAR

EM PADRE PARAÍSO, MINAS


GERAIS, CINCO IRMÃS SE
PROSTITUEM À BEIRA DA
ESTRADA: “A GENTE FAZ PISTA
PARA GANHAR ALGUM DINHEIRO”

Monique Renne/CB/D.A Press


EM ÁREAS DE m uma casa de taipa, com ra do Partners of the Americas delas pensa em buscar outro ti-

EXTREMA POBREZA,
A EXPLORAÇÃO
E esgoto a céu aberto cor-
rendo pela porta, uma
menina de 13 anos obser-
va a barriga e os seios que come-
çam a crescer. Ela está grávida,
(Companheiros das Américas).
Onde há miséria, existe ex-
ploração sexual. Mas não são
todas as pessoas pobres que se
entregam a essa realidade. Para
po de renda. Jéssica, de 23 anos,
explica a lógica financeira do
negócio: “Emprego aqui não pa-
ga mais do que R$ 100 por mês,
é menos do que a gente ganha
SEXUAL PASSA A SER mas não sabe há quanto tempo. os especialistas, a diferença está em dois dias de pista”. Enquanto
Aparenta ter cerca de quatro me- na valorização familiar e na so- as filhas vão para a estrada, a
O VÍNCULO ENTRE ses de gestação, mas nunca foi lidez dos laços comunitários. “A mãe delas toma conta dos netos.
MÃES E FILHAS. ao médico e não tem a menor auto-estima das famílias, a cria- Mônica tem um bebê de apenas
idéia de como vai cuidar da ção de oportunidades de renda, um mês. O de Melissa tem um
AÇÕES PARA EVITAR criança. Sara foi vítima de explo- a educação das meninas e me- ano e cinco meses.
ração sexual e hoje não vislum- ninos são capazes de evitar que Aliada à pobreza, a falta de es-
A DEGRADAÇÃO bra nenhuma perspectiva de fu- eles se entreguem à explora- trutura familiar contribui para
turo. Está longe da escola desde ção”, afirma a socióloga Améri- que meninos e meninas sejam ví-
MORAL o início do ano, espera um filho e ca Ungaretti, consultora da timas da exploração sexual. Em
ninguém de sua família está em- ABMP. “Mas, para desenvolver Natal, na praça Gentil Ferreira,
DECORRENTE DA pregado. O Bolsa Família, única um ambiente assim, são uma criança de apenas seis anos
fonte de renda da casa, foi can- necessárias políticas públicas e brinca entre as prostitutas que fa-
PROSTITUIÇÃO SÃO celado quando a adolescente ações comunitárias”, completa. zem programa no local. Gabriela
EXCLUSÃO PRATICAMENTE abandonou os estudos. nunca foi à escola e tinha um
A casa de Sara, no subúrbio Irmãs na pista enorme roxo no olho esquerdo
SOCIAL INEXISTENTES. de Mamanguape, interior da Pa- No município de Padre Paraíso, no dia em que o Correio a entre-
raíba, é um retrato de sua famí- em Minas Gerais, seis irmãs repe- vistou. A mãe da menina, Valquí-
lia. O local miserável tem pare- tem a sina da paraibana Sara. ria, de 34 anos, se prostitui há
Ronaldo de Oliveira/CB/D.A Press des em ruínas. O teto quebrado Com idades entre 18 e 26 anos, mais de dez anos na capital poti-
e repleto de teias de aranha não todas ganham o pão na BR-381, guar. A filha mais velha, Carla, de
protege os moradores. É uma ti- conhecida como Rio/Bahia. O di- 17 anos, também vende o corpo
ra de lona que segura parte da nheiro obtido na pista serve para Ilusão perigosa pelas ruas de Natal. Valquíria e
água em dias de chuva. Comida, alimentar as onze crianças da fa- Segundo Carla chegam à praça todos os
a família só tem quando ganha mília. Melissa e Mônica, as duas especialistas, dias às 8h. “Não tenho ninguém
doações. “Não sei como a gente mais novas, foram as primeiras a algumas famílias que possa cuidar da menina. Mi-
sobrevive. Passei a minha vida transformar o sexo com cami- vêem a prostituição nha mãe é muito doente. Tenho
trabalhando em canavial e ago- nhoneiros em fonte de renda. Co- como uma forma de que trazer a Gabriela junto com a
ra estou desempregada, passan- meçaram ainda meninas, aos 13 melhorar de vida. gente”, justifica Valquíria.
do fome”, reclama a mãe de Sa- anos. “No começo, era uma brin- “Os pais acham que, Enquanto Valquíria e Carla
ra, uma mulher de 43 anos que cadeira. Depois, a gente foi se entregando as filhas oferecem o corpo para os moto-
aparenta ser duas décadas mais acostumando”, conta Melissa, gê- para aliciadores, ristas que passam, Gabriela tenta
velha. Diante de tanta miséria, a mea de Mônica. elas terão uma se divertir no pequeno canteiro
garota foi em busca de dinheiro Apesar do barraco de tábuas oportunidade de da Gentil Ferreira. Se a mãe e a ir-
nas ruas. Fazia programas em em que a família mora, as seis ir- ascender social e mã saem para fazer programa, a
boates e postos de gasolina lota- mãs estão vestidas com roupas economicamente. menina de seis anos fica com as
Sexo, merla e café dos de caminhoneiros. da moda. “Aqui não tem empre- Acreditam que a dezenas de prostitutas que circu-
O sistema pensado para pro- go, a gente faz pista para ganhar exploração sexual lam pela praça. A situação da me-
Moradora da cidade paraense de Breves, na região das ilhas do
teger as vítimas não dá conta de algum dinheiro”, reclama Paula, pode oferecer nina assustou até mesmo as edu-
Marajó, Ana, de 15 anos, vende o corpo para marinheiros de
oferecer ações integradas, preser- de 26 anos, a mais velha. Mãe de chances de ganhar cadoras sociais do município.
passagem pela região. Depois de cada programa, a menina magricela dinheiro que elas
var as famílias e afastá-las da ex- quatro crianças e separada do “Como vamos saber se esta me-
parte em busca da merla oferecida por traficantes do município.“Eu jamais terão”, afirma
ploração sexual. “O abuso acon- pai dos filhos, Paula diz que não nina não é abusada? Se a família
quero largar, mas não sei como fazer”, diz ela, que tem a ponta dos Vera Rodrigues, do
tece em todas as classes sociais. teria como manter a família de inteira faz programa, nada garan-
dedos manchada de amarelo e vive com os cinco irmãos e a mãe em Mas a exploração está intima- outra maneira. Na BR-381, o projeto Escola que te que a mãe não receba dinheiro
um barraco a poucos metros do porto onde se prostitui. A mãe da mente ligada à vulnerabilidade preço do programa varia entre Protege, vinculado para permitir que a filha menor
adolescente explorada vende cafezinhos durante o dia para os social das famílias”, explica a so- R$ 15 e R$ 20. Com ganho médio ao MEC. seja tocada”, diz a educadora so-
mesmos homens que violam o corpo da filha durante a noite. cióloga Graça Gadelha, consulto- de R$ 50 por noite, nenhuma cial Maria Lúcia Faustino Silva.

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8. A ponta da exploração o local com maior movimento de turistas da
Conteúdo especial:
A praia de Ponta Negra,uma das mais famosas do cidade,meninas de áreas carentes circulam pela Reportagem extra sobre o fenômeno
Brasil,ainda é o principal ponto de exploração praia em busca de clientes.Muitas jantam com os da interiorização da exploração sexual
sexual de Natal.O vaivém de adolescentes e visitantes em restaurantes de luxo instalados à
Podcast:
aliciadores diminuiu com a instalação de beira da praia.Todas as noites,a kombi dos Professora da UnB, Maria Lúcia Leal
câmeras de segurança ao longo da avenida Beira assistentes sociais cruza Ponta Negra e os explica como a exploração chegou ao
Mar,mas os crimes persistem.Como Ponta Negra é profissionais abordam meninas. interior do país

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