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Instituto de Pesquisa

Prefeitura de Cuiabá Matogrossense

UFMT
Grupo de Pesquisa:
Cartografia Geotécnica e
Dinâmica Superficial

CARACTERIZAÇÃO E DELIMITAÇÃO
CARTOGRÁFICA DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO
PERMANENTE (APP’S) E DE ZONAS DE INTERESSE
AMBIENTAL (ZIA’S) NA ÁREA URBANA DE CUIABÁ.

Agosto de 2008
CARACTERIZAÇÃO E DELIMITAÇÃO CARTOGRÁFICA DAS ÁREAS
DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP’S) E DE ZONAS DE
INTERESSE AMBIENTAL (ZIA’S) NA ÁREA URBANA DE CUIABÁ.

EQUIPE TÉCNICA

Prudêncio Rodrigues de Castro Jr.1


(Coordenação) – Geólogo, CREA 10.790/D,
MSc. Em Educação e Meio Ambiente,
Doutor em Geografia Física

Fernando Ximenes de Tavares Salomão2


Geólogo, CREA/NAC: 260.446.719-4, MSc.
em Geologia Geral e de Aplicação, Doutor
em Geografia Física.

Letícia Thommen Lobo Paes de Barros3


Engº Agrônomo. MSc. Ecologia e
Conservação da Biodiversidade.
CREA/NAC:120.210.247-6.

Elder de Lucena Madruga4


Geólogo. CREA/NAC:120.133.804-2, MSc.
em Agricultura Tropical, Doutorando em
Engª. de Transportes; Bacharel em Direito.

Lélis Nogueira Gonzaga5


Geólogo. CREA/NAC: 120.213.714-8.
Especialista em Pedologia.

Eliane Salete Sartor Cavalheiro6


Licenciada em Geografia – Especialista em
Georeferenciamento em imóveis rurais.

1
Departamento de Geologia Geral da Universidade Federal do Mato Grosso
2
Departamento de Geologia Geral da Universidade Federal de Mato Grosso
3
Instituto de Pesquisa Matogrossense
4
Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de Mato Grosso
5
Instituto de Pesquisa Matogrossense
6
Instituto de Pesquisa Matogrossense
1

SUMÁRIO

Pág

1. INTRODUÇÃO ................................................................................. 1

2. METODOLOGIA ............................................................................... 3

3. ASPECTOS GERAIS DO MEIO FÍSICO E DOS PROCESSOS DE


DEGRADAÇÃO AMBIENTAL ................................................................... 5

3.1. Aspectos climáticos ............................................................. 5

3.2. Aspectos geológicos ............................................................ 8

3.3. Solos e a interpretação integrada do meio físico frente aos


processos de degradação ........................................................... 11

4. DEFINIÇOES LEGAIS E CONCEITOS TÉCNICOS .................................. 20


5. IDENTIFICAÇÃO E MAPEAMENTO DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO
33
PERMANENTE E DE ZONAS DE INTERESSE AMBIENTAL .........................
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................. 40

6.1. Mapa síntese das ocorrências de áreas de preservação


permanente e de zonas de interesse ambiental ............................ 41

6.2. Diretrizes para minuta de lei ................................................ 43

7.BIBLIOGRAFIA ................................................................................. 46

LEGENDA DE FIGURAS

Figura 1 – Balanços hídricos das Estações Meteorológicas de Cuiabá e Coxipó da


Ponte, municípios de Várzea Grande e Cuiabá/MT. Fontes: IBGE (1989) e Nimer
& Brandão, (1989) ......................................................................................... 6

Figura 2 – Balanço hídrico das Estações Meteorológicas de Cuiabá e Coxipó da


Ponte. Municípios de Várzea Grande e Cuiabá/MT. Fontes: IBGE (1989) e Nimer
& Brandão (1989 ........................................................................................... 7

Figura 3 – Exposição de metatarenito e filito, em detalhe, o contato da


intercalação entre ambos. Cuiabá, MT ............................................................. 9

Figura 4 – Foto da esquerda, aspecto da foliação do filito. Foto da direita,


detalhe de fraturas em corte de estrada. Cuiabá, MT........................................ 9

1
2

Figura 5 – Aspectos dos veios de quartzo muito fraturados e orientados


segundo a direção NW-SE, recortando rochas do Grupo Cuiabá formadas
localmente, por metarenitos intercalados por filitos, em área degradada por
garimpo, bacia do ribeirão do Lipa, no entorno do aterro sanitário de Cuiabá ..... 10

Figura 6 – Aspecto da vegetação de Cerrado em linha de talvegue efêmera, em


ambiente dissecado da porção centro sul da malha urbana de Cuiabá ............... 12

Figura 7 – Na parte superior imagem do Google Earth com indicação do


talvegue do córrego Canjica afluindo para o córrego Barbado. Esta indicado as
posições das tomadas fotográficas a, b, c e d: (a) setor de cabeceira do córrego
Canjica ocupado; (b) local de lançamento de águas pluviais e servidas; (c)
grande erosão na área de agradação, que ainda hoje é faiscada por
garimpeiros; (d) faixa de APP ocupada por residências do bairro Canjica, que
contribuem com o lançamento de águas servidas ........................................... 14

Figura 8 – Na parte superior imagem do Google Earth com indicação do


talvegue de um córrego afluente do ribeirão do Lipa e o contorno da área
brejosa (linha branca). Foto “a” vista da cabeceira degradada; foto “b” vista do
canal erodido; foto “c” vista do canal assoreado; foto “d” vista, em primeiro
plano, da área brejosa e ao fundo local em que será lançada as águas da
galeria pluvial ............................................................................................... 16

Figura 9 – Fotografias mostrando situações em várias APP’s de cursos d’água


que sofreram alterações por uso e ocupação, e hoje, funcionam como drenos
de esgotos e de águas servidas, em cujas margens são comuns as espécies
ruderais, cidade de Cuiabá/MT ....................................................................... 25

Figura 10 – Quintais arborizados de moradias voltados para a rua, onde corre a


céu aberto, esgoto e água servida, em antiga linha de talvegue efêmera.
Cuiabá/MT .................................................................................................... 27

Figura 11 – Quintal de moradia zelada como área verde, à semelhança de um


Jardim Japonês, recortado por água servida e de esgoto, proveniente dos
setores de montante, onde certamente deveria haver uma linha de talvegue
efêmera. Bairro Jd. Fortaleza, Cuiabá/MT ........................................................ 28

Figura 12 – Ao fundo, campo de futebol no entorno de linha de talvegue, onde


o remanescente de vegetação natural (em último plano), propicia
sombreamento para expectadores do jogo ...................................................... 28

Figura 13 – Foto superior: vista geral de área de lazer e esportes à margem


esquerda do córrego Gambá, na altura do Bairro do Areão. Ao lado, outro
ângulo dessa mesma área, onde se encontra o quiosque para atividades físicas . 29

Figura 14 – Área conservada por moradores em parceria com o colégio Portal,


onde se desenvolve linha de drenagem efêmera, situada à montante de
nascente hoje alterada pela presença de esgoto. Bairro Jd. Itália, Cuiabá/MT .... 29

2
3

Figura 15 – Zia’s definidas pela Lei Complementar 103 de 05/12/2003 para o


município de Cuiabá/MT ................................................................................ 32

Figura 16 – Mapa-índice destacando as cartas que cobrem a malha urbana da


cidade de Cuiabá. Essas cartas compreendem mosaicos formados, em geral, por
seis fotos aéreas cada ................................................................................... 33

Figura 17 – Perfil de Gleissolo, em destaque, horizonte A formado por


sedimentos tecnogênicos (assoreamento) e horizonte Ab (A enterrado),
recoberto por vegetação secundária de sistemas ribeirinhos do córrego
Barbado, setor centro norte de Cuiabá/MT ...................................................... 34

Figura 18 – Perfil de Gleissolo, em destaque, horizonte A formado por


sedimentos tecnogênicos (assoreamento) e horizonte Ab (A enterrado),
recoberto por vegetação secundária de sistemas ribeirinhos do córrego
Barbado, setor centro norte de Cuiabá/MT ...................................................... 35

Figura 19 - (a) Detalhe da coleta de amostra do horizonte Bt de Planossolo. (b)


Cores acinzentadas indicando hidromorfismo em Planossolo. Condomínio
Belvedere, Cuiabá/MT .................................................................................... 35

Figura 20 – Detalhe do horizonte Cg, de Gleissolo, onde as cores acinzentadas


mostram a condição de ferro na forma reduzida, próprio de ambiente saturado
em água ....................................................................................................... 35

Figura 21 – Delimitação da Área de Interesse Ambiental, Nascentes do Córrego


Baú, incluindo a área degradada do antigo bairro Águas Nascentes, que foi
transferido pela Prefeitura Municipal ............................................................... 37

Figura 22 – Delimitação da Área de Interesse Ambiental, Barra do rio Coxipó,


que sofre transbordamentos sazonais anuais no período das chuvas ................. 37

Figura 23 – Delimitação da Área de Interesse Ambiental, cujo remanescente de


vegetação forma um continuum na paisagem, incluindo a APP do rio Coxipó, a
qual está sendo proposta para a criação do Parque Municipal Avenida das
Torres .......................................................................................................... 38

Figura 24 – Em vermelho, as ZIA’s definidas neste estudo para a criação de


Parques, e em amarelo, os Parques já existentes no município de Cuiabá/MT .... 39

3
1

1. INTRODUÇÃO
O presente relatório atende a serviços contratados pela Secretaria Municipal de Meio
Ambiente e Urbanismo (SMADES) de Cuiabá em parceria com empresários desta
Capital, mediante convênio de cooperação mútua celebrado entre o Instituto de
Pesquisa Matogrossense – IPEM e o município de Cuiabá, com execução a cargo do
Grupo de Pesquisa Cartografia Geotécnica e Dinâmica Superficial da UFMT7, tendo por
objetivo geral identificar, caracterizar e mapear as Áreas de Preservação Permanente
(APP), bem como propor Zonas de Interesse Ambiental (ZIA), dentro da área
urbanizada de Cuiabá, com base em critérios técnicos estabelecidos.

Mais especificamente, o trabalho visa:

a) analisar a legislação vigente relacionada ao meio ambiente no perímetro urbano de


Cuiabá, no que diz respeito a APP’s e ZIA’s;

b) interpretar fotografias aéreas do levantamento realizado em 2005, e cedidas pela


Prefeitura de Cuiabá para a prévia identificação das APP’s;

c) realizar levantamentos de campo voltados à identificação e caracterização das


nascentes, cursos d’água, ZIA’s e alterações antrópicas;

d) elaborar um mapa síntese, identificando e delimitando as Áreas de Preservação


Permanente (APP’s) associadas a nascentes e cursos d’água, e áreas a serem
consolidadas como Zonas de Interesse Ambiental (ZIA’s); e

e) elaborar o relatório contemplando os produtos cartográficos, textos explicativos, e


minuta de lei, para consubstanciar uma proposta de delimitação das APP’s de nascentes
e cursos d’água e das ZIA’s.

A ocupação irregular de APP’s (Áreas de Preservação Permanentes) constitui-se numa


realidade em todo Brasil. Essa ocupação se dá não apenas com intervenções e obras
privadas, mas também por ações públicas, muitas das vezes autorizadas e fiscalizadas
pelos órgãos competentes. As ocupações ditas clandestinas, na maioria das vezes
conduzidas por famílias de baixa renda, historicamente se dão sob o olhar de
impotência e até de indiferença do poder público.

As raízes dessa ocupação ilegal estão calcadas na falta de planejamento e fiscalização


adequados, na pobreza, na ignorância, no descrédito quanto às funções e importância
das APP’s dos recursos ambientais que elas devem proteger, dentre outros. Deve-se
ainda considerar outro fator interveniente e de suma importância, que é são os conflitos
de interpretação e aplicação da legislação vigente no com conserte às Áreas de
Preservação Permanente em áreas urbanas.

7
Registrado no Diretório dos Grupos de Pesquisa do Brasil junto ao CNPq e credenciado pela
Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT.
1
2

Portando, o presente trabalho visa contribuir na elucidação de dúvidas quanto à real


localização das Áreas de Preservação Permanente de nascentes e cursos d’água, bem
como analisar as chamadas Zonas de Interesse Ambiental instituídas pela Lei
Complementar nº 044, de 23 dezembro de 1997, com base em critérios técnicos
estabelecidos no âmbito do projeto. Os trabalhos realizados demonstraram que a
delimitação de APP’s por sensoriamento remoto, sem trabalhos de campo que
identifique e interprete o funcionamento da dinâmica hídrica na formação de nascentes
e dos cursos d’água, sejam perenes ou intermitentes, pode levar a interpretações
equivocadas quanto à existência e aos limites de APP’s.

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2. METODOLOGIA
A execução do projeto obedeceu à orientação principal de oferecer as informações
concernentes ao meio ambiente, necessárias para a caracterização e delimitação
cartográfica das Áreas de Preservação Permanente (APP) e das Zonas de Interesse
Ambiental (ZIA) da área urbanizada de Cuiabá, que foram consolidadas em formato
analógico na escala 1:10.000, direcionada para a correta administração do uso e
ocupação do espaço urbano, priorizando os aspectos relativos ao risco quanto aos
processos de dinâmica superficial, bem como o mapeamento das áreas legalmente
protegidas e as de interesse ambiental.

Levando-se em consideração as APP’s e ZIA’s da área urbana de Cuiabá, e o universo


de modificações examinadas, a metodologia adotada no sentido de se obter um
produto de aplicação dos conhecimentos no processo de planejamento socialmente
responsável e ao mesmo tempo eficaz, obedeceu os seguintes procedimentos:

1) Reconhecimento e mapeamento das características de interesse do meio ambiente


através da busca orientada das informações acerca das APP’s e das ZIA’s considerando:

a) Operações de coleta e análise de dados disponíveis (cartográficos, bibliográficos e


informações de profissionais e do público em geral);
b) Interpretação de fotografias aéreas coloridas, na escala de 1:2.000, cenas obtidas
no ano de 2005, correspondente a parte da área urbana de Cuiabá. Foram utilizadas
como ferramentas auxiliares plantas planialtimétricas, em escala de 1:10.000, com
curvas de nível espaçadas de 1 metro, e fotos aéreas pancromáticas, na escala de
1:25.000, obtidas pela Esteio Engenharia e Aerolevantamentos SA, vôo de maio de
1983, correspondente ao levantamento aerofotogramétrico da região urbana de Cuiabá,
bem como fotos pancromáticas na escala de 1:8.000 obtidas junto ao INPE em julho de
1988 pela Prefeitura Municipal de Cuiabá.
c) Produção de uma base cartográfica na escala de 1:2.000, com todos os cursos
d’água, arruamentos e delimitação das ZIA’s atuais, tendo como fundo as fotografias
aéreas da cidade.
d) Trabalho de campo, executado com a finalidade de: a) verificar as informações
obtidas pela interpretação de fotografias aéreas; b) levantar e diagnosticar os
problemas existentes ou esperados pela ocupação; c) identificar a ocorrência de
nascentes e cursos d’água; d) observar a situação das APP’s ao longo do curso d’água e
nascentes; e) identificar e analisar as Áreas de Interesse Ambiental - ZIA’s,
anteriormente definidas por lei; e, f) delimitar no mapa síntese, as unidades definidas
como nascentes, cursos d’água, APP’s e ZIA’s.

2) Determinação das unidades territoriais cartografadas, utilizando-se de uma carta


base plani-altimétrica de Cuiabá, na escala de 1:10.000, com curvas de nível
eqüidistantes de 1m. Apoiando-se nas informações obtidas pela fotointerpretação e as
observações de campo, procedeu-se à elaboração de produtos cartográficos
digitalizados e georreferenciados por meio do programa Arc View.

3) Apresentação dos resultados de forma a dar acesso facilitado das informações


obtidas ao público interessado: técnicos de outras especialidades, administradores
3
4

públicos, e a qualquer cidadão que se interesse por estas informações. O produto


cartográfico, propriamente dito, requer o domínio mínimo de técnicas de representação
cartográfica ligadas à perspectiva de reprodução gráfica para uma perfeita divulgação
do material. O registro das diversas operações realizadas e materiais empregados é
fundamental para a retomada dos trabalhos e os necessários detalhamentos e
atualizações.

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5

3. ASPECTOS GERAIS DO MEIO FÍSICO E DOS PROCESSOS DE


DEGRADAÇÃO AMBIENTAL
O presente capítulo procura ilustrar o ambiente e as condicionantes em que está
inserida a área urbana de Cuiabá quanto aos aspectos do seu meio físico,
condicionantes fundamentais à ocorrência de nascentes e cursos d’água, de maneira a
se melhor compreender a dinâmica das águas pluviais e do lençol freático, e seu
comportamento quando às intervenções antrópicas.

São apresentados aspectos do clima, geologia, solos e relevos dentro de uma visão de
análise integrada voltada ao entendimento do comportamento da dinâmica das águas.

3.1. Aspectos climáticos


O clima regional, conforme o modelo de Thornthwaite, tem como principal característica
regional a sazonalidade, fator essencial para a sua classificação. Assim, Cuiabá
encontra-se sob a influência regional de regime pluviométrico tipicamente tropical, com
dois períodos sazonais: um chuvoso, de novembro a março, com cerca de 80% da
precipitação anual, e outro seco, de abril a outubro, sendo o inverno coincidente com
esse período, com as quedas acentuadas de temperaturas e precipitações pequenas ou
quase nulas, nos meses de junho e julho.

De acordo com o IBGE (1989) e Nimer & Brandão (1989), as Estações de Cuiabá,
localizada em Várzea Grande, e de Coxipó da Ponte (bairro Coxipó), encontram-se no
âmbito da Baixada Cuiabana, em cotas altimétricas de 172m e de 150m,
respectivamente, cujos balanços hídricos sazonais são representativos não só para a
cidade da Cuiabá, como também, para a região do médio curso do rio Cuiabá.

A zona climática é do tipo C2wA’a’, conforme IBGE (1989) e Nimer & Brandão (1989),
Figura 1, e enquadra-se no grupo Úmido (C2- da classe subúmido - úmido, com
moderados excessos na estação úmida e moderado déficit na seca, apresentando o
índice de umidade efetiva entre 0-20); com variação sazonal (w- mas, com moderado
déficit de água no inverno, sendo o índice de aridez entre 16,7-33,3); o clima é
megatérmico, do ponto de vista termal (A’- apresentando valores de eficiência térmica
anual, que é dada pela evapotranspiração potencial, entre 1.495mm e 1.397mm); além
disso, tem o índice de concentração da eficiência térmica no verão com valor de 48%
(sendo portanto do tipo – a’).

A precipitação efetiva anual ser negativa e o clima ser do tipo subúmido úmido, com
moderados excessos de água na estação úmida (verão) e moderado déficit na estação
seca (quando ocorre o inverno), implica em se ter uma estação de excesso que não é
muito úmida e uma estação de déficit que não é muito seca.

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6

Figura 1 – Balanços hídricos das Estações Meteorológicas de Cuiabá e Coxipó da Ponte, municípios de Várzea Grande e
Cuiabá/MT. Fontes: IBGE (1989) e Nimer & Brandão, (1989).
6
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De acordo com o gráfico da Figura 2, o balanço hídrico sazonal mostra os valores


limites de excedentes e déficits hídricos e a reposição e retirada de água nos solos.

Figura 2 – Balanço hídrico das Estações Meteorológicas de Cuiabá e Coxipó da Ponte.


Municípios de Várzea Grande e Cuiabá/MT. Fontes: IBGE (1989) e Nimer & Brandão (1989).

De maio a agosto inicia-se a estação de insuficiência de precipitação, que tem duração


de sete meses (abril/outubro). Contudo, apesar da forte redução das chuvas, o primeiro
mês de precipitação efetiva negativa, tem um déficit de água pouco aquém da
necessidade potencial. Além disso, o volume estocado nos solos, ao findar o mês de
março, não permite que o mês de abril seja caracterizado por carência de água,
embora o runoff sofra rápida desativação.

Ao se iniciar em maio a estação de déficits, com forte redução da precipitação, ela não
é suficiente para criar valores elevados negativos, em virtude do decréscimo paralelo da
evapotranspiração potencial e conseqüentemente, em maio, o déficit é ainda pequeno.
Só a partir de junho, quando os solos estão quase inteiramente exauridos de água e a
precipitação quase nula, os déficits para as plantas se tornam importantes,
principalmente entre agosto e setembro (70mm em média a cada mês), sendo esses os
mais secos do ano e juntamente com outubro, formam o trimestre das maiores
vazantes dos rios.

O retorno das chuvas em outubro traz volume de precipitação equivalente ao da


necessidade ambiental, porém os solos sedentos de água, não permitem, geralmente,
formação de excedentes, persistindo até janeiro, quando a reposição de água nos solos
e o acréscimo considerável das chuvas fazem iniciar a estação de excesso hídrico;
motivo pelo qual as maiores vazantes dos rios têm também alguma possibilidade de se
verificarem em novembro ou dezembro.

No período seco, os déficits são de 306 mm na Estação de Cuiabá e, de 244 mm, em


Coxipó da Ponte, enquanto que na estação chuvosa os excessos são moderados
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atingindo, respectivamente, 186mm e 179mm. Assim, ao final de um ano, para ambas


estações meteorológicas, verifica-se um déficit de precipitação que varia entre 120mm
e 65mm, em relação à necessidade potencial.

Tal fato evidencia uma adaptação das formações vegetacionais naturais em termos de
requerimento de água, face à sazonalidade climática regional o que resulta em ajustes
ecofisiológicos, que são transmitidos geneticamente aos descendentes. Por isso, as
espécies do Cerrado da Baixada Cuiabana são fortemente aptas à suportarem elevados
graus de estresses hídricos, baixa capacidade edáfica dos solos, sendo de alta
rusticidade e alta resiliência, em função das alterações da própria dinâmica superficial,
do balanço morfogênese/ pedogênese, etc.

Assim, o excesso de água no solo e nos cursos d’água da região, pode indicar por um
lado, a época de maior vulnerabilidade ao desenvolvimento de processos erosivos e por
outro, a intensificação da lixiviação de produtos químicos. Enquanto que o déficit de
água implica em se elevar a concentração de produtos químicos, quer sejam os
utilizados na agricultura, fertilizantes, agrotóxicos, etc., quer sejam aqueles de uso
doméstico (desinfetantes, detergentes, e outros), e que, em últimas instâncias, são
conduzidos através de águas servidas e lançados na rede de drenagem principalmente
da malha urbana, o que certamente resulta em necessidade de ações eficientes de
saneamento público.

3.2. Aspectos geológicos


A área urbana de Cuiabá encontra-se regionalmente inserida na seqüência de
metassedimentos detríticos do Pré-Cambriano Superior que constitui o Grupo Cuiabá,
sendo representado por rochas metamórficas de baixo grau de metamorfismo, que
apresentam variedade litológica, desde filitos sericíticos, metarenitos, metarcósios,
metaconglomerados, metaparaconglomerados petromíticos, além de calcários e
margas. Essas litologias, por vezes, apresentam-se recobertas por sedimentos
cenozóicos.
Os filitos e metarenitos, que têm maior expressão na área urbanizada, assumem por
vezes, aspecto ardosiano e a distinção dos planos de acamamento, na maioria das
vezes, em virtude dos esforços que as metamorfisaram e dobraram, são de difíceis
visualizações, sendo, no entanto notados, quando da presença de intercalações (Figura
3).
Tanto os filitos como os metarenitos encontram-se intensamente dobrados, foliados,
fraturados (Figura 4), e com ocorrência abundante de quartzo ao longo dos planos de
foliação, de direção geral de NE para SW (Figura 5).

Ocorrem ainda, associado a ambientes de sedimentação quaternária, litologias


formadas essencialmente por materiais finos, silte, argila e areia, e secundariamente,
por materiais mais grosseiros, cascalhos, calhaus, matacões, além de concreções
ferruginosas. Os depósitos mais antigos encontram-se parcialmente litificados,
enquanto que os mais recentes estão inconsolidados.
9

Metarenito Filito

Figura 3 – Exposição de metatarenito e filito, em detalhe, o contato da intercalação entre


ambos. Cuiabá, MT.

Figura 4 – Foto da esquerda, aspecto da foliação do filito. Foto da direita, detalhe de fraturas
em corte de estrada. Cuiabá, MT.
10

Figura 5 – Aspectos dos veios de quartzo muito fraturados e orientados segundo a direção NW-
SE, recortando rochas do Grupo Cuiabá formadas localmente, por metarenitos intercalados por
filitos, em área degradada por garimpo, bacia do ribeirão do Lipa, no entorno do aterro
sanitário de Cuiabá.

A Baixada Cuiabana (Almeida, 1964), também denominada Depressão Cuiabana (Ross


& Santos, 1982 apud RADAMBRASIL, 1982), faz parte da Morfoestrutura
Metassedimentar do Grupo Cuiabá e constitui uma superfície arrasada gerada a partir
do rebaixamento do nível de base regional, com a instalação da Bacia Sedimentar do
Pantanal. Apresenta tanto formas colinosas de relevo, como de topos tabulares
elaboradas por processos de dissecação, com diferentes intensidades de
aprofundamento de drenagem e comprimento de interflúvios entre 750 e 1.750 metros,
podendo também desenvolver formas de agradação por acumulações fluviais em
fundos de vales associados ao comportamento hídrico das drenagens, podendo ocorrer
ainda, planícies flúvio-lacustres (rios meandrantes), diques marginais, terraços aluviais,
dentre outros.

No âmbito da Depressão Cuiabana também se verificam áreas micro-deprimidas entre


as colinas e formas de relevos residuais, estes, representados por morros e morrotes
que marcam faixas de maiores declividades dando aspecto mais aguçado às colinas.
Regionalmente, essas formas de relevo residual encontram-se alinhadas acompanhando
preferencialmente as zonas de ocorrência de veios de quartzo, sendo este e a presença
de crostas lateríticas, os fatores principais mantenedores das ondulações do relevo.

Essa dinâmica superficial regida por erosão diferencial com notório incremento das
ações intempéricas sobre os materiais menos resistentes, e a preservação daqueles de
maior resistência, resulta na ocorrência comum de morrotes, regionalmente
denominados “cocurutos”, emergindo das formas de relevo colinosas da Depressão
Cuiabana com cotas altimétricas médias entre 150 e 200 metros.
11

3.3. Solos e a interpretação integrada do meio físico frente aos


processos de degradação
A cobertura pedológica tem como regra geral a ocorrência de solos rasos, formados
principalmente por Neossolos Litólicos e Plintossolos Concrecionários associados
preferencialmente às superfícies elaboradas por dissecação, representadas pelas formas
de relevo colinoso e morrotes, enquanto que os Planossolos, Plintossolos e Gleissolos
(Glei Pouco Húmico) associam-se ao ambiente de agradação nas porções inferiores das
vertentes e fundo de vale.

Os solos hidromórficos, desenvolvidos no ambiente agradacional, quando ainda não


alterados e não descaracterizados pela ocupação desordenada, comumente observado
por apresentar lençol freático a pequena profundidade durante período seco do ano,
sub-aflorante a aflorante durante períodos chuvosos, devem ser mantidos em estado
natural para a conservação desse ambiente de dinâmica sedimentar ativa.

A interpretação integrada do meio físico permitiu, assim, identificar, na área urbana de


Cuiabá, a existência de dois compartimentos morfopedológicos distintos entre si, mas
de gênese interativa: Compartimento Morfopedológico em Ambiente de Dissecação e
Compartimento Morfopedológico em Ambiente de Agradação; entendendo-se por
Compartimento Morfopedológico área relativamente homogênea, especialmente em
relação aos aspectos litológicos, geomorfológicos e pedológicos e de cobertura vegetal,
resultando em determinando funcionamento hídrico (Salomão, 1994; Castro e Salomão,
2000).

O Compartimento Morfopedológico resultante de processos de dissecação com


predomínio de colinas e morrotes, associa-se principalmente a Neossolos Litólicos,
sendo recobertos por Savana Gramíneo-Lenhosa (Campo Limpo) quando raso e se a
rocha é quase aflorante a condição é ainda mais restritiva para o estabelecimento de
plantas de grande porte.

Porém, quando os solos tornam-se um pouco mais profundos, principalmente quando


os Neossolos Litólicos se desenvolvem sobre cascalheiras e no filito conglomerático, a
vegetação essencialmente campestre passa para Savana Arborizada (Cerrado) ou para
Savana Florestada (Cerradão), preferencialmente na forma de capões, sendo esta
última, numa mistura comum com elementos de Floresta Estacional. Os talvegues nos
ambientes dissecados apresentam-se com estreitas faixas de maior umidade, não
permitindo, em regra, a instalação de Mata Ciliar, senão de vegetação campestre com
algumas espécies lenhosas ou mesmo com vegetação de Cerrado em faixas de solos
relativamente mais profundos (Figura 6).

Esses talvegues funcionam naturalmente como drenos coletores e condutores de


excedentes de águas pluviais, formando linhas de drenagem que geralmente não estão
associadas a nascentes. Essas linhas de drenagem em ambiente de dissecação, sem
presença de nascente, mas tão somente formadas pelo escoamento superficial
concentrado de águas pluviais, são classificadas como drenagens efêmeras (Bigarella,
2003). Toda a rede de drenagem situada em ambiente de dissecação, ou seja,
12

associadas aos terrenos mais declivosos, conduzem os sedimentos que se desagregam


por processos erosivos até locais micro-deprimidos ao longo dessas linhas de
drenagem, que funcionam como pontos de redução de velocidade de escoamento, até
atingir o compartimento morfopedológico de ambiente agradacional, onde são
depositados, preferencialmente, os sedimentos mais finos.

Figura 6 – Aspecto da vegetação de Cerrado em linha de talvegue efêmera, em ambiente


dissecado da porção centro sul da malha urbana de Cuiabá.

O uso e a ocupação das áreas de dissecação, que amplamente prevalecem com


distribuição areal na paisagem, interferem fortemente na dinâmica das águas pluviais e
no equilíbrio naturalmente existente com as áreas de agradação situadas nas porções
mais rebaixadas.

O processo de ocupação da área urbana de Cuiabá deu-se, e continua a acontecer,


predominantemente sem planejamento ou com planejamento não adequado às
necessidades de manutenção do equilíbrio ambiental que permita a conservação das
nascentes e dos córregos, sejam perenes ou intermitentes.

As galerias de águas pluviais, que deveriam drenar as águas de chuva das áreas
ocupadas e depositá-las de forma disciplinada e controlada ao longo dos talvegues
naturais, constituem-se em um dos principais veículos da degradação e destruição de
nascentes e de córregos. A prática de lançamento de águas servidas e de esgoto nas
redes de drenagem pluvial é uma realidade de conhecimento geral, que dá às
drenagens efêmeras e intermitentes aspectos de drenagens perenes.

Anteriormente à ocupação, nos períodos chuvosos, os excedentes hídricos que não


eram retidos pela vegetação e que infiltravam nos solos, desciam de forma difusa pelas
13

vertentes ou em baixos volumes através dos canais efêmeros até alcançarem os


córregos e brejos.

A ocupação urbana, retirando a vegetação e impermeabilizando o solo, resultou em


aumento de volume de águas que escoam pela superfície, seja na forma de enxurrada
pelas ruas ou concentradas pela rede de águas pluviais. Na medida em que se
encaminham para os pontos mais baixos da área ocupada, essas águas vão se
concentrando e avolumando até atingirem os locais de lançamento nos talvegues
naturais.

Os volumes de águas lançadas de forma concentrada e incompatível com a capacidade


de suporte dos terrenos, misturados às águas servidas e de esgoto, atingem
desastradamente os cursos d’água naturais, gerando erosão, assoreamento, poluição e
contaminação. Esses processos vêm causando a extinção de nascentes e a
efemerização de córregos.

As Figuras 7 e 8 apresentam exemplos de dois locais em que distintos processos de uso


e ocupação do setor de cabeceira, e a posterior introdução de obras de drenagens
pluvial, causaram e continuam causando, ou contribuindo, para a degradação
ambiental.

Na Figura 7, as fotos mostram aspectos do córrego Canjica, no bairro Aclimação. Esse


córrego tem seu trecho inicial em ambiente de dissecação, sendo que o talvegue atual
possui comprimento de aproximado de 120 metros, passando para ambiente de
agradação, que se encontra parcialmente ocupada em suas bordas. A ocupação inicial
da cabeceira do córrego Canjica, sem os cuidados necessários ao controle dos
processos erosivos, resultou em forte assoreamento na área de agradação.

O setor mais alto da microbacia (área de cabeceira) foi seccionada pela avenida
Historiador Rubens de Mendonça e ocupada por grandes edificações. Não é possível
saber se havia nascente nesse setor (Figura 7 “a”).

Uma rede de drenagem pluvial foi implantada na área ocupada, na qual a saída d’água,
na forma de bueiro duplo, situado a uma distância aproximada de 90 metros da
avenida, (Figura 7, foto “b”), lança as águas (de chuva, servidas e de esgoto)
diretamente sobre o talvegue do córrego.

Nos períodos chuvosos o volume de águas que sai dos bueiros, sem cuidados com a
distribuição de volumes e dissipação de energia, provocou a erosão do canal natural na
área de dissecação, e também da área de agradação, seccionando todo pacote de
assoreamento anteriormente depositado, o solo hidromórfico e a parte superior do
substrato rochoso alterado (Figura 7, foto “c”).
14

(a) (b)

(c) (d)
Figura 7 – Na parte superior imagem do Google Earth com indicação do talvegue do córrego
Canjica afluindo para o córrego Barbado. Esta indicado as posições das tomadas fotográficas a,
b, c e d: (a) setor de cabeceira do córrego Canjica ocupado; (b) local de lançamento de águas
pluviais e servidas; (c) grande erosão na área de agradação, que ainda hoje é faiscada por
garimpeiros; (d) faixa de APP ocupada por residências do bairro Canjica, que contribuem com o
lançamento de águas servidas.
15

A Figura 8 ilustra exemplo de córrego, afluente do ribeirão do Lipa, em processo de


efemerização. Sua área de cabeceira foi alvo de garimpo no passado recente que,
juntamente com processos erosivos que se sucederam durante e após a paralisação da
atividade, destruiu nascentes que provavelmente existiam (já que na área predominam
metarenitos) como também o canal natural do curso d’água.

A foto “a”, da Figura 8, mostra a área de cabeceira dessa drenagem fortemente


degradada. A foto “b” o canal fortemente erodido com afloramento de água. A foto “c”
mostra o início da área de agradação com espesso assoreamento do canal que
anteriormente havia sido entalhado pela erosão. Com isso, o trecho inicial do córrego,
com um comprimento de aproximadamente 500 metros, foi efemerizado (transformado
em curso d’água efêmero devido a processos de degradação), ou seja, já não possui
nascentes e por ele flui apenas águas de chuva.

A área de agradação deste córrego forma um campo úmido que se estende até o
ribeirão do Lipa, num comprimento aproximado de 850 metros. Esse trecho do córrego,
importante para a equilíbrio hidrológico da rede hidrográfica, encontra-se em processo
de degradação, tanto pela ocupação do entorno, com aterramentos, como por ruas que
o seccionam e interferem no fluxo natural das águas, tanto em superfície como em
subsuperfície pela compactação do solo.

Observa-se que processos erosivos vêm formando um canal preferencial de


escoamento das águas, o que não é comum nessas áreas brejosas, onde predominam
canais anastomosados, isto é: interligados por ramificações.

Obra de drenagem pluvial vêm sendo executada à margem esquerda dessa área
brejosa. A foto “d” da Figura 7 mostra, no primeiro plano, um canal formado por erosão
no interior da área brejosa e, ao fundo, bueiro duplo por onde será lançado as águas de
chuva capturadas pela rede de drenagem.

Provavelmente, como é em geral observado na cidade de Cuiabá, os moradores do


bairro farão ligações de águas servidas e de esgoto na galeria de águas pluviais.

No entanto, além da poluição e contaminação a qual provavelmente ficará exposta a


área brejosa, o grande volume de águas que serão lançadas nos próximos períodos
chuvosos, acelerarão os processos erosivos que já vem ocorrendo ao longo da área de
agradação, entalhando e drenando os solos hidromórficos, destruindo, assim,
surgências d’água na forma de nascentes difusas, e transformando o curso d’água
intermitente em curso d’água efêmero, similarmente ao ocorrido com o córrego Canjica
anteriormente comentado.
16

(a) (b)

(c) (d)
Figura 8 – Na parte superior imagem do Google Earth com indicação do talvegue de um córrego
afluente do ribeirão do Lipa e o contorno da área brejosa (linha branca). Foto “a” vista da
cabeceira degradada; foto “b” vista do canal erodido; foto “c” vista do canal assoreado; foto “d”
vista, em primeiro plano, da área brejosa e ao fundo local em que será lançada as águas da
galeria pluvial.
17

Os exemplos apresentados demonstram diferenças significativas no funcionamento


hídrico e sensibilidade à degradação dos compartimentos morfopedológicos de
dissecação e de agradação.

A natureza dos terrenos que compõem as áreas de dissecação, com predomínio


absoluto de solos rasos, não permite a infiltração das águas de chuva que escoa ao
longo das vertentes promovendo, logo após desmatamento, intensos processos
erosivos tanto laminar, por escoamento difuso, como linear na forma de sulcos e
ravinas, por escoamento concentrado.

A ação erosiva é intensificada por formas de ocupação que favorece a concentração do


escoamento das águas de chuva, observados tanto na periferia da área urbanizada, por
exemplo, pela existência de cercas, trilhas de gado, caminhos, como na área edificada,
por exemplo, pela abertura de arruamentos vertente abaixo. Os sedimentos produzidos
pelos processos erosivos depositam-se em grande parte nos fundo de vales,
assoreando os cursos d’água.

O compartimento morfopedológico em ambiente de acumulação ativa ou de agradação é


constituído por materiais/sedimentos trazidos dos sistemas de montante pela dinâmica hídrica
superficial.

Nesse ambiente, quando ainda não alterados em conseqüência da ocupação, podem ocorrer
micro-diques marginais descontínuos acompanhando canais de escoamento de excedentes
hídricos, e pequenos embaciados e micro-ilhas à feição de murundus circunscritos por canais
anastomosados e cuja cobertura vegetal é essencialmente florestada, porém na forma de
contato de Formações, principalmente do tipo Savana Florestada/Floresta Estacional (IBGE
1992), podendo ainda passar localmente para Formações Ribeirinhas com influência fluvial
sazonal (Rodrigues 2000).

Apesar das peculiaridades pontuais desse ambiente agradacional, no geral são


topograficamente influenciados por processos de sedimentação progressiva ou
modificados por erosão diferencial dos materiais trazidos dos sistemas de montante, ou
ainda, influenciados por diferentes graus de umidade ou ressecamento dos materiais,
dependendo de sua distribuição espacial e do arranjo interno das frações finas, médias e
grosseiras que os constituem.

Assim, esse compartimento agradacional é muito influenciado pelo sistema de


escoamento de excedentes hídricos dos setores de montante das vertentes ou seja, do
compartimento de dissecação, fato que propicia a instalação de ambientes com
características adversas e profundamente dependente da sazonalidade climática
regional, estando seus solos hidromórficos neste período do ano (meados de agosto e
se prolongando até setembro) com pouca umidade principalmente nos horizontes
superficiais.

O funcionamento hídrico desses ambientes de sedimentação assemelha-se àquele


observado em ecossistemas de Veredas e Campos Úmidos, da Baixada Cuiabana,
comportando-se como área de amortecimento de fluxos d’água provenientes dos
sistemas de Cerrado, onde, em geral, o solo é raso a pouco profundo e com ausência
de lençol freático, e servindo de zonas de recarga, na medida em que promovem a
18

retenção e acumulação das águas de chuvas e de escoamento superficial e


subsuperficial. Representam, portanto, ambientes de fundamental importância para a
manutenção do equilíbrio natural, conservando o funcionamento dos cursos d’água
(córregos e rios), o abastecimento das águas acumuladas, mesmo durante período de
estiagem, e retendo-as durante os eventos chuvosos de maneira a evitar
assoreamentos sobrecargas que provocam enchentes.

Entretanto, essas áreas são extremamente sensíveis à alteração do seu funcionamento


hídrico e à degradação ambiental, bastando, por vezes, o pisoteio para a instalação da
ação erosiva, por favorecer o escoamento concentrado das águas de chuva, que
naturalmente se dirige para esse ambiente, desenvolvendo, assim, erosão linear na
forma de sulcos e ravinas.

O que se observa em geral na área urbana de Cuiabá é que o principal agente gerador
da erosão dessas áreas de agradação são os grandes volumes de águas pluviais, que se
juntam às águas servidas e de esgoto, e que vêm sendo lançadas nos talvegues sem
sistema de dissipação de energia.

O grande volume de águas concentradas principalmente nos picos de chuva, escavam


os canais de drenagem presente no ambiente de dissecação, e continua com seu poder
destrutivo ao atingirem o ambiente de agradação, recortando os solos hidromórficos,
interceptando com relativa facilidade o lençol freático presente a pequena
profundidade, drenando-o, muitas vezes, de forma irreversível, e em certos casos
desenvolvendo erosão interna do solo por fenômenos de “piping”, dando origem à
boçorocas com alto poder erosivo e difícil controle.

As alterações ambientais ai verificadas têm, como conseqüência de maior gravidade aos


recursos hídricos, a destruição de nascentes originalmente existentes, tanto por
rebaixamento ou eliminação do lençol freático, como por assoreamento por sedimentos
produzidos pela ação erosiva.

Além da erosão e do assoreamento verificados nas áreas de dissecação e de agradação,


o despejo de águas servidas e de esgoto nos fundos de vales constitui gravíssimo
problema de degradação ambiental, e que é verificado em quase a totalidade dos
cursos d’água da área estudada.

De um total aproximado de 209,439 km de extensão de cursos d’água existentes na


área urbanizada de Cuiabá, objeto deste projeto, 172,357 km encontram-se
contaminados por águas servidas e esgoto, causando a degradação ambiental dos solos
existentes nos fundo de vales e nas áreas marginais, contaminação das águas
provenientes das nascentes ainda existentes e dos aqüíferos freáticos, favorecendo a
proliferação de doenças e insalubridades às populações direta e indiretamente em
contato com essas áreas, além de perdas ambientais.

Com relação aos processos de degradação/extinção das nascentes e cursos d’água


observados na área urbana de Cuiabá, resumidamente pode-se dizer que se dá devido
a:
19

• Desmatamento da microbacia (alteração na dinâmica natural das águas pluviais)


• Uso e Ocupação desordenada da microbacia (aumento do escoamento
superficial, do volume e concentração dos fluxos d’água)
• Maximização dos volumes lançados nos talvegues, por águas originadas de
outras bacias (principalmente na forma de águas servidas), que se juntam às
águas pluviais.

Quanto às principais causas da extinção das nascentes e cursos d’água, têm-se:

• Erosão e assoreamento
• Aterramento
• Escavações

E como principais causas da degradação das nascentes e cursos d’água, observou-se

• Lançamento de águas servidas e esgoto


• Lançamento de lixo
• Atividades garimpeiras
• Erosão, Assoreamento, Aterramento
20

4. DEFINIÇÕES LEGAIS E CONCEITOS TÉCNICOS


De acordo com o Código Florestal Brasileiro8, as Áreas de Preservação Permanente -
APP são aquelas nas quais, por imposição da lei, a vegetação deve ser mantida intacta,
tendo em vista a garantia de se preservar os recursos hídricos, a paisagem, a
estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, além da
proteção do solo e de assegurar o bem estar das populações humanas.

De acordo com Araújo (2006) “Aplicam-se aos parcelamentos urbanos as restrições de


edificação relativas às Áreas de Preservação Permanente (APP), definidas pela Lei
4.771/1965 (Código Florestal) e sua regulamentação. Existe um grande debate em
torno da validade para áreas urbanas, ou não, dos limites de APP previstos pelo Código
Florestal, que variam de 30 a 500 metros. A polêmica é gerada pela redação pouco
precisa do parágrafo único do art. 2º da Lei 4.771, o qual, ao mesmo tempo em que
remete os limites de APP em áreas urbanas para os planos diretores e a legislação
urbanística municipal, manda observar os princípios e limites estabelecidos pelo próprio
Código Florestal.”

Se por um lado o regime das APP’s, mesmo nas áreas urbanas, é bastante rígido9, por
outro, o crescimento urbano desordenado, é reconhecidamente um fator de degradação
ambiental e de diminuição do equilíbrio ecológico. Dessa forma, torna-se um desafio
cumprir a lei no espaço urbano da cidade de Cuiabá, se não for exercitada, na práxis, a
nova ótica do direito ambiental contemporâneo, conforme previsto no Estatuto da
Cidade10, em que se tem a concepção de cidades sustentáveis.

Esse conceito de cidade sustentável será de difícil aplicabilidade para Cuiabá, onde os
recursos hídricos, por exemplo, sofrem deterioração de sua qualidade ambiental, em
face da carência de saneamento básico, de planejamento urbano e de acesso à terra no
meio urbano, tendo como principal conseqüência o uso dos recursos hídricos como
destino de esgoto doméstico e de águas servidas, de resíduos industriais, além da
ocupação de APP’s, principalmente por população de baixíssima renda, as quais
deveriam ser justamente as áreas destinadas à proteção dos mananciais.

De acordo com o jurista Paulo Affonso Leme Machado (Machado, 2001), as áreas de
proteção dispostas no artigo 2º do Código Florestal Brasileiro podem ser divididas em
dois grupos: o primeiro, tem por objetivo proteger os recursos hídricos, estando contido
nas alíneas a, b e c; e o do segundo é proteger o solo, conforme as alíneas d, e, f, g e
h , a seguir transcrito:

8
O Código Florestal Brasileiro passou por profundas transformações a partir de 2000, a exemplo da Lei
9.985 de 2000 que, ao instituir o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza revogou o
art. 18 da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, que transformava as Áreas de Preservação
Permanente em reservas ou estações ecológicas. Também, a Resolução CONAMA nº 303/2002 redefiniu
parâmetros, definições e limites das APP’s; ou ainda, a Resolução CONAMA nº 369/2006 em que prevê a
intervenção ou supressão de vegetação APP, nos casos excepcionais, de utilidade pública, interesse social
ou baixo impacto ambiental.
9
Nas APP’s, a regra é a intocabilidade, admitida excepcionalmente a supressão da vegetação apenas nos
casos de utilidade pública ou interesse social, e que estejam legalmente previstos.
10
Estatuto da Cidade: Lei 10.257, de 10.07.2001.
21

“Art. 2° - Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as


florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água desde o seu nível mais alto em faixa
marginal cuja largura mínima será:
1 - de 30 (trinta) metros para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de
largura;
2 - de 50 (cinqüenta) metros para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50
(cinqüenta) metros de largura;
3 - de 100 (cem) metros para os cursos d’água que tenham de 50 (cinqüenta) a 200
(duzentos) metros de largura;
4 - de 200 (duzentos) metros para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a
600 (seiscentos) metros de largura;
5 - de 500 (quinhentos) metros para os cursos d’água que tenham largura superior a
600 (seiscentos) metros;
b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d’água naturais ou artificiais;
c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados "olhos d’água", qualquer
que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 (cinqüenta) metros de
largura;
d) no topo de morros, montes, montanhas e serras;
e) nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45°, equivalente a 100%
na linha de maior declive;
f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;
g) nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo, em
faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais;
h) em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a
vegetação”.

Além disso, Benjamin (1997) ao se referir às Áreas de Preservação Permanente,


diferencia duas categorias, aquelas criadas só pelo efeito do Código e aquelas
instituídas pelo Poder Público. Para ele, as primeiras são as APP’s ope legis ou legais,
“chamadas como tal porque sua delimitação ocorre no próprio Código Florestal”, e as
segundas são APP’s administrativas “assim denominadas porque sua concreção final
depende da expedição de ato administrativo da autoridade ambiental competente”11.
Nota-se que elas diferem ainda, quanto à sua natureza e possibilidade de indenização.

As Áreas de Preservação Permanente ope legis são aquelas fixadas pelo art. 2º do
Código Florestal, já anteriormente referidas; enquanto que as APP’s administrativas são
aquelas previstas no art. 3º desse mesmo Código, e só podem ser instituídas por ato do
Poder Público, assim vejamos:

Art. 3º - Consideram-se, ainda, de preservação permanentes, quando assim declaradas


por ato do Poder Público, as florestas e demais formas de vegetação natural
destinadas:
a) a atenuar a erosão das terras;

11
Benjamin, Antonio Herman V., 1997. Reflexões Sobre a Hipertrofia do Direito de Propriedade na Tutela
da Reserva Legal e das Áreas de Preservação Permanente. Congresso Internacional de Direito Ambiental,
5 anos após a ECO – 92 – Anais. São Paulo. p. 26.
22

b) a fixar as dunas;
c) a formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;
d) a auxiliar a defesa do território nacional a critério das autoridades militares;
e) a proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico ou histórico;
f) a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçados de extinção;
g) a manter o ambiente necessário à vida das populações silvícolas;
h) a assegurar condições de bem-estar público.

Diante disso, necessário deixar clara a interpretação do conceito de APP’s na cidade de


Cuiabá, que tem especificidades hidrogeológicas para a ocorrência de nascentes ou
olhos d’água, como também, para o desenvolvimento de linhas de drenagem
superficiais, conforme esclarecimento que segue.

A cidade de Cuiabá insere-se na região da Baixada Cuiabana onde se verificam dois


compartimentos morfopedológicos12 distintos em relação às interações entre os
elementos que constituem o meio físico (substrato geológico, formas e feições do
relevo e cobertura pedológica); o meio biótico (cobertura vegetal natural e alterada), e
o funcionamento hídrico, comandado pelas águas de chuva e do aqüífero freático. São
eles: Compartimento Morfopedológico em Ambiente de Dissecação, e Compartimento
Morfopedológico em Ambiente de Agradação, conceituados e resumidamente descritos
no Capítulo 3 deste relatório.

O primeiro, é dominantemente constituído por rochas pelíticas do Grupo Cuiabá, com


predomínio de filitos, filitos sericíticos e metarenitos, e, em menor expressão
metarcósios, metaconglomerados e metaparaconglomerados petromíticos, além de
margas, em cuja paisagem da área urbana favorece a elaboração dominante de formas
de relevo colinosas (colinas médias) com topos desde ligeiramente aplainados até
fortemente convexizados, e morros e morrotes (normalmente distribuídos na paisagem
de forma alinhada), que estão associados à presença de veios de quartzo recortando as
rochas do Grupo Cuiabá e de laterita. Nesse ambiente de dissecação desenvolvem-se
preferencialmente solos rasos (a maior parte Neossolos Litólicos e Plintossolos),
recobertos por matriz vegetacional natural do tipo savânica (Cerrado latu sensu, com
variações fitofisiômicas pelas respostas às adaptações edafoclimáticas pontuais), sendo
atualmente representada por remanescentes cada vez mais isolados, tendendo a
fragmentos na paisagem.

Já o segundo compartimento limita-se preferencialmente em fundos de vales de cursos


d’água, sejam eles de caráter intermitente ou perene, constituído por sedimentos
quaternários, cujas litologias são formadas essencialmente por materiais finos, silte,
argila e areia, e secundariamente, por materiais mais grosseiros, cascalhos, calhaus,
matacões, além de concreções ferruginosas.

Esses ambientes formados por superfícies aplainadas e com solos hidromórficos


(Plintossolos, Gleissolos), são recobertos por Formações Ribeirinhas que podem variar
12
Entende-se por Compartimento Morfopedológico área relativamente homogênea, especialmente em
relação aos aspectos litológicos, geomorfológicos, pedológicos e de cobertura vegetal, resultando em
determinado funcionamento hídrico (Salomão, 1994; Castro e Salomão, 2000).
23

desde essencialmente campestre (Campo Úmido), até florestada (Cerradão, inclusive


quando este faz contato com Floresta Estacional na forma de mistura fito-fisionômica,
podendo passar localmente para Matas Ciliares, à medida em que se aproxima do leito
das drenagens). Nota-se que a vegetação natural desse ambiente encontra-se
atualmente restrita a pontos isolados na paisagem urbanizada.

O ambiente de dissecação é definido na paisagem condicionado pelas características


litológico-estruturais, que favorece a concentração dos fluxos de água de escoamento
durante os episódios chuvosos, intensificando processos de alteração, e em especial, a
erosão natural ou geológica. A intensidade erosiva nesses locais de elevada energia de
escoamento impede o aprofundamento dos solos, subsistindo a difusão de Neossolos
Litólicos.

A ocorrência de nascentes nesse ambiente de dissecação fica restrita, e por vezes,


impossibilitada, uma vez que, na maior parte inexistem as condições que permitem a
formação de aqüíferos ou lençóis freáticos. Nessas condições, os fluxos d’água
instalados em geral, têm caráter efêmero, isto é, condicionados exclusivamente às
águas de chuva que escoam em superfície dos terrenos (Bigarella, 2003). Entendendo-
se por nascente, o conceito apresentado pela Agência Nacional de Águas que publicou
um glossário13, sendo também, compatível com o entendimento apresentado pelo
Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA através da Resolução nº 303 de
20/03/200214.

Esse conceito deixa clara a condição para que um determinado terreno apresente
nascente: presença de água subterrânea. Devendo entender-se por água subterrânea o
conceito apresentado pelo Dicionário Ecológico Ambiental15: “suprimento de água doce
sob a superfície da terra, em um aqüífero ou no solo, que forma um reservatório
natural para o uso do homem" (The World Bank, 1978).

Dessa forma, as margens dos canais ou talvegues efêmeros não se configuram como
Áreas de Preservação Permanente – APP, uma vez que apresentam exclusivamente
águas de escoamento superficial provenientes das precipitações pluviométricas, e não
de nascentes. Assim, não se justifica que esses canais de drenagens efêmeros sejam
contemplados com APP’s. Como já anteriormente referido, as APP’s de nascentes e de
cursos d’água, na interpretação de Machado (2001), têm função protetora dos recursos
hídricos e as drenagens efêmeras não possuem um recurso hídrico a ser protegido.

A remoção da cobertura vegetal original no ambiente de dissecação para a implantação


de moradias, rede viária, entre outros, resulta no aumento do escoamento das águas
superficiais, pois o pacote rochoso, de litologias impermeáveis do Grupo Cuiabá, fica
mais exposto e mais vulnerável ao desenvolvimento de processos erosivos (laminares e
lineares).

13
Para download, no site: http://www.ana.gov.br/gestaoRecHidricos/TecnologiaCapacitacao/tecnologia_glossario.asp
14
Definição conforme seu Art. 2º Inciso II - nascente ou olho d`água: local onde aflora naturalmente,
mesmo que de forma intermitente, a água subterrânea.
15
http://www.ecolnews.com.br/dicionarioambiental/
24

Já o ambiente de agradação, onde os terrenos são aplainados e muito susceptível ao


assoreamento, é formado por solos hidromórficos onde se acumula água na superfície e
em subsuperfície, pela presença de rochas pelíticas e impermeáveis do Grupo Cuiabá.

Esse ambiente de agradação, que também vem sofrendo forte pressão antrópica,
compreende as formações ribeirinhas em que se definem a maioria das APP’s da área
urbana de Cuiabá, onde os cursos d’água, que funcionavam como drenos naturais, hoje
em boa parte, funciona como drenos de águas servidas e de esgoto das casas e de
bairros inteiros. Além disso, muitas dessas áreas encontram-se ocupadas por
moradores, que não conseguem acessar o sistema habitacional para a população de
baixa renda da cidade.

As alterações no funcionamento do sistema ribeirinho resultaram em modificações no


suporte geoecológico do compartimento agradacional relacionado com a dinâmica de
sedimentação/erosão das linhas de drenagens, podendo significar para a vegetação
nativa da Área de Preservação Permanente, redução na capacidade de estabilidade de
sua elasticidade e de resistência, ou seja na perda da capacidade de resiliência.
Conforme Odum (1988) existem duas formas de estabilidade “a estabilidade de
resistência (a capacidade de se manter estável diante do estresse) e a estabilidade de
elasticidade (a capacidade de se recuperar rapidamente)”. A manifestação de ambas dá
significado ao termo resiliência.

Em outras palavras, o sistema ribeirinho pode perder a capacidade de auto-recuperar,


antes das espécies ruderais16, se estabelecerem, colonizarem e se desenvolverem.
Nota-se que as ruderais são espécies de rápida velocidade de crescimento e reprodução
e só concorrem com nativas de alta rusticidade e resistência, principalmente com
espécies herbáceas, que acabam também desenvolvendo o hábito ruderal.

A exemplo, temos vários fundos de vales de cursos d’água, onde se observam


alterações antrópicas e abundância de espécies ruderais, tais como: capim-colonião
(Panicum maximum), capim-napier (Pennisetum purpureum), leucena (Leucaena
leucocephala), mamona (Ricinus communis), bucha (Luffa sp.), embaúba (Cecropia
pachystachya), fedegosão (Senna alata ), entre outras (Figura 9).

Portanto, a principal conseqüência do processo de urbanização da cidade de Cuiabá, no


que diz respeito aos impactos diretos ou indiretos nos ambientes de agradação, foi e
ainda é a desfuncionalidade dos sistemas ribeirinhos devido ao desequilíbrio hidrológico
e da dinâmica sedimentação/erosão, levando à extinção de nascentes e efemirização de
cursos d’água, e, conseqüentemente, à desfuncionalidade ecológica da APP, que
deveria desempenhar o papel de protetora dos recursos hídricos.

16
As ruderais são espécies que se adaptaram aos ambientes alterados por ação antrópica (Pedrotti e
Guarim Neto, 1998), ou espécies que compõem a vegetação urbana e que crescem espontaneamente na
margem de ruas, sobre muros, telhados e calçadas (Lorenzi, 2001).
25

Figura 9 – Fotografias mostrando situações em


várias APP’s de cursos d’água que sofreram
alterações por uso e ocupação, e hoje, funcionam
como drenos de esgotos e de águas servidas, em
cujas margens são comuns as espécies ruderais,
cidade de Cuiabá/MT.

Em face desse quadro atual, de tendência à desfuncionalidade dos sistemas ecológicos,


contrapondo à ótica contemporânea de cidades sustentáveis, foram neste estudo
identificadas áreas que efetivamente devam ser protegidas para a conservação dos
recursos hídricos e da vegetação remanescente, que tenham importância para garantia
dos mananciais. São preferencialmente os casos das: a) APP’s de nascentes ou olhos
d’água; b) APP’s de cursos d’água; c) áreas úmidas, onde ocorrem nascentes difusas
26

em solos hidromórficos; e d) linhas de drenagem efêmeras situadas à montante de


olhos d’água.

Nota-se que as áreas úmidas, de vital importância para a manutenção dos recursos
hídricos e para os sistemas ribeirinhos, funcionam como veredas, sendo caracterizadas
como espaços brejosos ou encharcados, que contém nascentes ou cabeceiras de cursos
d’água, onde há ocorrência de solos hidromórficos.

O inciso 4º do artigo 3º da Resolução CONAMA 303, estabelece que constitui Área de


Preservação Permanente a área situada “em vereda e em faixa marginal, em projeção
horizontal, com largura mínima de cinqüenta metros, a partir do limite do espaço
brejoso e encharcado”. Da mesma maneira, as áreas brejosas situadas nos ambientes
de agradação da área urbana de Cuiabá devem ser contempladas por APP, dada sua
importância no equilíbrio hidrológico local.

A maioria das APP’s associadas aos cursos d’água se relacionam aos ambientes
agradacionais, e vem sofrendo forte pressão antrópica. Constituem áreas muito
suscetíveis ao assoreamento, a erosão e, conseqüentemente, ao desequilíbrio
hidrológico que acaba refletindo na substituição da tipologia vegetacional nativa por
espécies exóticas e ruderais, sendo muitas vezes, impossível a recuperação da
funcionalidade ecológica.

Quando os remanescentes de vegetação perdem a função ecológica, mas por outras


razões necessitam ser mantidos no meio urbano, a exemplo de quando servem como
atenuantes do desconforto térmico, pois Cuiabá sofre a influência climática da condição
geográfica da Baixada Cuiabana, então, a manutenção dos remanescentes deve ser
feita por meio de técnicas de manejo, semelhantes àquelas adotadas para jardins,
praças públicas e áreas verdes.

Nota-se que a Baixada Cuiabana é bordejada em sua maior parte, por regiões serranas
e áreas de planaltos, fazendo contato na porção sul, com o Pantanal Mato-Grossense,
resultando em uma condição geográfica sui generis, onde a sensação de conforto
térmico depende da época do ano, da hora do dia e do local onde a pessoa se
encontra.

Tal fato tem sido objeto de vários estudos a respeito dos efeitos da vegetação sobre o
micro-clima da cidade de Cuiabá e sobre o desconforto térmico em sua malha urbana
(Maitelli, 1994; Maitelli et al., 1995; Maitelli et al., 2004). De um modo geral, essas
pesquisas mostraram que a atenuação de desconforto térmico é fortemente percebida
em áreas associadas a remanescentes de vegetação, quer sejam por pomares de
quintais, quer sejam por ambientes urbanos protegidos por lei (unidades de
conservação, áreas de preservação permanente, praças, jardins, áreas verdes...), quer
por lotes baldios, ou ainda, por ambientes revegetados, caso do campus universitário
da UFMT.

Além dessas áreas, há ainda outras de suma importância em Cuiabá e que também
minimizam os efeitos das ilhas de calor na cidade, tais como: Horto Florestal, os
Parques Mãe Bonifácia, Massairo Okamura, da Saúde, Tia Nair, e Dante de Oliveira.
27

É com essa ótica que Maitelli et al. (2004), referem-se às áreas verdes como de
fundamental importância por desempenharem papel preponderante em cidades
tropicais que são marcadas por sazonalidade climática e com estações bem definidas,
como é o caso de Cuiabá. Em Cuiabá há ocorrência de ilhas de calor à semelhança das
grandes metrópolis, que de acordo com Lombardo (1985a e 1996b), “a ilha de calor
urbana corresponde a uma área na qual a temperatura da superfície é mais elevada
que as áreas circunvizinhas, o que propicia o surgimento de circulação local. O efeito da
ilha de calor nas cidades ocorre devido à redução da evaporação, ao aumento da
rugosidade e às propriedades térmicas dos edifícios e dos materiais pavimentados”.

Por outro lado, segundo as concepções de Soares (1998), as áreas verdes nas cidades
além de desempenharem o papel já conhecido de propiciar o conforto térmico para a
malha urbana, desempenham também, um outro ainda mais relevante, a significação
social, pois são obras de arte, e como tais, se destinam em incentivar a cultura dos
sentimentos da coletividade.

Assim, é muito importante conservar, os remanescentes que têm uso funcional para a
comunidade, ainda que na forma de quintais (Figura 10), ou de áreas verdes (Figura
11), ou área de lazer (Figura 12), ou como área para práticas de educação física (Figura
13), ou para educação ambiental (Figura 14), entre outras.

Figura 10 – Quintais arborizados de moradias voltados para a rua, onde corre a céu aberto,
esgoto e água servida, em antiga linha de talvegue efêmera. Cuiabá/MT.
28

Figura 11 – Quintal de moradia zelada como área verde, à semelhança de um Jardim Japonês,
recortado por água servida e de esgoto, proveniente dos setores de montante, onde
certamente deveria haver uma linha de talvegue efêmera. Bairro Jd. Fortaleza, Cuiabá/MT.

Figura 12 – Ao fundo, campo de futebol no entorno de linha de talvegue, onde o remanescente


de vegetação natural (em último plano), propicia sombreamento para expectadores do jogo.
29

Figura 13 – Foto superior: vista geral de área


de lazer e esportes à margem esquerda do
córrego Gambá, na altura do Bairro do
Areão. Ao lado, outro ângulo dessa mesma
área, onde se encontra o quiosque para
atividades físicas.

Figura 14 – Área conservada por moradores em parceria com o colégio Portal, onde se
desenvolve linha de drenagem efêmera, situada à montante de nascente hoje alterada pela
presença de esgoto. Bairro Jd. Itália, Cuiabá/MT.
30

A cidade de Cuiabá, em conseqüência de seu expressivo crescimento verificado, em


especial, nos últimos 30 anos, com marcante ocupação desordenada suprimindo-se a
vegetação de forma indistinta e sem um plano de arborização adequado, deixou de ser
a “Cidade Verde” orgulhosamente ostentada no passado recente, conforme Souza,
2004. Atualmente nota-se acentuada ausência de quintais e ruas arborizadas, além de
insuficiente existência de praças públicas convenientemente arborizadas e de parques
municipais, que formam áreas de descontração e lazer para a população em geral,
especialmente a mais carente. Urge ações voltadas a reverter esse quadro,
especialmente numa cidade marcada pela verticalização das edificações e pela natureza
climática, como já anteriormente comentada.

Sob esse aspecto, do clima da malha urbana de Cuiabá, Souza (2004), apresenta as
seguintes conclusões em sua monografia:

“1) Em Cuiabá o clima quente provoca desconforto térmico na malha urbana e a simples
presença de vegetação recobrindo os solos, amenizam tais efeitos, sentidos pela
população humana e por animais domésticos e silvestres comuns em áreas urbanizadas.
2) Na malha urbana da cidade, onde a pavimentação asfáltica e a impermeabilização, é
na atualidade uma tendência crescente e já predomina em sua porção central, as Praças
e os quintais cuiabanos remanescentes são incontestavelmente importantes áreas
vegetadas para reduzirem esses efeitos.
3) Preocupada com o gerenciamento da zona urbana de Cuiabá, sob o ponto de vista
administrativo-financeiro, a Prefeitura tem procurado implementar as diretrizes contidas
em seu Plano Diretor, considerando a realidade concreta da cidade. Por isso, buscou
instrumentos legais para estabelecer parcerias principalmente com as entidades
representativas do setor privado (comercial, empresarial, artesanal...), para ajudar a
manter as “áreas verdes” da cidade como um todo.
4) Todas as Praças deste estudo estão enquadradas na categoria de “áreas verdes”, de
acordo com a classificação do Plano Diretor de Desenvolvimento e Gerenciamento
Urbano de Cuiabá. Entretanto, todas elas apresentam superfícies impermeabilizadas e
apenas arborizadas nas áreas de canteiros e jardins.
5) Como as Praças sofreram reformas nos últimos cinco anos, o estado de conservação
varia em função do público que as freqüentam e de certa forma, exibem um padrão
paisagístico, onde se valorizou canteiros separados por muretas, que ao mesmo tempo,
isola o “verde” minimizando ações depredativas, e servem de banco à população.
6) Porém, esse padrão, que designamos neste trabalho com diferentes terminologias
“estilo espontâneo, neo-contemporâneo, contemporâneo”, resulta de uma interpretação
subjetiva das Praças que tivemos a oportunidade de conhecer antes da década de
oitenta, quando Cuiabá teve aumento substancial na expansão de sua malha urbana e
impermeabilização das superfícies por pavimentação e edificações em concreto.
7) Também, quer dizer que misturas de estilos paisagísticos nas Praças de Cuiabá podem
resultar em novo conceito e o “estilo contemporâneo espontâneo” vir a ser inovador,
onde existe um padrão geral, que permite variações, de acordo com o tamanho da área,
as características ambientais onde se situa, o uso coletivo a que se destina, mas tudo
amparado por uma arborização capaz de sombrear e minimizar os efeitos do calor desta
cidade.”

Nota-se que a cidade de Cuiabá possui instrumentos legais suficientes para favorecer a
existência de espaços públicos, que funcionem como áreas verdes17, que propiciem o

17
A Lei do Gerenciamento Urbano, Lei Complementar nº 004, de 24/12/1992 traz em seu artigo 524, o
conceito de áreas verdes, enquanto “Unidades de Manejo Sustentável”: “l) Áreas Verdes: são espaços
31

bem-estar da população, a exemplo da Lei Complementar n.º 003, de 24/12/1992, que


fornece diretrizes especificas do desenvolvimento urbano na área de meio ambiente e
recursos naturais da cidade, conforme previsto em seu Artigo 10, inciso III, “criar
mecanismos legais e econômicos que incentivem e compensem preservação de áreas
verdes com atributos naturais significativos”; ou em seu inciso IV, em “estabelecer
programas de conservação e manejo de áreas verdes; arborização urbana, educação
ambiental, recuperação e conservação de praças públicas”.

Já no inciso VII desse mesmo Artigo 10, está prevista a definição de “medidas de
controle das atividades econômicas visando a preservação, recuperação e conservação
de vegetações nativas”; enquanto que no inciso VIII fala em se “estabelecer controle
permanente na área de proteção aos recursos hídricos e cursos d’água no Município,
com especial atenção para o rio Cuiabá”, como são aquelas áreas que funcionavam
como zonas de anteparo para os sistemas ribeirinhos do ambiente agradacional do rio
Cuiabá, antes da implantação da Usina Hidrelétrica do Manso.

Após a implantação dessa Usina houve o controle das inundações do rio Cuiabá, e
muitos ambientes de agradação perderam a funcionalidade, enquanto sistemas
mantenedores da dinâmica hídrica típica de planícies flúvio-lacustres, resultando em
ambientes de acumulação de águas de chuva, servidas e de esgoto, por estarem em
base de vertentes com terrenos pouco permeáveis e de baixas declividades, por vezes,
com presença de locais embaciados, e normalmente associados a Planossolos18.

Deve-se enfatizar que a Lei Complementar nº 004 de 24/12/1992 traz no seu Capítulo
II que trata da flora na área urbana de Cuiabá, os ambientes que devem ser regidos
pela lei, a exemplo do inciso II, do Artigo 530, “in verbis”: “todas e quaisquer áreas
verdes, bosques, fundos de vale, áreas de recreação e hortos florestais existentes no
território municipal”. E ainda deixa claro em seu Parágrafo Único, que “As florestas e
demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são
consideradas bens de interesse comum a todos os cidadãos, exercendo-se os direitos
de propriedade com as limitações que a legislação em geral, especialmente esta Lei
estabelecem”.

Assim, considerando os instrumentos legais que a cidade de Cuiabá já possui para


favorecer a existência de espaços públicos que propiciem o bem estar da população,
sendo em potencial arborizado, bem planejado e mantido, resta ao cidadão
cumplicidade com a coisa pública, e, a efetividade do funcionamento como área verde,
nesses espaços de uso comum, só será possível na medida em que haja afirmação de

abertos, delimitados fisicamente e interados com o meio ambiente, caracterizados pela predominância de
cobertura vegetal, que podem ser públicas ou privadas, de caráter essencial ou especial,
respectivamente; m) Áreas Verdes do Setor Especial: são os terrenos cadastrados no setor competente,
que contenham áreas verdes com a finalidade de formação de bosques destinados a preservação de
águas existentes, da fauna e da flora local, da estabilidade do solo, da proteção paisagística e da
manutenção da distribuição equilibrada dos maciços vegetais”
18
Os Planossolos são solos minerais hidromórficos ou não, com mudança textural abrupta entre o
horizonte A e B (B textural-Bt). O Bt apresenta densidade aparente mais elevada em relação ao A, é
extremamente duro e firme, imprimindo-lhe porosidade total baixíssima, baixa permeabilidade. Nos
terrenos de agradação e planos favorecem o acúmulo de água.
32

sua identidade, tanto por parte do poder público, na qualidade de gestor, como
também, por parte da população, na qualidade de usufrutuário e agente mantenedor.

Dentre as áreas que já são amparadas por lei para serem protegidas, tem-se as Zonas
de Interesse Ambiental (ZIA), criadas pela lei Complementar 44 de 23/12/1997, cujo
Artigo 18 conceitua, como sendo “zonas que têm por objetivo a preservação e/ou
conservação ambiental, destinadas preferencialmente ao lazer e uso público”.

A lei Complementar 103 de 05/12/2003 sub-divide as ZIA’s em: (a) ZIA 1, constituídas
por áreas com potencial ambiental, paisagístico e de proteção, públicas ou privadas,
preferencialmente destinadas à atividades e empreendimentos com baixa densidade de
ocupação; e (b) ZIA 2, constituídas por áreas com potencial ambiental, paisagístico e de
proteção, públicas ou privadas, com características excepcionais de matas, cursos
d’água e outros, objetivando sua preservação e/ou conservação. Assim, foram definidas
dezesseis áreas como ZIA 1, e três como ZIA 2 (Figura 15).

Z1-A:CABECEIRA DO RIBEIRÃO DA PONTE


Z1-B: RECARGA AQUÏFEROS – CPA
Z1-C: MORADA DA SERRA
Z1-D: MORADA DO OURO
Z1-E: CENTRO DE ZOONOZES
Z1-F: MÃE BONIFÁCIA
Z1-G:CABECEIRA DO CÓRREGO DA
PRAINHA
Z1-H: BEIRA-RIO / OESTE
Z1-I: CAMPO DE BODE
Z1-J: BEIRA-RIO / PORTO
Z1-K: BEIRA-RIO / LESTE
Z1-L: BEIRA-RIO / SUL
Z1-M: HORTO FLORESTAL
Z1-N: CÓRREGO DO MOÍNHO
Z1-O: DISTRITO INDUSTRIAL
Z1-P: RIBEIRÃO DOS PEIXES

Z2-A: MATA CILIAR DO RIBEIRÃO


DA PONTE
Z2-B: FOZ DO RIBEIRÃO DA PONTE
Z2-C: FOZ DO RIO COXIPÓ

Figura 15 – ZIA’s definidas pela Lei Complementar 103 de 05/12/2003 para o município de Cuiabá/MT.

Tendo em vista a abrangência do conceito de ZIA apresentado na Lei, e considerando


que são os recursos hídricos, além das APP’s, que realmente necessitam de mecanismo
que complemente a sua conservação, neste estudo foi entendido como ZIA “áreas que
têm por objetivo a conservação do ambiente natural especialmente os recursos
hídricos”. Com base nesse entendimento de ZIA, foi possível definir critérios técnicos
voltados à delimitação cartográfica de tais áreas, apresentados no Capítulo 5.
33

5. IDENTIFICAÇÃO E MAPEAMENTO DAS ÁREAS DE


PRESERVAÇÃO PERMANENTE E DE ZONAS DE INTERESSE
AMBIENTAL
Tendo por base a metodologia e os conceitos e entendimentos de Áreas de Preservação
Permanente e de Zonas de Interessa Ambiental relacionadas às nascentes e cursos
d’água, conforme apresentados no Capítulo 4 deste relatório, foram interpretadas as
fotografias aéreas em escala de detalhe (1:2.000) e realizados levantamentos de campo
permitindo a elaboração do mapa síntese em meio digital e analógico, apresentado em
anexo, estando este último, representado em escala 1:10.000 para facilitar a leitura e
manuseio pelo público-alvo.

A Figura 16 apresenta a organização das fotografias aéreas em 41 cartas (com 6 fotos


por carta em média), recobrindo a área objeto de estudo, identificadas por letras e
dígitos numéricos, que foram previamente interpretadas em relação à ocorrência de
nascentes e cursos d’água, e em relação aos problemas de uso e ocupação do solo.
Essa interpretação permitiu a delimitação preliminar das áreas de preservação
permanente e localização das áreas de interesse ambiental, que foram submetidas a
cuidadoso levantamento de campo, permitindo definir critérios seguros e definitivos de
delimitação cartográfica das unidades mapeadas.

Figura 16 – Mapa-índice destacando as cartas que cobrem a malha urbana da cidade de Cuiabá.
Essas cartas compreendem mosaicos formados, em geral, por seis fotos aéreas cada.

Os levantamentos de campo, realizados no final do período chuvoso e início do seco do


ano, durante os meses de maio a agosto favoreceram a observação de ocorrências de
surgências d’água nas cabeceiras e ao longo dos talvegues. Quando necessário,
investigações das características morfológicas relacionadas ao funcionamento hídrico
34

dos horizontes pedológicos de solos hidromórficos (Figura 17), ocorrentes ao longo dos
talvegues e faixas marginais foram realizadas por meio de descrição de amostras
coletadas por tradagens e em perfis expostos em taludes naturais e de entalhes
erosivos.

Ab

Cg

Figura 17 – Perfil de Gleissolo, em destaque, horizonte A formado por sedimentos


tecnogênicos (assoreamento) e horizonte Ab (A enterrado), recoberto por vegetação
secundária de sistemas ribeirinhos do córrego Barbado, setor centro norte de Cuiabá/MT.

Dentre essas características morfológicas que denunciam a presença de água no


interior do solo, mesmo que temporariamente, a ocorrência de feições pedológicas de
Plintitas e de Gleizações serviram de indicadores fundamentais. Entende-se por Plintita
(Figura 18), volume milimétrico e centimétrico de geometria variada, de coloração
avermelhada, cujo material mineral de granulometria fina é constituído por concentrado
em óxidos de ferro por migração das águas subsuperficiais. Enquanto que feições
pedológicas de gleização (Figuras 19 e 20) são manifestações próprias de horizontes
pedológicos que se mantêm saturados em água transmitindo coloração acinzentadas
e/ou azuladas resultantes da presença de ferro na forma reduzida. São, portanto,
feições pedológicas identificáveis em horizontes do perfil do solo, que se relacionam à
presença de água subsuperficial manifestada no terreno, sendo indicadores precisos da
existência de aqüífero freático intermitente ou perene.

Tais critérios utilizados em campo permitiram deduzir com precisão a existência e


localização de surgências d’água na forma de nascentes intermitentes e perenes, e
delimitar as Áreas de Preservação Permanentes associadas às nascentes e aos cursos
d’água.
35

Figura 18 - Perfil de
Plintossolo. Em detalhe,
horizonte plíntico, indicando
oscilação do nível de água em
subsuperfície. Parque das
Nações, Cuiabá/MT.

(a) (b)
Figura 19 - (a) Detalhe da coleta de amostra do horizonte Bt de Planossolo. (b) Cores acinzentadas
indicando hidromorfismo em Planossolo. Condomínio Belvedere, Cuiabá/MT.

Figura 20 – Detalhe do horizonte


Cg, de Gleissolo, onde as cores
acinzentadas mostram a
condição de ferro na forma
reduzida, próprio de ambiente
saturado em água.
36

Conforme esclarecido nos Capítulos 3 e 4 deste relatório, as características


morfopedológicas e de uso atual do solo, peculiares da área objeto, impõem um
funcionamento hídrico marcado pela existência de cursos d’água efêmeros que se
dispõem à montante dos locais de nascente.

Tendo em vista a caracterização das áreas de ocorrência de Zonas de Interesse


Ambiental (ZIA’s) de maneira a se definir pela manutenção, exclusão, ou readequação
das proposições anteriormente realizadas e transformadas em lei municipal por
iniciativa da Prefeitura Municipal de Cuiabá, e também para sugerir outras áreas de
ZIA’s, foram estabelecidos critérios técnicos que permitissem justificar a real função de
áreas voltadas à preservação e/ou manutenção dos recursos hídricos superficiais e
subterrâneos. Tais critérios foram definidos com base nas avaliações dos resultados
obtidos através dos levantamentos de campo, que permitiram a compreensão do
funcionamento hídrico de vertentes, resultante das interações entre os elementos que
compõem o meio físico (substrato geológico, formas e feições de relevo e
tipologia/características pedológicas), e suas relações com a cobertura vegetal natural.
Duas situações de funcionamento hídrico específico com função protetora dos recursos
hídricos foram definidas, servindo de base para a delimitação das ZIA’s:

1) Faixa marginal com largura de 30 (trinta) metros, ao longo dos cursos d’água
efêmeros, excetuando-se aqueles com talvegues canalizados e suas margens
pavimentadas e/ou urbanizadas e que não seja possível reverter sua função protetora.
Esses cursos d’água efêmeros têm a função de receber as águas de chuva provenientes
das vertentes urbanizadas ou não urbanizadas, que se dirigem às cabeceiras e
talvegues, e abastecer, com energia dissipada, os cursos d’água de caráter intermitente
ou perene.

Essas áreas devem ser mantidas idealmente preservadas, com cobertura vegetal nas
faixas marginais, e, se necessário, com a implantação de obras de drenagem visando o
disciplinamento das águas de escoamento e/ou obras voltadas ao lazer da população
local. Essas áreas, de 903,422 hectares, distribuídas principalmente em setores com
baixa urbanização, abrangem uma superfície e a extensão desses canais efêmeros é de
88,444 km, na área mapeada.

2) Áreas de conservação de nascentes. São constituídas por ambientes que ainda


apresentam surgências perenes ou intermitentes razoavelmente preservadas, sobre
litologias do Grupo Cuiabá, que devido a sua porosidade e permeabilidade permitem a
infiltração e armazenamento das águas de chuva, formando aqüífero subterrâneo, que
abastece os cursos d’água, e permite a ocorrência de nascentes.

Essa categoria de ZIA tem significativa expressão em área contendo surgências d’água
ou nascentes que excepcionalmente pela natureza dos terrenos urbanizados de Cuiabá,
fluem diretamente da rocha, podendo dar origem a cursos d’água perenes ou a cursos
d’água intermitentes. Representam, pela localização e conformação topográfica, áreas
sujeitas a invasões e ocupação clandestinas, com sérios riscos de degradação dos
recursos hídricos e do solo muito erodível.
37

A preservação dessas áreas de ZIA exige atenção especial das autoridades municipais
de maneira a impedir sua ocupação e degradação. Essas áreas correspondem a duas
situações de ocorrência: (a) Nascentes do córrego Baú, no setor norte da cidade,
apresentando área de 174,137 hectares (Figura 21), e (b) Barra do rio Coxipó,
localizado na confluência deste rio com o rio Cuiabá, nas proximidades da avenida Beira
Rio e da colônia São Gonçalo, apresentando área de 99,833 hectares (Figura 22).

Figura 21 – Delimitação da Área de Interesse Ambiental, Nascentes do Córrego Baú, incluindo a


área degradada do antigo bairro Águas Nascentes, que foi transferido pela Prefeitura Municipal.

Figura 22 – Delimitação da Área de Interesse Ambiental, Barra do rio Coxipó, que sofre
transbordamentos sazonais anuais no período das chuvas.
38

Há ainda uma área situada à margem direita do rio Coxipó, defronte à avenida das
Torres, com superfície de 35,010 hectares (Figura 23), que por se constituir em
remanescente de vegetação florestada, que bordeja a faixa de APP deste rio, formando
um continuum fitofisionômico de Cerradão (Savana Florestada) em contato com
Floresta Estacional, justifica-se como ZIA, sob o ponto de vista da proteção dos solos, e
do rio Coxipó, devendo ser proposto um sistema eficiente de drenagem de águas
superficiais advindos principalmente da Avenida das Torres, controlando de maneira
natural a ação erosiva e o conseqüente assoreamento. Além disso, a ZIA deverá
também, conservar as raras formas vegetacionais existentes no âmbito da malha
urbana de Cuiabá. Se preservada, além da funcionalidade como refúgio e zona de
anteparo da APP, servirá como fonte de fornecimento de propágulos de espécies
nativas.

Figura 23 – Delimitação da Área de Interesse Ambiental, cujo remanescente de vegetação


forma um continuum na paisagem, incluindo a APP do rio Coxipó, a qual está sendo proposta
para a criação do Parque Municipal Avenida das Torres.

Sugerimos que tais áreas sejam transformadas em Parques Municipais com sua
viabilização por meio de projeto técnico que leve em conta as peculiaridades de meio
físico, funcionamento hídrico e cobertura vegetal. A categoria de Parque (conceituado
na Lei 9.985/2000) do Grupo de Unidades de Proteção Integral, só é admitido o uso
indireto dos seus recursos naturais. Dessa forma considera-se que as ZIA’s voltadas à
conservação de nascentes e cursos d’água necessariamente devam ser implantadas na
forma de Unidade de Conservação, na categoria de Parque Municipal, cujo uso indireto,
previsto em lei, são para fins de lazer, educação ambiental e atividades culturais.
Consideramos que manter essas áreas na forma de Zona de Interesse Ambiental em
áreas privadas não garantem a preservação e conservação necessário à manutenção
das nascentes e dos cursos d’água.

A Figura 24 apresenta a localização das áreas de ZIA’s sugeridas para a criação de


Parques Municipais.
39

Figura 24 – Em vermelho, as Zia’s definidas neste estudo para a criação de Parques, e em amarelo, os
Parques já existentes no município de Cuiabá/MT.

Os Parques Municipais são espaços ambientais que possuem importantes características


naturais, sendo legalmente instituídos pelo Poder Público com objetivos de preservação.
Possuem limites definidos e existem sob um regime especial de administração, ao qual
se aplicam garantias adequadas de proteção. Ressaltamos a necessidade de que seja
implementado Planos de Recuperação de Áreas Degradadas – PRAD, para os locais
alterados no âmbito das áreas recomendadas com Parques, incluindo as áreas de
entorno que formam as zonas tampão dessas unidades.
40

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
As Áreas de Preservação Permanente (APP’s) e as Zonas de Interesse Ambiental
(ZIA’s), incluindo-se aqui as unidades de conservação na forma de Parques Municipais,
apontadas no Mapa Síntese, em anexo, constituem um total aproximado de 2.681,277
hectares, sendo 1.468,874 hectares de APP’s, 903,422 hectares de ZIA’s e 308,981
hectares de áreas propostas para parques, cuja somatória representa 12,83 % da área,
objeto deste estudo. A maior parte dessas áreas encontra-se alterada pela forma
desordenada de ocupação, exigindo estratégia e ações que permitam reabilitar o
equilíbrio hidrológico, harmonizando a paisagem, e criando situação de estabilidade
ecológica.

Trata-se de grande desafio e vontade política, sob responsabilidade de todos nós,


administradores dos bens públicos e privados, e usuários desses bens. Por outro lado,
qualquer estratégia e ação a ser implementada requer tratamento ao nível da bacia
hidrográfica onde se inserem as áreas a serem recuperadas e preservadas, tratando-se
tanto de Áreas de Preservação Ambiental (APP’s), como de Zonas de Interesse
Ambiental (ZIA’s).

Nesse sentido, faz-se necessário, para as APP’s e ZIA’s, considerar as microbacias


correspondentes, quando da elaboração de planos e projetos voltados à recuperação
ambiental, contemplando medidas em grande parte de conhecimento do poder público,
destacando-se:

y Captação e tratamento das águas servidas e de esgoto a partir de projeto


que privilegie a microbacia como um todo, impedindo o seu lançamento nas
galerias de rede pluvial e nos cursos d’água intermitentes e perenes;
y Projeto e implantação de obras de drenagem (com reavaliação das
existentes), contemplando a microbacia como um todo, na determinação
condizente da vazão de projeto para o dimensionamento e concepção
correta das obras hidráulicas, evitando a concentração das águas pluviais
nas cabeceiras dos cursos d’água sem devida proteção e dissipação de
energia, com vistas ao controle dos processos erosivos;
y Recuperação e revegetação das áreas degradadas, especialmente ao longo
das APP’s, através de PRAD’s específicos para cada microbacia;
y Traçado viário evitando ruas longas situadas perpendicularmente às curvas
de nível;
y Realização de obras de terraplenagem executadas de forma simultânea com
as obras de drenagem, mesmo que temporárias, de maneira a se ter o
controle dos processos erosivos e de assoreamento;
y Inspeção periódica dos sistemas de drenagem, avaliando-se sua eficácia e
realizando-se reparos das partes destruídas, a desobstrução e o
desassoreamento dos coletores;
y Manutenção da cobertura vegetal em lotes não ocupados, e arborização das
ruas, a partir de um plano estrategicamente concebido e voltado
especialmente ao conforto térmico da população;
41

y Manutenção da limpeza das vias de circulação e demais espaços públicos,


especialmente nas áreas de nascentes e fundos de vales, equacionando-se
o problema do lixo.

Conforme demonstrado, parte dos cursos d’água, originalmente intermitentes e


perenes, encontram-se totalmente descaracterizados pela destruição das nascentes,
tornando-se, assim, canais efêmeros, transportando águas de chuvas, águas servidas, e
esgoto.

Consideramos ser tecnicamente viável a recuperação de parte desses cursos d’água,


desde que seja introduzido um sistema de captação e tratamento de esgotos, e a
implantação de obras de disciplinamento das águas de escoamento superficiais ao
longo dos talvegues; além da implantação de barragens de areia e subterrâneas, em
locais previamente selecionados, tratando-se de tecnologia simples, e de baixo custo,
que permite a retenção das águas de escoamento e de sedimentos transportados,
depositando-os em áreas de agradação, artificialmente construídas, onde são
armazenadas águas sub-superficiais, reativando, assim, nascentes e cursos d’água de
caráter intermitente.

6.1. Mapa síntese das ocorrências de áreas de preservação


permanente e de zonas de interesse ambiental
A consolidação deste trabalho está representada no “Mapa síntese das ocorrências de
Áreas de Preservação Permanente e de Zonas de Interesse Ambiental”, apresentado,
em anexo na forma de sete cartas, na escala 1:10.000 por facilitar a leitura e o
manuseio pelo público-alvo. A legenda desse mapa apresenta as seguintes unidades de
mapeamento:

1) Áreas de Preservação Permanente – APP

a) APP de nascentes (com raio de 50 metros) distribui-se no entorno dos locais de


ocorrência de nascentes que foram definidos em levantamentos de campo. Sua
representação está em traço contínuo, cheio e em cor verde.

b) APP de cursos d’água intermitente (em faixa marginal de 30m), cuja representação
está em traço cheio verde, acompanhando o leito, em linha azul tracejada. Caso o curso
d’água intermitente esteja com esgoto, a linha tracejada estará na cor preta.
Compreende a maior parte de linhas de drenagem de primeira ordem de menos de 10m
de largura, que se desenvolvem na zona urbana de Cuiabá.

c) APP de cursos d’água perene (em faixa marginal de 30m), representada em traço
cheio verde, acompanhando o leito da, em linha azul cheia. Caso o curso d’água perene
esteja com esgoto, a linha cheia estará na cor preta. Compreende a quase totalidade
das linhas de drenagem de segunda e terceira ordens, com menos de 10m de largura,
das bacias hidrográficas contribuintes da margem esquerda do rio Cuiabá.
42

d) APP de curso d’água perene (em faixa marginal de 50m), cuja representação está
em traço cheio verde, acompanhando o leito do rio Coxipó, que apresenta largura
variável, porém, entre 10 e 50 metros, no trecho em que atravessa a zona urbana de
Cuiabá. O seu curso está em traço cheio e na cor preta por receber águas servidas e de
esgoto na malha urbana da cidade.

e) APP de curso d’água perene (em faixa marginal de 100m), representada em traço
cheio verde, acompanhando a margem esquerda do rio Cuiabá, cujo leito tem largura
variável, mas entre 50m e 200m no trecho que separa a zona urbana de Cuiabá e de
Várzea Grande. Seu leito está em traço cheio e na cor preta por receber águas servidas
e de esgoto no trecho da malha urbana.

2) Zonas de Interesse Ambiental – ZIA

a) ZIA’s de cursos d’Água Efêmeros

Os cursos d’água efêmeros constituem linhas de drenagem de primeira ordem,


normalmente associadas aos setores de cabeceira das bacias hidrográficas, e devem ser
preservados desde o seu nível mais alto em faixa marginal com largura mínima de 30
(trinta) metros de cada lado, mantendo-se sempre com vegetação. Essas áreas, em sua
implantação, devem ser contempladas por sistema de drenagem de águas pluviais que
evitem o fluxo concentrado de águas que venham a desencadear processos erosivos a
jusante.

b) ZIA’s destinadas à criação de Parques Municipais, visando à conservação de


nascentes, áreas úmidas e remanescente de vegetação. Compreendem espaços
ambientais que possuem importantes características naturais, sendo legalmente
instituídos pelo Poder Público com objetivos de conservação. Possuem limites definidos
e existem sob um regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias
adequadas de proteção. A criação dessas Unidades de Conservação, no Grupo de
Proteção Integral e na Categoria de Parque Municipal, é uma proposta para diminuir os
impactos da urbanização sobre áreas de interesse ambiental, que necessitam da
preservação dos ecossistemas naturais, bem como dos recursos hídricos superficiais e
subterrâneos, além de proporcionar lazer, bem estar e qualidade de vida aos cidadãos.

Na legenda do mapa aparecem três áreas, representadas em traço contínuo, cheio e na


cor vermelha, como propostas para a criação de Parques Municipais, quais sejam:

9 Nascentes do córrego Baú, no setor norte da cidade.


9 Margem direita do rio Coxipó defronte à Av. das Torres.
9 Barra do rio Coxipó, na confluência deste rio com o rio Cuiabá.

Outras cinco áreas, que já haviam sido definidas anteriormente pela Prefeitura de
Cuiabá como ZIA’s, estão sendo reafirmadas, para serem mantidas também, na
Categoria de Parques Municipais. Estas áreas estão representadas no mapa em traço
contínuo, cheio e na cor magenta. São elas:

9 Horto Florestal e Parque da Saúde, situados no bairro Coxipó.


43

9 Parque Mãe Bonifácia, localizado no bairro Duque de Caxias.


9 Parque Massairo Okamura, na Morada do Ouro.
9 Tia Nair, ao lado do Condomínio Belvedere.
9 Parque Dante de Oliveira, localizado próximo à foz do ribeirão do Lipa.

3) Ocorrências de áreas úmidas (brejos)

As áreas úmidas constituem setores de surgências d’água difusas, formando ambientes


de agradação, que podem distribuir-se nos setores de cabeceiras e ao longo dos cursos
d’água, desempenhando importante papel na perenização de recursos hídricos,
devendo ser preservados em toda sua extensão. Em levantamentos de campo foram
identificados parte desses ambientes, e em destaque aqueles relacionados às nascentes
dos cursos d’água, não tendo sido possível a precisa delimitação das ocorrências
existentes em toda a malha urbana de Cuiabá. São áreas representadas com traço
descontínuo (tracejado) e em cor azul.

6.2. DIRETRIZES PARA MINUTA DE LEI


Os trabalhos realizados mostraram que a região onde se encontra inserida a área
urbana de Cuiabá apresenta peculiaridades no comportamento das águas de
escoamento superficial e subterrâneo expressos em sua rede de drenagem natural e
em suas nascentes.

Com relação ao escoamento superficial através dos cursos d’água (córregos e rios)
observa-se que parte deles, situados nos ambientes de dissecação, compreendem
canais de escoamento de águas de chuva não apresentando nascentes. Esses cursos
d’água são denominados de “efêmeros”, conforme o conceito de Bigarella (2003).
Entende-se que a Lei municipal deve claramente fazer referência a essa categoria de
drenagem como não contempladas com Áreas de Preservação Permanente.

Com relação à alimentação das drenagens naturais por nascentes, observou-se a


importância das áreas de agradação para a manutenção do equilíbrio hidrológico. Essas
áreas, popularmente conhecidas como brejos, devem receber a proteção legal e, a
exemplo das veredas19, ser protegidas proibindo-se a ocupação e a intervenção de
quaisquer obras que venha a alterar a circulação superficial ou subterrânea de seu
lençol. Nota-se que essas áreas úmidas, de vital importância para a manutenção dos
recursos hídricos e para os sistemas ribeirinhos, funcionam como zona tampão para a
preservação de nascentes ou cabeceiras de cursos d’água, onde há ocorrência de solos
hidromórficos.

Assim, recomenda-se que essas áreas úmidas e seu entorno sejam contempladas por
Área de Preservação Permanente, numa faixa com largura mínima de 50 metros, a
exemplo do previsto para as veredas na Resolução CONAMA 303.

19
O inciso 4º do artigo 3º da Resolução CONAMA 303, estabelece que constitui Área de Preservação
Permanente a área situada “em vereda e em faixa marginal, em projeção horizontal, com largura mínima
de cinqüenta metros, a partir do limite do espaço brejoso e encharcado”.
44

Com relação às Zonas de Interesse Ambiental (ZIA), previstas na Lei Complementar nº


44 de 23/12/1997, o trabalho propõe um novo conceito e identifica os espaços
territoriais em que as mesmas ocorrem, dependendo do recurso ambiental que se
deseja proteger. ZIA’s são, portanto, áreas que têm por objetivo a conservação do
ambiente natural, especialmente os recursos hídricos. Os recursos ambientais de
interesse à proteção são os recursos hídricos e florestais. As ZIA’s voltadas à
manutenção do equilíbrio hidrológico apresentam três situações, para as quais se
propõe que a lei municipal contemple:

1) Faixa marginal com largura de 30 (trinta) metros, ao longo dos cursos d’água
efêmeros, excetuando-se aqueles totalmente descaracterizados, conduzindo águas
servidas e de esgoto, ou com talvegues canalizados e suas margens pavimentadas e/ou
urbanizadas e que não seja possível reverter sua função protetora. Esses cursos d’água
efêmeros têm a função de receber as águas de chuva provenientes das vertentes
urbanizadas ou não urbanizadas, que se dirigem às cabeceiras e talvegues, e abastecer,
com energia dissipada, os cursos d’água de caráter intermitente ou perene. Essas áreas
devem ser mantidas idealmente preservadas, com cobertura vegetal nas faixas
marginais, e, se necessário, com a implantação de obras de drenagem visando o
disciplinamento das águas de escoamento, e/ou obras urbanísticas para criar condições
à implantação de áreas verdes, sejam elas voltadas ao lazer, às práticas esportivas,
praças, jardins, e/ou outras.

2) Área de conservação de nascentes do córrego Baú, com superfície de 174,137


hectares. Essa área apresenta ambiente com surgências perenes ou intermitentes
razoavelmente preservadas, sobre litologias do Grupo Cuiabá, que devido a sua
porosidade e permeabilidade permitem a infiltração e armazenamento das águas de
chuva, formando aqüífero subterrâneo, que abastece os cursos d’água, e possibilita a
ocorrência de nascentes. Representam, pela localização e conformação topográfica,
áreas sujeitas as invasões e ocupações clandestinas, com sérios riscos de degradação
dos recursos hídricos e do solo muito erodível.

3) Barra do rio Coxipó, localizado na confluência deste rio com o rio Cuiabá, nas
proximidades da avenida Beira Rio e da colônia São Gonçalo, apresentando área de
99,833 hectares. A importância ambiental dessa área é devido aos transbordamentos
sazonais no período chuvoso do ano, tendo a possibilidade de migração do leito do rio,
condicionado pelo grau de assoreamento deste na faixa da planície aluvionar. Apesar da
vegetação encontrar-se fortemente alterada, ainda pode ser recuperada através de um
PRAD.

4) Finalmente, indica-se para ZIA voltada principalmente à proteção de recursos


florestais uma área situada à margem direita do rio Coxipó e defronte para a Avenida
das Torres. Essa área, de 35,010 hectares, tem sua importância devido à necessidade
de se garantir a conservação de um ambiente florestado contíguo à APP do rio Coxipó,
e proteger os solos com caimento geral para a margem direita do rio Coxipó, impedindo
a ocorrência de erosão e assoreamento.
45

De maneira a se garantir real proteção dos recursos ambientais aqui contemplados,


sugere-se que nas ZIA’s Nascentes do córrego Baú, Avenida das Torres e Foz do
Coxipó, sejam implantados Parques Municipais.
46

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