You are on page 1of 1

Editorial

Editorial

Fibromialgia: O Desafio do Diagnóstico Correto

O
tema fibromialgia sempre esteve envolto em Em um artigo nessa edição, Milton Helfestein Jr, da
controvérsias e polêmicas. Mesmo o estabe- Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), apre-
lecimento de seu conceito e a validade do uso senta o caso de uma paciente com diferentes diagnósti-
do termo “fibromialgia” como diagnóstico específico cos de lesões musculoesqueléticas e dor difusa, sugerin-
têm sido motivo de debate na literatura até nos dias de do que o diagnóstico correto seria fibromialgia. Aponta
hoje. vários problemas nos diagnósticos prévios e salienta que
Acredito que essa seja uma questão já superada. Os o caso não é de doença ocupacional, discutindo também
pacientes têm um quadro clínico uniforme e quando a necessidade do afastamento do trabalho. Comenta
agrupados sob a denominação de “síndrome da fibro- com propriedade erros de interpretação dos exames
mialgia” puderam ser estudados através do método subsidiários e enfatiza a necessidade da correlação com
científico, obtendo-se assim grandes avanços no enten- achados clínicos.
dimento, não só da sua fisiopatologia, como também de Na questão da relação da fibromialgia com o traba-
abordagens a serem implantadas. lho, parece claro e já bem estabelecido que essa síndro-
A questão do diagnóstico, porém, ainda deve ser me não seja ocupacional, embora possa ser desencadea-
mais explorada. A utilização dos “Critérios de Classi- da pelo trabalho, principalmente nos casos em que um
ficação para Fibromialgia” do Colégio Americano de ambiente inadequado se associa à insatisfação pessoal
Reumatologia foi um grande avanço em termos de in- com a atividade.
clusão em estudos científicos. Mas para uso individual, Afastar ou não o paciente de sua atividade profissio-
com fins diagnósticos, ainda deixa muito a desejar. nal é um outro assunto polêmico. O objetivo de todo
O mesmo pode ser dito em relação aos “pontos médico, e em especial do reumatologista, é manter
dolorosos” (tender points) que, embora tenham seu paciente com uma boa qualidade de vida. Dentro
sua utilidade, não parecem ser determinantes para o desse conceito, a independência pessoal bem como a
diagnóstico de fibromialgia. O mais provável é que, inserção produtiva na sociedade devem ser mantidas.
na hipótese diagnóstica, tenhamos que considerar o Acredito que o afastamento do trabalho nos casos de
conjunto total de sinais e sintomas, além de levarmos fibromialgia deva ser uma medida extrema, pois contra-
em conta a presença das afecções satélites. É essencial ria a expectativa de uma saúde adequada. Entendo que,
termos em mente a teoria fisiopatológica atualmente em determinados períodos, quando a intensidade dos
aceita como mais provável, ou seja, que estamos diante sintomas for grande ou mesmo quando se apresentarem
de uma disfunção no processamento da dor. Portanto, co-morbidades, essa conduta possa ser considerada.
estaríamos diante de uma síndrome de amplificação do- Em suma, é fundamental que se aperfeiçoe a ava-
lorosa. Provavelmente, essa explicação não contemple liação dos pacientes tanto em relação ao diagnóstico
todas as características dessa síndrome, mas é um ponto quanto ao impacto das síndromes musculoesqueléticas.
de partida importante para que a compreendamos. O diagnóstico deve ser baseado na observação clínica
As dificuldades diagnósticas aumentam quando se com auxílio de exames subsidiários e não exclusivamente
trata de colegas de áreas básicas ou de especialidades nos seus resultados. Infelizmente, esse erro é cometido
que não têm tradição em pesquisa da fibromialgia. No com freqüência, especialmente no meio pericial. Crité-
início da história da fibromialgia observava-se escassez rios e instrumentos de avaliação de impacto devem ser
de diagnósticos. Atualmente, temos o contrário, uma aperfeiçoados e difundidos entre os profissionais da área
abundância de diagnósticos, com muitos falsos positi- trabalhista e pericial.
vos. O impacto dessa dificuldade extrapola o cuidado do
paciente e passa a afetar o relacionamento de médicos José Eduardo Martinez
e pacientes com a sociedade. Um exemplo é a questão Titular do Departamento de Medicina da Pontifícia
trabalhista que envolve essa síndrome. Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)

2 Rev Bras Reumatol, v. 46, n. 1, p. 1-2, jan/fev, 2006

You might also like