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Imagine que você colocou uma fronha de travesseiro bem esticada na boca de um balde, e
várias pessoas começam a jogar ali, de diferentes distâncias, bolas de pingue-pongue. As
pessoas podem jogar quantas bolinhas quiserem e com qualquer freqüência. O seu trabalho
é adivinhar, apenas olhando o movimento da fronha para cima e para baixo, quantas
pessoas estão ali, quem são elas e se elas estão se aproximando de você, se distanciando
ou estão paradas. Essencialmente, este é o problema com o qual o seu sistema auditivo
precisa lidar quando usa o tímpano como a porta de entrada da audição.
A maioria das pessoas presume que o mundo é exatamente como mostra sua percepção.
Entretanto, experimentos têm forçado pesquisadores, inclusive a mim mesmo, a confrontar
a realidade de que as coisas não são bem assim. Aquilo que realmente ouvimos é o final de
uma longa cadeia de eventos mentais que cria uma impressão – uma imagem mental – do
mundo físico. Em nenhum lugar isso é mais impressionante do que na ilusão perceptiva na
qual nosso cérebro impõe estrutura e ordem em uma seqüência de sons para criar o que
chamamos de música.
A maioria das gravações contemporâneas contém outro tipo de ilusão auditiva. Nossos
cérebros usam sugestões relacionadas ao espectro de som e os tipos te ressonâncias para
dizer-nos sobre o mundo auditivo ao nosso redor, assim como um rato usa seus bigodes
para aprender sobre o mundo físico que o cerca.
Engenheiros de som aprenderam a imitar essas sugestões com a intenção de inserir nas
gravações uma qualidade de "mundo real", mesmo quando estas foram gravadas em
estúdios sem qualquer reverberação. Reverberação artificial faz com que os sons de um
vocalista ou de um guitarrista pareçam vir da parte de trás de uma sala de concerto, mesmo
quando estamos ouvindo aquela música com fones de ouvido, quando o som está a apenas
alguns centímetros de nossos ouvidos. Os mesmo princípios podem gerar truques sonoros,
como aquele que faz com que um violão soe como se tivesse 3 metros de largura, e seus
ouvidos estivessem exatamente onde onde fica a abertura acústica (boca).
Efeitos Especiais
Gravações musicais nos permitem experimentar outras impressões sonoras que nunca
teríamos no mundo real. Engenheiros de som e músicos criam efeitos especiais que
enganam nosso cérebro por simular circuitos neurais especializados em discernir
características importantes de nosso ambiente auditivo. Por exemplo, nosso cérebro pode
estimar o tamanho de um espaço fechado tendo como base a reverberação e o eco
presentes no sinal sonoro que atinge os nossos ouvidos. Mesmo que poucos de nós
consigamos compreender as equações necessárias para descrever como os ambientes são
diferentes uns dos outros, todos poderíamos dizer se estamos em um banheiro pequeno e
apertado, ou em uma sala de concerto de tamanho médio, ou em uma imensa igreja, com
tetos bem altos. E podemos também dizer o tamanho da sala que um cantor ou um narrador
está, quando ouvimos suas vozes gravadas. Engenheiros de som exploram essa habilidade
para criarem o que chamo de "hiper-realidades", brincando com nossa percepção sonora de
espaço de forma equivalente aos truques cinemtográficos, onde uma câmera é montada no
pára-choque de um carro em alta velocidade.
Nossa habilidade de dar sentido à musica depende da experiência e das estruturas neurais
que aprendem sobre os sons e podem se auto-modificar a cada vez que uma nova canção
ou um trecho musical são ouvidos, ou ainda a cada vez que ouvimos uma música que já
conhecemos. Nosso cérebro aprende sobre um tipo de gramática musical que é específica
de nossa cultura, assim como aprendemos a falar a língua do país em que nascemos. Esse
fenômeno se torna a base para nossa compreensão musical e, finalmente, a base para o
que gostamos nas músicas, qual música nos toca, e como a música nos toca.
FONTE: http://www.musicaeadoracao.com.br/efeitos/ilusao_musical.htm
Nota:
Fonte: Revista New Scientist, vol. 197, nr. 2644 (23 de fevereiro de 2008), pp. 34-38.
Artigo original disponível on-line em http://www.newscientist.com/article/mg19726441.500-
music-special-the-illusion-of-music.html