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Código de Ética do Centro Zen de Rochester

(Tradução de Francisco Scherer; Revisão de Giovanni Kakugen)

I. Os Preceitos Budistas

A. Introdução

Como membros do Centro Zen de Rochester, nós estamos intrinsecamente ligados uns
aos outros, e as formas pelas quais nós interagimos podem ter um profundo efeito na nossa prática.
Por esta razão, uma força tarefa de Diretores do Centro Zen trabalhou durante os anos 2000 e 2001
para articular um Código de Ética para a Sangha diretrizes que, nós esperamos, irão ajudar a criar
um ambiente seguro, harmonioso e seguro. A força tarefa começou revisando os dezesseis preceitos
budistas e estudando as maneiras pelas quais estes preceitos modelam a nossa vida comunitária.

Os dezesseis preceitos são uma parte tão íntima da prática Zen que eles tem sido descritos
como sendo a veia da linhagem ancestral. Os preceitos podem ser entendidos em muitos níveis:
como apoio para a prática do despertar, como ambiente para esta prática, e como expressão do
despertar propriamente dito. Embora os preceitos possam ser entendidos de diferentes pontos de
vista por exemplo, que nós não podemos seguir de forma perfeita os preceitos, ou que nós já somos
completos da maneira como nós já somos nós não acreditamos que a prática Zen pode existir na
ausência dos mesmos.

Nós oferecemos quatro observações sobre o seguinte texto. Em primeiro lugar, enquanto
os preceitos sobreviveram ao teste de muitas gerações, a maneira pela qual eles são explicados e
praticados pode evoluir. Como Diretores do Centro Zen em um momento específico no tempo, nós
percebemos que nossas interpretações estão sujeitas a mudanças. Em segundo lugar, estas
interpretações não tem a pretensão de limitar o entendimento de ninguém ou de ser uma leitura
definitiva dos preceitos. Em terceiro lugar, este documento não tenta abordar quaisquer questões de
conduta pessoal que não tenham uma relação direta com a comunidade do Centro Zen. E, em quarto
lugar, estes princípios éticos não tem a intenção de se sobrepor a outras diretrizes específicas do
Centro Zen, mas sim complementar e viabilizar a aplicação das mesmas.

B. Os Três Refúgios

Os três refúgios representam a fundação e a orientação de nossas vidas como seguidores


do Caminho de Buda.

1. Eu tomo refúgio no Buda. Ao tomar refúgio no Buda, nós reconhecemos a Natureza


Búdica de todos os seres. Embora haja diferentes níveis de autoridade administrativa e religiosa no
Centro Zen, nós reconhecemos que todos nós somos, igualmente, a expressão da Natureza Búdica.

2. Eu tomo refúgio no Dharma. Ao tomar refúgio no Dharma, nós reconhecemos a


sabedoria e a compaixão do modo de vida Budista. É através do Dharma que nós exprimimos e
tornamos acessíveis os ensinamentos de Buda tal como nos foram transmitidos através da linhagem
de nossos professores. O termo Dharma é freqüentemente traduzido como Lei , e nesta
perspectiva nós podemos ver os ensinamentos de Buda como diretrizes para nosso comportamento
em todas as áreas de nossas vidas.

3. Eu tomo refúgio na Sangha. Ao tomar refúgio na Sangha, nós reconhecemos o


importante papel que a vida comunitária do Centro Zen desempenha na nossa prática. A fim de que a
Sangha seja um refúgio, nós aspiramos criar um ambiente inclusivo, com espaço para compreensão
e aceitação de nossas diferenças. Ao mesmo tempo, nós trabalhamos para implementar a percepção
de que a Sangha e seus membros não são entidades separadas. Uma comunicação aberta e
permanente dentro da Sangha é essencial para que seja criado este refúgio. Quaisquer preocupações
ou conflitos éticos devem ser integralmente ouvidos e apropriadamente discutidos.

C. As Três Resoluções Gerais

As Três Resoluções Gerais são inseparáveis da prática budista ensinada no Centro Zen.
Eles representam a aspiração de qualquer seguidor do Caminho de Buda.

1. Eu decido evitar o mal. Evitar o mal significa abster-se de dano a si mesmo e aos
demais ou a animais, plantas ou à Terra por meio de nossos pensamentos, palavras e ações.

2. Eu decido fazer o bem. Fazer o bem significa agir com base na compaixão e
equanimidade de nossa natureza desperta. Como parte de nosso esforço para viver eticamente, nós
abraçamos as práticas Mahayanas da confissão, do arrependimento, reparação e reconciliação.

3. Eu decido libertar todos os seres sencientes. Libertar todos os sencientes significa


manifestar a nossa Natureza Búdica para o benefício de todos. Quando nós expressamos a nossa
natureza desperta, nós damos aos demais a oportunidade descobrir a sua própria Mente Verdadeira.

D. Os Dez Preceitos Cardinais

Os Dez Preceitos Cardinais são inseparáveis da Natureza Búdica e de nossos


relacionamentos.

1. Eu decido não matar, e sim cuidar de toda forma de vida.

Este preceito expressa a intenção de viver de forma compassiva e inofensiva, e deriva do


reconhecimento da unidade intrínseca de toda existência. Quando compreendido em seu contexto
mais amplo, não matar também pode ser entendido como não causar dano, especialmente não
causar dano ao corpo ou a psique de outro. Violência física e comportamento abusivo (o que inclui
ameaças física e demonstrações extremas de raiva e malícia) são vistos como uma forma de matar .

Conseqüentemente todas as armas de fogo e outras armas projetadas principalmente para


tirar a vida não são permitidas dentro dos locais de prática do Centro Zen, e carnes não deverão ser
consumidos dentro dos locais de prática do Centro Zen, a menos que tal seja permitido pelo Abade
em circunstâncias especiais. Nós também reconhecemos nosso papel, seja diretamente ou em
cumplicidade com outros, no aniquilamento de outras formas de vida. Como nós somos uma Sangha,
quando questões que incluem o aniquilamento de animais e plantas são levantadas, nós precisamos
cuidadosamente considerar as nossas necessidades reais e nossas responsabilidades, para que seja
possível trabalhar para o benefício de todos os seres.

2. Eu decido não tomar o que não é dado, e sim respeitar a propriedade alheia.

Este preceito expressa o comprometimento de viver com base em um coração generoso,


ao invés de viver com base em uma mente ávida. Este comprometimento está baseado na percepção
de que, tal como nós somos, nada nos falta. Em um nível pessoal, o comportamento ganancioso
prejudica a pessoa que rouba tanto quanto prejudica a pessoa que é vítima do roubo. Em nível
comunitário, roubar pode comprometer ou mesmo destruir o ambiente de confiança mútua para a
prática Zen. Aqueles que administram os fundos da Sangha ou outros recursos tem a
responsabilidade especial de zelar pelos mesmos e impedir o mal-uso deliberado ou a apropriação
indébita destes recursos e fundos, uma vez que o mal uso deliberado e a apropriação indébita são,
ambos, formas institucionais de roubo (Favor consultar Seções V, Conflitos de Interesse, e VI,
Política Financeira, Proibição de Benefício Privado, no texto infra).

Em adição, nós reconhecemos que o mal-uso de autoridade e status é uma forma de tomar aquilo que
não é dado. Dentro da complexa vida da Sangha, vários níveis hierárquicos de autoridade e
anterioridade desempenham uma função em determinadas situações. É particularmente importante
que indivíduos em posições de confiança não utilizem a sua autoridade como uma forma de obter
privilégios especiais, ou como uma forma de controlar ou influenciar os demais de maneira
inapropriada.

3. Eu decido não utilizar mal a minha sexualidade, e sim ser cuidadoso e responsável.

Nós reconhecemos que a sexualidade faz parte da nossa prática tanto quanto qualquer
outro aspecto das nossas vidas diárias. Reconhecer e honrar a nossa sexualidade é uma forma de
criar um ambiente onde relacionamentos conscientes e compassivos podem ser cultivados.

Deve ser tomado um cuidado especial quando pessoas de status desiguais ou níveis
desiguais de autoridade iniciam uma relação sexual. Em especial, existem duas formas de
relacionamento que podem levar a grande dano e confusão. Cada uma destas formas é considerada
uma violação deste preceito.

Em primeiro lugar, todo adulto que se envolver sexualmente com um menor está
incorrendo em comportamento sexual inadequado. Evitar relacionamentos desta natureza é uma
responsabilidade exclusiva do indivíduo adulto.

Em segundo lugar, é considerado um mal abuso de autoridade, responsabilidade e


sexualidade o envolvimento sexual de um professor do Centro Zen com o seu ou sua estudante. Se
um professor e/ou estudante sentir-se em risco de violar esta diretriz, ela ou ela deve suspender o
relacionamento professor-aluno e procurar aconselhamento com o Abade do Centro Zen e/ou com o
Comitê de Aconselhamento.

Antes de formar um relacionamento sexual com qualquer um que é ou recentemente


tenha sido um estudante, qualquer Instrutor, o Responsável pelo Zendo, qualquer Líder Afiliado, ou
qualquer outra pessoa em uma posição formal que possa acarretar claras vantagens ou influência
sobre outros, deverá discutir com o abade se este potencial relacionamento é adequado e correto. O
Abade, antes de formar um relacionamento desta natureza, deverá discutir com o Comitê de
Aconselhamento se este é adequado e correto. É também considerado um mal uso da sexualidade o
envolvimento sexual de um professor do Centro Zen com um ex-estudante antes do término do prazo
de um ano, contado a partir do término do relacionamento professor-estudante.

Um cuidado especial deve ser tomado com novos membros do Centro Zen. Nós
acreditamos que um novo membro demora aproximadamente seis meses para estabelecer os
fundamentos da sua prática e começar a entender a complexa natureza dos relacionamentos internos
da Sangha. A fim de proteger a oportunidade de prática que todo novo membro tem, nós esperamos
que qualquer membro com mais de seis meses de prática aja com especial cuidado antes de formar
um potencial relacionamento com qualquer pessoa durante os primeiros seis meses da sua
participação, como membro, das atividades do Centro Zen.

Qualquer pessoa que vier ao Centro Zen, em qualquer condição, tem o direito de não ser
assediado sexualmente. Continuar expressando interesse sexual, após ser informado de que tal
interesse não é bem-vindo, também é considerado um mal uso da sexualidade (Ver Seção II,
Relacionamentos Bilaterais, e Seção III, Assédio Sexual, no texto infra).

4.Eu decido não mentir, e sim falar a verdade.

O preceito não mentir é particularmente importante para a vida comunitária de uma


Sangha. Apesar de as transgressões éticas poderem envolver qualquer um dos preceitos, muitas
dessas dificuldades não surgiriam se não houvesse um elemento de falsidade envolvido. Mentir para
si mesmo, para outro ou para a comunidade obscurece a natureza da realidade e cria obstáculos à
prática do Budismo. Mentir pode incluir a retenção intencional de informação, meias-verdades, a
criação deliberada de falsas impressões, e não corrigir abertamente as mentiras.

Uma comunicação aberta e direta é essencial em nosso trabalho e prática comunitária.


Nós temos direito à informação completa e direta quando nós solicitamos avaliações sobre nosso
comportamento, posição, ou desempenho no seio da comunidade. Com nossa solicitação esperamos
que esta informação seja dada com um espírito de honestidade e compaixão.

Estudantes no Centro Zen deveriam sentir que eles podem praticar livremente em uma
atmosfera de confiança. Os professores e líderes de prática do Centro Zen não devem revelar
informação recebida em dokusan, daisan, ou em discussões onde a confidencialidade é solicitada e
concedida, a não ser que sério dano possa resultar à indivíduos ou à Sangha se esta informação não
for revelada. Mesmo quando não há solicitação específica de reserva, estas informações não devem
ser partilhadas casualmente em nenhuma circunstância por nenhuma das pessoas envolvidas na
conversação. No contexto do processo de ensinamento, entretanto, consultas entre professores sobre
assuntos que não são estritamente confidenciais podem ser apropriadas, particularmente quando
membros da equipe de funcionários estão envolvidos. Todos aqueles que se envolverem nestas
consultas deverão fazer todo esforço para assegurar que isto é feito de forma sensível, justa e
respeitosa.

5. Eu decido manter a minha mente clara, não abusar do álcool ou outros intoxicantes, e
nem levar os outros a fazê-lo.

A prática budista ocorre dentro de um contexto de consciência e plena atenção, um estado


de mente que não é condicionado por tóxicos de nenhum tipo. Quando a claridade é perdida, é muito
fácil violar os demais preceitos. Além disso, nós pretendemos que o Centro Zen seja um ambiente
que apóie aqueles que estão tentando viver sem tóxicos. Portanto, álcool e intoxicação por drogas no
Centro Zen é inapropriado e constitui causa de preocupação e possível intervenção.

Quando um membro está envolvido em uso abusivo de drogas ou se torna dependente das
mesmas, é importante lembrar-lhe que a liberação de todos os apegos está no coração da prática
Budista, e que se espera que ele ou ela busque ajuda dentro e/ou fora da Sangha. Uma vez que a
negação dos fatos é freqüentemente um sintoma de dependência, a Sangha é encorajada a ajudar
pessoas dependentes a reconhecer a necessidade de auxílio.

6. Eu decido não falar sobre as falhas de outros, mas sim ser compreensivo e solidário.

Este preceito deriva de nossos esforços para construir harmonia social e compreensão
mútua. Declarações falsas e maliciosas, por sua própria natureza, são atos de alienação que
originam-se de uma percepção ilusória de oposição entre eu e outros . Geralmente a injúria traz
como conseqüências a dor para os outros, e a fragmentação para a Sangha. Quando surgir a intenção
de injuriar, esforçar-se para compreender as raízes deste impulso já uma expressão deste preceito. E
mesmo quando uma afirmação difamatória é consistente com os fatos, aqueles que se engajarem em
criticismo gratuito podem ser feridos pela influência negativa que resulta do ato de falar de forma
insistente nas falhas de outras pessoas.

7. Eu decido não enaltecer a mim mesmo e desfazer os demais, mas sim superar as
minhas próprias limitações.

Enquanto que alegrar-se com nossas melhores qualidades e feitos é uma prática Budista
consagrada pelo tempo, elogiar a si mesmo ou buscar um ganho pessoal às custas dos demais é uma
atitude derivada de uma compreensão equivocada da natureza interdependente do eu . No Centro
Zen, poderá ser necessário, em alguns casos, criticar a ação de certos indivíduos ou grupos. Quando
tal é feito, nós devemos prestar atenção especial aos nossos motivos, ao conteúdo específico do que é
dito, a quem é dito, e às potenciais repercussões da crítica.

8. Eu decido não sonegar ajuda espiritual ou material, mas conceder-las gratuitamente


quando necessário.

Todas os cargos no Centro Zen, incluindo a função de Abade, existem para o apoio da
prática e despertar de todos. Nem os recursos do Centro Zen nem qualquer posição dentro do Centro
Zen são posse de alguma pessoa específica. Não é apropriado para qualquer um, especialmente um
professor, usar seu relacionamento com o Centro Zen para obter vantagem pessoal às custas da
Sangha ou de qualquer um de seus membros (Ver Seção V, Conflitos de Interesse, e Seção VI,
Política Financeira Proibição de Benefício Privado, no texto infra).

No espírito de desprendimento, grupos de tomada de decisão no Centro Zen devem tomar


decisões conjuntas de forma cooperativa, e com um esforço sincero de levar em consideração todos
os pontos de vista. É importante que as finanças do Centro Zen, a estrutura do processo de decisão, e
as atas dos órgãos mais importantes de decisão sejam disponibilizadas à todos de uma forma
acessível e compreensível.

9. Eu decido não me entregar à raiva, mas sim praticar a paciência.

O cultivo da má-vontade é um veneno para indivíduos e para a comunidade. Ainda mais


corrosivo é o cultivo de idéias de vingança. Os membros da Sangha que estiverem em conflito ou
tensão com outros membros ou com qualquer grupo de tomada de decisão do Centro Zen devem
tentar resolver estes impasses diretamente em espírito de honestidade, humildade e de amor-
bondade. Entretanto, se uma resolução informal não é viável, a mediação deve ser buscada como
uma forma de esclarecer a dificuldade.

10. Eu decido não desrespeitar Três Tesouros (Buda, Dharma e Sangha), mas sim nutri-
los e sustenta-los[1].

Como os Três Tesouros são inseparáveis uns dos outros, o despertar modela a nossa
prática e a nossa vida comunitária, a prática modela a nossa vida comunitária e o nosso despertar, e a
vida comunitária modela o nosso despertar e a nossa prática. O desrespeito a qualquer um dos três
tesouros acarreta também danos para os outros dois.

Reconhecer as nossas transgressões, buscar reconciliação, e renovar o nosso


compromisso com os preceitos é o trabalho da Natureza Búdica e a reafirmação nosso lugar na
Sangha. Quando a integridade da Sangha é honrada e protegida, os Três Tesouros se manifestam.

[1] Outras traduções possíveis: preservar, defender, apoiar. (N.T.)

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