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Carta do Dia: A SACERDOTISA

sacerdotisa Minha tia Alba, falecida aos oitenta e muitos anos, era além de
tia, uma grande amiga e conselheira a quem, nós os sobrinhos e muitos dos demais
membros da nossa família, recorriam em diversas situações.
Tia Alba saiu da fazenda do interior paulista, onde nasceu, bastante jovem,
para estudar em São Paulo. Raras vezes voltou, durante os anos de formação como
professora, para a casa dos pais, primeiro por razões econômicas, segundo porqu
e estava sempre envolvida fazendo cursos que complementassem a sua formação. Foi
uma aluna séria e exemplar, tendo graduado com os méritos apropriados. Orgulho
da família.
Até, que num rompante de rebeldia inapropriado para aqueles tempos e contra
riando todas as expectativas da família que continuava a morar no interior, Tia
Alba resolveu ficar morando em São Paulo, depois de formada e morando numa pensã
o para moças, a qual, deixou bem claro desde o início, pagaria com seus salários
de professora primária concursada e aprovada pelo Estado. Minha avó chorou tod
as as lágrimas que tinha e meu avô trancou-se num silêncio magoado e desaprovado
r, mas as coisas aconteceram como minha tia havia planejado.
Tia Alba nunca casou-se, o que não significa que não tivesse tido, de acord
o com suas irmãs, uma grande paixão de quem não se sabe praticamente nada, nem m
esmo se realmente aconteceu. Tia Alba nunca teve problemas financeiros, pois seu
s proventos como professora sempre lhe garantiram uma vida confortável, o que se
manteve pelo fato dela ter sempre sido bastante equilibrada com seu dinheiro, s
ó gastando o que podia, parcimoniosa e discreta na aquisição de roupas e acessór
ios. Seu único luxo eram os livros, que por motivos econômicos comprava nos muit
os sebos da capital paulista.
Seu apartamento silencioso e tranquilo, onde viveu a vida toda desde que de
ixou a pensão, era quase um parque de diversões para nós, seus sobrinhos, pois e
ra um verdadeiro cenário onde se misturavam quadros em largas molduras douradas,
inúmeras fotos de família em porta-retratos de prata, um piano com o marfim ama
relado pelo tempo e pelo uso, vasos com flores, coleções de xicarazinhas, de col
herinhas, de pratinhos estampados com fotos em sépia de lugares onde ela havia e
stado, de bibelôs os mais diversos, tapetes exóticos e muitas plantas. Toalhas d
e crochê que ela mesma fazia protegiam os encostos dos sofás de veludo e delicad
os lenços de seda colorida recobriam as cúpulas dos diversos abajures que ilumin
avam mortiçamente a sala.
O que mais me fascinava eram as estantes recobertas de livros, onde o doura
do esmaecido das encadernações em couro reluziam naquele ambiente onde parecia s
er sempre fim de tarde e onde incensos perfumavam o ambiente com cheiros de terr
as que me pareciam tão distantes e exóticas. Eram prateleiras e prateleiras de m
adeira escura, cheirando a óleo de copaíba, que ocupavam o corredor de entrada,
paredes da sala de visitas e praticamente revestiam o quarto de hóspedes.Tia Alb
a era uma grande leitora. Lia de tudo. Todas as revistas da época, todos os jorn
ais, e tinha conta-corrente nas melhores livrarias do centro paulistano. Aos nos
sos olhos ela era uma sábia. Não conhecíamos ninguém, no restante da família, qu
e se parecesse com ela e, para ser sincero, nem mesmo entre as nossas amizades.
Quando a visitávamos, era uma festa para os sentidos, pois não só a sua cas
a era um verdadeiro tesouro recheado de delícias a serem decifradas, experimenta
das, compreendidas, apreciadas, como Tia Alba era uma excelente cozinheira. “Nis
so somos todas iguais!”, dizia orgulhosa minha mãe, referindo-se aos predicados
domésticos das mulheres da família. Sua casa era impecável e tudo rescendia e la
vanda antiga e temperos orientais. A mesa de jantar arrumada para o lanche da ta
rde era um requinte de toalha de renda (“Eu mesma escolhi em comprei em Veneza”,
dizia ela), talheres reluzentes, pratos e xícaras de porcelana fina como uma ca
sca de ovo, estampadas com mini-buques de rosas e frisos dourados. Bolos e bolac
has com sabor de Natal pareciam ser uma constante naquela mesa. Tia Alba era uma
grande anfitriã e nunca saíamos da sua casa sem um presentinho e, como ela mesm
a dizia, “Olha aqui um dinheirinho para o seu cofrinho”.
Mas o que mais nos atraía a ela era, além da sua aura de mistério (tão dife
rente da minha mãe e das outras tias…) a sua capacidade de nos compreender em no
ssas dúvidas e curiosidades de adolescentes. Com ela podíamos nos abrir, falar f
rancamente, pois sabíamos por intuição e por experiência que nunca seríamos dela
tados em nossas confissões. Ela nos ouvia, coisa que os demais pareciam não sabe
r fazer. Ela prestava atenção e demonstrava que tudo aquilo que dizíamos era rea
lmente importante e que merecia ser ouvido e analisado. E o que mais nos surpree
ndia era o fato que ela não vinha com lições de moral ou pretendendo defender co
m unhas e dentes uma posição diferente da nossa, mas nos fazia compreender que,
por menor ou mais estanque que pudesse parecer, toda idéia, todo desejo, todo pl
ano de ação deveria considerar também outras opções, outros desdobramentos e, po
r que não?, alguma rota de fuga. Tia Alba merecia ter recebido um diploma de psi
cóloga outorgados por todos nós que nos valemos da sua sabedoria, da sua discriç
ão, de seus conselhos, de sua paciência infindável.
Quando ela faleceu fazia algum tempo que não nos víamos. No seu enterro nós
, o que restou dos sobrinhos, mais duas de suas irmãs e muitos de seus ex-alunos
, recordávamos momentos daquela mulher incrível, tão cheia de mistério em sua vi
da particular, tão afetiva conosco, tão inteligente, tão culta. Discretíssima a
vida toda na sua forma de vestir, de agir, de se movimentar, era de uma elegânci
a natural, simples e refinada na sua forma quase antiquada de ser.
Reencontrei-me com a família quando o advogado nos convocou para ler o test
amento feito por ela, muitos anos antes. Tia Alba nos deixou, além do apartament
o que morava e que sempre acreditamos ser alugado, mais dois excelentes imóveis,
e uma razoável poupança acumulada com os proventos da aposentadoria que recebia
como beneficiária de um militar. Nossos queixos literalmente caíram. Tia Alba t
eve um amante, um companheiro, um parceiro e nunca soubéramos de fato! Nunca ouv
e nada, uma insinuação na sua conversa ou um detalhe em sua casa que nos fizesse
acreditar que ela tivesse alguém. Tia Alba viveu seu próprio mistério, seu próp
rio segredo a vida toda, guardando-o somente para si. Não foi somente nossa conf
idente, nossa orientadora, mas despertou em nós a consciência de que tudo o que
precisávamos realmente saber sobre a vida e o viver encontrava-se, desde sempre,
dentro de nós mesmos. Que os livros que nos sugeria ou as explicações que nos d
ava, eram apenas roteiros para que nós mesmos pudéssemos desenterrar esses tesou
ros que haviam dentro de nós. Tia Alba, a eterna professora, nos ensinava a comp
reender e a formar as sílabas, palavras e sentenças com um alfabeto que tínhamos
guardado em nosso interior e que ela nos ajudou a descobrir, compreender e util
izar como um mapa, um guia, um livro de orientação para todas as horas e ocasiõe
s. Ela era nossa tia, nossa mestra, nossa mentora espiritual e nossa cúmplice. U
ma sacerdotisa sabedora dos maiores mistérios.
Quando a Sacerdotisa, também chamada de Papisa, surge numa tiragem de tarot
, dependendo sempre da sua colocação e das cartas que a cercam, além da questão
abordada pelo consulente, pode significar, entre muitas outras possibilidades, a
ssuntos ou negócios que não podem ser revelados; segredo, enigma; silêncio, recl
usão; estudo, memória, observação, reflexão; intuição; perguntar-se o que sente
ou invés do que pensa; estar de bem com a vida e consigo próprio; experimentar s
entimentos que não se consegue traduzir em palavras, tempo de meditação e recone
ctar-se com sua verdade interior; auto-suficiência, independência, autonomia; po
upança, contenção, economia; gravides desejada; instinto maternal; bissexualidad
e; moralismo; esoterismo; espiritualidade; mediunidade.
Em termos de saúde, a carta da Sacerdotisa alerta para a possibilidade de p
roblemas ginecológicos, tais como cistos e miomas; problemas de menopausa ou men
struação; problemas de próstata; problemas com garganta, cordas vocais, voz; pro
blemas intestinais; obesidade. Em relação ao amor, a Sacerdotisa pode se apresen
tar protetora e maternal; carinhosa; inibida, recatada; moralista ou amoral ao
extremo; voyeurismo; homo ou bissexualidade; pode ser a amante ou viver uma rela
ção que deve ser mantida em segredo; muito sensível, fica ofendida com qualquer
fato que considere uma desconsideração do parceiro; amores platônicos.
Seu lado “sombra” pode ser percebido em atitudes tais como permissividade,
intolerância; falta de carinho; puritanismo; falsidade; descaso ou irresponsabil
idade em relação aos outros; recusar-se ao auto-conhecimento; fofoqueira; instab
ilidade; desatenção; vida social intensa; não saber guardar segredos.
02-Major-Priestess Dentro do esquema da Árvore da Vida cabalista, a Sacerdo
tisa liga Kether a Tiphareth, ou seja, é o que une a sabedoria e a compreensão à
compaixão. É o caminho entre o mais alto, o mais espiritual, Divino e o nosso c
oração. Ela é a que carrega a água (emoção, intuição) através do abismo do deser
to (razão, intelecto), fazendo-se acompanhar pelo Livro da Sabedoria (o conhecim
ento relativo às leis da criação material) até Tiphareth, o lugar da fertilidade
e da compaixão, a chave dos mistérios de toda a existência física neste plano m
aterial.
Hoje, domingo, regido pelo Sol, poderíamos aproveitar para tomarmos consciê
ncia de que tudo o que precisamos, inclusive saber, está dentro de nós, basta qu
e abramos as nossas cortinas, afastemos os nossos véus, e permitamos descobrir e
sses mistérios. É hora de nos perguntarmos o que precisamos calar, o que precisa
mos manter reservado. Quais as lembranças que devo guardar e quais posso ou devo
me descartar. Fica também a sugestão, dessa Carta do Dia, de nos iniciarmos na
meditação, de forma sistemática, aprendendo a nos concentrarmos mais e melhor,
nos desligando do exterior e vivenciando o nosso eu, permitindo assim que conheç
amos melhor nossos recursos pessoais. E, finalmente, ouvirmos atenciosamente a n
ossa própria intuição, a voz dos nossos sentimentos e emoções, das nossas percep
ções, para que possamos, ouvindo os nossos semelhantes, ajudá-los também.
Tenham todos um excelente domingo!
Imagem: TAROT NAMUR, por Prof. Namur Gopalla e Marta Leyrós (Academia de Cultura
Arcanum)
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