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Humanidades e Tecnologias
2º Ano do Curso de Direito
(pós-laboral)
DIREITO PENAL
Índice
3. Limitações Constitucionais 6
5. Discussão / Conclusão 11
6. Bibliografia
O conteúdo do debate acerca de qual sentido que deve tomar, no interior do Estado
Democrático (e Social) de Direito, o modelo penal e processual penal português vem
mantém acesa uma celeuma filosófica – ainda que não explícita –, a partir de
divergências que envolvem concepções de vida e modos-de-ser-no-mundo centrados nas
mais diversas justificações materiais e espirituais. O substrato de fundo destes embates,
entre tradições de pensamento tão diversas e, em grande parte dos assuntos,
antagónicas, revela uma contraposição ainda mais fundamental e consistente num conflito
quanto aos bens jurídico-penais que efectivamente merecem protecção penal nesta
quadra da história. Ao contrário do que acontece na maioria das Constituições
contemporâneas, estes conflitos estão positivados no texto constitucional português. Isso
implica a tomada de atitudes por parte do legislador ordinário. Ocorre, entretanto, que o
legislador, ao lado da doutrina e da jurisprudência pátrias, continua atrelado ao paradigma
liberal-individualista, podendo perceber-se, nestes trinta e dois anos de Constituição
compromissória e social, entre outros aspectos,
a) Certa dificuldade de coexistência de determinados princípios e valores tradicionalmente
imputados ao direito penal pelas vertentes liberais-iluministas, caracteristicamente
individualistas; e
b) Outra gama de princípios e valores (como definimos?) que sustentam a legitimidade de
novas matrizes normativas dirigidas à tutela de bens não individuais.
A opção do legislador constituinte em positivar comandos criminalizantes provocou – ou
deveria ter provocado – uma drástica mudança no tratamento dos bens jurídico-penais.
Por outras palavras, é possível afirmar que, ao contrário do que sustentam os penalistas
adeptos de posturas minimalistas, o constituinte não albergou a tese da "intervenção
mínima do direito penal", mas, ao contrário disso, colocou, pelo menos hipoteticamente, a
possibilidade de subversão de grande parte de uma hegemonia histórica nas relações de
poder sustentadas e reproduzidas, em não desprezível parcela, pela aplicação da lei
penal.
Essa questão vem agravada a partir do comando constitucional de o legislador enquadrar
algumas condutas no rol dos crimes hediondos. E com as consequências que isso terá.
Sendo a Constituição Democrática a projecção e expressão jurídica fundamental da
concepção ético-social da comunidade sobre os princípios que devem estruturar o
O Direito Penal, a sua missão dentro do Estado Social Democrático de Direito, Material,
tem certas funções. A primeira delas é a indispensável protecção de bens jurídicos
essenciais, protegendo de modo legítimo e eficaz os bens jurídicos fundamentais do
indivíduo e da sociedade.
Em sentido amplo, é qualquer coisa - objecto material ou imaterial - que satisfaz uma
necessidade humana, é tudo que tem valor para o ser humano, que se apresenta como
digno, útil ou necessário. O direito penal só deve actuar na defesa dos bens jurídicos
imprescindíveis à coexistência pacífica dos homens (princípio da exclusiva protecção de
bens jurídicos), o que concede ao direito penal um carácter fragmentário. Os bens
jurídico-penais essenciais devem ter referência explícita ou implícita na ordem
constitucional dos direitos humanos fundamentais. Como alerta Figueiredo Dias, é
somente por esta via “que os bens jurídicos se ‘transformam’ em bens jurídicos dignos de
tutela penal ou com dignidade jurídico-penal”. O Direito Penal é a indispensável tutela dos
bens jurídicos essenciais, a partir da contenção das condutas lesivas ou que exponham a
perigo tais bens.
3. Limitações Constitucionais
raça ou de qualquer outro característico que o designe como pertencente aos chamados
grupos minoritários.
Actualmente, a Constituição consagra uma série de garantias ou princípios em relação à
lei penal:
É possível afirmar, desse modo, que o legislador, num sistema constitucional que
reconhece efectivamente o dever de protecção do Estado, não está mais livre para decidir
se edita determinadas leis ou não.
Isto significa afirmar que o legislador ordinário não pode, ao seu bel prazer, optar por
meios "alternativos" de punição de crimes ou até mesmo pelo "enfraquecimento" da
persecução criminal sem maiores explicações, ou seja, sem efectuar juízo, isto é, a
exigência de juízo significa que as medidas tomadas pelo legislador devem ser suficientes
para uma protecção adequada e eficiente e, além disso, basear-se em cuidadosas
averiguações de factos e avaliações racionalmente sustentáveis. Não há grau zero para o
estabelecimento de criminalizações, descriminalizações, aumentos e atenuações de
penas.
A necessidade penal deriva que seja de recusar a existência das chamadas injunções
constitucionais implícitas de criminalização. Estas injunções significariam que, dada a
essencialidade ou dignidade penal de certos valores consagrados na Constituição, teria o
legislador ordinário de necessariamente criminalizar as condutas que os lesassem ou
pusessem em perigo.
A recusa destas imposições constitucionais assenta no facto de não bastar, para a
criminalização, a dignidade penal ou dimensão axiológica dos bens, exigindo-se, ainda,
que, no plano pragmático, a protecção desses bens encontre no recurso ao direito penal a
forma adequada de protecção. Em teoria tem de aceitar-se a hipótese de existirem
valores que possam ser mais eficazmente protegidos através de medidas jurídicas não
penais ou tão só medidas sociais do que através de medidas jurídicas não penais ou tão
só medidas sociais do que através de sanções penais. Em tais casos, não se justificaria a
criminalização das condutas lesivas de tais valores, pois que, apesar da dignidade
constitucional desses valores ou bens, não se verificava o pressuposto da necessidade da
pena.
Isto não significa que não haja bens jurídicos, consagrados na Constituição, que não
tenham, forçosamente, de ser tutelados penalmente. É evidente que os há: por exemplo,
a vida, a integridade física e a liberdade; e, em relação a estes bens, recai sobre o
legislador ordinário o dever de criminalizar as condutas que os lesem. Aliás, se é o próprio
legislador constitucional que expressamente prevê a existência de crimes e de penas (art
29º da CRP), é porque há algumas condutas que, de facto, não podem deixar de ser
criminalizadas pelo legislador ordinário.
Quando se nega a existência de injunções constitucionais implícitas de criminalização, é
que não é pelo facto de determinado valor ter uma essencial dignidade constitucional
(dignidade penal) que, necessariamente, terá de ser criminalizada a sua lesão; exige-se,
completamente, que haja necessidade penal no sentido acabado de referir.
Defender o contrário, parece-nos que só será aceitável para quem entenda que o direito
penal tem, para além de uma função de eficaz protecção dos bens jurídicos, uma função
simbólica. Ora, nós não partilhamos de uma concepção simbólica do direito penal por
duas razões: por um lado, achamos que o mundo do simbólico está num plano de apelo
cultural-espiritual muito acima do plano do mínimo exigível pelo direito penal; por outro
lado, atribuir ao direito penal um papel simbólico é abrir as portas à aceitação de “bodes
expiatórios”, o que o direito em geral e o direito penal em especial deve evitar a todo o
custo.
5. Discussão / Conclusão
Para ser-mos mais explícitos: devemos admitir que o legislador penal comete equívocos e
que estes podem trazer malefícios à sociedade. Ademais, constitui tarefa do legislador
demonstrar, nas hipóteses em que deseja abandonar as funções clássicas do direito
penal – e isso não lhe é vedado –, as razões pelas quais faz determinadas escolhas. Essa
questão assume foros de maior gravidade quando se está em face de um comando
explícito de criminalização, isto é, querendo ou não, o legislador não pode deixar de
considerar, por exemplo, o de tortura como crime de extrema gravidade, ao lado do
terrorismo.
Isso significa dizer que o legislador não poderá fazer "desvios" hermenêuticos a partir da
utilização de um afrouxamento que transforma a principal incidência do delito. O direito
deve ser decidido a partir de argumentos de princípio e não de políticas.
6. Bibliografia
Dias, Jorge Figueiredo, Direito Penal (Parte Geral – Tomo I), 2ª ed., Coimbra Editora,
2007.
Beleza, Teresa Pizarro, Direito Penal, 1º vol., 2ª ed., Associação Académica Faculdade de
Direito de Lisboa, 1984.
Carvalho, Américo Taipa, Direito Penal (Parte Geral), 2ª ed., Coimbra Editora, 2008.
Silva, Germano Marques, Curso de Processo Penal, Vol. I, 5ª ed., Editorial Verbo, 2008.