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Memória, Processos Sociais e Símbolos: uma interpretação a partir da

configuração-moda no Brasil

Salete Nery
Tomando como ponto de partida a trajetória do estilista brasileiro Alexandre Herchcovitch, busca-se
compreender o modo pelo qual suas produções se apresentam como símbolos que sintetizam o processo de
desenvolvimento da configuração-moda no Brasil, ao mesmo tempo em que, como tais, se apresentam como
produtos renovados articulando as transformações contemporâneas e ajudando a construir os delineamentos
futuros da configuração. Para tanto, a trajetória do estilista é interpretada em função das mudanças ocorridas no
cenário internacional de produção e consumo de moda, bem como da conformação nacional de uma estrutura de
meios de transporte, indústrias, suporte de serviços e políticas de desenvolvimento que contribuíram para os
rumos da configuração do modo como se deu no Brasil. O aporte interpretativo utilizado para fins desse trabalho
é a sociologia configuracional de Norbert Elias.
Palavras-chave: configuração; memória; processos sociais; símbolos; Brasil.

Introdução
A coleção feminina de Inverno 2009 do estilista brasileiro Alexandre
Herchcovitch, desfilada no São Paulo Fashion Week, teve como inspiração o caos urbano, a
mistura sem ordenamento, o cabaré dadaísta e o punk alemão. Segundo Herchcovitch, em
entrevista a UOL Estilo (19/01/2009), sua inspiração foi o crescimento desordenado e
composição arquitetônica de cidades como Berlim e São Paulo. Essas cidades teriam sua
unidade no desigual, na mistura, na conturbação visual de sua falta de regularidade. No
entanto, essa inquietante desarmonia forma um conjunto que incita o questionamento do que
seria, de fato, unidade e se a noção de unidade com que operamos corresponde efetivamente
àquilo que encontramos nas ruas de diferentes cidades espalhadas pelo mundo. Ao tomar
Berlim e São Paulo como exemplos, Alexandre Herchcovitch parece querer nos lembrar da
proximidade que pode ser percebida nessas cidades geograficamente distantes entre si, ainda
que permaneçam como distintas cidades. A provocação dessa estética urbana consiste na
aproximação, mesmo involuntária, entre edificações díspares em meio a peças publicitárias,
carros e mesmo transeuntes que não obedecem a padrões quanto à aparência. Herchcovitch
transporta isso para a linguagem dos “looks” de moda ao associar o cabaré ao punk, união
inicialmente inusitada entre temas e referências que parecem distantes. Em segundo lugar, e
talvez de modo mais impactante, tais concepções pautaram um trabalho têxtil de compor
diferentes texturas em uma mesma peça de roupa, criando uma espécie de ilusão visual.
Diferente do convencional trabalho em patchwork, que é a construção de uma peça a partir da
composição entre recortes de tecidos diferentes, Herchcovitch apresenta a diversidade dentro
do mesmo tecido. O caráter ilusório está em operar com o olhar convencional de que a
heterogeneidade ou assimetria implicam em cortes ou em uma reunião forçada de elementos.

Doutora em Ciências Sociais (UFBa), Professora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e
pesquisadora do Grupo Cultura, Memória e Desenvolvimento (UnB).
O estilista paulista nos confronta com uma nova percepção de unidade e, em acréscimo,
aponta uma São Paulo em conformidade com características de outras cidades desenvolvidas
da atualidade e, talvez nisso, busque expressar igualmente que o tipo de roupa que produz é
usável em São Paulo, do mesmo modo que em Berlim. Já no desfile masculino para a mesma
estação, buscou apoio, segundo ele, na saudade que as pessoas do mar têm do que deixaram
na terra. A coleção pode ser interpretada como uma espécie de nostalgia da fixidez e de certo
senso de tradição, de raízes deixadas para trás no curso dos acontecimentos, de terra por fim,
lembrando aqui, em certo sentido, a definição de Zygmunt Bauman (2007) de que estaríamos
em uma modernidade líquida. E nisso Herchcovitch se lança em busca do clássico através da
alfaiataria, resgatando-o e atualizando-o.
O objetivo deste artigo se centra na tentativa de tecer uma interpretação mais
profunda acerca da proposta apresentada por Herchcovitch nos seus mencionados desfiles.
Isso significa compreender sua produção articulando a peculiar trajetória do estilista em
função do desenvolvimento da configuração-moda no Brasil, o que remete às transformações
na estrutura urbano-industrial e de serviços no país, por um lado, e às condições de produção
e de consumo de moda internacionalmente. O aporte teórico-metodológico fundamental a
essa discussão é a sociologia configuracional de Norbert Elias (1999). Deste modo, a
configuração-moda é aqui tomada como a rede de interações que ata os diferentes indivíduos
envolvidos, que, em suas interdependências, vão definindo o curso da própria configuração de
que fazem parte. Como se trata de uma rede extensa e heterogênea, faz-se necessário
compreendê-la em sua diversidade e movimento constante. As modificações nos equilíbrios
de poder, ao longo do século XX e no início de século XXI, têm permitido um rearranjo na
configuração-moda em direção a uma maior complexidade das interações vigentes. As
produções de Herchcovitch articulam, como simbolizações, o processo sócio-histórico de
ampla escala que define sua trajetória pessoal. Herchcovitch, e outros tantos indivíduos que
poderiam ser utilizados aqui para estudo, é herdeiro desse processo, ao mesmo tempo em que
tem ajudado a construí-lo. Compreender sua proposta e o reconhecimento que tem conseguido
obter significa remontar a esse processo. Nesse sentido, como síntese, sua produção é
igualmente uma forma de cristalização e transfiguração da memória, pois, como símbolo,
aponta as referências que lhes serviram de base e transforma-as na composição de um objeto
renovado e atual. Assim, apenas aspectos desses processos podem ser efetivamente retomados
por via interpretativa, o que será feito articulando traços da trajetória do estilista,
transformações vividas em contexto brasileiro e o desenvolvimento da configuração-moda.
Judeus, São Paulo e comércio de roupas
Alexandre Herchcovitch é filho de Regina e Benjamin Herchcovitch, judeus de
ascendência européia cujas famílias aportaram no Brasil em busca de uma vida segura longe
das perseguições anti-semitas. Mais do que isso, discutir as produções de Herchcovitch
permite apontar a importância do povo judeu no desenvolvimento da moda brasileira. Nesses
termos, interessa aqui mencionar os judeus que chegaram ao Brasil a partir de fins do século
XIX, na condição não de colonizadores e sim de imigrantes em busca de trabalho. Dedicados
há séculos ao comércio, os judeus desenvolveram tanto a habilidade no fabrico de roupas,
como no seu comércio, uma vez que as roupas eram um objeto privilegiado das trocas
mercantis. No Brasil, encontraram terreno fértil ao fabrico e comércio de roupas, entendidos
como atribuições de escravos e, portanto, rejeitados pelos moradores do Brasil como
possibilidade de ganhos pecuniários (MALERONKA, 2007). Ao mesmo tempo, desde a
instalação da Corte Portuguesa no Rio de Janeiro, novos hábitos e modos de apresentação
pessoal levaram ao incremento da demanda por produtos ligados ao vestuário destinados à
vida particular e, especialmente, à pública. Uma nova dinâmica de comércio passou a
alimentar o desejo de luxo, proporcionado pelo afluxo de mercadorias caras vindas de países
estrangeiros, em especial da França e da Inglaterra e pelo surgimento dos jornais femininos
(RAINHO, 2002). Tais publicações começaram a contribuir para a conformação de uma rede
que articulava e, dentro de certos limites, homogeneizava os comportamentos e consumo
locais. Os judeus tiveram ampla participação nesse processo através do comércio ambulante e
da abertura de lojas para a distribuição dos desejados produtos, que iam de bebidas (como
champagne), a pianos, roupas, porcelanas, dentre outros. As lojas que começam a se instalar,
em especial na Rua do Ouvidor, transformam-se também num atrativo para que as mulheres
mudem o seu antigo hábito colonial de reclusão domiciliar, a ponto de ameaçar o
convencional comércio dos vendedores e mascates de porta. No entanto, a vastidão e
discrepâncias do Brasil não permitiam à época que tais redes fossem ampliadas. Para tanto,
seria necessário um suporte técnico, comunicacional e de serviços que permitisse a circulação
desses materiais formativos de gosto e dos produtos equivalentes ou que permitissem o
fabrico de cópias. Os importadores tiveram papel relevante na mudança de hábitos da camada
mais favorecida, porém seus negócios só ganham efetivo impulso após 1860, quando o vapor
substitui a navegação a vela e diminui o tempo de travessia do Atlântico (DURAND, 1988, p.
64). O desenvolvimento do comércio de moda, portanto, só tem condições de se efetivar a
partir do momento que o Brasil passa a estar servido da infra-estrutura de transportes e
comunicações necessárias, além de um parque industrial que permitisse a produção nacional.
Até o final do século XIX, as tecelagens nacionais só produzirão tecidos grosseiros,
destinados à sacaria de café e roupa dos escravos. Tudo mais era fruto das importações.
Após a Abolição da Escravatura, a imigração, de uma forma geral, fez parte de
uma política nacional de qualificação da mão-de-obra que atuava no Brasil para trabalho nas
indústrias nascentes e mesmo nas lavouras, ao mesmo tempo em que compunha uma clara
política étnica para branqueamento da população, bastante miscigenada pelo tempo de
convivência com os negros escravizados (MATTOSO, 2000). A política migratória direciona,
portanto, aqueles que aqui chegavam a regiões pouco povoadas ou em processo de
industrialização. O caso de São Paulo é peculiar. Sua expansão, segundo Santos e Silveira,
esteve ligada inicialmente à produção de café “numa fase em que havia mercado para esse
produto, porque o nível de vida estava em elevação na Europa e nos Estados Unidos” (2006,
p. 36). No entanto, é apenas na primeira metade do século XX que começa a se dar um esboço
de integração nacional, com a construção das estradas de ferro e aparelhamento dos portos,
mesmo com grandes desigualdades regionais. É nesse período, igualmente, que começa a se
forjar a hegemonia paulista, “com o crescimento industrial do país e a formação de um esboço
de mercado territorial localizado no Centro-Sul” (p. 37). Nos anos 1930, São Paulo já
superava o Rio de Janeiro e, assim, começou a atrair maior número de imigrantes,
comportando uma população que em sua maioria advinha do velho continente (numa
proporção de 2/3 de imigrantes). Dentre os imigrantes, os judeus teriam sido os principais
responsáveis pelo incremento do comércio de vestuário no Brasil. No entanto, não se trata de
exclusividade judia. Outros povos ajudaram a construir a história da moda no Brasil, tenham
sido eles italianos (como os Matarazzo), gregos (como os Anastassiadis) ou mesmo armênios
(como Renato Kherlakian, fundador da Zoomp) e os mais recentes coreanos. A maior parte
deles se instalou em São Paulo e no Rio de Janeiro. Os judeus orientais, que preferiam ser
designados “sírio-libaneses”, segundo Mizrahi, vendiam mercadorias aos judeus provenientes
de terras otomanas e eram denominados “turcos da prestação” por viverem do comércio
prestamista. Os asquenazes (europeus) que tinham no comércio prestamista sua subsistência,
por sua vez, eram denominados “judeus da prestação”. No entanto, estes logo se tornaram
lojistas e passaram a se destacar na produção de vestuário. Alguns, inclusive, começaram a
investir em tecelagens e negócios imobiliários. Já os sírios e os libaneses foram responsáveis
pelo desenvolvimento do comércio nas imediações de ruas paulistas como a 25 de Março,
local escolhido pela mãe de Alexandre Herchcovitch para a comercialização das peças que
fabricava em casa. O avô e avó maternos de Alexandre Herchcovitch eram judeus romenos. A
família vivia inicialmente em Botucatu, interior de São Paulo, quando passaram por
dificuldades financeiras após a morte do avô de Regina. Regina Stulman (Herchcovitch após
o casamento com o primo Benjamin, de ascendência polonesa) perdeu o pai quando tinha seis
meses. Por conta das dificuldades financeiras que enfrentaram, Regina e o irmão mais velho
deixaram os estudos e foram trabalhar para ajudar no sustento da família e nos estudos do
irmão caçula. Aos 13 anos, Regina trabalhava pela manhã no mencionado banco judaico no
Bom Retiro; à tarde, num escritório de contabilidade; à noite, datilografando laudos
confidenciais da Polícia Técnica. Além disso, como narra Lilian Pacce (2002), nas horas
vagas, junto à mãe e à avó, Regina fazia bolsas e bijouterias de miçangas que ela vendia na
Rua 25 de Março. Para os imigrantes, o trabalho manual era válido, como qualquer outro. O
que importava era, em primeiro lugar, encontrar uma ocupação que lhes proporcionasse
condições de subsistência.
O trabalho com confecção era atrativo aos judeus porque eles já detinham a
habilidade técnica do fazer e essa ocupação lhes permitia a manutenção de um trabalho
autônomo, conforme, inclusive, seus costumes e preceitos indicavam. Em acréscimo, havia
ainda as vantagens de o custo de instalação de uma oficina de costura ser relativamente baixo,
e a possibilidade de contar com o trabalho feminino, permitindo a participação dos diferentes
componentes da família, fossem homens ou mulheres, e mesmo crianças. Tudo isso teria
contribuído para o êxito dos judeus no ramo de confecções. Saliente-se que ainda na primeira
década do século XX, foram fundadas em São Paulo duas escolas de artes e ofícios, uma
masculina e uma feminina, dentro do conceito de escolas de trabalho. Com o desenvolvimento
industrial, era um modo de proporcionar maior qualificação do trabalhador para lidar com as
novas máquinas e ferramentas de trabalho. Os anos 1930 foram marcados por considerável
impulso de produção, parcialmente em decorrência do bloqueio das importações dos bens de
consumo por conta da Segunda Guerra Mundial. A política econômica adotada por Vargas foi
a do incentivo à industrialização via substituição das importações por produções nacionais. A
política, de claro cunho nacionalista, acabou oferecendo oportunidades para a dinamização da
produção nativa, ainda que, mais uma vez, aprofundando as diferenças regionais. As
indústrias concentravam-se no Sudeste e no Sul, agora interligados, enquanto as demais
regiões permaneciam fundamentalmente como fornecedoras de matéria-prima (BRUM,
1991). A necessidade de ampliação do mercado para essa industrialização levou à extinção
das barreiras à circulação de produtos entre os Estados da União, contribuindo para a
promoção, incipiente, da integração nacional; no entanto, faltava ainda a estruturação de uma
malha nacional de transportes (SANTOS, SILVEIRA, 2006). No que se refere à moda, as
indústrias continuavam se dedicando apenas à produção de tecidos. A concentração do
desenvolvimento, e a posição assumida por São Paulo nesse processo, acaba estimulando um
fluxo migratório crescente dentro do próprio Brasil, em especial advindo do Nordeste, e que
tinha São Paulo como um de seus principais destinos. De acordo com Milton Santos e María
Laura Silveira, apenas nos anos 1930 é que o número de imigrantes brasileiros para o Estado
de São Paulo supera o de estrangeiros (p. 42).
Em 1945, entidades judias se organizaram para promover a entrada de judeus
sobreviventes da Shoah e que buscaram no Brasil um refúgio. Nesse mesmo período, a partir
de 1945 e 1950, a indústria brasileira ganha novo impulso e São Paulo se afirma como
metrópole fabril do Brasil. Para isso, o Estado precisou contar com o apoio, em matéria-
prima, dos Estados nordestinos. No que se refere à produção de “roupas prontas”, já na
década de 1940 havia uma divisão em dois grupos. O primeiro dedicava-se à confecção em
grande escala de produtos mais populares e localiza-se fundamentalmente no Bom Retiro, no
bairro da Luz, do Brás e da Mooca; já o segundo grupo dedicava-se aos artigos de luxo e
localizava-se no centro da cidade (MALERONKA, 2007). Data igualmente dos anos 1940 a
criação do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), administrado pela
Confederação Nacional da Indústria, e que tinha como objetivo a criação de cursos para
formação de mão-de-obra qualificada para o trabalho nas fábricas. Em 1950, São Paulo
concentrava 32,4% dos estabelecimentos industriais do país e 34,6% dos empregos
industriais. E, nesse processo, os judeus contribuíram não apenas como mão-de-obra, mas
também como novo grupo consumidor. Os anos 1950 foram marcados, em especial a partir do
período JK (Juscelino Kubistschek), pela abertura do Brasil à entrada de capital externo e de
indústrias estrangeiras. O projeto juscelinista de desenvolvimento do Brasil via
industrialização previa a modernização do país e do aparelho estatal pela intensificação das
relações internacionais. Os rumos assumidos pela industrialização acabaram permitindo que o
Estado de São Paulo suplantasse o Rio de Janeiro, inclusive em diversidade de produtos. Ao
mesmo tempo, o programa de Juscelino, com o apoio de institutos de pesquisa, previa, ao lado
da industrialização, um amplo processo de renovação cultural. Os institutos de pesquisa,
como o ISEB e o CPC, são criados para justificar o plano desenvolvimentista do governo via
aliança com o capital internacional. No entanto, as pesquisas realizadas apontaram como
causa para o suposto atraso brasileiro a recorrente importação dos modelos estrangeiros. A
solução apontada pelos institutos indicava uma produção nacional, com características
nacionais, como resposta ao problema. Vivia-se no Brasil uma espécie de euforia por conta da
conjuntura favorável que se instalou desde o final da Segunda Grande Guerra, período do
início mais evidente dos rearranjos internacionais na moda a favor da produção industrial e
descentralizando a produção, por conta dos avanços norte-americanos. No entanto, a França
mantinha a dianteira em termos de referência quanto à criação de moda. Ao mesmo tempo em
que se buscava promover em âmbito nacional e internacional o tecido de algodão, principal
fibra nacional, que contava com o trabalho de grandes tecelagens, como a Matarazzo, de São
Paulo, e a Bangu, do Rio, a Cia. Brasileira Rhodiaceta, filial do grupo francês Rhône-Poulenc,
iniciou a produção de fibras sintéticas no país, como o Ban-Lon, o Albène, o Rhodianyl, a
Helanca e o Tergal (DURAND, 1988). É nesse contexto que surge Dener Pamplona Abreu,
considerado primeiro estilista brasileiro e que busca implementar uma moda brasileira.
Dener Pamplona de Abreu e a moda brasileira
Dener (1936-1978) nasceu em Belém do casamento entre Alfredo, um jogador de
futebol de Ilhéus, e Eponina (Lolita), brasileira de Belém, de “família remediada” recém-
chegada dos estudos na Inglaterra, o que era um costume mesmo para não-ricos. Com a crise
da borracha e o desquite dos pais, quando este contava ainda nove anos, a família mudou-se
para o Rio de Janeiro (DÓRIA, 1998). Dener, portanto, fez parte do grupo de migrantes do
Norte do país que buscou melhores condições de vida no promissor Sudeste do Brasil; no
caso, o Rio de Janeiro. A mãe de Dener encontrou buscou garantir os estudos do filho.
Segundo relato de Carlos Dória (1998), Dener, desde cedo, gostava de desenhar. Sofrendo de
enxaquecas, passava as noites insones desenhando. No entanto, apesar de podermos afirmar a
importância de ações políticas no desenvolvimento da produção de vestuário no país, não se
pode negar que conseqüências impremetidatas de ações ou mesmo o acaso ajudam a conduzir
os processos sociais numa certa direção pelas afinidades que assumem com uma série de
outros fatores e acontecimentos. Foi o que ocorreu quando Dener contava treze anos –
portanto, na passagem para os eufóricos anos 1950: um acaso ajudou a direcionar sua
trajetória definitivamente para a costura e os rumos da história da moda no Brasil. Quando
estava no lotação, a caminho de encontrar sua mãe, que havia lhe conseguido um emprego
numa companhia de seguros para afugentá-lo dos desenhos e da homossexualidade a eles
associados, ocorreu um engarrafamento que fez com que d. Cândida Fiala, irmã de d. Mena
Fiala da Casa Canadá (loja que buscava apresentar “interpretações” da alta costura feita por
estilistas nacionais), entrasse no lotação em busca de uma condução mais rápida. Assim,
sentada ao lado de Dener, ela vê os desenhos que o rapaz estava desenhando como
passatempo (ABREU, 2007). Dener, então, aos treze anos, seria contratado para trabalhar na
Casa Canadá na condição de estilista. Ou seja, Dener foi possível, enquanto estilista que
angariou reconhecimento nacional, apenas na medida em que havia uma indústria têxtil
conformada no Brasil e o impulso para o consumo de produtos nacionalmente fabricados, seja
por uma euforia nacionalista, pela melhoria das condições de vida de parcela da população ou
pelas limitações à entrada de produtos estrangeiros no país. Ainda que guiado pelas diretrizes
das criações européias, constituía-se um grupo de estilistas nacionais em função de uma
clientela efetiva. Uma vez que os anos 1950 serão igualmente marcados por uma crítica feroz
à imitação ao estrangeiro feita no Brasil, logo os ecos desse nacionalismo crescente
alcançarão a moda, e a moda, naquela época, tinha em Dener seu principal expoente. Entre
1949 e 1970, uma rede de aeroportos se constitui no país permitindo deslocamentos
interestaduais e internacionais mais velozes, o que permite maior deslocamento do estilista e,
pois, divulgação de seu trabalho: “Eu estava decidido a inventar a moda brasileira, sabia que
podia e não me faltava o talento de figurinista”. (ABREU, 2007, p. 55).
Dener já percebia o crescimento de São Paulo e as oportunidades que a cidade,
iniciando sua vida mais intensa de lazeres da “boa sociedade”, podia lhe oferecer. Decide
deixar o Rio de Janeiro e morar em São Paulo, em busca de uma clientela mais abastada. É
nesse período que a Rhodia começa a ingressar nos negócios com fios sintéticos. Em 1956,
Charles Snitow organizou um evento com o objetivo de divulgar a produção industrial do
mundo ao mercado norte-americano (DÓRIA, 1998, p. 58). Para Snitow, a política de
industrialização juscelinista era motivo suficiente para que o Brasil tivesse um estande na
feira. Snitow, então, convida o empresário Caio Alcântara Machado para liderar a iniciativa,
que vê em tal participação uma oportunidade de mostrar ao mundo os produtos brasileiros.
Como decorrência, em 1958, é inaugurada pelo presidente Juscelino Kubitschek a I Fenit
(Feira Nacional da Indústria Têxtil) no Pavilhão Internacional do Parque do Ibirapuera.
Capitaneada por Caio Alcântara Machado, a feira resultou em um prejuízo de cerca de 80
milhões de cruzeiros. Então, Lívio Rangan, encarregado da idealização e execução da Fenit
entre 1959 e 1970, transformou a Fenit em um mecanismo para divulgação da Rhodia. Apesar
de permanecer dando prejuízo, a Fenit se transformou num evento social de grande pujança
em São Paulo. O objetivo da Rhodia (empresa francesa) era vender matéria-prima para a
produção de tecidos sintéticos no Brasil. Para tanto, era necessário criar moda com esse tipo
de tecido e incitar o consumo. Como estratégia inicial, a Rhodia pagaria a publicidade de
quem trabalhasse com seu fio, tecido e roupa, contanto que o selo Rhodianyl figurasse junto à
marca. A idéia de Livio era promover uma moda brasileira e, para isso, recorreu a temas
nacionais. Em outubro, após terminado o período dos espetáculos na capital paulista, era feita
uma síntese do espetáculo, que viajava pelo Brasil divulgando moda, produtos e a Rhodia.
Os espetáculos promovidos pela Rhodia se distinguiam consideravelmente dos
desfiles promovidos pela paulista tecelagem Matarazzo. Esta, então associada à francesa
Boussac, começa, por conta da concorrência, a investir em desfiles no Rio de Janeiro e em
São Paulo. Produtora de fios de algodão, a emergência dos fios sintéticos a partir do intenso
trabalho de divulgação da Rhodia, consistia em ameaça aos negócios. Prêmios foram
instituídos, estilistas europeus, a exemplo de Christian Dior, foram convidados. E Dener
angariou o prêmio do desfile, tornando-se destaque em São Paulo. A fama o estimula a abrir
sua própria loja na praça da República e, depois, nos anos 1960, abre seu ateliê na Avenida
Paulista. É nessa época que surge Clodovil, seu principal rival, no evento da Matarazzo-
Boussac. Em 1960, em matéria para O Cruzeiro, Alceu Penna, que desenhava para o evento,
escreve sobre suas idéias de uma moda nacional, idéias essas que foram tecidas junto a Livio
Rangan e que ajudariam igualmente a direcionar as produções de Dener, que recorrentemente
fará parte da equipe de convocados por Livio. Daí talvez adviesse a construção de um espírito
de moda nacional, ainda que guiada pelas produções internacionais, que levaria Dener a se
afirmar como grande expoente e defensor de uma moda brasileira, capaz, inclusive, de ser
internacionalmente lançada. Mas Livio Rangan já não era indispensável à Rhodia e, como
angariou desafetos, acabou sendo demitido da empresa. Caio Alcântara Machado passou a
comandar sozinho a Fenit a partir dos anos 1970, agora no Anhembi e restrita a industriais,
comerciantes, estilistas de moda e compradores de diferentes partes do Brasil. Em 1972, as
roupas dos desfiles da Rhodia passaram a ficar expostas no Museu de Arte de São Paulo, em
um espaço novo: o Museu do Costume. Seguindo a trilha internacional, a moda brasileira
ingressava nos museus. É também nos anos 1960 que Dener consegue sua mais prestigiosa
cliente e seu reconhecimento se consolida: Maria Teresa Goulart, esposa do então presidente
João Goulart. De beleza vista como tipicamente brasileira, coube a Maria Teresa Goulart
começar a se vestir com estilistas nacionais. Era uma espécie de “exigência do momento”.
Dener se torna, então, o costureiro oficial da primeira-dama em 1963, o que também
possivelmente contribuiu para seu apelo ao nacional. No entanto, a fama de Dener não pode
ser atribuída apenas à relação com Maria Teresa. O personagem Dener, com suas “frescuras”,
como ele costumava afirmar, foi fundamental para torná-lo alvo das atenções.
No entanto, a dependência em relação ao capital estrangeiro, que se aprofundou a
partir dos anos 1950, se acentua ao mesmo compasso em que aumenta a dívida brasileira,
situação que irá perdurar até os anos 1970, enquanto o êxodo rural e a migração (interna) para
São Paulo aumentam a desigualdade entre as regiões do país. Devido às disparidades de renda
no Brasil e à grande concentração da produção e do consumo no Sudeste, as estratégias de
produção nacional se voltam crescentemente ao mercado externo e suas demandas, o que
aumenta a necessidade de modernizar as indústrias nacionais. A circulação entre as diversas
regiões e destas com a chamada “região concentrada”, noção de Milton Santos, mesmo que
com densidades diversas, é ainda mais facilitada. A difusão de energia elétrica, antes
localizada, passa a compor uma rede nacional a partir da criação e atuação da Eletrobrás nos
anos 1960. Ao mesmo tempo, uma revolução das comunicações ocorre nos anos 1970 com o
uso de satélites. Vivia-se o chamado “milagre brasileiro”, período de franca expansão nos
negócios, que ajudou a substituir a antiga camada abastada do Brasil. Ao mesmo tempo, a
capacidade de compra do brasileiro, guardando aí as diferenças regionais, se amplia fazendo
com que indivíduos de camadas mais pobres comecem a gastar mais em chamados bens
supérfluos, não apenas dinamizando o setor do comércio de moda, mas conferindo específico
acento nas produções industrializadas, os prontos-para-usar, que começam a melhorar sua
qualidade e a rivalizar com o domínio dos estilistas que se dedicavam, como Dener, à roupa
sob medida. Sua clientela se torna, então, bastante restrita, ainda mais se considerarmos que
as aquisições de roupas de luxo nacionais eram ainda bastante incipientes no Brasil e se
restringiam quase exclusivamente a São Paulo e Rio de Janeiro, inclusive com disparidades
entre as duas cidades. Por estranho que possa parecer, tal melhoria nas condições de vida do
brasileiro começaram a constituir os obstáculos principais ao trabalho de Dener, no modo que
ele tinha projetado para si. É desse modo que ele denuncia a falta de apoio governamental no
sentido de impulsionar o país como produtor e exportador de moda, uma vez que o produto
nacional é ainda consideravelmente caro se comparado a produções estrangeiras ou produtos
falsificados comercializados como estrangeiros (ABREU, 2007).
Dener morre em 1978. Sofria de cirrose hepática. Quanto aos negócios, estava
falido. A essa época, Dener havia experimentado, inclusive, o trabalho na nascente televisão
brasileira. No entanto, a ditadura o impediu de prosseguir no trabalho, por conta de seus
modos afeminados. Como afirma Durand, foi incabível a possibilidade de alicerçar a carreira
mantendo-se restrito aos círculos prestigiosos da “sociedade paulistana”. Dener viveu em
conformidade com suas idealizações a respeito da vida dos grandes costureiros, cujo contato
inicial ele teve através das revistas femininas. Diferente do que ocorria na Europa e nos
Estados Unidos, em que os estilistas eram pessoas que, mesmo de classe média, tinham
passado por cursos universitários, com mais condições e tempo de interiorizar os valores e
modos de comportamento das camadas mais favorecidas (quando não advinham dessas
camadas), Dener e Clodovil foram autodidatas no estilismo. Daí, talvez, como pontua Durand,
os modos afetados de Dener fossem tão acentuados. Nos mesmos anos 1970, inclusive, as
telenovelas começam a despontar como novo foco de difusão de trajes a partir das roupas de
seus personagens, como o de Sônia Braga em Dancing’ Days. Deste modo, a televisão
igualmente ajudou a tecer uma rede nacional de uniformização relativa dos usos a partir do
sucesso das novelas. Ao mesmo tempo, as senhoras da “sociedade” que antes comercializam
algumas peças começam a estruturar lojas; estas, por sua vez, ganham diversidade de padrões,
estilos e preços com o crescimento de uma moda industrial de melhor qualidade. A
diversificação dos estilos, fruto da melhoria das condições de vida no pós-guerra e dos
impactos da “geração baby boomer”, também chega ao Brasil, permitindo a assunção pelos
brasileiros de estilos hippie, punk, dentre outros, que se vinculavam, por vezes, a um tipo de
consumo de peças mais baratas, facilmente atendíveis pelo prêt-à-porter. As determinações
quanto ao uso paulatinamente passaram a estar nas mãos dos consumidores, e não nas de
“ditadores da moda”. A confluência, portanto, de fatores diversos levou a que houvesse cada
vez menor espaço à alta costura no Brasil – ou seja, ao trabalho de Dener, que deveria, pois,
optar em manter o seu modo de vida, com os riscos evidentes a ele associados, ou mudar sua
produção, modo de condução dos negócios e de sua vida particular.
A cirrose hepática de Dener coincidiu, segundo Dória, com o desencanto com a
moda, desde 1973. Além de testemunhar o crescimento do prêt-à-porter e conseqüente
declínio da alta-costura, Dener, que se considerava um artista, manteve considerável falta de
cuidado na condução dos negócios. Enquanto já começavam a se consolidar relações de
proximidade entre os estilistas e gestores encarregados de administrar o negócio, Dener
considerava que ele, sendo artista, pairava acima de todos “vivendo da arte e pela arte”
(ABREU, 2007, p. 83). Chegou, inclusive, a, sem saber, assinar um contrato em que vendia
sua marca sem receber dinheiro algum pela transação. É em 1971, década de tais
transformações e da morte de Dener, que nasce Herchcovitch na promissora São Paulo.
Contexto de formação de Alexandre Herchcovitch
Os anos 1970 foram palco da abertura de prêt-à-porter por parte de quantidade
considerável das grandes maisons e pelo início de divisão internacional do trabalho em moda.
Trata-se de uma espécie renovada de pronto-para-usar que se coloca como convergência entre
a alta costura e a roupa industrializada. Jovens estilistas freelances, desejosos de assinar
produtos e linhas criados por eles e de ter uma grife própria passaram a se associar a
industriais, que assumiriam o papel de prestadores de serviços e deixariam de intervir no
processo criativo. A proposta de “Criadores e Industriais” de Didier Grumbach, pioneiro,
permitia uma espécie de meio-termo entre a criatividade e a qualidade da alta-costura e a
produção barata e massiva da indústria. Desse modo, ao lado dos costureiros (da alta-costura)
e dos estilistas (do prêt-à-porter), surgem os criadores. Nessa conjuntura, os denominados
países de Terceiro Mundo participavam na condição de mercado pouco representativo para os
produtos estrangeiros e produtores de matérias-primas. Paulatinamente, a divisão
internacional do trabalho fará com que as indústrias do mundo da moda se distribuam em
países terceiro mundistas, devido à busca por mão-de-obra barata, enquanto os pólos de
criação e de consumo dos bens de melhor qualidade se mantêm na Europa e nos Estados
Unidos, que, a partir do final dos anos 1970 começa a ter suas produções aceitas na Europa. A
internacionalização do negócio, por outro lado, acarretou outra transformação fundamental a
se consolidar apenas nos anos 1980: os criadores de moda passariam a advir de diferentes
pontos do planeta, ainda que a Europa se mantivesse como ponto de confluência. O jogo de
relações globais na produção, divulgação e comercialização da moda significava, pois, um
duplo movimento: centrífugo, no angario de mão-de-obra barata e na busca por mercados
promissores; e centrípeto, por manter, em especial, a Europa (a França, em primeiro lugar)
como centro necessário para o reconhecimento do trabalho e aquisição, portanto, de prestígio
do “mundo da moda”. Era difícil, no caso do Brasil, crer na alternativa de produtos com
características nacionais, na verdade ainda em grande medida “interpretações” da moda
européia, como principal mecanismo para refrear o consumo de produtos estrangeiros.
No Brasil, os anos 1970 iniciaram sob o embalo do “milagre brasileiro” (1968-
1973), contudo a crise do petróleo, em fins de 1973, e as condições da empresa privada
nacional, com uma burguesia nascente e comprimida por dois grandes gigantes, as estatais e
as multinacionais, conferiam grande privilégio ao produto importado. Os investimentos nas
empresas privadas nacionais eram pautados, sobretudo, em financiamentos externos ou
estatais; estes também via empréstimos no exterior. A dívida externa, que começa a ser
cobrada com a crise, implica a diminuição dos investimentos internos e o afluxo de dinheiro
para pagamento da dívida, ao mesmo tempo em que diminuem as possibilidades de novo
empréstimo. A situação se agrava nos anos 1980. De qualquer modo, modelo similar de
desenvolvimento desigual de integração é perceptível também no Brasil com as evidentes
discrepâncias regionais e centralidade, não apenas na produção de moda, das capitais São
Paulo e Rio de Janeiro. No entanto, numa economia globalizada, a estruturação de um sistema
financeiro eficiente torna-se condição à estruturação de negócios de solidez, e, no Brasil, São
Paulo ganha dianteira nesse processo frente aos demais Estados do país. A Embratel, criada
em 1965, acabou por liderar o processo de informatização, facilitando a integração ao
mercado globalizado e contribuindo para a expansão da quantidade de empresas no setor de
informática. Nos anos 1970, tem-se a criação da Embrapa, que irá, por seu turno, promover
pesquisas que contribuirão para o desenvolvimento da indústria têxtil. O relativo movimento
de desconcentração da produção industrial brasileira que ocorre nos anos 1970, num
espelhamento do que já ocorria desde os anos 1930 e internacionalmente com a aceleração do
processo de globalização, favorece, neste momento, o Sul do Brasil. Holdings nacionais e
globais também irão se instalar, mantendo seus centros de comando no Sudeste, Sul e, por
vezes, na Bahia (SANTOS, SILVEIRA, 2006). As competições entre Estados, então, se
acirram para abrigar novas fábricas. As relações significativas não estão necessariamente
próximas, como ocorria anteriormente, daí a substituição, segundo Santos e Silveira, da noção
de circuitos regionais de produção para a de circuitos espaciais da produção, num movimento
comandado hoje por fluxo de materiais, capitais, informações e mensagens, cujas formas de
circulação dependem da integração do sistema de comunicação e informática que possibilitam
a dinamização do sistema financeiro, inclusive na instituição do sistema de crédito ao
consumidor como forma de efetuação de transações – o que se consolida no Brasil nas
décadas posteriores. De qualquer modo, as assimetrias permanecem.
Na moda, um exemplo da centralidade paulista e do acirramento da concorrência
está na contestação vinda do Rio de Janeiro, depois Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Ceará,
Santa Catarina e Rio Grande do Sul quanto à posição de São Paulo com a Fenit (DURAND,
1998). O peso de São Paulo pode ser percebido no rótulo de “regionais” que ganharam as
demais feiras de moda. Classificadas como tais pelo MIC, Ministério da Indústria e Comércio,
as feiras só podiam ocorrer 60 dias antes ou depois das feiras pré-existentes. Deste modo, a
Fenit de São Paulo, consagrada como feira nacional, fixou-se em maio, quando lançava, sem
possibilidade de concorrência, as coleções de Primavera-Verão. Uma série de associações
também começa a se estabelecer no sentido de conferir sustentação e força às produções dos
seus respectivos Estados de origem; no entanto, tais grupos, efêmeros, não trouxeram grandes
conseqüências no equilíbrio de forças inicial. Tais tensões e rivalidades serão fundamentais à
constituição do que poderíamos denominar de mapa da moda brasileira no século XXI. No
entanto, outros elementos são fundamentais, como as transformações que se processam no
cenário político-econômico e sociocultural do Brasil ao longo dos anos 1980 e 1990. De
qualquer modo, nos anos 1970, em que Alexandre Herchcovitch tem seus primeiros nove
anos de vida, estão lançadas as bases de condição ao desenvolvimento do trabalho do estilista
do modo como se deu, a partir de uma série de relações e de cruzamento de trajetórias que
foram se dando ao longo de séculos de história, dos quais aqui é apresentada apenas uma
súmula. Em primeiro lugar, Herchcovitch nasceu brasileiro por conta de uma política
migratória nacional que favoreceu a entrada dos estrangeiros judeus que eram perseguidos em
seus países de origem. E tal “abertura de portos” se deu a reboque de uma tentativa de
modernização do Brasil, via uso de mão-de-obra qualificada e que, numa segunda
conseqüência entendida como favorável pelos círculos de decisão nacional, contribuiria para
mudar a constituição étnica do país. No caso dos Herchcovitch, sua entrada no Brasil se deu
nos anos 1910, em decorrência dos pogroms. Como tantos judeus do Leste Europeu que
migraram para o Brasil em princípios do século XX, a família Herchcovitch se estabeleceu na
promissora São Paulo e, quando do nascimento de Alexandre, buscou, como ocorreu com
diversas famílias de classe média brasileiras e de origem estrangeira, conferir instrução formal
ao filho, mecanismo privilegiado de ascensão social e econômica para a mencionada classe,
em especial com a chamada democratização do ensino brasileiro. Os pais de Alexandre
buscaram que tal escolarização se desse em escola judia ortodoxa; no caso, o colégio Iavne.
Segundo o próprio Alexandre, sua vocação teria começado a se manifestar aos
seus nove ou dez anos (HERCHCOVITCH, 2007, p. 21), tendo sua mãe como principal
influência. Regina Herchcovitch, como afirmado, manteve ligação com a moda como
consumidora; como fabricante/vendedora; e como empresária, uma vez que, depois de casada,
chegou a montar uma microempresa de lingerie, com costureiras e vendedoras terceirizadas.
Ou seja, seguindo os passos de outros judeus, Regina começa a se dedicar à costura, fazendo
com que Herchcovitch cresça em meio a panos, linhas e máquinas de costura. De acordo com
Pacce (2002), a montagem da confecção de lingerie teria se dado quando Herchcovitch
contava nove anos. Em outros termos, o estilista acaba por identificar os primórdios de sua
vocação para a moda no encanto despertado pelas roupas de sua mãe e na observação dos
trabalhos na confecção, o que teria constituído impulso fundamental à sua trajetória posterior.
Parece mais interessante, para compreender a visão que A. Herchcovitch começa a
construir, perceber a criança que se via mergulhada em um mundo de panos, seja nos rituais
do judaísmo, seja no rigorismo que envolvia a questão indumentária no colégio Iavne, seja
através do trabalho de sua mãe ou do fascínio que as roupas dela, as roupas dos anos 1980,
começavam a provocar. Questões indumentárias faziam parte de seu cotidiano, de modo
similar à instrução convencional quando a inserção no mundo do trabalho se dava desde a
infância como continuidade ao trabalho dos pais, que, assim, eram encarregados de lhes
ensinar os primeiros passos em seu ofício e assim garantiam a “arte” do fazer. No caso de
Alexandre Herchcovitch, talvez a escola e o trabalho doméstico da mãe devessem levá-lo, de
modos distintos, ao mesmo ponto. Desde cedo, já dava sugestões de composição do traje e de
maquiagem à mãe, o que demonstra a canalização da curiosidade infantil na constituição de
um senso de observação e gosto próprio. É ainda nos anos 1970, aos 07 anos, que inicia sua
coleção de caveiras (COSAC, 2007). A paixão por caveiras vai fazer desta uma das marcas
registradas de Alexandre em diferentes peças que produz: de camiseta a relógio, a caveira,
logotipo de sua marca, pode se fazer presente.
É possível questionar se o interesse por caveiras não teria igualmente relação com
as marcas profundas de um passado de perseguições aos judeus e que culminaram na Shoah
do recente século XX. A lembrança do que ocorreu com os antepassados e que levou a
contínuas reestruturações abruptas de modos de vida, como a migração involuntária que
justifica a existência da família Herchcovitch no Brasil, faz com que a morte tenha grande
probabilidade de ser tema recorrente: nos assuntos familiares dos judeus, nos rituais
religiosos, bem como na escola. As escolas judaicas foram criadas para ajudar a manter os
costumes e, assim, contribuir no sentido de reforçar os elos da comunidade, ameaçados pela
dispersão no mundo (MIZRAHI, 2005). Deste modo, é possível imaginar o significado
especial que assume a morte, como tema cotidiano, na imaginação infantil e no processo
criativo do estilista adulto. Obviamente, não se pode determinar qualquer elemento aqui como
causador de tal interesse em colecionar caveiras; trata-se de um elemento que pode ter
contribuído para formação de tal interesse, a ponto de ele ter se mantido através de uma
coleção. Inclusive, deve-se destacar o caráter lúdico, ainda que por vezes mórbido, que
assumiu tal gosto. Ao mesmo tempo em que mantém uma caneca em formato de crânio,
Alexandre criou, em 2001, uma camiseta que trazia como estampa a caveira de Mickey
Mouse, personagem de Walt Disney. Tal combinação, inclusive, entre o infantil e a morte nos
permite destacar temas freqüentes de suas coleções: o universo de Walt Disney e o mundo
sombrio underground dos punks; o pop dos anos 1980 e o sadomasoquismo. No mais, o
destaque está em seu uso de símbolos religiosos nas coleções. São traços de continuidade na
mudança exigida nas relações de mercado. Ainda em 1985, quando Alexandre contava 14
anos, foi exibida pela Rede Globo de televisão a novela Ti Ti Ti, que Herchcovitch, segundo
relato próprio, assistia. A narrativa se pautava numa relação de disputa entre dois estilistas,
Jacques Léclair e Victor Valentim, personagens e trama inspirados na rivalidade entre Dener e
Clodovil. Se a novela ajudava a voltar a atenção dos telespectadores a um interesse e
familiaridade maior em relação a questões de moda, a primeira metade dos anos 1980, por
outro lado, foi também marcada pelo processo de transição do Brasil. Fazia-se perceptível o
esgotamento do modelo de centralização do Estado e da industrialização por substituição de
importações. Mesmo com alto índice de inflação, desemprego, dívida externa e grandes
disparidades na distribuição de rendas, em fins de 1984 já era perceptível uma retomada do
crescimento econômico do país e o aumento das exportações. Em 1985, Tancredo Neves é
eleito para assumir a função de Presidente na nova República, mas, devido à sua morte logo
após as eleições, o cargo foi assumido por seu vice, José Sarney (PFL). O programa de
Estabilização da Economia Brasileira, o Plano Cruzado, teve caráter emergencial, conseguiu
obter queda do índice da inflação, mas não atingiu os pontos fundamentais da crise
econômica. Os anos 1980 serão caracterizados por um boom no consumo que, contrariando as
expectativas, promoveu uma retirada maciça de dinheiro das cadernetas de poupança
deixando o governo sem recursos para investimento. Deste modo, a inflação volta a crescer,
há aumentos de preços e problemas generalizados de abastecimento, o que leva à escassez. A
inflação alcança o pico de 933,6% em 1988.
Em meio a esse contexto, Alexandre, aos 15 anos (1986), ganha sua primeira
máquina de costura (PACCE, 2002). Montou um ateliê na sala da casa de seus pais, com mais
duas máquinas. Aos 16 anos, já produzia e comercializava camisetas para os amigos
próximos. No mesmo ano, criou seu vestido em organza de seda cor-de-laranja e que levava
bolas de pingue-pongue inseridas na barra. Segundo Herchcovitch, tal modelo já evidenciava
algumas preocupações recorrentes em seu trabalho, como o caimento da roupa. Em 2000,
Herchcovitch jogou o modelo no lixo, mas a mãe o recuperou. Dois anos após, ele usaria
similares matrizes para a composição de uma nova coleção. Aplicou grandes correntes de
alumínio, segundo ele aludindo às microcorrentes dos tailleurs Chanel, à roupa. De acordo
com Cosac, Herchcovitch teria alegado a lembrança de que seus avós usavam moedas na
bainha das roupas, para obter mais perfeito caimento, como inspiração na criação do modelo.
Podia ser também um mecanismo para salvaguarda de bens em período em fuga da
perseguição anti-semita. Entretanto, não apenas as lembranças das histórias dos avós foram
atualizadas por Herchcovitch. Em seu desfile de formatura, em 1993, um dos tecidos
utilizados na confecção de algumas peças foi o piquê, extraído das colchas que a avó
mantinha guardadas em seu armário. Herchcovitch começa, então, a se dedicar ao estudo da
moda através de livros e revistas. Sua crescente vinculação à moda se rebatia, inclusive, em
seu modo de apresentação pessoal no colégio, o que quase o levou à expulsão. Como muitos
adolescentes de sua época, Herchcovitch manteve proximidade com a música. Boy George,
vocalista do grupo pop Culture Club, angariou fãs em diferentes partes do mundo nos anos
1980. O cantor desafiava a fronteira entre o masculino e feminino, a ponto de se tornar ícone
dos transformistas, ao mesmo tempo em que trazia com freqüência, em sua aparência pessoal,
elementos religiosos. Uma de suas imagens marcantes são os cabelos, sob chapéu alto, com
cachos descendo sobre o peito, ao modo dos judeus ortodoxos. O inglês Boy George figura
em segundo lugar no ranking das pessoas que, conforme o próprio Alexandre Herchcovitch,
teriam influenciado seu trabalho. A discussão sobre gênero se apresenta nos trabalhos de
Alexandre Herchcovitch nos cortes das roupas, que permitem, em certa medida, transposições
do masculino ao feminino nos usos cotidianos, na transposição do masculino/feminino nos
desfiles e na própria escolha de seus modelos, normalmente andróginos. Contudo, é
interessante notar a relação estabelecida entre o “dessexualizado” e o apelo fetichista que,
muitas vezes, também é característica forte em seu trabalho. O ingresso no underground
paulistano, segundo Herchcovitch, contribuiu para reforçar o conceito de moda sem gênero. A
adolescência de Herchcovitch é marcada, no colegial, tanto por uma viagem de seis meses a
Israel, acordando, no kibutz, às quatro horas da manhã para trabalhar na cozinha ajudando a
preparar a refeição de mais de mil pessoas (PACCE, 2002); como por sua incursão na noite de
São Paulo (HERCHCOVITCH, 2007). Como salienta ele, era época clubber. Os clubbers
colocam-se como uma síntese possível entre os punks, os homoeróticos, com atenção especial
à montagem das drag queens, o futurismo e o universo adolescente. Segundo ele, dois
mundos aí se cruzavam: o das peças de lingerie da mãe e o fetiche sado-masoquista (S&M) de
Thierry Mugler. Do mesmo modo que Boy George o leva à problematização da artificialidade
da roupa e das construções de gênero, o mesmo ocorre a partir da vida noturna que começa a
experimentar. Esse teria sido para Herchcovitch (e segundo ele próprio) o período de seus
questionamentos sobre religião, sexualidade e condição socioeconômica.
As referências, enquanto estilistas, serão Thierry Mugler e Rei Kawakubo. É no
geometrismo, na funcionalidade, na roupa “dessexualidada”, na desconstrução da roupa e na
imersão crescente na alfaiataria (conseqüência do jogo de construir e desconstruir as peças)
que Herchcovitch se aproxima de Rei Kawakubo; é no sexismo, no uso do látex, na exibição
do corpo sob o tecido transparente, no uso de detalhes sado-masoquistas, na roupa que
contorna e, por vezes, sufoca o corpo que Thierry Mugler aparece como influência. O ponto
de encontro entre ambos, percebido por Herchcovitch e que igualmente o aproxima deles, é a
importância conferida à questão do gênero, seu papel e relação possível com a roupa. No
entanto, a síntese proposta pelo paulista “chama” outros convidados ao diálogo. Um deles é
André Courrèges, que teria sido o primeiro a apresentar, nos anos 1960, uma moda com apelo
futurista de modelos com botas de plástico brancas e calças geométricas prateadas. Ao
cabedal das influências de Herchcovitch, cabe a menção a outra voz que tem presença vivaz
em várias de suas peças e que tem relação com o mundo infantil clubber e com os anos 1980
que tanto o marcaram: os personagens de animações. Herchcovitch estabeleceu uma parceria
com a Disney que lhe permitiu o uso das imagens da Branca de Neve e de Bambi em sua
coleção de 2003. Outros parceiros são a Sanrio, empresa que detém o uso de imagem da Hello
Kitty, e a Warner Bros, para uso da imagem do Piu-Piu (Tweety). Desse modo, percebe-se
que o infantil, o futurista, o pop, o punk e a drag queen celebrados no mundo clubber mantêm
a força no trabalho de Herchcovitch que, portanto, leva o underground paulistano revisado às
passarelas. No entanto, ao mesmo tempo, não há condições de considerar que suas coleções
são uma extensão do mundo clubber. A trajetória de Herchcovitch inicia criando roupas para
figurarem na cena clubber – que surgiu na Inglaterra dos anos 1970 e, no Brasil, encontrou
mais fértil espaço em São Paulo. Ao mesmo tempo vai se descolando do clubber rumo a uma
maior autonomia e a produtos mais vendáveis. É desse modo que o próprio Herchcovitch
interpreta a fotografia que tirou deitado num caixão em 1998: um momento de ruptura que o
leva à busca de produtos mais comerciais.
Foi o ano em que contratei mais modelistas, decidi incrementar a alfaiataria e pensar na
democratização da marca, contando com uma artilharia pesada para fazer a dupla jeans e
camiseta. (HERCHCIVITCH, 2007, p. 25/6).
A resposta de vendas, segundo ele, foi imediata. Em 2005, a linha Herchcovitch
Jeans já tinha apresentação própria nos desfiles de moda voltados ao consumidor final. No
mesmo ano de 1998, muda loja e ateliê para a Rua Haddock Lobo (São Paulo). É interessante
notar que o distanciamento em relação ao “estilista maldito”, como ele afirmou, significou
uma aproximação crescente com o legado de Rei Kawakubo. Esse amadurecimento, como
define, está colado a uma atenção maior às questões comerciais.
Os anos 90 e o amadurecimento
Os anos 1980 foram uma fase mundial de grande acento no consumo. Com a
queda do muro de Berlim, generaliza-se a crença no triunfo do capitalismo. Na moda, com o
avanço da individuação, a década foi marcada por uma razoável heterogeneidade das
produções. Como afirma James Laver (1999), nos anos 1970, a noção de individualidade
passa a estar vinculada à tentativa de um estilo pessoal de vestir. Com o encurtamento das
distâncias, promovido pelo desenvolvimento dos meios de transporte, de comunicação e de
informação, difunde-se igualmente uma variedade de estilos de vida, incrementando o
“estoque de possibilidades” a respeito. No entanto, mesmo tal circulação está atrelada à
distribuição internacional de controle da informação. É nesse sentido que, nos negócios
ligados à moda, o papel da publicidade, enquanto mecanismo profissionalizado de divulgação
de produtos, ganha em importância, pois é a possibilidade de o produto ser conhecido em
diferentes partes do mundo. O mercado comparece como fornecedor do instrumental através
do qual as individualidades podem ter franca expressão. Por outro lado, as empresas
capitalistas fornecedoras de tais bens mudam, de certo modo, suas estratégias de produção,
divulgação e comercialização em torno de frases como “faça seu estilo”, recorrentes nos anos
1990 e 2000. O resultado das combinações entre produtos seria único, ainda que o processo
de construção fosse coletivo. Nesse sentido, a construção da individualidade estaria nas mãos
do consumidor, cabendo ao mercado oferecer a variedade que possibilita a unidade
(BARTHES, 1996, LIPOVETSKY, 1997). As ruas passam a inspirar as passarelas, pondo em
questão a ênfase atribuída por sociólogos – como Simmel (2002) e, posteriormente, Pierre
Bourdieu (2002, 2007) – em um vetor único, de cima para baixo, de imitação da moda. Ao
lado da customização (personalização das roupas), o vintage, que é uso de peças antigas (ou
que são propositadamente envelhecidas) junto a peças novas, e o hi-lo (corruptela de high,
alto, e low, baixo), que é a composição da aparência pela justaposição de peças caras e
baratas, também se tornaram estratégias de busca por individualidade. São tentativas de
aproximar numa pares antes vistos como opostos: industrial/manual,
massificado/individualizado, antigo/novo, caro/barato. Ao uni-los, evidencia-se um
questionamento das dicotomizações fáceis, como Herchcovitch parece apresentar em sua
coleção de Inverno de 2009. O ideal passa a ser a construção de sínteses, ao que parece, chave
para a expressão individualizada.
A continuidade nos padrões de consumo atingidos nos anos 1980 teve seu
contraponto, nos anos 1990, pela aposta no minimalismo; isto é, na concepção, ainda em voga
nos anos 2000, de que less is more. A chamada roupa básica, expressão criada nos Estados
Unidos para um tipo de roupa mais utilitária, ganha maior espaço. No entanto, ao básico são
acrescidos detalhes de luxo, seja nos tecidos utilizados, na fibra artesanalmente trabalhada ou
no tipo de corte/costura. A concorrência global, intensificada pela maior facilidade em
produzir cópias mais baratas dos modelos exibidos nas passarelas e com menor defasagem de
tempo, obriga as marcas a promover um vulto maior de investimentos no caráter distintivo da
marca e na renovação da gestão e do marketing do negócio. É esse contexto que se mostra
propício ao surgimento de figuras como o empresário Bernard Arnault, com capital disponível
para as injeções de dinheiro necessárias ao desenvolvimento de peças e ações publicitárias a
serem lançadas simultaneamente em diferentes pontos do planeta e com experiência em
gestão de mega-empreendimentos e que se torna, nos anos 1980, o dono do maior
conglomerado de empresas de luxo do mundo: a LVMH (Louis Vuitton Möet Henessy). O
modelo implementado por Arnault, seguindo Grumbach, significou a substituição dos antigos
estilistas por jovens promissores, com formação universitária, e uma renovada visão a respeito
do trabalho com moda. Até mesmo o papel dos estilistas dentro das maisons passa a ser
redefinido, no sentido de um profissional sujeito às condições de mercado, e não um artista.
Essas transformações têm claro rebatimento na definição do ofício e nas suas possibilidades,
ao mesmo tempo em que ajudam a resolver o problema da sucessão do cargo na Maison. As
substituições de profissionais são comuns. O negócio permanece. A balança de definição do
estilista se inclina à compreensão da moda como negócio.
Em 1997, após oito casas de alta costura terem fechado as portas e as quinze
restantes “lutarem pela sobrevivência”, Didier Grumbach, novo presidente da Chambre
Syndicale de La Couture de Paris, simplifica as regras da alta costura, de modo a contribuir
para sua recuperação (SEELING, 2002). No entanto, não se trata de um retorno a uma “era
Dener”. A formação de tais grupos permite a que essas empresas de capital aberto mantenham
uma imagem de sucesso. O luxo, ainda que não-exclusivo, voltava à cena em fins do século
XX com altas margens de lucro. Ao mesmo tempo, a busca pela diferença, conseqüência
também de uma sensação de ameaça de homogeneidade global após a queda do muro de
Berlim, estimulou a pesquisa nos lugares culturalmente mais distantes quanto ao mundo
capitalista ocidental. Não se trata apenas de apelo ao Oriente, do modo como ocorreu nos anos
1970, como expressão de oposição ao capitalismo. O determinante passa a ser, por excelência,
a busca pelo diferente como meio para a expressão da especificidade pessoal, daí a
valorização das raízes (o apelo às tradições, ao trabalho manual, ao simples ou, simplesmente,
ao “diferente”, àquilo que se sente saudades e que, na produção de Herchcovitch, comparece
como aquilo que era firme e se deixou para trás na aventura das viagens e na fluidez das
mudanças), e a resposta podia ser buscada no ainda chamado Terceiro Mundo (atualmente
denominados países emergentes1 devido aos índices de crescimento que conseguiram obter
nas últimas décadas) e mesmo nos excluídos grupos que se conformaram dentro do mundo
ocidental. O resultado desses processos na produção de moda européia será sua crescente
abertura ao surgimento de estilistas advindos de diferentes partes do mundo, processo que já
havia se iniciado, mas com bastante timidez, nos anos 1980. É nesses termos que o brasileiro
Ocimar Versolato2 conseguirá construir uma carreira de estilista em Paris, carreira abalada por
questões de condução da administração e finanças, e outros estilistas nacionais começarão a
buscar constituir carreira assentadas no exterior, como Carlos Miele, com marca própria, e
Francisco Costa, como estilista da Calvin Klein, ambos nos Estados Unidos dos anos 2000. O
movimento de expansão global dos negócios ligados à moda, com o incremento tecnológico

1
O termo “países emergentes” foi concebido nos anos 80, quando o economista belga Antoine van Agtmael, ex-
funcionário do Banco Mundial, utilizou o termo como mecanismo para tornar mais “atraentes” papéis pautados
em dívidas dos países do chamado Terceiro Mundo (LAHÓZ, 2008).
2
Versolato foi um dos jovens que foram inicialmente seduzidos pela moda ao assistir, na televisão, uma matéria
que apresentava desfiles de Paris. Doze anos após, em 1986, Versolato seria um dos alunos de Marie Rucki, da
francesa escola Studio Berçot, que, na intenção de formar profissionais voltados à moda (não apenas como
estilistas) para ampliação de mercado, associa-se, no Brasil, à Rhodia e passa a promover cursos de moda em
São Paulo. É através de Marie Rucki que Versolato vai a Paris a fim de dar continuidade aos seus estudos e à sua
carreira, agora internacional.
que ocorre em diferentes lugares do mundo, implica o contra-movimento simultâneo que
permite a incursão (tímida) dos produtores brasileiros na dinâmica internacional dos negócios
ligados à moda, ainda em condição periférica. No entanto, as ambições perseguidas não se
limitam à exposição de coleções entendidas como exóticas que unicamente ajudariam a
promover o espetáculo da moda. Produzir roupas que tenham a sede da marca no Brasil, e
com aceitação no mercado nacional e, ao mesmo tempo, circulação por outros países é, nos
anos 1990 (e 2000), um grande desafio. Na esteira de tais transformações, os estilistas se
rebatizam, nos anos 1990, de diretores de criação, evidenciando sua nova relação com o
trabalho e os meandros da complexa cadeia de produção da moda. Não havia mais espaço
para um Dener Pamplona de Abreu. É nessa conjuntura que Herchcovitch anuncia sua morte e
se define pelo comércio de moda, lançando coleções de jeans e camisetas, o básico dos anos
1990 e 2000. A essa altura, ele já havia se formado na católica Faculdade Santa Marcelina, em
1993, pioneira na oferta de curso superior de moda no Brasil. De acordo com Borges e Bianco
(2002), nessa época, Erika Palomino começava a ser reconhecida no Brasil por suas matérias
no jornal Folha de S. Paulo, sobre, especialmente, a cena clubber paulista, que começava a
despontar. Segundo Borges e Bianco, os dois dos principais personagens da coluna eram
Márcia Pantera e Johnny Luxo, ambos vestidos por Herchcovitch. Isso permitiu, inclusive,
contatos e visibilidade ao trabalho do estilista antes de seu desfile de formatura, a ponto de, no
ano seguinte (1994), Paulo Borges convidar Herchcovitch para participar do Phytoervas
Fashion em sua primeira edição.
No Brasil, em 1989, inicia o governo Fernando Collor, jovem que parecia
encarnar, aos olhos dos brasileiros, a desejada modernidade que deveria substituir o passado,
os “velhos” modos de condução do país. Em conformidade com concepções liberais de defesa
da livre-concorrência, Collor “abre as portas” do Brasil para a livre entrada de produtos
estrangeiros, de mais baixos preços e melhor qualidade que os artigos nacionalmente
produzidos. O que seguiu foi um período de extrema crise das empresas privadas nacionais,
em especial de pequeno e médio porte. Apenas as empresas de maior porte, e já consolidadas
no mercado, tiveram oportunidade de superar a crise mediante considerável investimento, em
especial em tecnologia. A burguesia industrial brasileira colocava-se contra o autoritarismo e
a estatização da economia e defendia uma economia liberal de mercado, mas carecia de uma
estrutura melhor assentada e profissionalização para conseguir enfrentar uma concorrência a
que não estava acostumada e preparada, inclusive tecnologicamente. Com o confisco da
poupança e das contas correntes, o aumento dos juros e congelamento de salários, o
consumidor passou a ter precárias condições de compras. E em situação de crise, o setor da
moda, entendida como supérflua, sofre, convencionalmente, grandes abalos. As empresas
também foram abaladas por conta da concorrência, da flutuação cambial e pela dificuldade
em exportar. O resultado foi a falência de muitos empreendimentos, agravando ainda mais a
crise já instalada. A partir daí, em tais condições, era imprescindível uma alteração
considerável das empresas nacionais em termos de profissionalização e investimento em
tecnologia para a produção de bens mais confiáveis e competitivos. Na conjuntura que se
instala e sem o devido apoio governamental, apenas os grupos enriquecidos podiam se lançar
em tal reestruturação e se manter frente à concorrência. As medidas implementadas por Collor
tiveram duplo efeito na moda. Por um lado, o modo abrupto da “abertura” levou à
mencionada falência de muitas empresas e indústrias que estavam iniciando um percurso de
expansão. Por outro lado, as empresas que nasceram ofereciam produtos de melhor qualidade.
Ao lado disso, com a diminuição da taxa de importação, produtos variados, em qualidade e
preço, começaram a ter franca entrada no Brasil, proporcionando maiores opções de compra
aos brasileiros. É nesse momento que a loja Daslu, de Eliana Tranchesi, que, após a morte de
sua mãe, assumiu os negócios ao lado de Lourdes Aranha em 1984, inicia as negociações com
grifes internacionais, levando para São Paulo, nos anos 1990, uma série de marcas de luxo.
Após o impeachment do Presidente Collor, assume o seu vice, Itamar Franco, que
busca conduzir um governo neutro, sem grandes impactos ou inovações. É seu Ministro da
Fazenda, empossado em maio de 1993, Fernando Henrique Cardoso, quem assumirá o “centro
da cena” ao apresentar seu plano econômico para estabilização da moeda nacional e controle
da inflação. Com o Plano Real, a sensação de estabilidade econômica, de controle da inflação
e a paridade com o dólar promovem um incremento substancial no consumo. Nesse período,
marcado por uma maior integração nacional – ainda que polarizada em seu comando,
principalmente em São Paulo, e crescentemente difusa em sua base de trabalho (ainda que
com desigualdades flagrantes) – a produção e consumo de moda no Brasil avançam
significativamente. Seus mecanismos de divulgação, igualmente, começam a se incrementar
permitindo o planejamento e execução de medidas que contribuem para a organização do
setor. Um dos passos nesse sentido foi o Phytoervas Fashion, do qual Alexandre Herchcovitch
participou enquanto convidado a apresentar uma coleção no primeiro evento, em 1994.
Por intermédio de Romeu Moreira Leite, proprietário, à época, da agência Elite
Models, Paulo Borges foi apresentado a Cristiana Arcangeli com o intuito de que produzisse e
dirigisse o concurso “Look of the Year”, evento internacional promovido pela agência e que
contaria com o patrocínio da Phytoervas, empresa de cosméticos, – o que levaria à mudança
do título do evento para Phytoervas Look. Segundo relato de Paulo Borges, o concurso, que
em muito parece inspirado nos eventos da Rhodia, foi bem sucedido:
Teve música clássica brasileira executada ao vivo por um quinteto de violoncelos, uma
cantora lírica arrasou nas Bachianas de Villa-Lobos e um grupo indígena dançou um rito
religioso especial. Todo o desfile foi feito com produção de artistas de wearable-art3 e de
jovens estilistas absolutamente desconhecidos, com suas roupas “muito estranhas” – na
visão do povo e no entendimento do momento. (BORGES, BIANCO, 2003, p. 950).
Daí surgiu o planejamento e execução do Phytoervas Fashion. Para o evento,
inicialmente convidou Walter Rodrigues, estilista, e o segundo convidado foi Alexandre
Herchcovitch, a quem conheceu após o desfile na Faculdade Santa Marcelina. A proposta
consistia em três noites de desfiles (um desfile por noite), num mesmo local (um galpão semi-
abandonado), na segunda-feira após o carnaval de 1994. No sentido de angariar divulgação,
Paulo Borges começa, em seus termos, a “mapear” pessoas e veículos dispostos a falar a
respeito do assunto – cita Erika Palomino e Cristina Franco, apresentadora do jornal Hoje da
Rede Globo, de televisão. Herchcovitch, que foi convidado há 22 dias da realização do
evento, recebeu 800 reais para aquisição de todos os materiais e para contratar uma costureira.
No entanto, como salienta Paulo Borges, o Phytoervas Fashion era um evento de maior porte
e que conseguiu visibilidade, inclusive, da imprensa não-especializada. A coleção de
Herchcovitch, mesmo questionada em sua usabilidade por tal imprensa, foi vendida em menos
de um mês: “O nome Herchcovitch virou hype. Alexandre fez desfiles com Paulo Borges para
a Valisère e a Rhodia e assinou algumas peças para a marca Ellus durante três coleções. Em
outubro de 1994 abriu sua primeira loja” (BORGES, BIANCO, 2003, p. 955). Esse foi o ano
da eleição de Fernando Henrique Cardoso para Presidente do Brasil, decorrente da
credibilidade que conseguiu alcançar devido ao Plano Real, que consegue levar o índice da
inflação acumulada de 1995 ao patamar de 14,5%. O período, portanto, foi marcado por
otimismo, euforia e elevação nos índices de consumo do brasileiro. Tratava-se de momento
propício ao desenvolvimento de carreiras ligadas ao setor e à efetivação de negócios de vulto.
Para isso, era necessário, inicialmente, conferir maior visibilidade à moda. É nesse contexto
que as ações de Paulo Borges se inserem e podem ser compreendidos seus mecanismos, como
o apelo ao espetacular e ao choque, e os resultados que conseguiu alcançar, tornando-o um
nome-chave no desenvolvimento da moda no Brasil.
A segunda edição ocorreria no ano seguinte, num galpão da Rua Cardeal
Arcoverde, denominado por Mauro Freire de Espaço Phabrica. Nessa edição, Alexandre
Herchcovitch já viria contar com o suporte que não teve na edição anterior. A tecelagem

3
O termo, surgido nos Estados Unidos dos anos 1960, em função das transformações da época, designa a
chamada Arte Vestível, peças de roupas confeccionadas ou transformadas para ser “arte”.
Santaconstancia desenvolveu uma estampa de caveira exclusiva para ele, Fernando Pires
produziu os sapatos e Cristina Franco registrou cenas do desfile a serem exibidas na TV
Globo. Para Herchcovitch, o desfile era uma peça fundamental na construção de sua imagem.
Ele investiu, desde cedo, no potencial cênico que os eventos permitiam, criando atmosferas
que agiam no sentido de valorizar o produto exibido. Na terceira edição, realizada em 1995,
Herchcovitch apresentou peças marcantes, a exemplo da noiva, com chifres na cabeça, com
vestido tricotado por sua mãe (pesava 10kg) e que carregava uma placa escrito “noiva”. No
entanto, antes do desfile de Herchcovitch, Jorge Kaufmann apresentou uma coleção com
proposta oposta: modelos saudáveis, roupas coloridas, em conformidade com o clima de
otimismo que se vivia no Brasil. O público foi à euforia. Herchcovitch concluiu que o público
não havia apreciado seu desfile. Essa foi a última apresentação de Herchcovitch no
Phytoervas Fashion, que passou a divulger seu trabalho em desfiles independentes.
Desentendimentos com Cristiana Arcangeli levaram a que o Phytoervas Fashion só ocorresse
por mais três anos, sem Paulo Borges e sua equipe. Em julho de 1996, realiza-se a primeira
edição do “MorumbiFashion Brasil – Calendário Oficial da Moda”, novo projeto de Paulo
Borges. E, no mesmo ano, tem-se a realização da Semana BarraShopping de Estilo, no Rio de
Janeiro, projeto idealizado pela Dupla Assessoria, empresa de produção de eventos de moda
(GERALDINI, 2008). Segundo Paulo Borges, as dificuldades foram inúmeras, pois envolvia
reunir pessoas e empresas importantes, mas que pouco dialogavam, num mesmo evento. Por
isso, tomou a iniciativa de obter as adesões por assinatura de contrato, através da qual
firmava-se o compromisso oficial de participação no evento, evidenciando o caráter de seus
esforços e o pouco profissionalismo das empresas envolvidas com moda no Brasil. No
entanto, a maior dificuldade para Paulo Borges se transformou em sua maior façanha. O
funcionamento da moda, pensada como indústria, envolve a fina articulação entre diversos
setores de produção, que, no Brasil, mantinham desenvolvimento à parte do restante da cadeia
produtiva. Para além de estilistas, o setor do vestuário envolve uma gama de profissionais e
empresas4. A proposta de um calendário oficial da moda significava a tentativa de criar mais

4
Feghali e Dwyer (2001) apresentam uma classificação dos setores que envolvem a moda, no que se refere a
profissionais: 1) equipe da indústria têxtil e confecção (estilista, modelista, costureiros, profissionais de
desenvolvimento de produto, executivo de marketing, técnico têxtil, engenheiro químico-têxtil, empresário); 2)
equipe de comercialização (vendedor, gerente, fashion buyer, consultor de estilo, vitrinista, sacoleira); 3)
equipe de design (designer na tecelagem, designer têxtil, designer gráfico); 4) equipe de produção de moda e
de divulgação (modelos, beauty artist, agência de beleza, stylist, produtor de moda, figurinista, diretor de
desfile, diretor artístico, scouter e produtor de casting, agente, coordenador de camarim, relações públicas,
coordenador de promoções e eventos, coordenador executivo, DJ, assessor de imprensa, assessoria de imprensa
oficial, jornalista de moda, fotógrafo de moda, camareira, passadeira, segurança). Por sua vez, o complexo têxtil
engloba os seguintes segmentos: 1) produção de fibras; 2) fiação; 3) tecelagem; 4) malharia; 5) acabamento; 6)
confecção.
efetivo espaço para o estabelecimento de relações e negócios entre os diversos segmentos
atomizados, ao mesmo tempo em que se incrementava o potencial de visibilidade dos
diferentes setores e profissionais devido à sua concentração em evento único. Nesse sentido,
os desfiles de moda funcionam como chamariz tanto às empresas envolvidas com moda,
como aos consumidores – diferente do potencial de visibilidade de um estilista que apresenta
isoladamente sua coleção em um evento independente, voltado apenas a restritos convidados.
Herchcovitch apresentou coleção e se preocupou em construir uma imagem diferente: a
negação passou a, estrategicamente, ser uma de suas marcas.
A coleção de inverno 1997 foi aplaudida de pé: Herchcovitch fazia sua primeira
incursão na alfaiataria. Foi um mecanismo para melhorar o acabamento, a construção do traje.
Nessa época, já vendia na loja Patricia Fields de Nova York (desde 1996). Em 1998,
Alexandre Herchcovitch e Renato Kherlakian, da Zoomp, acordaram uma parceria.
Herchcovitch conceitualizaria a coleção da Zoomp, e a Zoomp licenciaria sua linha de
jeanswear e apoiaria sua marca. Foi neste ano que Herchcovitch foi fotografado no caixão
anunciando sua morte e a busca por um amadurecimento que lhe permitiria ingresso em mais
amplo mercado. Inicia o processo investindo em jeans e camiseta com a marca Herchcovitch;
jeans, segunda marca de Alexandre Herchcovitch – a primeira é a Herchcovitch; Alexandre.
Trata-se de um contraponto às coleções de prêt-à-porter, mais caras. No ano de 1998 o
estilista também iniciou as apresentações de sua coleção em passarela internacional, a London
Fashion Week. Seu projeto de internacionalização, que agora iniciava, estava vinculado ao
jeanswear, ao desfile em Londres e ao aumento do volume de encomendas por compradores
de diferentes lugares do mundo, possível apenas com o desenvolvimento da indústria, do setor
de transportes, comunicação e informática no Brasil.
Os anos 2000 e a internacionalização
Depois vieram Paris e, mais recentemente, Nova York. Em 2007, Herchcovitch
inaugura uma loja própria em Tóquio. O Japão começou a ganhar destaque no cenário da
moda com seu crescimento econômico, que permitiu aos japoneses um consumo intensivo de
produtos, e por sua abertura a novidades. De acordo com Herchcovitch (2007), foi com o
artista plástico e seu assessor, Maurício Ianês, que aprendeu que a roupa é um modo de
expressão e que seu trabalho significava criar um discurso através das roupas, o que o tira da
mera intenção de provocar mero espanto como reação de público; mas enfatiza: “sem,
contudo, jamais cair na tentação ou pretensão de achar que moda é arte” (HERCHCOVITCH,
2007, p. 39). No entanto, outra mudança significativa para a moda teria sido a eleição de
Paulo Skaf para presidente da ABIT, Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de
Confecção, no mesmo 1998. No mesmo sentido das ações de Paulo Borges com o projeto de
Calendário Oficial da Moda Brasileira, e em fundamental afinidade e complemento a elas,
Paulo Skaf busca promover a união entre produção de algodão, fiação, tecelagem, malharia e
confecção. Para tanto, cria metas comuns a todos e específicas a cada área de modo a
modernizá-las. Com o setor melhor organizado, Skaf reuniu 32 representantes do setor em
uma audiência com o Presidente Fernando Henrique Cardoso numa tentativa de pressionar o
governo a promover ações favoráveis ao desenvolvimento do setor para abastecimento do
mercado interno e externo. A ação mais efetiva da ABIT é a criação, em 1997, da Agência de
Promoção de Exportação e Investimentos (Apex-Brasil), ligada ao Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Os resultados obtidos por esses novos eixos
de articulação impulsionarão a fundação, em 2003 (ano da eleição do Presidente Luiz Inácio
Lula da Silva), da Associação Brasileira de Estilistas (Abest), por iniciativa dos estilistas
Alexandre Herchcovitch, Amir Slama, Lino Villaventura, Serpui Marie e Walter Rodrigues.
Atualmente presidida por Amir Slama, a Abest surgiu a partir das dificuldades que os
estilistas enfrentavam, especialmente, para exportar produtos. O objetivo da Associação é, nas
palavras de Herchcovitch (2007, p. 75), “obter maiores incentivos do governo brasileiro no
quesito exportação”. As primeiras ações envolveram desfiles e showrooms para apresentar a
moda brasileira em países estrangeiros. Em seu primeiro ano de atividades, com cinco
integrantes, a Abest exportou US$600 mil; em 2006, com 51 associados, US$12 milhões, com
vendas em 38 países. Atualmente, a Abest conta com 50 integrantes que exportam para 48
países. A projeção para 2008 era de exportar US$13,4 milhões 5, conforme dados divulgados
no site oficial da Associação6. A Abest conta, atualmente, com o apoio da Apex-Brasil, do
Ministério do Turismo e da Associação Brasileira de Empresas de Componentes para Couro,
Calçados e Artefatos (Assintecal). De acordo com as informações apresentadas no site, trata-
se de “fortalecer e promover a indústria de moda nacional focada nos pilares: qualidade,
design e identidade”. Também objetiva “desenvolver marcas de alcance internacional e
garantir a autenticidade e criatividade das coleções, divulgando o estilo de vida brasileiro”; e
terceiro, “contribuir também para o crescimento de todos os segmentos vinculados à moda do
nacional”. São ações conjugadas, da ABIT, Apex e Abest, que têm envolvido as diferentes
5
Os dados relativos ao ano de 2008 ainda não foram divulgados, contudo os resultados têm possibilidade de
terem sido inferiores ao projetado devido à chamada crise mundial, cujos efeitos são especialmente sentidos, no
caso brasileiro, quanto às exportações. E o setor de moda, vinculado à futilidade, convencionalmente sofre
abalos nos primeiros momentos de crise, ainda que haja episódios (como a Segunda Guerra Mundial) em que a
moda acabou sendo vivida como escape e, simultaneamente, como meio de estabelecimento de relações
comerciais vantajosas, em especial com os países que sofreram menos com a guerra ou que conseguiram obter
vantagens a partir dela.
6
www.abest.com.br.
relações que compõem a configuração-moda dentro do Brasil e, assim, profissionalizando as
relações, cria-se a base para inserção competitiva no mercado internacional mudando a
imagem de pouco profissional do Brasil no exterior.
Como o próprio Herchcovitch afirma, desde cedo apresentou facilidade para se
“desdobrar” em vários assuntos. Isso lhe franqueou, na vida adulta de dedicação à moda, a
possibilidade de trabalhar para várias linhas dentro da marca Herchcovitch; Alexandre, como
a Herchcovitch; Jeans, a AND, uma co-branding que teve início em 2004 para produção de
camisetas e acessórios, criadas fundamentalmente em encontros virtuais entre Herchcovitch e
Blame7, que mora em Londres, e a Herchcovitch Black. Mas, fundamentalmente, a
versatilidade do estilista é percebida, primeiro, em seu trabalho paralelo para outras marcas,
como a Ellus, a Zoomp e a Cori, que marcaram sua trajetória. Segundo, no desenvolvimento
de produtos vinculados à aparência, mas que não são roupa, a exemplo das jóias para a
Dryzun, roupas de cama para a Zelo, conjunto de louça e móveis para a Tok & Stok, sandálias
para a Melissa e mesmo band-aid. Por fim, Herchcovitch, como emblema do sucesso possível
àquele que pleiteia uma qualificação profissional em curso superior em moda, é diretor
artístico do bacharelado em Design de Moda do Centro Universitário Senac-SP e é DJ uma
noite por semana no Clube Glória, além de participar de outros projetos.
No entanto, o ano de 1999 marca ainda outra mudança significativa no contexto
nacional: devido a crises financeiras internacionais na Ásia e na Rússia, o governo Fernando
Henrique sela novo acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID), Banco Mundial (BIRD) e Banco de
Compensações Internacionais (BIS), num total de US$41,5 bilhões. Houve desvalorização da
moeda brasileira, aumento da dívida interna e da taxa de juros e crise financeira. Contudo, as
transformações que Herchcovitch destacou, a partir da fotografia no caixão, não se
restringiriam a seu trabalho e à crise financeira em que o país começava a mergulhar: marca,
de fato, uma nova etapa no fazer moda no Brasil. Ou seja, é representativo do momento. Por
seu turno, Paulo Borges busca maior profissionalização na condução do MorumbiFashion,
através de trabalho em equipe. O grupo de Borges planejava o aumento do evento, o que não
foi aceito pelo shopping, levando à rescisão do contrato. Em janeiro de 2001, ocorria a
primeira edição do São Paulo Fashion Week, contando com a empresa Direct TV como
patrocinadora master. Com título inspirado nos títulos dos eventos de moda de outros lugares
do mundo, o SPFW se torna o maior evento de moda da América Latina. Seguindo os passos
do evento paulista e buscando rivalizar com ele, ocorreria a primeira edição do Fashion Rio,
7
Judy Blame, nos anos 1980, vestia Boy George na época do Culture Club e fazia editoriais para a revista I-D.
como decorrência da Semana BarraShopping de Estilo. Isso se deu em 2003
(ALEXANDRE..., 2007). Em 2001, no Brasil, Herchcovitch passa a apresentar a coleção
masculina agora separadamente. Isso significa multiplicar inspirações e estilos apresentados
nas passarelas, o que remete a uma complexidade maior da discussão sobre a identidade
criativa do estilista para além de ver as criações como mera extensão do criador. Para dar
conta de tamanha diversidade em tempos de moda-negócio, as “matrizes identitárias” se
tornam consideravelmente mais abstratas, permitindo sua atualização em formas,
comparativamente, diversificadas – perceptível na comparação entre marcas distintas e
mesmo entre coleções de uma mesma marca, sem negar o fio de continuidade entre as
produções. Em entrevista à revista belga Dutch, de acordo com P. Borges, Herchcovitch
definiu o seu estilo a partir da noção de mistura; segundo ele, atitude típica do brasileiro. Mais
do que isso, o define o modo peculiar como sintetiza aquilo que toma para pôr em relação.
Poderíamos acrescentar ainda que sua recorrência em tomar temas arbitrários, no sentido de
não imediatamente remissíveis entre si se torna traço marcante em seu trabalho. Ou seja, o
trabalho de Herchcovitch não é reconhecível pela limitação a certo rol de temas ou materiais,
mas sim à sua abertura e ao modo como escolhe e lida com eles. O caráter de abstração desses
marcadores de estilo lhe abre campo de criação sem ferir a necessidade de continuidade, nem
a exigência de renovação. Devido ao sucesso internacional, o estilista quadriplicou os pontos-
de-venda no exterior, rompeu o contrato com a Zoomp, desenhou coleção de jóias e lançou o
livro HERCHCOVITCH; Alexandre, pela Editora Cosac & Naify.
Tais debates são conseqüência da nova voga do tema das identidades na definição
da relação global-local. Ao lado disso, o incremento no valor simbólico, e correspondente
valor de troca, de bens simbólicos vinculados à criatividade, em especial a partir da criação do
termo indústrias da criatividade pelo Governo Britânico em fins dos anos 1990 e das
pesquisas realizadas no sentido de apontar sua participação no PIB mundial, promove
paulatinamente o interesse governamental em tratar a questão cultural do ponto de vista do
desenvolvimento, o que implica a criação de políticas de incentivo à maior profissionalização
do setor. Nesses termos, a identidade parecia se tornar a chave para mais ampla aceitação do
produto brasileiro no mercado internacional. No entanto, o grande problema a ser discutido é:
Como, então, evitar produções marcadas pelo exótico ou demasiado “bairristas”, a ponto de
serem usadas apenas dentro do país?
A diversidade brasileira e a percepção da existência de um mercado interno, e
externo, pouco aproveitado acabou levando a um interessante panorama. A organização da
produção de moda passou a estar vinculada a identidades regionais: a moda paulista, a
carioca, mineira, a cearense, a baiana, e assim por diante. O desenvolvimento da indústria
nacional possibilitou a que cada região buscasse constituir nichos próprios de criação de
moda, ainda que São Paulo e Rio de Janeiro se mantivessem em condição privilegiada. Cada
região passou a assumir as características que, supostamente, seriam específicas e, ao mesmo
tempo, passíveis de uso no Brasil (ou adaptados a um pretenso gosto médio), afinal seriam
diferentes modos de expressão da (diversificada) cultura brasileira. A identidade funcionaria
como liame que amarraria as propostas e facilitaria sua visibilidade na rede mais abrangente
Brasil. Cada Estado acaba por apresentar seu evento de moda, e esses pretensos “diferentes
modos de apresentação da cultura brasileira” são rearticulados a partir dos dois pólos de
concentração da criação e produção de moda, facilmente distinguíveis entre si em suas
características e não menos concorrentes: São Paulo (com o São Paulo Fashion Week) e o Rio
de Janeiro (com o Fashion Rio). São Paulo, com desfiles de caráter urbano, cosmopolita,
congregando em especial marcas paulistas e mineiras; Rio de Janeiro, evidenciando o Brasil
praieiro, com desfiles ligados à leveza, à pouca roupa, congregando marcas identificadas com
o artesanal e litorâneo – aí comparecendo cariocas, cearenses e, de forma bastante tímida, a
Bahia. O Brasil amazônico surge de forma difusa e o sertanejo, pouco existe.
A despeito de qualquer consideração a respeito do equívoco de confundir
fronteiras geopolíticas com culturais, a organização da produção brasileira em dois principais
pólos, ainda que deixando em plano secundário tantos outros Brasis, parece significar o
reconhecimento das ligações e, pois, a fragilidade das fronteiras interestaduais, bem como
evidencia relações de poder historicamente estabelecidas na busca por hegemonia. São Paulo
com uma moda brasileira de metrópole, usável em qualquer lugar do mundo, e o Rio, com
uma idéia de moda de feições nacionais (próxima à idéia divulgada do Brasil no exterior e que
há bastante tempo tem o Rio como grande representante), e, por isso, com possibilidade de
inserção internacional, como a proposta paulista, mas pelo motivo de se apresentar como
expressão do nacional, ou seja, a partir da idéia de diferença, especificidade que o atrelamento
à identidade lhe conferiria. Secundarizando-se os exageros das tipologias, e os desviantes que,
obviamente, não conseguem abarcar, os finos cruzamentos entre os “dois Brasis” da moda
começam também a ser postos em uso. Os liames: identidade e tecnologia. Assim, as
evidentes diferenças entre os dois eventos de moda começam a ter suas fronteiras borradas a
partir do momento em que observamos no discurso do principal idealizador e organizador do
São Paulo Fashion Week, Paulo Borges, a afirmação da necessidade de construir uma “moda
brasileira” usável em diferentes pontos do mundo. Mesmo o calendário dos dois eventos, que
antes se sobrepunham impedindo que uma pessoa pudesse assistir os dois eventos, agora
assume novo caráter. A divisão de características das produções transformou-se numa forma
de organização do mega-evento brasileiro. Mantém-se o movimento centrípeto que canaliza
as produções regionais, filtradas nos eventos estaduais, para os dois pólos da moda brasileira,
que, por seu turno, constituem-se no canal para visibilidade de tais produções no conjunto do
país e para inserção internacional (movimento centrífugo).
Quanto a Herchcovitch, em 2002 toma a iniciativa de diminuir a distribuição de
suas peças em multimarcas e começa a investir em lojas. Além das duas que matem em São
Paulo, na Haddock Lobo e no Morumbi Shopping, inaugura loja no Park Shopping de Brasília e no
Iguatemi de Porto Alegre. “A partir daí”, afirma, “passei a pensar na marca como grande business”.
(HERCHCOVITCH apud BORGES, BIANCO, 2003, p. 958). O desfile de verão 2002/2003,
refletia, segundo Paulo Borges, a concepção do novo “criador-empresário” ao apresentar
peças de fácil entendimento pelo grande público e que geraram aumento considerável no
volume de vendas. Com uso freqüente de patchwork, a coleção trouxe como principais
referências o surfwear, a praia, Ursinhos Carinhosos e Meu Pequeno Pônei. No entanto,
destaquem-se as referências à ciranda e ao regionalismo brasileiro. Herchcovitch, portanto,
busca inserção no movimento de tomar a identidade como recurso para alavancar a moda
produzida por brasileiros em contexto internacional. A partir da mistura, Herchcovitch
começa a experimentar de modo mais sistemático o uso de referências nacionais como fator
de destaque. Os atentados de 11 de setembro abalaram o vertiginoso comércio de moda da
passagem para os anos 2000; no entanto, o aumento das vendas não tardou a recomeçar em
diferentes partes do mundo. No Brasil, a eleição do presidente Lula, empossado em 2003,
deu-se em contexto de balança comercial superavitária, mas de grande descontentamento
quanto às questões sociais. O período Lula será marcado, em seu primeiro mandato, pelo
desenvolvimento industrial e pela balança comercial positiva, com considerável incremento
das exportações por conta de alianças internacionais. Em 2004, no acumulado do ano, as
exportações e o saldo comercial chegaram a recordes históricos, em especial devido ao
agronegócio. Ancorado no rápido crescimento econômico chinês, com quem mantém
negócios de exportação de soja, o Brasil conseguiu atingir, em 2004, o Produto Interno Bruto
(PIB), soma de bens e serviços produzidos pelo país, de 4,9% (em 2005, o PIB registrou
crescimento da economia num percentual de 2,3%, e, em 2006, de 3,7%, após a revisão). Os
índices de crescimento do Brasil, ainda que abaixo de um grupo de países que obtiveram
melhores resultados, mesmo na América Latina, fez com que o Brasil fosse incluído no Bric
(China, Índia, Rússia e Brasil), promessas de desenvolvimento recorde para as próximas
décadas. Ainda que tímido, pois potencialmente o país apresenta condições de resultados
melhores, o crescimento do Brasil promoveu uma melhoria nas condições de vida, em
especial da classe média, fazendo, inclusive, com que, em 2007, o número de milionários no
Brasil crescesse em 19,1%, segundo dados do 12o Relatório Anual sobre Riqueza Mundial,
realizado pela consultoria Capgemini e pelo banco americano Merryll Lynch. Ainda que seja
um país marcado por desigualdades (e por grande potencial de crescimento inexplorado), a
conseqüência inicial para a moda é o incremento do consumo no país, inclusive de produtos
mais caros. Além disso, com o aumento das exportações e com a assunção pelo país da noção
de indústrias criativas, abrem-se oportunidades de pressão para a diminuição da burocracia
nas transações de exportação e para um investimento maciço na produção de qualidade
voltada ao comércio interno. A expectativa é que o centro de consumo deixe de ser os Estados
Unidos e compareça pulverizado nos chamados “países emergentes”. Segundo Agtmael, “em
dez anos haverá 1 bilhão de novos consumidores nos países emergentes e, em 25 anos, esses
mercados já estarão maiores que os desenvolvidos” (2008, p. 44). É, porém, uma estimativa.
Em síntese, minha meta é fazer um casamento perfeito de uma cultura 100% brasileira
com uma silhueta que encante clientes do Brasil, Estados Unidos, Japão, Alemanha,
China, Inglaterra e Canadá. (HERCHCOVITCH, 2007, p.72).
Em sua coleção Primavera-Verão 2006-2007, Herchcovitch se volta, mais uma
vez à geometria e mantém a alfaiataria, cada vez mais apurada. Do mesmo modo, o uso de
referências étnicas; no caso, a comunidade africana Ndebele foi a inspiração, com suas formas
e cores. Os traços de localidade paulatinamente, portanto, deixam de se referir apenas ao
Brasil, ao mesmo tempo em que a viagem se torna quase condição à inovação dos trabalhos. É
nesses termos que Herchcovitch caminha no sentido de tornar a relação com uma suposta
brasilidade vinculada mais à estratégia de criação do que a recorrência a elementos advindos
do repertório nacional-popular. Utilizar a Carmem Miranda, a ciranda ou a festa junina se
transformam em possibilidades dentro de um universo aberto, deixando de operar como
restritivos à criação. E esse “fazer” brasileiro, Herchcovitch relaciona à mistura. Assim, às
cores, matérias-primas e geometria Ndebele, Herchcovitch alia elementos da estética punk. Os
grafismos geométricos são feitos a partir de composições com a imagem de giletes
multicoloridas (ou mesmo em preto e branco), compostas a partir de pequenas contas, e que
estampam camisas de corte simples, de referência dos anos 60 em suas golas, ou mantos e
mesmos chapéus, articulados ao uso de botas militares e óculos Ray-Ban. No ano de 2007,
ano da inauguração da loja de Herchcovitch em Tóquio, a economia brasileira cresceu 5,4%,
segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), publicados no jornal
Follha de São Paulo. Teria sido a maior taxa de expansão desde 2004, quando atingiu
crescimento de 5,7%. O aumento do consumo familiar brasileiro atingiu, por sua vez, alta de
6,5% (CIRILO JR, 2008). De acordo com Philippe Aghion, “países com maior volume de
crédito e com índices mais elevados de capitalização na bolsa de valores apresentam taxas de
crescimento maiores” (2008, p. 55). Advertindo que se trata apenas de uma correlação, aponta
que uma das principais barreiras ao crescimento das empresas nos países emergentes é a
dificuldade na obtenção de financiamento, que pode, a rigor, ser conseguido no mercado
financeiro ou através do sistema bancário. Isso ajuda a compreender o movimento que
começa a ocorrer nas empresas de moda brasileiras nos anos 2000.
Na passagem para 2008, foi anunciada a aquisição de grifes brasileiras por
holdings e fundos de investimento. Desde 2006, quando o grupo HLDC comprou a marca
Zoomp, mais de dez negócios foram fechados. Além da HLDC, o fundo de private equity8
Pactual Capital Partners é outro grande comprador. A lógica é a mesma utilizada, nos anos
1980, por Bernard Arnault (da LVMH) na Europa: a aquisição de várias grifes, destinadas a
distintos públicos, sob uma administração comum e com específicas direções criativas,
associando o trabalho de administradores e estilistas. A mais rígida distribuição de funções e a
assunção do caráter de funcionário de uma rede é relativamente recente no que toca o ofício
do criador de moda. A racionalização da gestão e a maior capacidade de investimento das
holdings e fundos de investimentos seriam um importante motor à expansão dos negócios
num difícil mercado globalizado. No caso do Brasil, de acordo com entrevista de
Herchcovitch (LEITE NETO, 03/01/2008), a participação de investidores tornaria factível a
internacionalização, dificultada por uma série de fatores, como a incipiente profissionalização
e mesmo a dificuldade de uma marca “terceiro mundista” obter reconhecimento ao competir
com marcas européias ou norte-americanas já consolidadas. Por outro lado, a participação de
investidores, ainda segundo o estilista, possibilita maior democratização das peças
comercializadas por conta do incremento da produção.
Alexandre Herchcovitch, que divulgou a venda de suas duas marcas (a
Herchcovitch; Alexandre e Herchcovitch Jeans) em janeiro, anunciou, contudo, em princípios
de abril de 2008, a desistência do negócio com o grupo I’M (Identidade e Moda), da holding
HLDC Investimentos, o que ocasionou igualmente sua saída da direção de criação da Zoomp
e do cargo de curador da I’M, evidenciando as dificuldades de transação e de determinação
das tarefas de cada parte dos dirigentes (criativo e administrativo) na condução do negócio.

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Private equity (ou Fundos de Ativos privados) são uma forma de fundo de investimento que teve início nos
EUA em fins dos anos 1980. Consiste, como o termo indica, em um investimento feito por um determinado
grupo em uma empresa com potencial de crescimento (e, geralmente, de capital fechado) através da compra de
participação acionária na empresa visada. A partir daí se estabelece uma parceria em que o grupo investidor
acaba também por participar da administração do negócio. No Brasil, tal modalidade de investimento, cresce em
especial a partir da segunda metade nos anos 1990, devido ao impulso econômico do período.
Segundo o estilista, “as negociações não chegaram a bom termo” (FOLHAONLINE,
05/04/2008), confirmando a declaração de Mayer, do banco Morgan Stanley, de que a relação
entre um estilista (criador) e investidores (voltados a lucro) carrega grande potencial de atritos
(apud CAMARGOS, 2008). “Eles negociaram um valor e depois não tinham o dinheiro para
pagar. Eu percebi e saí antes [que algum documento fosse assinado]”, afirmou Herchcovitch
em entrevista a UOL Estilo-Moda (VASONE, 27/08/2008). De qualquer modo, aproveitando
os favoráveis índices de crescimento econômico e o aumento da confiança nas empresas
brasileiras, em termos de potencial de crescimento e cumprimento de compromissos, as
aquisições prosseguem e, para além delas, os conflitos instaurados no processo, como o
processo judicial promovido por Kenzo Takada contra o grupo LVMH pelo seu direito em
usar a marca que leva seu nome ou entre o estilista brasileiro Fause Haten e o grupo I’M,
cinco meses após ter vendido sua grife, por descumprimento de contrato. Quanto a Alexandre
Herchcovitch, após a desistência do contrato com a I’M, entrou em negociação com o grupo
InBrands. Criado em 2007, o InBrands é administrado pelo suíço UBS Pactual, um dos
maiores bancos de investimento do mundo, de acordo com Carolina Vasone, em matéria para
o UOL Estilo-Moda (19/08/2008). Em princípios de 2008, Nelson Alvarenga, dono da Ellus e
da Ellus 2nd Floor, e, pouco após, Isabela Capeto anunciaram a venda de suas marcas para a
holding. A divulgação oficial da parceria entre Alexandre Herchcovitch e a InBrands ocorreu
em 25 de agosto de 2008, após cerca de quatro meses de negociação. Além da marca
Alexandre Herchcovitch, o grupo InBrands passou a ser também sócio majoritário do São
Paulo Fashion Week (SPFW), evidenciando, mais uma vez, a relação de proximidade e
influência mútua entre Paulo Borges e Alexandre Herchcovitch. O interesse na empresa em
grau acentuado é mantido a partir do momento que o estilista é mantido no negócio na
condição de funcionário-sócio, o que lhe garante certa margem de autonomia e poder de
decisão quanto a deliberações que dizem respeito à empresa e que são definidas como de sua
competência, através de contrato. Em outros termos, a partir dos anos 1980 nova fase parece
ter iniciado no que se refere à produção de moda e que tem gerado um novo termo para
definir o “profissional-criativo”. De costureiro (alta costura) a estilista (prêt-à-porter), a atual
função desses profissionais no novo formato de seus empreendimentos é de “diretor criativo”,
o que é bastante revelador da atual conjuntura. Segundo Dana Thomas (2008), trata-se de uma
autodenominação dos estilistas surgida nos anos 1990. A função de diretor aponta um
específico formato de gestão, em que tal profissional assume a coordenação de uma equipe no
toca à criação de peças, ou seja, dentro de uma empresa marcada por acentuada especialização
de tarefas. Criação e administração se transformam em segmentos distintos na condução dos
“negócios da moda”, um formato recente na história do vestuário.
Conclusão
“Minha história é moda. E moda é negócio, por esse motivo no exterior o
segmento é conhecido por indústria da moda” (HERCHCOVITCH, 2007, p. 39). Essa frase é
o ponto de partida fundamental na compreensão do modo como Herchcovitch concebe o
processo criativo em moda. Tanto o trabalho que o estilista desenvolve é dependente da noção
que tem sobre moda e, conseqüentemente, sobre o ofício do estilista, como a noção de moda e
de estilista que carrega muda em função de sua trajetória de trabalho. Ao mesmo tempo,
poderíamos afirmar que o reconhecimento que tem conseguido obter, com as críticas
favoráveis na imprensa e os resultados nas vendas (observável através da expansão de sua
marca), funcionam como uma reafirmação de suas bases de trabalho. Herchcovitch tem
inserção (mesmo diferenciada) nos principais eventos de moda nacionais e internacionais,
bem como angariou relativo destaque nos meios de comunicação. A partir disso, acaba
reforçando sua percepção sobre moda e difundindo-a para outros profissionais ou aspirantes
ao trabalho, seja através de suas declarações públicas à imprensa, seja através de livros ou
mesmo a partir de sua atuação no curso de Design de Moda do Senac-SP. Nesses termos,
enquanto indivíduo de prestígio, Herchcovitch funciona simultaneamente como catalisador de
sua época e peça destacada na construção dos encaminhamentos futuros da moda no Brasil.
Não se trata, contudo, de percebê-lo descolado da rede do qual faz parte, mas perceber que
tais relações envolvem assimetrias que acabam com conferir pesos diferenciados aos
indivíduos que a compõem.
Herchcovitch é tributário de Dener. Mais que isso, podemos afirmar usando
termos simmelianos que Herchcovitch é herdeiro de Dener e de sua época. No entanto, a
herança não significa mera reprodução de um modo de vida e de condução do ofício.
Herchcovitch elogia as inovações de Dener e se lastima pelas condições de sua época, que
compeliram a que sua inventividade ficasse submetida a determinado modo de vida marcado
por luxo, festas e bebida a ponto de comprometer a sua saúde física e também financeira. Usa,
pois, sua “herança” de modo a ajudar a construir outro modo de engajamento do estilista com
seu trabalho, em conformidade com as transformações presenciadas ainda por Dener, no final
de sua carreira. Ao destacar que a moda é negócio, ao contrário do que alimenta Dener
quando se afirma como artista, Herchcovitch assume a importância da clientela,
reposicionando o papel do estilista em relação a ela. O dom e inspiração gratuitos,
subordinados aos desejos do “ditador de moda”, são substituídos pelo papel da pesquisa para
a efetivação de um trabalho de resultados satisfatórios. E isso ajuda a justificar o
distanciamento crescente do autodidatismo como mecanismo que é demorado e incerto.
Contudo, a pesquisa tem papel não apenas enquanto formação inicial para
aprendizado da costura e do que tem sido feito por profissionais já reconhecidos. Os relatórios
de vendas são fundamentais ao direcionamento das criações futuras, bem como mecanismos
começam a ser desenvolvidos no sentido de permitir a detecção dessas supostas vontades,
estimadas a partir da determinação do que teriam sido os pontos de força e de fragilidade da
coleção. A noção de processo embutida numa concepção de história como simultâneas
continuidades e transformações acaba ganhando considerável espaço e renovando a própria
idéia de novidade, sempre atrelada à moda, que deixa de ser compreendida como ruptura em
relação ao antigo e passa a significar, portanto, mudanças na continuidade; em outros termos,
o modo como cada estilista se posiciona frente ao desafio de manter uma assinatura pessoal,
uma produção identificável que permita a manutenção da fidelidade de sua clientela e, pois, a
continuidade das vendas, e, simultaneamente, continue estimulando o consumo pela
apresentação de algo renovado. O próprio Herchcovitch menciona que, no início de sua
carreira, tinha maior preocupação em, a cada coleção, romper com o que tinha produzido
anteriormente, mas demonstra haver mudado no sentido de buscar elos de continuidade que
criem uma “identidade” entre suas diferentes produções. O movimento passa a ser lento e
contínuo: a depender, uma inovação pode levar até três coleções para começar a ser usada. No
entanto, é interessante observar como Herchcovitch constrói sua solução para a questão posta:
como ter uma assinatura pessoal sem criar obstáculos à apresentação das inovações que são
imprescindíveis às vendas? No que se refere à moda, apresentar novidades, ser criativo é uma
exigência, uma norma que direciona os trabalhos. Em lugar de manter-se fiel a determinado
tipo de peça ou material utilizado, que pode levar ao esgotamento e fragilização da proposta
criativa, Herchcovitch desloca a sua assinatura pessoal para sua estratégia de criação. É nesse
sentido que ele pode fazer uso de cores sóbrias numa coleção e apresentar, na seqüência, uma
coleção alegre de cores exuberantes; ou pode fazer uso de referências militares numa coleção
e românticas em outra. Sua assinatura está no pôr em jogo elementos diversificados; isto é,
está em aproximar aquilo que convencionalmente seria percebido como distante. Assim,
Herchcovitch abre infinitas possibilidades para a criação: quantos elementos estarão em jogo;
quais; o que toma de cada um; como estarão articulados. Herchcovitch começa a experimentar
as combinações possíveis, como uma espécie de jogo que o permite, inclusive, ultrapassar as
fronteiras convencionais de compreensão de uma suposta moda brasileira; isto é, de uma
moda feita no Brasil a partir de características nacionais, projeto igualmente vivido por Dener,
Alceu Penna, Livio Ragan e, mais recentemente, Paulo Borges. Quando a idéia de que “o
Brasil está na moda” começou a ganhar força, Herchcovitch também começa a criar coleções
com apelo ao nacional. No entanto, o modo como ele começa articular discursivamente sua
estratégia criativa com a noção da mistura como modo brasileiro de processamento cultural o
permite prescindir de apelos a cores ou temas notoriamente brasileiros. Isto é, ele se coloca
como brasileiro em qualquer produto que fizer e, em especial, quanto mais ousar nas sínteses
que produzir. Como sínteses, os resultados seriam únicos. É desse modo que ele afirma buscar
um produto “100% brasileiro” e com silhueta que permita ser usado por uma pessoa de
qualquer lugar do mundo. A criação não se dá por intuição; as escolhas devem ser
racionalmente fundamentadas para ganharem a coerência que lhes permita a aposta do
investimento enquanto negócio. Definido como tal, o trabalho com moda passa a ser uma
profissão que demanda resultados, medidos em vendas, para sua continuidade. Quanto a
Herchcovitch, se qualquer elemento/tema pode ser tomado como inspiração, a característica
fundamental do criador acaba consistindo numa espécie de treinamento do olhar.
Considerando a história nacional da produção de vestuário e o papel dos imigrantes nesses
processo, acabamos sendo obrigados a relembrar as origens de Herchcovitch, sua criação em
colégio judeu ortodoxo, o modo de relação e “olhar” dos judeus para com não-judeus, os
meses que viveu em Israel, sua inserção na chamada noite underground paulista, a
experiência em instituição católica de ensino... Por excelência, Herchcovitch cultivou o
trânsito como modo de vida, e a síntese como processo de trabalho. Um está na dependência
do outro. Tais características acabaram sendo interiorizadas pelo estilista e reforçadas ao
longo de sua trajetória. O relativo sucesso de que desfruta confirma a adequação de sua
proposta ao contexto de transformações que viveu e vive.
Sagrado/profano, eterno/efêmero, homem/mulher, esconder/mostrar são postos
em articulação, ao mesmo tempo em que emerge a questão sobre a relação mesmo entre corpo
e roupa. Moldura, prisão, conforto, adorno, mentira são confrontados na exibição do corpo, no
envolvimento do corpo pela roupa, no cobrimento do rosto que torna a celebrizada modelo
dos anos 2000 anônima. No entanto, a interrogação posta sobre os pares duais lhe abre
caminho para problematizar também a noção de pares de oposição, o que cria oportunidades
novas para estabelecer cruzamentos entre variados elementos ou temas que seriam entendidos,
à primeira vista, como sem relação entre si (e para além da restrição a pares). O trabalho de
Herchcovitch ganha impulso e maturidade quando se propõe a estabelecer relações entre
distantes, como observado no desfile descrito no início desse artigo. O inusitado de seus
resultados não está nos elementos em separado que toma como inspiração, e sim no jogo que
os afina e transforma. Os elementos e temas são convencionais, apesar de buscados em
diferentes lugares e épocas. “Para deixar essa fonte de criatividade sempre na ativa, o melhor
caminho é passear entre mundos. Interligar áreas afins e somar um olhar curioso sobre coisas
distintas”, afirma Herchcovitch (2007, p. 52). Na coleção Verão 2009, apresentada no São
Paulo Fashion Week na data de 20/06/2008 – isto é, em meio às turbulências que envolveram
seus contratos com empresas de investimento – Herchcovitch lança a coleção feminina
intitulada “Exército do amor”. Toma como inspirações a estética militar, com seus tecidos
mais rígidos, e mistura o militar à fluidez do rococó do século XVIII, com tecido em seda e
xantung. O desfile inicia militar com toques da fluidez do século XVIII e paulatinamente
cambia se tornando rococó com toques militares. A própria mistura é tematizada pelo estilista.
Ou seja, as sínteses são o ponto nodal da produção de Herchcovitch e que o aproxima de seus
antecedentes judeus em sua história de errância pelo mundo, bem como do papel do dinheiro
no mundo capitalista, das características que marcam os usos das roupas no século XXI (hi-lo,
customização, vintage) ou ainda daquilo a que Simmel e Elias, por exemplo, definem como
característico do humano (a construção de pontes). No entanto, se qualquer “coisa” pode ser
tomada como inspiração, é a trajetória do estilista que definirá o que será tomado: uma
lembrança, um filme, um livro, uma viagem, uma reportagem, uma conversa, uma
caminhada... No entanto, definir-se como diretor criação significa um modo de afirmação do
modo como sua profissão se dá. Evidencia-se, por excelência, o trabalho em equipe, com
especialidade de funções. O trabalho do estilista é coordenar as diversas atividades que
compõem o setor de criação da empresa. Em outros termos, a criação é conjunta. Trata-se de
um modo de expressar a complexidade de funções e o aumento da quantidade de pessoas que
têm papel de relevo no processo criativo. É nesse sentido que uma série de profissionais
comparece no sentido de alimentar a gama de referências passíveis de serem conjugadas, de
avaliar o que está sendo proposto em função das pesquisas de mercado, dos relatórios de
vendas e da coerência da proposta em função do todo da coleção. O processo criativo é
assumido na falta da liberdade; liberdade esta que nunca chegou efetivamente a ter.
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