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Aparência Conta?

Mal vestida, cabelo sem corte, sem maquiagem, um jeito meio caipira. Foi
assim que Susan Boyle apareceu em frente às câmaras da TV britânica no show
de talentos “Britain’s Got Talent”, visto pelo país todo. Assim que ela entrou,
podia-se ver nos rostos da platéia, que eles não acreditavam que aquela mulher
sem classe poderia cantar. E foi aí que Susan Boyle surpreendeu todo mundo
com sua voz perfeita.
A história de Susan Boyle fez o mundo repensar sobre questões como
estereótipos, preconceitos e julgamentos precipitados. A mensagem que Boyle
nos deixa é de não julgarmos o livro pela capa pois quando esteriotipamos,
colocamos as pessoas em categorias carregadas de preconceitos.
Mas será que os estereótipos podem ser mesmo evitados?
Cientistas socias que estudam o fenômeno estereótipo dizem que
criamos estereótipos porque necessitamos deles. Julgamentos rápidos sobre as
pessoas podem ser crucial para nossas vidas, por exemplo.
Um professor de psicologia da Universidade de Nova York, Dr. Amodio,
diz que os estereótipos são um mecanismo necessário para o mundo ter
sentido para nós. Se, por exemplo, julgamos que uma pessoa como perigosa
somente pela aparência, isso pode, de fato, salvar nossas vidas.
Colocar coisas em categorias é na verdade parte da nossa natureza
humana. Mesmo se estamos vendo um certo tipo de pássaro pela primeira vez,
por exemplo, somos capazes de categorizá-lo como pássaro. Já imaginou se
tivéssemos que memorizar cada tipo de pássaro para encaixá-los em uma única
categoria?
Esta representação de modelos mentais do mundo em que vivemos se
chama protótipos, e tem sido estudado pela linguística para entender a relação
entre o léxico e a nossa mente. Assim, quando falamos “carro”, temos uma
imagem mental do que seja um carro, por exemplo. Estes protótipos são uma
mistura de observações que fazemos, crenças culturais, e interpretações
pessoais de nossas experiências.
Mas o que acontece quando algo não se encaixa nos nossos protótipos
mentais, como foi o caso de Susan Boyle?
De acordo com alguns estudos, quando uma pessoa não se encaixa em
nossas preconcebidas noções, nossa tendêcia é primeiro ignorar as
contradições. Se não for possível ignorar (como foi o caso de Susan Boyle), o
que fazemos é considerar a pessoa como uma exceção excepcional à regra.
Desta forma, encontramos uma maneira de fazer com que o mundo continue a
ter sentido para nós.
Na nossa sociedade, mudanças têm ocorrido que nos ensinam a
neutralizar algumas preconcebidas noções. A eleição Lula no Brasil, uma
pessoa que não tem educação formal e é de origem humilde, e a eleição de
Obama nos Estados Unidos, desafiaram o estereótipo negativo do homem negro
americano e do nordestino pobre brasileiro.
Mesmo assim, ainda parece que outros estereótipos continuarão a existir,
e outros podem ainda surgir. Susan Boyle, que fez o mundo repensar seus
preconceitos, acabou aderindo a certos noções de estilo ditados pela nossa
sociedade. Ela passou por uma transformação: tingiu e cortou o cabelo com um
corte moderno, fez as sobrancelhas, trocou os óculos, passou a vestir roupas
modernas e a usar maquiagem. A mudança de sua aparência e estilo nos diz
que fugir dos estereótipos pode ser mais difícil do que se pensa. Mesmo quando
se é cantora e possui uma voz perfeita.

Denise Maria Osborne é mestranda em Lingüística Aplicada na Columbia


University (Nova York) e professora de português como língua estrangeira.
dmdcame@yahoo.com

Artigo originalmente publicado pelo Jornal Clarim (Minas Gerais, Brasil):

Osborne, D. (2010, February 12). Aparêcia conta? Clarim, Ano14, n. 705, p. A2.

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