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Avaliaçã o da funçã o hepá tica


Existem varias provas de função hepática que se usam para:

1. Detectar a presença de doença hepática


2. Diferenciar entre os vários tipos de distúrbios hepáticos
3. Medir a extensão do dano hepático conhecido
4. Acompanhar a resposta ao tratamento

São imperfeitos na medida em que podem ser normais em pessoas com doença hepática grave
e também anormais nas pessoas sadias. Em vez de sugerir o DX específico apontam para uma
categoria geral da doença hepática: hepatocelular ou colestásica: servem para orientar o DX.

As inúmeras funções bioquímicas do fígado são difíceis de medir com as provas da função
hepática, assim poucas são capazes de medir alguma função ou até muito não medem
nenhuma função, como as aminotransferases ou a fosfatase alcalina. Assim em vez de função
detectam lesão celular hepática ou interferência no fluxo biliar.

Não há nenhuma prova específica para medir precisamente a função hepática total.

Para aumentar sensibilidade e especificidade dos testes hepáticos se devem usar em bateria
que inclui a avaliação dos níveis de:

 Bilirrubina
Avaliação da doença hepática 283
 Aminotransferases
 Fosfatase alcalina
 Albumina
 Tempo de protrombina

Quantos mais destes forem anormais, a probabilidade da doença é maior, entretanto, quando
todos estão dentro de limite de normalidade a doença hepática é rara. Estes testes podem
ser agrupados em categorias para melhor compreensão.

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Testes baseados nas funções de desintoxicação e excreção
Bilirrubina sérica
Bilirrubina é um produto de degradação de anel de porfirina das proteínas que contêm heme,
se encontra na sangue em duas fracções: conjugada e não conjugada.

Fracção conjugada Fracção não conjugada


Directa Indirecta
 Hidrossolúvel  Insolúvel em agua
 Excretável pelos rins  Ligada a albumina sérica
 30%  70%
 5,1 µmol/l (0,3 mg/dl)
 11,9 µmol/l (0,7 mg/dl)
Ø <17 µmol/l (1 mg/dl) no teste de Bergh
O seu ↑ implica a doença biliar ou hepática  ↑ nos distúrbios hemolíticos
quase sempre. O que limita a velocidade de o Iniciar a investigação de
metabolismo de bilirrubina não é a sua hemólise
conjugação mas sim o transporte de  ↑ nos distúrbios genéticos:
bilirrubina conjugada para os canalículos o Sd de Krigler-Najjar
biliares. o Sd de Gilbert

Raramente se eleva nas doenças hepáticas


Avaliação da doença hepática 283
Quando se ↑ isoladamente no paciente
previamente sadio investigar a presença de
hemólise e são não detectada se DX a Sd de
Gilbert sem provas adicionais
Na maioria das doenças hepáticas se elevam os dois tipos de bilirrubina.
O fraccionamento de bilirrubina apenas é útil na elevação isolada de bilirrubina não
conjugada.

Bilirrubina urinária
A bilirrubina não-conjugada sempre circula unida a albumina e não se filtra pelo rim,
portanto toda a bilirrubina encontrada na urina é conjugada e a sua presença ali implica a
doença hepática. Um teste urinário com a fita de imersão da quase a mesma informação que
fraccionamento de bilirrubina e é quase 100% exacto. Com o teste Ictotest os fenotiazínicos
podem dar falsos positivos. Nos pacientes que estão no periodo de recuperação da ictericia, as
provas de urina se negativizam antes das provas do soro.

Amónia sanguínea
Produzida durante o metabolismo das proteínas e também pelas bactérias de intestino
(principalmente cólon).

 Fígado: amónia → ureia


 Músculo esquelético: amónia ₊ ácido glutámico → glutamina

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Doença hepática avançada → perda muscular significativa → hiperamonemia

Alguns médicos usam a amónia sanguínea para monitorizar a função de síntese hepática ou
detectar a encefalopatia mas o seu uso é problemático porque há pouca correlação entre o
grau da encefalopatia hepática e o nível de hiperamonemia, contudo se pode usar para
detectar a doença hepática oculta nos pacientes com alteração do estado mental.

A correlação entre a função hepática e o nível de amónio no sangue também é fraca, assim
pode estar ↑ nos pacientes com a hipertensão portal grave e shunt sanguíneo portal extra
hepático mesmo quando a função hepática esteja normal ou quase normal. Os niveis de
amónia se correlacionam com o prognóstico da doença hepática aguda.

Enzimas séricas
O fígado contem milhares de enzimas que estão presentes no sangue em quantidades
mínimas, distribuídas pelo líquido intersticial e plasma, com as meias-vidas curtas. Se sabe
pouco acerca do seu catabolismo mas se acredita que sejam destruídas pelas células do
sistema reticuloendotelial. O aumento de alguma dessas enzimas no soro pode ser o sinal da
sua liberação hepática aumentada a partir das células de fígado lesionadas.

Os testes enzimáticos se agrupam em três categorias:

1. Enzimas cuja elevação indica lesão hepática


2. Enzimas cuja elevação indica colestase
3. Enzimas cuja elevação não indica padrão nenhum
Avaliação da doença hepática 283

Enzimas que reflectem o dano aos hepatócitos


Os aminotransferases (transaminases) são indicadores sensíveis da lesão hepatocelular e são
úteis para DX das doenças hepáticas agudas (hepatite).

Aspartato-aminotransferase (AST) Alanina-aminotransferase (ALT)


 Fígado Principalmente no fígado
 Miocárdio Mais específica para ad doenças de fígado.
 Músculo esquelético
 Rins
 Cérebro
 Pâncreas
 Pulmões
 Leucócitos
 Eritrócitos
Pela ordem de concentração

Lesão da membrana do hepatócito → aumento de permeabilidade → aumento de


concentração no soro (normalmente estão presentes em concentrações reduzidas). A necrose
do hepatócitos não é a condição necessaria para que sejam liberadas ao torrente e a
correlação entre a lesão hepática (necrose) e os níveis de transaminases é fraca, portanto
não são úteis para o prognóstico das doenças agudas.

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Qualquer tipo da lesão hepatocelular pode aumentar modestamente os níveis de
transaminases: níveis até 300 U/l não são específicos e podem ser encontrados em varias
doenças hepáticas, mas se sobrepassam 1000 U/l indicam exclusivamente a lesão extensa:

1. Hepatite viral
2. Lesão hepática isquémica (hipotensão prolongada ou insuficiência cardíaca aguda)
3. Lesão hepática induzida por fármacos

O padrão da elevação também pode ser útil:

ALT ≥ AST Distúrbios hepatocelulares agudos


AST:ALT > 3 Doença hepática alcoólica
AST:ALT > 2
 AST raramente se eleva mais de 300 U/l
 ALT costuma ser normal
 Se ALT é baixa pode resultar da deficiência de fosfato de piridoxal
induzida pelo álcool.

As aminotransferases não se encontram muito elevadas na doença obstrutiva, excepto


quando há uma obstrução aguda causada pela passagem do cálculo pelo ducto coleidoco,
atingindo os níveis altíssimos de 1000-2000 U/l em forma de pico súbito que baixa
rapidamente.

Enzimas que reflectem colestase


Avaliação da doença hepática 283
São três enzimas que costumam estar elevadas:

1. Fosfatase alcalina
2. 5’-nucleotidase
3. ϒ-glutamiltranspeptidase (GGT)

Fosfatase alcalina Membrana canalicular e sinusoidal ↑E


5’-nucleotidase biliar dos hepatócitos
GGT Retículo endoplasmático ↓ E para colestase
Células epiteliais de ductos biliares
Localização mais difusa no fígado
Alguns defendem o uso de GGT para identificar os pacientes que consumem álcool de forma
oculta mas a sua baixa especificidade faz duvidar dessa medida. A actividade de GGT pode
ser induzida pelo álcool e fenitoina.

A fosfatase alcalina engloba muitas isoenzimas encontrados no fígado, ossos, placenta e,


com menor frequencia, no intestino delgado. Pode estar aumentada nos seguintes grupos de
pacientes:

Indivíduos > 60 anos ↑ 1-1,5x


Indivíduos de grupo O ou B ↑ após as refeições abundantes em gordura devido ao
influxo de FA intestinal para o sangue
Crianças e adolescentes ↑ fisiológico por influxo de FA óssea na fase de crescimento
acelerado
Gravidez ↑ fisiológico por influxo de FA placentaria para o sangue

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O ↑FA da origem hepática não é completamente específico de colestase

↑ menor de 3x ↑ maior de 4x
Praticamente todos os tipos de doença 
Distúrbios colestáticos
hepática 
Doenças hepáticas infiltrativas
o Cancro
o Amiloidose
o Distúrbios ósseos por
renovação acelerada da
massa óssea (E. de Paget)
Nos distúrbios ósseos o aumento de FA se deve ao aumento de FA óssea e nos hepáticos ao
aumento de FA hepática

FA costuma elevar-se em colestase tanto intra como estra-hepática

Se a FA se elevar isoladamente numa pessoa aparentemente sadia ou se elevar mais do


esperado para o estado clínico do paciente há que investigar a causa:

1. Fraccionamento de FA por electroforese


2. Determinar a origem a partir do facto que as FAs dos distintos tecidos se inactivam a
temperaturas diferentes: assim o achado de FA com fracção termoestavel sugere a
que a fonte é a placenta ou o tumor. Na susceptibilidade de inactivação pelo calor vai
desde a FA intestinal (pouco sensível a calor) → FA hepática → FA ossea (muito
Avaliação da doença hepática 283
sensível).
3. Determinar os níveis de 5’-nucleotidase ou GGT que raramente se elevam em
doenças não hepáticas (a maneira mais disponível e conhecida)

Causas de elevação de FA hepática num paciente sem icterícia ou aminotransferases elevadas


Frequente Pouco frequente Raro
Colestase incipiente Infiltração hepática pelo  Doença de Hodgkin
tumor ou granulomas  DM
 Hipertiroidismo
 Insuficiencia cardíaca
congestiva
 Amiloidose
 Doença inflamatória
intestinal

Os valores de FA não distinguem as doenças obstrutivas intra- ou extra-hepáticas, assim não


existe a diferença entre os valores na icterícia obstrutiva pelo cancro, cálculo no ducto
colédoco, colangite esclerosante ou estenose de ductos biliares. Assim os valores estão
igualmente elevados em colestase intra-hepática pela hepatite medicamentosa, cirrose biliar
primária, rejeição de fígado transplantado e distúrbios hepatobiliares verificados nos
pacientes com SIDA. Raramente se eleva nos pacientes com esteatonecrose induzida por
álcool.

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Testes que avaliam a função biossintética do fígado
Albumina sérica
Albumina sérica é o marcador da função de sintese do fígado, a sua diminuição é marcador de
mal prognóstico. Costuma estar normal nas doenças agudas.

Se sintetiza apenas nos hepatocitos e tem a meia-vida longa: 18-20 dias, 4% se degradam
diariamente. Devido a alta longevidade não é util para medir as doenças agudas ou leves
como hepatite viral, hepatotoxicidade e ictericia obstructiva. Na hepatite os nives de
albumina < 3 g/dl nos fazer suspeitar uma doença hepática crónica. A hipoalbuminemia é
mais frequente nas doenças crónicas como a cirrose e reflecte o dano hepático grave com a
producção de albumina diminuida. Há que ter em conta que nos pacientes com ascite a
producção pode ser normal ou até aumentada mas nas provas de laboratorio nos dá um valor
inferior devido a aumento de volume de distribuição.

A albumina sérica pode estar diminuida noutras doenças não hepáticas como:

1. Desnutrição proteica de qualquer origem


2. Enteropatias perdedoras de proteinas
3. Síndrome nefrótica
4. Infecções crónicas onde aumentam os niveis de IL-1, FNTα e outras citocinas que
inibem a producção hepática.

Não é prudente medir os niveis de albumina em paciente sem suspeita de doença hepática
Avaliação da doença hepática 283
(num estudo epidemiológico se demonstrou que apesar de ter encontrado albumina sérica
anormal em 12% dos casos, so 0,4% tinham uma doença relevante).

Globulinas séricas
ϒ-globulinas (imunoglobulinas) Linfocitos B ↑ nas doenças
hepáticas crónicas
(hepatite crónica e
cirrose)
Α-globulinas Hepatocitos
Β-globulinas

Na cirrose o fígado não depura antígenos bacterianos que atingem a circulação hepática →
se formam anticorpos contra as bacterias intestinais → aumento de ϒ-globulinas.

DX das doenças hepáticas crónicas pela diferenciação dos isotopos de ϒ-globulinas


IgG Hepatite auto-imune
Suspeitar em aumentos > 100%
IgM Cirrose biliar primaria
IgA Doença hepática alcoolica

Factores de coagulação
Todos são de producção hepática excepto factor VIII. A sua meia-vida é curta (6 h para VII –
5 dias para fibrinogenio). Dessa forma são uteis na avaliação diagnóstica e prognóstica das
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doenças hepáticas parenquimatosas agudas. O aumento prolongado de tempo de
Protrombina > 5 s do normal e não corregido pela administração de vitamia K indica um
prognóstico pobre para a hepatite viral e outras doenças hepaticas agudas ou crónicas. Para
excluir a deficiencia de vitamina K (ocorre na obstrucção biliar) como a causa da alteração do
tempo de protrombina se administra a vitamina K em bolus intravenoso.

Tempo de protrombina Vitamina K


II, V, VII, X II, VII, IX, X
Aumenta em:
 Hepatite
 Cirrose
 Disturbio que levam a deficiencia de
Vitamina K
o Ictericia obstructiva
o Má absorção de lípidos de
qualquer origem

Outros testes diagnósticos


Biopsia hepática percutanea
É um procedimento seguro, se faz com a anastesia local e a beira lo leito. É util em:

1. Doença
Avaliação hepatocelular
da doença hepáticade causa desconhecida 283
2. Hepatite prolongada com a possibilidade de hepatite crónica activa
3. Hepatomegalia inexplicada
4. Esplenomegalia inexplicada
5. Defeitos no enchmento hepático em exames radiológicos
6. Febre de origem desconhecida
7. Estadiamento de linfoma maligno

A biopsia é mais precisa no disturbios hepáticos difusos, dado que nas doenças locais
(metastases hepaticas) pode colher uma mosta na região normal. Não deve ser usada nunca
como o procedimento inicial no DX de colestase: primeiro ver se há obstrucção da arvore
biliar. A relaização da biopsia está contraindicada na ascite significável e nos pacientes com
INR prolongado, nestes casos se pode fazer por via transjugular.

Ultra-sonografia (US)
É a prmeira prova a fazer nos pacientes com suspeita de colestase para buscar a dilatação da
árvore biliar intra ou extra-hepática e buscar os cálculos. Alem disso mostra os processos
expansivos hepáticos, ajuda a diferenciar entre a massa sólida e líquida bem como dirigir a
biopsia.

A US-Doppler detecta a permeabilidade de veia porta, arteria e veias hepáticas bem como
determina a direcção de fluxo sanguineo. É o primeiro exame a ser feito na suspeita da Sd. De
Budd-Chiari.

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Uso de testes hepáticos
Para aumentar a S e E dos testes hepáticos se devem fazer em bateria: transaminases, FA,
bilirrubina, albumina e tempo de protrombina. De acordo com os resultados se pedem outros
exames adicionais. Não necessariamente fornecem o DX mesmo que seja feito uma ampla
gama de testes, as vezes é preciso fazer medições repetidas ao longo de dias a semanas para
que por fim se deteca a padrão da doença.

Avaliação da doença hepática 283

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Padrões dos testes hepáticos nos distúrbios hepatobiliares

Tipo de disturbio Bilirrubina Aminotransferases Fosfatase alcalina Albumina Tempo de protrombina


Hemólise Normal ate 5 mg/dl
Sd. De Gilbert 85% por fracção indireta ↔ ↔ ↔
Sem billirubinuria
Necrose hepatocelular
 ↑ ambas as
aguda
fracções
 Hepatite viral ↔
 Hepatite  Pico geralmente ↔ geralmente
↑ > 500 UI
medicamentosa sucede as ↑ > 5x do normal:

ALT > AST
Hepatotoxinas aminotransferas prognóstico resevado
 Insuficiencia cardiaca es ↔ até 3x a elevação
aguda  Bilirrubinuria normal
Distrubios
↑ < 300 UI
hepatocelulares crónicos ↑ frequentemente
Hepatite alcoolica AST:ALT > 2 sugere ↓ frequentemente Ausencia de correcção
Cirrose  ↑ ambas as hepatite alcoólica ou com Vitamina K
fracções cirrose
Colestases intra e extra-  Bilirrubinuria ↔
hepática ↔ ou ligeiramente ↑ ↑ > 4x da elevação ↔ Se ↑ deve ser
Raramente > 500 UI normal ↓ em casos crónicos corrigida com vitamina
K
Doenças infiltrativas ↑ > 4x da elevação
 Tumores normal
 Granulomas Fraccionar ou
Obstrucção parcial das ↔ ↔ confirmar a origen ↔ ↔
vias biliares hepática com 5’-
nucleotidase ou ϒ-
glutamiltranspeptidase

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