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Álgebra Linear I - Aula 19

1. Bases Ortonormais e Matrizes Ortogonais.

2. Matrizes ortogonais 2 × 2.

3. Rotações em R3 .

Roteiro

1 Bases Ortonormais e Matrizes Ortogonais


1.1 Bases ortogonais
Lembre que uma base β é ortogonal se está formada por vetores ortogonais
entre si: para todo par de vetores distintos u e v da base β se verifica que
u · v = 0.
Uma base γ é ortonormal se é ortogonal e todo vetor da base é um vetor
unitário (ou seja, u · u = 1 para todo vetor de γ).
Como já vimos, calcular as coordenadas de um vetor em uma base or-
togonal é muito simples (mais ainda se a base é ortonormal). Suponha que
estamos em R3 e que β = {u, v, w} é uma base ortonormal. Queremos de-
terminar as coordenadas de um vetor ℓ na base β, ou seja

(ℓ)β = (a, b, c), ℓ = a u + b v + c w.

Para determinar a considere ℓ · u,

ℓ · u = (a u + b v + c w) · u = a (u · u) + b (u · v) + c (u · w).

Observe que, como a base é ortonormal, u · u = 1, u · v = 0 = u · w. Logo

a = ℓ · u.

Analogamente obtemos,

b = ℓ · v, c = ℓ · w.

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Exercı́cio 1. Encontre uma base ortonormal β que contenha dois vetores
paralelos a (1, 1, 1) e (1, −1, 0). Obtida a base β, determine as coordenadas
do vetor (1, 2, 3) em dita base.

Resposta: O terceiro vetor da base deve ser ortogonal a (1, 1, 1) e (1, −1, 0),
portanto, é paralelo a (1, 1, 1) × (1, −1, 0), isto é, paralelo a (1, 1, −2). Uma
possı́vel base β (existem muitas possibilidades) é
√ √ √ √ √ √ √ √
β = {(1/ 3, 1/ 3, 1/ 3), (1/ 2, −1/ 2, 0), (1/ 6, 1/ 6, −2/ 6)}.

As coordenadas de (1, 2, 3) na base β são (a, b, c) onde


√ √ √ √
a = (1, 2, 3) · (1/√ 3, 1/ √
3, 1/ 3) = 6/√ 3,
b = (1, 2, 3) · (1/√2, −1/√ 2, 0) √= −1/ 2, √
c = (1, 2, 3) · (1/ 6, 1/ 6, −2/ 6) = −3/ 6.

Obtemos assim as coordenadas. 

1.2 Matrizes ortogonais


Dada uma matriz quadrada M sua transposta, denotada M t , é uma matriz
cujas linhas são as colunas de M, ou seja, se M = (ai,j ) e M t = (bi,j ) se
verifica bj,i = ai,j .
Definição 1 (Matriz ortogonal). Uma matriz M é ortogonal se é inversı́vel
e M −1 = M t , ou seja,
MM t = M t M = Id.
Observe que se M é ortogonal então sua transposta também é ortogo-
nal (veja que (M t )−1 = M). Portanto, a inversa de uma matriz ortogonal
também é ortogonal.
Propriedade 1.1. O produto de duas matrizes ortogonais é ortogonal.

Prova: Para provar a afirmação, lembre que (AB)t = B t At . Sejam agora


M e N ortogonais, isto é, N N t = Id = M M t . Temos

(M N) (M N)t = M N N t M t = M (N N t ) M t = M M t = Id.

Portanto, o produto M N é ortogonal. 

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Propriedade 1.2. O determinante de uma matriz ortogonal é igual a ±1.

Prova: Para provar a afirmação é suficiente lembrar que M t e M têm o


mesmo determinante e que o determinante da identidade é igual a 1, logo

det(MM t ) = det(M) det(M t ) = det(M)2 = 1.

1.3 Matrizes ortogonais: interpretação geométrica


Propriedade 1.3. Uma matriz ortogonal é uma matriz cujas colunas (ou li-
nhas) formam uma base ortonormal (de fato, isto é uma definição geométrica
alternativa de matriz ortogonal).

Prova: Para simplificar a notação veremos a afirmação para matrizes 2 × 2.


Seja M uma matriz ortogonal cujos vetores coluna são u = (a, b) e v = (c, d).
    
t a b a c aa + bb ac + bd
Id = M M = = =
c d b d ac+ bd cc + dd
   
u·u u·v 1 0
= = .
u·v v·v 0 1

Logo
u · u = v · v = 1, u · v = 0,
e u e v formam uma base ortonormal. 
De fato, o argumento anterior mostra o seguinte:
Propriedade 1.4. Uma matriz é ortogonal se, e somente se, seus vetores
coluna formam uma base ortonormal.
Multiplicando MM t , v. obterá a mesma afirmação para os vetores linha:
Propriedade 1.5. Uma matriz é ortogonal se, e somente se, seus vetores
linha formam uma base ortonormal.
Observação 1. O fato anterior implica que a matriz de uma rotação ou
de um espelhamento (na base canônica) é uma matriz ortogonal. Também
implica que a matriz de uma projeção não é ortogonal (em nenhuma base).

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Veremos que a propriedade anterior implica que:
Propriedade 1.6. Uma matriz ortogonal A conserva ângulos e módulos.

Prova: Como já vimos quando estudamos espelhamentos e rotações, é


suficiente ver que a matriz A conserva o produto escalar. Sejam

v1 = A(1, 0, 0), v2 = A(0, 1, 0) v3 = A(0, 0, 1).

Pela Propriedade 1.3, como A é ortogonal, β = {v1 , v2 , v3 } é uma base orto-


normal.
Considere vetores u = (a, b, c) e v = (d, e, f ), Observe que

A(u) = a v1 + b v2 + c v3 , A(v) = d v1 + e v2 + f v3 .

Usando que v1 · v2 = v1 · v3 = v2 · v3 = 0 e que vi · vi = 1, i = 1, 2, 3, temos


A(u) · A(v) = (a v1 + b v2 + c v3 ) · (d v1 + e v2 + f v3 ) =
= (a d) (v1 · v1 ) + (b e) (v2 · v2 ) + (c f ) (v3 · v3 ) =
= a d + b e + c f = u · v.
Obtemos assim a afirmação. 

Propriedade 1.7 (Autovalores de uma matriz ortogonal). Todo autovalor


real de uma matriz ortogonal A é igual a 1 ou −1. Todo autovalor complexo
de A tem módulo 1.

Prova: A afirmação sobre autovalores reais é obvia: se λ é um autovalor e


u um autovetor associado a A,

|u| = |A(u)| = |λ u| = |λ||u|,

Portanto λ = ±1. Para ver que os autovalores complexos têm módulo igual
a 1 (veremos isto em dimensão dois ou três) usaremos que o determinante de
A é igual ao produto dos autovalores e que números complexos conjugados
têm o mesmo módulo. Observe também que se λ é um autovalor então λ̄
(seu conjugado) também é um autovalor. Portanto,

1 = | det(A)| = |λ| |λ̄| = |λ|2 .

Logo 1 = |λ|. Em dimensão três a prova e idéntica usando que existe um


autovalor real que é igual a ±1. 

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2 Matrizes ortogonais 2 × 2
Seja A uma matriz ortogonal 2 × 2. Existem as seguintes possibilidades para
os autovalores de A:

(a) autovalor 1 (duplo),

(b) autovalor −1 (duplo),

(c) autovalores 1 e −1,

(d) autovalores complexos conjugados de módulo 1 (isto é, da forma cos α±


i sen (α)).

Observe que temos as seguintes propriedades sobre os traços:

(a) autovalor 1 (duplo): traço 2,

(b) autovalor −1 (duplo): traço −2

(c) autovalores 1 e −1: traço 0,

(d) autovalores complexos conjugados: traço diferente de 0 (excluido o caso


em que os autovalores são imaginários puros).

Isto significa que estudando o traço da matriz (excluido um caso, que veremos
a seguir) é possı́vel saber o significado geométrico de transformação ortogonal
em dimensão 2.
Estas matrizes são: (a) a identidade, (b) menos a identidade, (c) um
espelhamento, (d) uma rotação.
Veremos o caso em que a matriz M verifica (c), os casos (a) e (b) são
similares (somente que muito mais simples!). O caso (d) será obtido quase
de graça.
As etapas do caso (c) são as seguintes:

1. Considere u um autovetor associado a 1.

2. Considere v um vetor perpendicular a u. Como M é ortogonal conserva


ângulos, protanto M(v) é perpendicular a u.

3. Como M(v) 6= 0̄, lembre que v 6= 0̄ e que M conserva módulos, temos


que M(v) = σv.

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4. Como os autovalores reais de uma matriz ortogonal são ±1, há duas
possibilidades, σ = 1 ou σ = −1. Por hipótese, ocorre a última possi-
bilidade.

5. Portanto, M tem autovalores 1 e −1 e existe uma base ortogonal de


autovetores de M, no caso {u, v}. Logo M é um espelhamento respeito
a reta de vetor diretor u que contém a origem.

Vejamos rapidamente o caso (d). Observe que como a primeira coluna de


A é um vetor unitário é da forma (cos θ, sen θ) para algum θ. Como o vetor
correspondente à segunda coluna é ortogonal e unitário, há duas possibilida-
des: (sen θ, − cos θ) e (−senθ, cos θ). Portanto há duas possibilidades para a
matriz A
   
cos θ sen θ cos θ −sen θ
A= ou A = .
sen θ − cos θ sen θ cos θ

Observe que a primeira matriz tem traço igual a zero.


Suponha que os autovalores sejam da forma a ± i b, onde a 6= 0. Em tal
caso, a primeira possibilidade pode ser descartada, pois o traço da matriz é
zero. Logo estamos na segunda opção, que já sabemos que representa uma
rotação de ângulo θ no sentido anti-horário.
Portanto, falta o caso em que os autovalores não têm parte real, e o traço
é zero. É simples ver que as únicas possibilidades são
   
0 −1 0 1
A= ou A =
1 0 −1 0

que representam rotações de π/2 e (3π)/2 radianos.

Exemplos 1. A matriz ortogonal


 √ √ 
1/ √2 1/√2
A=
−1/ 2 1/ 2

representa uma rotação de 45 graus. Veja que tem autovalores complexos e


calcule o ângulo de (1, 0) e A(1, 0). De fato, como o traço é diferente de
0 não pode ser um espelhamento, como é diferente de 2 não é a identidade
(bem, isto é obvio!), e como é diferente de −2 não é menos a identidade! Ou
seja, a única opção é uma rotação.

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A matriz ortogonal
 √ √ 
1/√2 1/ √2
A=
1/ 2 −1/ 2

tem determinante −1 e traço zero. Logo, necessariamente, seus autovalores


são 1 e −1. Logo, representa um espelhamento.√ √Para √ determinar a reta de
projeção, lembre que A(1, 0) −(1, 0) = ((1 − 2)/ 2, 1/ 2) é o vetor normal
à dita reta, ou seja um autovetor associado a −1.

3 Rotações em R3
Uma rotação cujo eixo é a reta r que contém a origem e é paralela ao vetor
n = (a, b, c) e ângulo α é uma transformação linear R que verifica:

• R(n) = n,

• para todo vetor u do plano π : ax+by +cz = 0 temos que R(u) pertence
a π e forma α graus com v (dito de outra forma, a restrição de R ao
plano π é uma rotação no plano).

A última afirmação implica que se h e w são vetores do plano π se verifica

h · w = R(h) · R(w).

O mesmo raciocı́nio que fizemos com as rotações de eixos coordenados im-


plicam que R conserva módulos e ângulos. Portanto, R é uma transformação
ortogonal. Mais uma vez, para provar esta afirmação é suficiente ver que R
conserva o produto escalar. Considere dois vetores u e v. Escrevemos

u = n + h, v = m + w,

onde n e m são vetores paralelos ao eixo de rotação e h e w ortogonais ao


eixo (ou seja, do plano π). Temos

u · v = (n + h) · (m + w) = n · m + n · w + h · m + h · w = n · m + h · w.

Também,
R(u) = n + R(h), R(v) = m + R(w),

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onde R(h) e R(w) são ortogonais a n e m. Portanto,

R(u) · R(v) = (n + R(h)) · (m + R(w)) =


= n · m + n · R(w) + R(h) · m + R(v) · R(w) =
= n · m + R(v) · R(w) = n · n + v · w.

Nas próximas aulas veremos que R é semelhante a uma matriz de rotação


em torno ao eixo X da forma
 
1 0 0
A =  0 cos α −sen α  .
0 sen α cos α
Como a matriz A não é diagonalizável (a não ser que α seja 0 ou π), a matriz
R não é diagonalizável (lembre que se R fosse diagonalizável a matriz A
também seria diagonalizável).

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