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Da Fiança

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DA FIANÇA
Sumário: 32.1 – Considerações introdutórias. 32.2 – Conceito.
32.3 – Principais características jurídicas do contrato de fiança.
32.4 – Limitação ou não-limitação da fiança. 32.5 – Fiança
prestada por um dos cônjuges sem o consentimento do outro. 32.6
Da escolha do fiador. 32.7 – Efeitos da fiança. 32.8 – Exoneração
do fiador. 32.9 – Extinção da fiança.

32.1 CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS


“Não se pode responsabilizar o fiador por contrato
renovado em ação de revisão de aluguéis para a qual não fora
intimado, mesmo que tenha se obrigado até a entrega das
chaves, pois o contrato de fiança, por ser benéfico, não admite
interpretação extensiva” (in RT 772/181).

Sendo a fiança forma de garantia do pagamento, é comum, no


Tribunal, a decisão constante da ementa do acórdão destacado, não
respondendo o fiador pelos acréscimos do aluguel, se não foi citado
como litisconsorte na revisional. Aliás, a jurisprudência, de um modo
geral, vem se firmando no sentido de não ser o fiador responsabilizado
por obrigações resultantes de aditamento contratual sem sua anuência.
Considerando que o fiador só responde pelo que declarou expressamente
no instrumento da fiança, não se pode admitir a responsabilidade do

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fiador por encargos locatícios acrescidos ao pactuado originalmente, sem


a sua anuência. Quando houver dúvida, esta será resolvida em favor do
fiador, por isso, o contrato de fiança deve ser interpretado
restritivamente. Confira-se, ainda, o seguinte aresto: “Na ação revisional,
impõe-se a regular citação do fiador para integrar a lide no pólo passivo.
Não tendo o fiador integrado na ação revisional, não pode ser
demandado pelos valores que por ela foram acrescidos ao antes
contratado, sendo, na espécie, de todo irrelevante a previsão de
responsabilização até a entrega das chaves, dessarte, notória a sua
ilegitimidade passiva para a ação que executa título judicial emanado
daquela ação revisora do locativo” (in RT 774/201).

32.2 CONCEITO
Se devo certa quantia a alguém e possuo bens penhoráveis, estes
ficam sujeitos à execução forçada devido ao princípio existente de que o
patrimônio do devedor responde pelo cumprimento de suas obrigações.
Portanto, a responsabilidade do devedor pela sua dívida é de
natureza patrimonial e ninguém pode ser preso por dívida, exceto nos
casos de infidelidade do depositário e de dívida de alimentos.
Como regra geral, é o patrimônio do devedor que constitui a
garantia de que honrará seus compromissos. Essa garantia do
cumprimento da obrigação, contudo, pode ser oferecida, particularmente,
pelo próprio devedor ou por terceiro. Quando o devedor fornece um
bem, móvel ou imóvel, para a própria coisa responder pela obrigação, há
garantia real, que compreende o penhor e a hipoteca. Quando a garantia
é oferecida por terceira pessoa, que se responsabiliza pela dívida, é a
garantia pessoal, chamada fidejussória ou fiança.
A fiança é uma garantia pessoal, ocasião em que o fiador,
terceira pessoa, submete o seu patrimônio penhorável ao
inadimplemento do seu afiançado. Ela resulta do contrato. “Pelo
contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma
obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra” (CC, art.
818).
Fiança, portanto, “é o contrato pelo qual uma pessoa se obriga
por outra, para o seu credor, a satisfazer a obrigação, caso o devedor não

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a cumpra”.276 Esse contrato se realiza entre o fiador e o credor do


afiançado. “O fiador só se torna credor do afiançado – decidiu o Tribunal
– quando efetua o pagamento da dívida por aquele contraída, sub-
rogando então nos direitos do primitivo credor. Até então não detém,
frente ao afiançado, título que exprima obrigação líquida e certa,
requisito legal ao deferimento do arresto” (in RT 767/293).
O que é óbvio, é que todo senhorio, quando aluga seu imóvel,
deseja uma garantia para o recebimento do aluguel. Normalmente,
impõe-se a presença de um fiador. Por isso, é costume impor uma
cláusula inserida no contrato de locação dizendo o seguinte: “Assinam,
também, o presente, como principal pagadores, sem benefício de ordem,
solidariamente com o locatário por todas as obrigações exaradas neste
contrato, na qualidade de fiadores, os Srs...., cuja responsabilidades,
entretanto, perdurarão até a entrega real e efetiva das chaves do prédio
locado”.
A fiança, sendo uma garantia pessoal, o que em verdade garante
a obrigação afiançada é o patrimônio do fiador e não um determinado
bem imóvel ou móvel. Vale dizer, a fiança é uma garantia pessoal ou
fidejussória, porque o devedor não vincula um bem ao pagamento da
dívida, tanto que, se na época da execução da dívida, o fiador não
possuir bem algum, o credor do seu afiançado nada receberá, exceto se o
fiador desejar, espontaneamente, pagar.
Em realidade, o que acontece com a fiança é um reforço de uma
outra obrigação da mesma natureza da originária, surgindo duas
obrigações: a principal, assumida pelo devedor, e a acessória, conhecida
como obrigação fidejussória, contraída pelo fiador (terceiro). A título de
exemplo, oportuno transcrever o seguinte julgado: “Pintura externa e
interna do prédio locado só se exige do inquilino e, pois, dos fiadores, se
demonstrado o mau uso, que não se presume...” (in RT 745/275).
A fiança visa dar maior garantia ao credor, quanto ao
cumprimento da obrigação por parte do devedor. Por essa razão, a fiança
é um contrato de garantia, como é a hipoteca. Esta é um contrato de
garantia real, enquanto a fiança é um contrato de garantia fidejussória ou
pessoal, por não envolver determinados bens.

276
José Lopes de Oliveira, ob. cit., p. 265.

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A pessoa que assume a fiança tem o nome de fiador; aquela a


quem o fiador garante é o afiançado. “A fiança bancária, como toda
fiança, pressupõe três pessoas distintas: o credor, o devedor-afiançado e
o banco-fiador” (in RT 743/222).

32.3 PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS JURÍDICAS


DO CONTRATO DE FIANÇA
O contrato de fiança desenrola-se entre o fiador e o credor do
afiançado e é: unilateral, gratuito, acessório e solene.

a) É unilateral porque gera obrigações somente para o fiador.


b) É gratuito porque o fiador não aufere nenhum benefício; seu
ato é puramente gratuito. Sendo contrato de feição gratuita, deve
sempre ser interpretado estritamente, ou seja, o fiador só
responde pelo que estiver expresso no instrumento de fiança. “A
fiança dar-se-á por escrito, - diz o art. 819 do CC – e não
admite interpretação extensiva”. Por exemplo, o fiador que se
obriga até a entrega das chaves, há de responder não só pelo
aluguel avençado, mas também pelas correções que no curso da
locação forem autorizadas por lei, desde que estejam
convencionadas no respectivo contrato. Caso contrário, não se
obriga, evidentemente, por aumentos, principalmente pelos que
forem ajustados amigavelmente entre credor e o principal
devedor. Nesse diapasão, examine o seguinte julgado: “Nos
termos do art. 1.483 (novo, art. 819) do CC, a fiança deve ser
interpretada de maneira restritiva, razão pela qual é inadmissível
a responsabilidade do fiador nos contratos de locação
prorrogados sem a sua anuência, ainda que exista cláusula
estendendo sua obrigação até a entrega das chaves” (in RT
789/196).
c) É acessório, pois subordina-se à existência de um contrato
principal, ou seja, a fiança não existe sem a obrigação principal.
Como contrato acessório, sua eficácia depende da validade da
obrigação principal, de tal modo que, se a obrigação principal for nula, a
fiança também será. Este fato fundamenta-se no princípio de que o
acessório segue, sempre, o destino do principal. Mas, a recíproca não é
verdadeira, ou seja, a nulidade da fiança não atinge o contrato principal.

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d) É solene porque a fiança só existe por escrito, consoante


mostra o art. 819 acima transcrito.

32.4 LIMITAÇÃO OU NÃO-LIMITAÇÃO DA


FIANÇA
A fiança pode ser limitada ou ilimitada.

a) Limitada – Quando as partes, no contrato, declaram a soma


ou o limite da dívida garantida, a fiança se diz limitada à
fração da dívida indicada; nada mais. Não abrange os
acessórios da obrigação.
b) Ilimitada – Quando as partes no contrato não estabelecem
restrições, a fiança compreenderá todos os acessórios da
dívida principal, abrangendo os juros moratórios, as
indenizações decorrentes pela inexecução da obrigação,
multa, despesas judiciais etc. É o que se extrai da dicção
textual do art. 822 do CC, in verbis: “Não sendo limitada, a
fiança compreenderá todos os acessórios da dívida
principal, inclusive as despesas judiciais, desde a citação do
fiador”.

Dizendo a lei que o fiador responde pelas despesas judiciais


desde a citação, ipso facto, responde por elas quando tiver sido acionado
juntamente com o devedor. A propósito, o Tribunal certa vez decidiu
que, se o locador propõe ação de despejo por falta de pagamento e não
manda notificar o fiador, não terá direito de cobrar deste as custas e os
honorários da ação de despejo, isto porque, se tivesse participado da
ação, poderia o fiador ter evitado a condenação, pagamento a dívida ou
apresentando defesa (in RT 434/2452). Veja, ainda, a seguinte ementa de
acórdão: “Se os fiadores não forem cientificados, na ação de despejo por
falta de pagamento, movida contra o afiançado, não respondem pela
multa contratual” (in RT 460/165).
De outra feita, considerando que a fiança é acessório da
obrigação principal, o fiador não poderá dever mais do que o afiançado
nem ter a sua situação mais onerosa do que a daquele. O art. 823 do CC
dispõe a respeito, dizendo textualmente o seguinte: “A fiança pode ser

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de valor inferior ao da obrigação principal e contraída em condições


menos onerosas, e, quando exceder o valor da dívida, ou for mais
onerosa que ela, não valerá senão até ao limite da obrigação
afiançada”. Exemplificando: Se foi dada uma fiança no valor de R$
10.000,00 e o afiançado pratica um desfalque no valor de R$ 5.000,00, o
fiador será responsável por esta quantia. Se foi dada uma fiança no valor
de R$ 10.000,00 e o afiançado pratica um desfalque no valor de R$
20.000,00, a fiança cingir-se-á a R$ 10.000,00. Portanto, a
responsabilidade do fiador vai até onde ele se responsabilizou, ou seja,
não valerá senão até o limite da obrigação.

32.5 FIANÇA PRESTADA POR UM DOS CÔNJUGES


SEM O CONSENTIMENTO DO OUTRO
Qualquer pessoa, desde que capaz, pode prestar fiança, exceto a
pessoa casada que não poderá fazê-lo sem o consentimento do cônjuge,
qualquer que seja o regime de bens, exceto o da separação absoluta. É o
que se extrai da dicção textual do art. 1.647, III, do CC, in verbis:
“...nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no
regime da separação absoluta:

III – Prestar fiança ou aval”.

Portanto, é vedada a prestação de fiança sem a outorga conjugal.


Não será demais reiterar que, para a sua validade, necessária é essa
outorga. Contudo, o consentimento do cônjuge pode ser suprido
judicialmente na hipótese de recusa injusta, mas não atingirá os bens
próprios desse cônjuge.
O consentimento do cônjuge autorizando a fiança significa que
não há fiança de ambos. Ou seja, um cônjuge afiança e o outro
simplesmente autoriza. Mas os cônjuges podem afiançar em conjunto.
Quando apenas um deles é fiador, somente seus bens podem ser
constrangidos.
Uma indagação: Se a pessoa casada afiançar sem o
consentimento do outro cônjuge, o ato é nulo ou anulável?
Com efeito, dos muitos assuntos considerados abertos à
discussão, e ainda sem uma opinião doutrinária definitiva e aceita por

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todos, estava o da indagação acima. Havia aqueles que entendiam ser


nula a fiança prestado pelo marido sem o consentimento da esposa.
Nesse particular, observava Lauro Laertes de Oliveira: “Hoje,
praticamente sem discrepância, os tribunais proclamam que a fiança
prestada por pessoa casada sem o consentimento do outro cônjuge é nula
integralmente. Não ocorre apenas exclusão da meação do cônjuge que
dissentiu277, mas anulação total do ato”.278 Em abono deste
entendimento, havia o seguinte aresto: “A fiança prestada pelo marido
sem anuência ou outorga uxória279, é absolutamente nula e não
simplesmente anulável, por infração a preceito de natureza cogente
previsto no Código Civil em seu art. 235 (antigo), III, c/c o art. 145
(antigo), IV” (in RT 758/252). Também já decidiu que a “fiança prestada
sem outorga uxória é apenas anulável, não nula, pois o próprio art. 248
(antigo), III, do CC estabelece prazo para a prescrição da ação de que
pode se utilizar a mulher para anular a fiança, o que seria supérfluo se a
lei a julgasse nula” (in RT 752/249).
O Código Civil de 2.002 colocou um ponto final na questão. “A
falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessário (art.
1.647), tornará anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge
pleitear-lhe a anulação, até dois anos depois de terminada a sociedade
conjugal” (art. 1.649). Nesse diapasão, confira o seguinte julgado: “A
falta de outorga uxória acarreta mera anulabilidade de fiança prestada
em contrato de locação, pois se a fiança fosse nula, não podia ser
ratificada ou prescrito o direito de sua anulabilidade” (in RT 803/266).

32.6 DA ESCOLHA DO FIADOR


Quando alguém houver de dar fiador, a aceitação pelo credor,
dependerá das seguintes condições: a) idoneidade moral e financeira; b)
residência no município onde tenha de prestar fiança; c) possuir bens
suficientes para desempenhar a obrigação. É o que se extrai da dicção
textual do art. 825 do CC, in verbis: “Quando alguém houver de
oferecer fiador, o credor não pode ser obrigado a aceitá-lo se não for
pessoa idônea, domiciliada no município onde tenha de prestar a
fiança, e não possua bens suficientes para cumprir a obrigação”.
277
Dissentiu = discordou.
278
Da fiança, Saraiva, São Paulo, 1981, n.16, p. 35.
279
Uxória = da mulher.

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“Se o fiador se tornar insolvente ou incapaz, poderá o credor


exigir que seja substituído” (CC, art. 826).

32.7 EFEITOS DA FIANÇA


Certo indivíduo afiança a importância de R$ 100.000,00 para
uma firma da capital do Estado de São Paulo.
Vencida a dívida e não paga, a Cia. Industrial propõe ação
executiva somente contra o fiador. Poderia ter acionado somente o
devedor ou ambos ao mesmo tempo. Contudo, prefere somente o fiador.
Como a fiança é um contrato benéfico, o legislador procura
proteger o fiador e o faz através do princípio do art. 595 do CPC, que
assim diz: “O fiador, quando executado, poderá nomear à penhora
bens livres e desembargados do devedor. Os bens do fiador ficarão,
porém, sujeitos à execução, se os do devedor forem insuficientes à
satisfação do direito do credor”.
O direito do fiador, de ver penhorados os bens do afiançado
(devedor principal), é chamado de benefício de ordem e, para se valer
desse benefício, deve o fiador nomear à penhora os bens do devedor
principal, no mesmo Município ou Comarca, onde se desenvolve a
execução, desde que livres e desembargados, bem como suficientes. O
parágrafo único do art. 827 do CC dispõe, com muita clareza, a respeito
do assunto em tela, dizendo o seguinte: “O fiador demandado pelo
pagamento da dívida tem direito a exigir, até a contestação da lide, que
sejam primeiro executados os bens do devedor”. Parágrafo único. “O
fiador que alegar o benefício de ordem, a que se refere este artigo, deve
nomear bens do devedor, sitos no mesmo município, livres e
desembargados, quantos bastem para solver o débito”. Sendo
insuficientes os bens nomeados, o fiador completará com os seus, até
que, com aqueles, perfaçam o valor da dívida.
Pode acontecer, no entanto, como geralmente acontece, na
prática, a renúncia expressa ou tácita do benefício da ordem, porque a
fiança é contrato entre fiador e credor; não entre fiador e devedor. O
contrato que inclui cláusula declarando o fiador como principal pagador,
solidariamente responsável com o devedor, é um caso de renúncia tácita,
devidamente prevista pelo art. 828 do CC, in verbis: “Não aproveita este
benefício ao fiador:

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I – se ele o renunciou expressamente;


II – se se obrigou como principal pagador, ou devedor
solidário;
III – se o devedor for insolvente, ou falido”.

Se o fiador se obrigou como principal pagador, a fiança, que tem


normalmente natureza acessória, deixa de ter esse caráter. O mesmo
acontece no caso do devedor solidário, pois consoante princípio previsto
pela primeira parte do art. 275 do CC: “O credor tem direito a exigir e
receber de um ou de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a
dívida comum;...”. A tese encontra ressonância na jurisprudência: “O
fiador não pode argüir o benefício de ordem, previsto no art. 1.491
(novo, art. 827) do CC e no art. 595 do CPC, sustentando que a penhora
deva incidir sobre os bens da devedora se, por ocasião do contrato de
locação, expressamente, renunciou ao mesmo e se obrigou como
principal pagador ou devedor solidário nos termos do art. 1.492 (novo,
art. 828), I e II, do CC” (in RT 765/274).
Renunciando o benefício de ordem que lhe retira a possibilidade
de indicar à penhora os bens do devedor, a fim de evitar a execução dos
seus próprios bens, será parte legítima ad causam e ad processum para
responder à execução pela dívida deixada pelo seu afiançado, mas
poderá requerer o exercício do direito de regresso contra este, após
efetuar o pagamento da dívida, nos próprios autos, consoante permite o
parágrafo único do art. 595 do CPC, in verbis: “O fiador, que pagar a
dívida, poderá executar o afiançado nos autos do mesmo processo”.
Ao se utilizar do exercício do direito de regresso, o fiador terá
direito à indenização por todas as perdas e danos que sofrer em
conseqüência do inadimplemento do afiançado. O art. 832 do CC
esclarece a extensão do direito de regresso: “O devedor responde
também perante o fiador por todas as perdas e danos que este pagar, e
pelos que sofrer em razão da fiança”. “O fiador tem direito aos juros
do desembolso pela taxa estipulada na obrigação principal, e, não
havendo taxa convencionada, aos juros legais de mora” (CC, art. 833).
Bem se está a ver, que o direito regressivo alcança o reembolso
completo de todo o dispêndio que o fiador tenha sofrido.
O fiador tem outros direitos contra o seu afiançado. Por exemplo,
se o credor inicia a execução somente contra o devedor e, sem justa

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causa, começa a retardar o andamento do processo, o fiador que tem


interesse em exonerar-se da responsabilidade assumida, pode dar
prosseguimento no feito, passando a ser parte legítima no mesmo.
Analise o que dispõe o art. 834 do CC: “Quando o credor, sem justa
causa, demorar a execução iniciada contra o devedor, poderá o fiador
promover-lhe o andamento”.
Existem ainda muitas conseqüências derivadas da relação entre
credor e fiador. O fiador pode opor ao credor as exceções que lhe forem
pessoais, alegando incapacidade para ser fiador, nulidade da fiança ou a
existência da novação feita sem o seu consentimento, como vimos no
início deste capítulo. O art. 837 do CC proclama tal princípio: “O fiador
pode opor ao credor as exceções que lhe forem pessoais e as extintivas
da obrigação que competem ao devedor principal, se não provierem
simplesmente de incapacidade pessoal, salvo o caso do mútuo feito a
pessoa menor”.
Assim, se a obrigação principal, por exemplo, está prescrita, paga
ou extinta por qualquer dos casos de extinção (CC, art. 844, § 1.º), o
contrato de fiança também estará extinto. Aliás, a alegação dessa
exceção cabe também ao devedor principal, quando este é acionado pelo
credor.
Se a fiança for dada num mesmo ato por dois ou mais fiadores,
haverá solidariedade entre eles de tal maneira que o credor poderá cobrar
de todos ou de um somente. “A fiança conjuntamente prestada a um só
débito por mais de uma pessoa importa o compromisso de
solidariedade entre elas, se declaradamente não se reservarem o
benefício de divisão” (CC, art. 829).
Os fiadores podem, portanto, evitar a solidariedade, declarando a
reserva do benefício da divisão; com essa declaração cada um
responderá unicamente pela parte que, em proporção, lhe couber no
pagamento. “Cada fiador pode fixar no contrato a parte da dívida que
toma sob sua responsabilidade, caso em que não será por mais
obrigado” (CC, art. 830).

32.8 EXONERAÇÃO DO FIADOR


Exonerar significa desobrigar, liberar-se de uma obrigação ou de
um encargo. Se a fiança é prestada sem limitação de tempo, o fiador tem

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o direito de exonerar-se da obrigação assumida sempre que lhe convier.


O julgado que segue é bem esclarecedor: “Se a locação foi prorrogada
por prazo indeterminado, é admissível a exoneração da fiança, ainda que
o contrato de locação contenha cláusula estabelecendo que a garantia
subsistirá até a restituição efetiva das chaves” (in RT 755/303). É,
enfim, o que se depreende do texto do art. 835 do CC, onde a lei afirma
o seguinte, in verbis:

O fiador poderá exonerar-se da fiança que tiver


assinado sem limitação de tempo, sempre que lhe convier,
ficando obrigado por todos os efeitos da fiança, durante
sessenta dias após a notificação do credor”.

O que se deduz do artigo é que o fiador será responsável por


todos os efeitos da fiança durante sessenta dias após a notificação do
credor. O que se deduz, ainda, é que a exoneração não se dá pela via
judicial. Basta apenas uma notificação ao credor do afiançado e aguardar
sessenta dias.
Outro modo comum de caracterizar a exoneração do fiador é pela
novação objetiva, prevista no art. 360, n. I, do CC, alheio à substituição
da dívida (art. 366 do mesmo diploma). Confira pelo seguinte aresto: “A
fiança é contrato benéfico e não admite interpretação extensiva. Se o
contrato de locação previu que sua prorrogação só se daria por escrito, a
ausência de anuência dos fiadores à prorrogação que se deu
automaticamente, mas não por escrito, exonerou-se da garantia prestada,
pela ocorrência de novação” (in RT 779/283). Ou seja, a majoração do
locativo não prevista em cláusula específica do contrato e a mudança da
periodicidade dos reajustes configuram novação, eis que alteram o seu
conteúdo, afetando, diretamente, o contrato acessório de fiança,
exonerando o fiador da obrigação assumida.
Outro modo também comum de exonerar o fiador é a moratória
concedida pelo credor ao devedor principal, à sua revelia. Essa transação
realizada sem o consentimento do fiador, exonera-o da fiança, nos
precisos termos do art. 838, n. I, do CC: “O fiador, ainda que solidário,
ficará desobrigado:

I – se, sem consentimento seu, o credor conceder moratória


ao devedor”.

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“A transação celebrada com a finalidade de parcelar o débito


locatício – decidiu o tribunal - caracteriza a moratória, desobrigando o
fiador se celebrada sem sua anuência, ex vi do art. 1.503, I, do CC” (in
RT 754/310).

32.9 EXTINÇÃO DA FIANÇA


Extinguir significa deixar de ser válido.
1. Sendo o contrato de fiança acessório, extinguindo o contrato
principal, extingue-se também o da fiança;
2. Morrendo o fiador, a fiança se extingue. A responsabilidade
da fiança vai até a morte; a responsabilidade dos herdeiros não
pode ultrapassar as forças da herança e limita-se ao tempo
decorrido até o dia da morte do fiador. É o que se extrai do art.
836 do CC: “A obrigação do fiador passa aos herdeiros; mas a
responsabilidade da fiança se limita ao tempo decorrido até a
morte do fiador, e não pode ultrapassar as forças da herança”.
3. Própria é a consulta ao art. 838, II, do CC, in verbis:
“O fiador, ainda que solidário, ficará desobrigado: II – se, por
fato do credor, for impossível a sub-rogação nos seus direitos e
preferências”.
Com efeito, o fiador, ao aceitar a fiança, está convicto de poder
exercer os direitos e preferência que possui o credor caso venha a
ser compelido a solver a obrigação. Se o credor, por ato seu,
impossibilita a sub-rogação do fiador nos direitos de garantia que
iria possuir, extingue-se a garantia ou a fiança. O exemplo dado
pela doutrina refere-se a ter o credor, além da fiança, também a
hipoteca prestada pelo devedor. Se o credor abrir mão dessa
hipoteca e o fiador vier a pagar a dívida, não mais terá direito à
hipoteca, representando uma diminuição de garantia contra o seu
afiançado. Se isto acontecer, ficará o fiador desobrigado,
extinguindo-se a fiança;
4. Se o credor, em pagamento da dívida, aceita,
amigavelmente, do devedor principal, objeto diverso do que este
era obrigado a dar, mesmo que depois venha a perdê-lo,
desobriga o fiador dos encargos da fiança (CC, art. 838, III).

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Deu-se, então, a dação em pagamento, que extingue a obrigação


principal e, por conseqüência, a fiança. Posteriormente, caso um
terceiro venha a reivindicar a propriedade do objeto dado em
pagamento e vencer a demanda, não terá o fiador revigorada a
sua responsabilidade, visto que os efeitos da evicção não o
alcançam, explica Levenhagen.280

JURISPRUDÊNCIA

4. “O fiador só se torna credor do afiançado quando efetua o


pagamento da dívida por aquele contraída, sub-rogando então nos direitos
do primitivo credor. Até então não detém, frente ao afiançado, título que
exprima obrigação líquida e certa, requisito legal ao deferimento do
arresto” – RT 767/293. No mesmo sentido: RT 755/281.
5. “Pode o locador, possuidor de contrato escrito, ajuizar
execução fundada em título executivo extrajudicial contra os fiadores que
se comprometeram expressamente a garantir o total cumprimento da
locação, independentemente da cientificação sobre a ação de despejo, pois
esta é movida contra o locatário, tendo como único objetivo a desocupação
do imóvel por parte do inquilino inadimplente” – RT 774/208.
6. “Pintura externa e interna do prédio locado só se exige do
inquilino e, pois, dos fiadores, se demonstrado o mau uso, que não se
presume, implicando exclusão das verbas a esse título orçada, exceto em
relação a paredes riscadas e danificadas por infiltração, estas sim, fruto de
falta de conservação, dever de inquilino” – RT 745/275.
7. “Fiador responde pelo lucro cessante no período em que o
imóvel, por força da produção de prova, não pôde ser locado a terceiro,
verba que corresponde ao aluguel fixado na perícia” – RT 745/275.
8. “A mulher que assina, juntamente com o marido, contrato de
fiança em garantia de locação, não é mera figurante necessária por força
de outorga uxória, mas fiadora solidária, razão pela qual sua obrigação
persiste, mesmo após a morte do cônjuge – RT 759/394.
9. “No contrato de fiança em que a mulher apenas concedeu a
anuência em face da exigência de outorga uxória, e não solidariamente nos
termos do art. 1.493 do CC, ocorrendo a morte do marido, fiador, a
responsabilidade daquela limita-se, apenas, até a data do infortúnio” – RT
756/195.

280
Ob. e vol. cits., p. 225.

391
Das Várias Espécies de Contrato

10. “Sendo a fiança convencionada até a entrega das chaves, tal


estipulação equivale à garantia celebrada sem limitação de tempo, por
prazo indeterminado e incerto, circunstância que autoriza o fiador a
postular sua exoneração com base no art. 1.500 do CC, não obstante o
contrato conter cláusula de irrenunciabilidade” – RT 757/232. No mesmo
sentido: RT 756/274, 755/303, 750/409.
11. “Não tendo o fiador participado de acordo que fixou multa
diária para desocupação do imóvel, por ela não pode ser responsabilizado,
ainda que pactuada e homologada em processo judicial do qual fora
cientificado”- RT 752/165.
12. “A fiança prestada por pessoa jurídica, embora havendo
cláusula expressa no contrato social proibindo a utilização da denominação
social da empresa para negócios estranhos aos objetivos sociais, não pode
ser invocada contra terceiros, restando ao sócio prejudicado voltar-se
contra aquele que deixou de observar a restrição” – RT 750/309.
13. “A renúncia ao direito assegurado no art. 1.500 do CC é
irrelevante àquele que presta fiança a sociedade jurídica em função dos
sócios, podendo exonerar-se a qualquer tempo, quando esses já não
integram mais o quadro social” – RT 749/332.
14. “A majoração do locativo não prevista em cláusula específica e
a mudança da periodicidade dos reajustes configuram novação, eis que
alteram o conteúdo do contrato de locação, afetando, diretamente, o
contrato acessório de fiança. Não se pode falar em obrigação perpétua do
fiador, contra a sua vontade, ainda que o contrato tenha sido firmado por
prazo indeterminado. A novação sem o consentimento do fiador o exonera
da obrigação assumida” – RT 746/194.
15. “O fiador não pode ser responsabilizado por prorrogação do
contrato por prazo determinado de que foi garantidor, se não foi dada a
sua anuência expressa” – RT 808/419.
16. “A fiança, por ser contrato benéfico e gratuito, deve ser
interpretada restritivamente, razão pela qual a prorrogação do contrato de
locação, por tempo indeterminado, sem a anuência do fiador, não pode
obrigá-lo, sendo irrelevante a existência de cláusula prevendo a obrigação
até a efetiva entrega das chaves” – RT 807/216. No mesmo sentido: RT
789/196.
17. “Na execução por título judicial, o fiador só poderá ser
executado se tiver sido citado e condenado na fase de conhecimento, pois
sujeito passivo da execução deve ser o devedor reconhecido como tal no
título executivo (ART. 568, i, do CPC)” – RT 805/314.

392
Da Fiança

18. “É possível a extinção do contrato de fiança em locação se ficar


evidenciado o abuso decorrente de protecionismo da credora em favor de
devedora, em detrimento dos fiadores, pondo termo final nas obrigações
dos fiadores, com a citação, com base no art. 219 do CPC, diante da
inaplicabilidade da regra do art. 1.500 (novo, art. 835) do CC, tendo em
vista não se tratar de mera exoneração, mas sim de infração contratual” –
RT 804/265.
19. “Nos termos dos arts. 591 e 646 do CPC, o devedor responde
com os seus bens presentes e futuros para garantir, patrimonialmente, a
execução, razão pela qual não é possível a indicação à penhora de fiança
bancária, pois trata-se de repasse de garantia de terceiro não contemplada
no rol do art. 655 do Estatuto Processual” – RT 793/282.
20. “Subsiste até a entrega das chaves ou até a imissão na posse do
prédio locado, deferida à locador, em razão do abandono, a
responsabilidade do fiador pelos danos ocasionados no imóvel, em virtude
da obrigação firmada no contrato locatício. A invasão do imóvel locado,
por meliantes que, diante do indigitado insucesso no resultado buscado,
depredam-no, quando já de conhecimento da locadora do seu estado de
abandono, aumentando, ainda mais, os prejuízos decorrentes do mau uso
da propriedade, faz dividir a responsabilidade pelos danos causados, entre
o fiador e a locadora, sob pena de infligir-se a um só valor expressivo,
quando se exige do possuidor indireto seja resguardada a propriedade
contra terceiros” – RT 790/320.
21. “Os fiadores têm legitimidade passiva para a ação de despejo
por falta de pagamento cumulada com a cobrança de aluguéis porque
também podem emendar a mora e, se isto inocorrer, prosseguirá a ação
pela cobrança do locativo, por serem devedores solidários, proporcionando
a agilização da prestação jurisdicional e a preconizada economia
processual. Nada impede a citação dos fiadores obrigados ao pagamento
em virtude da solidariedade voluntária, sendo a cumulação dos pedidos
dirigida apenas ao inquilino” – RT 387/368.
22. “Ainda que se trate de contrato de locação por tempo
determinado, prorrogável apenas por escrito, o não atendimento de tal
condição não tem condão de desonerar o fiador da garantia prestada, se o
garante se comprometeu por tempo indeterminado, desistindo da
faculdade de pedir exoneração da fiança e do benefício de ordem,
assumindo solidariamente com o locatário a obrigação até a efetiva
desocupação do imóvel” – RT 786/329.
23. “Se houve acordo entre locador e locatário para majorar o
aluguel em valores superiores aos reajustes legais, sem intervenção do
fiador, a responsabilidade deste se limita ao que foi pactuado no contrato
original” – RT 780/390.

393
Das Várias Espécies de Contrato

24. “A fiança é contrato benéfico e não admite interpretação


extensiva. Se o contrato de locação previu que sua prorrogação só se daria
por escrito, a ausência da anuência dos fiadores à prorrogação que se deu
automaticamente, mas não por escrito, exonerou-se da garantia prestada,
pela ocorrência de novação” – RT 779/283.
25. “A Lei 8.245/91 não exige que o fiador seja citado para a ação
de despejo por falta de pagamento de aluguel movida contra o seu
afiançado; no entanto, se a demanda for cumulada com cobrança de
aluguéis e acessórios da locação, tem-se o garante como parte legítima para
figurar no pólo passivo da lide” – RT 778/314.
26. “Fiança prestada pela esposa, declarando-se solteira,
inexistente a autorização marital ou a ratificação dela, está eivada de
nulidade relativa, pelo que anulável” – RT 816/260.
27. “A fiança, por ser garantia prestada de forma gratuita, deve
ser interpretada restritivamente, de sorte que não podem ser computados
no cálculo dos valores devidos débitos relativos a conta de telefones não
quitadas, porque não previsto o ônus no contrato assinado pela garante, o
mesmo ocorrendo com o aluguel da garagem, pactuado posteriormente,
por contrato separado, do qual não participou a fiadora” – RT 816/278.
28. “É penhorável o imóvel considerado bem de família por débito
gerado por contrato de fiança (inc. VII do art. 3º da Lei 8.009/90),
independentemente do aspecto socioeconômico do fiador” – RT 816/280.
29. “A inobservância da forma na prorrogação do contrato de lo-
cação acarreta, por conseqüência, a exoneração dos fiadores” – RT 813 /311.
30. “A obrigação decorrente da fiança se restringe ao prazo
determinado no contrato de locação. Dessa forma, não é da
responsabilidade do fiador o adimplemento de débitos referentes ao
período de prorrogação da locação, à qual não anuiu, conforme o disposto
na regra dos arts. 1.003 e 1.006 do CC(de 1916)” – RT 812/167. No mesmo
sentido: RT 810/196.
31. “A fiança prestada sem outorga uxória só produz efeito em
relação à meação de quem aprestou, excluída a de outro cônjuge” – RT
810/284.

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