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DEZ/JAN/FEV - 10/11 - Nº 53 1

Índice Expediente

ENERGIA 5 ECONOMIA 7
Think Tank - A Revista da Livre-Iniciativa
Ano XIV - no 53 - Dez/Jan/Fev - 10/11

CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
Arthur Chagas Diniz
Elcio Anibal de Lucca
Alencar Burti
Paulo de Barros Stewart
Jorge Gerdau Johannpeter
O SETOR DE ENERGIA E O A DESPESA DE PESSOAL E A EXPANSÃO Jorge Wilson Simeira Jacob
GOVERNO DILMA ROUSSEFF DO GASTO PÚBLICO NO BRASIL José Humberto Pires de Araújo
Adriano Pires Raul Velloso Raul Leite Luna
Ricardo Yazbek
Roberto Konder Bornhausen

11 15
Romeu Chap Chap
DESTAQUE MATÉRIA DE CAPA
CONSELHO EDITORIAL
Arthur Chagas Diniz - presidente
Alberto Oliva
Aloísio Teixeira Garcia
Antônio Carlos Porto Gonçalves
Bruno Medeiros
Cândido José Mendes Prunes
Jorge Wilson Simeira Jacob
José Luiz Carvalho
Luiz Alberto Machado
Nelson Lehmann da Silva
A ENERGIA NUCLEAR E A REGULAÇÃO E PARTICIPAÇÃO DO Octavio Amorim Neto
Roberto Fendt
RELAÇÃO BRASIL/IRÃ ESTADO NA ECONOMIA Rodrigo Constantino
Marcos de Azambuja Marcel Solimeo e Ulisses Gamboa William Ling
Og Francisco Leme e
ESPECIAL 22 EDUCAÇÃO 23 Ubiratan Borges de Macedo
(in memoriam)
DIRETOR / EDITOR
Arthur Chagas Diniz
JORNALISTA RESPONSÁVEL
Ligia Filgueiras
RG nº 16158 DRT - Rio, RJ

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SÃO PAULO
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BANCO DE IDÉIAS é uma publicação do Instituto Liberal. É permitida a
reprodução de seu conteúdo editorial, desde que mencionada a fonte.
Leitores
Editorial
Sua opinião é da maior impor-
tância para nós. Escreva para omo de hábito, os articulistas de aposentados e pensionistas se benefi-
Banco de Idéias. C Banco de Idéias são intelectuais ciam da mesma, com impacto do
ou profissionais de prestígio. Em alen- “déficit” previdenciário.
Prezado editor, tado artigo, os economistas Marcel O intelectual e embaixador
Solimeo e Ulisses Gamboa dão con- Marcos de Azambuja examina as
A eleição de Dilma Rousseff, no- ta de que numerosos políticos e ana- relações Brasil e Irã, e as possibilida-
tória esquerdista, com um passado listas consideram que a crise de 2008 des de sua repercussão em um even-
de guerrilheira não sei se trotskista era consequência direta do capitalis- tual programa nuclear no Brasil.
ou marxista, e seu competidor, o mo, quando deixado entregue às suas Azambuja afirma que a adesão do país
deputado José Serra, igualmente de ao Tratado de não Proliferação de
vertente socialista, me trazem à re-
próprias forças, pois as “falhas de
flexão temas que são caros a nós mercado”, quando não corrigidas pela Armas Nucleares se deve ao fato de
Liberais, tais como a liberdade, o ação do Estado, levariam à auto- não termos inimigos potenciais. A
direito de propriedade, a economia destruição do Sistema. Existe farta li- Argentina, terminados os anos de
de mercado, o Estado de Direito e teratura mostrando as imperfeições da governos autoritários, o que levou o
outros correlatos. Não há no país economia de mercado, o que exige Brasil à tentativa de controlar o ciclo
nenhuma corrente que contradiga os “intervenções” do governo para completo com a aquisição das Cen-
avanços que o Estado vêm efetuando corrigir “as falhas” em nome “do in- trais Nucleares de Angra dos Reis,
não apenas em matéria legislativa teresse da sociedade” ou para pro- aventura milionária que nunca se
como em interferências de natureza mover a “justiça social”. Por isso se mostrou eficaz para o que se propu-
econômica e, até mesmo, reesta- discute as falhas de governo que sem- nha. Afastada a motivação (conflito
tizações. Não há mais esperanças? com a Argentina), inexiste no caso bra-
pre provocam mais distorções do que
Maria da Conceição Batista aquelas que pretende corrigir. sileiro a necessidade de aquisição de
São José dos Campos – SP Adriano Pires, especialista em um arsenal nuclear para fazer frente a
energia, faz uma análise prospectiva eventuais inimigos. Restaria ao gover-
das alternativas que o governo Dilma no brasileiro a opção de dominar o
Prezada leitora, Rousseff pode adotar. A partir da cria- ciclo completo de energia nuclear em
ção da estatal Petrosal e do aumento busca de um lugar de maior prestígio
É verdade que os dois concor- de capital efetuado pelo Tesouro Na- entre as nações.
rentes eram de vias francamente so- cional, subscrito com “barris de pe- O Prof. José L. Carvalho avalia a
cialista. Dilma, em especial, tem pa- tróleo futuro” na Petrobras, a União importância da educação, espe-
trocinado questões de viés socia- não apenas aumentou sua participa- cialmente para os países em desen-
listas. O ministro Franklin Martins volvimento. Ela promove o bem- estar
não esconde sua insatisfação com a
ção como controladora como vai
imprensa. O governo Lula tentou, até obrigar a Petrobras a extraordinárias do indivíduo, desenvolvendo suas ha-
o fim, criar um modelo de controle despesas. A transformação da área do bilidades para competir por recursos
social da mídia, tentando carac- pré-sal em monopólio e a suspensão escassos.
terizar a medida como parte de um do regime de concessões para explo- Em NOTAS, examinamos a PEC
elenco de defesa dos direitos ração vai obrigar a estatal a suces- 300 e seus derivativos, propondo um
humanos. Acho que manter a im- sivas capitalizações. Igualmente foi aumento generalizado para os órgãos
prensa livre é a principal batalha que mudado o regime de royalties, com de segurança interna, nomeadamen-
enfrentamos agora, pois qualquer enormes prejuízos financeiros para os te: polícia federal, ferroviária, rodovi-
medida de restrição ao direito de estados do Rio de Janeiro e do Espírito ária, civil, militares e corpo de bom-
informação reduz drasticamente Santo. Prevê-se que a Petrobras de- beiro. A ideia central da PEC é equi-
nosso direito à liberdade, e sem li- parar as remunerações de todo este
berdade não há Estado de Direito.
verá expandir sua participação no setor
A luta, D. Conceição, tem que ser do etanol, estabelecendo parcerias no grupo de servidores. Os congressistas
determinada, porque embora Dilma setor sucroalcooleiro. estão entre duas pressões. É uma me-
afirme que respeita a liberdade de O economista Raul Velloso mos- dida que interfere diretamente nos
imprensa, sua matriz é contrária à tra, com sua habitual precisão, a evo- governos estaduais, obirgando-os a
mesma. Casos como os do Peru, lução das despesas com o pessoal da passar ao governo Federal parte das
Chile e Colômbia nos fazem acre- União. Elas têm crescido sistematica- despesas com o aumento. NOTAS en-
ditar que é possível reverter o qua- mente em ritmo superior ao crescimen- tende que a imposição de um salário-
dro. Mas não é fácil. to do PIB. Tudo se passa como se ti- piso em qualquer mercado de traba-
vesse uma economia de escala às lho discrimina contra os menos quali-
O editor avessas. Velloso questiona, igualmen- ficados por impedir-lhes o acesso ao
te, a remuneração dos servidores pú- emprego.
Envie as suas mensagens para blicos no que diz respeito à política Fecha esta edição a resenha de
a rua Rua Maria Eugênia, 167 - de repassar todos os ganhos reais de- Rodrigo Constantino sobre o livro
Humaitá - Rio de Janeiro - RJ - correntes do crescimento da econo- Sabres e Utopias, trabalho marcado
22261-080, ou ilrj@gbl.com.br. mia. Velloso é manifestamente con- pela coragem e lucidez do escritor
trário a esta política, ainda mais que Mario Vargas Llosa.

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Energia

O setor de energia e o
governo Dilma Rousseff
Adriano Pires
Diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE).

m 31 de outubro de 2010 outro cenário, em que o novo go- Projeto de Lei nº 5.938/2009,
E Dilma Rousseff foi eleita pre- verno poderá influir menos no se- referente ao modelo de partilha
sidente do Brasil e comandará o tor de energia, estimulando a ini- da produção, e com isso o gover-
país pelos próximos quatro anos. ciativa privada e voltando a forta- no e a Petrobras ampliariam for-
A sua eleição poderá implicar a lecer as agências reguladoras. É temente sua influência no setor de
continuidade de políticas implan- sempre bom lembrar que quan- petróleo. Isso, pelo fato de o novo
tadas durante o Governo Lula, do assumiu o Ministério de Minas marco regulatório conceder à
como o fortalecimento da partici- e Energia (MME), em 2003, Petrobras o monopólio da opera-
pação de grandes empresas es- Dilma Rousseff manteve políticas ção nas áreas ainda não licitadas
tatais, notadamente Petrobras e implantadas no Governo Fer- do pré-sal e participação mínima
Eletrobras, na realização de gran- nando Henrique Cardoso para o de 30% em todos os consórcios
des investimentos no setor de ener- setor de energia, como as licita- de exploração. Ainda dentro des-
gia. Nesse caso, ocorreria um ções de campos de petróleo, o se contexto, o Governo Dilma for-
cenário onde as duas estatais se- mercado livre no setor elétrico, taleceria a nova empresa estatal
riam consideradas empresas além de criar os leilões de ener- Petróleo Pré-sal S.A. (PPSA), o que
“Campeãs Nacionais”, realizando gia elétrica. poderia criar conflito de atribui-
vultosos investimentos influencia- No cenário “Campeãs Nacio- ções e enfraquecimento da Agên-
dos inclusive por decisões políti- nais” seria aprovado no Con- cia Nacional de Petróleo, Gás
cas. Porém, não se pode descartar gresso Nacional o atual texto do Natural e Biocombustíveis (ANP).

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Energia

No que se refere à divisão dos trica no Sistema Interligado Na- biocombustíveis, construindo
royalties, a maior beneficiada será cional (SIN). dutos e estabelecendo parcerias
a União, em detrimento dos esta- No refino de petróleo parece com grandes empresas do setor
dos e municípios produtores. Resta que o cenário “Campeãs Nacio- sucroalcooleiro para o forneci-
a dúvida sobre se a nova presi- nais” irá prevalecer, com a Petro- mento de etanol e ampliando a
dente vetará as modificações pro- bras investindo em novas refi- produção própria de biodiesel.
postas pelo congresso referentes narias premium, principalmente No setor elétrico, no cenário
à atual forma de distribuição dos no Norte e no Nordeste. Na hipó- “Campeãs Nacionais” a Eletro-
royalties. O conteúdo nacional tese do cenário mais pragmático bras realizará grandes investi-
poderá virar reserva de mercado a Petrobras exportaria petróleo mentos influenciados por questões
e, com isso, será a indústria na- bruto, concentrando seus investi- políticas, assim como ocorreu na
cional que ditará o ritmo de ex- decisão de construir a usina
tração do petróleo do pré-sal. hidroelétrica (UHE) Belo Monte, no
Num cenário de cunho mais
pragmático, a iniciativa privada
poderá continuar a ter grande
“ Outra questão a
ser definida no Governo
Pará. No Brasil a empresa pode-
rá construir novas grandes UHE
na Amazônia, como o Complexo
participação nos investimentos em Dilma é a regulamen- Tapajós, que terá potência total de
parceria ou não com a Petrobras, tação da Lei do 10.700 MW distribuídos entre cin-
o que poderá estimular a eficiên- Gás Natural, que foi co usinas. Ainda dentro desse ce-
cia operacional no setor petrolí- nário, o chamado desenvol-
fero brasileiro, diminuir custos ao sancionada pelo vimentismo não se preocupará
longo de toda a cadeia de produ- presidente Lula em 4 de muito com os impactos ambien-
ção e favorecer a inovação março de 2009 e dispõe tais dos empreendimentos da
tecnológica do setor, o que é um Amazônia. No exterior, a Eletro-
fator fundamental para o aprovei-
sobre as atividades bras poderá participar de novos
tamento das reservas da Camada relativas ao transporte projetos de integração elétrica
do Pré-sal. Para que isso ocorra de gás natural, bem com a América do Sul, com a
de forma mais efetiva, seria como sobre as ativida- construção de usinas hidro-
retirado do modelo de partilha o elétricas no Peru, na Colômbia, na
monopólio da Petrobras na ope-
des de tratamento, Argentina e na Bolívia, dentro da
ração dos campos do pré-sal não processamento, esto- ideia de se tornar uma nova
licitados, bem como os 30% de cagem, liquefação, Petrobras no setor elétrico.
participação mínima da estatal. regaseificação e No cenário mais pragmático
Outra questão a ser definida existiria uma maior preocupação
comercialização do


no Governo Dilma é a regulamen- com a governança das estatais,
tação da Lei do Gás Natural, que energético. tentando blindá-las de uma maior
foi sancionada pelo presidente ingerência política, e a questão da
Lula em 4 de março de 2009 e reforma tributária no setor elétrico
dispõe sobre as atividades relati- mentos no pré-sal e menos em teria maiores chances de ser
vas ao transporte de gás natural, construção de novas refinarias. implementada pelo congresso e
bem como sobre as atividades de Com relação à política de pre- pelo governo.
tratamento, processamento, esto- ços dos derivados, a Petrobras Nos próximos quatro anos com
cagem, liquefação, regaseificação possivelmente manterá o atual certeza serão introduzidas medidas
e comercialização do energético. controle em qualquer dos dois no setor de energia que constam tan-
O adiamento dessa regulamenta- cenários. Do ponto de vista to do cenário “Campeãs Nacionais”
ção vai ao encontro do cenário ambiental poderá ocorrer uma como do pragmático. Uma ingerên-
das “Campeãs Nacionais”. Caso nova tributação dos combustíveis cia maior do Estado no setor é o
o novo governo regulamente a Lei que considerasse suas emissões mais provável, a dúvida é o grau de
do Gás rapidamente, poderá es- de carbono. Isso aumentaria a intensidade. Porém, com certeza não
timular a formação de mercados competitividade do etanol e do ocorrerá nenhuma ruptura radical
para o gás natural diante do au- biodiesel em relação a combustí- nas políticas estabelecidas para o
mento da produção com a explo- veis fósseis, como a gasolina e o setor de energia brasileiro. Vamos
ração da Camada Pré-sal, como diesel. No cenário “Campeãs torcer para que o cenário prag-
a ampliação do uso do ener- Nacionais” a Petrobras deverá mático prevaleça sobre o “Cam-
gético na geração de energia elé- expandir sua atuação no setor de peãs Nacionais”. A conferir.

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Economia

A despesa de pessoal e a expansão


do gasto público no Brasil
Raul Velloso
Economista. PH.D. em economia pela Yale University.

esde 2003 a despesa de Para 2010 a previsão feita no Cabe, realmente, medir a des-
D pessoal da União tem cres- primeiro semestre foi de uma pesa de pessoal em relação ao
cido sistematicamente em ritmo pequena queda da despesa em PIB? Afinal, as necessidades do
superior ao do PIB. O Gráfico 1 proporção do PIB. Mas esta não País, em termos de serviços pú-
mostra que a despesa pulou de chega a ser uma boa notícia, blicos, crescem no mesmo ritmo
4,81%, em 2008, para 5,32% do porque decorre do forte cresci- do PIB? Não haveria economias
PIB em 2009! O valor de 2009 mento do PIB (e não da contenção de escala que permitiriam que o
só é inferior ao de 1995, ocasião da folha) e porque parte do número de servidores crescesse
em que, com a súbita parada do crescimento do PIB se refere à mais lentamente que o PIB?
processo inflacionário, os salários aceleração da inflação prevista, e Quanto à remuneração, será
dos servidores, recém-reajusta- não a crescimento real da obrigatório repassar aos servi-
dos, tiveram forte ganho real. economia. dores públicos todos os ganhos
reais decorrentes do crescimento
da economia? Acredita-se que
não. A tendência natural é de que
a despesa de pessoal do Governo
Federal caia como proporção do
PIB ao longo dos anos, ao con-
trário do que mostra o Gráfico 1.
Vale a pena, então, analisar o
crescimento real da despesa de
pessoal (ou seja, o crescimento
acima da inflação). Em valores de
2010, a despesa terá passado,
pela estimativa usada nesta nota,
de R$101 bilhões em 1995 para
R$184 bilhões em 2010: um
crescimento real de 82%. Note-
se que somente no período 2003-
2010 o crescimento real é de 62%,
o que equivale a 7,1% ao ano.

DEZ/JAN/FEV - 10/11 - Nº 53 7
Economia

E essa despesa é muito rígida para porque se deve ter um cuidado maior liberdade de gastos dos
baixo: o único ano em que se ob- “cirúrgico” na definição de salá- Poderes autônomos (Judiciário,
serva queda significativa da despesa rios e contratações no setor Legislativo e Ministério Público),
real foi o de 2003, ocasião em que público, visto que decisões to- bem como considerações sobre
um surto inflacionário corroeu o madas hoje terão impacto nas a inexistência de conexão entre
valor real das remunerações. contas públicas pelos próximos 40 o aumento do custo da folha e
Eis o ponto central da preo- ou 50 anos. uma efetiva melhoria ou am-
cupação com a despesa de pes- Outro ponto fundamental é pliação dos serviços públicos
soal: a sua rigidez. Não é possível que não se pode conter a ex- federais.
cortá-la de uma hora para outra, pansão do gasto público no Brasil
seja pela estabilidade da maior sem controlar a despesa com O MARCO LEGAL DE
parte dos servidores no emprego, pessoal. Essa despesa representa CONTROLE VIGENTE
seja pelo custo político de se uma fatia importante do gasto
demitir os não estáveis. O ajuste corrente total nos três níveis de O art. 169 da Constituição
por meio da depreciação do governo. A Tabela 1 mostra que Federal estipula que uma lei
salário real enfrenta a resistência nada menos do que 25% da complementar deve fixar o limite
dos fortes sindicatos de servidores, despesa corrente da União se máximo para a despesa de
além de ser um mecanismo de referem à folha de pagamentos. pessoal nos três níveis de governo
ajuste ineficiente (por ser um corte Nos estados e municípios a fatia (essa lei veio a ser a LRF). A
linear de salários, sem considerar é ainda maior, chegando a quase penalidade para o não cum-
a produtividade e a importância 60% nos estados. primento de tal limite é a sus-
de diferentes carreiras). Em várias edições do Fórum pensão “de todos os repasses de
A inércia da despesa de pes- Nacional (www.inae.org.br) verbas federais ou estaduais”.
soal é reforçada pelos parâmetros podem ser encontradas críticas à A LRF1 fixou limites máximos de
do regime previdenciário do setor política de pessoal dos últimos despesa de pessoal para cada ente
público, que permitem aposen- governos, considerações acerca da Federação (União, estados, DF
tadoria com salário integral e da dinâmica de crescimento e municípios). Criaram-se subli-
pensões de longa duração. Daí dos salários reais baseada na mites, em cada ente, para seus
Poderes e órgãos (Executivo,
Legislativo + Tribunal de Contas,
Gráfico 1: Despesa de pessoal da União com contribuição
Judiciário, Ministério Público).
patronal: 1995-2010 (% do PIB)
Para que um ente seja consi-
derado cumpridor do limite não
basta que a despesa total de todos
os Poderes e órgãos esteja dentro
do limite. Cada um dos sublimites
precisa ser respeitado.
As penalidades, em caso de
descumprimento, são:
• suspensão das transferências
voluntárias (federais ou
estaduais);
• proibição de obter garantia
(federal ou estadual) para
empréstimos;
• proibição de contratação de
empréstimos.
Note-se que a essas pena-
lidades se agrega aquela do art.
169, e que é ainda mais ampla
que a simples suspensão de trans-
ferências voluntárias: suspensão
Fontes: Ministérios da Fazenda, Planejamento e Sistema Siga Brasil, do Senado Federal. “de todos os repasses de verbas
federais ou estaduais”.
1
Arts. 18 a 23.

DEZ/JAN/FEV - 10/11 - Nº 53 8
Economia

Tabela 1: Despesa de pessoal e demais despesas correntes nos três níveis de governo: 2007
(% da receita corrente total)

Pessoal Outras despesas correntes

União 25% 75%

Estados 58% 42%

Municípios 42% 58%

Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional (http://www.tesouro.fazenda.gov.br/estatistica/est_estados.asp. Elaboração própria.


Obs.: não se incluem na despesa corrente as transferências obrigatórias da União para estados e municípios e dos estados para os municípios.

A Lei nº 9.496/97 e a MP nº limite (tribunais de contas e mi- era a de que cada Poder e órgão
2.185-35/2001, ao autorizarem nistério público) são diretamente de cada ente só poderia ter
que a União assumisse e rene- afetados por eles, o que induz um aumento real de 1,5% ao ano na
gociasse parte substancial das incentivo ao relaxamento da sua folha de pagamentos.
dívidas de estados e municípios, fiscalização. Não obstante isso, a A ideia, a princípio, parecia
estabeleceu alguns parâmetros de LRF tem se constituído importante boa. Limitando-se a despesa de
ajuste fiscal para esses entes. No balizadora de desempenho fiscal. pessoal restariam mais recursos
que diz respeito à despesa de Os contratos de renegociação para financiar os investimentos
pessoal tem-se, em primeiro lugar, da dívida de estados e municípios do PAC.
que o estado ou município deve parecem ser muito mais eficazes Na prática, contudo, se apro-
cumprir metas para essa despesa na imposição de disciplina fiscal. vado, provavelmente o dispositivo
(fixadas caso a caso), no âmbito Primeiro, porque qualquer ina- seria letra morta. Em primeiro
de um “Programa de Reestru- dimplência dá ao Tesouro Na- lugar porque não previa punições
turação e Ajuste Fiscal”. O des- cional o direito de sacar, imediata (apenas apontava os mecanismos
cumprimento resulta em elevação e diretamente, o valor devido da de ajustamento em caso de extra-
do custo financeiro da dívida conta do ente inadimplente. Se- polação do limite: não criação de
renegociada e na aceleração da gundo, porque o descumprimento novos cargos, proibição de refor-
sua amortização (aumento da das metas fiscais implica aumento mulação de planos de carreira,
parcela da receita comprometida da taxa de juros do contrato e, etc.). Mas não havia punições
com o pagamento mensal da principalmente, o imediato au- imediatas, como a proibição de
dívida). mento do desembolso mensal receber transferências ou de
No que diz respeito à efetivi- para pagamento da dívida. contratar operações de crédito.
dade prática desses dispositivos Em segundo lugar, sempre há
pode-se dizer, em resumo, que os DESPESAS DE PESSOAL a válvula de escape da conta-
tetos legais impostos (art. 169 da bilidade criativa, nos moldes do
CF e LRF) são parcialmente efe- No início de 2007, quando do que alguns estados e municípios
tivos. Isso porque há manobras lançamento do Programa de já praticam para driblar os limites
contábeis para “esconder” des- Aceleração do Crescimento, o da LRF, algumas vezes com a
pesas de pessoal, tais como não Poder Executivo Federal enviou ao benção do respectivo tribunal de
contabilizar a despesa com ina- Congresso o Projeto de Lei Com- contas. Poder-se-ia aumentar a
tivos e pensionistas ou a despesa plementar nº 1, de 2007 (PLP 1/ remuneração dos servidores por
com serviços terceirizados, con- 2007), cujo objetivo era alterar a meio de pagamentos não classifi-
trariando o que dispõe a LRF. Além LRF com vistas a colocar um limite cados como despesa de pessoal
disso, os órgãos responsáveis pela máximo ao crescimento da des- (vale-refeição, diárias, etc.), ou
fiscalização do cumprimento do pesa de pessoal. A regra proposta aumentar o efetivo contratando via

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Economia

terceirização (e, em desrespeito à O que se conclui, portanto, é crescimento do PIB, mesmo nos
LRF, não a contabilizando como que o Poder Executivo Federal e anos de forte crescimento da
despesa de pessoal). Outra opção sua bancada majoritária na economia. Dada a rigidez desse
seria a exclusão do pagamento a Câmara têm atuado no sentido de tipo de despesa, provavelmente se
aposentados e pensionistas da fragilizar os controles institucionais estão criando problemas para os
conta de despesa de pessoal. da despesa de pessoal, seja impe- próximos dois ou três Presidentes
Não bastasse o provável fra- dindo a aprovação de medidas da República.
casso do limite de despesa de pes- que poderiam ser restritivas (ainda Mostrou-se, também, que no
soal, caso fosse aprovado, a que provavelmente inócuas e campo da regulação da despesa
realidade foi ainda mais dura com apresentadas “para inglês ver”), de pessoal o Governo Federal está
o PLP nº 1/2007. A Câmara sim- seja aprovando rapidamente agindo no sentido de desmontar
plesmente travou a tramitação do medidas que desmontam peças a atual estrutura de controle sem
projeto, com a interposição de colocar outra em seu lugar. Ao
inúmeros recursos por parte de mesmo tempo em que apresenta
deputados, convocação de au- propostas de controle de im-
diências públicas e não apre-
sentação de relatórios por parte
dos relatores.
“fundamental
Outro ponto
é
provável eficácia, e ainda menos
provável aprovação no Con-
gresso, o Governo viabiliza, por
A proposta ressurgiu sob a que não se pode meio de sua liderança na Câ-
forma de Projeto de Lei aprovado mara, a aprovação de projeto que
no Senado e encaminhado à conter a expansão desmonta os limites e as res-
Câmara (PLP nº 549/2009). do gasto público pectivas punições para o excesso
Agora o limite passava para um de despesa de pessoal. Vai ainda
crescimento real da folha de 2,5% no Brasil sem mais longe ao facilitar a contra-
ao ano (em vez de 1,5% do pro- controlar a despesa tação de empréstimos por entes
jeto anterior) acima da inflação públicos que estejam descum-
ou igual à variação do PIB, o que com pessoal. Essa prindo os limites de despesa de
fosse menor. despesa representa pessoal e outros limites impostos
Continuavam os mesmo de- pela LRF.
feitos básicos: inexistência de uma fatia Seja no aspecto fiscal, seja no
punições e alta probabilidade de importante do aspecto de planejamento, metas
a regra tornar-se letra morta. gasto corrente e gerenciamento, a política de
Acrescia-se um defeito adicional: pessoal, por seu impacto finan-
total nos três

em caso de recessão, a folha de ceiro e na qualidade dos serviços
pessoal teria que encolher em níveis de governo. públicos, precisa de uma atenção
termos reais – um limite ainda maior na gestão governamental.
mais difícil de ser atingido. Não serão limites de gastos
Embora aprovado no Senado genéricos que conterão essa
(onde foi apresentado em fins de despesa. É preciso um diagnóstico
2007 pela bancada governista, centrais da LRF no que diz respeito do tipo de força de trabalho
na tentativa de demonstrar dis- ao controle da despesa de pessoal necessária, uma política de
posição em controlar gastos, no e às punições associadas ao seu remuneração compatível com a
contexto de debate acerca da descumprimento. remuneração do setor privado,
renovação da CPMF), a sorte de uma hierarquização das carreiras
tal projeto, na Câmara, dificil- CONCLUSÕES em conformidade com sua rele-
mente será diferente daquela vância e a criação de estímulos
reservada a seu congênere: os A política de pessoal do Go- à produtividade e à ascensão
anais da Casa já registram forte verno Federal, nos últimos anos, funcional, entre outras provi-
resistência à matéria e dificuldade parece ter adotado uma postura dências de nível administrativo
em fazê-la tramitar. temerária no que diz respeito a e gerencial, muito mais tra-
Não há, portanto, que se seu impacto fiscal. A forte ele- balhosas (porém mais eficazes)
esperar que o controle da folha vação de salários e contratações do que a simples fixação de um
de pagamento decorra desse tipo tem levado a uma evolução da (inexequível) limite máximo de
de medida. despesa em ritmo superior ao do despesas.

DEZ/JAN/FEV - 10/11 - Nº 53 10
Destaque

A energia nuclear e a relação Brasil/Irã


Marcos de Azambuja
Embaixador. Vice-presidente do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI)

fato de o Brasil não ter armas


O nucleares se deve a um
conjunto de circunstâncias que
talvez convenha, desde logo, listar.
Em primeiro lugar faltaram
sempre ao Brasil os alvos para as
armas que viesse a desenvolver. O
outro lado da medalha é que
também não temíamos ações
agressivas de reais ou potenciais
adversários. Mesmo a rivalidade
com a Argentina nunca foi tão
intensa a ponto de permitir que
se criassem, com credibilidade,
cenários em que os dois países
pudessem chegar a um enfren-
tamento com armas nucleares ou
precisassem de um arsenal
nuclear para dissuadir o outro de
realizar um tal ataque.
O resto da América Latina foi,
formal e gradualmente, se des-
nuclearizando desde a entrada em
vigor do Tratado de Tlatelolco e
com a adesão progressiva dos
Os presidentes Lula e Ahmadinejad: relações protocolares?
países do continente ao Tratado
de Não Proliferação de Armas
Nucleares (TNP). Hoje é universal Hemisfério Sul do nosso planeta da energia nuclear e nas diversas
na região a adesão a esses dois está livre de armas nucleares. atividades correlatas e comple-
instrumentos. Assim, o Tratado da Antártica mentares ao projeto de desenvol-
Desde a chamada crise dos estabeleceu a desnuclearização vimento de uma arma nuclear, e
mísseis em l96l, envolvendo daquele grande e frágil con- que o chamado “programa nu-
diretamente os Estados Unidos e tinente; o Tratado de Rarotonga, clear paralelo”, expressão que
a então União Soviética e a desnuclearização militar da encobria um programa sigiloso
aparecendo Cuba como o ter- África; o Tratado de Pelindaba, a para fins militares, havia feito
ceiro ator, a América Latina tinha desnuclearização da Oceania e pouco progresso e tinha depen-
deixado de ser o cenário de do Pacífico Sul. Não tínhamos dido, em não pequena medida, da
enfrentamentos estratégicos de nem temos, assim, seja no nosso aquisição sub-reptícia no mer-
extrema gravidade e voltado a ser entorno imediato, seja em todas cado clandestino internacional de
uma região que oferecia baixo as mais próximas projeções de peças e equipamentos e do de-
risco para a segurança inter- nossa geografia e dos nossos senvolvimento autóctone de algu-
nacional, situação que mesmo o interesses imediatos nenhum mas tecnologias de eficiência
episódio aleatório da Guerra das inimigo a temer. imperfeitamente provada.
Malvinas não conseguiu alterar. Cabe destacar, ainda, que o O Acordo Nuclear com a
Além das condições regionais Brasil não dispunha nas décadas Alemanha de 1975 foi uma
de segurança e confiança recí- de 50, 60 e 70 de uma ampla aventura muito dispendiosa e – no
procas, vale assinalar que não só comunidade científica verda- fim das contas – malograda em
a America Latina como todo o deiramente qualificada no campo seu objetivo principal, que era o

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de garantir para o Brasil o do- (AIEA), criassem a ABACC (Agên- internacional, a promoção dos
mínio sobre o ciclo completo de cia Brasileiro-Argentina de usos pacíficos da energia nuclear
combustível nuclear. Optou-se por Contabilidade e Controle) e ade- e, naturalmente, a própria não
uma tecnologia alternativa de rissem, finalmente, ao TNP. proliferação das armas nucleares,
enriquecimento (o método cha- Completava-se, assim, a rede título e objetivo central do Tratado.
mado jet nozzle), que naquela de garantias que o Brasil dava à É verdade que as potências
ocasião e desde então nunca se comunidade internacional de que militarmente nuclearizadas não
mostrou eficaz para o fim a que seus objetivos nucleares eram têm cumprido, até agora, de
se propunha. Gastou-se muito exclusivamente pacíficos, como forma convincente seu com-
dinheiro, e os resultados foram determina o artigo 20 da Cons- promisso com o desarmamento
minguados. tituição Federal e como também nuclear. Com a chegada de
Com o fim do ciclo de governos estamos obrigados por nossa Barack Obama ao poder existem
autoritários o Brasil iniciou, com assinatura e ratificação do já sinais de que o processo de
a Argentina – que vivia também mencionado Tratado de Tlatelolco, redução dos estoques nucleares
um momento semelhante de que estabelece a desnuclearização dos Estados Unidos e da Rússia
redemocratização – um processo para fins militares da América (nesses dois países estão hoje
de desmonte dos programas Latina. mais de 90% de todas as armas
paralelos que se haviam montado Se, por um lado, o compro- nucleares existentes) foi retomado,
nos dois países e por causa dos misso brasileiro com o não desen- e acredita-se que as grandes
quais tivemos, durante largo volvimento, aquisição ou uso de potências tradicionais não iden-
período, o pior dos dois mundos: armas nucleares é claro e ex- tificam mais utilidade estratégica
não nos tornamos potências presso em mais de um diploma prioritária para suas políticas de
militarmente nucleares e atraímos jurídico nacional e internacional, acumulação de armas nucleares
uma grande e onerosa descon- não é menos enfático e límpido e de seus vetores de lançamento,
fiança internacional sobre a nosso compromisso com o pleno e preocupam-se com a guarda de
transparência de nossas verda- desenvolvimento e emprego das grandes estoques de plutônio e se
deiras intenções. tecnologias nucleares para fins inclinam agora por avançar em
Esse desmonte iria levar a que pacíficos. um demorado processo nego-
os dois países, através de um O próprio TNP se assenta em ciador à sua conclusão última:
sistema intenso de consultas um tripé de objetivos equilibrados um mundo final e definitivamente
bilaterais e por um processo que e que devem ser cumpridos pelas livre de armas nucleares.
envolveu também a Agência altas partes contratantes: o de- A mais recente conferência de
Internacional de Energia Atômica sarmamento sob eficaz controle revisão do TNP, realizada em

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2010, produziu um promissor pleitear mesmo um assento per- alteraram os termos da equação.
documento final e superou o manente no Conselho de Segu- O primeiro foi a criação do
impasse que havia levado a rança das Nações Unidas. Protocolo Adicional ao TNP, que
Conferência anterior, realizada em Essa observação se aplica, autoriza inspeções mais intrusivas
2005, a concluir seus trabalhos essencialmente, ao que aconteceu a todas as instalações nucleares
sem poder aprovar um parágrafo com os primeiros membros do de um país, inclusive aquelas que
sequer do que seria seu clube nuclear. Os atores che- não estão sujeitas a salvaguardas
documento final. gados mais tarde não tiveram o da AIEA. O segundo fato novo foi
Um novo governo norte-ame- mesmo reforço de prestígio. A a evolução do programa nuclear
ricano e as preocupações cres- Índia e o Paquistão, por exemplo, iraniano, que – como indiquei
centes com os programas nu- não tiveram a rigor elevada sua acima – é cercado de conside-
cleares do Irã e da Coreia do inserção internacional. Israel, ao rável suspeição internacional e já
Norte, e a percepção cada vez foi objeto de mais de uma rodada
mais urgente de que armas de sanções do Conselho de
nucleares poderiam cair em mãos Segurança, além de outras

“asSão
de atores não governamentais ou adotadas por grupos de países
mesmo grupos terroristas, deu legítimas afins, como é o caso da União
Europeia e dos Estados Unidos e
um novo impulso à necessidade
de tornar o mundo mais seguro e
críticas que se Israel.
mais eficazmente desarmado. A fazem ao TNP. A questão do protocolo adi-
mais clara manifestação dessa cional reacendeu no Brasil um
nova atitude é o chamado Ele, de fato, não debate que parecia encerrado, e
o país reluta em dar um novo
programa “Global Zero” que,
como o próprio nome indica,
é um modelo de passo e subscrever o referido
pretende livrar o mundo das um instrumento protocolo adicional. Com esse
armas nucleares no espaço de debate voltou a questão da
uma ou duas gerações. paritário de assimetria que o TNP cria entre
potências nucleares e não
O que faz esse projeto
especialmente interessante é que
aplicação universal. nucleares, cabendo aos desar-
seus principais promotores são Suas falhas e mados controles e restrições
grandes personalidades da vida crescentes e pouco ou nada se
política dos Estados Unidos e de limites são cobrando dos países já militar-
seus principais aliados no Atlân-
tico Norte, e que a mesma ini-
ciativa encontra também resso-
visíveis.
” mente nuclearizados.
São legítimas as críticas que
se fazem ao TNP. Ele, de fato, não
é um modelo de um instrumento
nância favorável na Rússia de
Putin e Medvedev. paritário de aplicação universal.
Afastada a motivação, inexiste se armar nuclearmente, reforçou Suas falhas e limites são visíveis.
no caso brasileiro – de aquisição a desconfiança de seus vizinhos e É, contudo, e importa repetir isso
de um arsenal nuclear para fazer empurrou vários deles (mais sempre, um instrumento até hoje
frente a eventuais inimigos – e recentemente o Irã) a procurar se indispensável para conter uma
motivação que pode ser invocada dotar de arsenais equivalentes. proliferação descontrolada das
para a aquisição dessas armas A Coreia do Norte é mais do mais perigosas armas que o
é a do prestígio internacional que nunca um rogue state, ou mundo até hoje conheceu. Se o
acrescido e do aumento da seja, um Estado-pária por causa, TNP não existisse o mundo seria
autoestima nacional que deriva da em parte, de sua política nuclear; bem mais instável e, seguramente,
posse desse tipo de arsenal. o Irã, cujas intenções parecem mais perigoso.
O argumento contém mais do cada vez mais suspeitas, deve A questão iraniana é bem mais
que uma parcela de verdade. É enfrentar sucessivas levas de grave do que aquilo que acontece
fato que a posse de armas sanções que, se não paralisam sua na Coreia do Norte, cuja exígua
nucleares tem sido, desde o fim economia, representam um ônus geografia e vizinhança com as
da Segunda Guerra Mundial, um e um embaraço consideráveis. grandes potências nucleares
atributo das grandes potências e A situação, da perspectiva impedem, a rigor, que suas
um título que pode ser invocado brasileira, pareceria estabilizada veleidades apareçam como
para desempenhar um papel mais se não fosse por dois aconte- verdadeiramente ameaçadoras
visível na vida internacional e cimentos que, de alguma maneira, para a paz e a segurança

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internacionais. Os seus vizinhos – apenas pela Turquia. À luz do que presunção de que Teerã pretende
a China, a Rússia e a Coreia do aconteceu, parece hoje que o dotar-se, em algum momento, de
Sul (neste último caso vale dizer Brasil subestimou as resistências um arsenal nuclear.
os Estados Unidos, que ali têm à tentativa de encaminhamento As recentes ações militares
uma importante presença militar) que adotou e foi, em alguma estrangeiras contra o Iraque e o
– têm meios e saberão conter a medida, induzido em erro pelos Afeganistão terão reforçado em
questão dentro de limites admi- Estados Unidos, cujo Presidente Teerã a convicção de que só um
nistráveis. O que a Coreia do em mais de uma ocasião tinha escudo nuclear protegeria o país
Norte busca é menos transformar- dado indicações – orais e por de sofrer o mesmo destino. Por
se em uma potência nuclear e escrito – que o caminho trilhado outro lado, Israel deseja manter
mais, isto sim, preservar sua pela diplomacia brasileira poderia a exclusividade de seu poder
sempre precária existência. produzir bons resultados. nuclear na região, e apenas se
A situação no Irã me parece O Brasil, depois desse voto, todo o Oriente Médio pudesse,
muito mais desafiadora. Em anunciou que cumpriria, como é em um determinado momento,
primeiro lugar porque o Oriente de seu dever, as sanções ado- definir-se como uma zona livre
Médio é uma região mais instável tadas, mas ficou um resíduo desse tipo de armas seria possível
e mais perigosa do que a Ásia desagradável de suspeita de que imaginar um encaminhamento
Oriental, e porque o Irã é um ator o Brasil tinha ido, no caso, além construtivo e duradouro para o
internacional de muito maior peso de suas pernas e se envolvido em problema.
do que a Coreia do Norte. O Irã um “imbróglio” do qual devíamos Mesmo esse projeto de um
é, de fato, pela sua vizinhança ter permanecido distantes. Oriente Médio desnuclearizado,
com o Iraque e o Afeganistão, Mais do que nos procurar que foi aprovado pela mais
por sua proximidade com a Índia, identificar com os objetivos e as recente Conferência de Revisão
o Paquistão e, sobretudo, com políticas iranianas, melhor seria do TNP (que só encontrou a
Israel, um país que, nuclearizado, que o Brasil deixasse claro que resistência de Israel e dos Estados
alteraria a balança de poder em outras são as nossas circuns- Unidos), é uma imensa emprei-
uma região que, além de toda sua tâncias e que o nosso programa tada que, na melhor das hipó-
importância estratégica histórica, – já bem estabelecido – de do- teses, levaria a um longo período
representa o epicentro da pro- mínio completo do ciclo de para avançar e produzir os
dução mundial de petróleo. enriquecimento de urânio e do resultados desejados.
Para o Brasil, em condições desenho e fabricação de turbinas O Brasil, detentor de vastas
normais este seria apenas mais nucleares navais e para produção reservas de urânio, engajado há
um grande problema interna- de eletricidade se realiza com muitos anos em um amplo
cional que nosso país, distante transparência, em uma região programa de domínio do ciclo
pela geografia e com interesses militarmente desnuclearizada e completo do combustível nuclear,
seus indiretamente afetados, em harmonia – e mesmo coope- com sua terceira central nuclear
poderia tratar dentro na moldura ração – com seus principais vi- em construção e várias outras
de nossa inserção multilateral, zinhos e sob a estreita e assídua programadas, tem que preservar
agora acrescida pela nossa supervisão da AIEA. o patrimônio de credibilidade que
presença temporária no Conselho Da mesma maneira que a nossa política e nossa diplomacia
de Segurança das Nações Unidas. ausência de uma motivação souberam construir; assim,
A tentativa turco-brasileira de nuclear militar facilita a ação mesmo que atuemos de forma
exercer um papel de mediação e brasileira e reforça a confiança bem intencionada, devemos nos
facilitação na busca de um internacional em nossos objetivos distanciar de outros projetos que
encaminhamento diplomático declarados, as circunstâncias no não têm a credibilidade e a
para a questão nos levou a ter Irã e no seu entorno promovem a transparência do nosso.
uma presença bem mais ativa e suspeita de que seus motivos são O desgaste que sofremos no
um perfil mais alto na questão. outros, diferentes daqueles que episódio iraniano foi real, mas
Como os esforços de Ancara e professa. Não se pode afirmar a pode ser certamente anulado
Brasília não tiveram os resultados esta altura, com certeza, que o por gestos e palavras que
esperados, fomos levados mesmo programa nuclear iraniano sugiram que também no campo
a votar contra a resolução do encobre um outro, de natureza da energia nuclear o Brasil é
Conselho de Segurança que militar. Por outro lado, pelas um ator construtivo e identi-
adotou uma nova série de circunstâncias geopolíticas no ficado com a luta contra a pro-
sanções contra o Irã, ficando o Oriente Médio e pela natureza liferação das armas nucleares,
Brasil, no fim das contas, em mesma do regime teocrático e e defensor exclusivo dos usos
posição isolada, acompanhado autoritário do Irã, ganha força a pacíficos do átomo.

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Regulação e participação
do estado na economia
Marcel Domingos Solimeo e Ulisses Ruiz Gamboa
Economistas do Instituto de Economia da Associação Comercial de São Paulo

mercado financeiro sofreu consideraram que a crise era de- algo recorrente na história eco-
O forte abalo a partir de se- corrência inevitável do capita- nômica, tal como mostram Ken-
tembro de 2008, com a crise lismo, quando deixado entregue neth Rogoff e Carmen Reinhart em
iniciada no sistema bancário dos às suas próprias forças, pois as seu recente livro Oito Séculos de
Estados Unidos. Essa crise acar- “falhas do mercado”, quando Delírios Financeiros, onde ana-
retou profunda repercussão na não corrigidas pela ação do lisam os surtos de crises finan-
economia real da maioria dos Estado, levariam à autodestruição ceiras desde a experiência da
países, em virtude da quase do sistema. A previsão do fim do China, no Século XII, até a crise
paralisação dos financiamentos capitalismo, ou do liberalismo, é atual. Os autores concluem que
tanto internacionais como do- bastante antiga, mas tem sido o surgimento de crises eco-
mésticos, devido ao abalo da repetidamente desmentida pela nômicas em geral tem contado,
confiança no sistema financeiro. história. Além disso, é fato que o através da história, tanto com a
Muitos analistas e políticos surgimento de crises financeiras é presença de excesso de endivi-

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damento privado como com aquelas que pretende corrigir. comercialmente superavitários,
crescimentos da dívida pública De acordo com a Teoria da como a China, que investiram a
insustentáveis, levando a toda Escolha Pública, tanto os agentes maior parte desse superávit em
sorte de calotes soberanos e privados como os do setor público títulos públicos do Tesouro norte-
emissão monetária hiperinfla- agem procurando maximizar seus americano.
cionária. Também é interessante interesses. A diferença é que os Essa política permitiu que o
notar que o subtítulo do livro é mecanismos de mercado, ba- sistema financeiro pudesse ex-
“Desta Vez é Diferente”, fazendo seados na liberdade de escolha, pandir de forma exponencial as
menção à “síndrome” historica- permitem a autocorreção mais operações de derivativos e de
mente recorrente de excesso de rápida das distorções do que a outros mecanismos de “alavan-
confiança na capacidade das intervenção pública que, no geral, cagem” financeira, como se essa
políticas fiscal e monetária em se perpetua por anos ou décadas, situação fosse perdurar eterna-
evitar o surgimento de grandes continuando em vigor mesmo mente. Segundo Alan Greespan,
crises financeiras. depois de as medidas adotadas que foi presidente do FED por
De qualquer forma, para já não serem mais necessárias, ou muitos anos, o mandato da
muitos a crise representou a justificáveis. autoridade monetária se restringia
oportunidade de reabilitar o papel Embora pareça ser consenso a controlar a inflação que, graças
do Estado como controlador da que a principal causa da crise à entrada dos produtos chineses
economia, em parte por ideologia, tenha sido a falta de regu- mais baratos no mercado ame-
mas também, em muitos casos, lamentação do mercado finan- ricano, impediu a elevação dos
por não saberem como agir. A ceiro, é preciso analisar quais índices de preços. Não se pode
crise de credibilidade que atingiu foram as sinalizações e os estí- ignorar, no entanto, que a ampla
o sistema financeiro da maioria mulos que as políticas dos go- liquidez, que provocou uma
dos países levou os governos a vernos transmitiram aos agentes excessiva valorização dos ativos,
socorrerem as instituições com econômicos. É preciso considerar propiciou também a expressiva
montantes expressivos de re- até que ponto as condições ma- elevação dos preços das commo-
cursos, recorrendo em alguns croeconômicas criadas pelo dities, a qual, aliada à ampla
casos à estatização de bancos. governo dos Estados Unidos es- disponibilidade de recursos
Buscou-se restabelecer a con- timularam o comportamento financeiros a custos baixos,
fiança no sistema financeiro ofe- irresponsável de gestores de permitiu, durante muitos anos, o
recendo, além do volume brutal recursos de terceiros. Assim, crescimento significativo da
de recursos, a garantia de novos substitui-se a ética pela ganância economia dos países emergentes,
aportes em caso de necessidade. na busca de resultados de curto entre os quais o Brasil. Assim,
A crise do sistema financeiro foi prazo, com vistas aos “bônus” muitos dos críticos da “irrespon-
apresentada como consequência elevados, sem qualquer preocu- sabilidade” norte-americana se
da falta de regulamentação, pação com a segurança e o futuro beneficiaram dessa situação e se
descartando-se outras causas que das instituições. vangloriaram de suas políticas
poderiam ter contribuído para a A política fiscal dos Estados econômicas como responsáveis
formação e posterior estouro da Unidos, com seus déficits gigan- pelo crescimento da economia.
“bolha”. Não se discutiu a res- tescos, gerou uma liquidez inter- Ao excesso de liquidez e aos
ponsabilidade dos governos em nacional exagerada, a qual foi juros baixos, resultados da ação
relação à crise, atribuídas unica- sancionada pelo FED (Banco do governo e que propiciaram a
mente às “falhas de mercado”. Central norte-americano) com a formação das “bolhas” dos ativos,
Existe muita literatura mos- manutenção dos juros muito se somou, no caso americano, a
trando as imperfeições da eco- baixos por longos períodos. Além política “frouxa” na concessão de
nomia de mercado, o que exige disso, os vultosos déficits das crédito hipotecário. O objetivo de
“intervenções” do governo para contas externas norte-ameri- propiciar “uma casa para cada
corrigir as “falhas”, em nome do canas, que foram uma conse- americano” levou a que o mer-
“interesse da sociedade” ou para quência natural do crescimento cado imobiliário passasse a
promover a “justiça social”. Pouco insustentável do gasto público, conceder financiamentos de
se discute, no entanto, sobre as também se transformaram em forma pouco cautelosa, porque
“falhas do governo” que, no geral, enorme massa de liquidez, ao contava com a garantia da Fannie
provocam mais distorções do que serem financiados por países Mae e do Freddy Mac, que faziam

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parte do sistema GSE (Govern- Por tudo isso, é preciso cautela do que nos países desenvolvidos,
ment Sponsored Enterprise – com as intervenções governa- pois embora profunda (a pro-
conjunto de instituições finan- mentais em função de seus dução industrial chegou a cair
ceiras criadas pelo Congresso desdobramentos. Mesmo que as 23% no início de 2009) ela foi de
americano). Essas empresas, medidas adotadas possam ter curta duração, pelo fato de os
apesar de serem privadas, go- sido inevitáveis no auge da crise, bancos brasileiros estarem pouco
zavam de acesso a uma linha de as propostas de regulamentação inseridos no mercado financeiro
crédito do Tesouro americano, do sistema financeiro em discus- internacional e operarem com
além de isenções de impostos são devem ser muito bem ava- baixa “alavancagem”, em virtude
estaduais e municipais, e não liadas para não se tornarem de regras do BC e dos elevados
estavam sujeitas às normas da depósitos compulsórios. As
SEC (Bolsa de Valores americana). medidas adotadas pelo Banco


Essas duas GSE controlavam Central permitiram o resta-
cerca de 90% do mercado secun- Embora pareça belecimento do crédito doméstico
dário de hipotecas. Assim, as ser consenso que em prazo relativamente curto e o
cautelas necessárias nas conces- a principal causa governo concedeu estímulos
sões de financiamentos imobi- da crise tenha fiscais para alguns setores, o que
liários foram relaxadas pela cer- sido a falta de ajudou em uma recuperação mais
teza de que, em caso de inadim- rápida da economia.
plência, o contribuinte americano regulamentação do Mesmo que se aceite a ne-
cobriria. Esse comportamento, mercado financeiro, cessidade da intervenção gover-
denominado risco moral (moral é preciso analisar namental nos períodos de crise
hazzard), implicou, em suma, que quais foram as generalizada, isso não implica
o sistema de crédito hipotecário sinalizações e os necessariamente o aumento da
dividia seu risco com o Estado participação do Estado na eco-
americano, seu “sócio oculto”, in- estímulos que as nomia, embora possa aumentar
centivando a excessiva tomada políticas dos a regulação das empresas
de riscos. governos privadas. Atualmente, nos países
Assim, a má qualidade dos transmitiram aos desenvolvidos e em vários
financiamentos imobiliários e a
utilização das hipotecas para
gerar derivativos, que foram se
agentes econômicos.
” emergentes, como o Chile, por
exemplo, a intervenção passa pela
atuação de agências reguladoras,
espalhando pelo sistema finan- constituídas como instituições de
ceiro de muitos países, foram obstáculos para a recuperação Estado e não do governo de turno,
o “estopim” do estouro da das economias, por bloquearem o que lhes confere independência
“bolha” financeira. Desse modo, demais as forças do mercado. política, privilegiando a aplicação
pode-se dizer que mesmo que Também existe o risco da perma- de decisões de cunho técnico.
a falta de regulamentação nência de intervenções por mais Infelizmente, no caso brasileiro o
tenha permitido a alavancagem tempo do que o necessário, o que governo que acaba de terminar
excessiva do sistema financeiro, é normal ocorrer, porque os seu mandato contribuiu decisi-
na origem da crise se encon- interesses da burocracia e dos vamente para a “desidratação”
tram as “falhas do governo”, grupos beneficiados acabam das agências reguladoras, que
que incentivaram as condutas se consolidando. Isso pode passaram a ficar subordinadas ao
irresponsáveis dos agentes retardar a volta da eficiência dos poder político dos Ministérios,
econômicos. sistemas econômicos e o cres- restringindo-se sua capacidade de
Curiosamente, a crise vem cimento futuro. atuação e seu orçamento, além
sendo combatida na maioria dos de quebrar o preceito básico de
países com injeções maciças de A CRISE NO BRASIL E O estabilidade no cargo dos seus
recursos na economia, do que AUMENTO DO TAMANHO DO diretores, o que reduziria a in-
resulta elevados déficits públicos, SETOR PÚBLICO fluência partidária na constituição
ampla liquidez e juros baixos, de seus quadros. Convém sempre
gerando incerteza em relação O impacto da crise financeira lembrar, como certa vez afirmou
ao futuro. internacional no Brasil foi menor o célebre especialista em regu-

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Gráfico 1: Carga Tributária: 2003 - 2009 (% do PIB) que a participação das instituições
financeiras públicas nas ope-
rações de crédito totais à pessoa
física vem aumentando de forma
constante, passando de 36,3%
em janeiro de 2009 para 42% em
setembro de 2010 (Gráfico 2).
A descoberta das jazidas do
pré-sal serviu para que se esta-
belecessem regras que favorecem
a Petrobrás e aumentam a
intervenção estatal na economia.
Além disso, ela foi pretexto para
a criação de mais uma empresa,
a Pré-Sal Petróleo S/A, ainda no
papel, mas já aprovada pelo
Congresso, em vez do fortale-
cimento da ANP e de sua profis-
Fonte: IBPT. sionalização. No caso da Eletro-
brás, o movimento de reestati-
lação Harold Demsetz, que uma tantes desse impressionante zação na área da energia elétrica
regulação malfeita pode, na aumento de participação no parece seguir o objetivo, de-
maioria dos casos, ser pior que a mercado financeiro nacional clarado por algumas autoridades,
total falta de regulação. foram as capitalizações feitas pelo de transformar essa empresa na
No Brasil, a crise serviu para Tesouro ao longo do período, já “Petrobras” do setor. Além de
que o governo procurasse jus- que a aquisição do Banco Nossa arrematar nos leilões diversos
tificar, e aprofundar, as medidas Caixa representou pequeno projetos, a Eletrobrás vem com-
intervencionistas e estatizantes aumento dos ativos, também prando da iniciativa privada
que já vinha praticando an- conforme o Banco Central. Os usinas de geração de energia, o
teriormente, algumas das quais de dados permitem ainda concluir que lhe permite responder, através
difícil reversão, a começar pelo
aumento da carga tributária, Gráfico 2: Evolução das participações dos sistemas
que passou de 31,6% do PIB, financeiros público e privado nas operações de crédito:
em 2003, para mais de 35% janeiro 2008/setembro 2010 (%)
em 2009 (Gráfico 1), apesar do
crescimento da economia no
período.
A maior participação estatal
na economia, no entanto, vem se
dando não apenas pelo aumento
da carga tributária, mas também
com a criação de novas empresas
e pela expansão das existentes,
como a Petrobras, o Banco do
Brasil, a Eletrobras e a Telebras e
o BNDES.
No caso do Banco do Brasil
destaca-se, de acordo com dados
do Banco Central, que entre
junho de 2009 e junho de 2010
o BB passou do 14º lugar para a
primeira posição do ranking de
tamanho dos ativos totais ban-
cários. As causas mais impor- Fonte: Banco Central.

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de suas controladas, como forma apenas em mais um órgão e 2014 são da ordem de R$959
Furnas, EletroNorte, CHESF, governamental para oferecer bilhões, valor que deverá au-
Itaipu e EletroNuclear, por mais de cargos a colaboradores “fiéis”. A mentar, conforme revelam as
50% da capacidade instalada no Empresa de Pesquisa Energética experiências da realização de
país. Segundo empresários da (EPE), destinada a fazer o pla- grandes obras públicas.
área, as regras dos leilões nejamento energético, já sofreu o Se considerarmos a política de
afugentam a iniciativa privada, desgaste do escândalo que atingiu apoio à criação da “grande
dando pretexto para o avanço a Casa Civil, desacreditando em empresa nacional”, através dos
estatal em um setor parcialmente muito seu papel. O Banco Popular financiamentos subsidiados do
privatizado na década passada. do Brasil gastou muitos recursos BNDES e da participação dos
As empresas estatais têm con- em propaganda e acabou sendo Fundos de Pensão das estatais,
tado, para esse avanço, com veremos que a intervenção do
recursos do BNDES. governo na economia é muito
Em relação à Telebras, sua maior do que sugere a partici-
“ressurreição” decorre da decisão
do governo de levar a “banda
larga” para todas as regiões do
“ No Brasil, a crise
serviu para que o
governo procurasse
pação de suas empresas. Política
semelhante foi adotada no
governo Geisel, com o II PND,
país, objetivo que poderia ser quando o Estado, e não o
atendido pela iniciativa privada. justificar, e aprofundar, mercado, escolhia os setores ou
É evidente o interesse do governo as medidas empresas que deviam ser for-
em dispor de mais poder e mais intervencionistas e talecidas. Com relação ao
cargos para negociação com estatizantes que já BNDES, cabe assinalar que mais
essa decisão. Além da Telebrás, de 25% dos financiamentos con-
também a VALEC Engenharia foi vinha praticando cedidos no país, e cerca de 40%
reativada para operar 9.000 km anteriormente, algumas daqueles destinados à infra-
de trilhos, para o que o governo das quais de difícil estrutura, são fornecidos por esse
elevou seu capital social inicial de reversão, a começar banco. Além de financiar a
R$920 milhões para R$ 2,6 pelo aumento da carga expansão de estatais e de “gran-
bilhões e, depois, promoveu novo des empresas nacionais”, o
aumento de capital de R$1,037
tributária, que passou BNDES tem oferecido recursos
bilhão. Duas novas empresas de 31,6% do PIB, para a reforma de estádios, para
devem ser criadas para finali- em 2003, para mais o controvertido “trem bala” e
dades específicas, uma para
operar as obras de transposição
das águas do Rio São Francisco e
de 35% em 2009.
” outras aplicações questionáveis
do ponto de vista econômico – e
não justificáveis no aspecto social
outra para liderar a construção do – para receberem créditos
polêmico “trem bala”. extinto sem atingir o objetivo de subsidiados. Nos últimos 18
Além disso, a criação de duas oferecer microcrédito. Ficou meses o governo injetou R$180
fábricas, uma para hemoderi- comprovada a absoluta desne- bilhões no BNDES que, mesmo
vados e outra para semicon- cessidade de sua criação, e após a recuperação da economia,
dutores, ambas ainda não fun- mostrou-se que muitas empresas continua expandindo suas opera-
cionando, foi justificada como estatais têm servido, mais uma ções, criando dificuldades para o
necessária para dotar o país de vez, apenas para atender a Banco Central administrar a
empresas que pudessem atender conveniências políticas do go- política monetária.
à demanda em áreas estratégicas, verno. Ao mesmo tempo em que
mas o alcance esperado dessas Segundo matéria do jornal avança a participação das
iniciativas não se afigura como VALOR, entre 2003 e 2009 o estatais, a iniciativa privada se
relevante para a economia. A Tesouro aplicou R$63,8 bilhões depara com dificuldades para
Empresa Brasil de Comunicações no fortalecimento das empresas investir em determinados setores,
pretende ser uma resposta do estatais. Esse volume de recursos seja pela insegurança das regras,
governo à “parcialidade” da deve crescer significativamente pelos obstáculos regulatórios,
mídia, mas o fato de sua au- com as obras do PAC 2, cujos pela demora de aprovação de
diência ser muito baixa a trans- investimentos previstos entre 2011 licenças ambientais e pela fixação

DEZ/JAN/FEV - 10/11 - Nº 53 19
Matéria de Capa

de preços irrealistas em licitações Nota Fiscal Eletrônica e do SPED da simplificação burocrática e da


ou concorrências. Também – Sistema Público de Escrituração menor carga tributária. Isso
restrições operacionais como no Digital pode até propiciar alguma coloca a preocupação com o
caso, por exemplo, do setor facilidade ou vantagem aos destino da empresa média no
portuário, no qual a participação estabelecimentos de grande porte, Brasil e com as consequências de
da livre iniciativa é desestimulada mas transferiu às empresas os seu desaparecimento, principal-
com a proibição da construção de elevados custos da implantação, mente no que tange à geração de
terminais portuários de uso que exige equipamentos, sistemas empregos.
privativo misto, que permitiria ope- e pessoal especializado. Embora o governo se vanglorie
rar carga própria e de terceiros. As empresas médias, que não de sua atuação durante a crise, é
O decreto que regulamenta a Lei gozam de nenhum dos incentivos importante recordar que políticas
dos Portos proíbe, ainda, que a oferecidos aos empreendimentos econômicas verdadeiramente
empresa movimente produtos de micro e pequeno portes, não anticíclicas são de natureza in-
diferentes no mesmo terminal. possuem, também, os recursos e trinsecamente temporária, suavi-
Essas restrições se revelam ainda pessoal especializado das grandes zando os efeitos negativos do ciclo
mais graves quando se sabe que para atender às novas exigências de contração. O economista
os portos brasileiros são ex- da burocracia, e nem o seu poder inglês John Maynard Keynes,
tremamente onerosos e, na maioria, de mercado para transferir a fonte de inspiração de todos os
representam pontos de estran- tributação excessiva. Assiste-se, que defendem a regulação,
gulamento para as exportações. em consequência, a um processo sugeriu, em plena Grande De-
A intervenção do Estado na de absorção das empresas mé- pressão, que o investimento
economia vem se acentuando dias pelos grandes grupos, público deveria ser aumentado
também pelo lado da burocracia inclusive com a desnacionalização temporariamente para com-
e da tributação. A tributação das acentuada de alguns setores, pensar a retração do setor
empresas submetidas ao regime como o de autopeças. Essa privado, mas se referia a au-
do lucro real é da ordem de 50% informatização da burocracia e a mentos temporários dos gastos,
a 60% do valor adicionado por tributação elevada, por sua vez, que gerariam grande quantidade
elas, carga extremamente ele- representam um desestímulo ao de empregos temporários.
vada, que os empreendimentos de crescimento das pequenas em- Contudo, numa “tropicali-
grande porte suportam por terem presas, pois perderiam o benefício zação” das recomendações key-
poder de mercado para transferir
parte importante dessa carga a
seus consumidores, pessoas Gráfico 3: Evolução do gasto público corrente
2000 - 2009 (% do PIB)
físicas ou jurídicas. Isso exige
grande escala operacional, que
vem levando ao aumento da
concentração empresarial.
Quando se esperava que a
evolução da informática e das
comunicações fosse reduzir os
ônus burocráticos para as
empresas, o que se assiste é à
“informatização da burocracia”,
transferindo ao setor privado os
custos da “modernização” da
fiscalização e da arrecadação.
Isso não deverá reduzir o tempo
gasto pelas empresas brasileiras
na administração tributária, que
se mantém como o maior entre
183 países (108,3 dias em média
por ano), de acordo com estudo
do Banco Mundial (Doing Bu- Fonte: Tesouro Nacional.
siness 2010). A introdução da

DEZ/JAN/FEV - 10/11 - Nº 53 20
Matéria de Capa

nesianas, o governo entre 2009 sivo endividamento fiscal e fler-


e 2010 expandiu de forma signi- tam com a ameaça de calote
ficativa a quantidade de fun-
cionários públicos, além de con-
soberano apresentaram evolu-
ção similar à que vem ocorrendo A Suécia depois
ceder generosos aumentos de
seus salários. Essa expansão dos
gastos com pessoal é do tipo
no Brasil.
O desafio para o novo governo
é o de procurar restabelecer a
do modelo sueco
permanente, contribuindo para responsabilidade fiscal pelo corte de Mauricio Rojas
elevar o gasto público corrente a de gastos, que devem ser mais
45,1% do PIB em 2009 (Gráfico acentuados para liberar recursos
3), o que implica incrementar o para investimentos. Além disso,
tamanho do setor público na eco- deverá adotar medidas que
nomia, já elevado para os padrões estimulem o investimento privado
internacionais de uma economia em infraestrutura, para evitar que
emergente como a brasileira. a taxa de crescimento da econo-
Tanto o aumento da parti- mia seja comprometida.
cipação do Estado na economia, De fato, para chegar a ser um
seja pela tributação, criação e país desenvolvido o Brasil precisa
expansão de empresas estatais, crescer continuamente a taxas
como pelo crescimento dos gastos elevadas, o que somente será
de pessoal são medidas de viável se houver uma taxa de R$ 15,00
caráter permanente, cujos efeitos investimento de pelo menos 25%,
continuam presentes mesmo após que dista muito dos atuais 18%.
a recuperação econômica, pas- Caso contrário, estaremos con-
sando a se constituir em obstáculo denados a repetir outro novo ciclo Este livro mostra o que
para o exercício da política fiscal de baixas taxas de crescimento, aconteceu com o modelo de
e, em consequência, também da principalmente no momento em
monetária. A “contabilidade que as taxas de juros interna- welfare state implantado
criativa” que vem sendo utilizada cionais começarem a subir, naquele país. Originalmente
para obter um “superávit pri- levando parte importante dos socialista, Rojas assistiu à
mário” maior não muda a reali- capitais estrangeiros que hoje
dade de que a “responsabilidade contribuem para que o país cresça debacle do famoso modelo sueco
fiscal” foi abandonada nos últi- de forma acentuada. da economia do bem-estar e às
mos anos. O resultado tem sido Esse tão sonhado desenvol- alterações que se sucederam,
a manutenção dos juros elevados, vimento econômico, que serviria
a valorização cambial e a expan- para erradicar de forma definitiva desmascarando a derradeira
são da dívida pública, cuja real a miséria, construindo uma eco- utopia da esquerda no mundo.
evolução fica “mascarada” ao se nomia mais forte e mais justa,
descontar do montante total as passa necessariamente por uma Esta e mais 80 obras
reservas internacionais acumu- correta divisão de atividades entre
ladas pelo Banco Central e o o setor público e o privado. O estão à venda no
crédito gerado pelos empréstimos critério de delimitação deverá ser Instituto Liberal
do Tesouro ao BNDES. Desse pautado por critérios de eficiência.
modo, ao analisar a evolução da Afinal, o Estado tem tarefas
dívida total sem descontos (bruta) relevantes a desempenhar em
podemos constatar que sua áreas como segurança, saúde e
trajetória tem mostrado franco educação, o que não vem fazendo
crescimento, situando-se próxima com eficiência, pelo que deve
a 60% do PIB, pondo em risco a estimular o setor privado em vez
sustentabilidade futura da de procurar substituí-lo, criando Peça pelo site:
política fiscal brasileira. Muitos um ambiente regulatório favorável www.institutoliberal.org.br
dos países desenvolvidos que ao desenvolvimento da livre
atualmente apresentam exces- iniciativa.

DEZ/JAN/FEV - 10/11 - Nº 53 21
Especial
Uma visão liberal do fato

melhor do período tom de deboche com que comportamento de


O eleitoral foi a manu- O Lulla reage às críticas do O Lulla nas eleições, que
tenção da herança institu- Tribunal de Contas da União, acabaram por conduzir
cional deixada pelo pois ele diz acreditar que o Dilma Rousseff ao poder,
governo de Fernando controle é incompatível com a extrapolou, em muito, o que
Henrique Cardoso. Apesar eficiência quando, na verdade a ética autorizaria a um
de todas as diatribes, o ele é essencialmente o único e presidente que, em nenhum
esqueleto que suporta a Lei legítimo instrumento oficial momento, se licenciou do
de Responsabilidade Fiscal e de checks and balances primeiro cargo do Poder
as metas de inflação foram possível. Esta atitude crítica e Executivo. As inaugurações,
mantidas. Mesmo sendo de menosprezo ao Tribunal, legítimas ou inventadas, de
alcunhadas pelo presidente tratada em tom de deboche, obras resultantes do PAC
de “herança maldita”, Lulla vem sendo, aliás, recorrente e foram utilizadas francamente
manteve-se dentro desses despertou o primeiro lugar em para carrear votos para a
parâmetros, ainda que duas categorias: mau e feio. candidata escolhida pelo
mudasse algumas regras Esta, no qual por fim foi Presidente. No 2º turno Lulla
contábeis, como fez em escolhida, é o troféu de o fato excedeu-se, e fez verdadeiros
mais feio do período, onde comícios no exercício
relação ao superávit do seu cargo. Foi feio e
primário. Agora, com as acabou sendo superado. A acabou superando, em
obras necessárias para a crítica ao TCU tem caráter desqualificação, as críticas
realização das Olimpíadas mais permanente e mais com as quais o presidente
no Rio e a Copa do Mundo deletéria que a indevida tentou qualificar o TCU,
no Brasil abre-se um espaço participação do Presidente o qual recomendou a
tentador para a realização de na eleição de Dilma Rousseff. suspensão de algumas obras
gastos vultosos, e enorme Criticar o TCU por apontar do PAC (em especial) por
dificuldade para controlá-los. equívocos na realização de falta de licitação e, mesmo,
A experiência no Brasil (vide obras estatais é, antes de por pagamentos de obras
os Jogos Panamericanos) tudo, uma atitude ditatorial não realizadas. Essa atitude
tem mostrado que as obras ou imperial do monarca em é um retrocesso republicano
só são contratadas quando exercício. A existência de e caracteriza um modelo
em função do tempo, as um Tribunal de Contas é imperial de governar.
licitações se tornam administrativamente a única O que há de mais próximo
impossíveis. A corrupção possibilidade de defesa da de Lulla é a definição de
é o resultado direto da sociedade contra os excessos Luis XV, quando afirmou:
“pressa planejada”. do poder executivo. L´etat c´est moi.

DEZ/JAN/FEV - 10/11 - Nº 53 22
Educação

Liberdade e Tecnologia
José L. Carvalho
Vice-Presidente do Instituto Liberal e Professor de Economia da Universidade Santa Úrsula

uas obras, separadas por um Para Ferkiss a sociedade de homens


D quarto de século, tratam do fu- livres está se autodestruindo e somente
turo e do impacto da tecnologia so- uma nova filosofia política pode sal-
bre a civilização: The Future of var a humanidade. Essa filosofia seria
Technological Civilization, de Victor o humanismo ecológico [o qual] dife-
Ferkiss (1974) e NonZero: The Logic re do liberalismo por assumir que o
of Human Destiny, de Robert Wright bem comum existe e que seu conteúdo
(2000). Creio ser útil um exame des- é passível de ser conhecido, e que
sas duas obras, que vêm influen- ele tem prevalência sobre todos os
ciando as reflexões a respeito de como bens privados. (p.273). É falso atri-
o desenvolvimento tecnológico tem buir ao liberalismo a negação do bem
afetado a liberdade das pessoas. Em- comum. A proposição liberal é a de
bora os argumentos de Ferkiss tenham que em uma sociedade, o bem comum,
sido construídos antes da queda do ainda que não saibamos exatamente
Muro de Berlim, suas observações o que é, será promovido pela ação
são atuais, uma vez que a onda con- livre dos indivíduos na busca de seus
trária ao pensamento liberal tem cres- próprios interesses, sob um conjunto
cido alimentada pelos movimentos de instituições que garantam as liber-
ambientalistas e pelos críticos do que dades e estabeleçam responsabilida-
inapropriadamente ficou conhecido des delas decorrentes.
como neoliberalismo. Se o principal objetivo de Ferkiss é
Ferkiss destaca a globalização em mudar, por uma revolução promo-
um contexto ambientalista e apresen- vida pelo convencimento, a tendência
ta uma percepção negativa sobre a da organização da sociedade hu-
filosofia liberal e, consequentemente, mana, Wright (2000) alega ter desco-
do futuro do individualismo e da so- de regulamentação social tornada berto a direção da evolução biológica
ciedade de homens livres. De maneira possível pelas poderosas tecnologias e da história da humanidade: Minha
construtivista, elabora o que deve ser de supervisão e controle que estarão esperança é a de ressaltar um tipo de
feito para que a humanidade seja disponíveis. (p.18) força – a dinâmica do soma-não-zero
salva. Confundindo causa com efeito É fato que a tecnologia tem sofrido – que tem, de forma crucial moldado
– Liberalismo emergiu com o ad- mudanças drásticas, especialmente no o desabrochar da vida na terra, até
vento da modernidade; hoje ele é campo da informação e comunicação agora. (p.5). Sob a lente da teoria dos
obsoleto e perigoso, porque a era na e não resta dúvida de que as novas jogos, Wright conduz o leitor por uma
qual ele nasceu está chegando a um tecnologias da informação e comuni- rica e interessante jornada, identifican-
fim. (p.8) – ele descarta a filosofia li- cação podem produzir um tipo de go- do ao longo da história humana as
beral por ser incompatível com o verno Big Brother. O crescimento das inovações que introduzidas na vida
mundo em mutação no qual vivemos. regulamentações e dos controles go- social a direcionaram. Inovações, tanto
Os problemas ambientais gerados vernamentais que enfrentamos hoje em na produção de bens materiais quan-
pelo progresso – e não pela existên- dia é uma indicação de que a visão to nas instituições sociais são criadas
cia de bens de propriedade comum e de Ferkiss, na metade da década de para promover jogos de soma-não-
pela má caracterização dos direitos 1970, reflete uma ameaça verdadeira zero entre os indivíduos. Assim, insti-
de propriedade – são a bússola que à existência de uma sociedade liberal. tuições que reduzem os conflitos entre
aponta a direção do sistema de valo- Entretanto, Ferkiss desconsidera a luta os indivíduos em uma sociedade têm
res que permitirá às sociedades lidar dos indivíduos, ao longo dos séculos, emergido ao longo da história. Esse
com a relação humanidade-tecno- para restringir o poder do governante. processo, assim como sua velocida-
logia-natureza. Isso exigiria uma mu- Assim, o poder do governante, a des- de, mudou drasticamente com o ad-
dança drástica na organização soci- peito dos avanços tecnológicos, cons- vento da Sociedade Moderna. A ino-
al, e a tecnologia da informação e trangerá mais ou menos nossas liber- vação que promoveu o desenvolvi-
comunicação (TIC) tornaria possível dades, dependendo das instituições mento e a disseminação desse pro-
tal transformação: ... o mundo do sé- sociais que tenhamos desenhado para cesso foi a invenção por Gutenberg
culo vinte e um será um no qual a protegê-las. Tecnologia em si não age, dos tipos móveis para a impressão
liberdade humana deverá ser plane- embora ela seja sempre usada para pedagogicamente comparada por
jada e, na realidade, criada por meio satisfazer os desejos humanos. Wright com a Internet: Na realidade,

DEZ/JAN/FEV - 10/11 - Nº 53 23
Educação

não há melhor preparação histórica identificadas etnicamente (como na Iu- modo a promover um fluxo interna-
para se pensar como a Internet goslávia), religiosamente (como na cional de capitais, mais contínuo. Com
redesenhará a vida política e social Turquia) ou linguisticamente (como o desenvolvimento das novas TIC as
do que examinar como a imprensa as em Quebec, Canadá). transferências financeiras ficaram mais
modificou. (p.176) Mas, como seria esse mundo baratas assim como o custo de se ob-
Nesse contexto, ele enfatiza a im- globalizado? A governança pública ter informações dos parceiros finan-
portância da imprensa para os movi- tende a se expandir para promover ceiros no mercado internacional. Iden-
mentos de protesto tanto na socieda- soluções para os problemas não con- tificando a possibilidade de expandir
de quanto entre grupos: A imprensa siderados pelos códigos morais ou fora seus negócios por meio das novas TIC
lubrificava os protestos. Ela o fazia do escopo do sistema de preços devi- os mercados financeiros locais pressio-
reduzindo os custos de informar e do a falhas de mercado. Isso já vem navam os governos por liberalização.
mobilizar uma grande audiência. ocorrendo em dois níveis. Os gover- À medida que mais transações inter-
(p.176). Não é por outra razão que nos nacionais estão expandindo o seu nacionais se tornavam viáveis para os
governos, embora autodenominados papel de regulador pela multiplicação empreendedores locais a pressão por
democráticos, vêm controlando ou ten- de agências de controle e moni- liberalização do mercado se espalha-
tando controlar o processo de disse- toramento. As atuais organizações in- va por todo o setor financeiro. A
minar informação nas sociedades, in- ternacionais assim como as novas que liberalização a que nos referimos aqui
clusive pela Internet. A redução dos vêm surgindo têm procurado prover não implica menos intervenção go-
custos de informação e comunicação, uma ordem supranacional pela de- vernamental no mercado, mas menos
promovida pelas novas tecnologias, manda das corporações trans- ação governamental restringindo o
tem alimentado movimentos separatis- nacionais e do mercado financeiro fluxo financeiro internacional. Com a
tas, sectários e terroristas, assim como globalizado, assim como em resposta crise das subprimes esse processo foi
a sociedade civil na sua luta pela às pressões de grupos organizados por interrompido. Reagindo à crise os go-
descentralização do poder político e meio de ONG’s. Isso significa que vernos nacionais têm restringido as
pela liberdade. Ferkiss estava certo ao prever para o atividades desse setor por meio de
Com o desenvolvimento das século XXI que a liberdade humana normas regulatórias. Apoiados por
tecnologias de informação e comuni- precisava ser planejada? Não, e a vários governos nacionais, alguns or-
cação (TIC) ao longo do século XX os revisão de Wrigth nos convence de ganismos multinacionais já deixaram
fundamentos das relações políticas e que, a despeito de todas as dificulda- clara sua disposição de assumir um
econômicas se modificaram. Entre- des atuais a liberdade e a proliferação papel regulador nesse mercado inter-
tanto, essas mudanças ocorreram em de interações do tipo soma-não-zero, nacional.
um período muito curto de tempo e só possíveis em um ambiente de liber- A globalização dos mercados finan-
por isso mesmo não foram acompa- dade e criatividade, continuarão a ceiros produziu um benefício líquido
nhadas pelos costumes, normas so- promover a prosperidade da humani- para todos os participantes? Os be-
ciais e leis, assim como outras institui- dade. nefícios líquidos apropriados, como
ções, inclusive governança, tanto pú- As novas TIC têm afetado o comércio comumente se argumenta, se concen-
blica quanto privada. A cultura muda e o mercado financeiro internacionais tram nos países desenvolvidos em de-
mais lentamente como bem explica a tal ponto que podemos dizer que elas trimento dos demais participantes? A
Ogburn (1950). Essa distância, entre são responsáveis pela globalização do globalização promoveu o crescimen-
a cultura e o dia a dia do indivíduo século XX. Provavelmente a Internet é to econômico? Uma avaliação da
na tentativa de se adaptar às novas a inovação mais facilmente associada liberalização do mercado financeiro
tecnologias exige um ajustamento. à globalização, graças a outra inova- internacional deve ser conduzida para
Ajustes sociais têm custo e requerem ção que enfatiza a característica indi- um período anterior à crise subprime,
tempo e por isso mesmo produzem vidualista da sociedade moderna, o a menos que esta tenha resultado de
duas forças conflitantes: globalização computador pessoal (PC). Contraria- tal liberalização. Este não foi o caso.
e tribalismo. mente às indicações de Ferkiss, (1974), As evidências indicam que a crise,
A globalização é a reação econô- de que o liberalismo seria incompatí- como o nome que a identifica deixa
mica aos incentivos gerados pelas vel com esta nova civilização da claro, teve origem nas falhas de go-
novas TIC. Por reduzirem os custos de tecnologia, o PC e a Internet amplifi- verno nos Estados Unidos. Embora a
transação elas favorecem o comércio cam a característica individualista da literatura técnica sobre finanças seja
internacional e as transações financei- modernidade, assim como o senti- abundante a evidência empírica neste
ras internacionais, dando origem às mento individual de pertencer a uma particular é bastante escassa e deve
empresas transnacionais. Tribalismo é comunidade sem barreiras físicas ou ser vista com reserva. De um modo
a reação cultural à globalização, a a um grupo ou tribo. As escolhas in- geral as características dos dados usa-
qual ameaça as diferenças culturais e dividuais de interação com outros têm dos em tais estudos não atendem às
linguísticas por semear a cultura do se expandido a custos menores. exigências necessárias ao desenvolvi-
consumo (consumismo) que favorece O mercado financeiro internacio- mento de tais análises.
o livre comércio e o inglês como a nal é provavelmente o mercado mais Os estudos que investigam a rela-
principal língua. Reduzindo os custos globalizado hoje em dia. Isso explica, ção agregada entre desenvolvimento
de congregar pessoas, as novas TIC em parte, a tendência liberalizante nos financeiro, na maioria dos casos de-
facilitam o desenvolvimento de tribos mercados financeiros domésticos de vido à liberalização desse mercado, e

DEZ/JAN/FEV - 10/11 - Nº 53 24
Educação

crescimento econômico, têm indicado, governo, particularmente no que se re- econômicos e sociais, tão frequentes
empiricamente, que há um incre- fere às garantias do Estado de Direito. na sociedade contemporânea. Além
mento positivo no crescimento econô- Com o declínio dos custos de organi- disso, um mínimo de educação for-
mico que pode ser associado ao zação de grupos, os custos pecuniários mal é exigido para o uso eficiente das
desenvolvimento financeiro [King- para os cidadãos controlarem o go- novas TIC, em particular da Internet.
Levine (1993)], aparentemente decor- verno foram reduzidos. E é exatamen- Assim, a preocupação de exclusão
rente de melhor alocação dos recur- te isso que várias ONG têm feito por de pessoas do processo político
sos [Beck-Levine-Loayza (1999) e todo o mundo. Assim, as TIC têm fa- exige, em primeiro lugar, uma revi-
Galindo-Schiantarelli-Weiss (2002)] vorecido o processo democrático na são do atual papel desempenhado
assim como pela superação das difi- sociedade contemporânea, como já pelos governos dos países em
culdades financeiras das pequenas destacavam Jefferson e Madison desenvolvimento em seu processo
empresas participarem do comércio Federalist PPapers
(F apers números X e XIV). educacional.
internacional [Rajan-Zingales (1998) A importância da informação na
e Laeven (2000)]. sociedade contemporânea induziu al-
Se por um lado as novas TIC não guns autores [por exemplo Meléndez
têm o impacto direto na concepção (2002)] a sugerir a inclusão nos direi- REFERÊNCIAS
filosófica de sistemas de governo, por tos humanos do direito de informar e BIBLIOGRÁFICAS
outro lado, ela são importantes, como ser informado sem custo. Assim, a au-
em todas as outras atividades huma- toridade pública deveria garantir livre
nas, para administração e controle do acesso à Internet semelhantemente ao BECK, T, R. LEVINE and N.
orçamento público bem como para acesso a livros provido pelas bibliote- LOAYZA, Finance and the Source of
harmonização de impostos entre os cas públicas. O argumento é de que Growth. Journal of Financial Eco-
diversos níveis de governo. Como as a participação do cidadão é essencial nomics, 58 (1999):261–300.
novas TIC reduz os custos de adminis- à representação política, de modo que FERKISS, Victor, The Future of
tração e controle do governo elas tam- se o governo não der livre acesso aos Technological Civilization. New York:
bém promovem o crescimento do serviços de Internet ele estará conde- George Braziller, 1974.
governo uma vez que a coordenação nando uma parcela substancial da po- GALINDO, A., Fabio SCHIAN-
de suas atividades se tornou mais pulação de países em desenvolvimen- TARELLI and Andrew WEISS, Does
barata. O fato é que o governo tem to à exclusão do processo político. Se Financial Liberalization Improve the
crescido em todo o mundo a despeito levarmos a sério esse argumento, so- Allocation of Investment?: Micro
dos custos de administração de suas mos forçados a concluir que o gover- Evidence from Developing Countries.
atividades. no deveria também prover livre aces- Working Paper 467. Washington
A instabilidade macroeconômica so a outros bens e serviços como: te- D.C.: Inter-American Development
registrada ao longo dos anos 1980 lefone, aparelhos de TV e rádio, servi- Bank, 2002.
forçou os governos a evitar a expan- ços de correio, para mencionar ape- KING, R. and R. LEVINE, Financial
são de seus gastos por meio do im- nas os mais óbvios. Esse é um cami- and Economic Growth: Schumpeter
posto inflacionário. Esses países usa- nho muito perigoso. Uma melhor al- May Be Right. Quarterly Journal of
ram a privatização para ajustar o or- ternativa seria investir no recurso mais Economics, 108 (1999): 717–37.
çamento público embora não tenham importante do país, sua população. LAEVEN, Luc, Does Financial
ajustado o setor público às novas con- Que educação é importante todos Liberalization Relax Financing
dições. Sob um ambiente de cresci- concordam, particularmente para Constraints on Firms? Policy
mento econômico medíocre, a outra países em desenvolvimento. Entre- Research Working Paper 2467. Wa-
forma de aumentar a receita governa- tanto, os recursos públicos alocados shington, D.C.: World Bank, 2000.
mental era a introdução de um siste- à educação são bem inferiores ao que MELÉNDEZ, A. Hugo, Médios de
ma efetivo de monitoramento do con- o consenso público indica. Nos paí- Comunicación y Conflicto Social.
tribuinte para reduzir a evasão fiscal. ses em desenvolvimento, em particu- Contribuciones, 19 (Abril/Junio
As novas TIC eram justamente o que lar na América Latina isso parece ter 2002): 11–29.
as autoridades governamentais preci- resultado de uma forte tendência de OGBURN, William, Social
savam para manter e aumentar a re- investir em capital físico conforme os Change. New York: Viking, 1950.
ceita tributária sob tais circunstâncias. modelos keynesianos de crescimento RAJAN, R. and L. ZINGALES,
Se por esse lado as TIC têm colabo- sugeriam ao longo dos anos 1950. Financial Dependence and Growth.
rado para o crescimento do governo, Educação promove o bem-estar do The American Economic Review, 88
elas também tem proporcionado ao indivíduo desenvolvendo suas habili- (1998): 559–86.
cidadão melhores instrumentos para dades para competir por recursos es- SCHULTZ, T. W., The Value of
seu controle. cassos. Ela enriquece as pessoas e as Ability to Deal with Desequilibria.
Na medida em que os custos de torna mais sociáveis, reduzindo os cus- Journal of Economic Literature 13
informação e comunicação são redu- tos de comunicação local e global. (1975):827–46.
zidos, os cidadãos podem dispor de Schultz (1975) destaca a importância WRIGHT, Robert, Non Zero: The
um sistema de administração da justi- do processo educacional na formação Logic of Human Destiny. New York:
ça mais eficiente, assim como de me- de habilidades que permitem às pes- Pantheon Books, 2000.
lhores mecanismos para monitorar o soas conviver com os desequilíbrios

DEZ/JAN/FEV - 10/11 - Nº 53 25
Livros

O demolidor de utopias
Resenha do livro Sabres e Utopias: visões da América Latina, de Mario Vargas Llosa. Ed. Objetiva, 2010.

ono de incrível talento lite- ignorando as limitações, contra-


D rário, agora reconhecido dições e variações do ser humano,
pelo Prêmio Nobel, o peruano como se homens e mulheres
Mario Vargas Llosa é também um fossem uma argila dócil e mani-
ótimo escritor de crônicas po- pulável capaz de se ajustar a um
líticas. E, ao contrário de muitos protótipo abstrato, concebido
de seus colegas, ele não é um pela razão filosófica ou pelo
puxa-saco de caudilhos de es- dogma religioso com total des-
querda, e sim um incansável prezo pelas circunstâncias con-
defensor da democracia liberal. A cretas, pelo aqui e agora, isso
coletânea de artigos reunida no contribuiu, mais do que qualquer
livro Sabres e Utopias demonstra outro fator, para incrementar o
todo o bom-senso e a racio- sofrimento e a violência”.
nalidade deste grande escritor, O nacionalismo foi um dos
qualidades raras entre os roman- maiores entraves ao desen-
cistas latino-americanos. volvimento da América Latina, e
Sob a influência de grandes por isso mesmo um alvo inces-
pensadores, como Popper, Mises sante de Vargas Llosa. O “outro”,
e Isaiah Berlin, Vargas Llosa um estrangeiro, sempre foi
defende a sociedade aberta, um A covardia “politicamente utilizado como bode expiatório
modelo liberal de pluralidade e correta”, típica dos intelectuais da para os nossos infortúnios. Os
tolerância contra todos os tipos de região, simplesmente não faz ataques aos “imperialistas”
coletivismos autoritários. Para ele, parte da personalidade de Vargas sempre alimentaram a retórica
não existem soluções definitivas Llosa. Seus princípios liberais dos oportunistas. O antiameri-
para os males que assolam a são seu único norte. Quando o canismo é a marca registrada de
humanidade. Podemos apenas presidente Lula abraçou o ditador inúmeros intelectuais latino-
evoluir, mas devemos sempre Fidel Castro, enquanto o cadáver americanos. Vargas Llosa se
evitar as tentações utópicas, do dissidente Orlando Zapata destaca neste mar de estupidez,
aquelas que prometem um pa- ainda esfriava, Vargas Llosa reconhecendo que “o naciona-
raíso terrestre e costumam en- escreveu sobre a sensação de lismo é a cultura dos incultos”. A
tregar, na realidade, o inferno. asco que vivenciara. O escritor globalização, econômica e cul-
Vargas Llosa considera a lamentou ainda as amizades do tural, tem sido uma bandeira
liberdade política e a liberdade presidente brasileiro com a constante do escritor.
econômica dois lados da mesma “escória da América Latina” e Em suma, Vargas Llosa tem
moeda. Isso fez com que ele com a teocracia iraniana. A lutado a boa luta, consciente de
rejeitasse os autoritarismos de popularidade de um governante que os liberais precisam vencer
“direita” também. A economia não representa obstáculo algum batalhas no campo das idéias,
de mercado deve sempre andar para o julgamento imparcial de mas que a guerra jamais acabará.
de mãos dadas com o Estado de Vargas Llosa. Não existem panacéias neste
Direito, com garantias individuais, A insistência das crenças utó- mundo. Devemos sempre evitar o
como a liberdade de expressão e picas abaixo da linha do Equador fanatismo, as utopias, as soluções
artística. Sua desconfiança em é um tema recorrente em suas mágicas. Precisamos disseminar
relação aos militares, que colo- crônicas. Para Vargas Llosa, não uma cultura da liberdade. Ele tem
cariam fim às ameaças marxistas há problema se a busca pela feito sua parte, sem dúvida, de
no continente, sempre foi total. utopia for uma aventura indi- forma brilhante.
Pinochet, por exemplo, era visto vidual, por meio das artes e da
como um “assassino e ladrão”. literatura. O perigo é quando se
Não existem dois pesos e duas tenta transportar tal busca para por Rodrigo Constantino
medidas, como acontece com o campo da política social. Economista e escritor
muitos de seus colegas de esquerda. Querer “moldar a sociedade

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