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Boas obras e recompensas

1 – Introdução
Frequentemente, ouvimos ou lemos sobre algumas doutrinas que trazem discussão
em nossos dias. Entre essas, a questão da Teologia da Prosperidade é um dos temas mais
recorrentes. E, no meio de nossas igrejas, a questão da Predestinação. No estudo de hoje,
trataremos de uma questão que está ligada a esses dois temas, embora neles não se esgote.
De um lado, a ideia por trás da Teologia da Prosperidade, doutrina surgida no
último século nos Estados Unidos (que teve como expoentes de sua fundação Essek
Kenyon e Kenneth Hagin), é a de que os cristãos verdadeiros não devem ter dificuldades.
Como resultado de sua fé e boas obras, os cristão devem ter sucesso em sua vida – de forma
mais visível através do sucesso financeiro e da ausência de doenças. Extrapolando essa
ideia ao seu limite, Deus retribuiria de forma direta e visível a todos as boas obras
realizadas. Aquele que serve a Deus e nele tem fé sempre obterá o que almeja. Seria como
uma relação de ação-reação: busca-se a Deus -> alcança-se o que se deseja. Algo mecânico.
Por outro lado, uma das principais críticas feitas à doutrina histórica da
Predestinação (ou da dupla predestinação) é a não-necessidade de que o cristão faça
qualquer obra, já que os escolhidos já estão determinados, assim como os não-escolhidos.
Portanto, não haveria nada que fizéssemos que pudesse mudar o desígnio divino a respeito
da Salvação. E assim sendo, as obras em nada seriam necessárias na vida cristã.
Claramente, essa é uma crítica descabida, mas mostra o outro extremo em relação ao que a
Teologia da Prosperidade prega. Se naquela as obras são certeza de sucesso para o cristão,
aqui as obras em nada se refletem no plano de Deus.
Muitas vezes a verdade está entre extremos. Aqui certamente é o caso. E será essa
questão a discutida nesse estudo.

2 – Alguns textos bíblicos


Antes de discutir a questão, vamos adquirir alguma base bíblica para subsidiar essa
discussão. Seguem alguns textos pertinentes:

Marcos 11.22-24: “Respondeu Jesus: “Tenham fé em Deus. Eu lhes asseguro que se


alguém disser a este monte: „Levante-se e atire-se no mar‟, e não duvidar em seu coração,
mas crer que acontecerá o que diz, assim lhe será feito. Portanto, eu lhes digo: Tudo o que
vocês pedirem em oração, creiam que já o receberam, e assim lhes sucederá.”
Lucas 11.9-12: “Por isso lhes digo: Peçam, e lhes será dado; busquem, e encontrarão;
batam, e a porta lhes será aberta. Pois todo o que pede, recebe; o que busca, encontra; e
àquele que bate, a porta será aberta. Qual pai, entre vocês, se o filho lhe pedir um peixe, em
lugar disso lhe dará uma cobra? Ou se pedir um ovo, lhe dará um escorpião? Se vocês,
apesar de serem maus, sabem dar boas coisas aos seus filhos, quanto mais o Pai que está
nos céus dará o Espírito Santo a quem o pedir!”
Mateus 5.12: “Bem-aventurados serão vocês quando, por minha causa, os insultarem, os
perseguirem e levantarem todo tipo de calúnia contra vocês. Alegrem-se e regozijem-se,
porque grande é a sua recompensa nos céus, pois da mesma forma perseguiram os profetas
que viveram antes de vocês”
Hebreus 11.6: “Sem fé é impossível agradar a Deus, pois quem dele se aproxima precisa
crer que ele existe e que recompensa aqueles que o buscam.”
Mateus 10.41-42: “Quem recebe vocês, recebe a mim; e quem me recebe, recebe aquele
que me enviou. Quem recebe um profeta, porque ele é profeta, receberá a recompensa de
profeta, e quem recebe um justo, porque ele é justo, receberá a recompensa de justo. E se
alguém der mesmo que seja apenas um copo de água fria a um destes pequeninos, porque
ele é meu discípulo, eu lhes asseguro que não perderá a sua recompensa.”
1 Coríntios 3.8-15: “O que planta e o que rega têm um só propósito, e cada um será
recompensado de acordo com o seu próprio trabalho. Pois nós somos cooperadores de
Deus; vocês são lavoura de Deus e edifício de Deus. Conforme a graça de Deus que me foi
concedida, eu, como sábio construtor, lancei o alicerce, e outro está construindo sobre ele.
Contudo, veja cada um como constrói. Porque ninguém pode colocar outro alicerce além do
que já está posto, que é Jesus Cristo. Se alguém constrói sobre esse alicerce usando ouro,
prata, pedras preciosas, madeira, feno ou palha, sua obra será mostrada, porque o Dia a
trará à luz; pois será revelada pelo fogo, que provará a qualidade da obra de cada um. Se o
que alguém construiu permanecer, esse receberá recompensa. Se o que alguém construiu se
queimar, esse sofrerá prejuízo; contudo, será salvo como alguém que escapa através do
fogo.”
Romanos 8.28-30: “Sabemos que Deus age em todas as coisas para o bem daqueles que o
amam, e dos que foram chamados de acordo com o seu propósito. Pois aqueles que de
antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a
fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, também
chamou; aos que chamou, também justificou; aos que justificou, também glorificou.”
João 16.33: ““Eu lhes disse essas coisas para que em mim vocês tenham paz. Neste mundo
vocês terão aflições; contudo, tenham ânimo! Eu venci o mundo”
Lucas 12.30-32: “Pois o mundo pagão é que corre atrás dessas coisas; mas o Pai sabe que
vocês precisam delas. Busquem, pois, o Reino de Deus, e essas coisas lhes serão
acrescentadas. Não tenham medo, pequeno rebanho, pois foi do agrado do Pai dar-lhes o
Reino. Vendam o que têm e dêem esmolas. Façam para vocês bolsas que não se gastem
com o tempo, um tesouro nos céus que não se acabe, onde ladrão algum chega perto e
nenhuma traça destrói. Pois onde estiver o seu tesouro, ali também estará o seu coração.”

3 – Desenvolvendo o tema
Diante dos textos expostos, a primeira questão a ser tratada é a diferenciação entre
recompensa e salvação. São coisas distintas. Enquanto a salvação vêm apenas pela fé em
Cristo Jesus, não sendo resultado de obra humana alguma, mas sim do desígnio de Deus, as
boas obras são sinais desse desígnio e são recompensadas por Deus. Esta primeira
diferenciação é importante. Nada fazemos para alcançar a salvação. Mas, as boas coisas que
fazemos certamente serão recompensadas, por mais simples que sejam.
Mas, que tipo de recompensa seria essa? Qualquer coisa que pedirmos com fé, como
parece afirmar Jesus em uma leitura apressada dos dois primeiros textos acima? Seria
verdadeira a ideia da Teologia da Prosperidade, portanto? Certamente que não. De maneira
simétrica, os dois últimos textos citados mostram o quanto essa ideia é enganosa. Jesus
afirma que no mundo teremos aflições, de forma que é necessário que nos exorte a ter bom
ânimo. Além disso, ele demonstra o quanto é enganosa e errada a preocupação com as
riquezas e tesouros desse mundo. Os tesouros que Jesus recomenda ao homem buscar são
os tesouros celestiais.
A questão a ser respondida, frente a esses pontos já desenvolvidos, é, então, de que
forma as boas obras são recompensadas, como afirmam os textos lidos. É o que faremos em
seguida.

4 – Galardão e recompensas
Basicamente há três formas de recompensa para nossas obras: recompensas diretas,
recompensas indiretas e galardão. Falemos sobre cada uma delas.
Primeiramente, as recompensas diretas. Talvez elas sejam o que mais se aproxima
da Teologia da Prosperidade. Se estudar com dedicação para um exame que farei,
provavelmente obterei um bom resultado. Se dedicar anos de minha vida ao meu
crescimento profissional, provavelmente terei algum sucesso. A relação entre essas ações e
seus resultados muitas vezes é direta. Pode-se dizer que são os frutos de nossas ações.
Também nos relacionamentos, se dedicamo-nos a alguém, provavelmente essa pessoa terá
mais estima por nós. E também na obra de Deus é assim. Se investirmos nossos recursos –
tempo, orações, dinheiro – provavelmente veremos progresso na obra de Deus – e Deus nos
recompensará com essa alegria. Se tudo isso é certo, o ponto a que precisamos nos ater é
que nem sempre as boas obras são recompensadas diretamente. Essa é a falha da Teologia
da Prosperidade. Nem todos que estudam e se dedicam a fazer uma prova serão
recompensados com aprovações e sucesso. Por mais que tenha investido na minha vida
profissional, não estou livre de mudanças no mercado de trabalho e de colegas desonestos,
por exemplo. E também na obra de Deus é assim. Se dedicar meu tempo e recursos, nem
por isso posso ter certeza de que verei as pessoas de que gosto aceitando a Cristo e minha
Igreja crescendo. As coisas na vida não funcionam dessa maneira simples. Talvez a
Teologia da Prosperidade faça sucesso por conta disso – ser simples e fácil de aceitar para
muitos. Mas, isso não a torna verdadeira. Se fosse tudo assim tão simples, Jesus não teria
porque dizer que no mundo teríamos aflições. Por que não recebemos todas as recompensas
de forma direta? Há diversos motivos. Um deles pode ser deduzido do que Jesus fala no
exemplo do filho que pede um peixe. Certamente o pai não lhe daria uma cobra no lugar.
Mas, invertamos o exemplo. Será que um pai responsável daria uma cobra venenosa para
um filho, se ele lhe pedisse? Certamente que não. Pois esse é o caso. Na nossa ignorância,
muitas vezes pedimos coisas que não nos fariam bem se fossem concedidas. E Deus, na sua
misericórdia, faz o bem não nos atendendo. Portanto, fica claro porque Deus não atende a
todos pedidos, contrario sensu ao que o texto de Marcos 11 e Lucas 11 afirmariam, numa
leitura rasteira e despreocupada. O dia que Deus quisesse castigar os homens, começaria a
conceder tudo que eles pedissem... Há outro ponto: não estamos sós nesse mundo. Nossas
ações e vidas estão ligadas às de outras pessoas. Portanto, como não conhecemos até que
ponto se estendem essas ligações, nunca podemos saber o que há por trás dos
acontecimentos totalmente. Por exemplo, talvez eu não consiga sucesso no concurso que
almejo por Deus ter reservado essa vaga para outra pessoa – e a vaga fazer parte do projeto
de Deus na vida daquela pessoa. Outro exemplo: por mais que alguém ore para que Deus
permita que ele namore com uma pessoa da qual gosta, certamente Deus não atenderia essa
oração sabendo que a outra pessoa não seria feliz com quem está orando (e vice-versa).
Portanto, nem tudo é recompensado diretamente, porque a vida é complexa e interligada.
Atos trazem consequências. E somente Deus conhece todas as variáveis que estão
envolvidas em cada acontecimento. Em suma, nem tudo é recompensado diretamente, da
maneira como queremos, por Deus conhecer o que é melhor para nós e para os outros e se
guiar por isso – e não pelos nossos pedidos – para guiar nosso futuro. E no caso do sucesso
financeiro? Acontece o mesmo. Tenhamos certeza de que ficar rico certamente não é algo
necessariamente bom para todas as pessoas. Há quem viverá melhor sem conseguir o
dinheiro que almeja – e com ele a arrogância, a perda dos valores, etc.
Falemos do segundo tipo de recompensa: as recompensas indiretas. Quando
fazemos algo de bom, trazemos muitas recompensas indiretas. Por exemplo, se eu estudo
para um concurso, posso não passar na prova. Mas, terei adquirido conhecimentos,
disciplina, uma melhor capacidade de me expressar e raciocinar. Todas essas coisas são
úteis. Se sou um profissional dedicado, além de obter sucesso profissional, ajudo para o
desenvolvimento da sociedade (a depender do que faço, ajudo mais ou ajudo menos). E
também na obra de Deus. Se eu vou até o culto no domingo à noite, além de ter a alegria de
cultuar a Deus e as bênçãos da comunhão e da Palavra, indiretamente tenho recompensas –
fico mais motivado para a semana, ajudo no número das pessoas na Igreja (e a animar às
pessoas que freqüentam à igreja). Portanto, há muitas recompensas indiretas envolvidas em
nossas ações. Não devemos nunca deixar de observá-las. Muitas vezes, por desconsiderá-
las é que não entendemos o que se passa em nossas vidas. Esse é outro ponto fraco da
Teologia da Prosperidade.
Mas, não é tudo. Também há o galardão, que é prometido em muitos textos.
Afirmar categoricamente como seria o galardão nos céus, seria temerário. Porém,
certamente que tudo que fazemos de positivo será recompensado na outra vida. Portanto,
nada é perdido. Então devemos fazer boas obras pensando em ser recompensados depois
nos céus? Certamente que não. Devemos fazer as boas obras porque elas são boas e são
uma forma de louvor a Deus, que é bom. Buscai em primeiro lugar o Reino de Deus, e as
demais coisas serão acrescentadas. Aqui entram as recompensas indiretas e aqui entra o
galardão. Mas, vejam bem – busca-se o Reino de Deus e não busca-se as demais coisas.
E quanto à crítica à predestinação? Certamente ela é fruto de um mau entendimento.
Primeiramente, quem é salvo não deixará de fazer algo pelo Reino de Deus por já saber que
Deus tem todos os escolhidos determinados. Se a pessoa é salva, ela fará o que precisa
fazer, pois o Espírito a guiará a isso. Além disso, fazendo boas obras, somos
recompensados indiretamente com o sentimento de estar fazendo o que é correto e
agradando a Deus. Portanto, esse pensamento calculista certamente não faz parte do
coração transformado por Deus.

5 – Conclusão
Infelizmente, esse estudo foi idealizado para apenas uma aula de Escola Dominical,
de forma que pode parecer superficial em muitos pontos – que certamente mereciam ser
mais bem desenvolvidos. Porém, de tudo isso, que fiquem três lições principais: 1 – Nem
todas as recompensas são diretas, pois também há recompensas indiretas e o galardão aos
salvos, 2 – Todas as boas obras são recompensadas, de forma que não devemos nos
preocupar com injustiças, pois Deus é justo e a tudo vê, 3 – Devemos confiar em Deus, que
a tudo julgará e viver em paz, pois por maiores que sejam as aflições, as promessas de Deus
não falham.

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