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CONTRATO DE DEPÓSITO

72. Noção

O contrato de depósito (art. 1185º CC) tem por objecto a guarda (custódia)
de uma coisa. É esta a obrigação dominante no negócio: o depositário recebe a
coisa para a guardar.

Preceituando o art. 1185º CC que o depósito é um contrato pelo qual uma


das partes entrega à outra uma coisa, afirma esta disposição a sua entrega
real. Não havendo entrega, não há depósito. Sem entrega da coisa, pode
haver, quanto muito, um contrato-promessa de depósito, que tem por objecto a
realização de um negócio jurídico e não a guarda de uma coisa, e que são
aplicáveis os arts. 410º segs. e não arts. 1185º segs. CC.

O depósito é as mais das vezes efectuado pelo proprietário ou dono da


coisa. Mas nada impede, que seja constituído por titulares de outros direitos,
como pelo usufrutuário, locatário, etc. O art. 1192º CC, prevê inclusivamente a
possibilidade de o depósito ter sido efectuado por quem não tenha direito a
reter a coisa.

A afirmação de que o depositário há-de guardar a coisa e restitui-la, quando


ela lhe for exigida, não obsta a que as partes convencionem que a restituição
haja de ser feita independentemente de interpelação nesse sentido. O próprio
depositário pode ter legítimo interesse em efectuar a restituição antes de esta
lhe ser exigida, para se libertar do dever que assumiu, quando no tempo
ultrapasse o prazo fixado para a guarda da coisa ou quando tenha justa causa
para o fazer (art. 1201º CC).

Entre as modalidades possíveis de depósito, o Código Civil destacou o


depósito de coisa controvertida feito pelos dos litigantes (regulado nos arts.
1202 segs. CC) e o depósito irregular (arts. 1205º e 1206º CC) sem aludir ao
depósito judicial.

73. Obrigações do depositário

Guardar a coisa, significa, providenciar acerca da sua conservação material,


isto é, mantê-la no estado em que foi recebida, defendendo-a dos perigos de
subtracção, destruição ou dano. A realização destes fins requer do depositário
certa actividade, de conteúdo elástico e variável segundo a natureza da coisa.

No desempenho da sua missão, o depositário não está subordinado às


ordens ou à direcção do dono da coisa.

A obrigação de restituir também está contida na noção de depósito (art.


1187º-C e 1185º CC). A restituição deve ter lugar, quando o depositante a

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exigir. O prazo considera-se fixado em favor do depositante, mesmo que o
depositário seja oneroso (art. 1194º CC).

A coisa deve ser restituída ao depositante ou aos seus sucessores


devidamente habilitados e não a terceiros.

74. Obrigações do depositante

O pagamento da retribuição (art. 1199º-a CC) só tem lugar nos casos de


depósito oneroso. Sendo vários os depositários, cada um deles terá, em
princípio, direito à sua quota na retribuição global.

O depositário goza, em relação a este crédito, do direito de retenção sobre a


coisa depositada.

O depositante é obrigado a indemnizar o depositário pelos prejuízos sofridos


em consequência do depósito, salvo se aquele houver procedido sem culpa.
Esta restrição põe em relevo a circunstância de os prejuízos deverem, em
princípio, correr por conta do depositário, com risco do próprio negócio.

As indemnizações a que se referem o art. 1199º-b CC têm lugar tanto no


depósito onerosos, como no gratuito. A lei não distingue, visto essas
obrigações não constituírem o correspectivo ou a contraprestação da obrigação
assumida pelo depositário.

Para garantia destas obrigações goza também o depositário do direito de


retenção (art. 755º/1-e CC).

75. Depósito irregular

“Diz-se irregular o depósito que tem por objecto coisas fungíveis” (art. 1205º
CC).

No depósito, quando regularmente constituído, o depositário deve guardar e


restituir eadem res, móvel ou imóvel, que lhe foi entregue, mesmo que se trate
de coisas que normalmente sejam fungíveis ou consumíveis. Devendo a
restituição ser feita, não in natura, mas apenas em género, qualidade e
quantidade (art. 207º CC) o depósito diz-se irregular.

“Não compete ao legislador, escreve Galvão Telles, decidir a controvérsia


doutrinária, porque ao legislador só pertence resolver problemas dessa ordem,
quando isso se torne necessário à conveniente estruturação das instituições ou
à resolução dos conflitos de interesses. Não é o caso. Por isso o projecto,
adoptando a denominação corrente de depósito irregular, e sem tomar posição
no debate sobre a sua fisionomia jurídica, limita-se a definir os seus efeitos e a
mandar aplicar-lhe, em princípio, as disposições sobre o mútuo. Esta remissão
não significa atribuição da natureza do mútuo, mas extensão do seu regime,
que se justifica por motivos de ordem prática e económica, atendendo a que no

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depósito irregular, como no mútuo, se faz entrega de objectos fungíveis, com
translação do domínio e consequente obrigação de restituição genérica”.

No depósito irregular, o fim principal continua a ser a guarda da coisa, a sua


segurança económica, portanto a satisfação dum interesse do tradens, e só
acessoriamente a lei atribui ao accipiens poderes de disposição. Em
conclusão, mútuo e depósito irregular têm ambos a mesma causa genérica,
mas diversa a causa específica”.

“Consideram-se aplicáveis ao depósito irregular, na medida do possível as


normas relativas ao contrato de mútuo” (art. 1206º CC). Como regras aplicáveis
do contrato de mútuo ao contrato de depósito tem-se: arts. 1143º, 1144º CC,
em virtude da translação do domínio, tornam-se indirectamente aplicáveis ao
depósito irregular as normas reguladoras do risco nos contratos de alienação
com eficácia real (arts. 408º e 796º CC); o art. 1148º/1 CC é aplicável ao
depósito irregular, pois é em atenção à natureza fungível da coisa que se
faculta ao devedor o prazo de trinta dias para cumprir a obrigação. São ainda
aplicáveis as disposições dos arts. 1149º e 1151º CC; a do art. 1150º CC
confunde-se com os direitos normais do depositante.

As disposições dos arts. 1145º, 1146º e 1147º CC que se referem ao mútuo


oneroso são inaplicáveis.

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