You are on page 1of 6

Perturbação Pós – Stress Traumático

Sandra Zanchin

Resumo: No presente trabalho é feita uma abordagem sumária acerca das principais
características da Perturbação Pós - Stress Traumático (PTSD). São, igualmente, exploradas
questões como o diagnóstico, avaliação e eficácia da intervenção cognitivo –
comportamental.
Palavras – Chave: PTDS, diagnóstico, avaliação, intervenção cognitivo – comportamental

Abstract: In this work a summary approach was made over the main characteristics of Post
Traumatic Stress Disorder (PTSD). Are equally explored issues like diagnosis, evaluation
and efficacy of the cognitive behavioral intervention.
Key – Words: PTSD, diagnosis, evaluation, cognitive behavioral intervention

Introdução
Desde o inicio da humanidade que os acontecimentos traumáticos são experienciados,
reflectindo, por conseguinte, o esforço da literatura que, ao longo de mais de cem de anos,
incide na descrição da noção de trauma e consequentes reacções psicológicas fase a situações
traumáticas (Alberto, 1999).
De acordo com a Associação Americana de Psiquiatria (2002), um acontecimento
traumático consiste na “ (…) experiência pessoal directa com um acontecimento de morte,
ameaça de morte ou ferimento grave, ou outra ameaça à integridade física; ou observar um
acontecimento que envolva morte, ferimento ou ameaça à integridade física de outra pessoa;
ou ter conhecimento acerca de uma morte violenta ou inesperada, ferimento grave ou
ameaça de morte ou ferimento vivido por um familiar ou amigo íntimo (…)” (p. 463).
No seguimento das consequências traumáticas, surge em 1980, na DSM-III a
Perturbação Pós – Stress Traumático, estabelecendo, assim, critérios para um quadro de
diagnóstico, cada vez mais preciso, como constatamos na DSM-IV-TR (2002).
Tipos de traumas e efeitos
Os traumas podem ser vividos de uma forma individual ou colectiva, e caracterizam-
se de acordo com o modo de ocorrência em: desastres naturais (inundações, sismos, tufões,
tsunamis); desastres acidentais (desastres de aviação, ferroviários, marítimos, incêndios) e
desastres causados de modo deliberado pelo Homem (combates, tortura, ataques terroristas e
também em crianças, vítimas de abuso sexual e de maus tratos, assim como em vitimas de
violação), (Anunciação, 2005).
Apesar da natureza do trauma diferir, os seus efeitos são semelhantes,
comprometendo os mecanismos habituais de adaptação. Isto faz com que o sujeito se sinta
em perigo ou ameaçado, pois os eventos traumáticos apresentam-se fora do domínio da
capacidade da pessoa para compreender ou se adaptar (Valentine, 2003).
Relativamente às consequências, Vaz Serra (2003, cit in. Oliveira, 2008) salienta que
o trauma é tanto mais grave consoante é determinado pelo ser humano com crueldade
intencional; é de duração prolongada; decorre na infância e é multifacetado.

Dados epidemiológicos e Etiologia


No que concerne à prevalência da Perturbação Pós – Stress Traumático (PTSD) os
dados a nível mundial são parcos, dependendo de factores políticos, culturais e económicos.
As estatísticas nos EUA demonstraram que 70% dos adultos já sofreram um ou mais eventos
traumáticos, destes, 20% desenvolve PTSD (Valentine, 2003) Quanto a dados nacionais,
Albuquerque, Soares, Jesus e Alves (2003, cit in. Oliveira, 2008) verificaram que pelo menos
75% das pessoas já tinha sido exposta no mínimo a um acontecimento traumático, sendo a
prevalência ao longo da vida de 7.87% e salientando-se uma diferença estatisticamente
significativa de acordo com o género (4.8% para o sexo masculino e 11.4 % para o sexo
feminino).
Vários estudos realizados sobre a etiologia da perturbação apontam para o seu carácter
multifactorial (Andersen, 1980; Yehuda e McFarlane, 1996 cit in. Anunciação, 2005). A
probabilidade de desenvolver a perturbação varia, por conseguinte, de acordo com a
interacção de factores de personalidade, genéticos, físicos, psicológicos e sociais.

Diagnóstico e Comorbilidade
Para diagnosticar a presença da Perturbação Pós – Stress Traumático é condição
necessária a exposição a um acontecimento traumático, assim como três grandes grupos de
sintomas. Deste modo, o acontecimento tem de ser reexperienciado de modo persistente
(através de pensamentos e imagens intrusivas, sonhos perturbadores, actuar ou agir como se o
acontecimento estivesse a ocorrer, flashbacks dissociativos); é manifestado um embotamento
afectivo e um evitamento face a estímulos associados ao trauma (o que traduz esforços para
evitar pensamentos, sentimentos ou conversas associadas ao trauma, uma diminuição pelo
interesse em actividades significativas assim como uma gama de afectos restringida) e uma
reactividade fisiológica (perturbações do sono, irritabilidade ou acessos de cólera,
hipervigilância, dificuldades de concentração, resposta de alarme exagerada). Quando os
sintomas têm uma duração inferior a três meses a perturbação assume a designação de
Aguda, se for superior a três meses denomina-se de Crónica. Nos casos em que o início dos
sintomas ocorre pelo menos 6 meses depois do acontecimento stressor diz-se que a
perturbação tem um início dilatado. (DSM-IV-TR, 2002).
Atendendo à questão da comorbilidade e de acordo com Starcevic (2005), é
relativamente raro encontrar doentes com PTSD que não desenvolvam outras perturbações
psicológicas, especialmente com o decorrer do tempo. Mcfarlane e Papay (1992, cit in. Maia
& Fernandes, 2003) verificaram que de acordo com os estudos publicados, 80% dos sujeitos
com PTSD tinham outras perturbações. As perturbações que coexistem mais frequentemente
são a Depressão Major, a Distimia, as Perturbações de Ansiedade e Abuso de substâncias
(Starcevic, 2005). A literatura salienta também para o surgimento de perturbações da
personalidade e quadros psicóticos (Oliveira, 2008).

Avaliação
Existem inúmeros instrumentos para avaliar a PTSD, estes podem dividir-se em três
grandes grupos: avaliação da exposição a situações traumáticas, avaliação dos sintomas da
perturbação e avaliação de outros sintomas em vitimas de trauma (Maia & Fernandes, 2003).
De acordo com a literatura os mais completos no processo de avaliação psicológica da
perturbação são a Clinician – Administred PTSD Scale (Blake et al., 1990) e a A Structured
Clinical Interview Schedule (First, Spitzer, Gibbon e Williams, 1997). Relativamente a
instrumentos aferidos para a população portuguesa existe a Escala de Avaliação da Resposta
ao Acontecimento Traumático, que permite avaliar os sintomas de PTSD, havendo uma
versão para adolescentes (McIntyre e Ventura, 1995) e outra para adultos (McIntyre, 1997).

Intervenção
As terapias cognitivo – comportamentais para as perturbações de ansiedade, podem
ser divididas em duas categorias: terapias de exposição (conjunto de técnicas com o objectivo
comum de ajudar o doente a enfrentar situações temidas) e treino de manejo da ansiedade
(visa ensinar técnicas de controlo da ansiedade através de determinadas capacidades), sendo
que para a PTSD ambas são aplicáveis (Rothbaum & Foa, 1996).
A terapia da exposição (in vivo e em imaginação), a reestruturação cognitiva e as
técnicas de manejo de ansiedade, têm demonstrado grande eficácia no tratamento.
Foa e Kozak (1986, cit in. Rothbaum & Foa, 1996) sugeriram que as estruturas do
medo nas perturbações da ansiedade continham elementos patológicos pelo que o tratamento
tinha de incluir uma modificação desses elementos. A exposição permite activar essa
estrutura e constitui uma oportunidade para corrigir a informação nela contida.
A exposição in vivo é uma técnica que consiste em colocar a pessoa na presença de
estímulos, situações e actividades que lembrem o trauma, com o objectivo de levar a uma
aceitação emocional do acontecimento, admitindo, consequentemente, que aquele pertence ao
passado. Para lidar com a generalização do perigo procede-se à realização de tarefas
comportamentais que visem eliminar os evitamentos e comportamentos de segurança
(Gouveia & Sacadura, 2003).
A exposição em imaginação ou prolongada, requer que o doente reviva mentalmente e
de um modo detalhado, o acontecimento e situação traumática, preferencialmente uma a duas
horas por dia, tanto em psicoterapia como em casa (Starcevic, 2005). A exposição repetida à
memória traumática resulta, assim, numa habituação, o que faz com que a ansiedade
associada ao trauma diminua, permitindo com que através da uma reavaliação do significado
das representações mnésicas, a pessoa possa recordar o acontecimento traumático sem
desencadear respostas intensas de medo (Foa & Kozak, 1986).
A reestruturação cognitiva implica a identificação de pensamentos automáticos
negativos e a modificação de possíveis crenças disfuncionais que os pacientes possam ter
acerca de si próprios, dos outros, do futuro, do acontecimento traumático e do mundo no
geral (Starcevic, 2005). De acordo com Ehlers e Clark (2000, cit in. Gouveia & Sacadura,
2003, p.174) os pacientes que necessitam de maior reestruturação cognitiva são aqueles:” que
sentem cólera, culpa ou vergonha como emoção predominante; interpretam o seu
comportamento ou emoções durante o evento traumático como indicando aspectos negativos
acerca de si próprios, foram expostos a violência durante um longo período de tempo”. O
objectivo da reestruturação cognitiva é tentar que os sujeitos “normalizem” os pensamentos
acerca do acontecimento traumático e alterem o seu significado (Starcevic, 2005).
As técnicas de manejo de ansiedade consistem num conjunto de técnicas que são
ensinadas com a finalidade de reduzir a tensão, ansiedade e sintomas vegetativos, permitindo,
deste modo, um aumento no controlo dos sintomas (Starcevic, 2005). O programa mais
estudado no tratamento da PTSD é o treino de inoculação ao stress, desenvolvido por
Meichenbaum (1974) e incorpora um conjunto de componentes educacionais e competências,
tais como o relaxamento muscular, a paragem de pensamento e o diálogo auto-guiado (Foa e
Meadows, 1997, cit in. Gouveia & Sacadura, 2003).
Uma das mais recentes propostas terapêuticas é a técnica de reprocessamento e
dessensibilização através de movimentos oculares (Eye movement dessensitation
reprocesseing, EMDR). Esta consiste numa forma de exposição em imaginação acompanhada
por movimentos oculares (para trás e para a frente) (Shapiro, 1995, cit in Gouveia &
Sacadura, 2003). Apesar de gerar alguma controvérsia, principalmente porque o seu
mecanismo de acção ainda não é inteiramente compreendido, alguns estudos comprovam a
sua eficácia quando comparada com intervenções psicológicas não específicas, como a escuta
activa e o relaxamento (Carlson e tal., 1998; McNally, 1999, cit in. Starcevic, 2005).

Conclusão
O presente trabalho teve como objectivo abordar o tema da Perturbação Pós - Stress
Traumático de um modo sumário e esclarecedor. Atendendo à sua dimensão não foi possível
abordar alguns aspectos que considero importantes. Saliento, por conseguinte, as teorias
explicativas da PTSD, onde destaco o modelo de processamento de Informação de Horowitz
(1979), como sendo o mais explicativo na compreensão da perturbação (Alberto, 1999). Por
fim, gostaria de referir que embora estejamos a falar da PTSD no geral, convém não esquecer
as especificidades, nomeadamente os tipos de trauma e a idade do desenvolvimento em que
ocorrem, aquando a formulação de um plano terapêutico, uma vez que faz todo o sentido
adequar a intervenção à génese do seu surgimento.
Bibliografia

- Alberto, I. (1999). Avaliação de Perturbação Pós -Stress Traumático PTSD) e as suas


consequências psicológicas em crianças e adolescentes vítimas de maltrato. Dissertação de
Doutoramento apresentada à Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da
Universidade de Coimbra.
- American Psychiatric Association (2002). Manual de Diagnóstico e Estatística das
Perturbações Mentais – texto revisto. (4º ed). Lisboa: Climepsi.
- Anunciação, C. (2005). Estratégias de Coping em Veteranos da Guerra Colonial
Portuguesa (1961-1974) com (e sem) Perturbação Pós - Stress Traumático. Dissertação de
Mestrado apresentada à Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de
Lisboa.
- Briere, J. (2004). Psychological Assessment of Adult Posttraumatic States. Phenomenology,
diagnosis and measurement (2ª ed.). American Association Washington, Dc.
- Gouveia, J. & Sacadura, C. (2003). Terapia Cognitivo – Comportamental na Perturbação
Pós – Stress Traumático. In, M.G. Pereira & J. Monteiro – Ferreira (coords), Stress
traumático: aspectos teóricos e intervenção (pp. 163 - 185). Lisboa: Climepsi Editores.
- Maia, A. & Fernandes, E. (2003). Epidemiologia da Perturbação Pós – Stress Traumático
(PTSD) e avaliação da resposta ao trauma. In, M.G. Pereira & J. Monteiro – Ferreira
(coords), Stress traumático: aspectos teóricos e intervenção (pp. 35 - 54). Lisboa: Climepsi
Editores.
- Oliveira, S. (2008). Traumas de Guerra: Traumatização Secundária das famílias dos ex.
Combatentes da Guerra Colonial. Dissertação de Mestrado apresentada à Faculdade de
Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa.
- Rothbaum, B. & Foa, E. (1996). Cognitive – Behavioral Therapy for Posttraumatic Stress
Disorder. In, B. van der Kolk, A. McFarlane & L. Weisaeth (Eds) Traumatic stress: the
effects of overwhelming experience on mind, body and society (pp.491 - 524). New York: The
Guilford Press.
- Starcevic, V. (2005).Anxiety Disorders in Adults: A clinical guide (pp. 276 - 344). Oxford:
University Press.
- Valentine, P. (2003). Trauma: definição, diagnóstico, efeitos e prevalência. In, M.G. Pereira
& J. Monteiro – Ferreira (coords), Stress traumático: aspectos teóricos e intervenção (pp. 21
- 33). Lisboa: Climepsi Editores.

You might also like