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Descartáveis urbanos: discutindo a complexidade

da população de rua e o desafio para políticas de


saúde
Urbans discarded: discussing the homeless population
complexity and the challenge for public health policies

Walter Varanda
Psicólogo, Mestre em Saúde Pública, Doutorando na linha de
Resumo
pesquisa Sociedade Contemporânea eSaúde Pública , Faculda-
de de Saúde Pública da USP.
A condição de precariedade da população adulta de rua
E-mail: wvaranda@uol.com.br é tratada no âmbito da saúde e das intervenções soci-
ais visando levantar subsídios para a implementação
Rubens de Camargo Ferreira Adorno
Livre Docente, Doutor em Saúde Pública, Professor do Departa-
de políticas públicas de saúde para essa população. A
mento de Saúde Materno-Infantil, linha de pesquisa Sociedade conceituação dessa população e sua relação com a
Contemporânea e Saúde Pública. Faculdade de Saúde Pública exclusão social, a cidade, as economias paralelas, a
da USP. globalização, as estratégias e os circuitos de sobrevi-
E-mail: radorno@usp.br vência desenvolvidos se inserem num contexto de
oposição aos mecanismos de apartação social e rom-
pimento dos vínculos familiares, bem como na forma
de tratamento institucional. A precariedade e insalu-
bridade das ruas, culminando em exposição e riscos
cumulativos requerem intervenções e formas de tra-
tamento orientadas, segundo a sua especificidade,
desafiando os conceitos gerais de universalidade,
integralidade e eqüidade do Sistema Único de Saúde.
Palavras-chave: Moradores de rua, Direitos Humanos,
Vulnerabilidade, Saúde Pública.

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Abstract Introdução
The adult homelessness is focused in the scope of the Este trabalho levanta questões relativas ao segmento
health and of social intervention intending to set up populacional urbano identificado como população
subsidies to the implementation of health public poli- adulta de rua, considerando-o um sinal emergente de
cies to this population. The conceptualization of this mudanças sócio-político-econômicas das últimas dé-
population and its relation with social exclusion, the cadas e como um problema mundial inerente às gran-
city, the underground economies, globalization, des metrópoles. Nesse sentido, procura apresentar a
strategies and the survival circuits, are inserted in a complexidade desta categoria social e o desafio para
context of opposition to the social mechanisms that as políticas públicas.
put them apart from society and breaks the family Nosso estudo foi realizado na cidade de São Paulo,
links. It is also related to institutional practices. The Brasil, a partir da pesquisa que serviu de base para ela-
precariousness and unhealthiness from the streets boração de dissertação de mestrado (Varanda, 2003). O
results in a cumulative vulnerability which demands recorte temático foi desenvolvido considerando o pro-
intervention and treatment according to a specific cesso dinâmico daquilo que vem sendo chamado de
health condition, challenging the general concepts of “vulnerabilização” dessa população, ou de sua catego-
universal access, integrality and equity of national rização enquanto população vulnerável. Processo esse
health policies. que ocorre antes mesmo da ida para as ruas, no univer-
Key Words: Human Rights, Homeless, Public hHealth, so das redes de relações das classes populares.
Vulnerability. Partindo do pressuposto de que as respostas insti-
tucionais à questão foram sendo “assumidas” pela
assistência social, por via assistencialista, e observan-
do-se atualmente um processo de justificativa “medi-
calizante” desse fenômeno. Isso é, reduzir a dimen-
são de um problema social complexo a um diagnósti-
co médico clínico, ou entendê-la na dimensão dos pre-
ceitos higienistas e sanitaristas, na ótica da remoção
das populações em circulação pelas cidades (Foucault,
1979). Considera-se que os serviços de saúde, também
tenham tendência a reproduzir esse enfoque.
A pesquisa identifica elementos que concorrem
para a fragilização da saúde de moradores de rua e
aprofunda a discussão do problema, como forma de
subsidiar a articulação entre ações no campo da saúde
pública e outras intervenções sociais e a implemen-
tação de políticas públicas para essa população. A
pesquisa também acompanhou projeto do Ministério
da Saúde na área de quatro subprefeituras da cidade
de São Paulo, realizada em parceria com a Faculdade
de Saúde Pública da USP.
A pertinência do tema população de rua e as polí-
ticas públicas de saúde amparam-se, em grande par-
te, no conceito sociológico de saúde, “que retém ao
mesmo tempo suas dimensões estruturais e políticas
e contém aspectos histórico-culturais de sua realiza-
ção (...). Introduzindo a cultura na definição do con-
ceito de Saúde demarca-se um espaçamento radical:

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ela amplia e contém as articulações da realidade so- ma” de natureza mental ou psiquiátrica. Essas catego-
cial” (Minayo, 2000). rizações são feitas pelas instituições e reconhecidas
Também parte-se do pressuposto de que esse tema ou não pelo conjunto da população de rua. Entre os
represente um desafio à Saúde Pública, no sentido de moradores de rua, ocorre uma delimitação de identida-
trazer a complexidade da construção das redes de so- des e espaços por referência ao uso do tipo de droga.
ciabilidade e suas relações com processos institucio- Essas divisões e identidades refletem também a
nais, que vêm se definindo temas e problemas, como internalização culpabilizante da fala institucional. Os
a violência, as economias paralelas, etc., no contexto usuários de álcool são chamados de bêbados, bebuns,
de desigualdades de classe, de gênero, raça/etnia, ge- alcoólatras. Há também o uso de outras drogas na rua,
ração (Adorno e col., 2004). como a maconha, o crack e a cocaína. Para os que usam
álcool, de maneira geral, os usuários de outras dro-
gas são chamados de nóia. Os que usam crack tam-
Quem é a população de rua – termi-
bém são chamados de “pedreiros”. O crack, que esteve
nologia e conceitos muito popularizado entre moradores de rua mais jo-
vens, pode estar cedendo lugar à maconha, a julgar
Buscando situar a pluralidade e as identidades que se
pelas narrativas de freqüentadores de instituições
constroem entre a população de rua, destacamos as
para a população de rua. O uso de maconha não inter-
nomeações pelas quais os moradores de rua se identi-
fere tanto no acesso aos serviços e programas insti-
ficam, mesmo que estas reproduzam os enquadres
tucionais, como ocorre com os usuários de outras dro-
institucionais que lhes são impostos, como morador
gas, que apresentam alterações de comportamento
de rua, ou termos que se referem a práticas voltadas
conflitivas no ambiente institucional.
para grupos específicos. Refletindo a situação relacional entre os grupos e
É bastante comum, entre aqueles que dormem nas as instituições, as classificações operam, de certa
ruas, o uso do termo maloqueiro, que se refere a quem maneira, com um conceito de “cronicidade”, que rela-
usa a maloca, ou mocó – lugar de permanência de pe- ciona subjetivamente a aparência e comportamento
quenos grupos durante o dia, ou usado para o pernoi- do indivíduo a determinado “estágio de degradação”
te, com, normalmente, colchões velhos, algum canto na significação do que seja a situação de rua. Assim,
reservado para os pertences pessoais (roupas e docu- termos como “maloqueiro” passam a ser utilizados de
mentos) e, às vezes, utensílios de cozinha. Quem usa acordo com a posição de discriminação em que cada
albergues são identificados simplesmente como usu- um se coloca ou é colocado. Na presença de um as-
ário de albergue ou albergado. “Trecheiro” também é sistente social ou agente de saúde é comum que um
bastante usado entre os moradores de rua; o termo é indivíduo procure se mostrar menos “maloqueiro” do
oriundo dos trabalhadores que transitavam de uma que outro. As classificações usadas variam conforme
cidade para outra a procura de trabalho, continua sen- a natureza do olhar, seja de fora ou de dentro desse
do usado pejorativamente por uns e naturalmente por meio, ou da ótica institucional. Nesse caso, pode pre-
quem já teve a experiência de trecho (referindo-se a dominar critérios emocionais, religiosos, médicos ou
esse tipo de percurso). Os “trecheiros” se opõem aos sanitaristas.
“pardais”, que são, na sua visão, os moradores de rua, Vieira e col. (1994, p.93), estudando o tema das po-
que se fixam e não trabalham (Vieira, 1999). As atribui- pulações de rua, distingue “ficar na rua, circunstan-
ções de valor ao nomadismo também são referidas por cialmente”, “estar na rua, recentemente” e “ser de rua,
Magni (1995), pela oposição dos sujeitos pesquisados permanentemente”. Essa distinção se funda na visão
ao estado de carência e passividade do morador de rua da permanência na situação de rua, como fator de cro-
que se fixa num determinado lugar. nificação. Nesse estudo, consideramos que a situação
O enquadre institucional “medicalizante” e hege- de rua adquire uma maior complexidade na medida
mônico na área dos serviços de saúde tem interferido em que se considera o intrincado conjunto de fatores
nas categorizações da população, segundo o uso de que se inter-relacionam no processo de ida para a rua
drogas e sua forma de comportamento como “proble- e nas práticas assistenciais existentes.

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A situação também é mais complexa à medida que “The Unequal Homeless: Men on the Streets, women
observamos a construção de várias categorias, a partir in their place” traz o relato de entrevistas de 202 ho-
de funções, estudos acadêmicos ou de seu uso a par- mens e 178 mulheres. Nele, ela afirma que o problema
tir da própria incorporação, via reflexividade social. da rua é uma questão de lar (home), de imperativos
Quem cata papel, latinha e cobre na rua, por exemplo, culturais que são criados e reforçados pela ideologia
são os catadores – trabalhadores que vivem na rua –, da família nuclear (Pássaro, 1999), dando ênfase à
reconhecidos legalmente por essa ocupação profissi- questão da masculinidade e dos diferentes papéis de
onal. Grande parte deles se considera morador de rua, gênero na relação com a rua.
mas muitos, que têm o seu núcleo familiar constituí- Em outro artigo da mesma revista, Clarke (1999)
do, estão vinculados a associações ou cooperativas e traz o seguinte depoimento: ‘Home is where the heart
nunca estiveram na situação de dependência direta is’. My heart and soul have always been with my
de serviços públicos assistenciais, morando nas ruas. family, my children. I always had that, I always had
As classificações também se ordenam em função my ‘home’. What I didn’t have was a roof over my head:
da ótica dos estudos feitos sobre essa população. Nes- I was roofless, not homeless.
se sentido, é significativo pensar na contraposição Esta diferenciação entre homeless e roofless ou
entre a identificação do sujeito em função da situa- houseless também aparece na distinção entre o seg-
ção de rua, como se observa é no caso brasileiro, com mento dos sem-teto e a população de rua na cidade de
a classificação em relação à ausência de moradia, nos São Paulo. Os sem-teto têm suas conexões familiares
países anglo-saxônicos. e comunitárias, de forma que possibilitaram o surgi-
Nos Estados Unidos, usa-se o termo homeless, mas mento de um movimento social com conquistas políti-
nem sempre com um único significado. Pode, por exem- cas concretas de moradias populares, através da ocu-
plo, referir-se àqueles que estão em habitações que não pação de vários prédios públicos no centro da cidade
atendem às necessidades e padrões mínimos de ha- e a subseqüente luta pela regulamentação. Esse mo-
bitabilidade, ou, como a atribuído pelo National Coali- vimento é freqüentemente identificado como dos
tion for the Homeless (NCH, 2002), às pessoas que en- encortiçados, por ter se originado com a insatisfação
frentam alguma situação de desabrigo, incluindo pes- de moradores de cortiços, com suas condições
soas que, mesmo tendo um local para morar, esporadi- habitacionais e pela exploração dos proprietários dos
camente usam os albergues ou dormem nas ruas por imóveis.
falta de abrigamento público adequado e disponível. A referência explícita à moradia na identificação
Snow e Anderson (1998) atribuem ao desabrigo, de moradores de rua é feita de forma mais ampla, com
uma dimensão residencial, uma dimensão de apoio o termo sem-teto (homeless), usado principalmente
familiar e uma dimensão de valor moral e de dignida- nos Estados Unidos, ou com o termo sem domicílio
de baseada num papel desempenhado. Como primei- fixo (SDF), usado na França, o que vincula a noção de
ra dimensão entende-se a ausência de moradia con- direito a uma residência permanente (Magni, 2002).
vencional permanente. A segunda dimensão, diz res- Outros termos, como “mendigos” ou “pedintes”,
peito aos laços familiares, às redes sociais, à ligação quase em desuso, não correspondem às característi-
entre indivíduos e a sociedade e às várias configura- cas gerais dessa população, embora façam parte do
ções de atenuação dos laços familiares. “O terceiro imaginário social. Os primeiros estudos sobre a po-
traço distintivo do desabrigo é o grau de dignidade e pulação de rua do Brasil já identificavam ex-trabalha-
de valor moral associado às diversas categorias de dores vivendo de maneira socializada na rua (Neves,
desabrigo. De um ponto de vista sociológico, ser mo- 1983) e associa a mendicância à “uma cadeia de de-
rador de rua é, entre outras coisas, ser o detentor de gradação das condições de trabalho ao longo de duas
um papel básico ou de um status modelar” (p. 26). a três gerações” (p. 31). A associação da imagem do
A pesquisa de Joanne Pássaro, radicada em servo sofredor - oriundo da tradição religiosa cristã
Manhattan, partindo de uma perspectiva de gênero, que trata da resignação e do sofrimento de Cristo - ao
também analisa as circunstâncias do morar nas ruas. sofrimento na rua fez surgir o termo sofredor de rua,
Na coletânea intitulada Homelessness, seu artigo com conotação religiosa e explícita referência ao so-

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frimento causado pelas situações de injustiça social. ções relevantes sobre as questões investigadas; estar
Com o surgimento de uma Pastoral de Rua e da Comu- em situação de rua por mais de dois anos, pernoitan-
nidade dos Sofredores, a partir de 1978 (Castelvecchi, do mais freqüentemente nos logradouros públicos; e
1985, p. 109), esse conceito passou a ser adotado mais conhecer os serviços públicos de albergamento, “co-
largamente durante muitos anos, cedendo lugar a ou- munidades”, “Casas de Convivência”, “bocas de rango1”
tros termos trazidos com a ampliação da rede de as- e unidades de saúde. Outros moradores de rua ouvi-
sistência no município, principalmente na década de dos em campo ou constantes em documentos institu-
1990. Alguns antigos moradores de rua ainda se iden- cionais também são mencionados neste artigo. Esses
tificam “sofredor de rua”, referindo-se, porém, na documentos referem-se a registros de programas
maioria das vezes, à situação de carência e fragilida- socioeducativos e de geração de renda de duas insti-
de em que se encontram. tuições sociais que atuam na área central da cidade.
O Censo dos Moradores de Rua da Cidade de São Outra importante fonte de informações foram os
Paulo (SAS/FIPE, 2000), adota os termos “população relatórios gerados pelo projeto de Implementação de
de rua” e “população moradora de rua”, abrangendo Políticas Públicas de Saúde, voltadas à população de
todos os moradores de rua da cidade: “todas as pesso- rua, realizado pela Faculdade de Saúde Pública da
as que não têm moradia e que pernoitam nos logra- USP, apoiado pelo Ministério da Saúde. Durante o ano
douros da cidade – praças, calçadas, marquises, jar- de 2001, iniciou-se um processo de reuniões com as
dins, baixos de viadutos – ou casarões abandonados, subprefeituras da Sé, de Pinheiros, da Mooca e da La-
mocós, cemitérios, carcaças de veículos, terrenos bal- pa, que se estenderam a cursos de capacitação para
dios ou depósitos de papelão e sucata. (...) foram igual- um conjunto diversificado de profissionais vincula-
mente considerados moradores de rua aquelas pesso- dos ao poder público em diferentes níveis e atuação,
as, ou famílias, que, também sem moradia, pernoitam mas tendo em comum o trabalho de intervenção dire-
em albergues ou abrigos, sejam eles mantidos pelo ta ou indireta com a população de rua, como assisten-
poder público ou privados”. (p. 5). tes sociais, enfermeiros, médicos, psicólogos e coor-
denadores de unidades de saúde.

O Percurso da Pesquisa
A Trajetória da Situação de Pobreza
Além da aproximação da realidade da rua a partir da
convivência com seus moradores em locais de presta-
para a Situação de Rua
ção de serviços sociais e programas sócio-educativos No perfil de uma das pessoas entrevistadas, a única
durante vários anos por um dos autores desse artigo, mulher, encontramos um histórico de migrações, fi-
também foi feita a triangulação de diferentes instru- lhos, casamentos, separações, vivência nas ruas e em
mentos metodológicos. Utilizamos a observação parti- instituições, experiência com a prostituição, contami-
cipante, realizou-se entrevistas em profundidade com nação por HIV, e várias experiências com trabalho
cinco informantes-chave, com grande experiência de informal.
vida nas ruas e entrevistas com educadores da rede As particularidades das experiências de cada um
de assistência social do município, com amplo conhe- e de como cada pessoa reage aos seus efeitos na sua
cimento das relações institucionais. trajetória para a rua e depois que aí se instala, impe-
Foram selecionados para a entrevista quatro ho- de generalizações, todavia não se pode restringir essa
mens e uma mulher (proporção encontrada nos dados trajetória ao universo subjetivo e à individualidade
censitários), escolhidos dentro dos seguintes critéri- dos processos de fragilização dessas pessoas. É pos-
os básicos: ter o perfil preponderante da população sível observar, a partir dos dados macroestruturais e
de rua, evitando-se ocorrências isoladas (como alta es- conjunturais pertinentes às três últimas décadas, al-
colaridade, população jovem, etc.); possuir informa- guma relação entre as transformações socioeconômi-

1 Termos usualmente utilizados pelos moradores de rua para referirem-se aos equipamentos públicos ou locais de prestação de servi-
ços, como alimentação e higiene, normalmente restritos a essa população.

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cas desse período e o surgimento do fenômeno “popu- ruas com a ausência de políticas públicas de apoio.
lação de rua”, tal como se configura hoje, associados M. L. saiu de São Paulo com a família, deixou mu-
a um amplo processo de exclusão social (Bursztyn e lher e filhos na casa do sogro em outra cidade e
Araújo, 1997). retornou a São Paulo para “procurar trabalho”. O di-
Para Escorel (1999), a exclusão social é um “pro- nheiro acabou, ele conheceu a rua e “esqueceu” a famí-
cesso no qual – no limite – os indivíduos são reduzi- lia. A., era o filho adotivo que fazia os trabalhos mais
dos à condição de animal laborans, cuja única ativida- difíceis, dos quais os “irmãos” eram poupados, desde
de é a sua preservação biológica, e na qual estão im- criança. Não estudou como eles, mas poderia conti-
possibilitados de exercício pleno das potencialidades nuar como um agregado para trabalhar nos negócios
da condição humana”. da família que o adotou. Hoje, vive em albergues, re-
Castell (1998) também evita o modelo estático de correndo à bebida eventualmente, quando passa dias
análise da exclusão social, que fixam os indivíduos na rua sem se alimentar, sem cuidados de higiene e
em áreas de destituição e salienta o processo dinâmi- sem dormir adequadamente. R. G. conheceu a rua
co que os fazem transitar “da integração à vulnerabi- quando ainda era criança, catava ferro velho com o
lidade ou deslizar da vulnerabilidade para a inexis- pai. Manifestou sua revolta contra os professores,
tência social”. Ele prefere o termo “desfiliação para quando estava na escola primária, com os monitores
designar o desfecho deste processo”, a tratar de “esta- da Febem, quando ficou interno, e com os trabalhado-
dos de privação”. res sociais das instituições que freqüenta hoje. Na
Os movimentos sociais denunciam os mecanismos sua juventude aderiu à criminalidade, hoje vive nas
de opressão e exclusão social fundamentados na isen- ruas, esforçando-se para manter um padrão de mo-
ção da responsabilidade social do poder público e da ralidade à qual aderiu por via religiosa, entretanto
sociedade civil, apontando fatores diretamente rela- apresenta dificuldades em manter vínculos e continua
cionados ao desemprego, precarização do trabalho e reproduzindo o processo revolta-indisciplina-punição
degradação da qualidade de vida, como a valorização em suas relações com instituições de amparo social.
especulativa do capital, a tecnologização do processo Rosa (1999) pesquisou reportagens sobre as “Vi-
produtivo. As interpretações macroestruturais e o das de Rua” em jornais da cidade e a primeira notícia
discurso dos movimentos sociais têm apelo nos pro- citada, de 1972, relaciona vadiagem, delinqüência e
cessos das identidades e na construção da exclusão, desemprego, abordando a marginalização em relação
além da negociação cotidiana com os enquadres e as ao mercado de trabalho. A partir dos anos 1970, come-
falas institucionais (Adorno, 1997; 1999) . çaram a aparecer com mais freqüência o registro de
As polarizações econômicas, a reestruturação pessoas vivendo nas ruas da cidade sem “ganho defini-
demográfica e as novas dinâmicas do trabalho criam do” (Stoffels, 1977) e cuja identificação foi sendo subs-
uma situação propícia para a concentração de riqueza tituída de mendigos por “moradores de rua” ou “po-
no mundo e particularmente no Brasil, deixando gra- pulação de rua”. Escorel (1999) situa o crescimento do
ves seqüelas sociais sem a contrapartida do estado número de pessoas e o surgimento de grupos moran-
diante da miserabilidade crônica da população (Dow- do nas ruas, a partir do final da década de 1980 (ten-
bor, 1998). A “dissolução do consenso do welfare” (Gid- do como referência a cidade do Rio de Janeiro), quan-
dens, 1999), não dá ao indivíduo muitas alternativas do “sua presença passou a ser percebida como inopor-
diante da perda de poder aquisitivo. Mesmo que no tuna mas, principalmente, ameaçadora” (p .238).
Brasil existam soluções informais e às vezes ilícitas O quadro a seguir mostra o crescimento dessa po-
para se enfrentar os problemas da moradia – através pulação na cidade de São Paulo na última década, se-
da ocupação de áreas de mananciais e ocupação de gundo relatórios da SAS/FIPE2. Há diferenças entre os
prédios públicos, ou ainda para enfrentar o desempre- critérios metodológicos adotados, especialmente entre
go – através do trabalho informal, como é o caso dos os levantamentos de 1991, 2000 e 2003 e as contagens
ambulantes, um grande número de pessoas acaba nas de 1994, 1996 e 1998, com menor rigor estatístico.

2 Pesquisas e levantamentos censitários realizados pela SAS – Secretaria da Assistência Social do município de São Paulo e FIPE –
Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas.

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Quadro 1 - Crescimento da População de Rua na Cidade de São Paulo

Ano Pop. de rua (total) Utiliza albergue Abriga-se na rua


1991 3.852 460 3.392
1994 4.449 1.749 2.800
1996 5.334 1.913 3.421
1998 6.453 3.416 3.037
2000 8.706 3.693 5.013
2003 10.394 6.186 4.208

Pode-se destacar que, apesar do crescimento da as experiências vividas na relação de assistência,


população que passou a freqüentar os albergues e cen- ocorridas durante diferentes fases deste processo “.
tros de referência da prefeitura em função do aumen- Numa análise linear, ele identificou três fases nesse
to das vagas, permanece grande a população que de- processo: a de fragilidade, relacionada à perda do
clarou viver permanentemente nas ruas. As diferen- emprego; a de dependência dos serviços sociais (en-
ças entre o total da população de rua e a quantidade tendida no contexto de países europeus) e aquela ca-
de pessoas com acesso às vagas têm merecido uma racterizada pela ruptura dos vínculos sociais, “com
discussão que remete a uma série de questões: o usu- um acúmulo de fracassos que conduz a um alto grau
ário de drogas e de álcool que é preterido pelos alber- de marginalização”.
gues; questões de gênero e de raça/etnia; e também a A realidade brasileira revela pessoas que já nasce-
relação desses alojamentos com a condição de habita- ram num contexto familiar cujos membros estavam
ção. Hoje, admite-se um percentual de usuários de al- fora do mercado formal de trabalho, numa realidade
bergues que, sendo trabalhadores de baixa qualifica- de ausência de políticas de suporte social. D. A. traba-
ção, utilizam esse tipo de equipamento durante a se- lhou como doméstica, passou pela experiência dos
mana, por terem salários insuficientes para o custo “bicos”, que não exigem nenhuma qualificação pro-
do transporte para os bairros onde moram. fissional, e chegou a depender da ajuda de vizinhos
A demanda pelos locais de moradia com acesso para sobreviver. Pessoas que sobrevivem na pobreza
mais fácil ao trabalho e às facilidades urbanas dispo- e distantes de uma suposta rede de proteção social
nibilizadas na área central atrai a população de baixa experimentam vínculos sociais extremamente frá-
renda para as ocupações clandestinas, cortiços, fave- geis, que tendem a se fortalecer ou se romper de acor-
las à beira dos rios ou morros que circundam as áreas do com as dificuldades que a realidade lhes apresenta
urbanizadas. Algumas pessoas transitaram por essas e conforme o acúmulo de experiências desestruturan-
regiões de pobreza e pelos trabalhos informais e tem- tes ao longo da vida.
porários antes de chegarem às ruas, como mostra o Usamos o termo “experiências desestruturantes”
relato de D. A., sobre o período em que morou num para designar de maneira geral as experiências indi-
cortiço na Mooca, com o marido e 3 filhos: viduais, que em vez de fortalecer os recursos pesso-
... nóis fumo morar num lugar por nome de inferni- ais que capacitam o indivíduo para enfrentar os desa-
nho, óia bem, já se chama inferninho; (...) era um quarto fios que a vida lhe oferece, minam seu potencial de
e cozinha... (...); eu trabalhava, arrumei um serviço na organização interna, sua capacidade de articulação
feira, prá vender flores (...) e para ajudar a carregar com o meio em que vive, sua auto-imagem, auto-esti-
caminhão; eu ganhava trinta reais, vinte eu dava pra ma e sua identidade dentro do grupo; esses eventos
ele ajudar a pagar o aluguel e dez eu ficava guardando se inter-relacionam com as questões estruturais da
pra se acontecesse qualquer coisa com as crianças. sociedade. De forma mais radical, Bursztyn e Araújo
Paugam (1999) aborda o “conceito de desqualifi- (1997) confrontam os efeitos da migração e constru-
cação social, que caracteriza o movimento de expul- ção de Brasília com a “insustentabilidade da sobrevi-
são gradativa, para fora do mercado de trabalho (...) e vência” para pessoas que vivem das sobras da cidade,

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identificadas por eles como a “população do lixo”. Ao No Brasil, onde a família tem uma importância
tratar da exclusão, Escorel (1999) se refere ao “pro- enquanto rede (Sarti, 2003) e acaba exercendo um
cesso que envolve trajetórias de vulnerabilidade, fra- papel da rede de proteção social, a desvinculação
gilidade ou precariedade e até ruptura dos vínculos sociofamiliar mostra-se relevante no processo de ida
nas dimensões sociofamiliar, do trabalho, das repre- para as ruas. Como analisa Escorel (1999), as “vulne-
sentações culturais, da cidadania e da vida humana”. rabilidades ocupacionais e de rendimentos” também
As questões da moradia e pobreza se entrecruzam estavam associadas a “outras fragilidades de ordem
também com a convivência com os circuitos de habitacional, afetiva, de aumento da exposição à dis-
marginalidade (Adorno, 1999) e com a dependência criminação e à violência”.
institucional, observando-se ainda efeitos desestrutu-
rantes, presentes ou mesmo desencadeados a partir
Nos Porões da Cidade
de intervenções do poder público no contexto das rela-
ções sociais nos meios mais afetados pela violência: Entrar na rua significa desenvolver um processo com-
“... aí a Erundina pôs a gente num cinema véio, (...) pensatório em relação às perdas e começar a usar ou-
fechava de maconheiro, a rota todo dia chegava lá, ma- tros recursos de sobrevivência, até então ignorados,
taram um nos meus pés; (...) os cara saia da Celso Gar- e assimilar novas formas de organização que permi-
cia para vim roubar (...); os cara do cinema véio ia pra tem a satisfação das necessidades e a superação dos
Celso Garcia; cara de Febem saía da Febem para vim obstáculos que a cidade apresenta. Entretanto, o que
pra cá pro cinema véio da rua da Mooca (...)” (relato as tornam visíveis é justamente a situação de carên-
de D.A.). cia e deficiência, que caracterizam um novo modo de
A vizinhança com a criminalidade pode ser um ele- se vincularem ao contexto urbano.
mento dificultador na relação com o meio em que se As perdas acumuladas e as deficiências encontra-
vive, gerando uma lacuna nos referenciais do indiví- das são classificadas por Snow & Anderson (1998), em
duo que vai se desvinculando não somente dos fami- quatro categorias de déficits que (de) limitam a vida
liares mas também do seu grupo social, facilitando a dos moradores de rua: deficiências físicas e mentais,
transição para a rua. No caso de D. A., restavam os vín- falta de capital humano, falta de recursos materiais e
culos com o marido e filhos. Mas quando o marido falta de margem social. Essas deficiências, entendi-
ficou desempregado, ambos começaram a beber mais das dessa forma por comparação com a população
e a brigar mais, até que ela começou a morar sem o domiciliada, podem estar associadas tanto a causas
marido numa ocupação clandestina. Passou a traba- como a conseqüências por estarem vivendo nas ruas,
lhar com a coleta de materiais recicláveis e estreitar mas são fatores determinantes nas alternativas de
o contato com crianças que moravam na rua e freqüen- sobrevivência encontradas.
tavam sua casa. Perdeu a guarda dos filhos e alternou Do ponto de vista dos agentes sociais que traba-
a permanência em ocupações 3 clandestinas, alber- lham com a população de rua, a perspectiva analítica
gues, instituições de saúde e moradia nas ruas, onde da carência e a impossibilidade de acesso a oportu-
se mantém até hoje. nidades de trabalho se confundem freqüentemente
No processo de desclassificação social, Paugam com a identificação de diversos tipos e graus de defi-
(1999) identifica a desestabilização das relações com ciências de seus usuários. Isso resulta numa rede de
o outro, a situação de fragilidade (diminuição de ren- prestação de serviços que interfere nas estratégias
da e degradação das condições de vida), e finalmente adotadas pelos moradores de rua que freqüentemente
a ruptura dos vínculos sociais, quando as pessoas assumem os papéis que lhe são conferidos quando isto
“saem das malhas da proteção social e deparam-se se torna conveniente.
com situações em grau crescente de marginalidade, M. S., de aproximadamente 40 anos, afirmava que
onde a miséria é sinônimo de dessocialização” (p. 76). era humilhante pedir dinheiro “de cara limpa”, mas

3 Ocupação, nesse texto, refere-se a um imóvel público ou privado ocupado e apropriado por pessoas sem residência fixa, como forma
de conquistar o direito de morar.

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alcoolizado ele conseguia facilmente, nos faróis. J. U. valor, como rádios, relógios, ferramentas e utensílios
tomava conta de carros em frente a uma unidade de de cozinha. Alguns objetos são furtados para o uso
saúde da Mooca. Enquanto algumas pessoas se acos- pessoal, mas qualquer objeto que seja comercializável
tumam facilmente a pedir, outros têm no trabalho a nos depósitos de materiais recicláveis, na feira do rolo
única fonte monetária. Na interseção entre essas duas e por receptadores de objetos roubados podem se
situações encontramos aqueles que realizam algum ti- transformar em fonte de renda, como é o caso dos ca-
po de trabalho para “merecer” o dinheiro que recebem. bos elétricos da iluminação pública.
Algumas ocupações, como é o caso dos ambulantes Os alcoolistas relatam que, ao contrário da droga,
e catadores de materiais recicláveis, são executadas a bebida, como a “pinga do Japonês”, que segundo R.
com regularidade por alguns trabalhadores, em outros S., custa 80 centavos a garrafa de 900 ml, não justifica
casos observa-se menor constância da ocupação re- furtos, é muita barata e pode ser encontrada em qual-
munerada, como é o caso dos descarregadores de ca- quer lugar. Bastam alguns centavos para a “intera” de
minhões, guardador de carros, carregadores de feiras uma garrafa que pode ser compartilhada por um grupo
e pequenos serviços de manutenção. Para certos tipos de várias pessoas.
de trabalhos braçais, como o dos catadores e carrega- Outra forma de obtenção de bebida, drogas ou al-
dores, o uso da bebida chega a ser estimulado pelo gum dinheiro é o comércio ou troca pelo sexo, como é
empregador, o que facilita a identificação desse tipo o caso das usuárias de crack, que circulam pelas ruas,
de trabalho com o circuito marginal e afasta o traba- mas não necessariamente moram nas ruas. Os relatos
lhador de outras possibilidades de inserção social. indicam que elas se dispõem ao sexo mais facilmen-
A pesquisa da FIPE (2000) revelou que 60,4% dos te, se comparadas com outras mulheres e homens,
moradores de rua encontrados nos logradouros afir- como afirma R. S.:
maram que o trabalho é a fonte exclusiva de seus ren- “Ali é a pedrinha, a pedra. Aí pede um cigarro, eu
dimentos. Entretanto o fato de buscarem a rede pú- também não fumo, não tem. Tem cachaça, aí ela senta.
blica de assistência indica que já entraram em situa- Senta, toma uma cachacinha, aí meu... o bicho pega
ção de precarização. (...). Aí não tem como”.

O “Rolo” das Economias Paralelas Itinerância e Desabrigo


Em paralelo com um grande comércio de materiais Com o surgimento dos albergues públicos e escassea-
recicláveis, a “feira do rolo” é uma das formas de co- mento de renda, o trecheiro passou a utilizar o alber-
mercialização de materiais reaproveitáveis encontra- gamento gratuito e aos poucos foi conhecendo a rua
dos nas ruas. Essa feira agrega vendedores, que com- como recurso na falta de alternativas de pernoite. Na
pram objetos que não têm mais serventia aos mora- falta de trabalho e com restrições explícitas de pode-
dores da região, ou mesmo ambulantes, que comer- res locais, que não toleram a permanência de mora-
cializam mercadorias de baixo custo, adquiridas no dores de rua por muitos dias, muitas cidades forçam
comércio atacadista. Objetos roubados, achados e a migração dessas pessoas para os grandes centros,
aqueles que são utilizados como moeda de troca no fornecendo passes de viagem sob a justificativa de
comércio de drogas, também acabam indo parar na ajudarem-nos a chegar ao seu destino ou ao local de
feira do rolo. A maioria são objetos usados e até com origem (Vieira, 1999). A distribuição de passes e a im-
pequenos defeitos, como peças decorativas, ferramen- plantação de albergues interferem no nomadismo des-
tas, lanternas, vasos sanitários, liquidificadores, rá- sa população, estimulando a sua mobilidade por um
dios, relógios, ferros de passar, discos de vinil, bolsas lado e facilitando sua fixação nos grandes centros por
usadas, bijuterias, botijões de gás, revistas, roupas, outro. Diferentes circuitos (Adorno, 1997) recebem,
sapatos, capacetes, móveis usados, etc. dessa forma, ainda que indiretamente, o reconheci-
Tanto na rua como dentro das instituições, são re- mento e a anuência do estado e da sociedade civil. A
latados casos de furtos de objetos pessoais, como rou- rede pública de albergamento e de assistência que se
pas, relógios, sapatos, cobertores e objetos de maior instalou nos últimos anos vem definindo os contor-

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nos dos circuitos mais adotados pelo segmento da to é reservado para se instalar um fogareiro, construí-
população de rua que circula entre as cidades. do, muitas vezes, por uma lata de 18 litros e tijolos,
Na falta de dinheiro e de albergues, os centros co- nesse caso encontram-se também panelas, talheres e
merciais – livre do trânsito de pedestres à noite, com reservatórios de água para cozinhar e lavar os utensí-
amplas marquises para a proteção da chuva, próximos lios de cozinha. Esses utensílios são normalmente
a bares e restaurantes, que oferecem as sobras de co- provenientes da rua mesmo, são vasilhas descartadas
mida e banheiro, caso se esteja com boa apresenta- nos lixos ou latas adaptadas. A presença de catadores
ção, com farto papelão para se improvisar uma cama se faz notar quando a maloca tem carrinhos de feira,
– são uma boa opção para passar a noite. Fora dos horá- carrinhos de supermercado ou carroça para a coleta
rios comerciais, esses lugares oferecem os melhores de papelão, que freqüentemente contém materiais
locais para o pernoite sem o incômodo de residências recicláveis coletados e ainda não comercializados.
cujos moradores poderiam acionar a polícia ou os ser- Esses carrinhos ou carroças também servem para
viços de resgate da prefeitura. Em alguns casos a pre- guardar pertences pessoais, como roupas, documen-
sença de moradores de rua na porta de estabelecimen- tos, remédios e objetos de maior valor, que se encon-
tos comerciais pode servir como uma segurança adi- tram na rua. As mulheres acumulam mais objetos que
cional contra a violência urbana. Alguns relatos men- os homens. Entre os objetos guardados pelas mulhe-
cionam a autorização para que dois ou três moradores res, encontram-se objetos decorativos, bonecas, per-
de rua dormissem em entradas de casas comerciais fumes, batons, bijuterias e maiores quantidades de
ou nas proximidades de residências, como cita E.: roupas. Os homens guardam poucas peças de roupas,
“Se o porteiro está sozinho no prédio e aí tem os e costumam acumular materiais que podem ser
cara dormindo na rua vizinho ali, se acontecer algu- comercializados nos ferros-velhos, mas sempre por
ma coisa ali os cara dormindo ali viram também, en- poucos dias, como peças de motores, cabos elétricos
tão o cara é uma testemunha para alguma coisa que e papelão.
acontecer”. A população que dorme nas ruas se distingue dos
A arquitetura antimendigo, como passou a ser de- albergados por ter uma maior concentração de alcoo-
nominada desde a década de 1980, inclui artefatos que listas crônicos, que fazem uso da bebida alcoólica
impedem a permanência de moradores de rua em cer- mais freqüentemente. Permanecem mais tempo ocio-
tos locais, dificultando o pernoite em locais mais abri- sos e possuem menos disposição para os programas
gados e isoladamente (Jornal O Estado de S. Paulo, 26/ coletivos orientados institucionalmente. O percen-
04/1998). São tubos de água que mantêm as calçadas tual de alcoolistas nos albergues depende do rigor
molhadas, ferragens pontiagudas, gradis que cercam de cada uma dessas instituições, como atestam os
espaços desocupados sob marquises, pisos irregula- relatos de 26 históricos de uso de bebidas alcoólicas
res, superfícies inclinadas e luzes, que se aliam a es- entre 28 entrevistados, num estudo sobre população
tratégias menos camufladas como guardas noturnos albergada, em um dos albergues da cidade de São
e ameaças explícitas. Aqueles que preferem dormir Paulo (Nasser, 2001, p. 186). Para Nasser, “a bebida
sozinhos ou com poucos amigos evitam a aglomera- se introduziu na vida de todos eles como um hábito
ção dos lugares disponíveis na região central e optam familiar cultivado desde a tenra idade, e que, com o
pelo o garimpo de lugares mais retirados do centro. passar dos anos, foi se intensificando, até interme-
Cada um desses lugares, que se configura como o diar, na fase adulta, a relação entre o trabalho e a
espaço de moradia de um grupo de pessoas, é identi- vida doméstica, estabelecendo uma forma de lazer
ficado como uma maloca, construída através do que que podia se realizar em curto tempo, com poucos
diversos autores identificam como bricolages (Santos, recursos financeiros” (p. 186).
2003). Pode se constituir simplesmente de colchões
velhos e cobertores (os colchões podem ser substituí-
Gênero e Sexualidade
dos por papelões, mais facilmente encontrados nas
ruas), com, às vezes, alguns utensílios usados para a Se culturalmente a bebida afrouxa o moralismo e es-
alimentação, para a água de beber e para a pinga. timula a libido, na rua a bebida atua na censura quan-
Quando se prepara algum alimento no local, um can- do é necessário ignorar o desconforto, a sujeira, a pro-

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ximidade de outras pessoas, a possibilidade de con- As mulheres que não contribuem financeiramen-
trair doenças ou para compensar a dificuldade de es- te com as famílias também podem sofrer rejeição.
colher o parceiro/parceira. Nesse sentido, U. afirma: Segundo D. A., a mãe não a deixou ficar em casa, quan-
“quando a gente bebe fica mais fácil pegar mulher” do saiu da rua e retornou à sua cidade de origem, por-
ou “quando tá bêbado dorme com qualquer malo- que não havia levado dinheiro. Ela montou uma bar-
queira (...) até com homem tem gente que vai”. raca no quintal da casa da mãe, no estilo que se faz na
Sem a bebida, a prevenção é mais comum: “Quem rua e dormia lá (sic). Sarti (2003), encontrou o mesmo
não bebe tem o comportamento diferente como..., vou referencial de rejeição de meninas nas classes pobres,
dar um exemplo: o J. C. tá lá, o J. C. tá sem beber, o por questões econômicas. No seu estudo, a moral se-
comportamento dele é completamente diferente. (...) xual ou mesmo a gravidez não era o principal motivo
Ele está com uma mulher lá, mas tá sabendo o que está de rompimento com a família, como se acreditava.
fazendo. O cara quando bebe, ele perde o rumo” (R.S.).
Algumas mulheres usam o sexo para obter prote-
Políticas Públicas para os Descartá-
ção ou mesmo amparo financeiro para a sobrevivência,
mas ainda assim a prostituição aparece nas ruas de veis Urbanos
maneiras diferentes. Em primeiro lugar esse artifício
Um grande contingente de pessoas ainda não usa os
não é exclusivo das mulheres, mas não se comenta aber-
serviços públicos oficiais ou pouco se relaciona com
tamente sobre o caso de homens que se prostituem.
a assistência instituída, buscando alternativas para
Alguns lugares são mais propícios às práticas se-
o banho, necessidades fisiológicas, alimentação e ves-
xuais que outros, assim como um dos albergues da
tuário. Vivendo literalmente nas ruas, usam os depó-
cidade é lembrado pela presença marcante de homos-
sitos de ferro velho ou papelão, postos de gasolina,
sexuais: “... porque o [albergue X] tem muito travesti
bicas, torneiras públicas, chafarizes, igrejas, banhei-
lá dentro. O [X] é a forma fatal, aparece entendeu? (...)
ros públicos, instalações de vizinhos domiciliados,
é o ponto lá... eu fiquei lá, lá é demais. Você tá dor-
lojas e supermercados e serviços de higiene pagos
mindo, o cara tá passando a mão procurando... Se você
(SAS, 2000). São vitimizadas pelos problemas estru-
marcar touca...”.
turais e têm sua situação agravada pela contínua per-
O grau de exposição das mulheres que vivem nas
manência em condições insalubres, sujeitas à violên-
ruas não permite que elas possam ora dizer sim, e
ora dizer não a parceiros sexuais na própria rua, com cia ou ainda sob a ação contínua de álcool e drogas.
a mesma facilidade que isso acontece entre a popu- Os programas sociais desenvolvidos nesse contex-
lação domiciliada. Algumas delas não conseguem se to trazem a marca ideológica do descarte social de
defender quando são forçadas a praticar sexo, outras uma população que é tratada como excedente. São
usam a bebida ou assumem comportamentos bastan- programas marcados pela institucionalização de prá-
te agressivos para se defenderem e enfrentar os ho- ticas que visam à retirada dessas pessoas das ruas,
mens que insistem em ter relações sexuais, entretan- oferecendo, entretanto poucas possibilidades de uma
to, o uso da bebida pode deixá-las ainda mais vulne- reestruturação de suas vidas.
ráveis. Sem dinheiro, as pessoas vão se distancian- O descarte introjetado pelo próprio sujeito o desti-
do dos familiares e amigos. “E eu vou voltar de mãos tui de seu papel social, como no caso de A., que ao sair
abanando?”, é o que respondem aqueles que têm para do albergue pela manhã, dizia sair andando pela cida-
onde voltar, quando existe esta possibilidade. Alguns de, “sem rumo”. Uma das alternativas é a dissociação
que se esforçam para voltar, muitas vezes motivados da realidade que o cerca, sob a indução de bebidas.
pelo desejo de reencontrarem parentes, acabam “Estar sem rumo” é mais do que um recurso de lin-
retornando a São Paulo na mesma condição de rua. guagem ou alusão à situação momentânea de não ter
A perda do papel de provedor afeta principalmente o onde ficar. Pode ser estendido ao posicionamento do
homem, que busca reforçar a sua identidade mascu- indivíduo em relação a projetos de vida possíveis. A
lina de outras formas, por exemplo, através dos pa- ausência, insuficiência ou inadequação de políticas
péis a ele atribuídos, conforme a configuração dos públicas em relação ao processo de exclusão e vulne-
grupos das malocas. rabilidades cumulativas não significa somente uma

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posição de neutralidade ou incapacidade do estado em a situação da saúde dos moradores de rua não mudou
lidar com o problema da população de rua, mas pelo de maneira significativa nos últimos anos (Vieira e
contrário reafirma a penalização do indivíduo pela col., 1994; Castelvecchi, 1985).
situação em que ele se encontra. Os profissionais de saúde têm relatado experiên-
A concepção do descarte social aproxima as pes- cias pontuais de sucesso, quadros epidemiológicos
soas do lixo urbano e tal fenômeno pode estar relaci- restritos a algumas unidades de saúde e centros de
onado com o aumento do número de pessoas que pas- referência para álcool e drogas, como bases para o
saram a sobreviver com os materiais descartados pela desenvolvimento e implementação de políticas públi-
cidade. A esse respeito, Santos (2003) refere-se ao cas de saúde para esta população.
“novo paradigma para compreendermos uma das di- É interessante destacar que a Fundação Nacional
mensões mais perversas da sociedade globalizada: a de Saúde (Funasa) vem atualmente definindo como
relação nodal entre o descarte de produtos e materi- “populações vulneráveis” os povos indígenas – consi-
ais industrializados e o descarte de seres humanos”. derados a partir do critério da Funai, como aqueles
A vida na rua e a sua proximidade com o lixo urba- que vivem em aldeias reconhecidas oficialmente –, os
no a torna um alvo de ações de limpeza das vias públi- remanescentes de quilombos e os moradores dos as-
cas e das medidas encampadas pelos órgãos públicos sentamentos rurais (Funasa, 2004). Pensando no tema
de ação social. O recolhimento do lixo urbano e a “re- da eqüidade, ressaltamos a questão da necessidade de
moção” de pessoas para espaços “coletivos” de servi- discutir as políticas públicas de saúde que, em vez de
ços assistenciais, que comportam centenas de pesso- definirem os programas específicos voltados a grupos
as, são ações muito próximas, ainda que executadas elegidos focalmente, passassem a reconhecer os dife-
por profissionais de diferentes secretarias. rentes problemas de acesso, as questões locais, geo-
A internalização desse processo gera uma certa gráficas, culturais e toda a especificidade que envol-
resignação, que interfere na forma de lidar com as ve a relação com a saúde e a insalubridade dos dife-
questões de saúde e dificulta a relação com os profis- rentes grupos populacionais como “populações com
sionais dos serviços de saúde. Um grande número de necessidades especiais”, uma política orientada para
pessoas que vive nas ruas, raramente procura o servi- a população de rua assumiria contornos específicos,
ço de saúde, enquanto suporta a presença dos sinto- tendo em vista a apartação dessa população da orga-
mas de doenças, recorrendo à rede ambulatorial em nização espacial e social e urbana, e as conseqüênci-
último caso, com a acumulação de vários problemas as desse processo em todos os níveis da sua saúde e
de saúde. Muitas pessoas só se submetem a tratamen- na acessibilidade dos recursos públicos.
tos de saúde quando são conduzidas pelo serviço de Ainda que as situações ideais para a recuperação
resgate ou por meio de instituições de assistência, da qualidade de vida dessas pessoas sejam utópicas,
portanto encontram dificuldades em recorrer a eles as práticas de redução de danos e riscos sociais apon-
espontaneamente e ou ainda pela reincidência de do- tam para possibilidade de intervenções visando à
enças mal tratadas, como tem acontecido com casos melhoria da saúde nos circuitos de sobrevivência e de
de tuberculose. A familiaridade com as doenças (refe- acordo com a vida destas pessoas. “Entendendo-se os
rida por Gregis, 2002, entre meninos de rua, pela “mor- circuitos como formas dinâmicas que transitam pelas
te anunciada e narrada”) que vão se instalando e se vias da identidade e da exclusão” (Adorno, 1999, p. 94).
agravando lentamente em decorrência da debilidade
física e da perda da imunidade, se estende também às
Considerações Finais
doenças sexualmente transmissíveis ou adquiridas
através da convivência com outras pessoas doentes. Ao longo dos últimos anos foi possível identificar uma
O contraste entre as vulnerabilidades caracterís- cultura própria da rua, num contexto de liminaridade
ticas de quem vive nessa situação e a insuficiência social e econômica (Turner, 1974), caracterizada por
dos recursos obtidos através da rede de serviços de mecanismos de defesas contra os danos a que os mora-
saúde – grupos organizados da sociedade civil ou pa- dores de rua estão submetidos. Mesmo vindo de dife-
trocinados pelo poder público – são indicadores de que rentes localidades e com diferentes bagagens para

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enfrentar as adversidades da rua, a população que hoje das, como as ações de limpeza pública e recolhimento
sobrevive nessa circunstância vem criando uma cultu- dos pertences de moradores de rua ou métodos coerci-
ra alternativa, e não raro, distante das convenções e tivos, com o intuito de afastar essa população do cen-
sistemas de organização de outros grupos sociais. tro da cidade, por outro, há a implementação de políti-
Isso significa que entrar nesse circuito implica em cas focais, via assistência social e assistencialismo,
negociar a identidade em um contexto liminar. que reforçam a segmentação dessa população. Esta-
A busca de identidade dentro dos limites margi- belecer políticas públicas universais, como o SUS, con-
nais da sociedade pode também estar se revelando na siderando o princípio de eqüidade, significa estabele-
necessidade de ora se misturar e ora se distinguir nos cer procedimentos, formas de atendimento e diagnós-
diferentes circuitos liminares que se entrecruzam na tico flexíveis que considerem inclusive a atenção
rua, por exemplo: da pobreza, das relações familiares, extramuros ou em meio aberto estendendo o serviço
da delinqüência, da violência e do trabalho desquali- de saúde a essa população.
ficado, ou mesmo procurar negar ou distanciar-se des-
te contexto quando se tem, por necessidade, de utili- Referências
zar os equipamentos voltados a esta população.
A vinculação do tema população de rua e a saúde ADORNO, R. C. F. Identidade e exclusão. In: BARBO-
pública pode se evidenciar, não somente devido às SA, R. M. (Org.). Sexualidades pelo avesso: direi-
precárias condições de saúde em que estas pessoas tos, identidades e poder. São Paulo: editora 34; Rio
vivem, mas no tocante à articulação de políticas públi- de janeiro: IMS/UERJ, 1999. p. 89-97.
cas integradoras das populações com necessidades ADORNO, R. C. F. Os imponderáveis circuitos dos vul-
especiais tendo em vista os princípios da universali- neráveis cidadãos: trajetórias de crianças e jovens
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SUS (SUS, 2003). da Justiça e da Defesa da Cidadania. Cidadania,
A universalização da saúde apresenta o desafio de verso e reverso. São Paulo: Imprensa Oficial, 1997/
intervir na realidade tal como ela está constituída. 1998. p. 93-109.
Hoje a população de rua é parte do cenário urbano, ADORNO, R. C. F. Qualidade de vida e formas de vida
requerendo intervenções que levem em conta como ela ameaçadas: a saúde e o cenário contemporâneo.
se constituiu e as formas de sobrevivências ali desen- São Paulo, 1997. Tese (Livre docência em Saúde
volvidas. Pública) - Faculdade de Saúde Pública Universida-
Segundo o princípio da eqüidade (SUS, 2003) os de de São Paulo.
“serviços de saúde devem considerar que em cada po- BURSZTYN, M.; ARAÚJO, C. H. Da utopia à exclusão:
pulação existem grupos que vivem de forma diferen- vivendo nas ruas em Brasília. Rio de Janeiro:
te, ou seja, cada grupo ou classe social ou região tem Garamond, 1997.
seus problemas específicos, tem diferenças no modo
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de viver, de adoecer e de ter oportunidades de satisfa- postas de Geraldo Horácio de Paula Souza para a
zer suas necessidades de vida”. “Assim os serviços de cidade (1925-1945). São Carlos: Rima, 2002.
saúde devem saber quais são as diferenças dos gru-
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oferecendo mais a quem mais precisa, diminuindo as
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mente os desiguais”. Isso implica, em primeiro lugar, vidas eu daria! São Paulo: Edições Paulinas, 1985.
na realização de estudos epidemiológicos da popula- CLARKE, D.; Lifting The voices of homeless women:
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Recebido em: 14/11/2003


Reapresentado em: 09/03/2004
Aprovado em: 13/04/2004

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