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Será mesmo que esses escravos dos tempos bíblicos eram mal tratados? Será que
Elohim é cúmplice de injustiça?
Para estudarmos a questão, vamos olhar para os tempos bíblicos e compará-los com
os tempos atuais. Abaixo, um quadro comparativo entre o que era a escravidão bíblica,
versus o que ocorre hoje em dia se, por exemplo, nos endividamos junto a bancos.
Uma pessoa vendia seu trabalho e quitava O trabalho de uma pessoa pode não ser
todas as suas dívidas (Lv. 25:39) suficiente para quitar suas dívidas
O período máximo desse trabalho era de 7 Não há período máximo, e muitas vezes
anos, após o qual as dívidas eram as pessoas trabalham pelo resto das suas
anuladas. (Ex. 21:2) vidas para pagarem dívidas.
Ganhavam uma generosa porção de Nada ganham por pagar suas dívidas.
recompensa, se o trabalho tivesse feito
prosperar o seu senhor. (Dt. 15:12)
Terras produtivas que fossem vendidas Nada do que for pago será jamais
retornavam aos seus donos no Yovel restituído.
(Jubileu), quer ao proprietário inicial, quer
aos seus descendentes. (Lv. 25:29)
Não é difícil perceber que a Bíblia era bem mais justa do que a sociedade atual, e bem mais branda para com os endividados. Ocorre apenas
que a tradução do termo como “escravo” dá uma falsa impressão de que os israelitas mais pobres eram oprimidos com o aval de Elohim.
Mas ainda não temos a resposta à nossa indagação: Como poderia um senhor matar ao seu escravo e ficar livre?
Na realidade, a Torah diz que se o senhor sequer ferir o seu escravo, este imediatamente se tornará livre:
“E quando alguém ferir o olho do seu servo, ou o olho da sua serva, e o danificar, o deixará ir livre pelo seu olho. E se tirar o dente do seu
servo, ou o dente da sua serva, o deixará ir livre pelo seu dente.” (Shemot/Êxodo 21:26-27)
Além disso, deveria pagar compensação adequada por aquilo que feriu:
“Olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé.” (Shemot/Êxodo 21:24)
À exceção dos tsedukim (saduceus), a interpretação comum do passuk (versículo) acima sempre foi a de que a Torah se refere a valores
compensatórios, e não ao ferir de volta o agressor.
Mas, então, como podemos entender a passagem inicial? É simples: A passagem inicial deixa claro que a pessoa que assassinar o seu servo
será responsabilizada:
“Se alguém ferir a seu servo, ou a sua serva, com pau, e morrer debaixo da sua mão, certamente será castigado.” (Shemot/Êxodo 21:20)
Porém, a situação é relativamente delicada, pois a punição para o assassinato era a morte. A Torah portanto se preocupa com a situação de
um servo morrer de causas naturais, e o seu senhor ser responsabilizado pela morte do servo.
Por isso a Torah diz: “Porém se sobreviver por um ou dois dias, não será castigado, porque é dinheiro seu.”
A última frase é chave para a compreensão: “porque é dinheiro seu.” Em outras palavras: por que um senhor mataria a um servo, e
prejudicaria a si mesmo? O trabalho do servo era de sua posse, e portanto o servo era “seu dinheiro”. Assim sendo, não se pode partir do
pressuposto de que o servo necessariamente morreu por maus tratos. O servo pode ter morrido de causas naturais.
A Torah não está determinando um prazo máximo para que a família do servo assassinado veja a sua retribuição. Por isso mesmo a Torah
não diz “um dia” ou “dois dias”, e sim “um ou dois dias”. Em outras palavras, se morrer muito tempo depois de ter sido supostamente
agredido, o seu senhor pode até ser responsabilizado pelo ferimento, mas não se pode partir do pressuposto de que a morte foi causada pelo
senhor.
O que podemos concluir disso? Que até mesmo aqueles que são réus perante a Torah merecem ser tratados com justiça. Uma pessoa não
pode, nem deve, ser punida de forma excessiva, e sem que se tenha o devido cuidado para verificar até onde vai a extensão da culpa.
Que podemos extrair de lição sobre isso na prática? Muitas vezes quando uma pessoa comete ato contra outra, nossa tendência é de nos
solidarizarmos com o que foi prejudicado. Se nós fomos os prejudicados, então, nos sentimos no direito de querermos ver a ruína do outro.
Todavia, a Torah nos ensina que devemos tomar cuidado para não cometermos injustiça em nossas reações.
Rapidamente, uma situação pode se inverter e, caso a justiça não seja equilibrada, um réu pode se tornar vítima de uma punição desmedida.