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4. As palavras de Cristo que servem como base O Papa explica agora os dois relatos da Criação.
para este ciclo de catequeses são retiradas de O primeiro relato está em Gênesis capítulo 1.
Mateus 19, 3-8: Trata-se do ciclo de sete dias em que houve a
criação do mundo, na qual o ser humano é
“Alguns fariseus aproximaram-se de Jesus e,
criado no último dia, “à imagem e semelhança
para experimentá-lo, perguntaram: “É permitido
ao homem despedir sua mulher por qualquer
de Deus. O segundo relato está em Gênesis
motivo?” Ele respondeu: “Nunca lestes que o capítulo 2. Ele descreve a criação do homem a
Criador, desde o princípio, os fez homem e partir “do pó” vivificado com o “sopro de
mulher e disse: „Por isso, o homem deixará pai e Deus”, bem como a criação da mulher a partir
mãe e se unirá à sua mulher, e os dois formarão da “costela” de Adão.
uma só carne‟? De modo que eles já não são dois,
mas uma só carne. Portanto, o que Deus uniu, o 9. A primeira narrativa da criação do homem é
homem não separe”. Perguntaram: “Como então cronologicamente posterior à segunda. O
Moisés mandou dar atestado de divórcio e conteúdo da primeira narrativa da criação do
despedir a mulher?” Jesus respondeu: “Moisés homem, embora cronologicamente posterior, tem
permitiu despedir a mulher, por causa da dureza sobretudo um caráter teológico. (TdC 2)
do vosso coração. Mas não foi assim desde o
princípio.” 10. Nessa primeira narrativa, a criação do homem
se diferencia da obra anterior de Deus. A criação
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17. É significativo que o primeiro homem 20. O homem está "só": isto quer dizer que,
(„ādām), criado do "pó da terra", só depois da através da própria humanidade, através daquilo
criação da primeira mulher seja definido como que ele é, o homem é constituído em uma relação
“varão” ou “macho” („îš). Assim, portanto, com o próprio Deus que é única, exclusiva e
quando Deus-Javé pronuncia as palavras a irrepetível. Pode-se afirmar com certeza que o
respeito da solidão, refere-as à solidão do "ser homem assim constituído tem o conhecimento e a
humano" (tanto o homem quanto a mulher) consciência do sentido do próprio corpo. E isto
enquanto tal, e não só à do “macho” ou “varão”. baseado na experiência da solidão original. (TdC
Essa solidão tem 2 significados: um que deriva da 6)
própria criatura do homem, isto é, da sua
humanidade (o que é evidente na narrativa de Gn
2), e o outro que deriva da relação macho-fêmea, A Unidade Original
o que é evidente, de certo modo, com base no
primeiro significado. (TdC 5) 21. “Então o Senhor Deus fez vir sobre o homem
um profundo sono, e ele adormeceu. Tirou-lhe
18. “Então o Senhor Deus formou da terra todos uma das costelas e fechou o lugar com carne.
os animais selvagens e todas as aves do céu, e Depois, da costela tirada do homem, o Senhor
apresentou-os ao homem para ver como os Deus formou a mulher e apresentou-a ao
chamaria; cada ser vivo teria o nome que o homem.” (Gen 2, 21-22)
homem lhe desse. E o homem deu nome a todos os
animais domésticos, a todas as aves do céu e a 22. O homem („ādām) cai em um „profundo sono‟
todos os animais selvagens, mas não encontrou ou „torpor‟ para acordar "macho" („îš) e "fêmea"
uma auxiliar que lhe correspondesse.” (Gen 2, („îššā). Talvez a analogia do “profundo sono”
19-20) indique aqui um retorno específico ao “não-ser”,
ou a momento que antecede a criação, para que o
"homem" solitário possa, por iniciativa criadora
de Deus, ressurgir daquele momento na sua dupla
unidade de macho e fêmea. De todo modo, à luz
do contexto de Gênesis 2, não há dúvida que o
homem cai nesse "profundo sono" com o desejo
de encontrar um ser semelhante a si. (TdC 8)
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(...) O homem se tornou "imagem e semelhança" para todos os homens e mulheres que, em
de Deus não só mediante a própria humanidade, qualquer época, se unem entre si tão intimamente
mas ainda mediante a comunhão de pessoas, que que formam "uma só carne". (TdC 10)
o homem e a mulher formam desde o
“princípio”. O homem torna-se imagem de Deus
não tanto no momento da solidão quanto no A Nudez Original
momento da comunhão, (...) como imagem de
uma imperscrutável comunhão divina de 30. “O homem e sua mulher estavam nus, mas não
Pessoas. (TdC 9) se envergonhavam.” (Gen 2, 25)
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paz do olhar interior, que cria precisamente a mas encerra desde "o princípio" o atributo
plenitude da intimidade das pessoas. Se a "esponsal", isto é, a capacidade de expressar
"vergonha" traz consigo uma específica limitação amor: exatamente aquele amor em que a pessoa
do ver mediante os olhos do corpo, isto acontece humana se torna um dom e – mediante este dom –
acima de tudo porque a intimidade pessoal é como realiza o próprio sentido do seu ser e existir.
que perturbada e quase "ameaçada" por tal visão. Recordamos agora o texto do último Concílio,
(...) O significado original da nudez corresponde à onde se declara que o homem é a única criatura no
simplicidade e plenitude da visão, em que a mundo visível que Deus quis "por si mesma",
compreensão do significado do corpo nasce quase acrescentando que esse homem "não se pode
no coração mesmo da sua comunidade-comunhão. encontrar plenamente a não ser no sincero dom de
Chamaremos esse significado de “esponsal”. (TdC si mesmo" [Gaudium et spes, 24, 3]. (TdC 15)
13)
38. No primeiro encontro beatífico, o homem
assim encontra a mulher e ela encontra-o a ele.
O Significado Esponsal do Corpo Deste modo ele acolhe-a interiormente; acolhe-a
assim como ela é querida "por si mesma" pelo
35. A dimensão do “dom” é decisiva para a Criador, como é constituída no mistério da
verdade essencial e a profundidade de significado imagem de Deus por meio da sua feminilidade
da solidão-unidade-nudez original. A leitura dos (ou seja, única e irrepetível, escolhida pelo eterno
primeiros capítulos do Livro do Gênesis nos Amor). E, reciprocamente, ela acolhe-o a ele do
introduz no mistério da criação, isto é, do início mesmo modo, como ele é querido "por si mesmo"
do mundo por vontade de Deus, que é onipotência pelo Criador e por Ele constituído mediante a sua
e amor. Por conseguinte, toda a criatura traz em si masculinidade. Nisto consiste a revelação e a
o sinal do “dom” original e fundamental. (TdC descoberta do significado "esponsal" do corpo.
13) A narrativa javista, e em particular Gênesis 2, 25,
permite-nos deduzir que o homem e a mulher
36. Mas devemos observar que, até nesta situação entram no mundo exatamente com esta
de felicidade original, o mesmo Criador (Deus consciência do significado do próprio corpo, da
Javé) e depois também o "homem", em vez de sua masculinidade e feminilidade. (TdC 15)
sublinharem o aspecto do mundo criado para o
homem como dom subjetivamente beatífico,
fazem notar que o homem está "só". De fato,
nenhum dos seres vivos (animais) oferece ao
homem as condições básicas que tornariam
possível ao homem existir em uma relação de dom
recíproco. "Sozinho" o homem não realiza
totalmente a sua essência. Ele só a realiza
existindo "com alguém" – e, ainda mais profunda
e completamente, existindo "para alguém".
Atravessando a profundidade da solidão original,
o homem surge agora na dimensão do dom
recíproco, cuja expressão – que por isso mesmo é
expressão da sua existência como pessoa – é o
corpo humano em toda a verdade original da sua
masculinidade e feminilidade. O corpo, que
exprime a feminilidade "para" a masculinidade e,
vice-versa, a masculinidade "para" a feminilidade,
manifesta a reciprocidade e a comunhão das
pessoas. Este é o corpo: uma testemunha que a 39. A perspectiva "histórica" (depois do pecado
criação é fundamentalmente um dom, e portanto original), se construirá de modo diverso do que
uma testemunha de que o Amor é a fonte da qual era no "princípio" beatífico. Mas nela o homem
brota esse mesmo “doar-se”. (TdC 14) não deixará de conferir um significado esponsal
ao próprio corpo. Mesmo que esse significado
37. O corpo humano, com o seu sexo – a sua sofra e venha a sofrer muitas distorções, ele
masculinidade e feminilidade – visto no próprio sempre permanecerá o nível mais profundo, que
mistério da criação, é não só fonte de fecundidade exige ser sempre revelado em toda a sua
e de procriação, como em toda a ordem natural, simplicidade e pureza, e se manifestar em toda a
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sua verdade, como sinal da "imagem de Deus". vergonha acerca da nudez nasce neles, uma
Por aqui passa também o caminho que leva do vergonha que não sentiram no estado de inocência
mistério da criação à “redenção do corpo”. (TdC original. A inocência original manifesta e ao
15) mesmo tempo constitui o “ethos” perfeito do dom.
(TdC 18)
“Conhecimento” e Procriação
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outro com aquela específica profundidade do Encarnação. Pelo fato de o Verbo de Deus se ter
próprio "eu" humano, que por sinal se revela feito carne, o corpo entrou, eu diria, pela porta
também mediante os sexos, masculinidade e principal da teologia, isto é, na ciência que tem
feminilidade. (TdC 20) por objeto a divindade. (TdC 23)
45. Já desde agora, porém, é preciso verificar que, 48. Quanto é necessária uma precisa consciência
no "conhecimento", de que fala Gênesis 4, 1, o do significado esponsal do corpo, do seu
mistério da feminilidade se manifesta e revela em significado gerador – dado que tudo isto, que
toda sua profundidade mediante a maternidade, forma o conteúdo da vida dos esposos, deve
como diz o texto: "concebeu e deu à luz". A encontrar constantemente a sua dimensão plena e
mulher apresenta-se diante do homem como mãe, pessoal na convivência, no comportamento e nos
sujeito da nova vida humana, que nela é sentimentos! E isto, ainda mais no contexto de
concebida e se desenvolve, e dela nasce para o uma civilização que permanece sob a pressão de
mundo. Assim se revela também em toda um modo de pensar e de julgar materialista e
profundidade o mistério da masculinidade do utilitário. (TdC 23)
homem, isto é, o significado gerador e "paterno"
do seu corpo. (...) A procriação faz com que "o ________________________________________
homem e a mulher (sua esposa)" se conheçam
reciprocamente no "terceiro", originado de ambos. Perguntas para estudo
(TdC 21)
1. Falando de divórcio, Jesus nos diz em Mateus 19, 8
46. A consciência do significado do corpo e a que “no princípio não era assim”. Parece-lhe possível
consciência do seu significado generativo entram que nós tenhamos sido criados para estar no mundo
em contato, no homem, com a consciência da não no sofrimento e no pecado, mas na graça e
morte. Todavia, sempre volta na história do felicidade beatífica?
homem o ciclo do "conhecimento-procriação", em 2. Qual seu entendimento acerca do significado
que a vida luta, sempre de novo, com a inexorável esponsal do corpo? Os conhecimentos adquiridos
perspectiva da morte, e sempre a domina. Apesar mudam a percepção da sua própria dignidade
de todas as experiências da própria vida, apesar enquanto pessoa humana?
dos sofrimentos, das desilusões, de sua 3. Um dos ensinamentos do Concílio Vaticano II diz
pecaminosidade, e apesar da perspectiva que o “homem não pode se encontrar plenamente a
inevitável da morte, o ser humano coloca sempre não ser no sincero dom de si mesmo”. O que isso
de novo o "conhecimento" no "início" da significa?
"geração"; desse modo ele parece participar 4. Tornar-se “uma só carne” refere-se muito mais que
naquela primeira "visão" do próprio Deus: o ao encontro de dois corpos. Discuta o conceito de
Criador "viu tudo..., e achou que era muito bom". “comunhão de pessoas” na unidade original.
(TdC 22)
5. João Paulo II considera a nudez isenta de vergonha
como a chave para entender o plano original de Deus
para o homem e a mulher. Para nos ajudar a entender
Conclusão porque, discuta as seguintes questões:
a) Porque Adão e Eva não sentiam vergonha da sua
47. Penso que entre as respostas que Cristo daria nudez antes do pecado original?
aos homens do nosso tempo e às suas
b) O que significava a nudez deles?
interrogações, muitas vezes tão impacientes, seria
ainda fundamental a que deu aos fariseus. c) Como Adão e Eva experimentavam o desejo sexual
antes do pecado original?
Respondendo àquelas interrogações, Cristo iria se
referir antes de qualquer coisa ao "princípio". É a d) Com base no que foi visto até agora, como o
resposta através da qual entrevemos a própria desejo sexual pode ter mudado depois do pecado
original?
estrutura da identidade humana nas dimensões do
mistério da criação e, ao mesmo tempo, na
perspectiva do mistério da redenção. O estudo (Sugere-se enviar as respostas para daniel@teologiadocorpo.com.br)
destes capítulos, talvez mais do que o de outros, ____________________________________________
torna-nos conscientes do significado e da
necessidade da "teologia do corpo". O fato de a © Texto elaborado pela equipe Teologia do Corpo - Brasil
exclusivamente para fins didáticos, contendo trechos das
teologia compreender também o corpo não deve catequeses do Papa. As citações das catequeses TdC seguem
maravilhar nem surpreender ninguém que seja a numeração de Michael Waldstein (ver quadro de referência
consciente do mistério e da realidade da em separado) As citações bíblicas são da tradução da CNBB.