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Pena
Departamento de Bioquímica e
Imunologia, Universidade Federal de Minas
Gerais e Núcleo de Genética Médica de Minas
HUMANA
Gerais (GENE), Belo Horizonte, MG.
spena@genemg.com.br
OPINIÃO
1999 1999
Abril Maio
Wells et al., na Nova Zelândia, relatam o A empresa Geron Corporation, que financiou os estudos de culturas de células-tronco
nascimento de dez bezerras clonadas por humanas anuncia a formação de uma parceria de 20 milhões de dólares com o Instituto
transferência de células somáticas de Roslyn da Escócia, onde foi clonada Dolly. A intenção da parceria é o desenvolvimento
uma vaca adulta de alta qualidade. A de técnicas de clonagem seguida de cultura de células-tronco para uso em terapia
eficiência da clonagem foi de 10% e todas regenerativa humana sem rejeição imunológica.
as bezerras sobreviveram.
IV. A Ciência e a Tecnologia ras de células de glândulas mamárias ões reconstituídos, criados seguindo a
da Transferência Nuclear como doadoras de núcleo. Essas célu- transferência nuclear de células mamá-
las foram de ovelhas Finn Dorset, en- rias adultas, um rendimento de 0,4%.
Resumidamente, os passos indivi- quanto os ovócitos foram de ovelhas Desses 277 embriões, 29 se desenvol-
duais no procedimento de transfe- escocesas do tipo Blackface. Um passo veram em mórulas ou em blastocistos
rência nuclear incluem: chave parece ter sido a retirada de soro e foram transferidos para 13 recipien-
1) Preparação de um ovócito enu- das culturas de células de glândulas tes, resultando em um único parto a
cleado (citoplasto). mamárias para induzir a parada de termo (1/29; 3,4%). Atualmente, dados
2) Isolamento da célula doadora divisão celular (quiescência; G0). Na de quatro laboratórios diferentes indi-
ou do núcleo doador. verdade, Wilmut and Campbell (1998) cam que a taxa de sucesso total do
3) Ativação do citoplasto. acreditam que o sucesso da clonagem procedimento de transferência nuclear
4) Fusão celular para produzir um somente pode ser obtido de células é relativamente baixa quando os resul-
embrião reconstituído. quiescentes. Obviamente que, para a tados são expressos em nascimentos
5) Cultura do embrião. clonagem, as células doadoras têm de vivos por transferência de embrião
6) Transferência do embrião para estar em G0 ou G1, isto é, antes da reconstituído, da ordem 1-2% (Wilmut,
um útero hospedeiro. duplicação do DNA. Em seguida, a 1998). O motivo para essa alta inefici-
Os dois primeiros experimentos célula doadora foi colocada no espaço ência é desconhecido. Há uma perda
que tiveram sucesso em produzir perivitelino do ovócito enucleado e fetal de 50% e uma taxa total de morte
proles vivas da transferência nuclear tanto a fusão da célula doadora ao de ovelhas, ao nascimento, de 20%
de células somáticas adultas foram o ovócito enucleado quanto a ativação (Wilmut, 1998). Uma observação pe-
de Wilmut et al. (1997) em ovelhas e do ovócito foram induzidos por cor- culiar é o elevado peso ao nascer de
o de Wakayama et al. (1998) em rente elétrica. Esse procedimento re- ovelhas criadas por transferência nu-
camundongos. Os dois procedimen- sultou no ovócito tendo um genoma clear. Esse fenômeno, que pode estar
tos diferem consideravelmente em nuclear da célula doadora, mas um relacionado com os mecanismos de
detalhes nos vários passos descritos genoma quimérico do DNA mitocon- imprinting gênico, não foi visto em
acima. drial de citoplasmas fundidos. Dolly foi camundongos clonados pela transfe-
Wilmut et al. (1997) usaram cultu- a única ovelha nascida de 277 embri- rência nuclear (Wilmut, 1998).
1999 1999
Junho Julho
Wakayama e Yanagimachi, no Havaí, relatam a clonagem de Brüstle et al., na Alemanha, descrevem o direcionamento
camundongos a partir de células da cauda de camundongos em cultura da diferenciação de células-tronco em células
machos. Todas as clonagens anteriores haviam sido a partir de gliais, que produzem mielina. As células obtidas em
células do sistema reprodutivo feminino. cultura eram capazes de formar mielina in vivo em ratos
que eram incapazes de fazê-lo por ter uma doença
genética neurológica.
Um procedimento diferente foi usa- nascida foi chamada Cumulina). Em- somáticas de uma vaca adulta de alta
do pelo grupo de Yanagimachi, em bora diversas séries de experimentos qualidade. A eficiência da clonagem
Honolulu, (Wakayama et al., 1998) para levemente diferentes tenham sido reali- foi de 10% e todas as bezerras sobre-
clonar camundongos. Para realizar a zadas, a produção de camundongos re- viveram. O próximo passo lógico é
clonagem, eles começaram com 3 tipos cém-nascidos clonados de embriões tentar clonar primatas pela transfe-
de células somáticas que já estavam em transferidos foi da ordem de 2-3%, não rência nuclear de células somáticas de
estado de quiescência: células de cúmu- significativamente diferente da produ- adultos.
lo ovariano, células de Sertoli (o equiva- ção em ovelhas. Entretanto, como sali-
lente masculino das células de cúmulo) entado por Solter (1998), a importância V. Questões Éticas, Legais e
e células cerebrais. Esses experimentos deste relato é seminal camundongos Sociais da Clonagem Humana
somente funcionaram bem com as célu- têm um curto período de gestação, uma
las de cúmulo, indicando que, por em- genética bem caracterizada e seus em- A. Que benefícios individuais
pecilhos biológicos ou técnicos, nem briões são muito mais fáceis de serem ou sociais podem advir da clona-
todas as células adultas podem ser clo- manipulados do que aqueles de mamífe- gem humana?
nadas. Yanagimachi e seus colegas não ros maiores, abrindo a possibilidade de
fundiram a célula doadora com o ovóci- uma ampla análise experimental de clo- O prospecto da clonagem huma-
to, mas, ao invés disso, microinjetaram o nagem de mamíferos e de fatores que na levantou intensas discussões, inici-
núcleo da célula de cúmulo em ovócitos determinam seu resultado. almente centradas nos aspectos re-
enucleados de camundongos. Eles es- Em bovinos, Kato et al.(1998), no produtivos. A controvérsia pressupõe
peraram seis horas para dar uma chance Japão, tiveram o nascimento de oito que, se a clonagem humana fosse
ao ovócito de reprogramar o DNA da bezerras clonadas de células somáticas, segura, confiável e permitida, haveria
célula de cúmulo e depois, quimicamen- mas, como mencionamos acima, quatro uma demanda para ela. Sem deman-
te, ativaram o ovócito para começar a morreram no parto ou logo após o da, por que se preocupar? Mais realis-
divisão. Assim eles produziram 22 ca- nascimento. Entretanto, Wells et al.(1999), ticamente: se a demanda provasse ser
mundongos, nascidos vivos, clonados na Nova Zelândia, conseguiram melho- insignificante, ou limitada a situações
por transferência nuclear de célula gra- res resultados. Eles obtiveram dez bezer- excepcionais e justificadas, não have-
nulosa adulta (a primeira sobrevivente ras clonadas por transferência de células ria razão para proibi-la (Posner &