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edição

eBooksBrasil
O Rio de Janeiro Através dos Jornais
João Marcos Weguelin
Fontes digitais: A Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro
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Foto capa: Rio Orla - Galeria de Fotos do Rio de Janeiro
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©1998 Escola do Futuro da Universidade de São Paulo


1888 - 1969
Desenvolvida por João Marcos Weguelin, esta
pesquisa compila trechos de jornais de 1888 a 1969,
retratando alguns dos personagens e episódios que
influenciaram a história recente brasileira - como o
escritor Machado de Assis, o político Rui Barbosa e
o músico Noel Rosa; a promulgação da Lei Áurea, a
revolução de 1964 etc. Foram consultados 62 jornais
cariocas para reunir o acervo - o resultado, no
entanto, é um panorama que ultrapassa as fronteiras
desse estado.
Ano — Tópico
1888 - Lei Áurea
1889 - Atentado contra D. Pedro II
1889 - Proclamação da República
1892 - Jogo do Bicho
1892 - Primeiro bonde elétrico
1893 - Revolta da Armada
1897 - Salão de Novidades Paris no Rio
1897 - Atentado contra Prudente de Moraes
1900 - Bezerra de Menezes
1904 - Revolta da Vacina
1905 - Avenida Central
1908 - Machado de Assis
1909 - Teatro Municipal
1909 - Euclides da Cunha
1910 - Revolta dos Marinheiros
1912 - Barão do Rio Branco
1913 - Carestia
1913 - Pereira Passos
1914 - Edu Chaves
1915 - Pinheiro Machado
1918 - Alcindo Guanabara
1918 - Gripe Espanhola
1918 - Final da Primeira Guerra Mundial
1918 - Revolta dos Anarquistas
1918 - Olavo Bilac
1919 - Campeonato Sulamericano
1921 - João do Rio
1922 - Revolta do Forte
1922 - Lima Barreto
1923 - Rui Barbosa
1930 - Sinhô
1930 - Revolução de 30
1931 - Cristo Redentor
1935 - Intentona Comunista
1939 - Prisão de Luiz Carlos Prestes
1936 - Pedro Ernesto
1937 - Noel Rosa
1937 - Golpe de 1937
1938 - Revolta Integralista
1945 - Vargas Deposto
1946 - Fechamento dos Cassinos
1950 - Copa de 1950
1952 - Francisco Alves
1954 - Morte Vargas
1962 - Mineirinho
1964 - Comício da Central do Brasil
1964 - Revolução de 1964
1968 - Edson Luis
1968 - Passeata dos Cem Mil
1969 - Seqüestro do Embaixador Americano
1) Lei Áurea (1888)
"Lei 3.353 de 13 de Maio de 1888 Declara Extinta A
Escravidão no Brasil.
A Princesa Imperial Regente, em nome de Sua Magestade o
Imperador, o senhor D. Pedro II faz saber a todos os súditos
do Império que a Assembléia Geral decretou e Ela sancionou
a Lei seguinte:
Art 1º - É declarada extinta desde a data desta lei a escravidão
no Brasil.
Art 2º - Revogam-se as disposições em contrário.
Manda portanto a todas as autoridades, a quem o
conhecimento e execução da referida Lei pertencer, que a
cumpram e façam cumprir e guardar tão inteiramente como
nela se contém.
O Secretário de Estado dos Negócios da Arquitetura,
Comércio e Obras Públicas e interino dos Negócios
Estrangeiros, bacharel Rodrigo Augusto da Silva, do
Conselho de Sua Magestada o Imperador, a faça imprimir e
correr.
Dada no palácio do Rio de Janeiro, em 13 de Maio de 1888,
67 da Independência e do Império. Princesa Regente Imperial
- Rodrigo Augusto da Silva.
Desde 1 hora da tarde de anteontem começou a afluir no
Arsenal da Marinha da corte grande número de senhoras e
cavalheiros que ali iam esperar a chegada de Sua Alteza a
Princesa Imperial Regente.
As 2 horas e ¾ da tarde chegou a galeota imperial trazendo a
seu bordo Sua Alteza a Princesa Regente acompanhada de seu
augusto esposo Sua Alteza o Sr. Conde d'Eu, general Miranda
Reis, e chefe de divisão João Mendes Salgado e dos ministros
de agricultura e império.
Sua Alteza trajava um vestido de sêda cor de pérolas,
guarneado de rendas valencianas. Ao saltar no Arsenal foi
Sua Alteza vistoriada pelas senhoras que ali se achavam,
erguendo-se vivas a Sua Alteza e a Sua Magestade o
Imperador.
Às 2 ½ horas da tarde já era difícil atravessar-se o perímetro
compreendido nas proximidades do paço da cidade.
Calculamos para mais de 10.000 o número de cidadãos, que
ali aguardavam a chegada de Sua Alteza Princesa Regente.
(...)
Pouco antes das 3 horas da tarde, anunciada a chegada de Sua
Alteza por entusiasmáticos gritos do povo, que em delírio a
aclamava, abrindo alas, ministério, camaristas e damas do
paço vieram recebê-la à porta.
Acompanhada de seu augusto esposo, subiu a princesa, tendo
formado alas na sacada grande número de senhoras que
atiravam flores sobre a excelsa Regente.
Em seguida a comissão do senado fez a sua entrada na sala do
trono para apresentar a Sua Alteza os autógrafos da lei. Nesta
raia acham-se à direita do trono ministros e à esquerda os
semanários e damas do paço. A comissão colocou-se em
frente ao trono, junto ao qual estava Sua Alteza, de pé, então
o sr. Senador Dantas, relator da comissão, depois de proferir
algumas palavras, entregou os autógrafos ao presidente do
conselho, para que este, por sua vez, os entregasse a Sua
Alteza.
O sr. ministro da agricultura, depois de traçar por baixo dos
autógrafos o seguinte: - Princesa Imperial Regente em nome
de S.M. o Imperador, consente - entregou-os a Sua Alteza que
os assinou bem como o decreto, servindo-se da riquíssima e
delicada pena de ouro que lhe foi oferecida.
O povo que se aglomerava em frente do paço, ao saber que já
estava sancionada a grande Lei chamou Sua Alteza, que
aparecendo à janela, foi saudada por estrepitosos vivas. (...)"
Gazeta da Tarde, 15 de maio de 1888

"Durante o dia e a noite de ontem continuavam cheios de


animação as festas comemorativas da liberdade nacional. A
rua do Ouvidor, constantemente cheia de povo, apresentava o
belo aspecto dos grandes dias fluminenses. As casas
marginais primorosamente ornamentadas estavam repletas de
senhoras. De tempos em tempos, aqui, alí, acorria um viva
aos heróis da abolição cortava os ares estridentes.
De ocasiões em ocasiões, um prestito passava saudando as
redações dos diversos jornais. Geral o contentamento, enfim,
transbordando da grande alma popular, que andava cantando
a epopéia homerica da redenção."
Cidade do Rio, 18 de maio de 1888

"A sessão do senado foi das mais imponentes e solenes que se


tem visto. Antes de abrir-se a sessão, o povo que cercava todo
o edifício, com justificada avidez de assistir ao que ali se ia
passar, invadiu os corredores e recintos da câmara vitalícia.
As galerias, ocupadas por senhoras, davam um aspecto novo e
entusiasmático ao senado, onde reina a calma imperturbável
da experiencia.
Ao terminar o seu discurso, o senador Correia, que se
congratulou com o país pela passagem do projeto, teve uma
ovação por parte do povo.
Apenas o senado aprovou quase unanimemente o projeto,
irrompeu uma salva prolongada de palmas, e vivas e
saudações foram levantadas ao senado, ao gabinete 10 de
março, à absolvição, aos senadores abolicionistas e a S.A.
Imperial Regente.
Sobre os senadores caiu nessa ocasião uma chuva de flores,
que cobriu completamente o tapete; foram saltados muitos
passarinhos e pombas. (...)
Gazeta de Notícias, 14 de maio de 1888

"Continuavam ontem com extraordinária animação os festejos


populares. Ondas de povo percorriam a rua do Ouvidor e
outras ruas e praças, em todas as direções, manifestando por
explosões do mais vivo contentamento o seu entusiasmo pela
promulgação da gloriosa lei que, extingüindo o elemento
servil, assinalou o começo de uma nova era de grandeza, de
paz e de prosperidade para o império brasileiro. (...) Em cada
frase pronunciada acerca do faustoso acontecimento traduzia-
se o mais alto sentimento patriótico, e parecia que vinham ela
do coração, reverberações de luz.
Mal podemos descrever o que vimos. Tão imponente, tão
deslumbrante e magestoso é o belíssimo quado de um povo
agitado pela febre do patriotismo, que só d'ele poderá fazer
idéia quem o viu, como nós vimos. Afigura-se-nos que
raríssimas são as histórias das nações os fatos comemorados
pelo povo com tanta alegria, com tanto entusiasmo, como o
da promulgação da gloriosa lei de 13 de maio de 1888."
Gazeta de Notícias, 15 de maio de 1888

"O Carbonário - Rio 14 de maio de 1888: -


Coube ainda a muito dos descrentes desta reforma vê-la
realizada em nossos dias. Daí essa alegria imensa, maior
mesmo do que era dado esperar, de fato tão auspicioso.
Maior, porque a alegria de nossa população é tão sincera, que
não tem dado lugar a mais leves exprobação ao povo em sua
expansão. Muitos eram os que desejavam de coração,
ardentemente, anciosamente, mas não supunham vê-la tão
cedo realizada. Foi talvez a isso devido a expansão
relativamente acanhada do primeiro momento da lei. O golpe
era muito profundo, a transformação era tão grande como se
fosse um renovamento da sociedade.
Hoje como que nos sentimos em uma pátria nova, respirando
um ambiente mais puro, lobrigando mais vastos horizontes. O
futuro além se nos mostra risonho e como que nos acena para
um abraço de grandezas.
Nós caminhavamos para a luz, através de uma sombra enorme
e densa, projetada por essa assomrosa barreira colocada em
meio da estrada que trilhavamos - a escravidão. Para que
sobre nós se projetasse um pouco dessa luz interna, que se
derrama pelas nações cultas, era preciso que essa barreira
caisse.
Então, apareceram para a grande derrubada os operários do
bem - uns fortes operários, no parlamento e nas associações
ateram ombros à assombrosa derrubada. E venceram! Foi
ontem! Quando a grande barreira monstruosa da escravidão
desabou e caiu, sentiu-se a projeção de uma luz, que nos
ilumina. Ficamos atônitos, deslumbrados, como se saissemos
de um recinto de trevas para um campo de luz. Bem hajam os
que tanto trabalharam por essa grande lei! Não se poderia
descrever o entusiasmo do povo desde o momento da
promulgação da lei. A cidade vestiu-se de galas, o povo
encheu-se goso, o governo cobriu-se de glória!
Nas casas, como nas ruas, a alegria tem sido imensa,
indizível, franca e cordeal. Nenhum festejo organizado,
nenhuma estudada e falsa manifestação de regozijo; de cada
peito rompe um brado, de cada canto surge um homem, de
cada homem sai um entusista. E por toda a parte o regozijo é
o mesmo, imenso, impossível de descrever.
É que a felicidade que rebentou nesse dia imensamente
grande, que completou para o Brasil a obra da sua
independência real, é do tamanho de muitos anos de
escravidão.
Devia ter sido assim tão grande, tão santa, tão bela, a alegria
do povo hebreu quando para além das margens do Jordão,
perdida nas névoas do caminho à terra do martírio, ele pôde
dizer ao descansar da fuga:
- Enfim, estamos livres, e no seio de Abraham!
Tanto podem hoje dizer os ex-escravos do Brasil, que longe
do cativeiro, encontram-se finalmente no seio de irmãos.
Grande e santo dia esse em que se fez a liberdade da nossa
pátria!
O Carbonário - 16 de maio de 1888

"Está extinta a escravidão no Brasil. Desde ontem, 13 de maio


de 1888, entramos para a comunhão dos povos livres. Está
apagada a nódoa da nossa pátria. Já não fazemos exceção no
mundo.
Por uma série de circunstâncias felizes fizemos em uma
semana uma lei que em outros países levaria nos. Fizemos
sem demora e sem uma gota de sangue. (...)
Para o grande resultado de ontem concorreram todas as
classes da comunhão social, todos os partidos, todos os
centros de atividade intelectual, moral, social do país.
A glória mais pura da abolição ficará de certo pertencendo ao
movimento abolicionista, cuja história não é este o momento
de escrever, mas que libertou províncias sem lei, converteu
ambos os partidos à sua idéia, deu homens de Estado a ambos
eles e nunca de outra coisa se preocupou senão dos escravos,
inundando de luz a consciência nacional.(...)"
"Em todos os pontos do império repercutiu agradavelmente a
notícia da promulgação e sanção da lei que extingüiu no
Brasil a escravidão. Durante a tarde e a noite de ontem fomos
obsequiados com telegramas de congratulações em número
avultado e é com prazer que publicamos todas essas
felicitações, que exprimem o júbilo nacional pela áurea lei
que destruiu os velhos moldes da sociedade brasileira e
passou a ser a página mais gloriosa da legislação pátria."
"O júbilo popular explodiu ontem como bem poucas vezes
temos presenciado. Nenhum coração saberia conter a onda
entusiasmo que o inundava, altaneira, grandiosa, efervescente.
Desde pela manhã, o grande acontecimento, que será sempre
o maior da história brasileira, agitava as massas e as ruas
centrais da cidade e imediações do senado e paço imperial
tinham festivo aspecto, constante e crescente movimento de
povo, expansivo, radiante. Era finalmente chegado de atingir-
se ao termo da grande conquista, campanha renhida, luta
porfiada, sem tréguas, em que a parte honesta da população
de todo o império se tinha empenhado desde há dez anos.O
decreto da abolição tinha de ser assinado e para isso reuniu-se
o senado extraordinariamente. (...)
É inútil dizer que no rosto de toda gente transparecia a alegria
franca, a boa alegria com que o patriota dá mais um passo
para o progresso da sua pátria. Fora como dentro o povo
agitava-se irrequieto, em ondas movediças, à espera do
momento em que se declarasse que apenas faltava a
assinatura da princesa regente para que o escravo tivesse
desaparecido do Brasil. (...)
Logo que se publicou a notícia da assinatura do decreto, as
bandas de música estacionadas em frente ao palácio
executaram o hino nacional, e as manifestações festivas mais
se acentuaram prolongando-se até a noite. O entusiamo
popular cresceu e avigorou-se rapidamente, e a instâncias do
povo Sua Alteza a Princesa Imperial assomou a uma das
janelas do palácio, em meio de ruídos e unânime saudação de
mais de 10.000 pessoas que enchiam a praça D. Pedro II .
(...)"
O Paiz, 14 de maio de 1888

"No meio do entusiasmo do povo pelo sucesso do dia,


revelava a multidão a sincera satisfação pelas boas notícias
que se haviam recebido acerca do estado de Sua Magestade o
Imperador. O povo brasileiro não podia esquecer, nessa hora
em que o pátria festejava a iniciação de uma nova era social,
que em país estrangeiro estava enfermo o seu Monarca,
aquele que, verdadeiramente dedicado aos interesses
nacionais, tem o seu nome inscrito nos fatos da história do
progresso do Brasil. (...)"
Diário de Notícias, 14 de maio de 1888

"Continuaram ontem os festejos em regozijo pela passagem


da lei áurea da extinção da escravidão. A rua do Ouvidor
esteve cheia de povo todo o dia e durante uma grande parte da
noite, sendo impossível quase transitar-se por esta rua.
Passaram encorporados os estudantes da Escola Politécnica,
os empregados da câmara municipal e o Club Abrahão
Lincoln, composto de empregados da estrada de ferro D.
Pedro II, todos acompanhados de bandas de música.
Uma comissão desta última sociedade, composta dos Srs.
Henrique do Carmo, Lourenço Viana, Bartolomeu Castro e
Eduardo Dias de Moura, subiu ao nosso escritório, sendo
nessa ocasião abraçada pela redação. (...)"
"O tribunal do juri, ontem, manifestou de maneira eloqüente
que também se associava no regozijo geral pela extinção da
escravidão. (...)
Os empregados e despachantes da câmara municipal
organizaram ontem uma esplêndida e estrondosa
manifestação aos vereadores, em regozijo à extinção total dos
escravisados no Brasil.
À 1 hora da tarde mais ou menos, achando-se presentes todos
os srs. vereadores, penetraram os manifestantes na sala das
sessões, precedidos pela banda de música do 1o batalhão de
infanteria. (...)"
O Paiz, 15 de maio de 1888

AS MANCHETES
Viva a Pátria Livre!
Viva o Ministério 10 de Março!
Viva o Gloriosa Dia 13 de Maio!
Viva o Povo Brasileiro!
Viva! (O Carbonário)
A Liberdade dos Escravos É Hoje Lei do País (O Carbonário)
Brasil Livre
Treze de Maio
Extinção dos Escravos (Gazeta de Notícias)
As Festas da Igualdade (Cidade do Rio)
A Gazeta da Tarde
Ao Povo Brasileiro
Pela Liberdade dos Escravos
Lei 3353 de 13 de Maio de 1888 - (Gazeta da Tarde)
A Festa Da Liberdade ( Gazeta da Tarde )
O Diário de Notícias Significa Todo O Seu Júbilo Pela Nova
Era da Vida E Da Nacionalidade Ontem Iniciada (Diário de
Notícias)
Ave, Libertas! (O Paiz)
2) Atentado Contra D. Pedro II
(1889)
"Representava-se ontem no Sant'Anna a "Escola dos
Maridos", tradução de Arthur Azevedo, e nos intervalos
apresentava-se ao público a prodigiosa violinista Giulietta
Dionesi. S.M. o Imperador, que desejava conhecer a tradução,
tanto que supondo-o impressa mandara procurá-la pelas
livrarias, aproveitou o ensejo de ir ao teatro.
O Sant'Anna achava-se repleto: platéia e camarotes ocupados
por pessoas da melhor sociedade; as galerias cheias da gente
que de ordinário a freqüenta. No camarote imperial achavam-
se, além de SS. MM. o Imperador e a Imperatriz, SS. AA. a
Sra. Princesa Imperial e o Sr. D. Pedro Augusto e camaristas
de semana. O espetáculo correu na melhor ordem. A atitude
do povo era de todo o ponto pacífica e cortês. Nem se quer se
poderia suspeitar que houvesse ali o elemento de desordem
que mais tarde se revelou.
Terminado o espetáculo, o povo que enchia o teatro procurou
as saídas. A família imperial dirigiu-se para a porta, indo na
frente a Sra. Princesa Imperial, seguida de Sua Magestade o
Imperador, que dava o braço a Sua Magestade a Imperatriz e
do Sr. Príncipe D. Pedro.
O povo encostado para os lados, abria caminho a SS. MM.,
em silêncio. Ao chegarem ao vestíbulo do teatro, de um
pequeno grupo de pessoas de baixa classe partiu um grito
estentórico: "Viva o partido republicano". O Imperador parou
imediatamente. Começou então uma confusão extraordinária.
Grande número de pessoas prorompeu em vivas ao
Imperador, acercando-se dele. As senhoras, tomadas de
pânico, precitavam-se para o interior do teatro, de onde
refluiam, empurradas pela onda dos que saiam. O tumulto
generalizara-se: tanto na rua do Espírito Santo, como no largo
do Rocio, nas circanias do teatro, vivas desencontrados se
ouviram. Finalmente, pôde S.M. tomar o carro, seguindo
acompanhado do piquete, que o guardava de espadas
desembainhadas.
Ao passar, porém, pela frente da Maison Moderne, foram
disparados três tiros de revólver na direção do carro que o
conduzia. Asseguram-nos que um desses tiros quase alcançou
o Sr. D. Pedro Augusto.
Felizmente S.M. o Imperador passou incólume. O sentimento
da mais profunda indignação pintou-se em todos os
semblantes dos que foram testemunhas desse baixo atentado.
(...)"
Novidades, 16 de julho de 1889

"Ontem à noite quando terminava o espetáculo no teatro


Sant'Anna quando SS. Magestades Imperiais, SA. Princesa e
SA. o Príncipe D. Pedro Augusto se dirigiam para o carro, um
pequeno grupo de desordeiros levantou vivas à República.
Travou-se então um conflito que pouco durou pois foi
abafado pela intervenção do público sensato que também se
retirava do teatro.
Quando o coche imperial seguia para a praça da Constituição,
um indivíduo teve a leviandade de disparar um revólver
evadindo-se em seguida para um estabelecimento próximo.
Pouco depois, porém, foi preso pelo povo um homem que se
supõe ser o autor do atentado. À hora em que escrevemos esta
ele sendo interrogado na 1a estação policial."
Diário do Commércio, 16 de julho de 1889
"SS. MM. e S.A. Imperial e S.A. o Príncipe D. Pedro, com
seu séqüito, se retiravam do teatro Sant'Anna, à meia-noite de
ante-ontem, quando no meio de um grupo que se achava à
porta do mesmo teatro partiu um viva à República. Abafado
esse viva sob palavras e vivas à monarquia, a D. Pedro II e à
família Imperial, gerais e estrepitosos, houve um ligeiro
conflito, que mais susto causou do que teve resultados
funestos.
No meio desse tumulto, e aclamados pela multidão, puderam
os Augustos espectadores tomar o seu coche e retirar-se com
sua comitiva e guarda. Apesar, porém, da retirada de SS.
MM. e AA.., a agitação continuou por algum tempo e
propagou-se pela vizinhança do teatro. Quando mais forte era
o tumulto ouviu-se a detonação de um tiro de revólver, que
foi dado próximo ao carro de SS. MM. quando este partia em
direção do Paço da Cidade.
Grande foi a confusão que causou esse atentado, que ninguém
podia prever nem esperar, o que deu lugar a ser impossível,
na ocasião, prender-se o criminoso, que evadiu-se,
aproveitando-se do barulho e ocultando-se no meio da grande
multidão que estava no local.
Entretanto, o agente da polícia Paulino Alberto de Magalhães
capturou o espanhol Ramon Gonçalves Fernandes sobre que
caiam as suspeitas da autoria do crime. Em seu poder não foi
encontrada arma alguma, nem foram suficientes as provas
contra ele, pelo que foi posto em liberdade ontem de manhã.
Quando procediam as autoridades às primeiras diligências
chegou ao seu conhecimento que era conhecido o autor do
atentado, que havia sido visto pelo Sr. Antônio José Nogueira,
empregado do Maison Moderne.
Por essas indicações, das 2 para as 3 horas da madrugada, o
1o delegado de polícia, Dr. Bernardino Ferreira da Silva
conseguiu prender, em um bonde da Companhia de Botafogo,
na rua de Gonçalves Dias, Adriano Augusto do Valle, que
fôra acusado de ter disparado os tiros de revólver."
Diário do Commércio, 17 de julho de 1889

"Ao terminar o espetáculo de ontem no teatro Sant'Anna,


quando saíam suas magestades, houve um grande movimento
de povo dando vivas à República uns e outros à monarquia,
sendo em frente a Maison Moderne disparados alguns tiros.
Nós os republicanos nada temos com essas arruaças, que
devem ser levadas somente à conta da polícia disfarçada e da
guarda criada para garantia do trono."
República Brazileira, 16 de julho de 1889

" (...) O desacato que sofreu o chefe do estado, alquebrado


pelos anos e pela moléstia, junto à santa senhora que o
acompanhava só pode ser levado à conta da loucura daqueles
que a todo transe procuram indispor e vilipendiar o nosso
partido. Apelamos para o próprio imperador, e ele, que com
cosciência nos diga, se julga que haja nesta terra um
"verdadeiro republicano" que seja capaz de atentar contra a
sua vida! Revolucionários, sim, assassinos, nunca!"
"Causou a mais viva impressão a notícia da deplorável
ocorrência de ontem à noite, às portas do teatro Sant'Anna e
suas circumvizinhanças."
República Brazileira, 17 de julho de 1889
Um grupo, quando o Imperador saía do teatro em companhia
de sua augusta família, levantou vivas à república, o que
produziu a maior confusão no povo, que em desafronta de
Sua Magestade levantou vivas ao imperador.
Sua Magestade embarcou em seguida no seu coche, que
partiu a trote largo, e afirmam várias pessoas que, no
momento de passar aquele por defronte da Maison Moderne,
ou Stat-Coblentz, ouviu-se a detonação de um tiro.
Este fato deu à ocorrência o vulto de um atentado, que
comoveu profundamente a opinião.(...)
Não podemos acreditar que houvesse a intenção de atentar
contra a pessoa do Imperador. Repugna a índole do nosso
povo; não se conforma com os nossos sentimentos a
premeditação de tal crime, contra o soberano que aboliu de
fato a pena de morte. (...)"
Cidade do Rio, 16 de julho de 1889

"Ontem, quando se retirava do teatro Sant'Anna, terminado o


espetáculo, foi sua magestade obrigada a parar à porta de
saída.
Grande multidão de indivíduos achava ali postada e dentre ela
partiu um grito sedicioso. Sua Magestade parou e no mesmo
instante viu-se cercado por todos tantos o acompanhavam.
Ao passar o carro em frente à Maison Moderne, ouviu-se a
detonação de alguns tiros. Fácil é de imaginar-se o tumulto
produzido por este fato.
O piquete de cavalaria, que gurdava a carruagem imperial,
marchou em disparada, acompanhando-a pela rua da Carioca,
por ter o cocheiro fastigado os animais, afastando-os do lugar
tumultuoso.
A polícia compareceu imediatamente e foram dadas várias
ordens para conhecer-se qual o autor do atentado, até então
desconhecido.
Intimadas várias pessoas para virem à Polícia, conseguiu por
fim o dr. Bernardino Ferreira, 1o delegado, conhecer a
verdade, por denúncia de um cavalheiro. (...)
A população brasileira foi hoje dolorosamente impressionada,
tomando-se da mais justa indignação pelo estúpido atentado
cometido ontem, à noite, contra Sua Magestade o Imperador,
quando este retirava-se com Sua Magestade a Imperatriz do
teatro Sant'Anna.
Era o sr. D. Pedro II o único soberano deste século contra
quem não tinha havido atentado de espécie alguma e isso
abonava principalmente a brandura do coração brasileiro e
dos nossos costumes.
Infelizmente, houve ontem um atentado que não podemos
atribuir senão à inconsciência de quem o praticou: ou loucura
ou embriaguez, pois, por honra do partido republicano, não
acreditamos que tal ato dele partisse. Esse triste
acontecimento é ainda uma das consequências da profunda
anarquia que lavra nos espíritos do Brasil, onde todas as
noções de direito, dever e liberdade acham-se completamente
obliteradas."
Gazeta da Tarde, 16 de julho de 1889

AS MANCHETES
Atentado Contra o Imperador
Tiros de Revólver
Prisão do Criminoso (Novidades)
Lamentável (Diário do Commércio)
3) Proclamação da República
(1889)
"A partir de hoje, 15 de novembro de 1889, o Brasil entra em
nova fase, pois pode-se considerar finda a Monarquia,
passando a regime francamente democrático com todas as
consequências da Liberdade.
Foi o exército quem operou esta magna transformação; assim
como a de 7 de abril de 31 ele firmou a Monarquia
constitucional acabando com o despotismo do Primeiro
Imperador, hoje proclamou, no meio da maior tranqüilidade e
com solenidade realmente imponente, que queria outra forma
de governo.
Assim desaparece a única Monarquia que existia na América
e, fazendo votos para que o novo regime encaminhe a nossa
pátria a seus grandes destinos, esperamos que os vencedores
saberão legitimar a posse do poder com o selo da moderação,
benignidade e justiça, impedindo qualquer violência contra os
vencidos e mostrando que a força bem se concilia com a
moderação. Viva o Brasil! Viva a Democracia! Viva a
Liberdade!"
Gazeta da Tarde, 15 de novembro de 1889

"Despertou ontem esta capital no meio de acontecimentos tão


graves e tão imprevistos que as primeiras horas do dia foram
de geral surpresa. Rompeu com o dia um movimento militar
que, iniciado por alguns corpos do exército, generalizou-se
rapidamente pela pronta adesão de toda a tropa de mar e terra
existente na cidade.
A conseqüência imediata desses fatos foi a retirada do
ministério de 7 de junho, presidido pelo Sr. Visconde do Ouro
Preto, que teve de ceder à intimação feita pelo Sr. Marechal
Deodoro da Fonseca que assumiu a direção do movimento
militar. À exceção do lastimoso caso do Sr. Barão do Ladário,
que não querendo obedecer a uma ordem de prisão que lhe
fora intimada, resistiu armado e acabou ferido, nenhum ato de
violência contra a propriedade ou a segurança individual se
deu até o momento em que escrevemos estas linhas. (...)"
Jornal do Commércio, 16 de novembro de 1889

"O dia de ontem foi de surpresas para a pacífica população


industrial desta cidade. Um mimistério forte deposto sem
combate, uma revolução militar triunfante, os corpos
constitucionais arredados sem discussão alguma e o regime de
governo atacado com êxito inesperado, são fatos que
pareciam inexplicáveis se não se conhecesse a índole especial
desta cidade, sempre disposta a aceitar os fatos consumados.
(...)
A revolução de ontem é filha unicamente das energias e
espírito de classe dos militares, e foram os oficiais superiores
que, passando-se para a causa democrática, a tornaram
vencedora no momento.
Os elementos civis foram nulos ou improficuos e só
apareceram depois de realizado o movimento, e segundo é de
esperar, para ocupar as posições oficiais. É portanto, a classe
militar que deve se considerar como único poder existente de
fato e do qual depende o êxito ou insucesso da revolução.
Mesmo por não andar envolvida em nossas intrigas civis,
mesmo pelas suas ilesas virtudes cívicas, é que a classe
militar poderá evitar-nos os inconvenientes de uma surpresa
que não tem ainda a sanção do voto nacional."
Diário do Commércio, 16 de novembro de 1889

"Constando ontem ao conselheiro de estado Andrade Figueira


que os ministros do 6 de junho estavam presos no quartel
general, dirigiu-se para ali s.ex.., e antes de falar aos ministros
soube que a ordem de prisão já havia sido suspensa. O
conselheiro Andrade Figueira, ao ver os ministros, animou-se
a se retirarem para suas repartições, prestando-se a
acompanhá-los, ao que não quiseram anuir, não obstante
ponderar-lhes a conveniência de desvanecer-se assim o boato
que corria. Então os ministros declararam que haviam sido
depostos de seus cargos pelo exército.
É inútil encarecer a gravidade dos acontecimentos. Os nossos
conselhos e advertências, embora moderada e imparcialmente
feitos, não foram atendidos. a situação é tão difícil que só dá
prudência e do patriotismo se deve tirar conselho."
A Nação, 16 de novembro de 1889

"Após a gloriosa revolução ontem efetivada e da qual resultou


a deposição do sr. d. Pedro, que exercia em nome da
Santíssima Trinidade, o absoluto poder magestático sobre o
povo do Brasil, ao espírito público desde logo cedo acudiu a
necessidade urgentíssima de fazer sair quanto antes do solo da
Pátria a família que deixou de reinar. Ontem mesmo
esperava-se que essa indispensável medida fosse prontamente
executada pelo Governo Provisório; mas as atenções com que
os membros desse governo cercaram a pessoa do monarca
decaído chegaram, parece, ao ponto de permitir a D. Pedro a
mais inteira liberdade de ação.
O ex-Imperador abusou da magnanimidade com que era
tratado, e, em vez de submeter-se à revolução triunfante,
tentou opor-lhe meios em cuja eficácia só a verdadeira insânia
poderia acreditar. reuniu o conselho do Estado pleno, e, não
aceitando o fato consumado da sua deposição e da
organização do Governo Provisório Republicano, quis confiar
ao Sr. saraiva a incubência de formar novo gabinete,
malogrando assim os efeitos da revolução vitoriosa. (...)
Era imponente o aspecto que apresentavam as forças de terra
e mar, firmadas no Campo da Aclamação, desde o amanhecer,
em frente ao quartel do 1o, onde conservava-se prisioneiro do
povo e dos militares o gabinete decaído. Em constante
evolução, ao mando do general Deodoro da Fonseca, viam-se
o 1o e 9o regimentos de cavalaria, 2o regimento de artilharia
de campanha, 1o, 7o e 10o batalhões de infantaria, corpos de
imperiais marinheiros e navais, corpos de alunos das escolas
militares da praia Vermelha e Superior de Guerra, corpo de
bombeiros e corpos de polícia da corte e província do Rio. Ali
permanecendo durante horas, senhora da praça, a força
levantava sucessivos vivas à liberdade, ao exército e armada,
à República Brasileira!
Cerca de 9 horas da manhã, à intimação do povo e do
exército, o gabinete declarou-se demitido, pedindo o senhor
Visconde de Ouro Preto ao general Deodora da Fonseca
garantia para a sua pessoa e dos seus colegas. O sr. general
respondeu-lhe que o povo e o exército não ofenderiam os
cidadãos destituídos do governo e que os ex-ministros podiam
se retirar na maior tranqüilidade, como aconteceu.
Ao ser comunicada ao povo e aos militares a queda do
ministério, levantaram-se aclamações de todos os lados à
República Brasileira e vivas estrepitosos, enquanto o parque
de artilharia dava uma salva de 21 tiros, com os canhões
Krupp assestados para a secretaria da guerra.
O general Deodoro, o Sr. Quintino Bocayuva e o tenente-
coronel Benjamin Constant foram então disputados pelo povo
e pelos militares, que os carregavam em verdadeiro triúnfo.
(...)
Durante todo o dia e até alta hora da noite o povo percorreu as
ruas do centro da cidade, formando diversos grupos
precedidos de bandas de música. Expansiva em seu
entusiasmo, a população erguia vivas e saudações à imprensa
livre, aos bravos do exército e armada, ao general Deodoro, a
Quintino Bocayuva e à República Brasileira. (...)"
Correio do Povo, 16 de novembro de 1889

"A monarquia é um dos muitos males necessários a que estão


sujeitos os povos de hoje, entregues à influência anarquista do
militarismo e sujeitos às depredações dos poderes doirados!
No Brasil, o caso apresentou-se como um fenômeno de medo,
espécie de terror coroado, que espantou de Portugal o rei João
VI e o atirou, atônito, entre a exuberância grandiosa de nosso
clima e o incitarmento revolucionário de nosso sangue. Um
rei é sempre o frio para um povo. (...)
Comecemos de pensar. Esta República que veio assim, no
meio do delírio popular, cercada pela bonança esperançosa da
paz; esta República no século XIX que surgiu com a precisão
dos fenômenos elétricos, sem desorganizar a vida da família,
a vida co comércio e a vida da indústria; esta República
americana que trouxe o símbolo da paz, que fez-se entre o
pasmo e o temor dos monarquistas e a admiração dos sensatos
- esta República é um compromisso de honra e um
compromisso de sangue. (...)"
República Brazileira, 21 de novembro de 1889
"A população desta cidade foi hoje, ao acordar, sobressaltada
pela notícia de graves acontecimentos que se estavam
passando no quartel general do exército, em ordem a
despertar as mais sérias inquietações. Era assustador o
aspecto que oferecia a praça da Aclamação, na parte em que
se acha situado o referido exército e circumvizinhanças.
O quartel estava fechado e guardado por uma força do corpo
militar de polícia, de baioneta calada, pronta ao primeiro
ataque, corpo de bombeiros, 1o batalhão de infantaria e
batalhão naval, municiado e dispondo de uma metralhadora.
Deviam embarcar hoje dois batalhões, e como boatos
alarmantes se haviam propalado sobre a provável recusa
daqueles corpos do exército, o ministério providenciara para
que se fizesse o embarque sem novidade. O Sr. Ministro da
Guerra conservou-se até adiantadas horas da noite na sua
repartição.
Número superior a 400 praças do corpo de polícia estiveram
de prontidão, sendo retiradas até algumas que se achavam de
serviço nas estações. Os regimentos de cavalaria nos 1 e 9 e o
2o de artilharia manifestaram-se em revolta e armados
intentaram atacar o quartel general e do corpo de polícia. O
comandante de um dos regimentos de cavalaria abandonou o
quartel à vista do ânimo exaltado das praças. (...) No arsenal
da marinha permaneceram até pela manhã os srs. ministros da
justiça e marinha. (...)
A verdade, porém, é que o sr. ministro da marinha se
apresentou à porta do quartel general, sendo-lhe impedida a
entrada pelo Sr. General Deodoro; respondendo o ministro
que o governo ia cumprir o seu dever, puxou dois revólveres,
empunhando-os em posição de disparar. Nessa ocasião um
praça do exército disparou alguns tiros que atingiram S. Ex..
O sr. ministro caiu ferido, sendo transportado em braços para
o palacete Itamaraty. Seguiram para a praça da Aclamação o
corpo policial da província do Rio e contingente do batalhão
naval.
Todo o movimento social da cidade acha-se paralisado. O
comércio em grande parte fechou as portas. As ruas mais
freqüentadas nos dias ordinários estão desertas; raros
transeuntes passam, apressados, como perseguidos. (...) O
serviço de bondes é feito com grande irregularidade; há
longos intervalos no trânsito dos carros, que chegam aos
pontos de estação aos grupos de cinco e seis. (...) O pânico
anda no ar e nas consciências. (...)"
Novidades, 15 de novembro de 1889

"Desde ante-ontem que o Brasil é uma república federativa. O


exército e a armada nacionais, confraternizando com o povo,
completaram a limpeza da pátria, começada no dia 13 de
maio de 1888. (...)
Não se faz política na Vida Fluminense, não, senhores, não se
faz. (...) Entretanto, para não espantar o leitor, diremos desde
já que a nossa política será mais o apanhado da pelótica dos
pelotiqueiros baratos que para maior glória desta terra estão a
governá-la, do que preleções ligeiras sobre os rasgos da
Razão Pura ou circular do ilustre sr. barão do Paraná. Acresce
ainda que a política e a preocupação constante deste
pacientíssimo povo, que toma café dez vezes ao dia, não
vacilando em gastar sucessivamente muitos três vitens, isto é,
três vezes mais do que aquela célebre moeda que célebre
também tornou o honrado sr. presidente do conselho. (...)
Peloticas e pelotiqueiros é o que se encontra a dar com o pau.
Veja-se a pelótica do ministério em relação ao exército.
Disseminá-lo pelo Império, mas disseminá-lo de forma que
em cada cidade fique apenas uma ala de batalhão, e depois
licenciá-lo, aquartelando em seguida alguns batalhões da
guarda nacional, eis o plano, ministerial, que desde sete dias
corre de boca em boca, com os maiores visos de verdade. (...)
É bastante perigosa, porém, a cartada, e tão perigosa, que há
muito quem se persuada que no melhor da festa os trunfos
não ficarão em mãos dos membros do atual gabinete (...)"
Vida Fluminense, 17 de novembro de 1889

"A população fluminense despertou hoje com a notícia de que


se havia o exército recusado a cumprir ordens do governo por
julgá-las ilegais e ofensivas ao seu brio. Dois batalhões que
haviam recebido ordem de seguir para pontos afastados do
Império, decidiram não obedecer esta ordem.
A Noite de Ontem:
Às duas horas da madrugada estavam no quartel-general do
exército, o sr. ajudante-general e diversos oficiais, Em forma,
no quartel, estavam um batalhão de infantaria e um regimento
de cavalaria. Havia de prontidão uma força de mais de 400
praças do corpo de polícia. Para aumentar essa força, foram
retiradas praças de várias estações urbanas. até depois da
meia-noite, esteve o ministério em conferência.
Hoje:
6 horas da manhã - O ministério está reunido na secretaria do
império. Estão fechados os quartéis do 7o, do 10o e do Corpo
de Bombeiros. desembarca na corte, vindo de Niterói, uma
parte do Corpo de Polícia da província. Outra parte da força
está na ponte da Armação a espera da lancha que a conduza à
corte.
7 horas - Sobe a rua do Ouvidor uma força de fuzileiros
navais. Os soldados estão em pé de guerra. Os oficiais trazem
revólver.
8 horas - É quse impossível chegar ao Campo de Santana.
uma força do 10o está no largo da Lapa para impedir a
passagem provável de estudantes da Escola Militar. Das
janelas do palacete Itamaraty parte uma descarga sobre o
povo.
9 horas - À porta de uma taverna, na esquina da rua são
Lourenço está sentado, com um ferimento na fronte, o sr.
barão do Ladário, ministro da marinha. O ferido está com um
gramete ao lado. (...) Estão fechadas todas as estações de
polícia.
9 ½ - (...) O quartel está fechado. Dentro está o batalhão que
não quer, segundo consta, seguir para onde foi removido. O
ministério continua reunido.
10 horas - (...) Confirma-se o boato de que o ministério pediu
demissão. (...)
10 horas e meia - Os alunos da Escola Militar sem ordem,
nem todos fardados, mas armados, tendo à frente uma corneta
do 22o seguem para o Campo de Santana, dando vivas à
Nação brasileira e ao exército. O ministério que estava preso
e guardado pelo exército, rende-se. O general Deodoro entra
no quartel em triúnfo, abraçado, entre aclamações
entusiasmáticas. O exército dá vivas à República. É o grito
que se ouve em todo o Campo de Santana. (...)
10 e ¾ - O general Deodoro é carregado em triúnfo. O 2o de
artilharia dá uma salva de 21 tiros. Povo, exército e marinha
dão vivas à Nação brasileira. (...)"
Cidade do Rio, 15 de novembro de 1889
AS MANCHETES
Viva a República Brasileira!
Viva o Exército - Viva a Armada!
Viva o Povo Brasileiro! (Correio do Povo)
Revolta no Exército (Novidades)
Viva a República! (República Brazileira)
O Futuro do Brasil (Gazeta da Tarde)
Viva o Exército Libertador! (Cidade do Rio)
4) O Jogo do Bicho (1892)
"A empresa do Jardim Zoológico realizou ontem um
magnífico passeio campestre ao seu importante
estabelecimento, situado no pitoresco bairro de Vila Isabel.
Em bondes especiais dirigiram-se os convidados e
representantes da imprensa àquele local e depois de visitarem
o hotel, que se acha nas melhores condições, os jardins, as
gaiolas em que se acham os animais e aves, tomaram parte em
um lauto jantar, em mesa de mais de 60 talheres, presidida
pelo digno diretor daquela empresa, o sr. barão de
Drummond.
O 1o brinde foi levantado pelo sr. Sergio Ferreira ao sr. barão
de Drummond, que em seguida com toda a gentileza brindou
à imprensa, sendo correspondido pelo nosso representante.
Trocaram-se ainda outros brindes, sendo o último ao sr. vice
presidente da República.
Como meio de estabelecer a concorrência pública, tornando
freqüentado e conhecido aquele estabelecimento que faz
honra ao seu fundador, a empresa organizou um prêmio diário
que consiste em tirar à sorte dentre 25 animais do Jardim
Zoológico o nome de um, que será encerrado em uma caixa
de madeira às 7 horas da manhã e aberto às 5 horas da tarde,
para ser exposto ao público. Cada portador de entrada com
bilhete que tiver o animal figurado tem o prêmio de 20$.
Realizou-se ontem o 1o sorteio, recaíndo o prêmio no
Avestruz, que deu uma recheiada poule de 460$000.
A empresa tem em construção um grande salão especial para
concertos, bailes públicos, e vai estabelecer no jardim jogos
infantis e outros diversos para o público.
Às 9 horas voltaram os convidados, pessoas de alta distinção,
penhorados todos à gentileza do sr. barão de Drummond e
seus dignos auxiliares. Foi uma festa esplêndida."
Jornal do Brasil, 4 de julho de 1892

" Jardim Zoológico - A empresa deste importante


estabelecimento de criação do benemérito barão de
Drummond vai hoje inaugurar diferentes divertimentos ao
público fluminense, que alí terá diariamente um passatempo.
O sr. M.I. Zevada, é o gerente da empresa e conhecedor de
vários estabelecimentos europeus e americanos idênticos ao
Jardim Zoológico, dá esperanças de engrandecer aquela
instituição de mérito nacional. Há um jantar de instalação,
cujo convite muito agradecemos."
O Tempo, 3 de julho de 1892

"A empresa Jardim Zoológico deu domingo último um grande


banquete no magnífico restaurant que existe no Jardim. Para
esse banquete tinham sido convidados a imprensa e várias
pessoas da nossa melhor sociedade. Correu animadíssima a
festa, no meio da maior cordialidade e da maior gentileza por
parte dos diretores da emoresa. Durante todo o tempo em que
estiveram presentes os convidados tocou uma excelente banda
de música as melhores peças de seu repertório.
A empresa está atualmente organisada sob grandes moldes,
procurando o mais possível distrair o público por todos os
meios do seu alcance, organizando concertos, bailes públicos,
circos de cavalinhos, espetáculos diversos, bilhares, jogos
carteados, jogo de bola e outros modos de diversão.
Além disso, a empresa resolveu estabelecer um prêmio de 20$
por meio de um sorteio original. Cada pessoa ao entrar no
jardim receberá por 1$, um bilhete com a indicação de um
animal dos 25 que existem no jardim. Em um poste de 5
metros de altura, numa caixa fechada, será colocado um
quadro representando um dos animais e quem tiver no bilhete
receberá o prêmio. A empresa deposita como garantia de
pagamento dos prêmios 10$000 em um banco. O serviço de
bondes vai ser aumentado proporcionando assim maior
comodidade ao público."
O Tempo, 6 de julho de 1892

"Jardim Zoológico - Grande festa hoje no Jardim Zoológico.


Inaugura-se uma empresa de divertimentos públicos, com
rifas em que se pode tirar até 40:000$000. Uma fortuna."
Diário do Commércio, 3 de julho de 1892
"Realizou-se ontem, como tinhamos anunciado, a inauguração
da nova empresa do Jardim Zoológico.
Às 3 horas das tarde partiram do largo do Rocio em direção a
Vila Isabel, dois bonds especiais dessa companhia, levando os
convidados daquele empresa, sendo precedidos de uma banda
de música. Chegados ali foram os convidados recebidos pela
administração do Jardim, que gentilmente acompanhou-os na
visita geral.
Às 5 horas desceu a caixa que continha a figura do animal que
dominava o dia, de acordo com o programa. O avestruz foi o
animal vencedor e que deu aos donos dos bilhetes respectivos
os 20$ de prêmio.
Após a vitória do avestruz a vitória do estômago. Deu-se
começo pois a um lauto e profuso banquete de 100 talheres,
havendo por esta ocasião brindes de saudações recíprocas.
À festa compareceram muitas distintas senhoras,
representantes da imprensa e outros muitos convidados."
Diário do Commércio, 4 de julho de 1892

"A empresa do Jardim Zoológico inaugurando hoje um


restaurant no mesmo jardim, destinado a famílias, e onde
estabeleceu graciosos jogos para crianças e distrações
próprias a um magnífico logradouro público, oferece hoje aos
seus convidados um jantar regado a fino champagne Clicot. A
inauguração terá lugar às 5 horas da tarde, saíndo um bonde
especial para os convidados, às 3 horas, da praça da
Constituição."
Diário de Notícias, 3 de julho de 1892

"A empresa do Jardim Zoológico ofereceu ontem um jantar a


vários convidados, que em um bonde especial seguiram, às 3
horas da tarde, para o soberbo restaurante situado naquele
jardim, em Vila Isabel. Para desejar que faça carreira este
novo estabelecimento, basta desejar-lhe mais orientada
administração do que teve o seu antecessor."
O Paiz, 4 de julho de 1892

"A empresa do Jardim Zoológico ofereceu domingo, no


restaurante alí estabelecido, um lauto jantar a diversos
cavalheiros."
Gazeta de Notícias, 5 de julho de 1892

"Há hoje festa no Jardim Zoológico, inaugurando-se ali novos


divertimentos."
Jornal do Commércio, 3 de julho de 1892

"Foram inaugurados ante-ontem diversos divertimentos no


Jardim Zoológico, entre os quais o do sorteio dos animais,
que tem por fim animar a concorrência àquele
estabelecimento. Esse sorteio consiste no seguinte: d'entre 25
animais escolhidos pela Empresa é tirado um diariamente e
metido em uma caixa quando começa a venda de entradas. Às
cinco horas da tarde, a um sinal dado, abre-se a caixa e a
pessoa que tem a entrada com o nome e o desenho do animal,
ganha-o como prêmio. No próximo domingo o público lá
encontrará diversos divertimentos e jogos infantis. Está em
construção uma grande sala destinada a bailes populares."
Jornal do Commércio, 5 de julho de 1892

"Venceu ontem o gato. A empresa pagou prêmios na


importância de 1:420$000. O Jardim foi visitado por 1350
pessoas.
O Sr. ministro da Guerra visitou ontem o Jardim Zoológico
em companhia do barão de Drummond. S. Ex. foi testemunha
da forma dos prêmios estabelecidos pela empresa, afim de
animar a concorrência daquele estabelecimento. Muito
agradou a S. Ex. a ordem e asseio daquela vivenda de
animaes."
Diário do Commércio, 11 de julho de 1892

"O sr. ministro da Guerra visitou ontem o Jardim Zoológico,


percorrendo todas as suas dependências, acompanhado pelo
sr. barão de Drummond."
Jornal do Brasil, 11 de julho de 1892

"O marechal Floriano Peixoto visitará brevemente o Jardim


Zoológico."
Gazeta da Tarde, 8 de julho de 1892

"Para os azaristas - No Jardim Zoológico venceu ontem o


Avestruz. A empresa pagou de prêmios 680$."
O Tempo, 10 de julho de 1892

"Jardim Zoológico - Venceu ontem o gato. A empresa pagou


de prêmios 1:100$."
O Tempo, 14 de julho de 1892

"Jardim Zoológico - Venceu ontem o cavalo. Pagou-se de


prêmios 740$. Amanhã (domingo) das 3 horas da tarde em
diante baverá bondes diretos. Divertimentos diversos."
O Tempo, 16 de julho de 1892

"Jardim Zoológico - Venceu ontem o cachorro. Pagou-se de


prêmio 2:08$."
O Tempo, 17 de julho de 1892

"No Jardim Zoológico venceu ontem o pavão. Pagou-se


prêmio de 1:140$."
O Tempo, 19 de julho de 1892

"Jardim Zoológico - Venceu ontem o coelho. Pagou a


empresa prêmios na importância de 640$000."
Gazeta de Notícias, 6 de julho de 1892

ANÚNCIO:
Jardim Zoológico - Prêmios Diários Sobre Animais de 20$ a
40:000$ - Vendas das Entradas na Rua do Ouvidor No 129 e
no Jardim.
O Tempo, 12 de julho de 1892

"Ao Dr. 2o delegado dirigiu ontem o Dr. Chefe de Polícia o


seguinte ofício:
- No empenho de procurar atrair concorrência de visitantes ao
Jardim Zoológico, solicitou o seu diretor para certo recreio
público licença, que lhe foi concedida pela polícia, em vista
da feição disfarçadamente inocente que da símples primeira
descrição do divertimento parecia se deduzir. Entretanto,
posta em prática essa diversão, se verifica que tem ela o
alcance de verdadeiro jogo, manifestamente proibido. Os
bilhetes expostos à venda contém a esperança puramente
aleatória de um prêmio em dinheiro, e o portador do bilhete
somente ganha o prêmio, se tem a felicidade de acertar com o
nome a espécie do animal que está erguido no alto de um
mastro.
Esta diversão, prejudicial aos interesses dos incantos, que
com a esperança enganadora de um incerto lucro se deixam
ingenuamente seduzir, é precisamente um verdadeiro jogo de
azar, porque a perda e o ganho dependem exclusivamente do
acaso e da sorte.
Como semelhante divertimento não pode por mais tempo ser
tolerado, e conquanto maior fundamento quanto é certo que
muitas queixas me têm sido dirigidas pelas pessoas lesadas,
assim intimarei ao diretor do Jardim Zoológico para que
suspenda imediatamente a continuação do aludido jogo, sob
pena de ser processado na coformidade dos arts. 369 e 370 do
código penal."
O Tempo, 23 de julho de 1892

"Quem nasceu para dez réis nunca chega a vintém, - é


verdade que nenhum caipora é capaz de contestar.
Nestes dias de prosperidade, de progresso amamentado pelo
papel moeda que às enxurradas de magníficos negócios
engrandeceram o gênio das finanças, é sabido que a melhor e
mais segura indústria é a do jogo e loterias sob todas as
formas. Já tinhamos cassinos, clubes, cercles e outros grandes
estabelecimentos industriais que prosperam a bragas
molhadas sem auxílio nem nada. Temos agora a loteria
zoológica, o víspora dos bichos, a rodas das alimarias.
Atirei ao trabalho honrado, isto é, ao novo jogo que é o
trabalho da época. Aquele provérbio dos dez réis que não
passa a vintém, haja o câmbio que houver, perseguiu-me até
nesta invenção biolotérica. Os bichos fogem do caipora como
o demo da caldeirinha. Caso singular! Perco sempre na
mesma.
Outro dia joguei no perú, e saiu o pavão, galináceo como
aquele e tão vaidoso como o seu parente, mas com a
diferença, que um me daria vinte mil réis e o outro fez-me
perder mil réis. Comprei uma entrada com o "gato" e perdi
nas garras do "tigre", ambos felinos, e diversos no estado de
domesticidade e no estado selvagem.
Para maior dos pecados, quando contava desforrar-me com o
elefante, cuja corpulência e força devia arrazar tudo, caiu da
caixinha a estampa corcunda do camelo. Tanto um como o
outro são pachydermes, mas o camelo deu os vinte mil réis e
o elefante nem um nickel.
Sendo a loteria cientificamente zoológica, porque não se
aplicar o sensato e justo sistema esportivo de correr as poules
por coudelarias? Neste caso os lotes seriam por famílias,
gêneros e espécies. Quem jogasse nos felinos poderia ganhar
com o gato ou com o tigre entre os galináceos, o perú seria
tão bom segundo como o pavão foi primeiro. Entre os
roedores poderia eu achar dente de coelho ou apanhar
ratazanas nedias e roliças com o seu recheio de notas de mil
réis e farofa de vinte mil ditos. Quisesse eu jogar na alta e
molharar-me-ia com os trepadores e se o tucano caísse por
qualquer descuido, o papagaio de vistosas penas me levaria às
alturas das finanças. E os repteis não poderiam dar a fortuna
do prêmio gordo, tamanha é a família e tão rasteiro o seu
gêenero? A rola biolotérica não está bem organizada; precisa
de reforma, pelo menos enquanto eu perder nesse pacão.
O que não posso contestar é que o sistema, como se dizia no
tempo de Law, é genuinamente popular. É vir à rua do
Ouvidor às 5 horas da tarde, quando a caixa sobe para os que
tem de ir ao cofre, para se reconhecer que que o inventor da
vispora é homem de gênio. Na primeira revolução em que eu
tenha influência fal-o-hei ministro da Fazenda. Então é que o
Brasil verá o que são bancos geniais de emissão e
encilhamento de corar de vergonha todas as ruas
Quincampoix e Alfândega passados e por vir.
Ex digito, gigas. Por aqueles papéis de bichos pintados,
avalia-se o gênio de um povo e a moralidade de um regime
político. Ganhar pelo trabalho é uma velharia e custa uma
vida inteira. Hoje reza-se por outra cartilha; o jogo, a sorte, o
ágio e a advocacia administrativa parlamentar que em um
abrir e fechar de mãos levam um homem a habitar palácios
principescos em Lisboa ou pelintrar nos boulevards de Paris.
O gênio que criou tudo isso bem sabe o que fez."
Maximo Job , em O Tempo, 23 de julho de 1892
5) Primeiro Bonde Elétrico
(1892)
"Realiza-se hoje, á 1 hora da tarde, na Companhia Botafogo,
linha do Flamengo, a inauguração do bond pela tracção
electrica. O bond sahirá aquella hora do largo do Machado,
seguindo para a praia do Flamengo, de onde virá até o largo
da Carioca."
Diario de Notícias, 8 de outubro de 1892

"Foi inaugurada hontem a tracção electrica nos bonds da


Companhia Jardim Botanico tendo á inauguração assistido o
sr. marechal vice-presidente da Republica, os membros dos
ministérios, representantes da directoria d'aquella companhia,
da imprensa e grande numero de convidados. A experiencia
correu bem e amanhã daremos sobre ella circunstanciada
noticia."
Diario de Notícias, 9 de outubro de 1892

"Conforme haviamos noticiado realizou-se ante-hontem, com


a presença do sr. vice-presidente da Republica, do seu estado
maior, de alguns ministros e representantes da imprensa, a
experiencia da tracção electrica applicada nos bonds da
Companhia Ferro Carril do Jardim Botanico, em a 1a secção
da mesma companhia, que comprehende a linha do Flamengo.
Á 1 hora, pouco mais ou menos, sahiram tres bem trabalhados
e commodos bonds da frente do edificio do theatro Lyrico e
cerca de 10 ou 12 minutos depois entraram nas officinas da
companhia, á rua Dois de Dezembro, fazendo nesse periodo
de tempo o percurso que, pela tracção animal, é feito em 25.
Apoz serem examinadas as officinas de electricidade,
perfeitamente montadas, visitaram os convidados todas as
officinas de ferreiro, corrieiro, carpinteiro, pintura e mais
dependencias, officinas essas que occupam a extensa e vasta
área de sete mil metros quadrados, em tudo notando-se o
maior asseio, ordem e regularidade, que muito abonam os
esforços empregados pelo actual gerente de tão importante
empreza, que como era de prever, lutou com immensas
difficuldades, por falta de pessoal idoneo habil para trabalhar
com apparelhos electricos.
Nas referidas officinas vê-se grande numero de
melhoramentos, ultimamente realizados pelo sr. dr. Cintra,
que, tendo encontrado, quando tomou conta da gerencia da
empreza, em serviço 76 carros, todos americanos, e a
extensão das linhas de 38 kilometros, dotou-a já com 130
carros, por demais confortaveis, todos feitos nas officinas da
companhia, sendo actualmente a extensão das linhas de 58
kilometros. A extensão dos fios conductores, segundo as
informações que nos foram ministradas, é de 14 e meio
kilometros, sendo o trecho da praia do Flamengo o mais
accidentado da linha.
Depois de percorrido o estabelecimento, foi offerecido ás
pessoas presentes um esplendido lunch, no qual se fizeram
muitos brindes, sendo o primeiro o do sr. coronel Malvino
Reis, director da companhia, ao vice-presidente da Republica,
ao ministerio e á indendencia. Em seguida foram saudados a
directoria e o gerente da empreza.
O sr. ministro da marinha saudou a Republica dos Estados
Unidos da America do Norte, sendo tambem cumprimentados
o Congresso Nacional, o exercito, a armada e a imprensa. O
brinde de honra foi erguido ao sr. marechal Floriano Peixoto,
vice-presidente da Republica.
Tendo-se tornado justamente credora a directoria da
companhia Jardim Botnico de justos encomios, por ter
conseguido estabelecer a tracçào electrica em os seus bonds, o
que é um grande melhoramento, não podemos, applaudindo-a,
esquecer o nome do seu digno gerente o sr. dr. Carlos Cintra,
que foi um verdadeiro heróe nessa campanha, que teve ante-
hontem os applausos de todos, e os dos seus dignos auxiliares,
os engenheiros electricistas drs. James Mitchel e Antonio
Chermont, que muito concorreram para que fosse levado a
effeito tão brilhante commettimento.
Em alguns logares por onde passavam os bonds foram
photographados, tendo-se-nos informado que as primeiras
despezas feitas com a installação dos apparelhos, apezar das
differenças de cambio, não chegaram a 200:000$000.
Durante o trajecto do bond innumeras pessoas
agglomeravam-se nas ruas, justamente curiosa de apreciar o
novo systema de tracção, que, de futuro, ha de ser applicado
por força ás estradas de ferro."
Diario de Notícias, 10 de outubro de 1892

"Com a assistencia do Sr. Vice-Presidente da Republica e seu


Estado Maior, Ministro da Marinha, intendentes Silveira
Lobo, Abdon Milanez, Siqueira, Medeiros e França Leite,
deputados geraes, representantes de diversas classes sociaes e
da imprensa, realizou-se hontem a inauguração da tracção
electrica da 1a secção da companhia que comprehende a linha
do Flamengo.
Pouco depois de 1 hora sahirão tres bem construidos e
confortaveis bonds da frente do Theatro Lyrico e doze
minutos depois entravão nas officinas da companhia á rua
Dous de Dezembro.
Depois de examinadas as officinas de electricidade que se
achão perfeitamente installadas, percorrerão os visitantes
todas as officinas de ferreiro, coreeiro, pintor, carpinteiro e
mais dependencias da companhia, que occupão a extensa área
de sete mil metros quadrados, notando-se em tudo o maior
asseio, ordem e regularidade, o que muito abona ao actual
gerente que tem lutado com muitas dificuldades, sendo a
menor a de falta de pessoal idoneo para as applicações dos
diversos misteres.
De facto notão-se alli muito melhoramentos e grande
augmento no numero de carros, pois quando o Dr. Cintra
tomou conta da gerencia encontrou no serviço 76 carros,
todos americanos, sendo a extensão da linha de 38 kilometros,
no entanto ha hoje 130 carros confortaveis, todos feitos nas
officinas da companhia, sendo a extensão das linhas de 58
kilometros. A extensão dos fios conductores é de 14 e meio
kilometros, sendo esse trecho o mais accidentado da linha.
Depois de percorrido o estabelecimento, foi offerecido aos
visitantes um profuso lunch no qual se fizerão muitos brindes
sendo o primeiro ao coronel Malvino Reis director da
companhia ao sr. vice-presidente da Republica, ao Ministerio
e a Intendencia; em seguida forão saudadas a directoria e o
gerente da Companhia; o Sr. Ministro da Marinha saudou a
Republica dos Estados Unidos da America e Congresso
Nacional, o exercito, a armada, a imprensa e alguns outros
sendo o ultimo ao Sr. Marechal Floriano Peixoto.
Esta Companhia a mais antiga de todas, inaugurou o seu
trafego em 9 de outubro de 1868, sendo este primeiro trecho
entre a cidade e o Largo do Machado e a rua Marques de
Abrantes canto da praia de Botafogo foi inaugurada em 20 de
novembro e o terceiro entre este ultimo ponto e o canto da rua
S. Joaquim em 19 de dezembro do mesmo anno.
Foi seu fundador e primeiro presidente o Sr. C. B. Greenough
e superintendente deste o Thompson. A este succedeu E. P.
Moaree em 29 de março de 1869 o qual foi substituido por
Simeão Miller em 24 de abril de 1875 tendo por sucessor o
Dr. J. C. Coelho Cintra que foi nomeado gerente em 1 de
setembro de 1889.
24 anos depois de sua inauguração, coube a gloria a este
gerente a primeira installação electrica definitiva na America
do Sul para a substituição da tracção animal pela electrica
concorrendo para que ainda fosse esta Companhia, a primeira
a adoptar esse grande emprehendimento, provado entre nós
experimentalmente a resolução do problema. (...)"
Jornal do Commercio, 9 de outubro de 1992

"Realizou-se hontem a inauguração official dos bonds por


tracção electrica da companhia ferro-carril do Jardim
Botanico.
Compareceram o sr. vice-presidente da Republica, o sr.
ministro da marinha, algumas distinctas senhoras, intendentes
municipaes, muitos engenheiros, e representantes do
Economista, e desta folha.
As pessoas presentes visitaram toda a estação do Largo do
Machado, e, depois de percorridas as officinas de
electricidade, onde se acham montados os motores para a
tracção e caldeação electricas, todas elegantemente ornadas
de bandeiras e folhagens, sahiram os visitantes em tres carros,
percorrendo toda a linha da 1a secção secção de electricidade.
Em todo o estabelecimento notou-se o maior asseio, sendo
cuidadosa e perfeita a montagem de machinas e apparelhos.
Os carros, muito elegantes e confortaveis, são illuminados por
cinco fócos incandescentes cada um, dando logar a 4o
passageiros.
Em seguida á experiencia serviu-se profuso copo d'agua,
erguendo-se por essa ocasião os seguintes brindes: Do Sr.
coronel Malvino Reis ao Sr. marechal Floriano Peixoto; do
intendente Silveira Lobo ao digno gerente da companhia, Dr.
Cintra, que tornou uma realidade entre nós a substituição da
tracção animal pela tracção electrica; do Sr. Dr. Constante
Jardim ao progresso e ao Dr. Cintra; deste ultimo ao Sr.
marechal Floriano Peixoto; do Sr. Dr. Nilo Peçanha ao
progresso; do Sr. barão Ribeiro de Almeida á Imprensa; do
Sr. Pederneiras, nosso collega do Jornal do Commercio,
agradecendo e brindando o Sr. marechal Floriano Peixoto; do
Sr. William Frederick Leeson ao progresso do Brazil; do Sr.
dr. Nilo Peçanha ao almirante Custodio José de Mello, deste
ultimo ao povo americano; do Sr. Dr. Constante Jardim ao Sr.
barão Ribeiro de Almeida, presidente da companhia.
No regresso, os bonds electricos pararam no largo da Lapa,
sendo photographados em um delles os Srs. marechal vice-
presidente da Republica, seu ajudante de ordens capitão
Eduardo Silva, barão Ribeiro de Almeida, almirante Custodio
José de Mello, coronel Malvino Reis e Dr. Coelho Cintra.
Nossos cumprimentos ao gerente da companhia e seus dignos
auxiliares, os engenheiros electricistas Drs. James Mitchell e
Antonio Chermont, pelo feliz exito dos seus trabalhos.
Os bonds electricos devem ser entregues hoje ao trafego
publico."
O Tempo, 9 de outubro de 1892

"Assistimos hontem á experiencia de tracção electrica na 1a


secção da Companhia Ferro Carril do Jardim Botanico.
Compareceram a essa experiencia o Exm. Sr. marechal
Floriano Peixoto, com seu estado-maior, e os ministros da
fazenda, marinha, guerra e interior.
em visita rapida percorremos todas as dependencias da
companhia na estação do Largo do Machado, notando-se
n'ellas ordem e muito aceio.
As officinas de electricidade acham-se montadas com esmero,
e perfeitamente installados os apparelhos geradores, bem
como os apparelhos da caldeação electrica.
Em seguida o carro electrico percorreu toda a linha do
Flamengo, sendo em sua passagem muito victoriado pelo
povo, que se agglomerava principalmente nos caes do
Flamengo, Russel e Lapa.
Incontestavelmente a superioridade da tracção electrica sobre
a animal é sob todos os pontos de vista, provada. Resta que a
intendencia, desejando melhorar esta cidade, procure por
todos os meios a substituição gradual da tracção animal nas
companhias existentes, dando-lhes um prazo mais ou menos
razoavel.
Estamos certos de que a Companhia do Jardim Botanico, em
curto espaço de tempo, terá substituido toda a sua tracção
animal pela electricidade."
Gazeta de Notícias, 9 de outubro de 1892

"A companhia de bonds de Botafogo, inaugurou hontem a


nova linha de bonds electricos.
Á 1 ¼ da tarde partiram 3 bonds da rua da Guarda Velha,
conduzindo o Sr. marechal vice-presidente da republica,
capitão Eduardo A. da Silva, seu ajudante de ordens, o Sr.
contra-almirante C. de Mello, e convidados, com destino á rua
Dois de Dezembro, estação da companhia, fazendo todo o
trajecto em 12 minutos.
Ali foi servido um profuso lunch, onde se trocaram varios
brindes, sobresahindo os dos Srs. coronel Malvino Reis, ao
Sr. marechal Floriano, Dr. Nilo Peçanha, barão Ribeiro de
Almeida, Dr. Coelho Cintra, do Sr. contra-almirante Custodio
José de Mello, ministro da marinha, ao povo americano e o
brinde de honra feito ao Sr. marechal Floriano, pelo Sr. barão
Ribeiro de Almeida.
foi grande o numero de convidados. Entre elles se achavam
senadores, deputados, intendentes, etc.
O resultado da experiencia da electricidade nos bonds, foi
satisfatoria."
Jornal do Brasil, 9 de outubro de 1892
6) Revolta da Armada ( 1893)
"Desde a madrugada de ontem começaram a circular notícias
de graves acontecimentos. Soube-se que estava interrompido
o trânsito da estrada de ferro central e que a marinha se
puzera em atitude hostil ao governo do Sr. Marechal Floriano
Peixoto. Depois foram, pouco a pouco, aparecendo os
verdadeiros pormenores. (...)
No Mar
Segundo estamos informados daí começaram pouco antes da
meia noite pelo assalto ao encouraçado Aquidaban, que
apenas tinha a bordo o oficial de quarto, 1o tenente Mello
Moraes. Isso feito, foi atacada e tomada a Armação, e, em
seguida, os outros navios da esquadra e os vapores das
companhias Lloyd Brasileiro, Lage e Frigorífica, que foram
armados em pé de guerra e incorporados à esquadra
revolucionária,
Todos esses navios receberam grande quantidade de municão
na Armação, colocando-se depois em linha prolongada à
terra. As torpedeiras foram também incorporadas à esquadra e
durante todo o dia percorreram a baía. Os navios
revolucionários são: os encouraçados Aquidaban, Javary, Sete
de Setembro, cruzadores República, Trajano, Orion, corveta
Amazonas, canhoneira Marajó, torpedeiras de alto mar e de
lança. (...)" -
Jornal do Brasil, 7 de setembro de 1893

"Às 9 horas da manhã uma lancha do cruzador República


apreendeu uma das lanchas do cruzador Almirante
Tamandaré. Pouco depois, atravessando a baía e rebocador
Emperor, uma das lanchas que policiam o porto, deu dois
apitos e, tendo aquele rebocador parado, aprisionou-o,
deixando fundeado um saveiro que aquele conduzia. Foi
também aprisionado o paquete Matilde, e mais tarde levados
para a Armação os cruzadores Guanabara, Almirante
Tamandaré e a galeota Quinze de Novembro. O Júpiter foi
incorporado à esquadra. (...)" -
Jornal do Brasil, 8 de setembro de 1893

"(...) Ao amanhecer o Aquidaban embandeirou em arco e toda


a esquadra revoltada içou a bandeira nacional no topo do
mastro grande em comemoração à data de 7 de setembro.
Depois das 7 da manhã, do cais do Arsenal da Marinha
começou-se a observar os movimentos da torpedeira Marcílio
Dias, que por diversas vezes chegava à fala aos navios
estrangeiros, naturalmente para parlamentar, e do cruzador
República, auxiliado por diversas lanchas, para o ancoradouro
dos paquetes de Lloyd, onde, depois de apreender diversas
embarcações pequenas, começou a apoderar-se dos vapores
ali fundeados, os quais eram conduzidos para junto da
esquadra revoltada, por diversos rebocadores. O Júpiter foi
tirado do lugar em que estava e encorporado à esquadra,
encarregando-se desse trabalho o 1o tenente Camisão de
Mello. (...)
Jornal do Commércio, 8 de setembro de 1893

"Eis o que ontem se passou. Às 6 horas da manhã o Júpiter


levantou ferro e foi fundear no canal do Engenho. Na
passagem foi hostilizado pela bateria da Ilha do Governador.
O Aquidaban recebeu carvão, que lhe levaram um saveiro e
uma lancha da Ilha das Enxadas. Da Ilha do Governador
foram disparados alguns tiros contra o Tamandaré.
À tarde o forte de Gragoatá bombardeou a fortaleza
Villegaignon. Informam-nos que em Campos estãp prontos
para o serviço dois batalhões da guarda nacional, o 11o e o
39o, com os oficiais já fardados e as companhias completas.
Muitos oficiais de outros corpos também se fardaram e
esperam ordem."
Gazeta de Notícias, 9 de fevereiro de 1894

"O Dia de ontem raiou ao som estridente do forte canhoneio


que houve de madrugada entre as fortalezas da barra,
Gragoatá, baterias do morro de S. João em Niterói e da
Armação de um lado, e alguns navios da esquadra revoltosa e
Villegaignon de outro.
Foi uma luta renhida que se prolongou até cerca das 9 horas
da manhã. Cerca das 2 horas da manhã quatro lanchas dos
revoltosos largaram do Aquidaban e dirigiram-se para os
lados da Armação, disparando para ali os seus canhões de tiro
rápido e metralhadoras, e neste posto tiveram luta com as
forças que guarnecem aquele estabelecimento e as da Ponta
da Areia.
Naquela ocasião deixaram os seus ancoradouros e
aproximaram-se também da Armação o Aquidaban, o
Liberdade e o frigorífico Júpiter, que tomaram parte no
combate. As forças da Armação e Ponta da Areia atacaram
com vivo fogo os navios e lanchas, atirando às 6 horas da
manhã as fortalezas de Santa Cruz e da Lage para
Villegaignon, e S. João para a Ilha das Cobras.
Villegaignon respondeu atirando para Gragoatá. Este forte
trocou disparos com o encouraçado Aquidaban. Depois das
10 horas retiraram-se os navios e lanchas.
O sr. general Argolo, chefe das forças que guarnecem Niterói,
dirigiu ao sr. Ministro da Guerra o seguinte telegrama: "As
forças legais destroçaram os revolucionários, que tentaram
desembarque na Armação. Morreram três oficiais e muintos
marinheiros. Os revolucionários refugiaram-se no fundo da
baía." Consta que por notícias oficiais sabe-se que foram
aprisionados 55 marinheiros e três oficiais, um dos quais de
nacionalidade estrangeira.
Às 5 horas a Ilha das Cobras atirou para terra. Nesta ilha
houve ontem un incêndio em um galpão. Pouco depois foi
extinto. Da Ilha do Governador fizeram de manhã alguns
disparos contra o Tamandaré , que pouco depois respondeu."
Gazeta de Notícias, 10 de fevereiro de 1894

"Muito semelhante ao anterior foi o dia de ontem. A


população ainda se manteve tranqüila, esperando os
acontecimentos, com a máxima confianá no governo e na
vitória da República. Nas ruas notou-se a animação dos dias
normais. O comércio conservou francamente abertas as suas
portas, manifestando um total sossêgo e despreocupação da
revolta como se estivessem em época de paz mais absoluta."
Diário de Notícias, 9 de fevereiro de 1894

Grande Vitórias das Forças Legais:


"Na madrugada de ontem a população da nossa capital foi
despertada por um vivíssimo tiroteio, entrecortado de
sucessivos tiros de canhão, anunciando um grande combate
para os lados de Niterói.
Efetivamente os revoltosos levados ao desespero em nossa
baía pelo heroísmo das forças legais e pela falta de viveres e
disciplina a bordo, imaginaram dar um combate decisivo,
pondo em movimento todas as suas forças e atacando
simultâneamente Maruí, Ponta da Areia e sobretudo a
apetecida Armação. O combate nesses três pontos tornou-se
renhidíssimo, trocando a todo momento a artilharia de parte a
parte e ouvindo-se continuadas descargas de fuzilaria.(...)
Mal clareava o dia e em todos os pontos da cidade, de onde se
podia divisar a luta travada, a população aglomerava-se,
anciosa de saber o que se passava, e confiada na bravura dos
que defendiam a heroica Niterói. O combate ia muito renhido
quando de repente as baterias da Ponta da Areia e da
Armação cessaram o fogo, apriximando-se as lanchas e
havendo todos os indícios de um desembarque. (...)
Muito provavelmente por tática, as guarnições desses pontos
tinham-se concentrado e a marinhagem desenfreada julgava-
se já senhora das posições, quando a ofensiva foi tomada,
com valor, as forças desembarcadas foram cercadas pela
infanteria e expulsas do território fluminense, deixando
muitos mortos e feridos e fugindo vários marinheiros a nado.
Desalojados das posições, as bandeiras brancas foram
arrancadas em meio aos vivas à República, e a esquadra
revoltada, com menos duas lanchas, que foram a pique, fez-se
ao largo, custando-lhe mais uma tremenda derrota, que
certamente levará o ex-neutro da Ilha das Cobras a não tentar
outro desembarque."
Diário de Notícias, 10 de fevereiro de 1894
"Pouco antes das 4 horas da manhã de ontem fomos
surpreendidos por vivas descargas de grosso canhão, que
repercutiam com grande estrondo no silêncio profundo em
que se achava mergulhada a cidade.
Acudindo ao nosso posto de observação, vimos o Aquidaban
e um dos frigoríficos em serviço da revolta restauradora, que
haviam levantado ferro e aproavam bara a barra, achando-se
já próximos de Villegaignon. Os holfotes de S. João e da
Glória tinham, porém, projetado pouco antes os seus focos de
luz sobre os dois vultos que se esgueiravam rapidamente pela
treva densa, e das baterias legais e das fortalezas da barra,
sempre vigilantes, rompeu desde logo vivíssimo fogo sobre os
dois navios. Assim descobertos e debaixo de um chuveiro de
balas, ambos voltaram rapidamente para os ancoradouros que
pouco antes haviam deixado, naturalmente no intuito de
forçar a saída da barra. E cessou assim o canhoneio."
O Tempo, 9 de fevereiro de 1894

"Depois de longos dias de quse completa apatia em que


estiveram mergulhados os revoltosos restauradores
resolveram ontem operau uma ação séria e decisiva, que os
arrancasse do estado de aniquilamento em que se acham.
Custou-lhes, porém, caro a audácia. Mais uma derrota
formidável lhes foi infligida e mais uma vitória cheia de
heroísmo coube à mocidade entusiástica, às hostes
nibilíssimas dos bravos que defendem a república. (...)
Os revoltosos atacaram hoje pela madrugada,
simultaneamente, diversos pontos do litoral de Niterói,
desembarcando em alguns deles, de onde foram no fim de
pouco tempo desalojados, deixando muitos mortos e
prisioneiros, entre estes alguns oficiais."
O Tempo, 10 de fevereiro de 1894

"A iminência do ataque decisivo à candilhagem do mar, que


desde 6 de setembro ensangüenta duas cidades, reduz a ruínas
a capital do Estado do Rio e infelicita e enxovalha a pátria,
arrastando-a à mais injustificável das guerras civis, não podia
deixar de ser ontem a principal preocupação de todos os
espíritos. Diante do aviso prévio, que foi dada a mais laga
publicidade, as famílias moradoras no centro da cidade e nos
pontos mais provavelmente expostos começaram muito cedo
a retirada, enchendo literalmente os wagons da Estrada de
Ferro Central do Brasil e os bondes das diferentes
companhias, em demanda dos subúrbios e dos arrabaldes
mais arredados do litoral, onde se acham a abrigo das balas
inimigas, que até há poucos dias tanto sangue generoso e
inocente haviam feito derramar."
O Tempo, 13 de março de 1894

A Revolta - Vitória da República:


"Chegamos tarde para dar a notícia que repercutiu já como
um hino festivo em toda a República, desoprimida do ultraje
dos bandidos, das desgraças que eles lhe cavaram desde 6 de
setembro do ano passado. Está salva a República! (...)"
O Tempo, 15 de março de 1894

"Está salva a República! A República que durante seis meses


resistiu ao Aquidaban, Javarí, Almirante Tamandaré, Trajano,
Guanabara e esquadrilhas de torpedeiras, piquetes e
rebocadores, viu a imediata submissão dos revoltosos
restauradores, no dia em que se anunciou a sua anciosamente
esperada batalha."
- BOLETIM D'O PAIZ - ÀS TRÊS HORAS DA TARDE -
"Os revoltosos acabam de se render à discrição. Os oficiais
refugiaram-se à bordo dos navios de guerra ingleses,
franceses e portugueses, abandonando os enfermos na Ilha
das Enxadas.
Os tiros que estão se ouvindo são para descarga dos canhões.
As fortalezas e poucos fortificados apenas dispararam alguns
tiros, que não foram correspondidos.
Honra à República Brasileira. Honra às forças de terra, à
grande parte leal da oficialidade da esquadra!"
O Paiz, 14 de março de 1894

"A cidade do Rio de Janeiro respirou ontem, enfim,


desopressa do pesadelo da revolta. As fisionomias tinham um
ar radiante de contentamente e por toda a parte grandes
grupos de populares, entusiasmados, festejavam
delirantemente, a vitória da República."
O Paiz, 15 de março de 1894

"O comandante superior da guarda nacional Dr. Fernando


Mendes, acompanhado do seu estado-maior, comandantes das
brigadas, corpos e oficialidades, foi ontem à tarde
cumprimentar os srs. marechal vice presidente da República e
ministro da Guerra. Quatro bandas de música acompanhavam
o prestito que depois dos cumprimentos percorreu diversas
ruas da cidade.
No palácio do governo, estando ausente o sr. marechal
Floriano, foram os manifestantes recebidos pelo sr. capitão
Antônio José de Siqueira, secretário de s.ex. (...)"
Correio da Tarde, 15 de março de 1894

"O cruzador Trajano, que foi rebocado para a Gamboa, está


completamente perdido e quase imerso. Ao general Pimentel,
comandante da 1a brigada de vigilância no litoral
apresentaram-se 31 soldados das forças legais, prisioneiros
dos revoltosos nas ilhas do Engenho, Mocanguê e Ponta da
Armação. (...)
O sr. coronel chefe da polícia desta capital dirigiu aos
governantes dos estados o seguinte telegrama: - Neste
momento foi dominada a revolta no porto do Rio de Janeiro.
Antes de terminar o prazo de 48 horas, marcado pelo governo
para começar as hostilidades, os revoltosos entregaram-se à
discrição, tendo antes abandonado fortalezas e navios e
refugiando-se na ilha das Enxadas. Saldanha e mais oficiais
estão asilados em navios de guerra estrangeiros. O governo
trata de mandar forçar para o Paraná e Santa Catarina onde se
acha o almirante Custódio de mello. Mil parabéns. Viva a
República!"
"Hoje às 3 ½ horas da tarde haverá bondes especiais à
disposição daqueles que quiserem cumprimentar os alunos da
Escola Militar. (...)
As repartições públicas, praças ajardinadas e diversas casas
particulares iluminaram ontem à noite as suas fachadas. (...)
Foram removidos para a Ilha das Enxadas os marinheiros
presos que se achavam recolhidos ao 1o e 24o batalhões de
infantaria."
Correio da Tarde, 16 de março de 1894
7) Salão de Novidades Paris no
Rio (1897)
"Quem não tiver tido a dita de assistir a um banho de mar
com todas as suas peripécias e todos os seus atrativos, não
precisa ter o incômodo de se erguer do leito às 6h da manhã
para ir ao Boqueirão do Passeio ou à Praia da Saudade; é
bastante ir visitar o elegante salão Paris no Rio, onde o
Animatógrafo Super Lumière, entre muitos outros, exibe um
quadro desde gênero; e, tal é a perfeição do extraordinário
aparelho que a ilusão é completa; quase se sente medo de que
as ondas do mar, ultrapassando os limites do quadro, invadam
o elegante salão."
A Notícia, 15 de novembro de 1897

"Os srs. Segreto e Salles inauguraram ontem, na Rua do


Ouvidor, andar térreo do Club dos Reporters, as funções que
aí vão dar com o animatógrafo Lumière. A sessão foi
exclusivamente para a imprensa e o aparelho funcionou
perfeitamente, agradando bastante. Os quadros da dança
Serpentinas e o das melancias foram bisados. O aparelho é
movido por uma mola à gás de força de 15 cavalos, fabricado
por White e Midleton. A instalação da eletricidade foi dirigida
pelo engenheiro Augustro Grillet."
Folha da Tarde, 31 de julho de 1897

PROPAGANDA:
"Salve Século XIX Salve Amimatógrafo Lumière - A última
palavra do engenho humano. A mais sublime maravilha de
todos os séculos. Pinturas moverem-se, andarem-se,
trabalharem, ouvirem, chorarem, morrerem, com tanta
perfeição e nitidez, como se Homens, Animais e Coisas
Naturais fossem, é o assombro dos assomros. Salve Lumière!
O Animatógrafo Lumière é invento tão magestoso, soberbo e
imponente, que a própria natureza, que privilegiou o seu
autor, conserva-se estática diante de sua pasmosa
contemplação!
A exibição dos diversos quadros, que serão expostos à
admiração do público, é tãp primoroso e sedutor atrativo, que,
quem por ela é uma vez surpreendido, procura
irresistivelmente emergir sempre o seu espírito observador da
deliciosa admiração desse assombroso espetáculo!
As Exmas. famílias desta capital encontrarão à Rua do
Ouvidor no 141, um salão de espera digno de sua recepção e
iluminado à luz elétrica, das 12 horas às 10 da noite. Ao
Animatógrafo, pois, de Lumière cabem hoje, de todo o mundo
civilizado os aplausos bem merecidos de uma admiração, sem
limites. 141 Rua do Ouvidor."
Folha da Tarde, 9 de agosto de 1897

"Estive ante-ontem, pela primeira vez, no Salão Paris, e não


perdi o meu tempo; é realmente divertidíssimo o
Animatógrafo Super Lumière, pela entontecedora variedade
das suas fotografias. Todas me agradaram, todas, mas
nenhuma como as coloridas, que reproduzem, com uma
precisão extraordinária, as danças serpentinas da Loie Fuller,
ou do diabo por ela. Aquilo é bom... e é barato. Compete
agora ao público animar o animatógrafo."
Arthur Azevedo, em O Paiz, 24 de dezembro de 1897
PROPAGANDA:
"Paris No Rio - Salão de Novidades - De Salles e Segretto -
141 Rua do Ouvidor - No dia primeiro foi inaugurado esse
luxuoso salão com a exibição de maravilhosos quadros de
fotografias animadas, reproduzidas pela importante máquina
Vitoscópio - Super - Lumière, a primeira até hoje vinda à
América do Sul. sessão todos os dias e todas as noites.
Entrada 1$000." -
Cidade do Rio, 4 de agosto de 1897

"O Salão de Novidades que funciona no andar térreo do


edifício Club dos Reporters tem sido extraordinariamente
visitado."
Gazeta da Tarde, 2 de setembro de 1897

"Paris no Rio! Esta ficção é hoje realidade, graças ao


animatógrafo que funciona alí, quase em frente à nossa
redação. São dez tostões que valem mil francos, e satisfaz-se
um ideal muito ambicionado: ver Paris."
Gazeta da Tarde, 4 de setembro de 1897

"O Animatógrafo Super Lumière, à rua Moreira Cesar (*), foi


ontem extraordinariamente concorrido por grande número de
famílias. É deveras curioso e deslumbrante o engenhoso
aparelho, que reproduz em tamanho natural e com todos os
movimentos da vida real cenas de muita animação." -
Jornal do Brasil, 4 de outubro de 1897
(*) A Rua do Ouvidor se chamou Moreira Cesar de 1897 a
1916.
"Uma sega de trigo - é um dos quadros que estão sendo
mostrados pelo Animatógrafo Super Lumière, do elegante
salão Paris no Rio. Dizer que todos os movimentos são
maravilhosamente reproduzidos, não é bastante: quem assistir
a exibição daquele quadro póde dizer que ja viu ceifa do trigo
em Hamburgo.
A cena é tão perfeita, que quase que se chega a ouvir o ruído
dos cortadores a derrubar a preciosa planta.
A sessão a que assistimos, estava presente grande número de
senhoras.
Bem digno de predileção das famílias é o Paris no Rio, que se
acha elegante e luxuosamente montado."
Jornal do Brasil, 5 de novembro de 1897

"É de fazer água na boca, tão bem reproduzida está e tão


natural é a cena Üm Comedor de Melancias" quadro exibido
na Animatógrafo Super Lumière no Paris no Rio.
Ontem um espectador tão iludido ficou que, aproximando se
do quadro disse:
- Ó amigo, você me dá um pedaço dessa melancia?"
Jornal do Brasil, 14 de novembro de 1897

"Como um caso estupendo, conta a Bíblia que Josué fez para


o sol e, no entretanto, o Animatógrafo Super Lumière, no
Paris no Rio, fal-o dançar maxixe.
Imagine-se o astro-rei caído nos requebros exagerados da
nossa dança, como qualquer turuna da Cidade Nova! É
impagável!"
Jornal do Brasil, 25 de novembro de 1897

"Animatógrafo Super Lumière do Paris no Rio; há quadros de


todos os assuntos; desde o que diverte, tendo engraçados
episódios, até os que pinta desastre.
Para os apreciadores excêntricos desde últimos, isto é, para os
que gostam das comoções fortes, lá está um intitulado 'Um
Homem Apanhado Por Um Bonde'."
Jornal do Brasil, 30 de dezembro de 1897
8) Atentado Contra Prudente de
Moraes (1897)
" (...) O crime político está, enfim, implantado nos costumes
brasileiros. O assassinato de hoje, sem precedentes na nossa
história por isso mesmo, lançando profunda consternação no
seio da sociedade, provoca a mais justa indignação. O braço
que se estendeu contra a pessoa venerada de sr. presidente da
República; que assassinou os sr. marechal ministro da Guerra,
e que feriu quase mortalmente o sr. coronel Luiz Mendes de
Moraes, é simplesmente o instrumento inconsciente dessa
agremiação política que se quer impôr ao país pelo terror,
pela anarquia."
Narremos Os Fatos :
"Acabavam de desembarcar na ponde do trapiche do Arsenal
de Guerra o sr. presidente da República, ladeado pelo sr.
marechal ministro da Guerra e coronel Luiz Mendes de
Moraes, chefe da casa militar. Grande número de oficiais de
todas as patentes o acompanhavam. O povo abria alas à
passagem do venerado chefe da nação. Os vivas esturgiram
nos ares e as bandas de música fizeram ouvir o hino nacional.
As últimas notas deste acabavam de soar, quando um clamor
se elevou do grupo de que fazia parte o Sr. Dr. Prudente de
Moraes.
O soldado Marcellino B. de Miranda, 3a companhia do 10o
batalhão de infantaria, armado de uma pequena faca, investira
contra o Sr. Presidente da República. Neste momento o S.
Marechal Ministro da Guerra, em um rasgo de sublime
heroicidade colocou-se entre o soldado e a cobiçada vítima
dos furores jacobinos, protegendo-se com o seu corpo e com a
sua espada.
A arma homicida penetrou fundo no coração do bravo e leal
ministro. O coronel Mendes de Moraes, procurando também
defender o Presidente da República, recebeu grave ferimento
no baixo ventre esquerdo.
As espadas dos oficiais sairam das bainhas e ameaçaram de
morte o miserável assassino, que deveu a sua vida ao Sr.
Presidente da República, que declarou que o assassino
pertencia à Justiça.
Era uma hora e cinco minutos da tarde. Toda essa cena,
rápida, mais rápida do que o tempo que gastamos em
descrevê-lo, passou-se sob uma amendoeira que defronta com
o portão da Minerva.
Três minutos depois era cadáver o Sr. Marechal Carlos
Machado Bittencourt que foi conduzido nos braços de
diversos oficiais e paisanos para a sala das entradas, da
Intendência da Guerra, de onde mais tarde foi transportado
para a capela do Arsenal. O seu cadáver está coberto com a
bandeira nacional, e diversos amigos e parentes velam à sua
cabeceira.
O Sr. Coronel Mendes de Moraes foi conduzido para a sua
casa em padiola, carregado por 4 oficiais e acompanhado por
uma força do 10o batalhão.
O assassino, bastante machucado, em conseqüência da
resistência oposta no ato da prisão, foi recolhido ao xadrez do
arsenal, onde está incomunicável." -
Cidade do Rio, 5 de novembro de 1897
"A 1 hora da tarde foi apunhalado no Arsenal de Guerra, por
ocasião do desembarque do general Barbosa e dos batalhões
que voltavam de Canudos, o Sr. Marechal Carlos Machado
Bittencourt, Ministro da Guerra. A notícia foi transmitida
logo para o quartel-general, de onde partiu imediatamente o
Sr. Cantuária.
O agressor foi um aspençada do 10o de infanteria. O golpe
fora dirigido ao sr. Presidente da República.
O Sr. Ministro da Guerra, porém, antepondo-se ao agressor,
foi vítima da fúria deste, que lhe cravou três vezes a arma,
uma faca de lâmina fina, no peito, na virilha e em uma das
mãos.
Os oficiais do estado-maior do Sr. Presidente da República
atiraram-se sobre o soldado e espaldeiraram-no, sendo este
preso pelo alferes Murat. Seguiu-se um tumulto
extraordinário. Consta ter sido ferido o coronel Mendes de
Moraes.
O marechal Bittencourt foi transportado para a arrecadação do
Arsenal pelo tenente-coronel Bittencourt do 1o e alferes
Gonçalves, do 23o, onde expirou momentos depois; sendo
conduzido mais tarde para a capela do mesmo edifício.
Ao saber-se na Câmara do acontecimento em virtude do qual
faleceu o Sr. Ministro da Guerra, a sessão foi suspensa e mais
tarde levantada, depois de falarem os srs. Irineu Machado,
Nilo Peçanha, Serzedello, Augusto Montenegro e Arthur
Rios.
Foi nomeada uma comissão de vinte e um membros,
representando os estados da União, para comparecer aos
funerais. Não haverá sessão noturna."
Folha da Tarde, 5 de novembro de 1897
"Não podia ser mais profunda nem mais dolorosa a impressão
produzida no espírito público pelo ignobil atentato que teve
ontem por teatro o arsenal de Guerra. Um grito de justa
indignação percorreu a cidade, e cobriu-se a alma nacional de
luto diante do pavoroso crime.
Um soldado, mentindo à honra de sua farda e conspurcando
as tradições gloriosas do exército brasileiro, ousou erguer o
braço homicida contra o honrado chefe do Estado, que
encarna a soberania nacional, e, como lhe falhasse este golpe,
tirou a vida ao ilustre general Carlos Machado Bittencourt -
um benemérito da pátria, brasileiro dos mais dignos do
respeito e da estima de seus cocidadãos. (...)"
Gazeta de Notícias, 6 de novembro de 1897

"Num só movimento de surpresa e de indignação o povo


brasileiro estremece ante a pungentíssima tragédia de ontem.
A mesma dolorosa impressão fere de sul a norte todos os
corações, abatendo todos os espíritos, mergulhando-os na
mesma treva de dor e de apreensões. (...)
A atitude da imprensa, unânime hoje em protestar contra os
crimes ignóbeis que ontem ensangüentaram o Brasil, é a
melhor expressão do quanto é profunda a revolta que em
todas as almas bem formadas vieram eles provocar."
"A Gazeta da Tarde, externando o seu doloroso pezar pela
morte do bravo e dedicado marechal Machado Bittencourt,
associando-se ao luto justíssimo do exército e de toda a
nação, congratula-se ao mesmo tempo com o Brasil por ver
ileso no seu alto posto o Sr. Dr. Prudente de Moraes, o velho
e honrado republicano, que desde os mais árduos tempos da
propaganda toda a gente se habituou a respeitar."
"Continuaram hoje as manifestações de pezar pela morte do
marechal Machado Bittencourt. Todas as classes sociais têem
demonstrado o seu sentimento; é geral o luto na cidade.
Muitas casas comerciais cerraram as suas portas; as
repartições públicas encerraram o expediente, conservando-se
hoje fechadas; as redações de todos os jornais içaram
bandeiras a meio pau; deixaram de funcionar os teatros."
Gazeta da Tarde, 6 de novembro de 1897

"Escrevemos ainda sob a emoção da tragédia que ontem se


desenrolou diante da sociedade fluminense, enchendo-a de
indignação e luto. O que se passou no Arsenal de Guerra foi
tão rápido, tão imprevisto, tão fulminante que não há talvez
espírito que não se sinta atordoado ainda pela violência do
golpe e do absurdo da catástrofe. (...)
O que moveu o braço desse obscuro soldado e transformou
em miserável assassino um defensor da bandeira nacional, é
ainda para o povo um mistério que precisa ser completamente
esclarecido, para honra da Pátria, a bem da segurança social, a
bem da dignidade do poder."
À NAÇÃO:
"`As 2 horas da madrugada foi para o Diário Oficial o
manifesto do Sr. Presidente da República à nação. S.Ex.
declara que, ferido profundamente nos seus sentimentos de
homem e de brasileiro pelo atentado contra a sua pessoa
premeditado e que vitimou um dos mais dedicados servidores
da Nação, o Marechal Carlos Machado Bittencourt, afirma do
modo o mais solene que esse horroroso crime não terá o
efeito de demover uma só linha do caminho do dever e da
defesa da lei, do princípio da autoridade e das instituições
republicanas."
O Paiz, 6 de novembro de 1897

"Se o abismo tem o encantamento da atração, o crime é um


ensinamento e um incitamento para outro crime. Oxalá que o
nefando atentado de ontem encerre com o seu pesado luto este
ano nefasto em que nas ruas desta capital assaltaram-se e
saquearam-se casas particulares, se tinha opiniões adversas às
instituições, era garantido em seu direito de trânsito pelas leis
da República. (...)"
Jornal do Commércio, 6 de novembro de 1897
9) Bezerra de Menezes (1900)
"Succumbiu hontem, às 11 ½ horas da manhã, após longos e
dolorosos padecimentos, que foram a ultima prova imposta à
sua resignação verdadeiramente christã, o eminente brazileiro
cujo nome, encimando estas linhas, como homenagem
posthuma ás virtudes da sua vida, por tantos annos fulgurou
nos annaes da política do imperio e hoje, apenas vive na
tradição dos que o amaram, ou da inexhaurivel fonte da sua
bondade receberam inesqueciveis beneficios.
Foi esta a caracteristica essencial do venerado extincto.
Politico militante, filiado á mais adiantada parcialidade do
antigo Partido Liberal, deputado, vereador da extincta Camara
deste municipio, a cujos destinos por longos annos presidiu;
escriptor - que o era com raro merecimento e brilho - em
todas essas manifestações da sua actividade deu sempre o Dr.
Bezerra de Menezes as mais brillhantes provas da sua
capacidade de do seu valor moral e intellectual; mais foi
sobretudo no abnegado sacerdociu da sua clinica e na doce
penumbra da sua vida intima que mais refulgiram os
peregrinos dotes de seu espirito, multiplicando-se em
desvelos, em solicitude, em carinhoso desinteresse por todos
os que soffriam. E jamais bateu um desses, enfermo ou
necessitado, inutilmente á sua porta.
Tempo houve em que, fascinado pelo desejo de servir á sua
pátria, em cargos publicos, exclusivamente de confiança
popular, como acabamos de alludir, substituiu o exercicio da
medicina pela tribuna parlamentar ou pelos onerosos encargos
de chefe da Municipalidade, em que se conservou perto de
vinte annos. (...)
Passou através das grandezas deste mundo e do fastigio do
poder sem lhes sentir a vertigem, sombranceiro, indifferente,
alheio a ambiçãoes, tendo pelas seducções da fortuna um
desprezo que tanto contrasta com o culto hoje
incondicionalmente rendido a essa mesquinha preocupação,
cujo cultivo, em certas camadas da sociedade contemporanea,
tanto rebaixa o espirito da nossa nacionalidade.
É realmente edificante, no meio das ambições que na hora
presente se disputam entre nós a posse das melhores posições,
para a ostentação de insperadas opulencias, oppor o exemplo
desse grande cidadão, que não é mera figura - encaneceu no
serviço da Pátria e da humanidade e, tendo entrado para a
vida publica com fortuna, della se retirou pobre, depois de
haver exercido gratuitamente por um largo período, o cargo
de vereador, que não era então remunerado, em de ter tido em
suas mãos, como seu presidente, as chaves da
Municipalidade, de que não se utilizou senão para assegurar-
lhe as condições de prosperidade, de que rezam as tradições
desse tempo. (...)
Assim, de facto, viveu esse grande homem, mixto de
interesse, de abnegação, de fé e de grande moral, e que, de
sessenta e oito annos, voltados á actividade constante do
trabalho, extreme de ambições vulgares, sae da vida, deste
charco, que o não conspurcou, cercado de uma aureola de
virtude e atraves de uma glorificadora apotheose de bênçãos e
lagrimas. (...)
A sociedade brazileira, particularmente a sociedade
fluminense, contraiu com o venerando morto uma divida que,
revertendo em beneficios de sua familia, honrará a memoria
daquelle que tantos serviços lhe prestou. Resta que a pague,
provando assim que a ingratidão não é a única moeda com
que o povo costuma retribuir os sacerdocios dos que serviram
á patria e á humanidade. (...)"
O Paiz 12 de abril de 1900

"Falleceu hontem, ás 11 horas da manhã o dr. Adolpho


Bezerra de Menezes. O finado foi chefe politico do antigo
partido liberal, no regimen monarchico, na freguezia de S.
Christovão, onde gozava de real influencia; occupou os
cargos de eleitor especial e vereador, foi por muitos anos
presidente da camara municipal, e diversas vezes foi eleito
deputado geral, pelo 3o districto do municipio neutro.
Possuidor de grande fortuna, a politica e a pratica da caridade
empobreceram-no. A sua morte deixa um grande vacuo no
coração daquelles que tiveram ocasião de admirar de perto
quanto valia alma privilegiada.
Medico e medico habil, a sua vida foi, nos ultimos tempos um
continuo labutar em beneficio da pobreza; jamais recusou os
seus serviços áqueles que a elle recorriam. Dos pobres nada
aceitava; dos ricos recebia o que queriam dar-lhe. Por isso
morreu pauperrimo.
Para poder avaliar bem a grandeza d'alma do dr. Bezerra,
basta expor o seguinte facto, de que temos conhecimento,
entre muitos outros factos. Era o dr. Bezerra presidente de
uma companhia, com escriprorio a rua Sete de Setembro,
quando lhe appareceu um conhecido seu communicando-lhe o
fallecimento de um filhinho e dizendo-lhe, com as lagrimas
nos olhos, que, achando-se desempregado, não tinha recursos
para fazer o enterro. O dr. Bezerra chamou-o a um canto e
meteu-lhe na algibolsa todo o dinheiro que possuia. No
momento em que se propunha a retirar-se para a casa (morava
então na Tijuca) reconheceu que, tendo dado tudo nada lhe
restava para a passagem do bond, e pediu a um amigo
trezentos réis emprestados! As bênçãos da pobreza, que ele
soccorria o acompanharão para a morada celeste."
Jornal do Brasil, 12 de abril de 1900

"Depois de longos e crueis padecimentos, falleceu hoje o sr.


Antonio Bezerra de Menezes, antigo e estimado clinico desta
Capital. Exerceu entre nós o dr. Bezerra de Menezes varios
cargos de eleição popular, sendo considerado por muito
tempo um dos mais prestigiosos chefes do partido liberal do
antigo Municipio Neutro, durante a monarchia.
Por vezes escolhido pelo corpo eleitoral da cidade do Rio de
Janeiro seu representante na camara municipal do Rio de
Janeiro, por força da lei que outrora vigorava, foi o seu
presidente, e nesse caracter exercia grande influencia sendo
muito respeitado e considerado pelos chefes de sua
parcialidade politica, e gosando também de prestigio
verdadeiramente popular. (...)
Tendo exercido grande influencia como politico e homem de
acção, como médico que dispunha de clinica extensissima, ha
muito tempo que desaparecera da vida publica. Estava
retirado mas não esquecido. Não esqueceram seus
companheiros de luctas que nele tiveram um bom e leal
camarada, nem poderiam duvidar tantos quantos receberam os
muitos beneficios de que era prodigioso seu excellente,
bondoso e meigo coração."
Cidade do Rio, 11 de abril de 1900

"Falleceu hontem nesta capital o Dr. Adolpho Bezerra de


Menezes, influencia política do partido liberal do antigo
regimen.
Nascido no Estado do Ceará, fixou residência aqui logo
depois de formado na Faculdade de Medicina, sendo por
vezes eleito Vereador e Presidente da Câmara Municipal. Na
Câmara dos Deputados foi representante do Município Neutro
e de sua provincia natal, em varias legislaturas. Intelligente,
activo e dedicado ao seu partido o Dr. Bezerra de Menezes,
gozou de grande popularidade e prestigio chegando a ser
elevado a chefe incontestado do partido liberal nesta Capital,
depois da morte do Dr. Dias da Cruz.
Ha muito tempo que abandonando a politica entregou-se ao
exercício de sua profissão de médico, onde também se
distinguio pelo seu desinteresse e actos de caridade. Muitos
forão os amigos que teve quando no vigor de todo o seu
prestigio, do seu talento e de toda a sua popularidade. Morreu,
entretanto, muito pobre após longa enfermidade e apenas
rodeado do grupo de amigos que nunca o abandonou."
Jornal do Commércio, 12 de abril de 1900

"Faleceu hontem às 11 ½ horas da manhã o dr. Adolpho


Bezerra de Menezes, conhecido médico, residente nesta
Capital, onde gosava de geral estima. Era natural do Ceará,
tendo, durante o império, representado por diversas vezes o
Município Neutro na Câmara dos Deputados. Occupou
também, o logar de presidente da antiga Câmara Municipal. À
família enlutada apresentamos as nossas condolencias."
A Imprensa, 12 de abril de 1900
10) Revolta da Vacina (1904)
"O governo arma-se desde agora para o golpe decisivo que
pretende desferir contra os direitos e liberdades dos cidadãos
deste país. A vacinação e revacinação vão ser lei dentro em
breve, não obstante o clmamor levandado de todos os pontos
e que foi ecoar na Câmara dos Deputados através de diversas
representações assinadas por milhares de pessoas.
De posse desta clava, que o incondicionalismo bajulador e
mesureiro preparou, vai o governo do Sr. Rodrigues Alves
saber se o povo brasileiro já se acanalhou ao ponto de abrir as
portas do lar à violência ou se conserva ainda as tradições de
brio e de dignidade com que, da monarquia democrática
passou a esta República de iniqüidade e privilégios.
O atentado planejado alveja o que de mais sagrado contém o
patrimônio de cada cidadão: pretende se esmagar a liberdade
individual sob a força bruta..." -
Correio da Manhã, 7 de outubro de 1904

"Foi extrema a indignação que o projeto do regulamento da


vacina obrigatória excitou no ânimo de todos os habitantes de
Rio de Janeiro, cuja sensibilidade ainda não embotaram
interesses dependentes do governo e da administração
sanitária."
"Durante o dia de ontem foram distribuídos boletins
convocando o povo para um meeeting no largo de S.
Francisco de Paula, contra os demandos do Conselho
Municipal e da execução da lei da vacina obrigatória."
Correio da Manhã, 11 de novembro de 1904
"Parece propósito firme do governo violentar a população
desta capital por todos os meios e modos. Como não
bastassem o Código de Torturas e a vacinação obrigatória,
entendeu provocar essas arruaças que, há dois dias já, trazem
em sobressalto o povo.

Desde ante-ontem que a polícia, numa ridícula exibição de


força, provoca os transeuntes, ora os desafiando diretamente,
ora agredindo-os, desde logo, com o chanfalho e com a pata
de cavalo, ora, enfim, levantando proibições sobre
determinadas pontos da cidade."
Correio da Manhã, 12 de novembro de 1904

" (...) As arandelas do gás, tombadas, atravessaram-se nas


ruas; os combustores de iluminação, partidos, com os postes
vergados, estavam imprestáveis; os vidros fragmentados
brilhavam nas calçadas; paralelepípedos revolvidos, que
servem de projéteis para essas depredações, coalhavam a via
pública; em todos os pontos destroços de bondes quebrados e
incendiados, portas arrancadas, colchões, latas, montes de
pedras, mostravam os vestígios das barricadas feitas pela
multidão agitada. a viação urbana não se restabeleceu e o
comércio não abriu suas portas. (...)"
Jornal do Commércio, 15 de novembro de 1904

"Como ante-ontem, repercutiram-se ontem as correrias e


arruaças dos dois dias anteriores. Como na véspera, tiveram
princípio no largo de S. Francisco.
Desde que se manifestou o conflito, deu-se a intervenção da
força armada, segundo ordem do Dr. Chefe de Polícia, que,
por intermédio de seus delegados, determinara que a
intervençào só se desse em caso de conflito ou atentado à
propriedade.
Na rua do Teatro, do lado de Teatro São Pedro, estava
postado um piquete de cavalaria da polícia. Ao aproximar-se
o grupo de populares, a gritos e a vaias, a força tomou posição
em linha, pronta a agir, caso fosse necessário. A
movimentação do piquete de cavalaria aterrorizou um tanto os
populares que recuaram. Depois, julgando talvez que a
cavalaria se opussesse à passagem, avançaram resolutos,
hostilizando a força a pedradas. O comandante da força
mandou avançar também, dando-se o choque. (...) Serenado
mais ou menos o ânimo popular naquele trecho, seguiu a
força a formar na praça Tiradentes, fazendo junção com outro
piquete que ali se achava postado."
Gazeta de Notícias, 13 de novembro de 1904

"Seria preciso não conhecermos a vida da cidade do Rio de


Janeiro, mesmo nos seus dias anormais, para não
compreendermos os acontecimentos de ontem que encheram
de pânico e pavor toda a população.
Houve de tudo ontem. Tiros, gritos, vaias, interrupção de
trânsito, estabalecimentos e casas de espetáculos fechadas,
bondes assaltados e bondes queimados, lampiões quebrados à
pedrada, árvores derrubadas, edifícios públicos e particulares
deteriorados."
Gazeta de Notícias, 14 de novembro de 1904

MANHÃ DE ONTEM:
"Pela Rua Senhor dos Passos, às 7 horas da manhã, subia uma
grande massa de populares, dando morras à vacina
obrigatória. Pelos indivíduos que a compunham foram
atacados alguns bondes da São Cristovão. Ao entrar na Praça
da República foram virados os seguintes bondes: ns. 140, 95,
113, 27, 55, 105, 87, 101, 38, 41, 85, 56, 31, 13, 130, 101 e
129. Em alguns casos os populares atearam fogo. A Jardim
Botânico sofreu também prejuízos. seus carros no Catete e
Larangeiras, foram atacados.
BOMBAS DE DINAMITE:
"Já ontem apareceram as terríveis bombas de dinamite, como
elemento de guerra. A 3a Delegacia foi alvejada por inúmeras
bombas atiradas pelos populares; estes, ao fim de algum
tempo, conseguiram repelir a força de polícia, que foi
substituída por praças do corpo de marinheiros.
"A cada passo, no centro da cidade, erguiam-se barricadas e
trincheiras de onde os populares atacavam as forças militares.
as ruas da Alfândega, General Câmara, Hospício, S.Pedro,
Av. Passos etc. foram ocupadas pelo povo."
"Os alunos da Escola Militar do Brasil, depois de deporem o
general Costallat do comando desse estabelecimento,
elegeram, em substituição, o sr. general Travassos e em saída
saíram em grupos, naturalmente para se reunirem na praia de
Botafogo. Ao seu encontro seguiu do Palácio o 1o de
infantaria do exército, sob o comando do coronel Pedro Paulo
Fonseca Galvão."
Gazeta de Notícias, 14 de novembro de 1904

Interrompemos a nossa narração às 3 horas da manhã. Pouco


antes foi-nos telefonado do palácio que um delegado viria ver
as provas da nossa folha para se certificar de dávamos
notícias alarmantes. respondemos que as nossas notícias eram
símples narração de fatos. Foi-nos então pedido para retirar
algumas das notícias que enumerara e que entretanto foram
publicadas por outros colegas."
Gazeta de Notícias, 16 de novembro de 1904

"A evidente prova de que toda esta agitação em torno da


vacina é artificial e preparada com intuitos meramente
perturbadores, está em que as arruaças começaram,
justamente quando reiteradas declarações do Sr. Ministro do
Interior, feitas a todos os jornais,levavam à convicção de que
o que indiscretamente se publicou como sendo regulamento
da lei não só o não era como o não seria nunca. A discussão
sobre a questão da vacina tinha se conservado no terreno
doutrinário. (...)
"Continuaram ontem infelizmente as assuadas e correrias da
véspera no largo de S. Francisco de Paula, sendo necessária a
intervenção da força de polícia para dissolver os grupos de
turbulentos. Alguns gaiatos deram largo curso ao boato de
que à tarde havia um meeting naquele largo para o fim de se
protestar contra a obrigatoriedade da vacina, o que não
aconteceu; mas, não obstante, desde as 5 ½ horas começou a
afluir ao lugar indicado várias pessoas, que se aglomeraram
próximo à estátua de José Bonifácio.
Eram 6 horas. Notava-se no largo de S. Francisco de Paula
desusado movimento, quando principiou a assuada. Não havia
orador, todos se olhavam admirados sem saber porque ali se
estacionavam. Afinal, dentre os populares surgiram os
indivíduos Francisco de Oliveira e Lúcio Ribeiro, os quais,
subindo ao pedestal da estátua de José Bonifácio fingiram que
iam falar as massas. Os dois pandegos, porém, embatucaram
diante da grande multidão e limitaram-se a gesticular
estupidamente, sendo isso motivo de datisfação para a
garotagem que os aplaudia frenéticamente. (...)"
O Paiz, 12 de novembro de 1904

"Como nos dois dias anteriores, arruaças começaram ontem à


tardinha. Não esta convocado meeting, entretanto, desde 5
horas da tarde o largo de Sào Francisco de Paula esteve
repleto de gente em sua maioria curiosos."
"Enquanto se perde tempo e se despende energia nessa
agitação injustificável a pretexto da vacinação obrigatória,
vamos deixando de lado as questões que realmente nos
interessam e que afetam vivamente a situação do país. (...)
O Paiz, 13 de novembro de 1904

"Não há que se esconder a gravidade da situação que, desde


alguns dias já, se vinha desenhando no aspecto da cidade e
que tos os espíritos anunciavam porque a pressentiam e
apalpavam.(...)
Verdadeiras lutas foram travadas a peito nú entre populares e
as forças policiais de infantaria e cavalaria, distribuídas por
fortes contingentes nos pontos onde maior era a aglomeração
e onde as desordens mais se pronunciavam.
Na execução das ordens recebidas e conforme um edital da
polícia publicado pela manhã, a polícia interveio na dispersão
do povo, acometendo-o com cargas de espada e lança e não
raro travando verdadeiros tiroteios; o povo repelia-a a
pedradas, entricheirando-se como podia, e a força despejava
os revólveres. Iso mesmo sente-se da relação publicada dos
feridos, a maior parte por armas de fogo."
"Os estragos que a cidade apresentou na manhã de hoje,
árvores derrocadas, combustores retorcidos, quebrados, e
postes por terra, , edifícios com as vidraças estilhaçadas,
bondes quebrados uns, incendiados outros, tudo isso dá idéia
da intensidade dos conflitos de ontem e do desespero e
anarquia que reinaram nas ruas, que mais tétricas e cheias de
perigo se tornaram quando a noite caiu, privadas grandes
trechos de sua iluminação costumada."
"Jamais podiamos imaginar que da vacina obrigatória
pudessem surgir os distúrbios de ontem, iniciados na véspera,
depois dos breves mas violentos discursos pronunciados na
Liga Contra a Vacinação.
Combatendo a obrigatoriedade desta providência, o fizemos
sempre de acordo com a lei, em nome dos princípios
constitucionais e da liberdade individual, sem jamais
aconselhar a resistência à mão armada, que condenamos com
a maior energia porque a desordem não pode governar e o
prestígio da autoridade constituída não pode parecer diante da
subversão da ordem."
BARRICADAS:
"Na rua Senhor dos Passos, esquina da rua Tobias Barreto,
Sacramento e Hospício foram levantadas barricadas, havendo
em alguns pontos atravessado correntes e arames de lado a
lado da rua. Junto a essas barricadas os populares varavam a
polícia."
A Tribuna 14 de novembro de 1904
AS MANCHETES

Vacina ou Morte (Correio da Manhã)


O Monstruoso Projeto (Correio da Manhã)
Arruaça Policial - Novas Violências - Bondes Atacados -
Prisões - O Comércio Paralizado (Correio da Manhã)
A Revolta dos Alunos Militares - Gravíssimo Os Fatos de
Ontem - Combate em Botafogo - Tomada de Delegacia -
Montins na Saúde - Barricadas - Trincheiras - Assaltos a
Casas Populares - Morte e Ferimentos
(Gazeta de Notícias)
Estado de Sítio - A Conspiração - Discursos do Senador Rui
Barbosa - Rendição de "Porto Arthur" - Ataque à Fábrica
Confiança - Prisão do General Olympio de Oliveira -
Fechamento da Escola Militar - Prisão de Alunos da Escola
de Realengo (Gazeta de Notícias)
Graves Sucessos - Os Acontecimentos de Ontem - Barricadas
e Tiroteios - Conflitos, Ferimentos e Mortes - Providências do
Governo -
(A Tribuna)
11) Avenida Central (1905)
"Hoje deve ser entregue ao trânsito público a primeira
Avenida construida no rio de Janeiro, que recebeu o nome de
Central. Como é igualmente sabido, esta grande artéria será
oficialmente inaugurada hoje pelo Sr. presidente da
República, que cortará as fitas que a fecham. Quase todos os
prédios concluídos terão as suas fachadas ornamentadas com
bandeiras e garlhadetes.
Dentre estes, destacam-se os do Sr. Eduardo Guinle, posto à
disposição da comissão construtora da Avenida e do qual o
Sr. presidente da República assistirá ao desfilar das tropas, e
da Rio Light and Power. O primeiro acha-se internamente
decorado com muito gosto, tendo nos vastos salões, além de
escudos com bandeiras encimadas por guirlandas de flores,
muitos festões cruzando os tetos assim como nas sacadas que
dão para a Avenida. O outro prédio que se destacará pela sua
ornamentação é o em que se vê instalada a Light, que além de
outros enfeites terá a fachada iluminada por 500 lampadas
elétricas incandescentes multicores, tendo no centro uma
estrela formada pelas mesmas lâmpadas. esse prédio pertence
ao Sr. Conde Sucena. (...)
Os mastros fincados ao longo da Avenida, em número de 348,
terão galhardetes e serão ligados por festões. Em 41 desses
postes serão colocados escudos com os nomes dos
engenheiros da comissão da Avenida, assim como também
alguns com os nomes de vários construtores.
Os coretos, em número de sete, acham-se colocados nos
seguintes pontes da grande artéria: um em frente à Casa
Guinle; dois na praça circular; um em frente ao 1o Barateiro,
em forma de açafate de flores (este coreto será o mais belo);
um em frente ao Teatro Municipal e dois no trecho entre a rua
do Passeio e Santa Luzia. (...)"
Gazeta de Notícias, 15 de novembro de 1905

"Nem mesmo o mau tempo, tão inclemente e tão enfadonho


desde a noite da véspera, conseguiu arrefecer o júbilo e o
intenso enthusiasmo com que o povo acorreu a festejar o
aniversário da República, tão bem caracterizado pela
inauguração dessa monumental Avenida, que agora se oferece
não somente à nossa admiração, mas à de todo o país e à do
estrangeiro, como um exemplo do poder de vontade do
governo federal, auxiliado fortemente pela nossa engenharia e
pelos capitais e fortuna dos que viram na construção da
grande artéria um emprego remunerador, do mesmo passo
que uma contribuição pedida a todas as individualidades para
o engrandecimento moral e material desta terra.
A Avenida surgiu diante dela como uma maravilha, como a
aurora luminosa de um futuro grandioso. E todos esperavam o
dia ansiosos para levarem ao Sr. Rodrigues Alves, nas palmas
de suas aclamações, o testemunho do seu reconhecimento. O
tempo foi ingrato, injusto, impediu na sua crueldade que o
entusiasmo popular fosse o que ia ser, um longo e estrepitoso
grito de saudação ao governo, representado nesse homem
puro e bondoso, que na paz de sua convivência sente a grande
ventura do dever cumprido.
Realizou-se ontem, às 6 horas da tarde, a inauguração oficial
da iluminação da Avenida Central. A essa hora achavam-se
no escritório da Light os Srs. Drs. Teófilo de Almeida,
inspetor geral da iluminação pública, conselheiro Camelo
Lampréia, ministro de Portugal, Pearson, Drs. Rego Barros e
Paulo de Frontin, Brisson e vários engenheiros da comissão
construtora da Avenida.
Os diretores da light convidaram os Srs. ministro de Portugal
e Drs. Paulo de Frontin, Teófilo de Almeida e Pearson a abrir
os circuitos para estabelecer a comunicação às lampadas, que
em ato contínuo derramaram sobre a Avenida intensa luz.
Depois desta cerimônia foi servido às pessoas presentes
profuso lunch, fazendo todos em seguida o percurso da
Avenida em carros e automóveis. Apesár da chuva, a
iluminação produziu esplendido efeito."
A Tribuna, 16 de novembro de 1905

"A chuva interrupta que cae sobre a cidade, desde ante-ontem,


à noite, não permittiu que a inauguração da Avenida Central,
tivesse o brilhantismo anunciado... A inauguração apesar do
número de pessoas presentes, esteve fria. O conselheiro
Rodrigues Alves foi, durante longo tempo, acompanhado por
uma enormidade garotos, que pulavam de um lado para outro
lado, formando um sequito incomodo e alverecido. O povo,
divorciado por completo das festanças e pagodes oficiais, não
teve uma aclamação, não teve um viva, para o presidente da
República.
Na sacadas e janelas dos prédios já construídos, já por
concluir, em alguns dos quais foram improvizados pavilhões
viam-se muitas famílias.
9:00 foi lançada pelo vigário de São José, a benção à
Avenida, assistindo a essa solenidade os membros da
comissão construtora, além de convidados.

9:50 Chegada do Presidente da República acompanhado do


Almirante Julio de Noronha, ministro da Marinha, marechal
Argolio, ministro da Guerra e Dr. Lauro Muller, ministro da
Indústria, Viação e Obras Públicas. O landau do chefe da
nação era escoltado por um piquete de 40 praças do 9o
Regimento de Cavalaria.
À chegada na Avenida, no extremo da Prainha, o chefe da
nação e sua comitiva foram recebidos pelo Dr. Frontin e toda
a comissão construtora. O Dr. Rodrigues Alves desfez o laço
de fitas que interceptava a passagem pela grande avenida. Foi
então tocado o Hino Nacional pela banda de música da
Companhia Luz Stearica.
O presidente da República, seguido de sua comitiva, dos
membros da comissão da Avenida, representantes da
imprensa e convidados dirigiu-se então para um dos edifícios.
Dali, de uma sacada adornada especialmente para o ato, Sua
Exel. junto com os ministros assistiu ao desfilar das forças,
que contornavam o prédio, pela rua Acre. (...)
Hontem, enquanto ao espoucar do champagne festivo e o
mastigas das festivas empadas, a gente do governo
inaugurava a Avenida, sob o hospitaleiro tecto dos felizardos
Guinle, centenas de famílias abandonavam os lares nos carros
dos benemeritos bombeiros buscando abrigo onde se refugiar
da massa d'água que lhes invadiu às casas.
O dinheiro do contribuinte foi esbanjado, foi desperdiçado em
indenizações vergonhosas, em que se abarrotou a advocacia
administrativa, foi distribuido em negociatas e arranjos.(...)"
Correio da Manhã, 16 de novembro de 1905

"Raras vezes um acontecimento publico terá attrahido a uma


extensa área da cidade mais gente do que a inauguração da
Avenida Central attrahio hontem desde pela manhã á zona
urbana, vulgarmente conhecida pelo nome de "centro". É
evidente que a affluencia maior se localizou na nova via de
comunicação, mas todas as transversaes entre o largo de S.
Francisco e o Rocio, de um lado, o largo do Paço e a rua
Direita, do outro, foram, desde as 7 horas da manhã, outros
tantos carreiros por onde se agitou num fluxo continuo e
animado um dos mais vastos formigueiros humanos que a
actual geração será dado presenciar.
O facto demonstra o grande interesse da população pelo
importante melhoramento que o actual Governo lega á Capital
do paiz. Esse interesse, apressamo-nos em dizel-o, é de todo
justificado. O extrangeiro que visitar agora a nossa Capital ja
tem na Avenida um bello exemplo do progresso material que
o Rio de Janeiro se sente resolvido a realizar. Está de vez
morta a exlusividade de seducção que a naturaleza, e só ella,
exercia sobre quantos extranhos nos visitavam. Subsistirá
sempre a seducção das bahias, das arvores e dos morros, mas
a Avenida já prova que estamos resolvidos a construir outras
joias que nós mesmos fabriquemos sem nos limitarmos tão
sómente a exhibir aquellas em que de modo algum
trabalhamos.
Foi porque o animava esta mesma convicção, que o povo
durante toda a manhã e parte da noite se escoou
constantemente entre os dous flancos da Avenida em ondas
compactas que só cessaram depois das dez da noite, ante a
necessidade imperativa do descanso.
O tempo não quiz collaborar com a população na consagração
do melhoramento novo, mas, considerada a verdadeira
avalanche humana que com dia feio encheu a Avenida, quasi
se pode abençoar o acaso do tempo, pois sem elle o estadio na
nova arteria principal da cidade se teria tornado intoleravel.
Ao demais, ante a má vontade do tempo, os cariocas
souberam encolher desdenhosamente os hombros. As
senhoras, ás janellas dos prédios já concluidos, em palanques
improvisados no arcabouço dos em construção, ou pelas ruas
chapinhando na lama aristocratica da grande rua elegante,
pareciam affirmar que esse documento de progresso valia
bem o holocausto de um vestido, de elevado preço que fosse.
Do lado dos homens, uma ou outra cartola foi naturalmente
votada á perdição, como tributo expontaneo á commemoração
grandiosa. Os proprios soldados, marcises e serenos, pareciam
elles proprios indifferentes ao gottejar da chuva sobre ou
dourados e alamares das fardas e deram á Avenida a nota
sympathica da sua presença. (...)"
Jornal do Commercio, 16 de novembro de 1905

"A esperança de um bello dia sagrando uma bella data e uma


bella obra desfez-se, infelizmente; o sol não veiu, e foi sob
um aguaceiro impertinente e odioso, fino e pulverizado a
começo, grosso e encharcante depois, que se fez hontem a
inauguração da formosa avenida que foi, no dia da festa da
República, a concretização mais evidente e irrecusavel das
suas promessas de melhores dias. O ceo amanheceu turvo e
torvo se conservou até a noite, como uma carranca de
sebastianista impenitente.
A despeito disto, a inauguração da Avenida Central e as
commemorativas que se confundiram nesse facto, tiveram um
brilho consolador. Não houve sol, mas houve enthusiasmo; e
a multidão que veiu para a rua e que a despeito do chuveiro se
derramou pela grande via, enchendo-a de vida e movimento,
nela se conservou ate dessaparecer no angulo da rua do
Passeio o ultimo soldado da desfilada militar, valeu como
consagração e calor pelo mais claro sol destes claros dias de
novembro. (...)
Para toda essa gente a avenida era como uma noiva linda, de
que uns querem apanhar bem o geito, a maneira, a impressão
das ultimas horas de solteira, e a quem outros se contentam de
olhar, de alma aberta, felizes e radiosos unicamente de vel-a
radiosa e feliz. (...)
Às 9 horas resoava para os lados da Ajuda a vibração marcial
de uma banda de cornetas. Houve um fremito na multidão, já
densa. Pouco depois apontava no extremo da avenida o
brilhante estado-maior da divisão militar, a cuja frente se
destacava, pequeno e incisivo, o perfil napoleonico, como
escreveu um reporter das ultimas manobras, do general
Hermes da Fonseca, e após elle as pontas reluzentes e as
bandeirolas vermelhas do piquete de cavallaria. Mais um
pouco se surgia o estado-maior da brigada da marinha,
chefiado pelo contra-almirante Rodrigo Rocha, e apos este,
em uma longa fila, admiravelmente alinhada, de gorros
brancos, o primeiro corpo de marinheiros nacionaes. Seguiu-
se o outro logo e immediatamente os pelotões flammantes do
batalhão de infanteria de marinha appareceram, movendo-se
como uma successão de faixas vermelhas que os guias
mantivessem pelos extremos impeccavelmente distendiadas...
(...)
A fita inaugural da avenida fôra rota; a grande via estava
aberta officialmente para o Rio de Janeiro; e por entre a
massa popular, vibrante, exaltada, movida por um explicavel
e justo enthusiasmo, a carruagem presidencial, onde se
alliavam as figuras do chefe do Estado e do ministro que
fizera a construcção admirada, desfilava vagarosamente
diante das continencias da divisão e das acclamações do povo.
(...)"
O Paiz, 16 de novembro de 1905
AS MANCHETES:
Luxo e Miséria (Correio da Manhã)
As Festas Da República (A Tribuna)
12) Machado de Assis (1908)
"O Brasil acaba de perder o filho que mais alto o elevou no
mundo das letras. A Morte, sempre impecável era a sua triste
missão, ceifou ontem a vida preciosa de Machado de Assis - o
Mestre querido e respeitado da literatura pátria. (...)
Machado de Assis nasceu inteiramente pobre e foi no seio da
pobreza que ele se criou e deu os primeiros passos na sua
vida. A struggle for life tornou-o artista e foi na qualidade de
símples compositor que ele entrou um dia para as oficinas da
Imprensa Nacional. mas dotado de um invejável talento e de
uma vasta erudição, - espírito observador por excelência -
Machado de Assis não tardou a revelar-se o escritor
primoroso, cujo passamento acaba de trazer a dor e o luto a
todo o país. (...)
Morreu Machado de Assis. À hora em que escrevo esta frase,
nesta mesma seção, em que há apenas algumas semanas,
acusava a recepção de Memorial de Ayres, o livro de afeto,
que lhe prolongou a vida, ele jaz embalsamado, no salão da
Academia de Letras, aguardando a hora solene que que todos
os que, nesta terra, prezam e amam as manifestações de
espírito, lhe vão render as últimas e supremas homenagens,
que restritamente, lhe são devidas.
Machado de Assis atravessou três gerações literárias e por
todas elas foi considerado o que era realmente: um mestre
desta difícil arte de escrever. Em face de seu corpo
inanimado, pode-se lhe fazer a justiça plena; e essa justiça
deve-se traduzir num apoteose. Transformando os seus
funerais numa glorificação, o povo brasileiro não rende
apenas o preito devido ao pensamento e à arte, glorifica-se a
si mesmo, porque é, de fato, uma glória que constitunamos o
meio superior, indispensável à existência, ao
desabrochamento, à evolução de um espírito tão primoroso,
como o do autor do Braz Cubas. (...)"
A Imprensa, 30 de setembro de 1908

"Não é uma símples perda. A morte de Machado de Assis é


uma catástrofe no mundo das letras nacionais. Era impossível
de resto guardar por mais tempo uma vida que se prendia à
nossa por um fio delgado. Machado de Assis desde que se foi
a sua companheira de tantos anos, já não vivia senão a vida da
saudade, a vida da recordação, daquela que fora o conforto da
sua existência, o arrimo da sua velhice e a suprema
inspiradora de toda a sua generosa obra literária. O
desaparecimento do Mestre é tanto mais irreparável quando
ele cai de uma altura literária à qual ninguém entre nós
atingiu antes dele. (...)
Porque Machado de Assis não foi nenhum filho da fortuna,
ele teve de lutar incessantemente contra todos os obstáculos
da vida. Não gozava saúde, não tinha meios para se
desvencilhar das amarguras em que seu espírito sossobraria
de certo, se ele não tivesse a couraça de uma energia que
ninguém adivinhava na serenidade e na doçura daquela alma
de criança. Entrou lutando e tombou vencido pela dor e pela
saudade. (...)
Era poeta, publicista, cronista, conteur. O seu nome em
literatura era Legião. Valia por um pelotão de estrategistas.
Era mais forte do que uma guarda de escolhidos. (...)
Descrevia coisas ordinárias extraordinariamente bem. O estilo
é o homem. Na naturalidade da obra do Mestre descobre-se
sem esforço a simplicidade do homem na sua vida pública e
particular. E era esse o maior encanto dos muitos amigos do
pranteado morto. (...)
Daqui a muitos anos, talvez a muitos séculos, as gerações que
substituirem as que se forem mergulhando para o outro lado
do mundo terreno, hão de ir buscar à obra do Mestre
ensinamentos preciosos. Porque os gênios não desaparecem;
transformam-se apenas em anjos de guarda das nações de que
foram figuras precipuas. (...)"
O Século, 29 de setembro de 1908

"O homem que hoje desapareceu de entre os vivos não era


apenas um fino cultor das letras, um romancista de nomeada,
um conteur exímio, um cronista encantador - era acima de
tudo isso o mais alto, mais delicado e pertinaz amigo da
literatura nacional.
Consciente de seu valor, do prestígio de seu nome na arte
Machado de Assis não se isolava na legendária torre de
marfim dos orgulhosos e misantropos, o que ele buscava não
era a glória e o respeito para o seu nome unicamente, o que
ele queria ver aureolada de veneração, reconhecida como uma
força sublime, como um fator da grandeza nacional era a
literatura, a profissão de homem de letras, que amava acima
de todos e cultivava com fervor de sacerdote. (...) Daí a sua
preocupação tão ardente, tão fanática, que foi quase ingênua,
de formar academias, criar um núcleo que atraísse o olhar de
todo um povo, fundar a aristocracia das letras. (...)
O grande escritor Machado de Assis sofria há muito tempo e
veio a piorar rapidamente depois da morte de sua idolatrada
esposa. Domingo último mais se afirmaram os padecimentos
até que hoje às 3,45 da madrugada, a arterio-sclerose teve o
seu termo final. (...)
Foi agraciado com os títulos de cavalheiro e oficial da Ordem
da Rosa e pelo seu valor literário mereceu a eleição à
presidência da Academia Brasileira de Letras."
A Tribuna, 29 de setembro de 1908

"A literatura nacional acaba de sofrer, com a morte de


Machado de Assis, seu chefe incontestado, uma perda
verdadeiramente irreparável, e que não podia ser maior nem
mais dolorosa.
Sem falar nos seus dotes de imaginação, que não eram
extraordinários, Machado de Assis foi um dos escritores mais
puros da língua portuguesa no século XIX e o seu nome será
repetido a par de Garrett, Camillo e outros mestres ilustres.
Favorecido por uma cultura literária formidável e pela
faculdade do trabalho abundande e fácil, Machado de Assis
deixa uma obra considerável, a maior, talvez, que ainda saiu
da pena de um homem de letras brasileiro. Na poesia, que foi
a primeira manifestação do seu talento, no romance, no teatro,
no conto, na fantasia, na crônica, em tudo ele brilhou
intensamente; nenhum trabalho, ainda o mais insignificante,
lhe saiu das mãos que não tivesse o cunho do definitivo, do
bem acabado. (...)
Joaquim Maria Machado de Assis nasceu no Rio de Janeiro
em 21 de junho de 1839 e era filho legítimo do operário
Francisco José de Assis e de D. Maria Leopoldina Machado
de Assis. Os seus estudos foram irregulares. Ao deixar a
escola de primeiras letras, sabendo apenas ler e escrever,
tratou de instruir-se a si mesmo, sem professores nem
conselheiros, e assim adquiriu todos os conhecimentos
indispensáveis à carreira com que devia ilustrar o seu nome.
(...)
Em 1858, Machado de Assis abraçou a arte tipográfica, mas
no ano seguinte abandonou-a, para ser revisor de provas da
famosa casa de Paula Brito e do Correio Mercantil. Em 25 de
março de 1860 encetou a sua vida jornalísica, ao lado de
Saldanha Marinho, Quintino Bocayuva e Cesar Muzio, no
Diário do Rio de Janeiro. (...) Em 1867 o governo imperial
agraciou-o com o grau de cavalheiro da Ordem da Rosa, por
serviços prestados às letras brasileiras; em 1888, a princesa D.
Isabel elevou-o a oficial da mesma ordem; mas a honra maior
que ele recebeu em vida, foi a presidência da Academia
Brasileira, que os seus confrades lhe deram por aclamação.
Em 1869 casou-se Machado de Assis com D. Carolina
Augusta Xavier de Novaes, irmã de Faustino Xavier de
Novaes, a qual faleceu há três anos. A viuvês foi para o
grande escritor um golpe terrível, que o aniquilou, agravando
os seus antigos padecimentos. Pode-se dizer que, depois da
morte da querida esposa, Machado de assis não viveu mais:
morria aos poucos. Sozinho no mundo, sem filhos, sem
parentes, não resistiu à perda da extremosa companheira de
tantos anos. (...)"
O Paiz, 30 de setembro de 1908

"Morreu Machado de Assis. Perde a nossa língua um de seus


mais vigorosos e profundos escritores. Com ele desaparece a
mais leve e a mais encantadora das nossas prosas, a mais
completa e a mais perfeita das organizações literárias que
possuimos. Poeta, romancista, dramaturgo e jornalista, era
Machado de Assis o tipo culminante e o mais simpático do
nosso mundo de letras. Sua perda é irreparável. Num país
como o nosso, já tão pobre de espíritos brilhantes como o seu,
esse desaparecimento é mais importante do que parece. (...)
Não mais nos será dado ler novos primores da pena que
escreveu Quincas Borba e Dom Casmurro. Machado de Assis
desaparece e embora cubram-lhe a tumba de flores e a sua
memória da mais profunda saudade, do seu estro só nos
restará a lembrança que nos seus livros, no entanto, palpitará
sempre luminosa e forte como o sol. (...)
Quem entrasse, às 4 horas, no Guarnier havia de ver,
invariavelmente, um homem pequeno, franzino, de barba
curta e quase branca, sempre numa das cadeiras que correm a
fila das brochuras francesas, entre as pernas um indefectível
guarda-chuva. Tinha um ar cansado, se bem que a fisionomia
lhe sorrisse todas as vezes que um chapéu se erguesse ou uma
mão apertasse a sua, sempre com grande interesse e respeito.
Era Machado de Assis. Fechada a sua repartição, subia ele
Ouvidor acima, caminho do Guarnier, àquela mesma hora,
sempre com o seu passo rítmico e nervoso de quem vai ao
cumprimento de um dever sagrado. (...) E velhos e novos,
acadêmicos e poetas que surgissem, óculos e cabeleiras,
cercavam-no com interesse, com curiosidade ou admiração.
De toda a grande nave da livraria, era a figura, a mais vista e a
mais admirada. (...)"
Correio da Manhã, 30 de setembro de 1908
13) Inauguração do Teatro
Municipal (1909)
VISITA AO TEATRO MUNICIPAL:
"Realizou-se ontem à noite uma visita ao Teatro Municipal,
para que o Dr. Oliveira Passos enviou convites à várias
pessoas e à imprensa. Desde 7 horas da noite começaram a
chegar convidados àquele teatro, dirigindo-se todos para a
platéia, camarotes e galerias.
Quando o teatro se achava cheio, tiveram início as
experiências, que agradaram imensamente. A iluminação de
todo o edifício é belíssima e farta, distribuída por focos
elétricos os mais modernos. Pela eletricidade são obtidos
todos os efeitos teatrais, como relâmpagos, chuvas, trovoadas,
etc.
As várias dependências do teatro, como sejam platéia,
camarote, galerias, botequim, camarins etc. agradaram
também muito É enfim uma obra bem feita luxuosa, de
gosto."
O Século, 13 de julho de 1909

"Está oficialmente inaugurado o Teatro Municipal, obra em


que se gastou muito dinheiro, mas está suntuosamente
levantada. (...)
A inauguração oficial efetuou-se ontem, às 2 horas da tarde,
com a presença do vice presidente da República, prefeito do
Distrito Federal, intendentes municipais, engenheiros
construtores e outros membros da comissão construtora,
superintendente do teatro e jornalistas. O chefe da Nação
percorreu todas as dependências do edifício e depois assinou
a ata da inauguração. Foi servido champagne, orando o vice
presidente da República, o Dr. Oliveira Passos e o intendente
Eduardo Raboeira.
À noite realizou-se o espetáculo inaugural, com a presença do
chefe do Estado, prefeito, intendentes municipais, ministros,
deputados, senadores e o alto funcionalismo público.
Antes das 8 horas da noite já era crescido o número de
pessoas que nas imediações do teatro aguardavam a chegada
dos que deviam assistir à brilhante festa. O espetáculo
começou pelo hino nacional, executado por uma orquestra de
64 professores, sob a regência do maestro Francisco Braga.
Em seguida Olavo Bilac, em um discurso magnificamente
burilado, fez uma rápida e interessante história do teatro
nacional e estrangeiro, sendo, ao concluir, delirantemente
aplaudido e chamado ao proscênio. (...)"
O Século,15 de julho de 1909

"Entre a Avenida Central e a Rua Treze de Maio, voltado a


sua fachada - imponente nas puras linhas do reu estilo do
Renascimento - para o mar - o Teatro Municipal avulta num
deslumbramento de ouro e mármore, de cristais e vitraux. E,
para todos nós, ele, ali está, como uma esperança de melhores
dias para a nossa arte dramática, que a incoerência de uns, a
má compreensão de outros deixam cair até a degradação do
momento atual. (...)
O Teatro Municipal que hoje inauguramos é bem um bemplo
em cuja nave esperamos ver um dia - não muinto longe - o
ressurgimento dessa arte que será para nós também, como
outrora para os helenos, a escola de energia de que tanto
carecemos.
O programa para esta tarde é o seguinte:
1a Parte: Hino Nacional, Discurso Oficial do Sr. Olavo Bilac,
Insomnia - Poema Sinfônico do Maestro Francisco Braga.
2a Parte: Noturno, da Ópera Condor de Carlos Gomes ,
Bonança - Peça de Um Ato de Coelho Netto, Desempenhada
Pelos Atores Nacionais.
3a Parte: Moema - Ópera Lírica em Um Ato de Delgado de
Carvalho, Cantada por Artistas do centro Lírico Brasileiro."
A Imprensa, 14 de julho de 1909

"A sociedade fluminense vai hoje assistir à inauguração do


suntuoso monumento de arte que é o Teatro Municipal e, ao
mesmo passo, assistir a um espetáculo exclusivamente
nacional. (...)
Coelho Netto era decerto imprescindível neste espetáculo, que
bem se pode considerar o início de uma nova era para o teatro
nacional, e o grande escritor escreveu um ato que é a
revelação de um ideal novo na nossa literatura profundamente
original: Bonança marca uma nova fase de seu teatro como o
verificarão os que logo tiverem a ventura de a ouvir. Para
interpretar essa nova produção do fecundo autor nacional veio
de São Paulo a companhia dramática Arthur Azevedo, de que
é a primeira figura feminina a distinta artista Lucilia Peres.
Com Coelho Netto aparecem também neste espetáculo
genuinamente nacional dois musicistas brasileiros: Francisco
Braga e Delgado de Carvalho. O primeiro apresenta o poema
sinfônico "Insomnia", com texto de Escragnolle Doria. O
segundo a sua ópera Moema.
Mas a eloqüência oratória devia ter também uma alto
representante nessa festa intelectual. Essa é representada por
um dos maiores poetas e prosadores brasileiros, Olavo Bilac,
que fará o discurso inaugural.
Tomam parte na interpretação da Bonança as atrizes Lucilia
Peres, Gabriella Montani e Luiza de Oliveira e os atores A.
Ramos, Nazareth e João de Deus. A Moema terá como
intérpretes a sra. Laura Malta e os srs. Americo Rodrigues,
Oswaldo Braga e Mario Pinheiro. A orquestra dirigida por
Francisco Braga é composta de 64 pessoas, muitas das quais
professores do Instituto. o cenário da Moema é trabalho do
distinto cenógrafo Chrispim do Amaral."
A Notícia, 14 de julho de 1909

" (...) Contudo o efeito da sala era deslumbrantíssimo. A fina


elegância, o rigor de toilette foi mantido e as linhas dos
camarotes apresentavam um belíssimo golpe de vista. A sala é
um encanto cheio de público. As localidades bem dispostas, o
forrado cautchouc abafando o rumor dos passos, todos os
pontos com boa vista para o palco dão uma impressão
agradabilíssima. A acústica é excelente como ontem se pôde
verificar com a audição dos dois g6eneros teatrais, o musical
e o declamado. Longe do que poderia se esperar pelas suas
dimensões, a sala parece pequena e os espectadores mais
afastados como se sentem próximos do palco. O espetáculo
correu magnificamente.
O hino nacional, a sinfônia Insomnia, de Francisco Braga, o
Noturno da ópera Condor, Carlos Gomes, bem como a
partitura da ópera Moema, de Delgado de Carvalho, foram
excelentemente executados pela orquestra de 64 pessoas,
regida pelo maestro Francisco Braga. A peça de Coelho
Netto, Bonança, também teve excelente interpretação,
sobretudo por parte das sras. Gabriella Montani e Luiza de
Oliveira e do sr. A. Ramos. (...)
O discurso de Bilac foi mais uma dessas orações de que o seu
talento é tão pródigo, em tudo à altura da magnificência e do
esplendor dessa soberba festa de arte que foi a inauguração do
suntuoso monumento."
A Notícia, 15 de julho de 1909

"Foi ontem inaugurado o Teatro Municipal. O ato revestiu-se


da maior solenidade: era numerosa a assistência, notando-se o
presidente da República, o prefeito, senadores, deputados,
membros do Conselho Municipal, pessoas gradas e
representantes da imprensa.
O presidente da República chegou ao Teatro Municipal às 2
horas da tarde, acompanhado do seu secretário e do chefe da
csa militar. Esperavam-no, no topo da escada, o prefeito, o
Dr. Passos, engenheiro construtor, e várias pessoas. S. Ex.
percorreu o edifício, examinando-o atentamente e mostrando-
se maravilhado e satisfeito.
O termo de inauguração foi lavrado e assinado na sala da
biblioteca. Depois passaram-se as altas autoridades e os
convidados para o restaurant, onde, ao servir-se de
champagne, o presidente da República felicitou o engenheiro
Passos, que agradeceu a saudação. Falou também o intendente
Raboeira, em nome do Conselho Municipal. Já em tempo
descrevemos o edifício, que é imponente e suntuoso."
Folha do Dia, 15 de julho de 1909

"É hoje finalmente a inauguração do Teatro Municipal, com o


programa já divulgado. Ontem à noite conferenciou com o
presidente da República relativamente ao assunto o prefeito
do Distrito Federal deliberando que o sr. Nilo Peçanha
visitará às 2 horas da tarde, aquele teatro em companhia do
prefeito e dos intendentes municipais, assinando, nessa
ocasião a ata inaugural. Ficou assentado, ainda, nessa
conferência, que à disposição dos intendentes serão postos os
camarotes de gala do presidente da República e do prefeito
para que eles possam daí assistir ao espetáculo em companhia
do chefe da Nação e do representante do poder executivo
municipal."
Correio da Manhã, 14 de julho de 1909

"Realizou-se ontem, com todo brilho, a inauguração desde


monumento nacional. Concorrência da mais seleta, toilettes
de muito bom gosto, enfim um verdadeiro sucesso, sucesso
este que só se pode comparar com o que está tendo a casa
Colombo com a sua colossal liqüidação."
Correio da Manhã, 15 de julho de 1909

" (...) A platéia completamente cheia de cavalheiros e


senhoras deixava destacar estas pelo luxo, riqueza de
adereços, formosura das cabeças e colorido variado dos trajes
dos cavalheiros na sua uniforme e correta casaca preta.
Nas luxuosas frisas e camarotes, como nos balcões e galerias
nobres superiores era a mesma encantadora beleza de
contraste, tão comum, e sempre admirável e pomposo,
espandindo-se até a orla última - a galeria - onde curiosa,
embevecida, a nossa mocidade acadêmica, misturada com o
povo de todas as classes, fechava o ambiente que a cúpola
ilustrada por Visconti coroava."
O Paiz, 15 de julho de 1909

"Inaugurou-se ontem o suntuoso monumento com que a


prodigalidade municipal dotou a cidade. O edifício colossal e
soberbo parecia uma imensa mole de granito, mármore, ouro,
bronze e vidros, resplandecendo à luz branca que jorrava do
seu bôjo numa fulguração que deslumbrava.
A multidão olhava para o teatro como tomada de assombro
ante aquela grandeza, fruto de uma megalomania e abria alas
para os que lá dentro iam assistir ao espetáculo de
inauguração. (...)
Carros e automóveis, numa fila interminável, chegavam
apressados, desde oito horas da noite, e despejavam na rua
Treze de Maio e Avenida Central homens encasacados e
enluvados e senhoras que escondiam sob vistosas capas e
amplas mantas o luxo das toilettes, a riqueza das jóias, as
núvens de rendas, as ondas de perfume."
Jornal do Commércio, 15 de julho de 1909

"A noite de ontem foi de grande, de intenso júbilo para a alma


carioca, alguma coisa de uma noite verdadeiramente de gala,
associada à grande data que a França e o mundo comemoram,
a inauguração do belo e opulento Teatro Municipal, com
muito poucos rivais nas grandes capitais européias. (...)
Tudo ali falava no nosso progresso, do nosso adiantamento,
da nossa cultura espiritual, da civilização dos nossos
costumes, do apuro do nosso gosto: o edifício que se
harmoniza com a nossa sociedade, a sociedade que faz honra
ao grande sacrifício do poder municipal, dotando a cidade
com aquele rico monumento e fazendo calar os velhos
reclames de não possuir o Rio de Janeiro uma casa de
espetáculos digna do seu desenvolvimento, capaz de abrir
caminho à idéia que o malogrado Arthur Azevedo tão
longamente acariciou, na pertinácia beneficiadora da arte
dramática brasileira, de que ele foi o esteio mais poderoso,
como escritor e amigo dos artistas, que perderam com a sua
morte o mais desinteressado de seus protetores, o mais leal
dos seus amigos. (...)
Noite de opulentas galas, dissemos, pelo aspecto ofuscante de
todas aquelas belezas de arquitetura em foco, pela
resplandecência daqueles mármores custosos, esbatidos e
faiscantes às lâmpadas e candelabros elétricos; noite de arte
pela magia da palavra de Olavo Bilac na sonoridade de seu
discurso historiador e poético, pela música e pela cena
brasileira em que se casaram, para celebrar a fausta
inauguração, a linguagem e a urdidura da leve Bonança de
Coelho Netto, e as gammas dos nossos musicistas, em
poemas de harmonias sensibilizadoras."
A Tribuna, 15 de julho de 1909
14) Euclides da Cunha (1909)
"Varado de balas, num suburbio distante e ermo, a que o
conduzira a perturbaçào de uma idéa fixa e o aguilhão
mordente de uma suspeita allucinadora, morreu hontem
Euclides da Cunha, o escripror poderoso que a publicação dos
"Sertões", o seu primeiro livro, deu ao Brazil a goloria de um
novo estylista e a segurança de uma alta capacidade de estudo
e de trabalho posta ao serviço constante do paiz.
Hoje não ha em toda a vasta extensão da nossa terra pessoa
medianamente culta, que lhe não conheça o nome. Foi como a
arraiada radiosa de um sol; e desde então, aureolado de um
prestigio que augmentava com o tempo, ficou sendo na vida
contemporanea um vulto inconfundivel e um consagrado. (...)
Seriam pouco mais ou menos 10 horas da manhã, quando
repetidos estampidos de tiros de revolver, alarmaram os raros
e pacatos moradores da estrada Real de Santa Cruz, no trecho
de Inhauma, pondo-os em sobresalto.
Ávidos de curiosidade e passada a primeira impressão,
procuraram averiguar de que se tratava; e dirigiram-se para os
lados de onde lhes parecia ter partido o tiroteio, que era na
casa n. 214, residencia de dois moços estudantes militares.
Ahi, alguns populares mais animosos, penetraram no pequeno
jardim, deparando-se-lhes estendido ao chão, com dorso
inclinado sobre os degráos de uma pequena escada que dá
saida da casa, o corpo de um homem, todo ensanguentado, e
que no momento estava sendo carregado para o interior, por
dois outros, tambem ensanguentados, e em cujas
physionomias se espelhavam grandes dores physicas e
moraes.
Estupefactos com o que presenciavam, não lhes occorreu
logo, á mente a idéa de penetrarem na casa; conservaram-se
em uma atitude de mixto de mêdo e respeito, até que um dos
do grupo falou, lembrando chamar-se a policia, idéa a que
logo outro accedeu, partindo a correr em demanda da
delegacia.
Enquanto isto se passava, chegava ao local uma senhora
acompanhada de um rapaz que carregava nos braços uma
criança; e apressada, arfando de cansaço, rompia o
aggrupamento de curiosos, e penetrava tambem na casa.
A esse tempo o comandante da guarda nocturna, que havia
recebido pelo telephone aviso do que occorria chegava á casa
e penetrava-lhe no interior, encontrando sobre uma cama de
ferro um homem arquejando, e ao lado deste dois outros
feridos, prostrados, e mais um rapaz, uma senhora e uma
criança.
O seu primeiro cuidado foi chamar um médico, acudindo o
Sr. Capanema de Souza que pensou os dois feridos sem poder
fazer mais nada, em relação ao outro, que fallecia á sua
chegada.
Apurou a autoridade em um ligeiro interrogatorio feito aos
feridos que estes eram os irmãos Dilermando Candido de
Assis, de 21 annos, aspirante do exército, e Dinorah Candido
de Assis, de 20 annos, alumno paisano da escola da marinha;
que o morto era o Dr. Euclides da Cunha, lente da cadeira de
lógica do Externato Nacional, ex-Gymnasio Nacional, e que a
senhora era sua esposa D. Anna Solon da Cunha, que ali
estava com os seus dois filhos, Solon e Luiz. Depois de saber
dos nomes dos personagens tratou a autoridade para a
elucidação do caso, de orientar-se sobre as suas causas. (...)
Hontem pela manhã, estava Dinorah, á janela da sala em
frente, que dá para o jardim, e Dilermando deitado em seu
quarto, com a porta fechada, a lêr, quando appareceu o Dr.
Euclides da Cunha, que perguntou a Dinorah se a sua esposa e
filhos não se achavam ali, e como Dinorah respondesse
negativamente, elle abriu a cancella do jardim, entrou na sala
e dirigiu-se pelo corredor, em direcção á sala de jantar.
Ao chegar em frente á porta do quarto de Dilermando, que se
achava fechada, elle abriu-a a ponta pés, e entrando no
aposento, sacou rapido de um revolver, dizendo ao rapaz: -
Agora, miseravel, vais pagar-me.
Este quiz levantar-se, mas o dr. Euclides detonou a arma,
ferindo-o na virilha direita, e ainda o alvejou por duas vezes
mais, perdendo-se, porém, as balas, que foram se alojar na
parede.
Dinorah, vendo seu irmão ferido, correu para defendel-o,
tentando colher os braços do que atirava; mas o Dr. Euclides
da Cunha, sentindo-se preso pelas costas, voltou o revolver
contra o rapaz, que o abandonou, fugindo pelo corredor. O
escriptor então alvejou-o, attingindo-o na região dorsal.
Nesse interim Dilermando tirou um revolver, que se achava
sobre uma prateleira e deu dois tiros seguidos para a parede,
afim de intimidal-o, o que não conseguiu, virando-se o Dr.
Euclides para elle, atirando repetidamente e ferindo-o na
região estomacal e mamelão direito.
Dilermando, nesta situação, atirou com pontaria, ferindo-o no
pulso direito, no braço esquerdo e na região infra-clavicular
direita, ferimento este que lhe occasionou a morte.
Sentindo-se sem forças para luctar e sem mais uma bala no
revolver, o Dr. Euclides ganhou á porta da rua para sair a ahi
ao descer os poucos degráos, cambaleou e caiu.
Aproximaram-se delle, Dilermando e Dinorah, e á custo, o
carregaram para a cama, onde o collocaram, perguntando-lhe
o primeiro, porque fizéra tal loucura, sem motivo algum. Ao
ouvir essas palavras o Dr. Euclides da Cunha encarou-o e
balbuciou: - Odeio-te, mas te perdôo. Meia hora depois era
cadaver.
Foi esta, como dissemos já, a narrativa feita pelos irmãos
Dilermando e Dinorah, ao delegado, Dr. Alcantara. (...)"
O Paiz, 16 de agosto de 1909

"Acontecimento doloroso e que dolorosamente echoou em


todas as nossas camadas sociaes, especialmente nas mais
cultas, foi, sem duvida, essa terrivel tragedia, esse fúnebre
drama de familia que se desenrolou em um dos suburbios
desta cidade e roubou á Patria e á Familia um homem de
grande, de inestimavel valor moral e intellectual, um espirito
superior, o Dr. Euclides da Cunha.
Euclides da Cunha tinha um nome feito na sciencia e nas
lettras nacionaes. Já era grande o circulo das suas relações e
vasto o horizonte em que fulgurava como um astro de
primeira grandeza.
Nada, absolutamente nada fazia suppôr que tão cedo e em
plena mocidade desappareceria do scenario da vida onde tinha
um brilhante papel a desempenhar esse teimoso e
cultivadissimo espirito que era uma gloria do nosso paiz.
E, por isso mesmo que foi traiçoeiro e inesperado o golpe do
Destino que o roubou á existencia terrena é que mais
sensacional e dolorosa foi a noticia de sua morte.
Não é grande a sua obra, é facto; não é enorme a sua
bagagem, mas é de primeira qualidade. O que elle fez, o que
elle escreveu, o que elle deixou bastou para dar-lhe a gloria e
a immortalidade.
Certo elle tinha ainda muito a fazer e a produzir, e agora é que
o seu espirito começava a mostrar todo o seu valor e todo o
seu brilho. Mais alguns annos e a sua obra seria immensa e do
que ha de superior em valor scientifico e litterario.
E, entretanto, com 42 annos incompletos, desapparece da
arena esse valente e emerito luctador, esse espirito de eleição,
esse coração que era um cofre de todas as bondades e de todas
as virtudes.
Não nos deteremos aquiem narrar o triste e sangrento
episodio que tanto commoveu a sociedade brazileira. Todas
as folhas diarias o narraram em todos os seus pormenores. O
nosso objectivo é unicamente lamentar essa perda enorme
para a nossa Patria que, agora no Campo Santo, deplora a
perda de mais um filho dilecto.
Foi no domingo proximo passado que se deu o tristissimo
acontecimento e o enterro do mallogrado escriptor, feito a
expensas da Academia de Lettras e immensamente concorrido
por tudo quanto temos de mais distincto, realisou-se na tarde
de segunda-feira desta semana, 16 de Agosto corrente, sendo
o corpo do saudosissimo finado, sepultado no carneiro n.
3.026 do cemiterio S. João Baptista.
É ahi que dorme para sempre o erudito, o pensador, o poeta, o
scientista, o notavel litterato e escriptor que escreveu Perú
Versus Bolivia, Contrastes e Confrontos, e esse formosissimo
livro Os Sertões, tendo já em preparo ou promptos outros
trabalhos de igual ou talvez maior importancia.
Com immensa tristeza registramos nestas columnas tão
infausto acontecimento, apresentando não só á familia do
querido extincto como á nossa Patria as mais sinceras e
profundas condolencias."
Rua do Ouvidor, 21 de agosto de 1909

"Há muito já que não se registrava o acontecimento de uma


tragédia de sangue e há muito mais que nenhuma havia
atingido a importância da que temos hoje a noticiar, dado o
valor pessoal da sua principal vítima, um notável da
engenharia militar e nas letras. A vítima da morte trágica, que
é o principal assunto desta notícia, era gloriosamente
conhecida nas rodas literárias do nosso país, engenheiro
militar distinto e membro da Academia de Letras, para onde
entrava com brilhantíssima bagagem literária. Levado pela
suspeita de que a deshonra houvesse invadido o seu lar, esse
homem de alto prestígio premeditara o cometimento de um
crime, a isso induzido, de certo pela exacerbação que tal
suspeita naturalmente lhe atribulava o espírito. E foi no
momento em que punha em prática o desforço, que desde a
véspera premeditara, que caiu varado por uma bala, disparada
por um daqueles a quem pretendia extinguir, para a defesa de
sua honra. Esse que assim acabou a sua existência de glórias,
de modo tão trágico, era o dr. Euclides da Cunha, 2o tenente
reformado e engenheiro militar."
A Imprensa, 16 de agosto de 1909

"Finou-se um grande espirito. Moço, vitorioso, em pleno


triúnfo de sua colossal cerebração, que o tornava um dos tipos
mais representativos dos assomes surpreendentes de uma
possante intelectualidade e, talvez por isso mesmo, pelo
refinamento de nervos e suscetilidade delicadissima, uma
fibratura levemente, impressionável, Euclides da Cunha, que
observava a Natureza em seus mais ásperos aspectos,
iluminando as regiões do norte com as rutilações eruditas de
um talento analítico e severo e tivera de guerreiro, como
oficial do Exército que era, pela pena de escritor, que se
esmerara em desvendar as misérias e sofrimentos que tiveram
por expoente a campanha de Canudos e o seu ardor em
contribuir para as soluções amistosas, como o arauto da
documentação de fronteiras e o protesto, revelados de uma
coragem pasmosa, com que em artigo memorável se opôs à
idéia de sufocar-se uma revolta de presos por meio de sacos
de cal. (...) O próprio egoísmo nacional deplora essa morte,
porque Euclides, com seus 42 anos de idade, estava em plena
exuberância de ativa produtividade e muito teria ainda a dar
do seu talento inovador e progressivo. (...)
De algum tempo a esta parte, começaram a murmurar a
Euclides da Cunha umas suspeitas a cerca do procedimento
de d. Anna para com um dos rapazes. Euclides, ao que parece,
deixou-se impressionar pelos murmurios, chegando mesmo a
interpellar a esposa, que, conhecedora do estado de espírito de
seu marido, tratou de afastar de sua casa os rapazes. Fez-se
tudo na melhor harmonia. D. Anna, porém, continuou a
visitar os moços, que moravam na Estrada de Santa Cruz no
214. Nessas visitas, fazia-se acompanhar pelos seus filhos.
Afirmaram alguns que aos ouvidos de Euclides da Cunha
chegaram novamente, nestes últimos dias, rumores a cerca
das visitas da esposa aos dois rapazes, que são os Srs.
Dilermando de Assis, aspirante a oficial do Exército, e
Dinorah de Assis, também aluno aspirante, porém da Escola
Naval. O estado de espírito do ilustre escritor, fortemente
alterado como se achava, parece que favoreceu para que a
terrível suspeita assumisse proporções de realidade, tanto que,
conforme declarou seu filho Solon, falára em matar
Dilermando de Assis."
O Século, 16 de agosto de 1909

"Na triste tarde de ontem correu pela cidade, entre espanto e


magoa, a notícia do assassinato de Euclides da Cunha. Às
primeiras informações, vagas e falhas, seguiram-se detalhes
dolorosos: Euclides da Cunha tombara varado por bala, no
rápido desenrolar de ena íntima, quando procurava
desafrontar a honra, que julgava ofendida. Torturado pelo
sofrimento que lhe deprimia o espírito alanceiado pelo
desgosto de um sonho desfeito, o querido autor de "Os
Sertões" premeditara a desafronta e é de calcular a cruel
amargura que para ele foram as ultimas horas de existência. E
assim, desapareceu, em minutos esse homem cheio de vida e
de talento que tanto honrava a nossa cultura. (...)
No seu livro "Peru Versus Bolívia" com proficiência estudou
a questão de limites entre esses dois países, sendo o seu livro
citado como documento de grande valia. Literato, aí esta o
"Sertões", obra que causou o maior sucesso, atestado
imorredoiro de seu valor: à pureza impecável de estilo
vigoroso, junta-se o colorido forte da paisagem, a observação
profunda do meio, a psicologia superiormente feita dos tipos,
o completo estudo geológico, da zona descrita. Esse livro
abriu-lhe as portas da Academia de Letras - de que era
membro. (...)"
Folha do Dia, 16 de agosto de 1909

"Ainda não voltamos a nós do espanto horrivel que nos


causou a noticia do absurdo e tragico assassinato de nosso
prezado e eminente collaborador Euclydes da Cunha.
Um telegramma expedido de Cascadura ás 12 horas e 30, da
tarde de hontem, dizia-nos laconicamente: "Euclydes da
Cunha, assassinado Estrada Real 214. (Assignado) Solon
Cunha."
Assassinado por que? Como? Por quem? parecia inverosimel
a noticia. (...) Nada, absolutamente nada fazia prever a
tragédia de hontem. Todos os tinham na conta de um homem
heroico e intemerato. O autor de obras tão fortes devia ser
naturalmente um espirito robusto, um homem armado de rude
coragem contra os equivocos da vida contra os absurdos do
destino.
Infelizmente assim não acontecia. Euclydes da Cunha era
uma cerebração de rara força, servido por um coração vibratil
e fragilimo. Ás grandes coleras vingadoras do seu poderoso
estylo evocador, correspondia, no seu trato social e na sua
existencia domestica, uma extraordinaria delicadeza de
sentimentos. Tinha por vezes certos milindres de uma candura
verdadeiramente angelica. Dava, não raro, uma impressão de
profunda timidez pessoal, revelando acanhamentos e
humildades que tocavam pelo desazo, apparencias curiosas
que á primeira vista nos autorizavam a supô-lo um homem em
contradição com a sua própria obra. A verdade, porém, é que
essas duas feições de seu espirito e de seu caracter se casavam
á maravilha, imprimindo um vigoroso relevo á sua
personalidade.
Homem de uma integridade moral a toda a prova,
experimentado em provações de todo genero, com uma alta
comprehensão dos seus deveres civicos, pelejador como
poucos, intrepido atá a temeridade, Euclydes da Cunha
conservara da mathematica a disciplina mental formidavel, da
poesia a idéa da belleza e o gosto da perfeição, da philosophia
o sentimento da justiça, a vibração continua e generosa,
alguma cousa acima das miserias da terra.... E tudo isto a vida
cortou hontem brutalmente, num golpe de tragedia
inenarravel. (...)"
Jornal do Commercio, 16 de agosto de 1909

AS MANCHETES:
A Morte De Euclides Da Cunha - Um Doloroso Drama De
Sangue - As Causas E Os Factos - As Declarações Á Policia -
O Transporte Do Corpo -
As Manifestações De Pesar - O Enterro ( O Paiz )
Sensacional Tragedia - O Assassinado Do Dr. Euclides Da
Cunha
( A Imprensa )
O Assassinato Do Dr. Euclides Da Cunha - Os Antecedentes
E O Crime
O Enterro Do Mallogrado Escriptor Efetua-se Hoje, Ás 5
Horas -
As Manifestações De Pesar Da Academia de Lettras ( O
Século )
Uma Perda Nacional - Euclides Da Cunha - Fim Tragico -
Drama Em Familia
( Folha do Dia )
O Assassinato Do Dr. Euclides Da Cunha ( Jornal do
Commercio )
15) Revolta dos Marinheiros
(1910)
"Terminou felizmente com a entrega dos navios ao domínio
do governo a revolta de parte da nossa marinhagem na baía
do Rio de Janeiro. Não obstante a terrível trucidação de
alguns dos nossos oficiais de marinha e outros danos
causados, não há como negar que os pobres marinheiros
desesperaram, por insuportáveis, com os rigorosos castigos
que lhes eram inflingidos a bordo, deprimentes do caráter
humano e atentatórios dos princípios de humanidade,
liberdade e justiça, garantidos pelas nossas leis disciplinares.
São sempre assim os abusos do poder e autoridade, acabam
por desorientar a razão e transformar o homem em fera. Foi-
lhes concedida a anistia pelo Congresso como a condição sine
qua non da rendição. De outra forma não poderiam de fato os
revoltados se entregarem a menos que saíssem de bordo,
presos em flagrante, para as prisões militares. Só anistiados
poderiam os oficiais com eles se entender sem quebra do
respeito à lei. A quantas humilhações mais desta natureza não
nos levará o espírito de indisciplina reinante hoje em todas as
classes?"
O Democrata, 4 de dezembro de 1910

"Logo pela manhã do dia 23 foi o deputado Sr. José Carlos de


Carvalho procurado por diversos políticos em evidência que,
a pedido do Sr. Pinheiro Machado, lhe iam rogar fosse a
bordo entender-se com os marinheiros.
Recebendo a comunicação de que fôra escolhido para
desempenhar a delicada missão o Sr. Capitão de Mar e Guerra
José Carlos de Carvalho vestiu o seu uniforme e dirigiu-se
para o Arsenal da Marinha. Uma vez nessa praça de guerra, o
Deputado riograndense dirigiu-se à Casa da Ordem visitando
a cada um dos oficiais vítimas da revolta, que se achavam ali
depositados. Em seguida S. Ex. procurou o Ministro da
Marinha e, como este não se achasse, resolveu partir para o
que tomou lugar em uma lancha em que foi arvorada a
bandeira branca. (...)
A lancha, largando, tomou a direção do Minas Gerais.
Avistando a lancha, os revoltosos relutaram se deviam ou não
consentir que ela se aproximasse, respondendo finalmente
pela afirmativa à pergunta que de bordo fazia o comandante
José Carlos sobre se podia atracar. Recebido a bordo com
todas as honras inerentes ao seu posto pelos marinheiros
revoltosos, o Deputado José Carlos falou com o que assumira
o comando da esquadra e que, segundo a versão corrente, é o
marinheiro de 1a classe João Cândido. Disse-lhe o
"comandante" da esquadra que os marinheiros se haviam
desgostado com os maus tratos, com os castigos corporais,
que lhe eram barbaramente infligidos, com a má alimentação
e com o trabalho excessivo a que eram obrigados. À presença
do do Deputado José Carlos foi mandada vir uma praça da
guarnição do Minas, que havia sido chibateada dias antes, e
que apresentava as costas cortadas de chibata. Essa praça
tendo vindo para terra na lancha do parlamentar, foi recolhido
ao Hospital da Marinha. (...)
Do Minas Gerais o Capitão de Mar e Guerra José Carlos de
Carvalho passou-se para o São Paulo, onde foi recebido com
as mesmas honras, ao som da banda de música de bordo. (...)"
O Universo, 23 de novembro de 1910
"A Rua do Ouvidor compartilha sinceramente a justa e
enorme dor que neste momento domina a briosa marinha
nacional pela perda dos valentes oficiais que foram vítimas da
revolta dos marinheiros das guarnições dos couraçados Minas
Gerais, São Paulo, Bahia e Deodoro, e que tanto emocionou a
população desta capital.
Foi um deplorável acontecimento essa revolta que, enchendo
do mais justificado pânico a quase todos os habitantes desta
vasta e populosa cidade, pode em futuro não remoto, ter ainda
mais lastimáveis conseqüências. (...)
Oxalá que os tristíssimos fatos de que foi teatro a baía de
Guanabara nos tragam proveitosos ensinamentos.
Infelizmente, foi para nós crudelíssima a lição, não só pela
própria revolta de parte da marujada nacional, o que já é
bastante deprimente para os nossos créditos de povo
adiantado e culto, como porque, arrebatando a vida a
distintíssimos oficiais da nossa marinha de guerra, enlutou
para sempre alguns lares até então plenos de alegria e ventura.
(...)
É, pois, com o coração sangrando, com a alma profundamente
abatida que escrevemos estas linhas lamentando a perda dos
briosos oficiais de marinha vitimados pela revolta dos
marinheiros."
Rua do Ouvidor, 3 de dezembro de 1910

"A cidade amanheceu com uma notícia tremenda: a revolta


dos marinheiros. As guarnições de alguns navios de guerra,
alegando maus tratos, castigos corporais, excesso de serviço,
etc., revoltaram-se a bordo. A insubordinação começou pela
guarnição do Minas Gerais, que logo teve adesão das do São
Paulo e Bahia, seguindo-se durante a noite a adesão de outros
vasos de guerra.
A causa da revolta foi sabida por um radiograma, passado
pelos marinheiros revoltados ao Sr. Presidente da República e
concebido nos seguintes termos:
- Não queremos volta chibata. Isso pedimos presidente,
ministro marinha. Queremos resposta já e já. Caso não
tenhamos, bombardearemos a cidade e navios que não se
revoltarem. - Guarnição Minas, São Paulo, Bahia. - (...)
O governo fizera sentir aos revoltosos, - não sabemos se por
meio de radiograma ou outro qualquer meio - que de modo
nenhum atenderia as reclamações dos marinheiros, enquanto
estes não deixassem a atitude revoltosa. No caso dos mesmos
deporem as armas, seriam convenientemente estudadas essas
reclamações para que o governo pudesse agir com justiça."
A Notícia, 23 de novembro de 1910

"A precipitação com que se pode apreciar, tarde da noite, o


espetáculo sinistro de uma ameaça mortífera voltada contra a
cidade entregue ao sono descuidado, a deficiência de detalhes
resultantes da falta de comunicação com os navios revoltados
não permitem um juízo completo sobre as origens desses
sucessos lamentáveis. (...)
A primeira vítima da sedição naval foi o tenente Alvaro
Alberto da Silva. Esse oficial acompanhava o comandante
Batista das Neves quando esse foi desacatado ao chegar a
bordo do Minas. O tenente Alvaro Alberto foi esfaqueado
pela marinhagem de depois de tombar esvaído em sangue foi
posto a bordo de um escaler e mandado levar para o
dreadnought São Paulo. Ali o tenente Alvaro Alberto recebeu
um grande curativo feito pelo Dr. Catanheda, sendo remetido
para o Arsenal da Marinha. Seu estado é gravíssimo."
Folha do Dia, 23 de novembro de 1910

"Não houve exagero nos meios de que lançaram mão os


marinheiros nacionais, para extinguir o execrando e
inveterado uso de casigos ilegais. Foi transportado ontem para
o Arsenal da Marinha, horrivelmente martirizado por 250
chibatadas, o marinheiro que deu causa à revolta. - Gama
Rosa -"
Folha do Dia, 24 de novembro de 1910

"Pelas folhas da manhã ficou toda a população sabedora dos


primeiros fatos ocorridos a bordo dos grandes couraçados
Minas Gerais e São Paulo e de mais navios da armada
nacional.
A causa predominante, única, assinalada pelo desenrolar dos
graves acontecimentos, conhecidos nas suas primissas, emana
do rigor excessivo que imperava a bordo do primeiro
couraçado, onde a marujada era obrigada a trabalhos
excessivos, tendo de dobrar e triplicar todo o serviço, devido
à falta deplorável de tripulação.
Os castigos eram por demais pesados, sendo a chibata a arma
predileta de que usavam e abusavam alguns oficiais.
Não se fizeram esperar os resultados: homens, os marinheiros
revoltaram-se, facilmente conseguindo a solidariedade de
todos os camaradas."
A República, 23 de novembro de 1910
"(...) Hoje pela manhã novos radiogramas: Ao governo:
- Queremos solução imediata sobre a abolição dos castigos
corporais e aumento de soldo. Do contrário arrazaremos a
cidade.
- Queremos a nomeação de um parlamentar que venha a
bordo para se estabelecerem as condições de rendição.
O governo intimou a rendição imediata e incondicional. Em
caso de resistência, fará torpedear os couraçados. (...)
Também sobre o palácio do governo foi feito um disparo, sem
mais consequências, além de algumas palmeiras do parque
destruídas. (...)
Além do S. Paulo aderiram também à revolta o "scout" Bahia,
os cruzadores Timbira e Tamoio, tendo as oficialidades
desses navios se retirado para terra, apresentando-se às
autoridades navais. (...)
Por uma notícia chegada ao gabinete do Dr. Belisário Távora,
sabe-se que toda a oficialidade do Minas Gerais que se achava
a bordo quando se deu o levante está morta. Essa notícia
terrível causou, como era natural, a mais dolorosa impressão
entre as pessoas que se achavam na repartição central de
polícia."
A Tribuna, 23 de novembro de 1910

"O governo, convencido embora de que, no fundo das


reclamações repousavam motivos justos e disposto a atender a
essas reclamações, precisa salvar, entretanto, a sua honra e a
honra da nação constituida. Pode prometer aos revoltados que
lhes fará o que eles pedem, mas não pode prometer que o fará
porque eles o exigem sob pena de bombardeamento da
cidade."
A Tribuna, 24 de novembro de 1910

"Decreto Legislativo N. 2280 de 25 de novembro de 1910 -


O presidente da República dos Estados Unidos do Brasil faz
saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a
seguinte resolução:
Art 1º É concedida anistia aos insurretos de posse do navio
dos navios da Armada Nacional se os mesmos dentro do
prazo que lhes for marcado pelo governo, se submeterem às
autoridades constituidas;
Art 2º Revogam-se as disposições em contrário.
- Presidente Hermes da Fonseca" - A Tribuna, 26 de
novembro de 1910

"Agora, porém, julgamos poder assegurar que o movimento,


iniciado a bordo do Minas Gerais, com o cruel assassinato do
bravo comandante Batista das Neves, vítima do dever militar,
é caracteristicamente e exclusivamente uma sublevação da
marinhagem, acusando os oficiais de maus tratos, de excesso
de trabalho, de insuficiência de alimentação, tornando-lhes,
dess'arte, insuportavel a vida e levando-os a essa explosão de
desespero. A autoridade pública não foi, de nenhum modo,
contestada pelos sublevados: antes a ela se dirigiram,
explicando-lhe que eram esses os moveis da sua conduta."
A Imprensa, 24 de novembro de 1910
AS MANCHETES:
Revolta No Mar - Os Boatos da Tarde - Causas Prováveis - A
Indisciplina na Marinha - Oficiais esfaqueados - Oficiais ao
Mar - (Folha do Dia)
Marinheiros Revoltados Assassinam O Comandante do Minas
Gerais e o Capitão- Tenente João Claudio Junior (A Notícia)
Marujada em Revolta em Plena Baía nos Grandes Couraçados
- A População Não Se Alarma - Os Fatos Principais (A
República)
Sublevação da Esquadra (A Tribuna)
16) Barão do Rio Branco (1912)
"Faleceu hoje, às 9 e 10 da manhã o nosso ilustre ministro do
Exterior, barão do Rio Branco. A despeito dos grandes
esforços empregados pelo seu distinto médico assistente sr.
Pinheiro Guimarães, a morte teve mais poder que a ciência e
robou à vida e à pátria o mais notável dos brasileiros
contemporâneos. S. Ex. foi vitimado por uma insuficiência
renal, que resistiu a toda medicação empregada. Com o
passamento do barão do Rio Branco, perde o Brasil um dos
seus mais diletos filhos e um dos seus mais dedicados
servidores. A República, principalmente, deve-lhe os mais
relevantes e inestimáveis serviços. (...)
O Barão do Rio Branco foi o estadista que mais tempo
exerceu o cargo de ministro do Exterior, tendo assim a
oportunidade de servir ininterruptamente a quatro governos
da República, cujos presidentes o honraram sempre com a
mais completa e até incondicional confiança. Nenhum
brasileiro atingiu mais alto o culto da veneração popular. O
Barão do Rio Branco era verdadeiramente um patrimônio
nacional. A nação que o amou em vida há de idolatrar-lhe
reverentemente a sua venerada memória. (...) A ele deve a
República, entre muitíssimos outros serviços de não pequena
relevância, a reivindicação de 290.622 kilômetros quadrados
de território litigioso e o aumento da sua superfície com 200
mil kilômetros quadrados adquiridos por compra e que
constituem hoje esse uberrimo solo do Acre. (...) Fundou
nesta capital um vespertino com o título A Nação, onde
defendeu com ardor as idéias abolicionistas. (...)"
A República, 10 de fevereiro de 1912
"Ontem o telégrafo nos trouxe a triste e dolorosa notícia de
haver falecido o benemérito brasileiro Barão de Rio Branco,
Ministro do Exterior. O Barão do Rio Branco personalizou a
maior figura de estadista na América do Sul. desde o regime
monárquico da nossa Pátria, que o ilustre brasileiro vem
prestando inúmeros serviços ao Brasil obstando o
derramamento de sangue e tirando de todas as dificuldades
em que se achou muitas vezes a nossa Pátria. A morte do
Barão do Rio Branco, nesse momento, representa um desastre
para a Nação, porquanto, agora, mais do que nunca, eram
necessários os seus serviços. As próprias nações estrangeiras,
os próprios jornais argentinos, que não olhavam o Sr. Barão
do Rio Branco com bons olhos, proclamam os seus méritos de
estadista e de bom patriota. O Baluarte, que é composto de
brasileiros que desejam a felicidade e prosperidade da Nação,
nesse momento de luto nacional exparge flores imersas da
mais profunda saudade, sobre o túmulo do ilustre morto. Paz
à sua Alma!
Assim que recebemos da repartição dos Telégrafos
comunicação de ter falecido às 9,15 da manhã o Sr. Barão do
Rio Branco, imediatamente fizemos cerrar as portas da nossa
redação e hasteamos o nosso pavilhão em funeral. O comércio
de nossa cidade cerrou as suas portas e hastearam os seus
pavilhões. O club Indiano Goytacaz, em sinal de pezar pelo
falecimento do Sr. Barão do Rio Branco, transferiu a sua
passeata que devia ter lugar hoje. Todas as repartições
públicas desta cidade hastearam os seus pavilhões em funeral.
Os proprietários do Moulin Rouge, suspenderam o espetáculo
que estava anunciado para ontem em sinal de pezar pela
morte do Barão do Rio Branco."
O Baluarte, 11 de fevereiro de 1912
"Morreu ontem o Barão do Rio Branco. Há dias a sua vida era
a agonia prolongada pelos recursos da ciência. A cidade, os
estados, o país inteiro, as nações vizinhas, a América, o
mundo indagavam anciosa da saúde do grande homem. E o
grande homem caíra para não se levantar. Fora com um
imenso soble, que resistindo anos e anos ao vendaval e a
terperie, dominando a vida, de repente estala e cai. Dizer do
Barão do Rio Branco uma rápida impressão de dor, de luto,
de lágrimas, quando o país inteiro soluça é bem difícil. E sua
obra foi enorme e grandiosa. Ele teve duas vidas: a do
jornalista de talento que se fez cônsul e a do cônsul que se
transformou no maior dos brasileiros pelo seu desinteressado
amor à pátria, e no maior dos diplomatas contemporâneos
pelo seu alto espírito, pela alta compreensão da função que
exercia. Ele foi o dilatador do Brasil alargando-o e
aumentando-o em terras, graças ao seu engenho, sem um leve
ataque à justiça e ao seu direito. (...)"
Gazeta de Notícias, 11 de fevereiro de 1912

" (...) O Barão do Rio Branco tivera a última convulsão às 3


horas da madrugada, entrando depois num estado de perfeita
imobilidade. Foi nessa situação que precisamente à 9 horas e
10 minutos S. Ex. exalou um quase imperceptível suspiro,
expirando-se. (...) O barão não teve sequer uma contorção de
músculo, extinguindo-se calmamente. Segurou a vela no
momento supremo um dos netinhos do extinto e que estava à
beira do leito. As outras pessoas estavam ajoelhadas em volta
da cama. (...)
Logo que foi rapidamente conhecida a tristíssima notícia
começaram as demonstrações de pezar. O comércio cerrou
portas imediatamente, içando muitos estabelecimentos
bandeiras de meio haste. O mesmo sucedeu nos bancos, nas
agências, nos escritórios de todas as empresas e nas
repartições públicas, tendo sido a bandeira do palácio do
Catete posta em funeral por ordem do próprio presidente da
República. Os cinematógrafos que já haviam posto os seus
affichés às portas, retiraram-nos cerrando os estabelecimentos
que não funcionarão hoje. Também não funcionarão os
teatros e outros centros de diversões, os bailes, todos os
divertimentos de club e associações enunciadas para hoje
estão adiados. (...)
O Sr. presidente da República convidou hoje todos os seus
secretários de Estado para uma conferência em palácio, que se
realizará hoje às 4 horas da tarde. Parece que nessa
conferência ficará assentado que se prestem ao grande
brasileiro as honras fúnebres de chefe de Estado."
A Notícia, 10 de fevereiro de 1912

"Durante todo o dia de ontem esteve exposto, no Itamarati, o


corpo do barão de Rio Branco - e, desde a manhã até à noite,
milhares de pessoas desfilaram em frente ao grande morto,
cujos servíços e cujo nome ficarão eternamente vivos na
gratidão brasileira. (...)
Muitos suspiros ouvimos, de grande mágoa, e soluços que
rebentavam convulsivos, à vista desse corpo, agora exanime e
outrora animado pelo espírito incomparável, a quem mais
deve a grandeza nacional. Dir-se-ia também que, à
consternação popular, ainda se juntava uma espécie de
assombro, como se a todos custasse acreditar na dura verdade.
A multidão subia e descia as escadas do Itamarati como
levada ao peso de uma mudez angustiosa - e eram mais os
olhos magoados, que exprimem o doloroso sentimento dessa
perda que avassala o Brasil e a fraternidade sul-americana. No
vastão salão onde cisma a tristeza de amigos e filhos do
eminente estadista e por onde peregrinava o pezar do povo
brasileiro, nós também estivemos um momento, olhando o
catafalco, em torno do qual seis brandões acessos
derramavam as suas lágrimas de cêra. Mas o aspecto
profundamente impressionante, que nos feria os olhos, era
demasiado forte para nós, que sempre veneramos no grande
ministro o mais fiel, o mais seguro, o mais vigilante guarda da
pátria, que ele estremeceu sobretudo neste mundo. E,
alquebrado também pele dor do grande infortúnio, afastamo-
nos dali, trazendo a impressão da pena alheia, que se veio
juntar à nossa desconsolação."
A Imprensa, 12 de fevereiro de 1912
17) A Carestia (1913)

A República (diversas datas)


"... A carestia da vida é um problema que merece a atençào do
governo e todo o movimento que se fizer para resolvê-lo deve
ter o apoio da imprensa; para isso, porém, é preciso que a
ação do "comité" seja razoável, se mantenha dentro da ordem
e do respeito às autoridades constituídas, sem o que nenhum
resultado dará." - 20 de fevereiro de 1913
"Teve lugar ontem às 8 ½ horas da noite, na sede do Centro
Cosmopolita, à Rua do Senado n. 215, o primeiro comício
popular organizado pelo "Comité de Agitação Contra a
Carestia da Vida" para protestar contra o encarecimento da
vida nesta capital. a esse "meeting"compareceu extraordinário
número de operários, comissões de associações trabalhadoras,
além de regular elemento popular." - 21 de fevereiro de 1913
"(...) A carestia de vida, sem contudo ser um problema
nacional, pois ela afeta neste momento por muitas e diversas
razões quase todos os povos, não pode deixar de merecer a
atenção dos nossos dirigentes e induzí-los a uma solução
equitativa e justa. Para que isso se dê, é porém necessário que,
como muito bem disse um dos membros do "Comité" de
protestos contra essa carestia, não se dê a esse momento, que
deve ser nacional, um caráter partidário, desvirtuando-o do pé
em que foi habilmente posto pelo dr. Caio M. de Barros." - 25
de fevereiro de 1913.
"Continua a agitação em torno deste problema, aguardando o
povo as providências que o governo está tomando para tornar
mais fácil a vida entre nós. Hoje, realiza-se mais um comício,
às 5 horas da tarde, na praça da República, em frente ao
quartel general." - 4 de março de 1913.
"Como estava anunciado, realizou-se ontem, às 4 horas da
tarde no largo de S. Francisco de Paula, o grande comício
promovido pela Federação Operária do Rio de Janeiro, para
protestar contra o encarecimento dos gêneros de primeira
necessidade.
Esse comício foi extraordinariamente concorrido, sendo digna
de registro a ordem que ele presidiu; que se deveu não só à
exhortação dirigida à multidão pelo delegado do 3o distrito
dr. Muniz de Aragão, como também aos interesses dos
representantes das associações operárias empenhadas em
conservarem-se, para melhor êxito da causa que defendem,
dentro da ordem e do respeito às autoridades constituídas.
A polícia, representada pelo delegado do distrito, dr. Muniz
de Aragão, esteve presente providenciando para que a ordem
não fosse alterada. (...)" - 17 de março de 1913.

O Século ( diversas datas)


"Continuam os comícios populares contra a carestia da vida.
O povo diariamente se tem reunido nas principais praças
desta capital e pela palavra inflamada de seus oradores tem
erguido os mais solenes protestos contra o modo por que
alguns indivíduos valendo-se dos trusts ociosos o exploram.
Conforme deliberação tomada no comício de sábado,
realizado no largo de S. Francisco, embarcou ontem para
Petrópolis, uma comissão composta dos srs. Caio Monteiro de
Barros, Luiz Franco, Raul Deueza, Francisco Pereira de Lima,
Simão da Costa e Vicente Nunes Ferreira, que foi levar ao
presidente da República a moção do comité de agitação
contra a carestia da vida aprovada naquele comício." 3 de
março de 1913.
"As providências que o marechal Hermes prometeu dar, em
benefício do povo, devido à agitação contra a carestia da vida,
tiveram, ontem, início com o esbordoamento, a prisão e a
violência praticados por agentes de polícia, verdadeiros
arruaçeiros.
Tão grande era o prurido de desordem entre os desordeiros
investidos de funções policiais, que no começo do tumulto
que provocaram no largo de S. Francisco, um menor de 12
anos arrancou das mãos criminosas de um deles um revólver.
Essa criança, que evitou certamente mortes, pois o estado de
agitação do agente fazia crer que ele disparasse todas as balas,
avisadamente entregou a arma a um outro policial. E o agente
foi preso. (...)" - 6 de Março
"Mais um meeting e vários discursos provocou, ontem, o
problema da carestia da vida. O meeting monstro, levado a
efeito no largo de S. Francisco, do qual participaram muitas
sociedades operárias, começou e terminou na maior calma. A
polícia fez, antes do seu início, a declaração de garantir as
manifestações do povo, o que de resto levou a efeito, não
perturbando, como é de seus hábitos, a reunião do povo. Os
oradores em discursos violentos combateram os "trustistas",
lembrando os meios de combate aos exploradores e de
destruição dos conchavos que tanto encarecem a vida.
Depois dos discursos, a multidão, tendo à frente vinte e duas
bandeiras vermelhas de assoçiações operárias, desceu a rua do
Ouvidor, em direção da sede da Confederação Operária
Brasileira, à rua Barão de S. Gonçalo. (...)"
17 de Março
Folha Do Dia (diversas datas)
"Realmente viver no Rio de Janeiro é um suplício, porque a
carestia de vida absorve todos os resultados do trabalho, por
maiores que sejam a atividade do homem e sua inteligência.
Nem todos podem dizer que ganham o pão no Rio, porque,
mesmo trabalhando-se muito, às vezes não se ganha esse pão.
A maioria, com os maiores esforços, apenas consegue passar
miseravelmente. A vida está insuportavelmente cara há já
muito tempo, mas no momento chegou ao cúmulo do abuso.
Não é difícil, porém, torná-la mais suave; para isso só é
preciso boa vontade das nossas autoridades, únicas culpadas
da carestia, porque cochilam, quando deviam velar. São
gerais os clamores contra o prefeito da cidade, apelando-se
também para o governo federal. O prefeito pode, é verdade,
obter a diminuição de taxas exageradas sobre o comércio e
cumprir posturas que obrigariam os taverneiros a ficar muito
mais humanos. Não o faz, talvez porquenão sinta a carestia." -
24 de fevereiro
"O dia de ontem foi o dia do operariado nacional, que veio em
grande comício à praça pública protestar contra a terrível
crise de angústia que ora assoberba a população de todo o
Brasil. Digna de nota tornou-se a atitude ordeira da massa
popular, na reivindicação dos seus direitos. Protestando, pela
energia dos seus oradores francamente aplaudidos, contra a
postergação de que é vítima pelo açambarcamento e pelo
trust, fê-lo ainda assim patenteando as suas qualidades de
população ordeira, que confia na ação enérgica dos dirigentes
da Nação. (...)
Raríssimas vezes tem o largo de S. Francisco de Paula, o
tradicional ponto da manifestação do sentimento popular,
reunido tão elevado número de pessoas como ontem, por
ocasião em que se realizava o grande comício, o "monstro",
como foi cognominado por esse mesmopovo e organizado
pela Confederação Brasileira do Trabalho e pela Federação
Operária do Rio de Janeiro. Os lugares mais altos eram
disputados a poder da força bruta. O largo estava totalmente
tomado de povo. De vez em quando atravessavam a grande e
unida massa popular agentes de polícia, em atitude de quem
esperava o momento de agir. Praças de cavalaria estavam
postadas em todas as embocaduras das ruas, isto pouco
distante do local, vendo-se força de infantaria ao meio do
largo. As sacadas dos prédios estavam todas apinhadas de
pessoas que assim muito comodamente ouviam os oradores.
Em todas as esquinas, em grupos, mais agentes de polícia. Na
rua do Teatro, acompanhado do seu auxiliar, alferes Augusto,
vimos o tenente-coronel Zeferino Costa, que superintendia o
policiamento militar. Viam-se também no largo muitas
senhoras, atenciosamente ouvindo as inflamadas orações dos
operários, a quem não foram regateados aplausos. (...)" - 17
de março

A Notícia (diversas datas)


"A alta súbita da gasolina na praça produziu em nosso meio,
aliás e infelizmente, não são raras aberrações comerciais, um
certo pânico pela iminência de um encarecimento dos
transportes e como consequência uma alta proporcional em
todos os artigos de primeira necessidade, embora sem relação
com a gasolina mas sujeitos ao jogo pela lei geral das
compensações que, como é exercido, melhor, se diria dos
pretextos gananciosos. (...)" - 18 de fevereiro
"Nunca, talvez, a solicitude e o cumprimento dos deveres dos
auxiliares da Prefeitura estiveram tanto à prova, como neste
momento em que a sua ação fiscalizada é reclamada para
debellar uma crise em que se debate a saúde, o direito de
subsistência e os interesses pecuniáios do público." 9 de
março
"Nesta questão da carestia, decididamente o governo parece
não ter tomado a sério o problema nem feito caso nenhum da
situação em que se acha o povo. Num momento dado,
ouvindo queixas que já se haviam feito clamor, o presidente
em pessoa fez anunciar, por um jornalista que o entrevistou,
que ia agir energicamente contra os trusts. Logo a esperança
se estabeleceu. Mas providências dessa ordem não podem ser
demoradas, e o governo demora-se. Desvaneceu-se assim a
esperança, que as palavras presidenciais tinham inspirado, e o
povo continuou a reclamar." - 13 de março
"Realizou-se ontem, mais um "meeting" de protesto contra os
esploradores da fome. Falaram vários oradores, foram
erguidos protestos e ... os gêneros continuam em alta e o Sr.
presidente da República insiste em declarar que podia ser
pior.
A polícia, pelo que soube,os, portou-se bem. Entretanto,
alguns dos oradores a acusaram de violências, de cerceamento
de liberdade e os colegas matutinos isso registraram. Por essa
razão resolvemos hoje procurar o Dr. Paula Pessoa, 1o
Delegado auxiliar para ouvi-lo. (...) A respeito do grande
meeting convocado para ontem, e em que as classes operárias
eram chamadas a lavrarem o seu protesto contra a horda
salteadora dos açambarcadores dos gêneros da alimentação,
ficaram apreensivos muitos espíritos que não ignoram a
justiça das queixas que se deviam formular nesse comício,
mas conhecem de sobra os nossos costumes policiais. (...)" 17
de março
A Tribuna (diversas datas)
"A fim de combater a crise que avassala a classe proletária
com o aumento constante dos preços dos gêneros alimentícios
de primeira necessidade e do aluguel dos humildes casebres,
organizou-se ontem à tarde no escritório do Dr. Caio
Monteiro de Barros, à Rua do Ouvidor n. 159, um comité, que
fará no Rio, Campos, Juiz de Fora, S. Paulo, Santos e outros
lugares comícios a fim de dar um franco combate aos
monopolistas e diretores de sindicatos que tanto prejudicam a
classe pobre. O primeiro comício terá lugar hoje às 8 horas da
noite, na sede do Centro Cosmopolita, à rua do Senado n.
215, gentilmente cedida pela sua honrada diretoria, sendo
orador o Dr. Caio Monteiro de Barros, presidente do Comité."
20 de fevereiro
"Ainda bem que se vai conduzindo para um terreno prático a
magna questào do combate à carestia da vida. Problema vital
para a nossa população, que vê dia a dia encarecerem os
produtos principais de sua alimentação, para ele se voltam as
atenções do povo, que já iniciou os seus protestos, realizados
sob a forma de "meetings" em diferentes pontos da cidade e
aos quais se tem associado a população, consciente dos seus
direitos e deveres." 24 de fevereiro
"Continua sendo objeto da cogitação pública o problema
tendente a baratear a vida. Clero, nobreza e povo se
ismanaram nessa cruzada, concorrendo cada um com o seu
máximo de esforço. É de se esperar que dentro em breve
tenhamos a crise definitivamente resolvida, pois as medidas
tomadas são de toda presteza e oportunidade. 1o de março
"Realizou-se ontem, à tarde, no largo de S. Francisco, o
grande comício promovido pela Federação Operária contra a
carestia da vida. A concurrência a essa reunião pública foi
considerável. Todas as associações federadas compareceram
com os seus sócios, tendo havido também grande concurso de
povo. Usaram da palavra diversos oradores, todos protestando
contra o encarecimento da vida. Depois do comício, os
manifestantes foram a vários jornais e prosseguiram nos seus
protestos. a polícia manteve-se vigilante, tendo distribuído
por vários pontos os reforços necessários para impedir
qualquer perturbação da ordem." 17 de março
18) Pereira Passos (1913)
"A notícia da morte, a bordo do Araguaia, que partiu desta
capital a 19 do mês próximo findo, com destino à Europa, do
Sr. Francisco Pereira Passos, causos profunda surpresa e
intenso pezar, porque nào se esperava que aquele combatente
forte, bem disposto, sadio, apesár dos seus 77 invernos,
tombasse tão cedo, em pleno mar, quando com sua família
demandava terras adiantadas que ele ia, de novo percorrer.
(...) Aceitando o convite que lhe fôra feito pelo governo do
Sr. Dr. Rodrigues Alves, o ilustre engenheiro Pereira Passos,
para as altas funções de prefeito do Distrito Federal, o seu
primeiro cuidado foi pedir carta franca para dirigir a cidade,
pois profissional que era, tinha em mente planos de sua
remodelação completa, absoluta. (...) E o Sr. Dr. Pereira
Passos, sem mais detença, pôs em evidência o seu plano de
remodelação da cidade, dando trabalho a milhares de
operários, pondo abaixo pardieiros, prédios novos e velhos,
mostrando que tudo que existia e estava de pé não prestava,
era um atestado do nosso atraso, da nossa vergonha, de falta
de capacidade administrativa e de pusilanimidade. Um
trabalho ingente, foi um movimento como jamais se viu o que
se fez durante a administração do grande engenheiro. O
programa do Dr. Passos para sanear e embelezar a nossa hoje
formosa cidade iniciou-se sob os melhores auspícios, tendo-se
trabalhado com intensa afana na abertura de três avenidas, no
alargamento de doze ruas, no prolongamento de outras três e
de uma travessa e na canalização dos rios Carioca, Berquó,
Banana Podre, Maracanã, Joana, Trapicheiros e Comprido.
Os pessimistas, os retrógados, os estacionários sorriam,
zombeteiramente, dizendo ser impossível transformar a
cidade em um céu aberto, mostral-a outra, muito diferente do
que era e que isso custaria a ruína do país, o empobrecimento
das nossas finanças. E o Dr. Pereira Passos, sereno e surdo,
mas apoiado, pelo governo e com os aplausos da população,
caminhava na sua obra, fazendo a Avenida Beira Mar, essa
beleza e esse encanto, dando-lhe 5.200 metros de extensão
com uma lagura de 39 metros. O trabalho foi indigente e
porfiado."
A República, 3 de março de 1913.

"A morte tem sido cruel e impiedosa para o Brasil nestes


últimos tempos, roubando-lhe as suas maiores personalidades,
os seus mais beneméritos servidores. No ano que se findou,
foram-se Rio Branco, Ouro Preto, Paranaguá e já hoje somos
surpreendidos com o desaparecimento do Dr. Francisco
Pereira Passos, o extraordinário velho, cujo nome ficou para
sempre ligado à cidade do Rio de Janeiro, que lhe deve a sua
remodelação, a sua rápida e completa transformação. Um
telegrama laconico e sinistro informa-nos haver ele falecido
em viagem para Europa, para onde embarcara há dias, a bordo
do paquete Araguaia. É, pois, com o mais profundo
sentimento que registramos o desolante sucesso. O nome do
Dr. Pereira Passos não poderá nunca ser esquecido.
Prefeito desta cidade, nenhum administrador revelou ainda
maior tenacidade, nem tão elevada compreensão dos deveres
que lhe impunham a lei e o momento. No período
presidencial que ficou assinalado na história como o iniciador
dos melhoramentos que a capital brasileira estava a exigir, o
Rr. Pereira Passos foi a sua figura mais operosa e destacada.
Enfrentando com rara energia a oposição tremenda e desleal
que lhe moviam os interesses feridos e a rotina, fez-se surdo a
todos os ataques, aos apodos violentos, às agressões e às
ingúrias, levando a termo a obra de que o País hoje se
orgulha.
E assim abriu avenidas, ajardinou, com supremo gosto, as
praças e largos, outrora em abandono, construiu esse passeio
sem rival que é a extensa Avenida Beira Mar, introduziu os
calçamentos asfaltados, cuidou das habitações do
proletariado, ergueu edifícios que atestam a nossa cultura de
povo adiantado e transformou a nossa Capital Federal na mais
bela cidade do mundo. Com assombrosa atividade, dirigia
sempre em pessoa todos os serviços, dando eloquente
atestado de quanto pode uma energia de ferro, aliada à
competência de superior mentalidade. Embora absorvido pela
multiplicidade desses afazeres, o Dr. Pereira Passos nào
esquecia outras responsabilidades do seu cargo e, encontrando
desacreditada e quase falida a Prefeitura, cheia de atrazos nos
pagamentos, reabilitou-a, restaurando-lhe a situação
financeira. escravo da lei, sem condescendências, nem
transigências, conseguiu reorganizar escrupulosamente as
arrecadações, que lhe forneceram recursos para enfrentar os
compromissos e pô-los em dia. Ao deixar o governo, era
reconhecidamente um grande benemérito. (...)"
Folha Do Dia, 3 de março de 1913

"A notícia da morte de Francisco Pereira Passos, a bordo do


"Araguaia", em que viajava o grande remodelador da cidade
do Rio de Janeiro, chegou como uma nota de luto e de dor,
num domingo alegre e luminoso em que a sua linda, a sua
encantadora, a sua estremecida cidade rebrilhava nos seus
palácios e nas suas avenidas. Dos homens que ocupam altas
posições na política e na administração se costuma dizer,
quando deixam a vida, que é cedo para julgar a sua obra. Ela
foi tão discutida e apaixonou tantos espíritos que só a anos,
mais serenos e mais justos, podem estabelecer o seu
veredictum inapelável. de Francisco Pereira Passos não se
pode dizer o mesmo. O julgamento da sua ação na pública
administração estava há muito feito, quando o Dr. Rodrigues
Alves, assumindo a presidência da República, o chamou à
Prefeitura do Distrito Federal, para remodelar a cidade
colonial de Mem de Sá. (...)
O Dr. Francisco Pereira Passos, nasceu em 29 de agosto de
1836, na cidade de São João Marcos, no Estado do Rio de
Janeiro, e era filho dos barões de Mangaratiba. Formou-se na
antiga Escola Central, hoje Politécnica, e foi logo após
nomeado adido à legação brasileira em Paris, onde
aperfeiçoou os seus estudos de engenharia, publicando, em
seguida, em Londres, a "Caderneta Passos", trabalho técnico
de grande valor.
Voltando da Europa foi nomeado engenheiro residente da
Estrada Pedro II, de onde saiu para dirigir o estabelecimento
de fundição da Ponta da Areia, ocupando depois o cargo de
engenheiro da Diretoria de Obras Públicas. Foi fiscal da
Estrada de Ferro de S. Paulo e empreiteiro da estrada de Bagé
a Uruguaiana. Foi engenheiro chefe da Estrada de Ferro de
Mauá a Petrópolis, de cujo traçado foi autor, assim como da
linha elétrica da Santa Teresa. Como engenheiro da Estrada
de Ferro Pedro II construiu o ramal de Porto Novo do Cunha,
tendo projetado e realizado trabalhos de consolidação da
Serra. Exerceu os cargos de presidente da Companhia Ferro-
Carril de São Cristovào, da Estrada de Ferro de Macaé e
Campos, da Estrada de Ferro Sapucaí, cujos trilhos estendeu
até a fronteira de S. Paulo, e da Estrada de Ferro do
Corcovado, sendo desta também o engenheiro construtor. Foi
por duas vezes diretor da Estrada de Ferro Central do Brasil,
devendo-lhe a Estrada grandes e importantes obras, como
sejam, os armazens da Maritma, estação de S. Diogo, ligação
direta da Maritma com o interior por um segundo túnel, ponte
da Maritma e seu prolongamento, alargamento da bitola da
Estrada até Taubaté, substituição de trilhos de ferro pelos de
aço, estações de Belém e de Mariano Procópio e, finalmente,
a bela reconstrução da estação Central no Campo da
Aclamação.
Em 31 de dezembro de 1902 foi nomeado para o cargo de
prefeito do Distrito Federal, cargo de que tomou posse no dia
2 de dezembro de 1903. Como prefeito do Distrito Federal
realizou a remodelação da cidade pondo em prática um
vastíssimo plano de embelezamento e transformando o velho
Rio de Janeiro, de aspecto colonial, na bela cidade de ruas
largas e esplêndidas avenidas, de que hoje nos orgulhamos.
Além disso, aumentou a renda municipal e diminuiu a
despezas de várias repartições da Prefeitura, sem prejuízo do
serviço público: pagou todas as dívidas da Intendência
Municipal e conseguiu fazer com que ficasse em dia o
pagamento de todo o pessoal e fornecedores."
A Notícia, 3 de março de 1913

"A notícia do passamento do Dr. Pereira Passos causou funda


impressão na cidade. Engenheiro de reconhecida
competência, depois de administrar proficuamente por duas
vezes a Central do Brasil, e de desempenhar outras funções e
comissões, foi convidado para o cargo de prefeito do Distrito
Federal (...)
Era como que o administrador honorário da capital,, pela sua
ação benéfica e inimitável, toda de dedicação e ativiadde. Se
discordamos do reformador do Rio, mais de uma vez, mesmo
em sua vida reconhecemos a grandeza dos seus serviços e
agora, depois de morto, rendemos justa homenagem ao que
fez em benefício da cidade. O Dr. Francisco Pereira Passos
deixa seu nome gravado a empreendimentos e a obras, que
conseguiu ultimar nos quatro anos em que se multiplicou na
Prefeitura.
Assumindo as sua funções, o Dr. Pereira Passos projetou
grande número de obras. (...) A obra mais importante que
realizou foi a avenida Beira-Mar, por ele concluída; ela se
estende do estremo sul da Avenida Rio Branco até Botafogo,
sendo a sua extensão de 5.200 metros e a sua largura de 33.
(...) Longa seria a enumeração de todos os seus serviços,
como as avenidas Mem de Sá, Salvador de Sá, o alargamento
das ruas da Assembleia, Carioca, Visconde do Rio Branco,
Frei Caneca, Estácio de Sá, Marechal Floriano, Visconde de
Inhauma, Treze de Maio, que antes da atividade assombrosa
desse patrício ilustre só merecia louvores pela sua natureza.
Este, sim, merece, como justa homenagem ao muito que fez,
ter levantado a sua estátua no coração da cidade. Foi um
brasileiro digno dessa comemoração."
O Século, 3 de março de 1913

"O Dr. Francisco Pereira Passos que ontem faleceu em


caminho da Europa foi, no meio brasileiro, uma exepção e
uma surpresa: excepção, pelo contraste fulminante com a
nossa educação e com o nosso temperamento; surpresa, pela
valentia com que, na sua idade, realizou obras a que gerações
moças inteiras não se haviam aventurado. Na antiguidade
pagã e ingênua esse homem passaria a ser um herói ou um
mito, pela sombra de trabalhos espantosos levados a efeito.
No nosso tempo é, com Rio Branco, um ídolo nacional. São
esses de fato os nomes mais populares da capital da
República. Com uma visão genial das coisas, com uma
incomparável capacidade de trabalho, esses dois homens
agiram como duas encarnações da pátria. Não foram homens
de partido. Não tiveram paixões políticas a orientá-los neste
ou naquele sentido. Trabalharam pela grandeza nacional,
acompanhados pela simpatia geral, prestigiados pelo apoio de
todos. Por isso receberam as bênçãos de todos.
O velho Dr. Pereira Passos, repetimos, era um tipo único de
nosso meio pela energia superior da vontade e pela visão
segura e certa das coisas. Quando lhe coube assumir o
governo da cidade, ninguém acreditou realizável a obra que
sem dificuldades se realizou. (...) Em quatro anos esta feita
uma reforma sem igual, transformada completamente a
cidade. Deixando a administração da cidade, as pedras que se
atiravam sobre o demolidor implacável se transformaram em
flores ao incomparável remodelador. A cidade estava uma
jóia. As rendas municipais aumentadas. O funcionalismo da
Prefeitura pago em dia.
E quando o grande homem tomou o vapor para ir descansar
na Europa, para repousar da surpreendente atividade
despendida, a população carioca fez uma ardente apoteose. O
Dr. Pereira Passos acaba de falecer gozando nesta cidade de
uma popularidade só comparável à que cerca o nome de Rio
Branco. Foi um homem."
A Tribuna, 3 de março de 1913.

AS MANCHETES:
Dr. F. Pereira Passos - O Grande Remodelador Da Cidade
Morreu, Em Viagem A Bordo Do Araguaia (A Notícia)
Uma Perda Nacional - Dr. Francisco Pereira Passos (Folha do
Dia)
Um Homem - O Dr. Pereira Passos (A Tribuna)
O Remodelador Da Nossa Cidade - O Seu Falecimento (A
República)
19) Edu Chaves: Primeiro Vôo
sem Escalas São Paulo - Rio de
Janeiro (1914)
"A chegada inesperada de Edu Chaves, o simpático patrício, a
esta capital, pilotando o seu magnífico Bleriot depois de um
percurso de 400 kilômetros, foi um ruidoso sucesso para a
nossa aviação, tornando-se objeto de comemorações, por toda
a parte, o dia de ontem. (...) Às 9,30, Edu Chaves, tendo
disposto convenientemente o seu magnífico aparelho, partiu
do prado da Moóca, elevando-se, em seguida, bem alto, afim
de melhor poder fazer a travessia de S. Paulo ao Rio. (...)
Partindo, como dissemos, do prado da Moóca, Edu Chaves
elevou-se a 1.800 metros, viajando nesta altura cerca de 20
kilômetros, ascendendo ainda a 2.000, 2.400 e 2.800 metros.
Ao chegar a esta capital Edu estava precisamente a 3.000
metros de altura. Para mais facilitar o "raid" do jovem patrício
o Telégrafo manteve troca de comunicação, ficando assim
organizado um belo serviço tendo a Estação Central recebido
os seguintes telegramas:
Rio, 5 - O aviador Edu Chaves partiu às 9,46 de São Paulo
diretamente para esta capital, onde deverá chegar às 14,30,
aterrando no Campo dos Affonsos. Nem sem escala.
Rio, 5 - Edu Chaves passou em Taubaté às 11 horas.
Rio, 5 - Edu Chaves foi visto em Cruzeiro às 13,50.
Rio, 5 - Barra Mansa avistou Edu às 11,30 viajando em
direção ao Rio. (...)
Eram 14 horas e 10 minutos quando Edu Chaves aterrou no
hangar da Escola Nacional de Aviação. Grande era a
assistência que enchia o Campo de Aviação e que
anciosamente acompanhava, com interesse, as manobras
arriscadas do arrojado aviador paulista. (...)
O denodado campeão do espaço conseguira cobrir o percurso
de 480 kilômetros em 4 horas e 39 minutos, perfazendo uma
média de 120 kilômetros por hora. O record de velocidade de
percurso fôra batido na América do Sul pelo aviador paulista.
No Campo dos Affonsos, onde se encontravam o Sr.
presidente da República e sua exma. esposa, foi o aviador Edu
Chaves cumprimentado por S. Ex., que o felicitou pelo bom
êxito colhido na sua travessia. (...)
O motor que é um Gnome 80 HP trabalhou magnificamente,
gastando durante o percurso 16 litros de gasolina e 45 litros
de óleo. O aparelho é munido de hélice Chouvier e vela Oleo.
(...)"
A República, 6 de julho de 1914

"O dia de ontem assinalou mais um triúnfo para a aviação no


Brasil. Coube ainda uma vez a Edu Chaves realizar um "raid"
sensacional, vindo de S. Paulo ao Rio de Janeiro em 6 horas e
meia, vencendo com admirável segurança um percurso de 450
kilômetros. O arrojado aviador paulista, nessa prova de
resistência teve de vencer dificuldades que não chegaram para
impedir a terminação do seu vôo memorável, desta vez
terminado com um absoluto sucesso, aterrando calmamente
no campo de aviação da fazenda dos Affonsos.
Edu Chaves saiu do prado da Moóca em S. Paulo às 9,30 da
manhã, tendo resolvido de surpresa renovar o "raid" que o
tornara famoso, alguns anos atrás, quando uma falsa
orientação do terreno o fez cair ao mar, nas proximidades de
Mangaratiba. O aparelho de que se serviu Edu Chave foi um
monoplano Bleriot, com um motor Gromo de 80 cavalos. O
percurso realizado no "raid" de ontem foi de cerca de 450
kilômetros, vencidos em 6 horas e meia. Edu Chaves fez o
vôo na altura de 2000 metros, subindo a 3000 metros ao
atravessar a Serra do Mar. A velocidade desenvolvida pelo
Bleriot foi de cerca de 80 kilômetros por hora. Foi uma
verdadeira surpresa a chegada de Edu Chaves no campo de
aviação da fazenda dos Affonsos. Recebido com efusivas
demonstrações de aclamação, por Darioli, Nicola Santo, Kirk
e outros aviadores presentes, Edu Chaves foi felicitado
entusiasticamente pelo "raid" que realizara com um sucesso
tão brilhante.(...)"
O Diário, 6 de julho de 1914

"Edu Chaves, o valoroso e pertinaz aviador brasileiro,


conseguiu fazer num só vôo, sem escalas, a travessia São
Paulo a esta capital. Com essa audaciosa prova bateu ele o
recorde da velocidade em longo percurso na América do Sul.
Ocultando dos amigos mais íntimos e da própria família o seu
intento, edu levantou ontem, às 9,30 da manhã, o vôo no
aeródromo paulista no seu Bleriot. fazendo a maior do
percurso na altura de 1800 metros, atingiu ele até os 2800
metros. Chegando ao Rio, Edu procurou dirigir-se para o
campo do Aeroclube Brasileiro, no Campo dos Affonsos,
onde aterrou às 2,10 da tarde. Em o nosso aeródromo achava-
se várias pessoas, inclusive o marechal Hermes, que, com sua
esposa, haviam ido ali assistir aos exercícios aviatórios de
Kirk e Darioli. Todos felicitaram calorosamente o aviador
brasileiro pela sua brilhante vitória. A travessia foi feita sem o
menor incidente desagradável, tendo gasto 160 litros de
gasolina e 45 de óleo. (...)
Depois de muito felicitado no Campo dos Affonsos, onde lhe
foi oferecido uma taça de champagna, Edu veio, às 10 horas
da noite, para a cidade, hospedando-se no Hotel Avenida. (...)
O notável vôo de Edu Chaves revolucionou os meios
aviatórios cariocas, onde a façanha de Edu tem causado
assombro."
O Século, 6 de julho de 1914

"Teve início, ontem, a festa promovida pelo Aero Club, por


um fato inteiramente inesperado, que foi a súbita aparição de
um aeroplano, de que não constava no programa a sua
evolução. De pequenino ponto, avolumou-se pouco a pouco
até reconhecer-se o magnífico aeroplano Bleriot 80 HP de
Edu Chaves, que às 9,35 partira do hipódromo da Moóca, em
S. Paulo. Após 4 horas e 40 minutos de ininterrupta viagem, o
nosso ousado patrício, numa bela "aterrisage", tomava contato
com o solo, descendo no campo da Escola Brasileira de
Aviação. Foi uma exclamação uníssona de pasmo e alegria ao
ver-se a figura simpática do nosso patrício, o precursor
brasileiro da nossa aviação no país. Edu partira, precisamente
às 9,45 e aterrou às 2,10 levando, portanto, 4 horas e 25
minutos para vencer os 450 kilômetros que nos separam da
capital paulista, fazendo, portanto, uma média de 104
kilômetros e 200 metros a hora. (...)
Antes, porem, de descer, executou uma série de voltas com os
braços levantados, não tocando, portanto, no volante de
direção. Esta proeza causou grande entusiasmo e levantou
muitos aplausos. (...)
Foi uma festa que obteve o mais franco sucesso, o que nos
deixa prever a aceitação que terão as futuras provas
instituídas pelo Aero Club. Num dos intervalos foi servida
uma fina mesa de doces e ao "champagne" foram feitos
diversos brindes. Durante a festa tocou uma banda de música
militar. Enfim, todos que de lá vieram trouxeram a melhor das
impressões."
A Tribuna, 6 de julho de 1914

"A comissão do Aero-Club Brasileiro reune-se amanhã, em


sessão extraordinária, afim de receber o grande aviador
patrício Edu Chaves, o arrojado piloto que acaba de realizar o
maior vôo sem escalas da América do Sul. A extraordinária
proeza de Edu veio fazer avançar de um ano a aviação
nacional. É justamente para registrar esse feito admirável, que
se inscreverá entre as maiores cruzadas aéreas
contemporâneas, que o Aero-Club se reune amanhã.
Tomando conhecimento oficial do vôo de Edu, O Aero-Club,
como único poder aeronáutico no Brasil, comunicalo-a à
Féderation Aéronautique Internationale, concedendo-lhe o
título de "recordman" de distância no Brasil."
A Rua, 8 de julho de 1914

MANCHETES
"Aviação - Uma Grande Surpresa - Edu Chaves Faz
Inesperadamente O "Raid" Rio-S.Paulo, Em 4 horas E 25
minutos - A Festa No Aero-Club (A Tribuna)
De S. Paulo ao Rio Em Aeroplano - Edu Chaves Faz A
Travessia (O Século)
Os nossos homens-pássaros - Edu Chaves será recebido
amanhã solenemente no Aero Club Brasileiro (A Rua)
20)Pinheiro Machado (1915)
" (...) Seriam mais ou menos 4.35 horas da tarde. Um dos
telephones da nossa redacção tilintou, rapido.
- Que deseja?
- É o Correio da Manhã?
- Sim , senhor.
- Quem fala é um dos amigos do "Correio". Acaba um
homem do povo, ao que parece, de assassinar o senador
Pinheiro Machado.
- Como sabe o senhor disso?
- Agora mesmo saltei do bonde e penetrei no Hotel dos
Estrangeiros, de onde lhe falo. O cadaver do senador Pinheiro
Machado acha-se ainda aqui.
E a ligação foi interrompida.
Immediatamente tres dos nossos companheiros abandonaram
a redacção, para colher informações sobre a noticia que nos
fôra, tão inesperadamenrte, communicada por telephone.
Poucos minutos, porém, decorreram depois da saida daquelles
representantes do "Correio da Manhã", quando outro nosso
companheiro varou precipitadamente a redacção, informando-
nos de que já se vulgarizara, com insistente brutalidade, a
noticia do assassinato do vice-presidente do Senado Federal.
Essa noticia era grave demais, para ser acreditada para logo,
deante das escassas minucias informadas. Esperámos, por
isso, e com explicavel anciedade, a sua confirmação, para a
transmitir ao publico, em boletins. Já por esse tempo - deviam
ser 5 horas - compacta massa de povo, na qual se lobrigavam
pessoas de representação social, detinha-se defronte da nossa
redacção, á espera dos nossos boletins.
Recebemos, então, pelo telephone, nova communicação do
assassinato do senador Pinheiro Machado, feita por um quinto
ou sexto companheiro de trabalho.
- Viu o cadaver?
- Não. a noticia, porém, é verdadeira.
- Pois assim que vir o general Pinheiro confirme-a. E procure
a confirmação, indo ao local.
A massa de gente defronte da nossa redacção avolumava-se,
porém, cada vez mais, presos instinctivamente de anciedade.
É que a noticia já corria por toda a cidade, em fórma de boato.
Um dos tres companheiros nossos que haviam partido para o
Hotel dos Estrangeiros conseguiu, finalmente, communicar-se
com a redacção pelo telephone official:
- O senador Pinheiro Machado foi, effectivamente,
assassinado, com uma punhalada nas costas, no saguão do
Hotel dos Estrangeiros. O assassino é um moço brasileiro,
nascido em São Paulo. O cadaver do senador sul-riograndense
acha-se numa das saletas de espera do andar terreo do hotel,
cercado de amigos. Vi-o.
Affixámos, então, no "placard" os primeiros e minuciosos
boletins do "Correio da Manhã". O automovel conduziu-nos,
celere. (...)
Depois de percorrermos detidamente algumas dependencias
do andar terreo do hotel, inclusive a saleta de espera onde se
achava, sobre uma mesa, estendido o cadaver do senador
Pinheiro Machado, voltamos á sala contigua ao saguão, onde
se verificara o assassinato, e palestramos com o dr. Bueno de
Andrade, testemunha de vista do tragico sucesso. O deputado
paulista achava-se succumbido. A sua physionomia revelava
uma fadiga moral excessiva. Trocamos um ligeiro
cumprimento com o parlamentar paulista e conduzimol-o para
uma poltrona daquella sala.
- Então, dr. Bueno, como foi essa tragedia?
Elle olhou-nos um momento e confirmou:
- Diz bem: uma tragedia!
- Como veiu o general Pinheiro aqui?
- Elle veiu visitar o sr. Rubião Junior, que não se achava,
então, no hotel, pois que havia saido. Eu e o sr. Cardoso de
Almeida achavamo-nos no saguão a cerca de oito passos da
escada, que dá accesso para o andar superior do edificio.
Palestravamos os dois sobre a politica paulista. O senhor
Pinheiro Machado, depois de ter sido informado da ausencia
do Sr. Rubião Junior, appareceu na saguão e, lobrigando-nos,
dirigiu-se para onde nos achavamos.
- Houve sessão no Senado sr. Pinheiro?
O senador riograndense retorquiu:
- Houve sim. Mas nada houve de mais.
Depois de uma curta pausa o senador Pinheiro convidou:
- Mas venha cá, bacharel Cardoso. Interrogueio o então.
- Como vai general?
- Como vai você, "seu"Bueno?, respondeu-me, interrogando o
senador.
Referiu-se então, á ausencia do Sr. Rubião Junior. Desse
momento o Sr. Cardoso de Almeida disse:
- Mas o sr. Albuquerque Lins está ahi.
- Vamos conversar com elle, "seu"Cardoso. Vamos conversar
com elle, vamos.
E o sr. Pinheiro insistiu muito nesse convite, ao que se
excusava o deputado paulista, por haver já visitado o sr.
Albuquerque Lins. Estavamos a uns quatro passos da escada
espiral do saguão. O senador riograndense achava-se de
costas exactamente para a parte anterior da saguão, de frente,
portanto, para os fundos dessa dependencia do hotel. O sr.
Cardoso de Almeida e eu estavamos collocados de maneira
que não podiamos avistar immediatamente quem penetrasse
no hotel, pelas suas portas principaes.
Foi precisamente no instante em que o vice-presidente do
Senado insistira com o seu collega de bancada para uma visita
commum ao dr. Albuquerque Lins, que o assassino surgiu.
- E, como era esse assassino?
- Não pude guardar-lhe as feições, continuou o Sr. Bueno de
Almeida. Pareceu-me, porém, que era moço, vestia roupas
escuras, chapéo de palha, paletot aberto, sem collete. Vi-o de
relance.
- E como praticou o assassinato?
- Surgiu por detrás do senador Pinheiro e deu-lhe um murro
nas costas. O general gaúcho estremeceu e exclamou:
Canalha! O covarde correu. O sr. Cardoso de Almeida deitou
a correr em sua perseguição. (...)
Correio da Manhã, 9 de setembro de 1915.
"A politica nacional attingida em cheio pelo golpe de punhal
que cortou abruptamente a existencia do general José Gomes
Pinheiro Machado, transformou-se de subito numa formidavel
interrogação para o paiz, colhido de surpresa por um violento
extremeção da vertiginosa corrente em que se deixava
arrastar, indolente e descuidado.
O general Pinheiro Machado, a exemplo de todos os grandes
dominadores das multidões, nunca tomou em conta da sua
obra publica as opposições infimas, as resistencias
imponderaveis ao seu espirito de luctador affeito a enfrentar e
vencer as maiores energias antagonicas; nem a molestia ou a
sua morte entraram jamais em seus calculos como factores
possiveis do insucesso de suas idéas e das aspirações que S.
Ex. aggremiara, disciplinara e movia a seu talante com
absoluta confiança na sua peregrina estrella. (...)
Sempre guardado á vista, o assassino Francisco Manso de
Paiva Coimbra, passou a noite calmo, dormindo algumas
horas, recusando, entretanto, qualquer alimentação, a não ser
café. Tem o aspecto abatido, pronunciadas olheiras e a barba
mais crescida. Veste ainda o mesmo terno escuro com que foi
preso e se deixa photographar sem a menor reluctancia.
O maior temor que o criminoso manifesta é o que lhe poderá
acontecer na Casa de Detenção, para onde não deseja ir. Sabe
que o director desse presidio era amigo particular do general
Pinheiro Machado, e se arreceia de ser maltratado ali. Isso
mesmo já o criminoso hontem expandia ao dr. chefe de
pollicia, quando interrogado.
Na delegacia do 6o districto, quando, ás 11 horas da manhã
de hoje estava sendo identificado, um dos nossos
companheiros logrou falar ao criminoso.
Apezar de se mostrar calmo, Francisco Manso de Paiva
Coimbra ao assignar as fichas tinha a mão tremula.
Interrogando-o, disse-nos o assassino que as suas declarações
são as de seu depoimento, já publicado em todos os jornaes
em que affirmou estar satisfeito em haver cumprido um voto
de que ha muito fizera.
Disse-nos ter pae e mãe vivos, no Rio Grande do Sul, de onde
é filho; seu pae é Francisco de Paiva Coimbra, portuguez e
padeiro, e sua mãe D. Maria de Jesus, natural do Rio Grande.
Seu parente é apenas sua irmã Conceição, tambem no Rio
Grande, não tendo aqui no Rio senão ligeiros conhecimentos.
Perguntando-lhe si havia já sido preso alguma vez, mesmo
com o nome de João Dias Regis, respondeu-nos que nunca
fora preso e se trocou de nome foi por ter desertado do
Exercito.
Dentre outras declarações prestadas, quer á policia, quer á
imprensa, o assassino disse não ser habito seu frequentar
"meetings" nem reuniões politicas, apenas tendo ido ao ultimo
realisado nesta capital, que diziam ser contra o general
Pinheiro. Fôra este o único "meeting" a que compareceu. (...)
A policia tinha conhecimento de que se tramava um complot
contra o Senado ou contra o proprio sr. senador Pinheiro
Machado.
Segundo declarações feitas pelo sr. dr. Carlos Maximiliano,
ministro da Justiça, soubera a nossa policia que esse complot
tinha por fim fazer saltar a dynamite o edificio do Senado, no
dia do reconhecimento do Sr. Hermes da Fonseca.
Esta noticia nos foi transmittida por um dos membros da
bancada rio-grandense, que ouviu o sr. Ministro da Justiça
fazer tal declaração. Sobre o caso foi guardada, porém, a mais
absoluta reserva e discreção, não sendo tomadas, mesmo,
medidas ostensivas, para não causar o alarma muito natural
que ellas iriam provocar.
Entretanto, esta falta de uma iniciativa rigorosa causou
estranheza enorme nos circulos politicos rio-grandenses. (...)"
A Notícia, 9 de setembro de 1915

"A primeira impressão causada no espirito publico pelas


noticias do assassinato de sr. general Pinheiro Machado foi a
de um verdadeiro estupor. Chefe politico, de uma influencia
tão vasta, tão poderosa e quasi podemos dizer tão
incontrastavel na vida da nação, a primeira idéa ligada ao
facto, quando o facto já não podia ser posto em duvida, foi a
de que se tratava de um attentado politico. E, felizmente,
esses processos violentos estão de tal modo afastados da
nossa indole, que o movimento geral que se fez
immeadiatamente em torno do lutoso acontecimento foi o de
uma franca e geral condemnação. (...)
Mais ou menos ás 4,40 da tarde passava pelo Hotel dos
Estrangeiros um bond da linha do Humaytá. Varios
vendedores de jornaes que por ali se achavam correram para o
bond gritando:
- Mataram o general Pinheiro Machado!
Uma senhora disse aos pequenos:
- Vocês não gritem essas mentiras.
- Mas é verdade, foi agora mesmo.
E o pequeno, com outros companheiros, saltaram para os
bonds que passavam pela rua Senador Vergueiro e pela rua
Marquez de Abrantes, repetindo os mesmos gritos: - Mataram
o senador Pinheiro Machado!
A impressão, porém, era de incredulidade apesar de haver um
desusado movimento junto á porta do hotel, para onde varios
guardas civis acudiram. (...)
O sr. Pinheiro Machado almoçou hontem, á hora habitual, no
seu palacete da rua Guanabara, depois do que recebeu varios
amigos politicos que o procuraram. Depois, tomando o seu
"laudaulet", dirigiu-se ao senado, onde deveria ser feita a
votação do parecer reconhecendo o sr. marechal Hermes da
Fonseca senador pelo Rio Grande do Sul.
Na ausencia do sr. dr. Urbano dos Santos, assumiu S. Ex. a
presidencia, demorando, propositalmente, a abertura da
sessão até a 1 hora e 45 minutos, á espera de conseguir
numero para a votação. Como, porém, até ás 2 horas não
tivesse numero preciso, pediu uma lista da residencia de todos
os senadores, determinando que se expedissem telegrammas a
todos quantos se encontram presentemente nesta capital e em
Petropolis, pedindo-lhes o comparecimento á sessão de hoje.
Depois demorou-se ainda no edificio do senado cerca de 20
minutos, conversando com alguns senadores, entre os quaes
os srs. Indio do Brasil e Arthur Lemos.
Deixando o Senado, S.Ex. tornou a tomar o seu automovel
para fazer varias visitas, entre as quaes uma ao sr. dr. Rubião,
chegado de S. Paulo e que se hospedara no Hotel dos
Estrangeiros. Era a fatalidade do destino a chamal-o ao ponto
onde o esperava a morte!
Chegando ao vestibulo do Hotel dos Estrangeiros, o vice-
presidente do Senado encontrou os srs. Cardoso de Almeida e
Bueno de Andrade, deputados federaes pelo Estado de S.
Paulo.
Dirigindo-se a esses cavalheiros o sr. general Pinheiro
Machado, convidou-os, galhofeiramente, para subirem aos
aposentos do dr. Rubiào Junior, "afim de visital-o e ouvirem
historias engraçadas", phrase textual, proferida pelo senador
rio-grandense.
Os srs. Cardoso de Almeida e Bueno de Andrade, seguindo
uma versão subiram, ladeando o Sr. Pinheiro e recusaram-se
subir consoante outra versão, dizendo em tom de pilheria: -
Suba você sosinho...
O facto é que o sr. Pinheiro Machado foi apunhalado pelas
costas, quando atravessava o saguão para entrar na sala do
hotel.
O assassino, ao que parece, não conhecia o general Pinheiro
Machado, tanto assim que perguntou a uma pessoa presente
quem era o vice-presidente do Senado Federal.
Ao sentir-se ferido, mortalmente, o sr. Pinheiro Machado,
desceu tranquillamente as escadas e, encaminhando-se para a
sala de visitas do hotel declarou estar ferido, sentando-se em
uma cadeira, e expirando minutos após.
Como é natural, o assassinato do vice-presidente do Senado
divulgou-se com extrema rapidez e o Hotel dos Estrangeiros
enchia-se de amigos e correligionarios de S. Ex.
A primeira pessoa que chegou ao Hotel dos Estrangeiros foi o
sr. ministro da Justiça, que estava ligeiramente enfermo.
Ferindo mortalmente o sr. Pinheiro Machado, o seu assassino,
desceu as escadas e entregou o punhal homicida ao sr.
Cardoso de Almeida. (...)"
Gazeta de Notícias, 9 de setembro de 1915

"A impressão no primeiro momento foi a da mais completa


surpreza. Ao circular a nota do assassinato praticado no Hotel
dos Estrangeiros houve a sensação de pasmo, de duvida, de
incerteza. A cida do homem hontem tombado estava de ha
muito em perigo e entre os sucessos previstos figurava a
possibilidade de sua eliminação. mas que caisse assim,
daquella forma, em um momento de relativa calma, sem os
prenuncios da dolorosa tragedia, eis o que não entrava nos
dominios do admissivel.
Entretanto tal aconteceu, manifestando-se a principio a
incredulidade publica, para dar logar mais tarde, deante de
informes positivos e seguros, ao peso da realidade, com toda a
sua brutal e triste evidencia. (...)
A hora adiantada da tarde em que foi perpetrado o assassinato
do senador Pinheiro Machado, quando já havia saido a nossa
segunda edição, só nos permittiu que em uma terceira edição
dessemos em rapidas notas a noticia confirmadora do crime,
quando ainda não se sabiam os pormenores da scena de
sangue. Passamos por isso, a narrar, em breves linhas, como
occorreu o crime.
O senador Pinheiro Machado chegava, de automovel, ao
Hotel dos estrangeiros onde ia visitar o dr. Albuquerque Lins,
ex-presidente de S. Paulo. Nesse momento encontravam-se na
portaria os deputados Bueno de Andrade e Cardoso de
Almeida, que chegara pouco antes.
Conversavam os dois congressistas quando viram o senador
Pinheiro que interrogava o porteiro do hotel.
Cumprimentaram-se os tres politicos. O sr. Cardoso de
Almeida interrogou o general Pinheiro Machado: - Sr. chefe,
como passa? O general respondeu brincando com esta
expressão: - Adeus bacharel. Voc6e como vae?
O sr. Cardoso de Almeida declarou, então, sabedor de que o
seu collega Bueno de Andrade não encontrara o dr. Rubião
Junior, que tambem o dr. Albuquerque Lins se acha
hospedado no hotel, o general Pinheiro Machado asseverou
que ali fôra visital-o.
O senador Pinheiro recebeu então communicação de que o dr.
Albuquerque Lins o esperava. O sr. Cardoso de Almeida quiz
se retirar para os seus aposentos, mas diante do convite
insistente do sr. Pinheiro Machado, resolveu acompanhal-o.
Ladeado pelos dois deputados, encaminhou-se o general do
saguão para o interior do hotel. Ao se approximarem o
general e os dois companheiros do salão de leitura no hotel,
um individuo apunhalou pelas costas o chefe do Partido
Conservador. Este virou-se, rapidamente, e exclamou, com
indignação: - Canalha!
O assassino saiu a correr para a praça José de Alencar. O dr.
Bueno de Andrade, que não comprehendeu, ao primeiro
momento a gravidade do facto, não presumindo que o general
Pinheiro Machado houvesse sido ferido, interrogou:
- Que quer dizer isto?
- Estou apunhalado, respondeu o senador Pinheiro.
O sr. Cardoso de Almeida saiu em perseguição do aggressor,
em companhia de outras pessoas, prendendo-o logo adiante,
sem a menor resistencia e confessando elle o crime.
Dentro do hotel o senador Pinheiro Machado caiu sem
pronunciar mais palavra alguma, expirando pouco depois,
sendo inuteis os soccorros que lhe prestaram. (...)
O Século, 9 de setembro de 1915

"Foi um verdadeiro estupôr a sensação que causou, ao cahir


da tarde de hontem, a noticia do assassinato do sr. general
Pinheiro Machado, vice-presidente do Senado e chefe do
Partido Republicano Conservador.
O barbaro, o hediondo crime de hontem relegou para um
plano muito remoto todas as cogitações partidarias em torno
do valoroso vulto republicano que cahia victima da sanha de
um facinora. Crimes como o de hontem envergonham uma
sociedade inteira, ao mesmo tempo em que a enxovalham e
ameaçam no que ella tem de mais nobre e mais elevado.
Pode-se affirmar sem receio de exaggero que o gesto estupido
que roubou a vida do general Pinheiro Machado nào
encontrou duas modalidades diversas de julgamento.
A sociedade affrontada por essa erupção de barbaria
inqualificavel, foi unanime na indignação que verberou o
scelerado que descera á pratica daquella hediondez sem
nome. O que revolta particularmente no crime de hontem é o
risonho cynismo desse monstro humano, que vinha seguindo
semanas a fio, a sua nobre victima, espreitando o momento
propicio para traiçoeiramente, cravar-lhe o punhal pelas
costas!
Quiz a ironia do destino que o general Pinheiro Machado,
homem cavalheiresco e altivo e possuidor de qualidades
excepcionaes de coragem, experimentadas em muitos campos
de batalha e em varias pendencias de honra, viesse cahir
victima de um braço covarde e traiçoeiro, a serviço da loucura
de um cerebro inculto. As ultimas palavras do illustre vulto
republicano mostram que elle apezar da fulminante rapidez da
scena, percebera nitidamente o alcance do que succedia: - Ó
canalha!
E nesta expressão, que precedeu de segundos as duas ultimas
palavras que pronunciou, resumia-se todo um infinito
desprezo pelo abjecto assassino que lhe cravara no coração a
fina lamina de um punhal reluzente...
Não ha, em toda a sociedade, como diziamos, duas maneiras
para julgar o assassinato do general Pinheiro Machado.
Mesmo seus adversarios politicos mais intransigentes
ververaram com indignação a criminosa loucura desse
facinora que enxovalhou a nossa civilisação, dando largas aos
seus instinctos selvagens e repugnantes.
Não é este ainda o momento para falar da verdadeira
significação politica do assassinado no complexo da vida
nacional. A historia, expurgando-lhe a figura dos erros que
commetteu, ha de fazer-lhe justiça, colocando-o na plana dos
seus melhores e mais devotados servidores.
Mas o que parece innegavel é que o crime de hontem pode
aggravar de muito as difficuldades do paiz. (...)
A Tribuna, 9 de setembro de 1915

AS MANCHETES:
O Assassinato Do General Pinheiro Machado - Quem É O
Criminoso E Quaes Os Motivos Do Crime - As Forças De
Terra E Mar Em Meia Promptidão - As Homenagens Que
Serão Prestadas Ao Morto ( A Tribuna )
Pinheiro Machado - O Seu Assassinato - A Repercussão No
Paiz - O Crime E O Criminoso - As Providencias Do Governo
- Demonstrações De Pezar - A Transladação Do Corpo -
Notas E Informações ( O Século )
Um Crime Sensacional -O Assassinato Do General Pinheiro
Machado - O Dia De Hontem - A Visita Ao Hotel Dos
Estrangeiros - O Crime - Notas Commoventes - A Acção Da
Policia - Prisão Do Assassino - Na Delegacia - O Auto De
Flagrante - Depoimentos - No Morro Da Graça - No Palacio
Guanabara - Providencias Da Policia - No Exercito - Diversas
Notas
( Gazeta de Notícias )
O Assassinato Do General Pinheiro Machado ( A Notícia )
O General Pinheiro Machado Foi, Hontem, Á Tarde
Assassinado No Saguão Do Hotel Dos Estrangeiros - O
Criminoso, Natural Do Rio Grande Do Sul, Foi Preso,
Declarando Ter Agido Por Conta Própria - O Que Dizem As
Testemunhas De Vista Da Tragica Scena - As Forças De
Terra E Mar estão De Promptidão ( Correio da Manhã )
21) Alcindo Guanabara (1918)
"Faleceu esta madrugada em sua residência, à rua Gustavo
Sampaio o Senador Alcindo Guanabara. Esta triste notícia
chegou-nos na hora que a nossa folha entrava na máquina. Foi
absolutamente inesperada a sua morte. Sua Ex. faleceu de
uma embolia cerebral."
Jornal do Commércio, 20 de agosto de 1918

"O Sr. senador Alcindo Guanabara há muitos anos tinha


abalado o seu estado de saúde. Diversas crises de um mal que
não perdoa fizeram que seus amigos temessem sérias
consequências. Mas ultimamente parecia que o mal
estacionara e o seu aspecto geral já não impressionava ao
largo círculo de suas relações. (...) O Sr. Alcindo Guanabara
gozava de forte prestígio e a sua palavra foi sempre acatada
nos meios parlamentares. Há cinco ou quatro anos, o Sr.
Alcindo Guanabara se afastava por completo do jornalismo.
(...) A politicagem prendeu e enlaçou esse grande espírito,
que uma porção de negócios também embaraçou: mas, se
essas preocupações fizeram variar o agrupamento a quem
pertencia, nunca alteraram o seu grande programa social e
político. (...) Foi esse grande mestre da nossa arte de escrever
em jornal, grande mestre que sempre honrou a profissão pela
elevação dos conceitos, erudição poliforme e brilhde estilo,
que anteontem faleceu. Foi dos maiores espíritos da sua
geração e influiu como poucos na formação intelectual dos
estadistas republicanos. (...)"
Jornal do Commércio, 21 de agosto de 1918
"A Prefeitura vai prestar a Alcindo Guanabara homenagem. O
Dr. Amaro Cavalcanti assim que soube da morte do senador
pelo Distrito Federal mandou o seu oficial de gabinete Dr.
Mário Cavalcanti à casa do morto apresentar pêsames à
família e comunicar que o governo municipal se encarregará
do enterro e das exequias do ilustre morto. O governador da
cidade será representado no enterro pelo seu oficial de
gabinete. A prefeitura mandou hastear o pavilhão municipal
em funeral em todas as repartições municipais. repercutiu
dolorosamente na Câmara Alta da República a notícia do
falecimento inesperado de Alcindo Guanabara, uma das
figuras mais representativas daquela casa, onde o morto
representava o Distrito Federal (...)
O desaparecimento de Alcindo Guanabara, colhido
subitamente pela morte, vem ferir e enlutar as letras e a
imprensa nacionais de modo profundo (...) O falecimento do
senador Alcindo Guanabara revestiu-se de todos os
imprevistos. De domingo até ontem trabalhara
excessivamente no parecer sobre o reconhecimento dos
senadores espírito-santenses. Hontem, como de costume, saiu
de sua residência indo até ao escritório, almoçando em
seguida num restaurante da Rua Sete de Setembro. Depois
dirigiu-se ao Senado, onde procedeu à feitura do parecer que
tinha escrito. Às 7 horas da noite, sentindo-se muito fatigado
e passando mal, dirigiu-se à casa de seu médico, o Dr. Castro
Barreto, que reside nas proximidades da rua Gustavo
Sampaio. Ao entrar, pediu ao clínico que o medicasse.
Aconselhado a repousar, antes que tudo, o senador Alcindo ia
retirar-se quando foi acometido de uma syncope. Socorrido,
ficou na residência do Dr. Castro Barreto, onde veio a falecer
às 2,5 da manhã, vítima de um terceiro ataque de embolia
cerebral. (...)"
A Notícia, 20 de agosto de 1918
"Faleceu, ontem, inesperadamente, nesta cidade, o senador
Alcindo Guanabara. Ainda ante-ontem o senador carioca dera
o parecer que elaborara sobre as eleições do Espírito Santo,
aos membros da comissão de Poderes, que o aprovaram.
Deixando o Senado, às 15 ½ horas daquele dia, o senador
Alcindo Guanabara veio para a cidade, onde permaneceu até
cerca de 21 ½. A esse tempo, tomou um automóvel e dirigiu-
se à sua residência no Leme. Quando o veículo transpunha a
rua Gustavo Sampaio, naquela localidade, o senador carioca
sentindo-se mal, deu ordens ao "chauffeur" para levá-lo à casa
do Dr. Castro Barreto, seu médico assistente. Em ali
chegando, o senador Guanabara piorou muito. O referido
facultativo acomodou-o em um de seus aposentos, onde,
horas depois, às 3 da madrugada, teve um colapso cardíaco,
falecendo, já então cercado de pessoas da sua família.
(...)
Vindo para o Rio, o senador Alcindo Guanabara escreveu,
entre outros, na Gazeta da Tarde, de José do Patrocínio, no
Novidades, Correio do Povo, Jornal do Commércio e,
ultimamente, na Imprensa, que era de sua propriedade. Muitas
vezes se arredou do seu posto para exercer mandatos
políticos. Fez parte da Constituinte e, depois, na República,
foi eleito em várias legislaturas Deputado Federal. (...)"
O Imparcial, 21 de agosto de 1918

"Por circunstâncias decorrentes talvez menos de sua própria


vontade que da nossa anarquia político-social, que se
caracteriza justamente pela completa inversão de todos os
valores, o maior jornalista brasileiro acaba de falecer,
afastado do jornalismo militante, cujas fileiras são invadidas
por "arrivistas" falhados em outras profissões. (...)
De fato, enquanto vivesse o incomparável mestre, cuja única
paixão era o jornal, havia a esperança consoladora de que, não
obstante o abatimento de suas energias físicas, ele voltasse, de
um momento para o outro, à atividade jornalística, elevando,
de novo, o nível intelectual da nossa classe à altura fulgurante
em que ela pairou, durante o largo período em que sua pena
pontificava em pleno vigor. Tombado, porém, o gigante, nós
outros olhamos em torno dos que enxameam na cidadela
invadida, não vendo quem possa sopesar a sua clava
formidável. (...)
Mas é, sobretudo como jornalista, que o nome de Alcindo
Guanabara se perpetuará na nossa história. A sua pena
maravilhosa representava, por si mesma, o próprio jornal,
porque produzia tudo de quanto ele precisasse, desde o artigo
de fundo até ao noticiário de polícia. (...)"
A Razão, 21 de agosto de 1918

"Na vertigem alucinante destes dias que passam, quando


todos nós somos empolgados pelo espetáculo prodigioso da
transformação que se opera no mundo, a tendência geral se
acentua sempre no sentido de ninguém se deter, com emoção
duradoura, diante de acontecimentos que não se entrelaçam
com os fatos atuais e que mais nos falam do passado do que
do presente. Mas, apesar disso, não há como sopitar a onda de
uma emoção sentida e transbordante, que sobe dentro de nós,
com a força irreprimível dos sentimentos inelutáveis e
profundos, ao sermos surpreendidos pela notícia da morte de
Alcindo Guanabara. (...)
Recordar os episódios culminantes dessa vida é assinalar toda
a nossa evolução nacional nestes últimos 30 anos. Porque raro
serão os grandes acontecimentos de ordem social e política,
ocorridos de 1888 para cá, a que não esteja ligado o nome
refulgente de Alcindo. (...)
Como político e como parlamentar, Alcindo Guanabara foi
um combativo e foi um construtor. (...)
Alcindo Guanabara, que no domínio da atividade jornalística,
foi um grande doutrinador e um irredutível liberal e
republicano, como parlamentar não só confirmou essas
qualidades como ainda se revelou sociólogo e economista de
altíssimo valor. (...)"
A Tribuna, 20 de agosto de 1918

MANCHETES:
Alcindo Guanabara - O Brasil Sofre Uma Perda Irreparável -
Morre O Maior Dos Seus Jornalistas Contemporâneos (A
Tribuna)
Uma Perda Insubstituível No Nosso Patrimônio Moral - O
Falecimento Do Maior Dos Jornalistas Brasileiros (A Razão)
22) Gripe Espanhola (1918)
"O que se está passando na Saude do Porto da nossa capital é
simplesmente assombroso. Os navios entram infeccionados,
os passageiros e tripulantes atacados saltam livremente
contribuindo para contaminar cada vez mais a cidade, não
soffrendo os navios o mais rudimentar expurgo!
A Saude do Porto não tem conducção, não tem o pessoal
necessario para as emergencias do momento e o material
preciso para as desinfecções.
A inepcia, o pouco caso criminoso do director de Saude
Publica pelo cumprimento das attribuições que em má hora o
governo lhe confiou, tocou hoje, as raias do incrivel.
Telegrammas chegados ha dias de Estados do Norte,
annunciaram detalhadamente dezenas de casos de "influenza
hespanhola" occoridos a bordo da "Itassucê". Era o caso do
Sr. Carlos Seidl tomar providencias energicas, para isolar os
enfermos e expurgar o navio, mal chegasse elle á Guanabara,
si s.ex levasse a sério seus deveres. Nada disso, entretanto,
aconteceu. O "Itassucê" chegou, foi desimpedido e os doentes
desceram calmamente á terra, sem que o director da Saude
Publica mandasse tomar a minima providencia!
O dr. Pereira Neves, medico, hoje de serviço na Saude do
Porto, viu-se em sérias difficuldades para visitar o "Itassucê",
por falta de conducção, isto porque o ineffavel sr. Carlos
Seidl emprestou a lancha de serviço a um amigo que queria ir
a bordo desse navio buscar pessoas de sua amizade.
O director da Saude Publica, está evidentemente, abusando da
paciencia da população. O governo está na obrigação de fazer
sentir ao incompetente administrador, que mais de um milhão
de vidas não pódem continuar assim á mercê do seu
formidavel desleixo, da sua extraordinaria inercia e da sua
incommensuravel inaptidão administrativa. (...)
Rio Jornal, 11 de outubro de 1918

"O descaso do governo pela saude pública está tomando um


ar pilherico. Até agora não se poz em pratica uma só
providencia, digna desse nome, para debellar o epidemico mal
ou, pelo menos, circumscrevel-o a proporções reduzidas
dentro das quaes a sua prophilaxia se tornasse possivel e facil
sem desperdicios de tempo. Deu-se isto hontem com os
passageiros do transporte inglez "Highland Lock".
A molestia transmitte-se, propaga-se assim precipitadamente.
As repartições publicas, as escolas, os escriptorios de
empresas de toda a especie, as officinas dos jornaes, os
estaleiros, as estradas de ferro estão ficando enormemente
desfalcados de pessoal.
Em todas as ruas, e a todas as horas, vemos cahir subitamente,
tombar sobre a calçada victimas do mal estranho. A
Assistencia tem multiplicado o seu serviço, os hospitais estão
repletos. (...)"
Rio Jornal, 14 de outubro de 1918

"A epidemia que de ha quatro dias vem assolando a cidade


longe de enfraquecer tem recrudescido nestas ultimas vinte e
quatro horas, a mais grave, é que o seu caracter, que se
apresentava benigno nos primeiros dias, tem peiorado,
registrando-se continuamente casos fataes. Entre as dezenas
de milhares de pessoas atacadas, já não são tão raras quanto
seria para desejar os casos de "grippe pneumonica".
A intervenção dos poderes officiaes torna-se urgente e
necessario. O governo não póde continuar inactivo perante o
affecto serississimo que vem assumindo o mal. Concertem-se
e tomem-se providencias que urgem. As fabricas começam a
fechar, as officinas ficaram com as suas portas cerradas,
grande numero de casas de commercio não funccionam. O
governo não póde criminosamente ficar de braços cruzados,
assistindo platonicamente ao desenrolar dos acontecimentos.
O que se esperava desde as primeiras horas de hontem deu-se
hoje: as pharmacias começaram a fechar. Desde as primeiras
horas em que se declarou a epidemia que a romaria ás
pharmacias não parou nem um instante.
Houve então uma grande desorientação e uma ignobil
exploração por parte de algumas pharmacias. Os preços
variavam de pharmacia para pharmacia e de bairro para
bairro. O tubo de bromo-quinino passou a custar de 1.500 a
8.000 e 9.000 réis. Uma limonada purgativa 4, 6 e 8.000 réis.
Uma capsula com 25 ctgrs. de Sulphato de Quinino custava
400 réis, no maximo, custa 2 e até 3.000 réis!
É o furto, parecendo que nem se quer estamos numa cidade
policiada! Mas a necessidade era grande e os doentes nos
milhares, o que fez com que apezar do descabido escandaloso
dos preços, os medicamentos se esgotassem.
Várias pharmacias, especialmente nos suburbios, allegam
tambem a doença do seus pessoal.
Que será da população sem ter sequer medicamentos?
Ha mais ainda no capitulo pharmacia. Em algumas dessas
casas a exploração na venda dos "preventivos e preservativos"
attingiu as raias do inacreditavel. Tudo era preventivo. Até a
vulgar naphtalina! e como tal tudo era cobrado em dobro e em
triplo. (...)
A Avenida Central que costuma estar sempre tão animada á
noite, hontem cerca das dez horas apresentava um aspecto
desolador. Cerca de onze e meia raros eram os transeuntes e
unicamente dois taxis estacionavam a todo o longo da
Avenida deserta.
Os bonds chegavam e sahiam da estação do Jardim Botanico
com dois e três passageiros, no maximo. (...)
Nas proprias casas de familia, onde ha a felicidade de não
haver nenhum membro doente, e são bem raros esses lares,
nessas mesmas as normas de vida estão inteiramente
alteradas. Nesta é o padeiro que não vem entregar o pão; na
outra foi o leiteiro que não deixou ficar o leite. Mais logo,
toca-se para o armazem e não é possivel ser attendido. Se
quizer alguma cousa é necessario mandar buscar ao armazem,
pois não ha mais quem leve as encommendas ao seu destino.
Noutra casa ainda é a lavadeira, o tintureiro, a costureira que
não apparece. Emfim, um nunca acabar de pequenas
difficuldades que fazem desesperar as donas de casa."
A Rua, 15 de outubro de 1918

"Conselhos aos que se acham no inicio da infecção:


Tomar um purgativo salino qualquer ou a formula seguinte:
N.1 - Uso interno; Agua distilada... 120,0 Sulphato de Sodio...
30,0 Assucar q.s. para adoçar. Para tomar de uma só vez. Em
seguida fazer uso de capsulas com quinino, aspirina,
salicylato de sodio, ou a formula seguinte, da Directoria Geral
de Saude Publica: N.2 - Uso interno: Agua distilada... 150,0
Salicylato de Sodio... 4,0 Bicarbonato de Sodio... 2,0 Assucar
q.s. para adoçar. Para tomar uma colher de sopa de duas em
duas horas. Para a tosse e facilitar a espectoração, usar a
seguinte formula: N.3 - Uso interno: Agua distilada... 150,0
Benzoato de Sodio... 4,0 Acetato de Ammonea... 6,0 Assucar
q.s. para adoçar. Para tomar uma colher de sopa de tres em
tres horas. Dieta: O uso do frango ou da gallinha não é
indispensavel. A dieta poderá ser mantida por meio de leite,
caldo de sopa de cereaes, de legumes, de lentilhas, de arroz,
aveia, centeio, etc., etc. A Directoria Geral de Saude necessita
ainda de medicos, doutorandos, pharmaceuticos e praticos de
pharmacia.
Conselhos para evitar o ataque da grippe ou influenza:
Evita o uso e, com maior razão, o abuso de bebidas
alcoolicas. Lavar a boca e gargarejar com uma solução de sal
de cozinha, na seguinte proporção: uma colher de sopa para
um litro de agua fervida. Fazer diariamente uso de uma
solução de essencia de canela, conforme as seguintes dóses:
uma colherinha das de café em meio copo de agua
assucarada, de duas em duas horas, até desapparecer a febre.
Depois tomar ua colherinha em meio copo de agua tres vezes
ao dia. Evitar agglomerações, principalmente á noite. Não
fazer visitas. Tomar cuidados hygienicos com o nariz e a
garganta: inhalações de vaselina mentholada com agua
iodada, com acido citrico, tannino e infusões contendo
tannino, como folhas de goiabeira e outras. Tomar, como
preventivo, internamente, qualquer sal de quinino nas dóses
de 25 a 50 centigrammas por dia, e de preferencia no
momento das refeições. Evitar toda a fadiga ou excessos
physicos. O doente, aos primeiros symptomas, deve ir para a
cama, pois o repouso auxilia a cura e afasta as complicações e
contagio. Não deve receber, absolutamente, nenhuma visita.
Evitar as causas de resfriamento e de necessidade tanto para
os sãos, como para os doentes e os convalescentes. As
pessoas idosas devem applicar-se com mais rigor ainda todos
esses cuidados. (...)"
O Paiz, 23 de outubro de 1918

"Emquanto o governo faz annunciar que a epidemia declina, o


povo soffre as aperturas deste afflictissimo momento - tudo
fechado! Não ha pão, não ha remedio, não existem os generos
de primeira necessidade. Os donos dos armazens, apavorados
com a tranquibernia do Comissariado entendem que o melhor
é ter os seus estabelecimentos fechados.
E quaes foram até agora as providencias do governo em face
da situação? Mandou, por exemplo, fabricar pão?
Providenciou sobre a remessa dos generos para esta Capital?
Resolveu o problema do barateamento da vida? Organizou o
serviço de transporte? Tomou medidas preventivas sobre a
entrada de navios empestados, em nosso porto? Cuidou da
reorganização dessa custosa e inutil repartição de Saude
Publica, onde se gasta milhares de contos? Agiu com energia
no sentido de forçar a Santa Casa a ser uma instituição que
lhe dá o nome?
Nada. O governo, ferozmente atacado da mania dos cartazes,
continua dando conselhos ao povo sem ouvir o que lhe pede
esse mesmo sacrificado povo, já faminto, sem dinheiro,
supplicando trabalho e pão.
Abusando da inercia do governo e do desmantelo do
Commisariado, o commercio não cumpre a sua tabella e
recusa-se a receber os generos do interior porque elles são
vendidos pelos productores por preços muito mais elevados
que os da tabella governamental.
Tivemos hontem o ultimo dia feriado. Vamos vêr o que faz
hoje o governo. (...)"
A Razão, 23 de outubro de 1918

" (...) O mal da fome mais e mais se accentua na metropole


brazileira, parecendo incrivel como não tivesse ainda
despertado o governo, levando-o a tomar providencias
energicas, no sentido de ser evitada uma situação que o povo
não poderá admittir.
Avolumam-se os protestos nas tabernas contra a falta de
diversos generos alimenticios, desculpando-se os taverneiros,
deante do clamor popular, com a justificativa de que esses
mesmos generos já não são encontrados nos grandes
armazens atacadistas.
Estes, por seu turno, argumentam com a situação dos
mercados do interior, procurando demonstrar que os grandes
productores não se sujeitam ao arbitrio dos novos preços,
animando-se com a idéa de que poderão fazer bons negocios
com numeroso grupo de agentes commerciaes estrangeiros,
que pretendem conseguir do governo brazileiro permissão
para exportação dos generos alimenticios para a Europa, o
que, de resto, já têm conseguido, pela intervenção delicada de
autoridades diplomaticas. A situação dos nossos mercados
complica-se imprevistamente. (...)"
A Razão, 1 de novembro de 1918

"(...) Ha tres semanas que a mortandade no Rio de Janeiro


vem orçando por aquella terrivel cifra, cuja somma dá um
total aproximado de 12.000 obitos, o sufficiente para tornar
bem negro o peso de consciência dos culpados de tamanha
desgraça publica.
Pelas estatisticas officialmente auctorizadas hontem o numero
de mortos é superior a 10.000. Não é temerario adduzir um
pouco esse algarismo para ter o obituario real e effectivo,
supprimindo o que se occulta e nega. Temos pois perto de
12.000 casos fataes sobre os 600.000 accommettidos da peste
reinante ou "simples grippe" como dogmatisa a pretensão da
medicina official. (...)
A A Razão visitou hontem todos os cemiterios do Rio de
Janeiro, para obter uma estatistica exacta e completa de todo
o obituario desde o dia 12 a 31 de outubro, primeira phase da
grande calamidade que nos assola. damos abaixo o quadro
geral do obituario e a seguir o resultado da nossa reportagem:
Caju ... 6.312, S. João Baptista ... 1.587, Penitencia ... 49,
Carmo ... 75, Catumby ... 30, Inglezes ... 7, Paquetá ...6 , Ilha
do Governador ... 54, Campo Grande ... 132, Inhauma ...
1.793, Irajá ... 579, Santa Cruz ... 143, Realengo ... 382,
Jacarépaguá ... 224 - Total: ... 11. 373 (...)"
A Razão, 2 de novembro de 1918

"A noite foi chuvosa, fria e triste. E o dia que amanhecera


com boas disposições, mostrando de vez em quando uma
nesga azul do céo, enfarruscou-se á tarde e ameaçou uma
nova noite chuvosa, fria e triste. Decididamente o máo tempo
alliou-se á peste, para affligir e flagellar o Rio de Janeiro.
As noticias officiaes continuam optimistas. A epidemia
declina... Mas, quando e como acabará esse declinio? Que
novas victimas a voracidade do flagello ainda fará? Até
quando durará essa situação de incerteza e angustias?
Dia de finados! Nunca o dia dos mortos foi tão propriamente
um dia de mortos como o de hoje! Com que tacto o Destino
aggregou a data do luto official a essa série de dias
angustiosos, de luto intenso e geral, que vem vivendo a
população carioca. As bandeiras dos edificios estão a meio-
páo... Não parece que o Destino quiz forçar o governo a
participar do luto do povo? (...)"
A Noite, 2 de novembro de 1918

"O dia, que amanhecera cheio de um sol claro e tonificante,


encheuse, dentro em pouco, de incertezas, chegando a chover
sobre a cidade. Ora nebulosas e sombrias, ora claras e alegres,
numa inconstancia permanente, as horas passaram, todavia,
sem que o movimento da nossa capital diminuisse, ou
pairasse nos rostos qualquer sombra de maiores e novos
receios. Si é certo que a epidemia ainda continúa, embora em
declinio, pois é de notar que em sete delegacias de saude, nas
ultimas vinte e quatro horas, apenas foi registrado um unico
caso novo - não é menos certo, porém, que a cidade já entrou
definitivamente na sua vida normal, ha tanto desejada."
A Noite, 4 de novembro de 1918

"Parece que estamos em pleno verão. Finalmente! Ora até que


afinal o verão foi sincera e unanimemente desejado. E talvez
por isso tenha custado tanto a chegar. E terá chegado mesmo?
Não teremos novas surprezas? Deus permitta que não... Mas,
com verão ou sem verão, a epidemia vae passando ao rol dos
factos consumados. Ella hoje já é apenas um assumpto de
conversas... O medo e as angustias já passaram, a não ser para
quem ainda tem um ente querido de cama. O aspecto da
cidade já é quasi completamente normal."
A Noite, 7 de novembro de 1918

AS MANCHETES:
A Influenza Hespanhola - Registra-se O Primeiro Caso Fatal
Da Nossa Capital
O Sr. Carlos Seidl Está Abusando Criminosamente Da
Paciencia Da População
A Saude Do Porto É Um Formidavel "Blague". ( Rio Jornal )
A Cidade Invadida Pela Epidemia Da Gripe Por Culpa Da
Incompetencia Do Director Da Saude Publica - Uma
Reportagem Completa Do Rio Jornal
( Rio Jornal )
O Rio Assolado Pela Epidemia - Urge A Intervenção Dos
Poderes Publicos Para Combater O Mal - As Pharmacias
Começam A Fechar - Faltam Os Medicamentos - As
Explorações - A Cidade Com O Seu Aspecto Inteiramente
Alterado - As Casas De Commercio E De Diversões
Inteiramente Ás Moscas
( A Rua )
O Governo Diz Que A Peste Declina, Mas O Povo Vae
Morrendo Por Falta De Recursos ( A Razão )
O Rio Convalesce Ameaçado Pela Devastação Da Fome - O
Aspecto Desolador Do Nosso Mercado - Symptomas
Alarmantes Da Fome - E O Commissariado Dorme... ( A
Razão )
A Epidemia Entrou Na Sua Fase De Declinio - 11.373
Pessoas Morrem Em Toda A Capital Federal, De 12 A 31 De
Outubro ( A Razão )
Nunca O Dia Dos Mortos Foi Tão Propriamente Um Dia De
Mortos Como O De Hoje! ( A Noite )
Um Unico Caso Novo ( A Noite )
A Epidemia Vae Passando Ao Rol Dos Factos Consumados
( A Noite )
23) Final da Primeira Guerra
Mundial (1918)
"É difícil descrever, em exatas palavras, o que foram as
últimas horas da tarde de hoje na Avenida. O entusiasmo do
povo aglomerado na nossa principal artéria não tinha limites.
De momentos a momentos, à aparição de um símbolo das
nações aliadas, vivas eram ouvidos, acompanhados de salva
de palmas, de aclamações ruidosas. Também os oficiais e
soldados estrangeiros, atualmente no Rio, eram
constantemente alvo do entusiasmo popular. As bandas de
música do exército, da Marinha e da Polícia, que percorriam a
Avenida, eram solicitadas de instante a instante, a execução
dos hinos aliados, a cuja terminação o povo prorompia em
aclamações delirantes. pouco depois das 5 horas da tarde,
marchando garborosamente, passou pela Avenida o Batalhão
Naval, que foi recebido por entre vivas da multidão, não
sendo esquecido o nome do Almirante Alexandrino de
Alencar(...) E como esse, muitos episódios confortadores
ocorreram, à tarde na Avenida, numa demonstração eloqüente
do sincero entusiasmo que a todos domina nesta hora
histórica. (...)"
A Noite, 12 de novembro de 1914

"Ainda ontem a cidade apresentava o mesmo aspecto festivo


da véspera, tinha a mesma vibração de entusiasmo pela vitória
sem par dos exércitos aliados, cheia de uma multidão ruidosa,
expansiva e delirante de júbilo, dando vivas às nações
vencedoras e entoando canções patrióticas. O comércio,
fechado em grande parte, desde pela manhã, não concorreu
para diminuir, como acontece aos domingos e feriados, o
movimento das ruas. Pelo contrário, veio aumentá-la,
facultando liberdade aos seus auxiliares para tomarem parte
nas manifestações populares em regosijo da paz, que
desponta, afinal, depois de quatro anos da mais sangrenta e
terrível carnificina. (...)
Na Avenida Rio Branco e em todas as ruas principais era
extraordinário o movimento. De instante a instante passavam
automóveis embandeirados, conduzindo famílias e grupos de
populares, uns após outros, surgiam de toda parte, cantando
alegremente. (...)
Às 4 horas da tarde, quando a nossa avenida estava no auge
do entusiasmo patriótico, apareceram, vindos do lado da
Praça Mauá, uns nove artilheiros navais franceses,
empunhando bandeiras aliadas e entoando a Marselheza. Uns
rapazes brasileiros, que na ocasião passavam, correram a
abraçá-los, beijando-os no rosto e cobrindo-os de confeti. A
multidão acompanhou os nossos patrícios nessa manifestação
de estima aos bravos marinheiros da gloriosa França. (...)"
A Razão, 13 de novembro de 1918

"Entusiasmados com os festejos comemorativos do fim da


guerra, vários populares, formando resumido grupo, chefiado
pelo Sr. Pádua Machado, alugaram um automóvel, no Catete,
e mandaram tocar para a cidade, a participar do corso. Ia o
auto em vertiginosa corrida e, alegres, os rapazes erguiam
vivas aos aliados, erguendo bandeiras vitoriosas nesse
prolongado conflito. Ao chegar o auto à célebre "curva da
morte", devido à grande velocidade, emborcou, atirando à rua
os passageiros, que ficaram ligeiramente feridos e foram
pensados pela Assistência. O "chauffeur", que não sofreu
nenhum ferimento, fugiu, embora não lhe coubesse culpa
alguma no desastre, que foi todo casual, segundo mesmo
declararam os feridos, às autoridades do 6o distrito, presentes
ao local do desastre."
O Paiz, 13 de novembro de 1918

"Ainda ontem a população caioca exultou pela celebração do


armistício, entregando-se a ruidosas expansões. Continuou a
cidade empavezada e as ruas mantiveram excepcional
movimento de peões e automóveis. À tarde, o aspecto da
Avenida, principalmente, era dos mais brilhantes, guardando
ainda o ar de festa que desde sábado a alegra
extraordinariamente."
O Paiz, 14 de novembro de 1918

"A cidade despertou ontem sob o mais vivo entusiasmo. Os


boatos de fuzilamento do ex-Kronprinz e a ratificação da fuga
de Guilherme II vieram sacudir a alma do povo, que se
movimentou, durante todo o dia, pelas principais ruas da
cidade, improvizando cordões e cortejos, a fim de, em
verdadeiro delírio, saudar as nações aliadas. À 1 hora da
tarde, a Avenida Rio Branco já estava completamente cheia.
Às 6 horas, ninguém podia passar por ali. Dir-se-ia estar se
assistindo a uma das nossas maiores festas populares. Com
efeito, ao passo que os cordões de estudantes, empregados no
comércio e outras classes, desfilando pelos "trotoirs" vivavam
as nações vitoriosas, uma multidão de automóveis
garridamente enfileirados, percorria a Avenida, conduzindo
famílias que trajavam as cores dos países aliados, e, então, de
todos os lados sairam vivas ao Brasil, à frança, à Inglaterra,
aos Estados Unidos, à Bélgica e aos demais povos que
acabam de subjugar o orgulho alemão. (...)"
O Imparcial, 13 de novembro de 1918

"A cidade continuou hoje com o aspecto deslumbrante de


pleno delírio de que foi tomada hontem, às primeiras horas da
noite, após a iniciativa brilhante das colônias estrangeiras
entre nós domiciliadas de festivamente comemorarem o mais
memorável dos memoráveis acontecimentos de nosso tempo:
a derrocada do militarismo prussiano. A nossa população fria,
como quase sempre, compreendeu por fim que deveria se
associar a tão justas e naturais manifestações de regosijo. Um
intenso frêmito de entusiasmo sacudiu-lhe os nervos
entorpecidos e despertou a consciência do momento. Hoje,
como ontem à noite, o delírio era pleno. Em toda parte, em
todos os semblantes, muito embora a triste quadra que
acabamos de atravessar, a alegria era geral pela volta do
império bemdito da Paz."
Rio Jornal, 12 de novembro de 1918

AS MANCHETES:
A Vitória Da Civilisação - O Povo Continua A Vibrar De
Entusiasmo Percorrendo As Ruas Da Cidade (O Imparcial)
Em Plena Folia (O Paiz)
As Festas Da Paz Empolgam E Levantam O Povo Brasileiro
(A Razão)
24) Revolta dos Anarquistas
(1918)
"Começou ontem o movimento dos operários a favor da greve
geral. A polícia interveio, com o objetivo de impedir que
algumas fábricas tivessem seu movimento paralisado. Logo
depois, eram espalhados boatos alarmantes de que "os
operários anarquistas planejavam uma revolução, estando,
para isso, fortemente municiados". Em realidade, pelo que
pudemos verificar, os operários não têm pretensões políticas;
disputam tão somente a garantia de um direito, que é
assegurado aos operários de todas as partes do mundo e que
aqui, até agora, lhes tem sido negado. (...)
O que querem os operários é suavisar suas condições de vida;
é a regulamentação das horas de trabalho; é uma lei sobre os
acidentes; é a proteção às crianças e mulheres; é, enfim,
fiscalizar como compete a todos os cidadãos a ação do poder
público, submetendo ao seu exame as soluções desses
problemas, entre nós, tão retardado. Este movimento dos
operários era conhecido e esperado. Infelizmente, porém, não
se revestiu de uma caráter inteiramente pacífico. Houve sérias
consequências a lamentar, talvez, devido à ação das
autoridades policiais, que se precipitaram em sua ação,
efetuando prisões a torto e a direito, utilisando da maior
violência, trancafiando no xadrez todo aquele que julga
responsável pela situação, sem atender à sua condição social.
Foi o que se deu ontem com o professor Oiticica, que antes de
ser transferido para a Brigada Policial, esteve encarcerado nas
enxovias do palácio da rua da Relação. (...)
De sorte que o movimento operário anunciado por todos os
jornais, em favor da greve geral, assim de um momento para
outro, assumiu o mais grave aspecto. (...)"
O Imparcial, 19 de novembro de 1918

"Os acontecimentos que se passaram ontem nesta cidade


devem ter trazido a todas as classes conservadoras da
população a convicção de que não é mais possível transigir
com os agitadores, que procuram arrastar o proletariado
brasileiro a uma perigosa aventura, para repetir no nosso país
as cenas de anarquia que desorganizaram a Russia e
eliminaram, politicamente, do convivio das nações o antigo
império moscovita. Quando o movimento revolucionário vem
para as ruas lançar bombas e tentar assaltar os depósitos de
material bélico, não é mais tempo de discutir reivindicações e
de argumentar sobre teorias sociológicas. A hora é de ação, de
açào energica, de ação inflexível, sem hesitações e sem
temores, para defender a ordem pública, para proteger a
propriedade particular, para assegurar a inviolabilidade dos
lares, ameaçados pelo saque e pela violência da mashorca.
(...)"
"Era já há dias assunto cogitado pela polícia o esperado
movimento operário, que, segundo os boatos que corriam,
teria as mais graves consequências. Sabedora desse
movimento hostil, a que não faltaria o elemento anarquista, a
polícia começou a desenvolver a sua atividade, no sentido de
reprimir o movimento logo à primeira manifestação de
alteração da ordem pública. Todo esse cuidado, entretanto,
não só da polícia como das corporações armadas, apesár da
rigorosa prontidão em que há dias se achavam os quarteis,
não evitou a violência do movimento operário que ontem, à
tarde, se fez sentir com tiroteios de revólveres e bombas de
dinamite. Atacados no primeiro momento, parece terem
fracassado as intenções malevolas dos grevistas, mas, durante
as duas horas, mais ou menos, em que reinou a desordem,
houve tempo bastante para trazer um grande pânico à
população, principalmente dos bairros onde a violência do
movimento mais se fez sentir. (...)"
O Paiz, 19 de novembro de 1918

"Declararam-se ontem em greve, precisamente, às 3 horas da


tarde, os operários das fábricas de tecidos Carioca e
Corcovado, situadas no bairro da Gávea. O número de
operários que ali trabalham é aproximadamente de 4000. Os
grevistas se mantiveram em atitude pacífica. A polícia
imediatamente mandou fortes contingentes de força para
guardar as fábricas e as suas imediações transformando o belo
e pacato bairro proletário numa verdadeira praça de guerra.
(...)
Como é sabido, desde julho do ano próximo passado, os
operários tecelões conseguiram, à custa de grandes
sacrifícios, a semana de 56 horas, que representavam 6 dias
de serviço. Os industriais sempre procuraram, por todos os
meios, apesár dos acordos que faziam hipocritamente com a
União, arrancar essa concessão por eles próprios oferecidos
aos seus operários. No último acordo realizado em fins de
agosto último, sorrateiramente os industriais quizeram abolir
esse horário, querendo estabelecer o pagamento por horas e
não pelos 6 dias da semana, conforme estava fixado. A
comissão da União que fez parte do acordo por delegação dos
operários não aceitou tal sugestão. Os industriais continuam a
persistir no seu intento, apesár de já estar aprovado o acordo
aludido. (...)
É, pois, justificável essa greve, que não representa senão um
movimento de instinto de conservação, porquanto, com o
novo horário imposto pelos industriais, os operários
trabalhavam mais ou menos 28 horas por semana,
equivalentes a 3 dias completos, fazendo menos da metade
dos salários que antes percebiam.
Com a situação deplorável a que foram reduzidos pela
epidemia e pelo espectro da fome que paira sobre os seus
lares, só a greve geral como único recurso, poderia ser o
protesto desses trinta mil trabalhadores espoliados."
A Razão, 19 de novembro de 1918

"Não há mais dúvida que a greve, o movimento preparado


pelos agitadores, está por pouco, esperando-se a todo o
momento o estourar do petardo. A polícia cometendo agora
verdadeiras violências, vem, mesmo assim, tomando várias
providências. Desde muitos dias, como se sabe, está a polícia
de rigorosa prontidão, pernoitando constantemente, no seu
gabinete o respectivo chefe. Hoje, à tarde, por determinação
desta mesma autoridade, foram presos vários individuos
apontados como agitadores. E esses, cujo número atinge a
cerca de 10, estão recolhidos, incomunicáveis, ao Corpo de
Segurança. (...)
Às 3 horas da tarde todas as fábricas paralisaram os serviços,
tendo os operários abandonado o trabalho."
A Rua, 18 de novembro de 1918

"Continua reforçada a guarda do palacio do Catete por uma


companhia de guerra do 56o de caçadores, sob o comando do
capitão Gregório da Fonseca. (...)
É uma medida cujos resultados têm sido os melhores
possíveis, esta tomada hoje pelas nossas autoridades. É o caso
que, dos trens procedentes de Bangu e adjacências, em
Deodoro, são os passageiros convenientemente revistados por
soldados do exército que ali estão sob odem imediata de um
oficial. Até à 1 hora da tarde, muitas eram as armas e outros
apetrechos suspeitos apreendidos naquela estação. (...)
De regresso paraa estação da Carioca, da estação de Neves, já
madrugada, vinha o bonde no 21, conduzido pelo motorneiro
Antonio da Silva, quando um forte estampido da explosão de
uma bomba se fez ouvir sob as rodas. O veículo passava
justamente em frente ao poste no 148 e com o choque veio até
a frente do 146, já com o assoalho e o teto furados,
desconjuntado, sendo necessário o emprego de grande perícia
da parte do motorneiro, para que o carro não tombasse.
Outra bomba, porém, estava colocada nas proximidades deste
último poste, que fica quase à esquina da rua Silva Manuel e
as rodas do lado contrário do veículo tocaram-na também,
explodindo o pétardo, com grande fragor. Mãos terroristas
haviam-na colocado alí para que explodissem à passagem dos
elétricos. parado, enfim, o veículo, verificaram os que nele
estavam que a linha estava minada de aparelhos explosivos.
Do lado contrário as rodas quase tocavam um novo pétardo e
mais adiante, na linha contrária, em frente à casa no 54, viam-
se colocadas mais duas bombas. (...)
A polícia, num cálculo ao que parece errado, forneceu à
imprensa a nota de que se acham paralisados apenas 15
fábricas, estando em greve cerca de 15.190 operários."
A Rua, 19 de novembro de 1918

"Pelo movimento observado de hoje pela manhã, em toda a


capital está já extinta a agitação que ontem irrompeu em
vários pontos da cidade. Ninguém mais ignora pelas notícias
dos jornais da manhã de hoje, as ocorrências havidas. Assim
só temos que registrar a mais, o aparecimento de bombas de
dinamite em vários pontos e ameaças constantes de grevistas
a fábricas cujos operários estão em número reduzido
trabalhando. No mais, boatos, com o intuito de perturbar a
ordem e manter acesa a agitação, que neste momento não
serve aos interesses operários e perturba a normalidade
governamente, preparada, porém, para manter a tranqüilidade
pública. A opinião pública, acompanha sobressaltada a
imprevista e injustificável agitação e espera que tanto o
patriotismo do proletariado, como as providências do governo
concorram para que a vida nacional volte o mais breve
possível à normalidade."
Rio Jornal, 19 de novembro de 1918

"Terminou a bernarda à dinamite que deu ao povo uma


impressão pouco favorável do modo por que os anarquistas
querem realizar a "nova sociedade". O governo, que agora
reprimiu a desordem, deve saber quais são as justas
reivindicações operárias, para apoiá-las. (...)
A cidade voltou ao seu aspecto normal, estando
completamente dominado o movimento que quizeram fazer
em o operariado. Por precaução, a polícia mantém ainda o
policiamento reforçado, não permitindo reuniões na praça
pública, nem nas associações operárias. Algumas fábricas já
começaram a funcionar, continuando em outras a greve
pacífica. (...)
Um perverso, de idéias anárquicas, pela manhã de hoje
arremeçou uma bomba de dinamite contra um edifício da Rua
Cândido Benicio, em Jacarepaguá, onde funciona um
orfanato. O estrondo foi enorme, alarmando todo o bairro, não
fazendo, felizmente, nenhuma vítima. Preso o perverso
individuo, foi levado à delegacia do 24o distrito, onde deu o
nome de Rodolfo Pereira Leal. É ele um vagabundo
conhecido na zona."
Rio Jornal, 20 de novembro de 1918

"A polícia do 23o distrito apreendeu hoje, no morro da


Carolina, na Vila Militar, duas bombas pequenas de dinamite,
que se achavam colocadas sob um montão de capim sapê.
Essas duas bombas foram levadas para a delegacia, de onde o
sr. delegado fê-las remeter para a Central de Polícia. O
policiamento de todo o subúrbio continua com o mesmo
número de praças, conforme tem sido feito, apesár do
movimento grevista encontrar-se mais ou menos
tranqüilizado."
Rio Jornal, 21 de novembro de 1918

AS MANCHETES
Um Sussuro De Mashorca Politiqueira Explora A Greve
Geral Dos Operários Tecelões - Na Iminência De Uma Greve
Geral - Rebentou, Ontem, A Parede De Todos Os Tecelões
Do Rio E De Niterói - Setenta Mil Operários Em Greve - O
Movimento Paredista Alastra-se À Medida Que A Polícia
Estabelece E Espalha O Terror - A Greve Dos Operários
Prossegue Intensa, A Despeito Da Barbariedade Alemã Da
Polícia. (A Razão)
Os Operários Das Fábricas De Tecidos Declaram-se Em
Greve - Uma Delegacia Atacada Pelos Grevistas - Grande
Conflito Na Fábrica Confiança - Um Delegado Ferido E Um
Grevista Morto - O Litoral E Outros Pontos Da Cidade
Policiadas Pelo Exército (O Imparcial)
Estaremos Sobre Um Vulcão? Procura-se Dar À Greve Dos
Tecelões Um Caráter Político Muito Sério - A Polícia Age
Nas Trevas - Que Haverá De Verdade? - Estará Sufocado O
Movimento? - Gorou O Movimento Operário? Tudo Em Paz?
(A Rua)
Bernarda Ou Greve? O Aspecto Da Cidade É De Relativa
Calma. As Fábricas Continuam Paralisadas, Estando Algumas
Delas Ameaçadas Pelos Grevistas. Bombas De Dinamite
Encontradas Por Toda A Parte (Rio Jornal)
25) Olavo Bilac (1918)
"A cidade despertou sob a emoção de uma notícia triste:
Olavo Bilac, um dos seus filhos mais dilectos, poeta
soberano, artista impecável, acabava de falecer às 5.30 da
manhã. Uma pneumoccocia impenitente, agravada pelos
maléficos da miocardite crônica, de que sofria o autor de
elevado número de obras scintilantes, fazia abater o o
organismo do insigne patrício. Diante do esquife que encerra
os despojos de Olavo Bilac, sob a tristeza que suscita a sua
morte, avulta-se o apreço ao príncipe da poesia brasileira, por
ele elevada e dignificada em surtos de aprimorado gênio
artístico.
Ourives do verso, são jóias de subido valor os "Panoplias", a
"Via Láctea", a "Alma Inquirta", as "Sacras de Fogo", as
"Viagens", o "Caçador de Esmeraldas". Precursor da Escola
Parnasiana no Brasil, teve como Leconte de Lisle e Hereclia,
o brilho, a cor, o rítmo, a suprema beleza, a intuição do
maravilhoso Tivesse nascido em França e escrito em francês e
o seu nome seria universal. Mas, nascido no Brasil,
expressando-se em português, idioma que ele cultuava com
requintes não comuns, nem assim amesquinhou-se o seu
prestígio. Dentre os quatro maiores poetas que introduziram o
parnasianismo em nosso mundo literário, é o mais sugestivo,
o mais brilhante, o mais impecável. (...)
A noite de ontem para hoje, passou-se mal. A morte
avizinhava-se do poeta. Foram baldados todos os recursos
médicos adotados com proficiência pelo Dr. Henrique Roxo.
Pela madrugada, instantes antes de morrer, o artista de muitos
versos de ouro, levantou-se do leito. Suas pupilas brilhavam.
- Dei-me café; eu quero escrever! - exclamou com voz firme,
mas um tanto fraca. Às 5,30 da manhã, em companhia da sua
família, isto é, de Alexandre Guimarães, seu cunhado, de sua
irmã, de Corrêa Guimarães e de seus sobrinhos Ernani e
mademoiselle Corina, bem como de vários amigos, cessou o
último alento do maior poeta patrício.
Poeta dos mais ardentes, Olavo Bilac celebrava com filosofia
a volúpia da vida. Morrer num dia cheio de sol, em terra moça
regorgitante de flores, tendo ao seu lado uma mulher formosa,
pareceu-lhe o horror da maior tortura espiritual (...)"
A Rua, 28 de dezembro de 1918

"Morreu Olavo Bilac, o príncipe dos poetas brasileiros! A


notícia assim dada desdobra logo à imaginação de quantos a
lê os painéis de uma vida toda voltada ao culto da Arte, à
Beleza e aos ardores de um patriotismo ardente e fecundo.
Não há, entre os poetas contemporâneos patrícios, nenhum
que tenha logrado o renome e a popularidade de Olavo Bilac.
Nascido em 1865, o seu talento nasceu precisamente num
período de transformações literárias, filosóficas e políticas,
tendo Olavo Bilac conquistado a situação de maior relevo.
Seus primeiros versos, que constituem a parte inicial das
"Poesias", produziram sucesso excepcional (...)
A sua poesia, aproveitando a plástica, proclamada pela escola,
não perdeu a vivacidade, a exuberância, o fervor que
constituem a eminência essência dos nossos pendores
artísticos. "Sarças de Jogo" são um formoso exemplo. O seu
"Julgamento de Phynéa" é uma obra prima, nessa feição. O
aparecimento dessas poesias marcou desde logo rumo novo
nas letras nacionais. Por aqueles tempos, obstinadamente
românticos, os escitores e poetas novos guardavam ainda a
maneira boêmia, aprendida nos romances de Murger. O grupo
era numeroso. Fazia-se Arte no fundo dos botequins e
cervejarias. Coelho Netto, Patrocínio, Aluisio Azevedo, Raul
Pompéia, Olavo Bilac, Guimarães Passos, Luiz Murat, Arthur
Azevedo, Valentim Magalhães e outros, compunham jornais e
revistas boemiando. (...)
Surgira a questão formidável da Abolição, empolgando os
espíritos. Não havia hesitar e Bilac, com seus companheiros,
foi colhido no tumulto libertário. (...) Republicano por
temperamento, Olavo Bilac via na proclamação de 15 de
novembro a realidade num sonho seu. Daí empenhar-se nas
lutas consequentes da Revolta de 6 de Setembro, fugindo -
sob ameaça de prisão, ou ainda pior - para Minas, de onde
mandava logo depois as lindas crônicas que formam a melhor
parte do seu livro "Crônicas e Novelas" e onde colheu o tema
para esse admirável, esse legítimo poema nacional "O
Caçador de Esmeraldas". (...)
Cronista, Olavo Bilac deu à "Notícia" o brilho inexcedível da
sua colaboração durante anos, escrevendo diariamente "O
Registro". Ultimamente afastara-se de imprensa. Estavam
errados os que acreditavam que a atividade maravilhosa de
Olavo Bilac calara-se. No silêncio do seu gabinete, o poeta
admirável comounha sem tréguas. (...) Recordando aqui, nas
atropeladas palavras que a notícia da morte de Olavo Bilac
nos permite escrever, a personalidade excepcional desse
grande poeta, queremos deixar nas páginas do jornal que ele
tanto ilustrou com o ouro admirável de seu talento, as provas
legítimas da nossa dor e da nossa grande e irreparável
saudade. (...)"
A Notícia, 28 de dezembro de 1918
"Aquela célebre frase de "vão-se os deuses!" o destino quiz
contrapor, na maior das crueldades, a de "vão-se os poetas!".
Hontem, foi Rostand que, com a sua morte, enlutou toda a
França, que tão gloriosamente cantara; hoje foi Olavo Bilac,
que, no seu leito mortuário, enche de sombras os céus da
literatura brasileira, onde, com os fulgores do seu talento
privilegiado, figurava como astro de primeira grandeza,
intangível e inconfundível.
Ourives da forma, esmerilhador de idéias, lapidador de
conceitos, era a sua cerebração uma das mais raras que a
poesia contemporânea nos podia oferecer. Os seus versos
correm de boca em boca, em língua portuguesa e em várias
traduções, e os sonetos que o seu estro brilhante soube
transmitir à posteridade, envoltos em uma aureola de
incomparável esplendor e perfeição, serão o eterno
movimento erguido à sua memória, levantado por suas
próprias mãos, para seu maior renome e orgulho das letras
patrias. (...)
Foi realmente fecunda a vida do glorioso poeta. No verso
como na prosa, na tribuna das conferências como nas colunas
dos jornais e ainda na fiscalização do ensino - em tudo foi
uma existência brilhante e encantadora. (...) Bilac, sabe-se,
trabalhava há dezesseis anos, em um dicionário analógico, do
qual, dizia o poeta, seria a sua grande obra final de poeta. (...)
Estava resolvido hoje, pela manhã, que a Academia de Letras
faria o enterro. No entanto falava-se que também a Liga de
Defesa Nacional tencionava oferecer-se para tal, como uma
homenagem a quem despertou o coração da mocidade
brasileira em S. Paulo, depois pronunciando discursos de pura
fé patriótica e entranhado amor ao Brasil."
A Noite, 28 de dezembro de 1918
"Embora esperada, pois de há muito se conhecia a extrema
gravidade da moléstia do grande poeta, a morte de Olavo
Bilac, ocorrida na manhã de hoje, causou uma impressão
dolorosíssima. Não foram os meios propriamente literários e
jornalísticos aqueles em que a triste nova repercutiu de
maneira mais consternadora. Toda a cidade sentiu,
sinceramente, o desaparecimento do grande poeta, que era
orgulho de sua geração e que soubera incarnar, na última
etapa de sua vida, todo o admirável surto de renascimento
cívico que se operou no Brasil. (...) Portanto, Olavo Bilac não
foi apenas o poeta incomparável, cuja obra aí fica, como uma
das mais ricas, e das mais belas da nossa literatura. Foi
também, em um momento decisivo da vida nacional, o
intérprete eloquentíssimo das aspirações brasileiras. A sua
conferência na Academia de Direito de S. Paulo, primeira de
uma série em prol da difusão do serviço militar, foi um hino
entusiástico à grandeza do Brasil. Bilac pregou então a união
de todos os moços sob o ideal magnífico da Pátria renovada e
forte. E o seu luminoso apostolado não foi em pura perda. O
seu exemplo frutificou. Em pouco tempo, a semente que o seu
gênio semeou se desdobrava. (...)
Olavo Bilac guardava o leito há muitos dias, tendo, agora,
seus antigos padecimentos agravados, por um ataque de
"gripe", vindo, em consequência, falecer, depois de esgotados
todos os recursos da ciência, miraculosamente procurada pelo
seu médico assistente, Dr. Henrique Roxo, de quem o poeta
era grande amigo.(...)
Poeta por vocação, trovador por índole, o morto ilustre deixa
precioso acervo de poesia, das melhores que existem em
nossa língua. Pouco produziu, mas tudo quanto saiu da sua
pena teve, desde logo, o caráter de perpetuidade. (...) Além de
poeta-mestre, Bilac era também prosador elegante e,
sobretudo, conferencista sem muitos competidores. (...) Suas
obras literárias são: "Poesias Infantis e Poesias"; "Crítica e
Fantasia"; "Conferências Literárias". Em colaboração:
"Cantos Patrios", "Livros de Leitura", "Teatro Infantil", "A
Pátria Brasileira", "Tratado de Versificação", "Livro de
Composições", "Através do Brazil". (...) Olavo Bilac
pertencia a várias instituições e academias. Era membro
fundador da Academia Brasileira. Era também inspetor
escolar aposentado."
A Tribuna, 28 de dezembro de 1918

"O passamento de Olavo Bilac registrado às primeiras horas


do dia de ontem era previsto por alguns dos seus amigos
íntimos. Moléstia impenitente vinha minando o seu
organismo, asuumindo nestes últimos dias uma feição de
extrema gravidade. Lúcido de espírito, calmamente esperou a
morte redentora e, antes do derradeiro alento físico, ainda se
via deslumbrado pelas miragens de algum sonho de arte, que
ele desejou exteriorizar em versos. Pediu, então, café e
pretendeu escrever. (...) A obra de Bilac, é sem dúvida,
comparativamente à dos grandes poetas brasileiros, uma das
mais brilhantes. Sua primeira série de "Poesias", apesár das
influências flagrantes do parnasianos franceses,
principalmente Theophile Gauthier, François Copée, Heredia
Baudelaire, apresenta-nos páginas verdadeiramente
fulgurantes, como as do Ïn Extremis", "Inania Verba", as de
muitos sonetos das "Viagens" e do "Caçador de Esmeraldas",
poemeto verdadeiramente modelar, pela harmonisação
estética da Forma e do Fundo. Mas de todos os parnasianos
brasileiros, foi Olavo Bilac o que menos seguiu os
preconceitos da impossibilidade característica do espírito da
escola decaída. O seu verso, pessoal pelo estilo fundia o
fundo e a forma numa liga perfeita de idéias fortes,
esplendidamente exteriorizadas. A "Tarde", volume de
sonetos é, porém, o mais expressivo da personalidade literária
do poeta brasileiro. Em sua última obra revela-se Bilac liberto
dos preceitos escolásticos, dentro do seu próprio sonho e para
ele vivendo. É certo, infelizmente, que o vício da factura do
soneto privou-o de expandir o talento a mais vastos surtos.
Mas o artista revela-se columnal num país que ainda não
produziu um gênio primordial a Victor Hugo... (...) A sua
campanha em pról do levantamento cívico da nossa
nacionalidade foi uma das mais brilhantes e mais dignas. Está
na sua vida social na razão direta dos seus sonetos com laivos
de espiritualidade e pureza. (...)"
A Razão, 29 de dezembro de 1918

AS MANCHETES:
Morreu Bilac - "Dêem-me Café! Quero Escrever!" - Foi A
Sua Última Frase - A Resurreção Cívica Do Brasil E O Seu
Otimismo (A Rua)
Olavo Bilac Morreu - Já Raia A Madrugada; Dêm-me Café,
Vou Escrever! - As Últimas Palavras Do Príncipe Dos Poetas
Brasileiros (A Noite)
O Passamento De Olavo Bilac - O Patriota, Seu Momento
Extremo E A Sua Obra (A Razão)
26) Campeonato Sulamericano
de 1919
"Antes do campeonato, o football aqui já era uma doença:
agora é uma grande epidemia, a coqueluche da cidade, de que
ninguém escapa."
A Rua, 7 de maio de 1919

"No "stadium", como estava anunciado, realizou-se ontem, o


"training" de apuro dos "scratchmen" brasileiros. (...) Os
chilenos deram esta manhã, na rua Campos Salles, o seu
"training" de apronto para o jogo de domingo. Os uruguaios
treinaram, ontem, no campo do Botafogo. (...) Os argentinos
estiveram ontem, à tarde, na rua Payssandu, praticando
"training" individual."
A Rua, 8 de maio de 1919

"Iniciou-se hoje, às 15 ½ horas, sob os melhores auspícios, o


sensacional Terceiro Campeonato Sul-Americano de Football.
Fazendo coincidir com esta temporada de "matches"
internacionais, a festa de hoje teve ainda o seu brilho
aumentado pela inauguração do stadium do Fluminense
Football Club, o glorioso campeão tricolor brasileiro. A
cerimônia de inauguração do stadium consistiu juntamente na
inauguração do "match" internacional, para o qual foi
construído o soberbo campo."
Rio Jornal, 11 de maio de 1919
"Sob os olhares anciosos de uma multidão superior a 40.000
pessoas realizou-se ontem no stadium do Fluminense, o 1o
match do campeonato sul-americano. Esse match que foi
disputado entre os quadros chilenos e brasileiros despertou
como aliás era natural o máximo entusiasmo e interesse
levando mesmo a assistência a interminentes explosões de
júbilo e de contentamento. (...) O jogo transcorreu
admiravelmente, vindo a terminar pela vitória do quadro
brasileiro pelo score de 6 a 0."
"O terceiro Campeonato Sul-Americano de Football decidiu-
se ontem pela vitória dos jogadores brasileiros. Este
acontecimento teve uma repercussão que se pôde considerar
bem como continental, apesár das grandes coisas que neste
momento ocupam a atenção dos povos, como o problema da
paz, a ser resolvido pela resposta da delegação alemã à
proposta dos aliados e a travessia aérea do Atlântico. Aqui, a
impressão causada pela vitória dos nossos jogadores foi de
um entusiasmo delirante. Desde muito cedo a população
sentiu a sua atenção presa à grande peleja, que se ia travar no
campo do Fluminense, crescendo à medida que se
aproximava a hora do desempate sensacional. Havia também,
para despertar a curiosidade pública, uma eclipse do sol.
Pouco se preocupou a cidade com isso. Um eclipse é uma
coisa tão banal... (...) A Avenida Rio Branco, em um certo
trecho, ficou literalmente cheia, com o trânsito perturbado. A
febre com que se acompanhava o match era crescente. O jogo,
indeciso no primeiro tempo, empolgava cada vez mais toda a
gente.
- Está duro! Zero a zero!
- Mas vencem os uruguaios!
-Qual! Não venceram até agora, não vencem mais. Os
brasileiros tomaram o pulso aos uruguaios.
- Qual!
- Não! As vantagens agora são nossas.
E assim decorreu toda a tarde, sem que o caso se decidisse.
Afinal, quando o entusiasmo público já tinha chegado ao seu
período agudo, chegou a grande nova: os brasileiros
venceram por um contra zero. Foi um estrugir formidável de
palmas e de bravos, que eletrizou toda a cidade.
- Acabou-se. Agora não perdemos mais a dianteira! Perdemos
os campeonatos anteriores! Agora seguramos o cinturão de
ouro e não o largamos mais. E, com essa convicção, toda
gente voltou para casa, depois de um grande dispendio de
energia nervosa."
A Razão, 30 de maio de 1919

"(...) Só mesmo a falta de sorte nos remates não permitiu ao


team brasileiro conquistar o ponto que lhe assegurasse o
triúnfo. Enfim, nova luta será travada para o desempate do
campeonato e, se desta vez, nào desenvolvendo jogo bem
apreciável e tendo o adversário obtido a vantagem de 2X0, o
team brasileiro ainda conseguiu dominal-o e empatar a peleja,
em condições normais deve produzir jogo mais eficiente e
fazer figura mais brilhante."
O Imparcial, 26 de maio de 1919

"(...) Pela primeira vez tivemos em nosso continente um


embate travado com um ardor inacreditável por parte dos
combatentes e que findou do modo mais honroso e nobre para
nós brasileiros. (...) Os brasileiros depois de uma peleja
renhidíssima, como até então não se realizara, abateram,
ontem pelo score de 1X0 o formidável scratch uruguaio, que
na opinião unânime dos entendidos representava o expoente
máximo do football oriental."
O Imparcial, 30 de maio de 1919

"A concorrência, se não era colossal como a de domingo, era


seletíssima, notadamente pelo número de senhoras. A
animação, extraordinária desde 11 horas, tornou-se como
poucas vezes tem acontecido ao aproximar-se a hora do jogo.
Um alarido unânime atroava e nos morros visinhos a multidão
agitava bandeiras nacionais, por entre vivas. (...) O jogo de
hoje era já de desempate e, assim, de graves
responsabilidades para ambos os teams. (...) Brasileiros:
Marcos, Pindaro e Bianco, Sergio, Amilcar e Fortes, Millon,
Néco, Friendenreich, Heitor e Arnaldo. (...) 1o Half Time:
Brasileiros 0 goal Uruguaios 0 goal - 2o Half Time:
Brasileiros 0 goal Uruguaios 0 goal - Nova Prorrogação: 1o
goal brasileiro Hurrah! Friedenreich! Hurrah - Brasil!
Não havendo resultado nos trinta minutos de prorrogação foi
pelo juiz ordenado a segunda prorrogação. A saída foi dos
uruguaios e os brasileiros atacam, obrigando os adversários a
um corner. Pouco depois Arnaldo é dado como off-side, mas
os brasileiros não desanimam. Néco corre pela direita, centra,
sendo a bola recebida de cabeça por Heitor, que a passa a
Friedenreich. Este, com um shoot de meia altura, ao meio do
poste, marca o 1o goal brasileiro. Hurrah! Friedenreich!
Hurrah - Brasil! (...) Final: Brasileiros 1 goal Uruguaios 0
goal - Com este resultado foram os brasileiros aclamados
campeões da América do Sul.
A Noite, 29 de maio de 1919

AS MANCHETES:
A Sensacional Peleja De Ontem Entre Brasileiros E
Uruguaios - Os Nossos Denodados Patrícios Assumiram O
Visível Domínio Da Pugna, Que Findou Com Empate De
2X2 (O Imparcial)
Salve Footballers Brasileiros! Depois De Uma Peleja
Emocionante, Os Nossos Patrícios Lograram, Ontem, Para O
Nosso País A Supremacia Do Football No Campeonto Sul-
Americano. A Nossa Inegável Vitória De Ontem Sobre Os
Uruguaios Pelo Score De 1X0. (O Imparcial)
Bravos Aos Brasileiros! Vencedores Do 3o C.S.A De
Football ! Friedenreich Marcou O Ponto De Vitória! (A
Noite)
27) João do Rio (1919)
"Uma noticia desoladoramente triste veiu surprehender,
hontem, á noite, quantos trabalhavam nesta casa - o
passamento de João Paulo Barreto, ou melhor "João do Rio",
pseudonymo com que se fez na literatura nacional e que o
levou, afinal á Academia de Letras.
A vida de Paulo Barreto na imprensa carioca pode servir
modelo aos que se dedicam á rude profissão de escrever para
o publico - ella foi uma serie longa de victorias, que
grangearam para elle um justo renome.
Estreando na "Cidade do Rio", onde pontificava Patrocinio,
foi ao lado desse grande mestre do jornalismo e de collegas
como Guimarães Pessoa, Bilac e outros, que Paulo Barreto se
revelou o jornalista, por excellencia, começando a
organização das notas de reportagem, que foram compor o
seu primeiro livro, "As Religiões no Rio", que appareceu sob
os applausos da critica e fez sucesso de livraria.
A maneira por que o seu primeiro trabalho foi recebido
estimulando-o, e dahi em deante, as obras de Paulo Barreto
entraram de apparecer qual a mais bem recebida pela critica,
ainda mais a dos mais severos commentadores.
E registraram-se mais a "Alma Encantadora das Ruas", "O
Cinematographo", a "Mulher e o Espelho", e outros trabalhos
que apresentaram o autor como um typo fino de observador.
Além das obras de sua autoria, Paulo Barreto trouxe para o
vernaculo a "Salomé", de Oscar Wilde.
João do Rio, que era um artista, tambem escreveu para o
teatro, desde o genero brejeiro "Chique-chique", até á
comedia como a "Bella Mme. Vargas", que foi recebida com
applausos pelos amantes da arte. Póde-se dizer a "Bella Mme.
Vargas" é a comedia pr excellencia escripta no Brazil por
autor brazileiro.
Na litteratura propriamente dita, não foi só nos volumes que
deixou, bem assignalados, traços indeleveis da sua passagem.
Tambem nos jornais, notadamente n' "O Paiz", elle collaborou
ora como literato, na columna de honra, ora como chronista,
ora como jornalista propriamente dito, discutindo ou
commentando os assumptos com elevação e grande
illustração.
Ha pouco tempo, após uma viagem que fizera á Europa, aqui
chegado emprehendeu o morto de hontem a fundação de um
jornal, o que conseguiu, montando o nosso collega "A Patria",
do qual era seu director. (...)"
A Razão, 24 de junho de 1921

"O passamento de Paulo Barreto, occorrido hontem á noite,


foi uma surpreza que impressionou profundamente o meio
espiritual, as camadas litteraria e jornalistica, prolongando-se
essa impressão a todas as rodas sociaes, onde essa
individualidade, que o era, tinha um realce de admiração e de
estima. E esse destaque bem frisante surge evidenciado,
precisamente pela unanimidade das revelações de pezar ante o
desapparecimento do litterato, do jornalista e do homem,
mórmente deste, que não podendo escapar á fragilidade da
perfeição humana, se tinha defeitos, bem os recompensava
com o seu nucleo de virtudes. (...)
Mas a sua feição saliente nas letras era o jornalismo, a sua
espiritualidade pendia muito mais, e com relevo de valor, na
columna do jornal, do que na pagina do livro; naquella elle
era o jornalista completo, tudo fazendo com a mais cabal
proficiencia, não lhe escapando a minima "ficelle" do mais
simples facto tirando o preciso para o salientar, vibrar a
pequena nota ou espiritualizar um "suelto", encher uma
columna de chronica com actualidade de comentario e
"verve" de narrativa.
A sua primeira prova de jornalista elle a deu, cabal, na celebre
reportagem sobre as differentes religiões no Rio, que valeram
á "Gazeta de Notícias" um bom renascimento de
popularidade.
Paulo Barreto tinha pelo jornalismo uma affeição extrema, era
a sua predilecção bem manifestada desde tenros annos,
inclusive no seu "debute" num modesto semanario, o "O
Coió" - ahi por voltas de 97.
Foi por essa época que elle começou a frequentar "A Cidade
do Rio", levado por Emilio de Menezes e Henrique Cancio.
Ahi se iniciou com uma chronica sobre as "grisetes no Rio",
que José do Patrocinio classificou de "estupenda". (...)
Foi na "Cidade do Rio", que Paulo Barreto se iniciou e
revelou predicados de espirito especiallissimo para a
profissão que abraçou e em que incontestavelmente brilhou
até a sua morte hontem.
Depois, na "Gazeta de Notícias", no "O Dia", na "A Noticia",
no "O Paiz", no "Rio Jornal" e n' "A Patria", essas revelações
de vinte e tantos annos de jornalismo intenso e por vezes
fulgurantes, foram guindando-o á posição que mantinha
actualmente no jornalismo, que lhe fica devendo um bom
incremento, quasi diriamos uma moderna remodelação. (...)"
Boa Noite, 24 de junho de 1921
"Com o desapparecimento de Paulo Barreto perde o Brasil,
sem duvida, uma das mais estranhas e por isso mesmo talvez,
mais empolgantes, das suas organisações literarias. Delle
poder-se-á dizer com justiça que era em tudo e antes de tudo,
como escriptor, um estheta na mais perfeita accepção do
vocabulo. O que Olavo Bilac realizou na poesia, João do Rio
o foi em nossa prosa contemporanea: a emoção feita estylo
para dominio dos sentidos.
Não seria decerto um pensador, mas um artista, impondo-se
menos pelo peso dos conceitos do que pela graça e leveza dos
proprios pensamentos, a que a phrase incisiva, nervosa e
scintillante, communicava, todavia, grande movimentação e
emprestava sempre intenso brilho. Dahi, dessa arte que, até
certo ponto, constituia uma originalidade em nosso meio,
tirava o privilegiado publicista patricio o melhor dos seus
effeitos literarios. (...)
João do Rio não foi, em verdade, um commentador grave de
homens e coisas, sendo muito embora um observador, por
vezes agudo demais. Dir-se-ia que, a despeito da percuciencia
da sua visão, elle se comprazia em deixar de lado,
propositadamente, tudo o que não encontrasse de banal ou de
grotesco no seu exame, para, assim, melhor dar expansão ás
suas tendencias incontrastaveis de espirito entre leve e
picaresco, e sempre bem humorado de mais para desdenhar
das glorias de critico de futilidades. A esta conformação
comsigo mesmo deveu, sem duvida, João do Rio os seus
inexcediveis triumphos de chronista mundano e reporter... (...)
Onde a vibração da massa pedisse alguem para transmittil-a,
ahi estava João do Rio. No seio do povo colhia elle as
emoções da sua fonte; registrava-as todas, com o poder
retentivo sorprehendente e sem esforços mnemonicos se as
transmittia a si mesmo, para, depois de processal-as,
apurando-as, em seu engenho, communical-as a nós outros,
harmonicas, luminosas e trepidentes.
Nisto, os seus talentos não o trahiam nunca e elle o fazia com
amor e convicção. A sua arte era, assim, não só bella, mas
sincera. A fantasia, conquanto sua collaboradora, entrava ahi
apenas como elemento de realce; não lhe sacrificava a obra,
sentida e verdadeira, máo grado os paradoxos que iam por
ella para confirmar- quem sabe? - no fundo, a individualidade
do seu autor. (...)"
Rio Jornal, 24 de junho de 1921

"Ecoou dolorosamente, como era de esperar, em todo o pais a


noticia da morte prematura do brilhante jornalista que foi
Paulo Barreto.
Durante todo o dia de hontem foi grande a romaria, de
pessoas de todas as classes sociaes que affluiram a redacção d'
"A Patria", e que ali deixavam os seus nomes por não ter sido
ainda permitida a visitação ao corpo, velado por seus
companheiros de trabalho.
O dr. Josette procedeu ao embalsamento do corpo, trabalho
que ontem não poude ser concluido e, motivo porque só hoje
depois das 9 horas da manhã poderá Paulo Barreto ser
exposto a visitas, em camara ardente, armada na sala da
redacção.
Ficou deliberado que o enterro do mallogrado jornalista seja
realizado amanhã, domingo, saindo o feretro ás 15 horas da
redacção do jornal de que era director.
O Sr. A. Azeredo, vice-presidente em exercicio, na sessão do
Senado de hontem, depois de communicar o fallecimento do
Sr. Paulo Barreto, jornalista brasileiro e membro da Academia
de Letras, de quem fez o elogio funebre, solicitou que o
Senado permitisse que na acta dos seus trabalhos fosse
inserido um voto de pesar pelo seu fallecimento. O
requerimento foi approvado unanimemente. (...)
O Jornal, 25 de junho de 1921

"As tocantes homenagens que a cidade tem prestado ao


illustre escriptor que a morte arrebatou em pleno trabalho e
em plena maturidade do seu espirito valem como a mais
sincera e a mais justa das cortezias aos meritos singulares de
sua obra de jornalista e de artista.
É possivel que uma analyse fria e tranquilla de sua longa e
tumultuosa actividade mental demonstre o caracter apressado
e um pouco superficial dos numerosos livros em que procurou
concretizar as impressões, mais ou menos vertiginosas, que os
aspectos da vida urbana do Rio e dos paises estrangeiros que
visitou, lhe produziram. Mas ninguém lhe contestará jamais o
ouro puro da sua intelligencia e que elle tão
descuidadosamente prodigalizou em vinte annos de
jornalismo.
A sua lingua de impressionista, cheia de paradoxos, de
imprevistos e de contrastes desconcertantes e de "trouvailles"
de espirito, bastará para salvar na sua bagagem literaria o que,
porventura, lhe falta de reflexão.
A sua memoria ficará também como de um grande coração
cheio de bondade em que a ironia apparente mal dissimulava
a sensibilidade extrema, muitas vezes infantil, e como a de
um amigo sincero e apaixonado da sua terra que elle procurou
ardentemente servir dentro da sua orientação das suas
concepções. O instincto popular nào se illude; a romaria á
redacção de seu jornal que, hoje, se repetirá, no seu enterro
diz bem alto que com elle perderam o nosso jornalismo e os
leitores um de seus elementos mais representativos. (...)" O
Jornal, 26 de junho de 1921.
" (...) Paulo Barreto não hesitou um momento na sua grande
obra. Felizmente ha uma força que anima os homens
dominados pelos nobres messianismos. Paulo Barreto foi
durante estes ultimos mezes de sua vida um condensador
dessa força. Graças a ella, a sua intelligencia dos homens e
das coisas, tornou-se quasi milagrosa, a sua coragem
affrontou todos os ódios, a sua capacidade de trabalho
multiplicou-se e a plasticidade de seu espirito fez prodigios
nas columnas mais diversas deste jornal. Elle era para todos
nós, os mais velhos como os mais novos companheiros, mais
do que um director, um chefe. Era uma força communicativa,
um estimulo a que ninguem podia resistir; porque, como se
não bastasse o seu escrupulo no trabalho, Paulo Barreto soube
conquistar da juventude enthusiasta desta casa uma
admiração, um respeito, uma estima, um culto que só o
conseguem os santos ou os genios. Isto, alías, era natural.
Ninguem privaria com esse homem, singularmente dotado,
sem ser attrahido pelo fulgor impressivo, pela palavra, pela
viveza de sua intelligencia repentina, pela graça do seu estylo,
pela sua bondade espontanea, pela meiguice do seu trato e por
sua despretenciosa e luminosa superioridade mental.
Perdemos, pois, desde a sinistra noitada de ante-hontem, a
maior intelligencia e a maior vontade que collaboraram para o
exito excessivo que fez de "A Patria", em tão pouco tempo,
uma columna stoica dos humildes contra os humilhadores, do
idealismo politico contra a mediocridade saciada, do Brasil
jovem, progressista, impellido pela consciencia nova de sua
finalidade na America e no velho Brasil, de cuja persistencia
na arena das grandes actividades uteis pouco lucraria o
presente e, muito menos, o futuro. (...)"
A Patria, 25 de junho de 1921

AS MANCHETES:
Paulo Barreto - A Morte Subita Do Director D' A Patria -
Ligeiras Notas Sobre A Sua Vida Literaria e Jornalistica ( A
Razão )
Paulo Barreto - O Desapparecimento Da Figura mais Original
Do Jornalismo Brasileiro ( Boa Noite )
A Imprensa Enlutada - Como Repercutiu A Morte Repentina
De Paulo Barreto
( Rio Jornal )
A Morte De Paulo Barreto - Homenagens Da Imprensa, Do
Parlamento E De Varias Associações - A Exposição Do
Corpo E O Seu Enterramento Amanhã
( O Jornal )
Paulo Barreto - O Rio Presta Á Memoria Do Nosso Director
A Maior Homenagem Popular Que Fóra Da Politica Alguém
Já Mereceu - A Romaria Á Nossa Redacção - As
Homenagens Collectivas - O Que Serão Os Funeraes Do
Morto Querido - O Dever Dos Que Ficam ( A Patria)
28) Revolta do Forte (1922)
"Desde a madrugada de ontem que entrou a cidade numa
situação inquieta, com o pronunciamento militar iniciado pelo
forte de Copacabana, que ficou sob a ação revolucionária do
capitão Euclides Fonseca, logo seguido do levante na Vila
Deodoro. As primeiras notícias eram desorientadas, e muitas
vezes contraditórias, o que não permitiu se fizesse um juízo
seguro dos acontecimentos que se desenrolaram. O noticiário
refletiu, como não podia deixar de refletir, esse 'brouhahada',
levando um pouco de confusão aos espíritos inespertos. (...)
Cerca de 1 hora da madrugada o general Bonifácio Costa,
com o seu ajudante de ordens e o capitão Silva Barbosa, de
artilharia, aproximou-se da porta das armas da fortaleza e
anunciou-se ao oficial de dia, que foi chamado. Este,
comparecendo, foi informado pelo general Costa que ia para
falar com o capitão Euclides Fonseca sobre um caso oficial e
urgente.
O capitão Euclides, que estava recolhido no seu aposento,
mandou que o oficial de dia introduzisse o general e o capitão
na sala de armas, pois recebel-os-ia logo. Poucos momentos
após, o capitão Euclides aparecia na referida sala e recebia os
dois oficiais, tendo o general Costa lhe comunicado a
natureza de sua missão: receber a fortaleza e entregar o
comando da mesma ao oficial que os acompanhava. O capitão
Euclides Fonseca declarou estranhar tal procedimento,
acrescentando que não entregaria o comando naquele
momento.
Trocaram-se algumas palavras entre os dois interlocutores, até
que o capitão Euclides declarou ao general Bonifácio Costa
que se considerasse prisioneiro, bem como o capitão referido
e o seu ajudante de ordens e ordenanças. Ato contínuo, o
capitão Euclides designou um oficial para olhar pelos oficiais
presos, sendo-lhes indicado aposentos.
Foi, então, 1 e 35 da manhã, que a fortaleza fez o primeiro
disparo, de pólvora seca, sinal, ao que parece, convencional,
para os outros elementos sublevados. Foram logo distribuídas
vedetas para a avenida Atlântica e rua Nossa Senhora de
Copacabana e, ao nascer do dia foi iniciado o serviço de
abertura de trincheiras, trabalho que às 11 horas da manhã
estava dado por terminado. O fosso aberto ocupa a extensão
que fica em frente à rua Copacabana e ao meio dia já se
achava guarnecido. (...)
O número de praças inferiores e oficiais sublevados atinge a
359 homens, incluindo o pessoal que estava no forte do Leme,
e que pouco antes das 10 horas fora chamado e mandado
recolher à fortaleza de Copacabana, aderindo, assim, ao
movimento. Antes, porém, de deixarem o forte do Leme
retiraram as culatras das peças. No forte de Copacabana há
munição de bocca para um mês. (...)"
O Brasil, 6 de julho de 1922

"Foi às 21 horas de ante-ontem que o governo começou a


receber informes sobre o projetado movimento de revolta na
Vila Militar. Recebendo dos seus agentes todas as
comunicações sobre o que ocorria, o governo imediatamente
concertava as medidas de repressão. Assim que foi ouvido o
primeiro disparo no Forte de Copacabana, estourou na Vila
Militar a insubordinação de um pelotão do 1o Regimento.
Estava este pelotão com alguma munição. A outra parte do
regimento que se manteve com a legalidade, conseguiu
sufocar a rebelião.
Conforme informações que temos, das proximidades da Vila
Militar, reina desde ontem ali completa tranquilidade depois
da rendição das praças da Escola Militar e do 1o de Cavalaria.
As forças da Polícia Militar que seguiram para ajudar a
dominar a rebelião, já regressaram para esta Capital, tendo
também regressado a 3a companhia de metralhadoras. Esta
força estacionou, depois de descer da Vila Militar em
Cascadura. As novas notícias sobre o Forte de Copacabana
declaram que o chefe dos revoltosos nesta praça de guerra
pediu para parlamentar com o governo, informação esta que
publicamos mais abaixo com os devidos esclarecimentos. (...)
O despertar dos moradores dos lindos bairros atlânticos de
Copacabana, Leme e Ipanema foi, na madrugada de ontem,
terrível. As famílias dispunham-se a abandonar as suas
residências apressadamente, na imminência do forte que
estava revoltado, ser bombardeado pelas tropas legais. Desde
as primeiras horas do dia, um inumerável cortejo de todas as
características sociais, em automóveis, bonds, caminhões do
Corpo de Bombeiros e carroças, desfilava pela rua Barroso,
direção a Botafogo, pelo Tunel Velho.
Os moradores do Leme cujo bairro estava sendo alvejado
pelos 7 ½ do forte de Copacabana retiravam-se a conselho da
própria autoridade. O forte de cinco a cinco minutos
disparava para a antrada do Tunel Novo, onde estavam
alojadas as tropas do 3o Regimento de Infantaria. O trânsito
ficou, então, interrompido neste trecho. Os bonds passaram a
circular pelo Tunel Velho, até as 15 horas, quando não mais
atingiram o bairro atlântico, por estar o mesmo sitiado pelas
tropas e, na iminência de ser bombardeado pela esquadra,
pela aviação naval e pelas tropas de terra - o que talvez se dê
esta manhà, segundo informações que tivemos. (...)
O Forte de Copacabana, o iniciador da rebelião, hontem, até a
tarde, continuava atirando a esmo. Em certo momento os
disparos passaram a ser feitos em direção do bairro de
Copacabana, o que estava causando prejuizos aos prédios da
Avenida Atlântica. (...)
O governo tendo recebido uma intimação do forte de
Copacabana respondeu a este documento dos revoltosos com
a decisão tomada de que se a guarnição do forte nào se
render, dentro de um determinado prazo de horas, mandará o
governo bombardeal-o por forças de mar e terra, sendo a
rendição sem condições. (...)
Ao assinar do decreto de estado de sítio, ontem aprovado pelo
Congresso Nacional, o sr. presidente da República proferiu as
seguintes palavras:
- Nunca desejei e nunca pensei ter de assinar um ato como
este, mas agora o faço gostosamente, certo de que estou
prestando um serviço à República e às instituições."
A Pátria, 6 de julho de 1922

"Lamentamos o desvario dos espiritos que, por criminosa


ambição política, arrastou homens de responsabilidade como
os Srs. Nilo Peçanha e marechal Hermes à revolução contra o
governo constituído do país; limitamo-nos a nomear alguns
fatos do movimento, felizmente dominado pelo governo, que
teve a seu lado as forças armadas e a opinião conservadora do
país. (...)
O movimento explodiu quase simultaneamente na Escola
Militar do Realengo e na fortaleza de Copacabana. Os
revoltosos acreditavam que o resto das forças da guarnição
militar aderisse à revolução, mas essas esperanças felizmente
fracassaram. As tropas, em sua grande maioria, conservaram-
se fiéis ao Governo e à legalidade. Aquela Escola, sob o
comando do tenente-coronel Xavier de Brito e tendo como
oficiais vários capitães e tenentes revoltosos que, na noite de
4, iludindo a vigilância da Polícia Militar conseguiram atingir
o Realengo, saiu para o 1o batalhão de engenharia, certo de
ser este o único obstáculo que encontrariam para chegar ao
contato com as tropas da Villa Militar, supostos também em
estado de sublevação.
O 1o batalhão de engenharia, reforçado imediatamente pelo
15o regimento de cavalaria, repeliu os revoltosos que se
instalavam nas alturas que dominam, pelo lado de oeste, a
Villa Militar, e aí colocando seus canhões, abriram intenso
fogo contra os quartéis do 1o artilharia, 1a brigada de
infantaria, Escola de Sargentos etc. A esse tempo, o general
de brigada Ribeiro da Costa, na sua qualidade de chefe mais
graduado da Villa Militar assumiu o comando de todas as
forças e dispôs a defesa. (...)
Na Villa Militar só houve um pequeno movimento
subversivo, imediatamente abafado. Um pelotão, às ordens de
um tenente, atirou contra a sala onde estavam reunidos os
oficiais. O capitão da companhia a que pertencia esse pelotão,
de nome Barbosa Monteiro, oficial de extraordinário valor
moral e intelectual, saiu ao encontro dos soldados sublevados
e recebeu uma descarga que o fez tomar morto. O pelotão,
imediatamente cercado pelo resto da companhia, que acudiu,
foi, com seu comandante, feito prisioneiro e desarmado. (...)"
A União, 9 de julho de 1922

"As forças que estão sitiando o forte de Copacabana, sob o


comando do general Menna Barreto, tiveram ordem do
governo para enviarem um 'ultimatum' à fortaleza, intimando-
a a render-se dentro de uma hora. Em caso contrário será
bombardeada por forças legais de terra e navios de guerra."
O Combate, 5 de julho de 1922

"Por ordem do governo, a fortaleza de Santa Cruz e o forte de


Imbuhy desde ontem às 6 ½ até hoje pela manhã, que estão
fazendo disparos contra o forte de Copacabana. (...)
O Diário Oficial publicou a seguinte nota: - Tendo se
revoltado na madrugada de ontem a guarnição do forte de
Copacabana, que se achava sob o comando do capitão
Euclides Hermes da Fonseca, e havendo aderido a esse
movimento a Escola Militar, o sr. Presidente da República
adotou prontas e energicas providências, fazendo cercar
imediatamente aquela fortaleza e ordenando que as forças
legais fossem ao encontro da Escola Militar. Entrando em
contato com a Escola, as forças legais travaram com esta um
tiroteio conseguindo em pouco tempo dominar inteiramente
os sediciosos, que se renderam à discreção do governo, sendo
todos presos e desarmados e conduzidos para a Capital. Todos
as demais forças da guarnição estão com o governo, estando a
cidade em completa calma. (...)
O Sr. Presidente da República, no momento em que assinava
a decretação do estado de sítio, recebeu uma comunicação
telefônica do Ministério da Guerra, anunciando que os
revoltosos do forte de Copacabana acabavam de solicitar a
admissão de um parlamentar, ao que o Sr. Presidente da
República se negou terminantemente, adiantando mais, que só
aceitaria a rendição discrecionária. (...)
Hoje pela manhã sob a serenidade do azul do céu passou, com
destino a Copacabana, uma esquadrilha de aeroplanos
'Breguet' a fim de cooperar com as forças legais no assalto ao
forte. É bem possível que as possantes máquinas do novo
poder aéreo tenham entrado em ação com as suas bombas de
assalto. (...)
O governo intimou o forte de Copacabana a, dentro de um
certo número de horas, render-se incondicionalmente, sem o
que, bombardeal-o-á por forças de mar e terra."
O Combate, 6 de julho de 1922

"Segundo declarações dos soldados presos, o tenente Siqueira


campos e seus colegas resolveram enfrentar peito a peito os
legalistas, não querendo bombardear a cidade, como
tencionavam pela manhã enquanto aguardavam a resposta do
governo sobre as condições de rendição da praça. Rasgaram
então a bandeira do Forte, distribuindo um pedaço a cada
praça, colocando-o no peito, desceram do Forte, para virem
atacar os 2000 legalistas que os sitiavam."
O Combate, 7 de julho de 1922

"A cidade acordou tranquilla, tendo adormecido na sciencia


de que o governo estava resolvido a fazer emmudecer, e
render-se, o forte de Copacabana. Parte do commercio central
abriu suas portas, num começo de normalisação. Por volta das
8 horas, porém, senào precisamente entre ás 7 ½ horas e ás 8,
a população ficou um pouco desorientada com a successão de
uma meia duzia de fortes disparos, que abalavam os
moradores. Os habitantes das vizinhanças, do mar notaram o
movimento de navios de nossa esquadra que se dirigiam para
o forte de Copacabana, regressando depois ao porto, para
novamente tomar aquelle rumo, chegando mesmo o S. Paulo
a transpor a barra.
Por volta das 10 horas foram vistos alguns apparelhos de
aviação voar na direcção do forte de Copacabana, e logo
depois se soube officialmente da rendição do forte, noticia
esta que circulando, celere, por toda a cidade a attingindo,
logo, todos os bairros, tranquilisou a familia carioca. Mas os
suburbios, desde hontem á noite se achava relativamente
tranquillos, á vista da retirada das forças, que protegiam a
linha ferrea. E o Cattete, depois das 10 horas da manhã, ficou
tambem desguarnecido, o que produziu immediatamente uma
impressão de que a cidade retomava de certo a sua
normalidade completa. (...)
As autoridades militares, pela manhã, conseguiram, após o
ataque que foi dirigido contra o forte de Copacabana,
communicar-se com o respectivo commandante, capitão
Euclydes da Fonseca, intimando-o a entregar-se, pois a sua
resistencia seria inutil, uma vez que todas as forças, quer do
exercito, quer da Marinha, estavam ao lado do Governo.
O capitão Euclydes, ante a evidencia desses factos, declarou
que se entregaria; mas com a condição de ser respeitada a
vida daquelles que com elle se achavam na fortaleza.
Promettido ser atendido nesta imposição, o forte de
Copacabana entregou-se ás forças legaes, sendo o capitão
Euclydes preso, assim como os 18 homens que constituiam a
guarnição do forte, pois as demais ja o haviam abandonado,
no correr da noite. (...)"
A Noite, 6 de julho de 1922

"Os graves sucessos da noite anterior foram o prenuncio de


um movimento revolucionario que estalou, pela madrugada
de hontem e que deixou a cidade grandemente alarmada.
Conforme é sabido, o movimento teve origem na Escola
Militar, e as primeiras noticias para aqui transmittidas davam
como à frente da tropa revolucionaria o marechal Hermes. E,
durante toda a noite, os boatos mais desencontrados corriam,
deixando toda gente apprehensiva deante dos acontecimentos
que se desenrolariam. O que se passou durante o dia no
Cattete e no quartel-general, a imprensa relatou
minuciosamente e a noticia do levante soube-se depois pela
intercepção do Centro Telephonico de diversas
communicações para corpos da Villa, marcando o movimento
para determinada hora.
De posse de taes revelações, facil foi ao governo organizar o
seu plano de resistencia, entendendo-se antes com o general
Carneiro da Fontoura e com o titular da pasta da Guerra.
As notícias sobre os acontecimentos chegaram aqui
desencontradas, sem que se soubesse ao certo o que de
positivo havia ocorrido.
Na cidade conhecia-se do plano apenas a adhesão em
definitivo do forte de Copacabana, de onde, de quando em
quando, se ouviam disparos, que mais se accentuaram á tarde
quando circulou a notícia de que o 3o regimento iria tomar o
forte de assalto, á noite.
Algumas baterias de canhão de tiro rapido faziam disparos em
direcção ao Tunel Novo, na supposição de que as tropas
legaes ali se encontrassem. O éco formidavel dos disparos de
tiro rapido, em Copacabana, dava a impressào de que o bairro
todo estava sendo arrasado e, dahi, o exodo das familias que
foram procurar outros pontos da cidade. (...)
Ao que sabemos, até á ultima hora o forte de Copacabana não
se havia rendido ainda. Dizia-se que o commandante
propuzera uma rendição com condições, mas que o governo a
recusara. O ataque ao forte, por este motivo, fôra resolvido e
se realizaria pela madrugada simultaneamente pelas fortalezas
proximas, por navios da esquadra e por forças do exército."
Correio da Manhã, 6 de julho de 1922

AS MANCHETES:
A Revolta Do Forte De Copacabana E O Movimento Da
Escola Militar
O Congresso Concede A Medida Do Sitio, Pedido Com
Urgencia, Pelo Governo - Varias Prisões - Mortos E Feridos
( Correio da Manhã )
Pronunciamento Militar - O Governo Informa A Rendição
Discrecionária da Escola Militar E Do 15o Regimento De
Cavalaria Da Villa Militar - O Estado De Sítio Foi Ontem
Mesmo Sancionado - O Forte De Copacabana É Intimado
Pelas Forças Legaes A Render-se Incondicionalmente - O
Que Foi O Encontro De Tropas Em Deodoro - Algumas
Granadas Caem Sobre O Quartel General Fazendo Vítimas
( O Brasil )
A Situação - Os Sucessos De Hoje - A Rendição Do Forte De
Copacabana
( A Noite )
A Escola De Guerra Rendeu-se - O Levante Na Villa Militar
Foi Dominado
Esperava-se A Rendição Do Forte De Copacabana -
Foi Decretado O Estado De Sítio Por 30 Horas ( A Pátria )
Copacabana Prestes A Capitular! ( O Combate )
O Movimento Revolucionário Que Explodiu Nesta Capital
A Legalidade Vitoriosa ( A União )
29) Lima Barreto (1922)
"Morreu Lima Barreto; esta expressão laconica tem uma
grande significação nos meios cultos de nosso paiz,
principalmente nesta capital. É uma intelligencia robusta que
se extingue, um romancista de temperamento singular que
desapparece, justamente na edade em que as faculdades
creadoras mais se accentuam e definem o literato, o artista, o
psychologo: 42 annos de vida. (...)
Era um romancista de indole; se se pudesse determinar a
escola a que se filiára mister era também dizer que elle
mesmo, na sua visão minuciosa, na sua observação
penetrante, fizera a sua propria escola; deixara-se nortear á
mercê de sua imaginação fecunda e facunda. Lima Barreto,
dizem-no os que sobre as suas obras fizeram juizos criticos,
teria sido o maior romancista do seu tempo, se nas suas
producções não revelasse as caracteristicas do seu "eu"
artistico, a physionomia de sua propria individualidade, um
superior desinteresse para os preciosismos sociaes, um
descuidado desalinho, em que o seu genio creador, com uma
malheabilidade prodigiosa, amoldava e distendia o typo e as
sociedades dos seus romances.
Lima Barreto deixa as seguintes obras impressas: "Triste Fim
de Polycarpo Quaresma", "Vida e Morte de J. M. Gonzaga de
Sá", "Numa e Nympha", "Memorias do Escrivão Isaias
Caminha", "Sonhos e Contos", "Farras e Mafuás", "Uma
Provincia da Bruzundanga", as duas ultimas na livraria
Schettino.
"O Cemitério dos Vivos", obra que começou a escrever,
quando, por doença, recolheu-se ao Hospício, Lima Barreto
não pôde concluir; a sua saude abalada o impediu.
Collaborou em varios jornaes e revistas desta capital, mesmo
doente e abatido. (...)
Ha tres dias recolhera-se á casa e não mais saira. Ante-
hontem, ás 5 horas da tarde, uma de suas irmãs, em
obediencia ás prescripções médicas, penetrára em seu quarto
para dar-lhe uma colher de remedio; achou-o em estado de
agonia. A familia pediu a Assistencia, que já o encontrou
morto.
Assim, morreu o filho extremoso, que, no arranco ultimo,
teve ainda forças para conter-se numa sublime mudez, a fim
de não causar dissabor ao pae, seu grande amigo. (...)
O Jornal, 3 de novembro de 1922

"Á ultima hora, quando já se achavam quasi encerradas os


trabalhos nesta redacção, surprehendidos com a dolorosa
noticia do fallecimento de Lima Barreto.
Nada mais podemos dizer, senão que a morte do grande
escriptor carioca abre na literatura nacional um vacuo
diddicilmente preenchivel.
Lima Bareto era quasi uma tradição da cidade. O imprevisto e
a hora do seu fallecimento não nos permittem, por ora, traçar
notas mais completas sobre o grande vulto que se apaga.
Mas, nesta simples exclamação, de pasmo e de dôr,
resumiremos, sem duvida, toda a magua que enche, neste
momento, as rodas intellectuaes e bohemias da cidade:
Morreu Lima Barreto!"
O Imparcial, 2 de novembro de 1922
"- O corpo vae para o S. João Baptista? - interrogou uma
mulher de apparencia modesta e ar compungido.
- Vae. É lá que elle sempre disse que desejava ser enterrado.
Estavamos na casa de Lima Barreto, na estação da Piedade.
Gente boa da visinhança cercava o esquife do romancista. Á
porta, um grupo curioso de crianças olhava com attenção os
que entravam, medindo todas as coisas com interesse e
admiração.
A terde cinzenta e chuvosa tinha uma expressão vaga de
humildade infinita, como se sobre ella pairasse invisivel e
terna, a alma humilde de Lima Barreto...
Poucas flores. Grupos silenciosos e meditativos enchiam a
pequenina sala, onde dormia, em seu leito final, o romancista
bohemio dos nossos suburbios. Figuras do povo, dessas que a
gente encontra a cada instante pelas ruas, anonymas em sua
modestia trabalhadora e honrada, fitavam enternecidas o
corpo inanimado de Lima Barreto, como que se despedindo
de um companheiro querido, de um amigo, de um irmão...
Depois, o caixão se fechava sobre a physionomia impassivel
do morto. As janellas visinhas se enchiam de rostos curiosos,
e o enterro saia.
Breve, o rodar do trem, rumo á Central. Mais alguns instantes,
e o cortejo pequenito e pobre demandava o aristocratico
recolhimento de S. João Baptista.
E foi assim que, na tarde de hontem, desceu ao tumulo o
corpo de Lima Barreto. (...)"
O Imparcial, 3 de novembro de 1922
"A nota dolorosa destas ultimas horas foi a morte de Lima
Barreto, o maior romancista da sua geração.
Escriptor singular e brilhante, Lima Barreto possuia a mesma
alma cheia de colorido e vivacidade, por vezes radiosamente
alegre, por vezes triste, desta tumultuaria e formosa metropole
em que nasceu ha quarenta e dois annos, e onde viveu as
horas bizarras, amargas ou gloriosas de sua existencia
movimentada de bohemio e de artista.
Chronista admiravel, jornalista notavel, tendo collaborado em
varios jornaes dos Estados e desta capital, o autor das
Memórias do Escrivão Isaias Caminha, deixa, sem duvida,
uma obra profundamente humana, a qual, embora incompleta,
ficará bella e eterna em meio da literatura nacional.
O desapparecimento do intenso e forte escriptor provocou no
espirito dos que com elle conviviam, ou simplesmente o
leram, um sentimento de saudade imperecivel. Essa saudade
já se traduz, no coração de seus amigos mais dilectos, pela
idéa de lhe erigirem um mausoléo no cemitério S. João
Baptista, onde foi sepultado, sob a tarde humida e chuvosa de
hontem, tendo o ataude, transportado em vagão funebre,
ligado ao trem de suburbios, chegado á Central ás 17 horas e
um quarto, vindo da estação de Todos os Santos, da rua Major
Mascarenhas, residencia do romancista, á qual affluiram, ao
saber da infausta nova, os amigos, varios representantes da
imprensa carioca, e até gente do povo, desconhecida
inteiramente, mas chorando o desapparecimento daquella
alma bonissima. (...)"
O Paiz, 3 de novembro de 1922
"Morreu, pela madrugada de hontem, o romancista Lima
Barreto. Esse escriptor nascera em 1881, contando, portanto,
41 annos de edade.
Nascera nesta cidade e aqui mesmo se diplomara em
engenheiro geographo, pela Escola Polytechnica.
Submettendo-se a concurso, em 1904, foi nomeado
funccionario do Ministerio da Guerra.
Lima Barreto, como todo mundo sabe, passou a vida na mais
incorrigivel das bohemias. Essa forma de viver terminou por
lhe abalar fundamente a saude, affectando-lhe differentes
orgãos. Ultimamente os seus males se aggravaram, vindo o
jornalista e literato a fallecer pela madrugada de hontem.
O romancista deixa varias obras publicadas, alem de algumas
ineditas.
Lima Barreto foi enterrado, hontem, á tarde no cemitério de
S. João Baptista."
Correio da Manhã, 3 de novembro de 1922

"Falleceu em sua residencia, á rua Major Mascarenhas,


estação da Piedade, onde vivia ha muitos annos, um dos
nossos mais festejados escriptores, Lima Barreto. Esse
passamento, alías esperado, pois que, de havia mezes, elle
apresentava serios symptomas de grave enfermidade, a que
concorria a sua indole irreprimivelmente bohemia, veiu
estremunhar numa dolorosa surpresa todo o nosso mundo
mrntal, que via em Lima Barreto o verdadeiro escriptor typico
do nosso povo, o impressionista admiravel da vida deste Rio
de Janeiro, onde elle nasceu e de onde nunca saiu, o
psychologo carregado e amargo das nossas ruas, dos nossos
bairros pobres e de certos typos victoriosos e dominadores do
nosso meio, que eram retalhados em complascencia pela sua
ironia acre. (...)
Entre as obras mais populares e mais vibrantes, pelo colorido
forte da verdade que soe illuminar as paginas deste escriptor,
está o "Triste Fim de Polycarpo Quaresma", de que
reproduzimos, abaixo, um trecho lapidar, em toda a
irregularidade que constituia uma das caracteristicas desse
impressionante tecelão de romances vivos.
Lima Barreto escreveu ainda: "Numa e Nympha", novella de
grande sucesso escripta especialmente para "A Noite", que a
publicou, ha alguns annos; "Memorias do Escrivão Isaias
Caminha", em que ha criticas acerbas e desopilantes do nosso
jornalismo; "Vida e Morte de J. M. Gonzaga e Sá", "Sonhos e
Contos", e, ainda ineditos, "Uma Provincia da Bruzundanga"
e "Farras e Mafuás", livros cheios das mais interessantes
observações acerca da vida popular e politica desta gente com
quem elle conviveu. Ha ahi quadros inesqueciveis que
retratam a vida suburbana e a lufa-lufa das nossas baixas
camadas sociais.
Com o seu desaparecimento material, Lima Barreto encetará,
por certo, uma nova existencia de gloria e de prestigio no seio
deste povo de que elle tanto escarneceu quanto amou. (...)
A Noite, 2 de novembro de 1922

AS MANCHETES:
Lima Barreto A Sua Morte ( O Jornal )
Morreu Lima Barreto ( O Imparcial )
A Morte de Lima Barreto ( Correio da Manhã )
Lima Barreto - A Morte Desse Observador Admiravel Da
Vida Do Nosso Rio De Janeiro ( A Noite )
30) Rui Barbosa (1923)
"Na vida da nacionalidade brasileira não há maior vulto do
que aquele que acaba de desaparecer: Ruy Barbosa. Tão
eminente era ele, que encarnava a própria Nação, no que ela
tem de mais alto, de mais nobre, de mais puro. Repetidas
vezes o povo do Brasil sentiu essa estranha e rara impressão
de ver Ruy Barbosa significando a própria existência da
Pátria, na sua alma elevada e na sua máxima grandeza.
Grande e incomparável na organização do regime
republicano; grande e incomparável em Haya, - a Pátria
brasileira compreendera, enfim, a representação da sua
personalidade como a da própria representação.
Ele era o pensamento mais alto; as suas aspirações mais
grandiosas. Toda a sua vida se devotara ao Brasil num afeto
que não será jamais ultrapassado por nenhum homem público
deste país. Toda a sua vida se desenrolou entre tremendas
tempestades, e nas suas lutas e controvérsias ele foi sempre o
grande alentador das nossas energias cívicas e morais.
Combatendo, no império, pelas reformas liberais e pela
democracia, ele foi o maior fator de impulso que levantou a
República e abateu a monarquia.
Na República ele foi o seu maior sustentáculo; e o seu verbo
divinizado consagrou-se à glória das campanhas cívicas, em
que a nação pulsou com o seu coração e o seu pensamento,
ardentes e cintilantes do mais puro ideal republicano! O maior
gênio da nacionalidade - a sua obra - confunde-se com a
existência nacional, as suas forças gastaram-se no
devotamento incessante ao país. (...)
Ruy Barbosa ficará como a maior tradição da nacionalidade, e
o fato da sua morte, agora que as paixões incendiadas vão
aplacar os seus ímpetos, fará com que apareça imaculado e
venerado, alto e intangivel como um deus. (...)"
A Pátria, 2 de março de 1923

"Entre as maiores desgraças que, nesta época sombria, cheia


de incertezas, vacilações e temores, poderiam desabar sobre a
Nacionalidade, nenhuma será comparável à morte do
conselheiro Ruy Barbosa. Na realidade, esse super-homem
excepcional era numen tutelar que velava pelos destinos
nacionais. (...) Não há, no Brasil, outra personalidade que
possa ser comparada a Ruy Barbosa (...)
Moço ainda, no parlamento do Império, começa ele a agitar a
sua mascula personalidade. Batalha pela eleição direta. É um
dos operários mais prestimosos da campanha que derruiu o
edifício negro da escravidão. Levanta o problema do ensino
público e produz dois monumentais pareceres - até hoje
consultados como orientadores seguros e firmes. Ergue a
bandeira da Federação, para salvar as províncias da
centralização que as anemizava, e, por amor desse princípio,
recusa uma pasta de ministro no gabinete Ouro Preto.
Vem a República, em cuja "pedra angular está embutido o seu
nome", como ele mesmo disse, e vemol-o, então, como o
construtor máximo das instituições e formulas políticas que
nos regem. A sua passagem pelo Ministério da Fazenda ficou
assinalada por providências e medidas a que, anos mais tarde,
os seus impenitentes adversários e defratores tiveram de
recorrer, como salvaterio das finanças nacionais.
Daí por diante, não houve grande momento da nossa vida de
povo livre em que essa extraordinária figura moral não
aparecesse, predizendo e mostrando ao povo o caminho certo
e seguro da salvação pela liberdade. Na campanha civilista,
em que não se poupou a cansaços e fadigas para poupar ao
país a implantação humilhante do militarismo em nossas
instituições, Ruy Barbosa excedeu-se a si mesmo,
conseguindo despertar, nas nossas populações indiferentes, a
chama sagrada da fé cívica.
E está na memória de todos o que foi essa campanha contra o
obscurantismo da política nacional, coroada pela vitória nas
urnas, fraudadas, em seguida, pelos malandrins da política
oficial, que despojaram Ruy Barbosa da vitória que a Nação
lhe conferira. Jurisconsulto de oracular sabedoria, orador de
asssombrosos recursos verbais, mestre incomparável do
idioma de Camões, escritor dos mais completos da época
moderna, senhor d'um estilo que vibra em todas as gamas e
d'uma foma que é musculo e sangue, o conselheiro Ruy
Barbosa é uma destas figuras inconfundíveis que mui
raramente, de século em século, honram a Humanidade. (...)
A Tribuna, 2 de março de 1923

" O eclipse de um genio... Com este monosílabo se definia um


mundo. Este mundo de fulgurações imprevistas se nos
afigurava tanto mais raro, quanto se continha no pequeno
espaço do cerebro de um homem ... Rompida, porém, quase
de súbito, a curva fechada da sua gravitação, em torno de um
sol, que acreditamos fosse o genio da Justiça, ele, se não veio
desaparecer, propriamente, pelo menos entrou em conjunção
com outras, eclipsando-se! (...) Enquanto existir pelo menos a
língua de Camões, Ruy, o seu maior poeta em prosa, não
passará! (...)
A cidade amanheceu enlutada sob a pressão causada no
espírito público pelo doloroso acontecimento. Cedo, ainda, o
comércio já apresentava o aspecto anormal dos dias tristes.
Mais tarde, hasteadas as bandeiras a meio pau, aumentou, se
possível, essa tristeza. À porta das redações, o povo procurava
informações sobre as homenagens que iam ser prestadas ao
eminente brasileiro, cujo corpo, já se sabia, deveria descer à
tarde, de Petrópolis para ser colocado em exposição no
edifício da Biblioteca Nacional. Ainda não passara a surpresa
do sucedido. O último comunicado da Agência Americana,
tranquilizava um pouco os admiradores do ilustre brasileiro,
que às 9 horas, mais ou menos, receberam a notícia do
desenlace. (...)
Ruy Barbosa foi, todos o recordam, quase vitimado pela
uremia, há poucos meses. O mal foi debilitado, mas deixou
completamente perturbadas as funções do resistente
organismo do eminente brasileiro. Adoecendo, agora, de
outro mal, Ruy Barbosa veio ainda a morrer em consequência
do envenenamento produzido por aquele ataque de uremia,
pois teve o bulho atingido pela infecção (...) A paralisia
tomara todo o corpo de Ruy Barbosa. A agonia foi rápida. Às
8,25 morriaplacidamente."
Rio Jornal, 2 de março de 1923

"Apagou-se ontem a grande vida de Ruy Barbosa. Não se


grafa esta frase friamente. Certos embora da condição
extremamente delicada da sua saúde, preparados para a
dureza do golpe que, de ha muito, ameaçava essa luminosa
existência, não soubemos afazer à brutal realidade do seu
desaparecimento. Profundamente consternados diante da
evidência sem remédio, não nos conformamos com a perda
formidável, senão para sentirmos ainda com maior dor a
incidência da cruel fatalidade.
Desmorona-se, com ele, o acume da mentalidade brasileira;
perde a América o seu maior cidadão vivo, e o mundo
civilizado uma das raras cerebrações potenciais que iluminam
de peregrino esplendor contemporâneo a sua cultura política,
jurídica e literária. (...)
Sessenta anos consumiu ele lutando por todas as causas
dignas de um gênio de mil faces e de um coração nutrido pelo
bálsamo da mais alta generosidade. (...)
De uma vida tão opulenta, vivida com tamanho fausto e
glória, baldado seria tentar mesmo uma síntese, com a
pretensão de fixar nos seus lineamentos mais típicos e uma
obra nos seus aspectos mais sensíveis. Falece-nos o engenho
ante a sombra do gigante. Não temos senão ânimo para
pranteal-o, e participar do luto que assombra a alma
inconsolável da Pátria. (...)"
O Paiz, 2 de março de 1923

"Os genios escapam à precacidade das coisas humanas. A


imortalidade só para eles não é uma palavra vã, porque só eles
podem viver, pela irradiação eterna da sua luz, para além do
perecimento da forma material em que se abrigaram. Por isso,
a morte, que nos arrebatou ontem Ruy Barbosa, não n'o
matou. Ele sobreviverá à fatalidade das leis que presidem os
destinos hymanos e o seu grande espírito, que anda todo
esparso na sua grande obra, viverá conosco e viverá com a
história pelos tempos adentro. (...)
Revelou-se sobretudo na memorável campanha civilista que
agitou o país em 1909 e 1910. São imortais - pode-se dizer -
os discursos e conferências que fez no Teatro Lyrico, da
Bahia, em S. Paulo, em Campinas, em Santos, em Belo
Horizonte, em Ouro Preto, em Juiz de Fora, a Plataforma do
Polytheama Bahiano e os manifestos à Nação.
É sem dúvida, a grande obra de Ruy Barbosa, a "República"
ao professor Carneiro. É o Ruy polemista, entre amargo e
agressivo, gramático e estilista. É outro trabalho de fôlego do
ilustre morto a revisão do Código Civil, mil e oitocentos
artigos, com longas e minuciosas notas. Como consequência
dele, nasceu a réplica. As duas obras se completam em
perfeição. (...)
Será transportado hoje, ao meio dia, para esta Capital o corpo
do eminente brasileiro. (...)"
O Brasil, 2 de março de 1923

AS MANCHETES:
A Morte do Gênio da Raça - Ruy Barbosa Faleceu, Ontem,
em Petrópolis, Às 8,25 da Noite ( A Pátria )
Ruy Barbosa - Clarão Extinto ( O Paiz )
O Eclipse de um Gênio ( Rio Jornal )
Um Golpe Irreparável do Destino . Morreu Ruy Barbosa -
Homenagens e Tributos de Gratidão da Alma Nacional ( A
Tribuna )
Finou-se O Expoente Máximo da Intelectualidade Brasileira -
O Páis Inteiro Chora, Neste Momento, A Morte de Ruy
Barbosa, O Maior De Seus Filhos
Foi Decretado Pelo Governo Luto Nacional Por 3 Dias -
Serão Prestadas Ao Grande Morto Honras de Chefe de
Estado, Correndo As Despezas Dos Seus Funerais Por Conta
da Nação. ( O Brasil )
31)Sinhô (1930)
" 'Sinhô', o cantor de uma série infindável de canções, trovás e
sambas, faleceu ontem, vitimado pela grave enfermidade que
a muito lhe minava o organismo. Quem não conheceu o
boêmio incorrigível, que foi o José B. de Lobo, o 'Sinhô', ou
melhor 'O Rei do Samba'?
Toda a população brasileira, e mesmo pelo exterior, o
trovador que desaparece era assás conhecido. Os seus sambas,
as suas marchas, as suas emboladas e cateretês eram
disputados pelos cantores.
Tinha razão de ser. 'Sinhô', fazendo a música, compunha
também os versos, daí a cadência e harmonia das suas
composições. Dedilando o violão com maestria, ele
empolgava desde que aparecia. No piano era apreciadíssimo,
quando tocando as suas composições. O reclame das suas
composições fazia ele mesmo, chefiando conjuntos, ora
tocavam em casa de música e ora percorriam as ruas da
cidade, muitas vezes iam parar em casa de famílias onde se
realizavam festas. Teve sua época.
Há muito, a tuberculose apoquentava-o. Ontem, quando
saltava de uma barca, vindo de Niterói, 'Sinhô' foi acometido
de uma forte hemopthise e sucumbiu. O seu cadáver foi
levado para a residência de onde hoje sairá o enterro."
Diário Carioca, 5 de agosto de 1930

"A morte de José Barbosa da Silva, o popularíssimo 'Sinhô',


já amplamente noticiada, compungiu verdadeiramente a
cidade que se diverte, e mesmo a que se não diverte. Sirva-lhe
de consolo ao espírito!
Ele, que tanto concorrera para a alegria da nossa gente, com
os seus sambas de expressão popular inegavelmente belas,
vivia, de ha uns anos para cá, doente e esquecido. Não
cantava mais, porque a tosse incessante não o permitia. E
lutava com as maiores dificuldades para viver. Magro, de voz
sumida, curvado ao peso da moléstia implacável que o
minava dia-a-dia, o 'Rei do Samba', por todos proclamado, era
um 'cadáver vivo' a arrastar-se pelas ruas da metropole.
Veio a morte, que todos os que conheciam 'Sinhô' esperavam,
e não houve quem não sentisse a perda do cantor. Todos, não.
O governo, nem mesmo depois de morto o infeliz, lembrou-se
de prestar-lhe uma homenagem, por singela que fosse, ao
verdadeiro criador da canção brasileira, genuinamente
brasileira, que tanto sucesso tem logrado aquem e além das
fronteiras do país!
O caixão de 3a classe, encerrando o corpo magerrimo do
autor de 'Jura' saiu, hontem, às 17 horas, num coche de igual
categoria, na capela do Hospital Hahnemaniano para uma
cova rasa no cemitério de S. Francisco Xavier. (...)"
A Pátria, 6 de agosto de 1930

"Na barca que vindo da Ilha do Governador atraca ao Pharoux


pouco antes das 18 horas, foi surpreendido pela morte de um
homem que se a Fatalidade lhe tivesse cerrado os olhos na
época em que a cidade, ha uns seis anos, tinha ainda aos
ouvidos o rumor da canção que fica sempre, palpitante, ainda
do Carnaval que se foi, talvez tivesse um terço da população
rendendo-lhe, compungida, a homenagem ultima na visita ao
seu corpo inanimado.
Foi ele José Barbosa da Silva, ou simplesmente o 'Sinhô', o
popular musicista, cujas canções de uma modulação
essencialmente carecterística lograram, indubitavelmente,
estupenda consagração.
Enfermo ha tempos, 'Sinhô', que atualmente quase não
produzia já, foi, por longo tempo, pode-se dizer, o mais
popular dos nossos compositores de músicas carnavalescas.
Empunhava com justiça, o sceptio de 'Rei do Samba' como o
chamavam, pois no gêenero bem poucos conseguiram ver as
suas produções alcançarem o exito das suas que chegaram a
varar fronteiras, logrando no estrangeiro o mesmo exito que
aqui.
Difícil tarefa seria catalogar-se, nesta nota apressada em que
não dissimulamos a surpresa que nos causou a morte do
popular compositor, quantas produções ele deixou. Foram
muitas é o que todos sabem, como bem poucos ignoram que
numerica, embora mais por intuição do que por cultura,
'Sinhô', principalmente na sua época aurea, não só compunha
como executava. A flauta, o violão e o piano lhe eram
familiares.
'Sinhô' morre aos 35 anos de idade. Residia com sua
companheira d. Nair Silva à rua Pio Dutra n. 44 na Ilha do
Governador. E recolhido que foi o seu corpo à capela do
Hospital Hahnemaniano, deve o seu enterro sair daí hoje à
tarde, para o cemitério de S. Francisco Xavier."
A Batalha, 5 de agosto de 1930

"A morte, numa das verdadeiras traições que constituem os


bruscos epilogos que ela impõe à vida das criaturas, acaba de
alienar do convívio da cidade uma das figuras mais
conhecidas e mais queridas do Rio, principalmente o Rio que
se diverte, fazendo-a desaparecer nos socavões sombrios do
desconhecido. J. B. Silva, o 'Sinhô', ou melhor, o Rei do
Samba, como a cidade inteira o sagrou, faleceu, ontem,
repentinamente, quando se achava em plena Praça 15 de
Novembro. Ocorreu tudo num minuto. Um ataque que se
ouviu, o baque de um corpo e as mãos frias da morte cerrando
os olhos daquele que foi o maior interprete da alma popular
nos últimos tempos.
Que singularidade! 'Sinhô', o Rei do Samba, o cantor das
almas, das ruas, morreu ao contato da alma das ruas, que ele
tanto amou e interpretou nos seus anseios, escrevendo
canções populares que andaram de boca em boca, na mais
larga extensão, correndo mundo. (...)"
A Crítica, 5 de agosto de 1930

" 'Sinhô' morreu, foi a triste nova que ontem compungiu a


cidade inteira. Poucos sabiam-lhe o nome verdadeiro - José
Barbosa da Silva - mas todos proclamavam 'Sinhô', como o
'Rei do Samba' e - diremos nós - como uma expressão lidima
da alma popular, nas suas alegrias, sambas alegres que muitos
perpetrou, e samas sentimentais, que tanto souberam
enternecer.
Foi a implacável tuberculose que vitimou 'Sinhô'. A sua voz
sumida, nos últimos dias de sua agitada existência - quanta
luta pelo pão nosso de cada dia! - não lhe permitia mais
cantarolar, em rodas amigas, o seu 'último samba', de era ele,
sempre, tão cioso; dava, porém, e com exatidão, a certeza de
que aquela carcassa, que se locomovia a custo, vibrava ainda,
cheia de esperanças, para que vibrassem, também, o coração
bem brasileiro da nossa gente e o espírito das nossas causas e
dos nossos costumes.
'Sinhô' esplendeu nas ruas, nessas ruas da nossa grande
metropole, que recebem e acolhem os gritos dos que têm alma
e fé, gritos que os salões engalanados, por incomparável
vergonha, não querem ouvir, mas que são a expressão
definida do nosso amor, dos nossos costumes, da nossa vida.
E aqui ficam estas simples e rápidas palavras do seu
necrologio. Para a tumba de 'Sinhô', no campo santo, não
desceu somente o corpo mirrado do tuberculoso, que se foi:
desceu, também, a exuberância de nossa alma nos ritmos
brasileirissimos da música nossa, expressiva, alegre, as vezes,
sentimental quase sempre."
O Globo, 5 de agosto de 1930

AS MANCHETES:

A Morte do 'Rei do Samba' - O Pezar da Cidade, Pelo


Desaparecimento de 'Sinhô', O Seu Cantor Predileto ( A
Pátria )
Os Imprevistos da Morte - 'Sinhô', O Rei do Samba Faleceu
Repentinamente
( A Crítica )
Faleceu, Ontem, Repentinamente, O Popular Compositor
'Sinhô'(A Batalha )
Um Violão de Luto - O Falecimento de 'Sinhô' ( O Globo )
32) Revolução de 30 (1930)
"Os primeiros boatos que circularam na cidade diziam que o
movimento revolucionario rebentara em Bello Horizonte.
Succederam-se outras noticias. O agitador Assis
Chateaubriand, bem como o Sr. Nelson Paixão, redactor do
"Diario da Noite", teriam sido presos. Momentos após, a
nossa reportagem era informada que a policia havia
effectuado mais a prisão de varios jornalistas pertencentes aos
jornaes "Diario da Noite", "O Jornal", "A Batalha", "Diario
Carioca" e "A Patria".
Em todos os quarteis da cidade, a promtidão era rigorosa. O
quartel-general, do mesmo modo, mantinha-se guarnecido por
um grande numero de sentinellas. Em varios pontos da cidade
viam-se piquetes de cavallaria e a estação da Central do Brasil
mantinha-se vigiada por um grande numero de agentes
policiaes, que fiscalisavam a entrada e sahida de pessoas. (...)"
A Crítica, 4 de outubro de 1930

"Apesar do terrorismo dos fantasiados pela imaginação


exaltada de certos derrotistas, o rythmo normal da vida
carioca não soffreu alterações de natureza alguma. O mesmo
movimento dos dias communs, a mesma calma imperturbavel
que é caracteristica não se modificou.
A cidade quase não commentou o que os boatos vehiculavam.
Nas casa de diversões a concurrencia foi normal. Os cafés e
logares publicos apresentavam o aspecto de sempre, algo
mais vivo por ser sabbado - dia ordinariamente consagrado a
expansões maiores.
A Avenida - mostruario da elegancia e da fitilidade do Rio -
não se despovoou, nem, ao menos, seu ruidoso movimento
envolvente. Não se viam physionomias sobressaltadas, nem
se ouviam commentarios reciosos.
Estava sob a mais completa calma a cidade, hontem. E, o
carioca, generoso, bom, nobre, e respeitador, teve seu somno
absolutamente tranquillo."
A Crítica, 5 de outubro de 1930

"Deante da situação anormal creadas pelos acontecimentos de


Minas Geraes e do Rio Grande do Sul, despertando os
appetites de alguns retalhistas inescrupulosos, que pretendiam
explorar o povo, o governo da Republica resolveu tomar
immediatas e energicas providencias, tendentes a evitar o
assalto á bolsa do povo.
Apezar das difficuldades de transporte entre os Estados de
Minas e Rio Grande, nada justificava o assalto dos
"profiteurs" do momento (...)"
A Crítica, 8 de outubro de 1930

"A impressão causada no espirito publico pelo manifesto do


presidente Washington Luis prova a necessidade de um
contacto permanente entre os governantes do paiz. Os moldes
da nossa republica isolaram do povo os seus dirigentes. Desse
isolamento se aproveitam os exploradores para a interpretação
capciosa de certos actos governativos que permaneceriam
inattingiveis ao desvirtuamento si a palavra presidencial os
defendesse perante a Nação. (...)
O presidente Washington Luis - si já tinha a confiança do
Brasil que trabalha e deseja prosperar em paz multiplicou,
com o seu manifesto, a efficiencia do apoio que a Nação lhe
dava. Nada falará melhor do que esse documento sobre a
indignidade do golpre desferido contra o Brasil quando os
beneficios de um quadriennio honesto e laborioso se
reflectiam em todas as classes.
A magoa do patriota não diminue, porém, a sua fé. Fortalece-
a . Á politica do Rio Grande do Sul coube, para maior
sorpreza do administrador probo, o papel de Brutus. A
unidade sulina recebeu do governo Washington Luis os
maiores auxilios e honrarias.
Escolhido para ministro da Fazenda neste Governo, o Sr.
Getulio Vargas habilitou-se á presidencia do seu Estado
graças ao prestigio que lhe adveio dessa escolha. A sua
lealdade é conhecida do paiz. Passando por cima de um
documento garantindo a sua colaboração na questão da
candidatura presidencial - elle candidatou-se á revelia dos
compromissos assumidos. Declarando acceitar o veredictum
das urnas como epilogo da sua felonia, elle armou, ou
consentiu que se armassem, os seus correliogionarios.
Brutus em escala maior, o Sr. Getulio Vargas depois de
apunhalar pelas costas o amigo, apunhalou pelas costas o
Brasil. (...)"
A Crítica, 11 de outubro de 1930

"O termo da intimação, dirigida ao presidente Washington


Luis, estava redigido nos seguintes termos:
Rio de Janeiro, 24 de outubro de 1930 - Exmo. Sr. presidente
da República - A Nação em armas, de Norte a Sul, irmãos
contra irmãos, paes contra filhos, já retalhada, ensanguentada,
anseia por um signal que faça cessar a luta ingloria, que faça
voltar a paz aos espiritos, que derive para uma benefica
reconstrução urgente as energias desencadeadas para a entre
destruição.
As forças armadas, permanentes e improvisadas têm sido
manejadas como argumento civico para resolver o problema
politico e só têm conseguido causar e soffrer feridos, luto e
ruina, o descontentamento nacional, sempre subsiste e cresce,
porque, vencida, não pôde convencer-se de que, o que teve
mais força, tenha mais razão. O mesmo resultado reproduzir-
se-á como desfecho da guerra civil, a mais vultosa que se viu
no paiz. A solução politica, a integridade da Nação, o decoro
do Brasil e até mesmo a glória de v. ex. instam, urgem e
imperiosamente commandam a v. ex. que entregue os
destinos do Brasil, no actual momento, aos seus generaes de
terra e mar.
Tem v. ex. o prazo de meia hora a contar do recebimento
desta para communicar ao portador a sua resolução e, sendo
favoravel, como toda Nação livre o deseja e espera, deixar o
poder com todas as honras garantidas.
(aa.) João de Deus Menna Barreto, general de Divisão,
inspector do I Grupo de Região; João Fernandes Leite de
Castro, general de Brigada, commandante do 1o DAC;
Firmino Antonio Borba, general de Brigada, 2o sub-chefe do
EMB; Pantaleão Telles, general de Brigada, e varios generaes
e almirantes de que não houve tempo de colher as
assignaturas.
Pela Avenida Rio Branco corria anormal o movimento. O
povo - depois de longa tyrannia e liberto, saltava, pulava,
dando expansão á alegria immensa que o empolgava.
Automoveis, repletos de militares, em fraternal mistura com o
povo, passavam aos gritos de - Viva a Revolução! - Viva João
Pessoa! - Viva Getulio Vargas!
É quando um carro passa, repleto de elemento civil. Ha um
movimento geral de curiosidade. O povo cala-se por instantes.
Foi obra de um segundo. Immediatamente, um grito irrompe
em todas as bocas: - Mauricio! Era o Mauricio de Lacerda
que passava.
O grande tribuno, notava-se sem sua phisionomia alegre,
transpirando jubilo intenso, estava cansado e mantinha-se ali,
com custo porque (talvez effeito dos rudes golpes por que
passou nestas duas ultimas semanas) elle estava mais magro,
e abatido, physicamente.
O povo pediu, em altos brados, que Mauricio, o seu
estremecido tribuno, falasse.
Mauricio, entretanto, não poude fazel-o. Limitou-se a sorrir,
enquanto dirigia um cumprimento ao povo e acenava com as
mãos pedindo-lhe calma.
Depois, a massa popular que cercava-lhe o auto abriu alas,
dando-lhe passagem, aos gritos de: - Viva Mauricio! Viva
Getulio Vargas! Viva a Revolução!
Pouco atrás do carro em que vinha Mauricio, o povo
agglomerava-se, aos gritos, incessantes, de "Viva a
Revolução", emquanto acenava com varios pedaços de
pannos vermelhos ao ar.
Approximámo-nos, e, então, pudemos comprehender a causa
do enthusiasmo do povo. Ali estava, parada, a "barata" n.
12.026. No seu interior uma moça gentil e bella rasgava o
vestido de côr rubra, para distribuir os pedaços entre o povo.
Quizemos falar-lhe, mas foi impossivel, tão compacta era a
massa popular que cercava a sympathica brasileira! (...)
O povo suburbano, constituido na sua grande parte pelos
menos favorecidos da fortuna, explodiu em vibrantes e
enthusiasticas manifestações, dando expansões ruidosas ao
seu incontido jubilo pela victoria dos ideaes revolucionarios.
Os sentimentos de revolta do povo, por tanto tempo
suffocados pelos actos da mais torpe prepotencia, romperam
tumultuosos, enthusiasticos e delirantes. (...)"
A Esquerda, 24 de outubro de 1930

"Neste instante é difficil fixar no papel, no torvelinho da hora


historica que a Nação atravessa, as impressões extraordinarias
que nos envolvem. O aturdimento da victoria inebria o povo.
Defronte á nossa redacção, povo e exercito, povo na sua mais
ampla expressão, senhoras e crianças, em verdadeiro delirio,
acclamam a liberdade.
A Avenida é toda uma visão alucinante. Os aviões cortamn-a
sob a vibração das massas. As sirenes atordoam. Em outros
pontos, defronte do Paiz e da Noticia as fogueiras
improvizadas pelo povo consomem jornaes velhos, livros,
escrivaninhas, cadeiras, tudo quanto o povo, no primeiro
impeto arrancou de dentro daquelles jornaes atirando para a
rua.
Pelas ruas desfilam multidões inebriadas. O espetaculo é
emocionante. A cidade está sob a impressão de desafogo.
Apparecem retratos de Getulio Vargas, em quadros
estampados, deante dos quaes o povo prorompe em vivas.
Era de causar funda impressão o verem-se senhoras quando
mais viva era a agitação distribuirem flores ao povo. Lenços
vermelhos, bandeiras vermelhas, um delirio vermelho
vermelho empolgou a capital. O povo victorioso explodia em
vibrações permanentes. São 11,30. (...)
Diário da Noite publica com o jubilo natural o documento
abaixo, dictado nesta redacção, á hora em que chegava á
Avenida Rio Branco noticia da quéda do governo, pelo
capitão Raymundo da Silva Barros, do Corpo de Intendencia,
a valorosa corporação que se associou immediatamente á
causa do povo.
São as seguintes as palavras do valoroso militar que falou ao
povo de uma das janellas deste jornal, o primeiro militar que
falou sobre o golpe definitivo da Revolução.
Pela madrugada de hoje, ás 5,30, os officiaes, general Menna
Barreto, Firmino Borba e Leite de Castro e João Gomes
Ribeiro Filho, apoiados pelo 1o C/P de São Christovam
lançaram um manifesto aos militares da 1a Região,
convidando para o pronunciamento militar que fizesse para de
uma fez para sempre o modo impatriotico de governar o
Brasil.
Nesse momento o coronel Bastos, da Intendencia da Guerra,
parlamentou com o 1o grupo para saber se se tratava de uma
resolução definitiva e não de um embuste.
Á adhesão do grupo depuzemos immediatamente o general
Xavier de Barros que não oppoz resistencia. Esse official
general tinha em seu poder um documento pelo qual lhe
haviam sido adiantados para operações 1.000 contos de réis
pelo Banco do Brasil.
Reuniu-se immediatamente o Conselho de Administração
para tomar conta dos dinheiros publicos, sendo presos e
desarmados, quando se hasteavam a bandeira brasileira e
revolucionaria o coronel Heitor Abrantes e tenente Ravedutti.
o 1o de Cavallaria fez a guarda da revolução, reaffirmando o
valor patriotico de seus homens que vivavam a causa do povo
e mantendo as suas tradições de heroismo, apoiados pelo 1o
Grupo de Artilharia Pesada, disposto e prompto a proteger a
marcha revolucionaria sobre a capital.
São essas as palavras que nos ditou, entre vivas e
acclamações o capitão Silva Barros que o povo pediu que
falasse e que depois saiu carregado pela multidão para reunir-
se aos seus companheiros."
Diario da Noite, 24 de outubro de 1930

"Após um periodo de 21 dias de allucinante expectativa e


fundas appreensões, os imperativos da alma popular
determinaram os memoraveis acontecimentos que
culminaram, hontem, nessa apotheose á liberdade coroando a
redempção de um povo nobre e altivo, que parecia pequeno
porque permanecia de joelhos.
Trazendo no peito o fogo sagrado que levou João Pessôa ao
sacrificio supremo da vida, abalado pelo enthusiasmo santo
que o patriotismo communica a todas as almas bem formadas,
o povo carioca saiu hontem para a rua, realizando
galhardamente a conquista de seus direitos conspurcados.
Vibrando em estos de civismo, delirante de alegria, na qual
tomaram parte senhoras e creanças, ao tremular do Pavilhão
Nacional a ao aceno dos lenços vermelhos, symbolos e
distinctivos da revolução redemptora, soube o povo, usando
de suas prerogativas de conscio de seus deveres, dar o
merecido castigo a todos quantos tripudiavam sobre a caudal
de sangue patricio, generoso e bom que a caricata de um
Cesar de papelão desencadeára sobre o solo da Patria.
Castigou e purificou a fogo o ambiente emprestado pela
covardia inonimavel dos lacaios agachados por traz dos
communicados officiaes, supremo escarneo atirado ás faces
de um povo, cuja capacidade de soffrimento se esgotou,
emfim.
E no momento justo em que a Nacionalidade reclamava a sua
collaboração decisiva, eil-o que entra em acção vibrando o
golpe de misericordia, na tyrannia inconsciente e moribunda.
Da sua actuação na jornada gloriosa de patriotismo e
redempção, que hoje inicia a sua primeira etapa vitoriosa,
damos a seguir detalhados informes. (...)
Desde as sete horas da manhã, que a aristocratica Avenida
Atlantica, se encontrava em verdadeiro delirio e sob os
impulsos incontidos de alegria sem par, que a todos causou a
victoria da revolução brasileira.
Nas immediações do Forte de Copacabana - o tradicional
forte da immortal epopéa dos dezoito heróes - a massa
popular era consideravel.
Ali, como em todo o percurso da elegante praia, o
enthusiasmo dos moradores, attingiu ao auge, e, á passagem
de carros conduzindo praças revolucionarias, todas com um
laço vermelho no fuzil ou na farda, o povo prorompia em
vivas ardorosos ao "Brasil Livre" e á "Revolução Victoriosa".
Senhoras e crianças, populares e militares viveram horas da
mais completa confraternização.
Foi um brilhante espetaculo, o da manhã de hontem, na
aristocratica avenida, espetaculo que se prolongou até á noite.
O povo na sua incontida expansão de vindicta contra os
conspurcadores de sua liberdade, praticou varias depredações.
Os mais sacrificados com a ira do povo foram os jornaes que
apoiaram o governo derrubado.
Assim as sédes dos jornaes "A Noticia", "A Critica",
"Vanguarda", "Gazeta de Noticias", "A Ordem", "O Paiz,
"Jornal do Brasil" e "A Noite" foram violentamente alvejados.
Destes, as redacções do "Jornal do Brasil", "A Noite" e "O
Paiz" e as officinas da "Gazeta de Noticias", chegaram a ser
incendiadas, sendo necessario o comparecimento do Corpo de
Bombeiros para abafar as chammas. O edificio da "A Noite"
ficou damnificado até ao 4o andar, alem das avarias da
redacção.
Enquanto isso, o povo victoriava "A Esquerda" e "A Batalha"
e outros orgãos das sympathias populares eram victoriados.
(...)
A Batalha, 25 de outubro de 1930

"Triumphou hontem em toda a linha, pela intervenção dos


generaes que intimaram o Presidente da Republica a deixar o
poder, triumphou desde as primeiras horas nesta capital e
pode-se considerar victoriosa em todo o paiz, a revolução
desencadeada por Minas Geraes, Rio Grande do Sul,
Parahyba e elementos de outros Estados, contra o governo da
Republica.
Movimento de reivindicações legitimas, necessarias á
normalização do paiz, perturbado pelas injustiças do poder -
foi uma revolução eminentemente civil, dos elementos
politicos e populares dos governos estaduaes irmanados com
o povo, a que as forças armadas do Exercito e da Marinha,
confraternizadas com a Nação, como sempre, em todas as
phases graves da nossa historia, déram o concurso
indispensavel a uma decisão mais rapida.
Minas Geraes teve, por seu governo e pelo seu povo, um
papel preponderante nesta grande jornada civica.
Ainda ao Rio Grande do Sul e a Parahyba, foi o nucleo
central da resistencia e da offensiva contra o governo que,
transviado da sua missão, tendo enveredado para os caminhos
da prepotencia e da injustiça, interveiu nos dissidios politicos,
empregando em favor de um grupo todos os recursos que ao
poder foram dados para garantia de todos, para tranquillidade
e progresso da Nação.
É cedo nesta primeira hora, de paixões ainda candentes, é
cedo para julgar definitivamente da conducta que entendeu
observar o ex-presidente, homem honrado, de qualidades sem
duvida apreciaveis, probidade, caracter e patriotismo, mas
violento e obstinado, que a ninguem ouvia, ou antes só
obedecia ás inspirações da sua vontade discrecionaria.
Não lhe falaram com franqueza seus ministros e conselheiros,
ou não os escutou.
De que a norma por elle adoptada no exercicio da sua
magistratura, que desviou de sua verdadeira missão
pacificadora - prova a revoluçÃo, ora victoriosa em todo o
paiz e nesta Capital, por entre demonstrações de regosijo
popular bem maiores do que as que assignalaram o advento
da Republica.
É o regimen que sahe victorioso desta provação, a que o paiz
inteiro se associou orientado e dirigido por um pugilo de
patriotas destemerosos civis e militares, cujos nomes estão já
inscriptos no kalendario republicano como regeneradora de
uma época, descortinando o futuro.
Getulio Vargas, Olegario Maciel, Antonio Carlos, Arthur
Bernardes, Oswaldo Aranha, Juarez Tavora, e seus bravos
companheiros de armas, Flores da Cunha, João Neves, e
tantos outros heroes, civis e militares, desta jornada de altivas
repulsas e corajosas affirmações, com os generaes e
almirantes que hontem déram o golpe final da campanha,
assumiram grandes compromissos com a Nação.
Estamos seguros de que vão abrir para o Brasil um novo acto
de garantias effectivas, de trabalho, de progresso, e
civilização.
Liberdade e Justiça sejam o lemma desse periodo historico,
que se abre para a nossa patria, deante do olhar vigilante do
continente e do mundo.
Liberdade, autoridade, direito, justiça - tudo isso temperado
pela equidade, emanação da bondade constructora.
Bondade que desarma e pacifica, fundando os alicerces do
edificio social no coração do povo, fraternisado e feliz. Viva a
Republica! Viva o Brasil unido e forte!"
A Patria, 25 de outubro de 1930

"A população do Rio de Janeiro sabe que o edificio da A


Noite foi assaltado, que as suas officinas foram quasi
totalmente destruidas, que os escriptorios e empresas
installados no arranha-céu foram roubados, mas ainda não
conhece os autores dessas brutalidades, que surprehenderam a
todos, e ninguem attribuiu, nem poderia logicamente attribuir,
ao generoso, ao culto povo carioca.
As attitudes da A Noite no momento que passava não
explicariam taes crimes, que tiveram origem no odio e na
inveja, procurando aproveitar-se de uma situação anormal
para destruir um jornal em cujas columnas têm amparo todos
os desgraçados e que despende uma média mensal de trinta
contos para soccorrer os necessitados que batem á sua porta.
O jornal que tem aberto em favor dos humildes as
subscripções mais vultosas, que dá conta minuciosa, aos
doadores dos donativos que lhe são entregues, que tem
collocado nos hospitaes milhares de enfermos pobres, que
levanta das ruas os infelizes sem tecto, que affronta os
poderosos na defesa dos fracos, nunca seria, e não foi atacado
pelo povo a que se devotou.
Conforme declarações espontaneamente feitas deante das
novas autoridades, alguns communistas, auxiliados por
individuos despedidos da A Noite, no momento em que se
atacava O Paiz, conseguiam arrastar os elementos
communistas e grupos de individuos fluctuantes, sem
classificação,, nem idéas, para atiral-os contra a nossa folha,
cujos empregados, em grande parte, como adiante
demonstraremos, estavam nas fileiras da revolução,
enfrentando os corpos que ainda não se haviam definido
contra o governo.
Na A Noite, á hora do assalto, estavam, apenas, um dos
directores da Sociedade Anonyma, o gerente, o redactor-
chefe, alguns empregados do escriptorio e parte do pessoal
das officinas.
Quando os aggressores se aproximaram, suppondo-os
revolucionarios, recebemol-os como amigos janellas e portas
abertas. Um delles, porém, destacando-se exigiu que
arriassemos a bandeira nacional, hasteada no terceiro
pavimento, gritando-nos: - Arrie a bandeira burgueza! Outro
exigiu: - Levanta a bandeira vermelha!
Fizemos então baixar as portas exteriores de aço. Uma dellas
foi arrebentada com auxilio de um caminhão. Arrancada de
nosso fachada a bandeira do Brasil, foi pisada pelos
communistas, que a rasgaram, levando um de seus pedaços
como um trophéo, a redacção do "Diario da Noite", como
noticiou esse vespertino.
Assistimos depois á invasão do nosso edificio e á depredação
do nosso material. Pensamos no primeiro momento que
soffriamos, apenas, a "revanche" do communismo e só mais
tarde viemos a saber que outros elementos por despeito e
inveja tinham-se reunido aos subversores da sociedade. (...)"
A Noite, 4 de novembro de 1930

AS MANCHETES:
As Ultimas Informações Sobre O Movimento Subversivo De
Minas Geraes e Rio Grande - Foi Decretado O Estado De
Sitio Para Minas, Rio Grande, Parahyba, Districto Federal E
E. Do Rio ( A Critica )
As Tropas Federaes Estão Senhoras Da Situação - Reina
Completa Calma Em Todo O resto Do Paiz - Todas as Altas
Patentes Do Exercito Solidarias Com O Governo ( A Critica )
Como Será Feito O Abastecimento De Generos Alimenticios
Á Cidade - O Governo, Attento, Ao Bem Estar Publico, Toma
Energicas E Efficazes Providencias Para O Abastecimento De
Generos Á População ( A Critica )
Brutus ( A Critica )
Num Gesto Que Bem Define A Sua Mentalidade E Tanto
Ennobrece Os Seus Sentimentos, O Povo Da Capital Da
Republica Acaba De Vibrar O Golpe Decisivo Nesse Montão
De Miserias E Sordices Que Era O Governo Que Acaba De
Cair, Afogado Na Propria Ignominia. Precipitando Os
Acontecimentos E Dando A Victoria Á Causa Sagrada Da
Patria, O Povo Carioca Pôz Um Dique, Á Caudal De Sangue
Desencadeada Pelos Moribundos E Avultou, Aureolado, No
Coração Do Brasil - Salve Povo Carioca!
( A Esquerda )
Viva O Brasil! Viva A Republica Nova E Redimida! Os
Ideaes Da Patria Venceram! ( Diario da Noite )
O Sr. Washington Luis Que, Diziam Os Seus Amigos, Era
Destemido E Bravo, Teimoso E Valente, capaz De Morrer No
Seu Posto, Sem Recuar, Teve Medo Do Povo. Teve Medo E
Até Ás 14 Horas De Hontem Permanecia No Palacio
Guanabara, De Onde Teimava Em Não Sair, Porque O Povo
Estacionava Nas Immediações. Doloroso Epilogo De Uma
Farça; Triste Fim De Um Regabofe Indecoroso Que Se Esvae
Por Entre Arrepios De Pavor E Temores De Medo...
( A Batalha )
Alliando-se Á Republica Triumphante, Os Generaes De Terra
E Mar Apressam A Victoria. O Povo Carioca, Numa
Confraternização Commovedora, Tomou Parte Na Arrancada
Final Em Que As Forças Armadas Depuzeram O Governo
Que Nos Infelicitava E Desagradava. O Ex-Presidente Foi
Conduzido, Preso, Para O Forte De Copacabana. A Victoria
Da Revolução ( A Patria )
As Attitudes Da "A Noite" ( A Noite )
33) Cristo Redentor (1931)
"A cidade está em festa e com ela o Brasil inteiro, pela
inauguração, no ápice da mais linda montanha da capital da
República, do esplendido monumento que a nação consagra
ao Redentor da Humanidade. Não há coração que deixe de
vibrar da mais pura alegria pela celebração do acontecimento
grandiloquo. Cristo, do alto da colina magnífica, abençôa a
cidade e abençôa o povo que lhe implora, ungido de fé,
conduza os homens ao caminho sublime da perfeição.
Foi um espetáculo soberbo, de inesquecível majestade a
bênção do monumento ao Cristo Redentor, pela manhã de
hoje. Estavam presentes, no alto do Corcovado, as altas
autoridades eclesiasticas e civis, e, enquanto se efetuava a
bela cerimônia, uma esquadrilha de aviões deslisando,
tranqüila, pelos ares macios da manhã lançava braçadas de
flores sobre a imagem de Jesus. Os sinos de todas as igrejas
bimbalhavam festivamente. Um momento de inenarável
emoção. (...)
A CompanhiaRadiotelegráfica Brasileira e Marconi, ele
mesmo, haviam guardado um profundo sigilo em torno da
prova que o grande inventor deveria fazer ontem à noite
iluminando de Roma a estátua de Cristo Redentor. Marconi
desde sexta-feira passada se comunicava com o Sr. René
Bouglé, diretor geral da Radiotelegráfica, dizendo-lhe que
desejava fazer domingo, às 19 ¼ , uma experiência de
transmissão de onda elétrica afim de acender os refletores que
deveriam iluminar a estátua. O diretor geral da
Radiotelegráfica deu conhecimento do desejo de Marconi
apenas aos diretores dos Diários Associados, Srs. Gabriel
Bernardes, Paulo Rapaport e Assis Chateaubriand. Tratava-se
de uma experiência e por isso mesmo os diretores da Radio
não desejavam dar-lhes maior divulgação. (...)
Às 18 ¾ os diretores dos Diários Associados já se
encontravam na sala de aparelhos da Companhia, que fica no
4o andar do edifício Hasenclever, na Avenida Rio Branco.
(...)
Às 19 e 14 todos os corações palpitavam. Faltava um minuto,
e esse minuto era uma eternidade. Uma eternidade tanto mais
imensa e angustiosa quanto ela durou, pelo relógio da sala,
120 segundos.
Às 19 e 16 minutos todos os olhares da sala que se fixavam
para a janela donde se divizava o Corcovado viram o céu
cortado de um halo luminoso. Dentro da massa de nuvens, as
fulgurações de luz rompiam bravamente a escuridão. Três
minutos após, os rolos pardacentos se dissipam e o Cristo
branco, com as suas mãos imensas de perdão e de ternura,
fulgia no topo da montanha, inundado de caridade boreal. O
milagre de Marconi se tinha traduzido em todo o seu
esplendor."
Diário da Noite, 12 de outubro de 1931

"A data de hoje transcorre, com as imponentes cerimonias


liturgicas que se estão a celebrar, festejando a inauguração do
monumento do Cristo Redentor, ficará nos anais do
catholicismo como um dia enaltecido por alta, significativa e
eloquente afirmação de fé.
Do país inteiro e ainda de vários outros pontos do continente
acorrem à formosa capital do Brasil, guiadas pelos baculos
pastorais de cinco dezenas de veneráveis prelados, milhares
de peregrinos cristãos, os quais, nesta manifestação de crença
que redunda também numa demonstração de fraternidade,
trazem a oblata das suas preces contrictas ao Cristo-Rei. (...)
Hoje, às 16 horas, começará na praia de Botafogo, a
inauguração oficial do Monumento a Cristo Redentor. Nessa
ocasião proferirão breves palavras, D. João Braga, Arcebispo
de Curitiba; D. José Pereira Alves, Bispo de Niterói; Conego
Dr. Henrique Magalhães, professor Alcebiades Delamare
Nogueira da Gama, da Faculdade de Direito e Mario
Michelotto, em nome dos operários católicos. Logo após, a
estátua monumental de Cristo Redentor será iluminada da
Itália, pelo senador Marconi. Em seguida à iluminação,
haverá um grandioso prestito luminoso em honra de Cristo
Redentor. Desfilarão as Ligas Católicas, podendo no mesmo
tomar parte todos os católicos, munidos de lanterna.
O cortejo luminoso será em terra e no mar, porquanto os
pescadores fiéis às tradições do nosso povo, darão o seu
concurso, comparecendo em os seus barcos. Além do mais
também as lanchas e outras embarcações aderiram. A nossa
marinha também concorrerá para o maior brilho da festa,
iluminando especialmente alguns dos nossos vasos de guerra.
(...)"
A Esquerda, 12 de outubro de 1931

"Inaugura-se, hoje, o monumento a Cristo Redentor, ereto no


cimo da montanha do Corcovado. Obra de arte que diz,
eloquentemente, do acendrado espírito religioso dos católicos
no Brasil, fica a simbolizar, através da majestade da obra de
arte, os anseios de fé e de paz que animaram aqueles que
empreenderam as cruzadas em prol do seu levantamento no
alto da montanha mais elevada da Guanabara. (...)"
Diário de Notícias, 12 de outubro de 1931
"A semana do monumento a Cristo Redentor, que se ergue no
alto do Corcovado, constituindo-se a maior estátua do mundo,
encerrou-se ontem.
A despeito da chuva que durante todo o dia caiu sobre esta
Capital, as solenidades da bênção da estátua e da missa
campal no stadium do Fluminense nada perderam da sua
pompa liturgica. O povo compareceu a ambas sem que o mau
tempo lhe arrefecesse o entusiasmo com que nesses últimos
oito dias vem participando das festas realizadas aqui desde o
dia 4 corrente.
O ato culminante de domingo foi a Hora Santa do Brasil,
realizada na matriz de Sant'Anna. Quando os relógios
marcavam as 16 horas, todo o interior do templo tradicional
se iluminou. E quem àquela hora ali chegasse já não
encontraria um lugar vago. A velha igreja fôra decorada para
que nela se realizasse a cerimônia. O altar-mór, ostentando a
imagem de Sant'Anna, estava adornado com lírios brancos.
Pela cúpula, de espaço a espaço, panejavam-se bandeiras do
Vaticano e do Brasil. Bem ao centro via-se uma grande corôa
dourada, forrada de púrpura. Desprendiam-se dela quatro fitas
largas de cor vermelha, descendo até ao meio de quatro
colunas. Simbolizava essa corôa a realeza de Cristo entre os
homens. O povo se comprimia nas partes laterais e ao fundo,
no recinto da igreja. Os bispos ocupavam as cadeiras do
presbitério. O clero regular e secular distribuia-se em boa
parte do templo. Quinze minutos depois das 16 horas dava
entrada no templo o cardeal Legado. Sua Eminencia dirigiu-
se à capela-mór, ocupando depois das orações a curul
cardinalicia que lhe fora destinada. (...)"
Diário de Notícias, 13 de outubro de 1931
"A cidade se reveste, neste dia, das mais sublimes galas
espirituais, por motivo da bênção solene da grandiosa imagem
do Cristo Redentor, erigida no Corcovado.
O caminho que vai das Águas Ferreas ao Corcovado era hoje
um ir e descer contínuo de católicos e romeiros, que todos
ansiavam por assistir à cerimônia da inauguração da estátua
de Cristo, erguida no cume do monteque domina a cidade.
Espetáculo de fé que não se costuma reproduzir muitas vezes
na vida dos povos. Desde o Largo do Machado via-se o
interesse que a festa de hoje estava despertando no coração e
no espírito do povo. Os bondes despejavam centenas de
criaturas, que disputavam, aos grupos, os carros da Estrada do
Corcovado. Nas casas fronteiras, apalacetadas, viam-se
colchas ricas de damasco cobrindo as janelas e sacadas, como
uma homenagem aos prelados das várias doiceses brasileiras
que vieram assistir à cerimônia.
Trafegaram pela manhã quatro trens especiais, destinados
respectivamente ao transporte do chefe do governo e
membros da administração, do cardeal D. Leme, prelados e
figuras do clero, da imprensa e dos convidados especiais. O
carro do Sr. Getúlio Vargas ia literalmente cheio, vendo-se
além de Sua Exma. esposa todos os ministros, membros da
casa civil e militar da presidência, e outras pessoas gradas.
Em frente à estação do Corcovado, numerosas pessoas do
povo aguardavam as autoridades e dignatários da igreja,
estabelecendo-se grande movimento naquele trecho das
Laranjeiras.
No alto da montanha teve então lugar a cerimônia da
inauguração da estátua de Cristo. Vários oradores se fizeram
ouvir, exaltando a figura do Messias, que se sacrificou pela
humanidade.
Houve inicialmente a bênção do monumento, cerimônia em
que oficiou o cardeal D. Leme, seguindo-se a missa solene,
celebrada por D. Aloisio Masella, nuncio apostólico.
Seguiram-se os discursos eloquentes do arcebispo D. João
Becker, arcebispo de Porto Alegre; Dr. Pandiá Calogeras,
professor Fernando Magalhães, da Universidade do Rio de
Janeiro. À última hora, continuava a solenidade, fazendo-se
ouvir os oradores do programa. D. Sebastião Leme leu na
cerimônia uma bula declarando enthronisada a imagem de
Cristo no Brasil."
A Noite, 12 de outubro de 1931

"A cidade assistiu, ontem, deslumbrada, com a inauguração


do monumento do Redentor, mais uma experiência
sensacional, realizada, da Itália, por Guglielmo Marconi, na
data histórica da descoberta da América.
Um gênio da ciência contemporânea iluminou, de sua pátria
distante, berço do Catolicismo, e onde nasceu o descobridor
do novo continente, a imagem de Cristo, fazendo-a
resplandescer no Corcovado à hora exata que fora anunciada.
(...)
Às dezenove horas, diante dos poderosos aparelhos da
Companhia Radiotelegráfica Brasileira, o Sr. Bouguier, com
os fones aos ouvidos recebe de Coltano a hora justa. Daí a
quinze minutos, Marconi enviaria através da estação italiana a
centelha elétrica que deveria mover a alavanca para a
iluminação do monumento a Cristo Redentor, no alto do
Corcovado. (...)
O Sr. Vittorio Cerrutti, embaixador da Itália junto ao governo
do Brasil, recebeu, às 19.20 horas, a seguinte mensagem de
Guglielmo Marconi.
- Sinto-me sobremodo satisfeito pelo fato de um feixe de
ondas, por mim lançado no espaço, iluminar a estátua
gigantesca do Cristo Redentor, que os brasileiros acabam de
erigir sobre o Corcovado, como símbolo de sua fé, invocando
a proteção divina para o seu país e para a humanidade. Envio
uma saudação fervorosa ao Brasil, a nobre nação na qual
tantos compatriotas meus t6em encontrado uma segunda
pátria. Comprazo-me em haver juntado um novo élo à forte
cadeia que estreita a Itália ao Brasil e que permite às duas
grandes nações latinas irmãs uma elevada colaboração em
prol do progresso e da civilização do mundo. Roma, 12 de
outubro de 1931. (a) Guglielmo Marconi."
O Jornal, 13 de outubro de 1931

"Apesar do tempo mau que reinou ontem, nesta cidade,


correram imponentes as festas de inauguração solene do
monumento de Cristo Redentor, erguido no alcantil
imponente do Corcovado.
Pode-se dizer, que toda a população carioca prestou, ontem,
suas homenagens ao divino profeta do Bem, cuja religião,
fecundada com o sangue generoso do martírio calvariano, já
atravessou quase dois mil anos, resistindo das mais dolorosas
vicissitudes às mais desenfreadas tempestades, às mais
dramáticas investidas da heresia e da mentira, para surgir,
cada vez mais belo, mais sugestivo, mais radioso, na sua
eterna pureza.
Aquela imagem que se ergue no Corcovado não é apenas a
representação do fundador de uma religião. É, acima de tudo,
o símbolo de todo o idealismo de bondade, de amor, de
perdão e de fraternidade. E todos nós, neste momento de
incertezas, de dúvidas, de apreensões que invade a Terra,
precisamos ter a palavra do Mestre bem diante dos ólhos,
ritmando o nosso pensamento, lapidando a nossa fé,
inspirando a nossa consciência. (...)"
Diário Carioca, 13 de outubro de 1931

AS MANCHETES
Do Alto do Corcovado, Cristo Abençoa Povo do Brasil
( Diário da Noite )
A Imagem Do Mestre Domina A Cidade, Na Imponência
Alcantilada Do Corcovado - É Preciso Que Cristo, O
Redentor Dos Indivíduos E Das Sociedades, Proteja E Salve
A Terra De Santa Cruz. Ele Pode E Quer Construir, Em
Defesa Da Nação, Um Ante-Mural, Mais Resistente Do Que
Aquela Muralha De Rochas Que Enfrenta A Fúria Dos
Vagalhões.
( Diário Carioca )
Inaugurou-se Ontem Oficialmente, Em Presença De Altas
Autoridades Do Clero E Da República, O Monumento A
Cristo Redentor, No Corcovado
( O Jornal )
Aberta Em Cruz Sobre A Cidade A Imagem Santificada Do
Cristo Redentor
( A Noite )
As Festas Inaugurais Do Monumento Do Corcovado - A
Vibração De Fé Católica Nas Homenagens A Cristo Redentor
( A Esquerda )
34) Intentona Comunista (1935)
"Foi o capitão Djalma Fonseca que com um contingente de 40
homens tomou o quartel do 3o RI. O Correio da Noite fazia
parte desse grupo e pôde assim focalizar os aspectos ainda
quentes da refrega. Tudo ali dentro era um montão de
escombros; no Casino todo o mobiliário estava destroçado.
Na parte principal do quartel o fogo destruiu tudo, e à hora
em que deixávamos o local uma turma do Corpo de
Bombeiros abafava as labaredas. Todos os alojamentos
estavam em destruição completa. Está ferido o coronel
Affonso Ferreira, que, lutou, valentemente, para sufocar o
movimento. O presidente Getúlio Vargas visitou-o, no
momento em que era transportado para o H. C. E. Dirigindo-
se ao coronel Ferreira o presidente da República teve para ele
palavras de conforto. À saída do quartel o presidente
encontra-se com o ministro da Guerra. Trocam impressões e o
ministro da Guerra diz, que não terminara às 12, mas às
13,15, pouco além do prazo por ele marcado o combate aos
revoltosos.
Assim que o capitão Djalma fonseca tomou o 3o RI deteve o
capitão Agildo Barata, que se rendeu sem resistência.
Incontinente esse oficial rebelado foi remetido para o Quartel
General. O general José Pessoa visitou o 3o RI logo depois da
cessação da luta e providenciou para a unificação dos
trabalhos. À sua presença vêm os oficiais que não aderiram ao
movimento; para os mesmos teve o general José Pessoa
palavras de estímulo pela maneira por que se portaram.
Também esteve naquela unidade militar o general Eurico
Dutra tomando as providências necessárias. (...)
Na Vila Militar sublevou-se também a Companhia
Extranumeraria. Para combatê-la, as autoridades militares
designaram os Primeiros e Segundos Regimentos de
Infantaria e o Primeiro Regimento da Cavalaria Divisionário.
(...)
O 3o RI foi tomado por tropas pertencentes ao corpo de
guarda e do 2o B. C. sob o comando do capitão Djalma
Fonseca. (...)
À última hora, chegaram presos ao Quartel General o capitão
Agliberto Vieira de Azevedo e tenente Ivan, chefes do
movimento do 3o RI."
Correio da Noite, 27 de novembro de 1935

"O movimento extremista do 3o Regimento de Infantaria teve


início às 22 horas do dia 26. Parte da guarnição, dois dos
batalhões, sob o comando do capitão Agildo Barata, que
revoltara a soldadesca, por ordem, segundo afirmou, de Luiz
Carlos Prestes, saíram à rua, amotinados.
Cientes, talvez, de que o governo legal os combateria sem
tréguas resolveram entrincheirar-se no próprio quartel da sua
unidade e aguardar os acontecimentos. Parte das forças da
unidade, porém, não pactuaram com os rebeldes, resultando,
entre eles, sério choque que terminou pela vitória do número,
isto é; dos amotinados, que estavam em maioria.
Diante disso, as forças fiéis ao governo ocuparam o andar
superior do edifício, onde ficaram como que encurralados. De
posse da situação, entrou o capitão Barata a irradiar, da
estação do 3o RI comunicados às demais unidades
concitando-as à luta. Esses comunicados foram
imediatamente contestados pelas demais estações do Exército.
Nada, entretanto, demoveu os cabeças do motim, resultando
saí, as primeiras provid6encias, para o extirpamento do foco
da rebelião. O alto comando da Região tomou de início
medidas no sentido de serem sitiados os rebeldes o que foi
feito com guarnição de tropas federais, conduzidas para o
local, por grande número de ônibus da Light.
Cercados por todos os lados acessíveis, foi, então, iniciado o
bombardeio do quartel na Praia Vermelha por três peças de
bateria do 1o grupo de obuses peças essas que foram
colocadas uma nos terrenos do Fluminense Yacht Club e as
demais em plena avenida Pasteur, em frente à Faculdade de
Medicina. Entrincheirados, os soldados do 3o RI resistiram,
tenazmente, isto desde as 2 horas da madrugada até às 13,30
horas quando, então, se renderam. (...)
As tropas legais, diante da resistência dos entrincheirados,
usaram de um recurso fulminante: bombas incendiárias. Em
pouco, atingida a cúpula do edifício ardia, para ruir em breve,
propagando-se o fogo lenta, mas progressivamente, pela ala
esquerda e, depois, pela direita. Ao mesmo tempo eram
lançados sobre as forças rebeldes gazes lacrimogeneos o que
mais agravou ainda a sua situação. (...)
Pelas 11 horas começaram a voar sobre posições inimigas
cinco aviões Corsário, de reconhecimento, armados de
metralhadora. Três deles por várias vezes fizeram fogo sobre
o quartel, sendo, também alvejados. (...)
O lance esperado mão se deu, entretanto. E, entre alternativas
de intensa fuzilaria e descaídas súbitas, prolongou-se a ação
até às 13,30 horas, em que os revoltosos içaram a bandeira
branca. (...)
Correio da Noite, 28 de novembro de 1935
"Esta madrugada revoltou-se um batalhão do 3o Regimento
de Infantaria aquartelado na Praia Vermelha, sob o comando
do capitão Agildo Barata, que ali se encontrava preso. Dois
batalhões do mesmo regimento continuam fiéis ao governo,
lutando contra os sediciosos.
Tropas do Exército sob o comando direto do general Eurico
Gaspar Dutra iniciaram, no amanhecer de hoje, o ataque aos
rebeldes. Esse ataque está sendo feito com grande cuidado, a
fim de que não sejam sacrificadas as vidas das tropas que não
aderiram ao movimento, por isso que 2 batalhões, localizados
na parte alta do edifício do quartel, repeliram as propostas dos
que solicitavam apoio ao movimento.
O capitão Agildo Barata, utilizando-se da estação-rádio do 3o
RI, emitiu, durante as primeiras horas da manhã de hoje,
rádios concitando outras unidades do Exército a secundarem o
golpe ali iniciado e declarando vitorioso o movimento
naquele regimento. Esses rádios, porém, logo a seguir, foram
desmentidos pelas estações do Exército, reduzidos às suas
verdadeiras proporções.
Na Escola de Aviação, um grupo de sargentos atacou os
oficiais e assumiu o comando da tropa. O 1o Regimento de
Aviação, comandado pelo coronel Eduardo Gomes, atacou
imediatamente os rebeldes, enquanto tropas da Vila Militar,
sob o comando do general José Joaquim Andrade,
marchavam contra os amotinados.
O Grupo Escola de Artilharia bombardeou a Escola de
Aviação. Os rebeldes incendiaram os hangares. O movimento
ali está praticamente dominado. Todos os corpos da Capital
Federal, com exceção dos acima citados, se mantêm fiéis ao
governo. A Chefatura de Polícia continua a receber
manifestações de solidariedade dos principais sindicatos e
centros operários desta Capital."
A Noite, 27 de novembro de 1935

"O presidente da República dirigiu ontem aos governadores o


seguinte telegrama circular, comunicando-lhes haver sido
inteiramente dominado o movimento subversivo, irrompido
em Natal e Recife e ontem pela madrugada nesta capital:
- Tenho satisfação comunicar-vos movimento subversivo, de
caráter comunista, irrompido noite 23 para 24 em Natal e
Recife e hoje pela madrugada no Distrito Federal se acha
inteiramente dominado. Revoltosos Rio Grande do Norte
abandonaram capital Estado, onde ordem foi restabelecida.
Diante impossibilidade oferecer resistência forças se
aproximavam embarcaram vapor Santos, número 500 mais ou
menos, seguindo rumo ignorado. (...)
Quanto ao Distrito Federal, ficou circunscrito Escola de
Aviação de 3o RI Praia Vermelha. Irrompido esta madrugada
teve imediata e energica repressão. escola Aviação rendeu-se
pela manhã e 3o RI, de onde acabo de chegar, entregou-se,
depois tenaz resistência, tendo incendiado quartel.
Há vários oficiais mortos pelos revoltosos, afora numerosas
baixas ainda não identificadas resultantes luta travada com
forças legais, se conduziram valorosamente, tanto aqui como
em Recife e Natal.
Embora existisse plano articulado outros pontos país, é fora
de dúvida que movimento de nítida finalidade comunista se
acha dominado, enfrentado como foi resolutamente e sem
perda de tempo.
Impõe-se agora sanear ambiente e afastar elementos cuja
atividade anti-social tanto vem perturbando a vida do país.
Para levar a cabo essa patriótica tarefa e continuar a garantir
ordem governo federal se acha perfeitamente aparelhado e
espero governo esse Estado mantenha todo vigilância em
torno elementos suspeitos, cooperando decisivamente como já
o fez para restabelecer tranquilidade pública. (...)"
Diário de Notícias, 28 de novembro de 1935

"A explosão de ferocidade e violência de que foi ontem teatro


a capital da República, dizendo-se inspirada na ideologia
comunista, não interessou direta ou indiretamente às classes
trabalhadoras organizadas no país e, servindo-se das armas da
Nação, sofreu o castigo sangrento que lhe impôs o Exército
indignado.
Pois se a tentativa sinistra se fez à revelia do operário
pacificamente trabalhando nas suas oficinas, se os
provocadores e rebeldes dentro dos quartéis não obtiveram a
solidariedade da tropa - que reivindição honesta poderiam ao
menos alegar os criminosos? Não foi uma idéia social ou
política, não foi um sentimento ou espírito de corporação que
ceifou tantas vidas inocentes e acarretou tantos prejuízos
morais e materiais ao país. Responsáveis pelo drama funesto
são por um lado o orgulho e a presumpção da mediocridade
desvairada, por outro a cupidez, o despeito, a perversidade de
alguns agitadores profissionais.
O comunismo ignaro do Sr. Luiz Carlos Prestes não é uma
convicção nem uma aspiração do país. Não há nada no
ambiente político, social e econômico da Nação que torne
sequer admissível a terrível supressão do Estado jurídico e a
subversão da ordem legal na sociedade em que vivemos.
Longe de manifestar qualquer simpatia pelo credo moscovita
sucedem-se no povo brasileiro demonstrações de apego à
liberdade e à democracia e uma repugnância profunda pelo
regime de violência.
O comunismo só é professado no Brasil por uma ridícula
minoria de semi-analfabetos, de cabotinos e exibicionistas, de
aventureiros e piratas. Jamais apareceu uma forte
personalidade capaz de interferir nos nossos destinos
políticos, endossando a responsabilidade de um movimento
social que se propõe fazer o milagre da felicidade humana.
(...)"
Diário Carioca, 28 de novembro de 1935

"(...) Chegamos à Praia Vermelha, depois de atravessarmos


todo o largo terreno que fica por trás do Hospício Nacional,
justo à hora em que o quartel do 3o Regimento começava a
sofrer as consequências do bombardeio feito pela peça de
grosso calibre localizada às proximidades da sede do Yacht-
Club.
Isolado como estava todo aquele trecho que vai desde o
Pavilhão Mourisco até à Urca, não se via, na praia das
Saudades, aqui e ali senão grupos de soldados em torno de
canhões postados em direção do quartel revoltado. Ambiente
de plena guerra, com as balas silvando no espaço e de instante
a instante cortando galhos de árvores, furando postes da
Light, partindo fios telefônicos e da iluminação pública,
quebrando as vidraças das casas próximas e às vezes
roubando a vida dos que se colocaram em defesa da ordem.
De momento a momento viam-se as tropas abandonar as
posições em que se encontravam para ocuparem outras logo
adiante. Soldados se arastando pelo chão, artilharia em pleno
funcionamento martelando a fachada da cidadela revoltada, e,
lá, em baixo, perto do mar, o canhão de grosso ronco a
despejar granadas no quartel dos amotinados. Cada assobio
correspondia a um estrondo e logo as labaredas subiam do
ponto visado. Os tiros eram dados com uma precisão notável,
notando-se que eram dirigidos por verdadeiros mestres na
matéria. Lá no quartel do 3o Regimento, vinha de quando em
quando uma resposta através das rajadas de metralhadoras,
que iam bater de encontro às casas vizinhas ou nos troncos
das árvores, atrás das quais eram vistos os mais afoitos.
À distância em que nos encontravamos, metidos entre duas
paredes pouco além do Hospício Nacional, na avenida
Pasteur, não nos permitia ver bem a extensão do incêndio que
grassava no antigo prédio da Escola Militar. O desejo de
botarmos a cabeça de fora para melhor enxergar as chamas
era intenso, mas as balas que vinham de vez em quando
assustar o nosso espírito impediam a realização de tal intento.
(...)"
Correio da Manhã, 28 de novembro de 1935

"A cidade trabalhava desde a véspera com a falta de notícias,


muito claras, de vários pontos do país, onde rebentaram
montins grandes e pequenos, mal definidos em suas
finalidades, entrou ontem em verdadeiro terror - pânico,
ferida a sua atenção pelos comunicados da polícia trazendo a
notícia alarmante da amotinação de duas unidades de nosso
Exército.
Esse comunicado afixado à porta dos jornais, transmitidos
pelas estações de broadcasting explicavam justamente os tiros
ouvidos no romper d'alva e eram comentados de vários
modos, tomando, à medida que o tempo ia passando,
proporções enormes. Nas palestras falava-se de um
movimento articulado, esperando-se acontecimentos de
grande monta para poucas horas. O pavor era grande e a
expectativa ansiosa. Mesmo os mais ponderados temiam,
tivesse maiores alcances o resumido comunicado que reduzia
os motins a um batalhão do 3o R.I. , na Praia Vermelha, e a
um grupo do 1o Regimento de Aviação.
Quem ontem assistisse, na Galeria Cruzeiro, a chegada da
massa trabalhadora, a partir das 6 horas, teria uma impressão
de que toda aquela gente, presa de pavor, tinha o ar de quem
indagava o que estava acontecendo. O mesmo se poderia
notar no largo de São Francisco, na multidão ali despejada
pelos bondes fa Light, que se espalhavam pela rua do
Ouvidor, cujas casas se mantiveram fechadas até depois da
hora de costume, dando apenas entrada aos seus auxiliares.
Virtualmente, o comércio esteve paralizado até quase às 10
horas.
Às oito horas, a Chefatura de Polícia, em comunicado que
expedira informava que a Escola de Aviação, cercada pelas
forças do governo, se havia rendido às 7 horas e que estava
sendo preparado o assalto a baioneta ao 3o Regimento de
Infantaria. Essas informações trouxeram relativa tranquilidade
ao comércio e vários estabelecimentos iniciaram o seu
movimento. Ainda assim, os bancos começaram as suas
operações um pouco mais tarde e encerraram mais cedo o
expediente, exceto o do Brasil.
Conforme o comunicado da Polícia, o capitão Agildo Barata,
que se encontrava preso, sublevou um dos batalhões desse
regimento, e tentara, pela estaçào de rádio, sublevar outras
unidades. (...)
E hontem, na hora H, para impregar a linguagem
revolucionária, o capitão Agildo Barata contava com a
solidariedade de um batalhão completo e muitos elementos de
outro.
Mantendo-se fiel ao Governo, um batalhão, a luta se iniciou
dentro do próprio regimento, tomando lugar na parte alta as
forças fiéis e na parte baixa os revolucionários. A notícia se
espalhou pelas redondezas, sendo logo levada ao
conhecimento das altas autoridades do Exército e do Chefe de
Polícia."
O Imparcial, 26 de novembro de 1935

AS MANCHETES:

O Movimento Subversivo Que Irrompeu Pela Manhã Nesta


Capital Foi Dominado - Uma Impressão Do Quartel Do 3o RI
Após A Cessação Da Luta
( Correio da Noite )
Todo O Brasil Em Estado de Sítio - Ainda Não Há
Comunicações Com As Zonas Conflagradas - Luiz Carlos
Prestes Anciosamente Procurado - Não Se Conseguiu O
Acordo Com O Sr. Flores da Cunha ( O Imparcial )
Declina, Parecendo Debelado, O Movimento Revolucionário
Do Norte
( O Imparcial )
Debelado O Movimento Revolucionário No Norte - O
Governo Reprime Energicamente Um Levante Nesta Capital -
O Presidente Da República Enfrenta A Situação Difícil Que
Se Apresentou ( O Imparcial )
Dominada Nesta Capital Uma Grave Rebelião Militar - Às
Primeiras Horas Da Madrugada De Ontem Revoltaram-se O
3o Regimento De Infantaria E Parte Da Escola De Aviação -
As Tropas Fiéis Dominaram A Situação Após Longas Horas
De Luta, Na Qual Perderam A Vida Oficiais, Sargentos E
Praças, Ficando Feridos Numerosos Outros ( Correio da
Manhã )
O Sr. Getúlio Vargas Esteve Ontem Demoradamente Em
Todos Os Pontos Em Que Perigosamente Se Combatia Em
Defesa Da Ordem Legal, Penetrando No Antigo Recinto Do
3o RI Antes Mesmo Da Rendição Dos Oficiais Criminosos
O Sr. Presidente Da República Confortou Assim Com A Sua
Presença As Autoridades E As Tropas Do Exército Em Luta
Pela Paz, Segurança E Felicidade Da Nação ( Diário Carioca )
Dominada A Rebelião Em Todo O País - Embora Existisse
Plano Articulado Em Outros Pontos Do País, O Movimento
Se Acha Dominado
( Diário de Notícias )
Graves Acontecimentos Nesta Capital ( A Noite )
h1>35) Prisão de Luiz Carlos Prestes (1936)
"A prisão do capitão Luiz Carlos Prestes constitui,
indubitavelmente, o acontecimento de maior sensação destes
últimos tempos. Quando, em novembro, o país se abalou com
as rebeliões comunistas do norte e do centro, todas as
atenções convergiram para esse personagem misterioso, chefe
supremo do movimento da extrema esquerda no continente
sul-americano. Em todo o território nacional, lançou-se a teia
das investigações severissimas, que se desdobravam dia-a-dia
do litoral ao coração do sertão.
Hoje, a polícia carioca, em diligência verdadeiramente
notável, prendeu Luiz Carlos Prestes, numa pequena casa
solitária no Meyer. É a primeira vez que, no mundo inteiro, se
detém o chefe messiânico de uma revolução, como bem
acentuou ao Correio da Noite o capitão Filinto Muller. E isso
honra sobremodo a organização policial da Capital da
República. (...)
Informam os moradores das vizinhanças da casa onde foi
preso Luiz Carlos Prestes, que os seus moradores eram
extremamente misteriosos. Não saiam quase e evitavam,
sempre, qualquer contato com outras pessoas. Em horas
avançadas recebiam visitas de pessoas que viajavam, de
ordinário, em automóveis. (...)
Na residência de Luiz Carlos Prestes a polícia apreendeu um
caixote contendo livros, quase todos versando sobre a vida
financeira da nação. Grande parte tida sobre a dívida externa
do Brasil. (...)
Entre a bagagem de Luiz Carlos Prestes, foi encontrada, além
de farto material de propaganda comunista, uma batina de
padre. (...)
Prestes antes de mudar-se para o Meyer, coisa que fez há dois
meses, morou à rua N.S. Copacabana, número 864, conforme
afirmou, em depoimento o comunista Allan Baron. A casa
referida é de propriedade do senador Antônio Jorge Medeiros
de Lima. (...)
Estava instituido um prêmio de 100 contos de réis a quem
efetuasse a prisão do chefe comunista Luiz Carlos Prestes.
Com as diligências realizadas hoje, ficou evidenciado que a
prisão do perigoso chefe vermelho foi efetuada pelo chefe de
grupo da P.E. João Torres Galvão e também pelo auxiliar de
gabinete da D.I.P.S. Francisco Menezes Juliano, com o
auxílio de investigadores e soldados da Polícia Especial. Foi,
entretanto, João Torres Galvão quem primeiro se confrontou
com Luiz Carlos Prestes, dando-lhe voz de prisão."
Correio da Noite, 5 de março de 1936

"Às primeiras horas da manhã a polícia efetuou no Meyer a


prisão do capitão Luiz Carlos Prestes, chefe dos comunistas
no Brasil. Daremos detalhes na próxima edição sobre a
sensacional diligência da polícia carioca, hoje realizada."
Diário da Noite, 5 de março de 1936 - Primeira Edição

"Há cerca de um mês a polícia carioca vinha realizando ativas


diligências no Estado do Rio, em Nova Iguaçu onde, segundo
denuncia recebida, estava localizado o ex-capitão Luiz Carlos
Prestes, chefe do movimento comunista da América do Sul.
Todas as diligências então realizadas, firmadas em
documentos e cartas achadas em poder de Miranda, secretário
do partido Comunista, enviado do Komintern à América do
Sul, mostraram que o chefe vermelho ainda se encontrava em
nosso território, onde procurava concatenar elementos para
uma nova investida contra o regime. não conseguindo deter
Luiz Carlos Prestes em Nova Iguaçu, a polícia prosseguiu
suas investigações, prendendo o sargento de Aviação, Azor,
revoltoso da Escola de Aviação Militar e guarda-costa do
chefe vermelho. Prestes continuava no Rio, não restava
dúvida, e a polícia desta capital, seguindo elementos
destacados do Partido Comunista, não tardaria, como não
tardou, em localizal-o novamente.
Dias depois nossas autoridades policiais ficaram cientes de
que chegaria ao Brasil, em missão especial do Komintern, o
individuo Victor Allan Baron, designado para entrar em
entendimentos com o capitão Prestes, a fim de que o mesmo o
instruisse sobre as possibilidades de implantação do regime
soviético em nosso país. Allan, recolhido à Delegacia de
Ordem Pública e Social, informou às autoridades que o
capitão Luiz Carlos Prestes se encontrava de novo nesta
capital, asilado em uma casa da rua Honório, com o n. 279,
em Todos os Santos.(...)"
Diário da Noite, 5 de março de 1936 Terceira Edição

"Desde os sucessos de novembro que as auroridades policiais


vem diligenciando para deter o famoso comandante da
"Coluna Invicta", capitão Luiz Carlos Prestes, ex-chefe da
Revolução de 1924. Essa preocupação justificava-se na
presunção das citadas autoridades de que o celebre
desbravador dos sertões brasileiros estava implicado no
movimento que irrompeu naquela data em vários pontos do
país, culminando com a revolta do 3o Regimento desta
capital. Já algumas vezes a Polícia anunciava estar numa pista
certa, sendo em vão, entretanto, seus esforços, de vez que se
verificava sempre um insucesso. Desta vez, porém, os
elementos da Polícia Central tiveram mais sorte. Como
resultado de uma diligência ruidosa, na manhã de ontem, no
bairro de Cachambi, ali na Estação do Meier e, portanto a
vinte minutos da cidade, os policiais conseguiram prender o
capitão Prestes. (...)
Para prender Luiz Carlos Prestes foram requisitados mais de
noventa policiais, à paisana, que foram distribuídos pelas
cercanias do prédio onde residia o famoso revolucionário.
Mais de trinta casas foram cuidadosamente revistadas. (...)
A polícia ficou espantada, quando, após seu movimentado
cerco, penetrou na casa da Rua Honório 297 a fim de prender
o chefe da Revolução de 1924, esperando encontrar, ali,
grosso armamento, sucedendo o contrário das apreensões,
pois, na residência de Prestes, apesar da minuciosa busca, não
foi encontrada a minima arma, nem, sequer um projétil de
revólver."
O Radical, 6 de março de 1936

"Preso há algum tempo já pela polícia carioca, o extremista


Victor allan Baron, nas declarações sucessivas que prestou,
acabou por denunciar a estadia de Luiz Carlos Prestes no Rio.
Entrando em diligências a polícia terminou por localizar o
ponto onde se encontrava o chefe da revolução comunista,
levando a efeito, hoje, numa diligência aparatosa, a sua
prisão. Luiz Carlos Prestes foi capturado pela manhã, à rua
Honório no 279, sendo conduzido para a Polícia. O
denunciante, ao ter a notícia da prisão, suicidou-se, ao que
fomos informados, saltando do 2o andar do palácio da rua da
Relação ao patio interno.
O Globo, 5 de março de 1936
"A prisão de Luiz Carlos Prestes, pela maneira por que se
consumou, vem confirmar as suspeitas de que os chefes e
inspiradores da mashorca vermelha de novembro ainda não
haviam perdido as ultimas esperanças. Conforme sempre
informaram as nossas autoridades mais responsáveis, numa
constante advertência ao povo, o trabalho subterrâneo dos
agentes do Komintern prosseguia intenso nos vários setores
em que o Brasil fôra dividido pelos "técnicos" de Moscou. De
outro modo, realmente, não se compreende que o principal
daqueles agentes tivesse permanecido no Rio, afrontando os
riscos do cerco em que o colocara a polícia, quando não lhe
teria sido de todo modo impossível, pelo menos transportar-se
para outra cidade, talvez mesmo para outras terras,
desconhecida como se tornara a sua fisionomia, no correr dos
anos, para a quase totalidade dos brasileiros. Ele, com certeza,
ainda sonhava com outro golpe..."
O Globo, 5 de março de 1936 - Sexta Edição

"A prisão do ex-capitão Luiz Carlos Prestes, ontem nesta


capital, veio por ponto final na tarefa da polícia encarregada
de deter todos quantos se envolveram nos acontecimentos
vermelhos de novembro, que tão fundo magoaram a
civilização do país. À polícia do Distrito faltava, porém, a
captura do verdadeiro cabeça da rebelião para apresentar-se à
altura da confiança que o Brasil liberal-democrata dela exige.
(...)
O Chege revolucionário foi intimado a render-se, o que fez
sem palavra. Dali, o conduziram para a Polícia Central,
juntamente com Olga Meirelles, a mulher de preto e
companheira de Prestes.
A chegada de Luiz Carlos Prestes ao palácio da rua da
Relação, foi assinalada por um idescritível movimento no
interior da Polícia Central. Portas se abriam e fechavam com
estrondo, investigadores tomavam todas as saidas da casa, não
permitindo nela a saída ou entrada de quem quer que fosse.
Ordens eram gritadas no segundo andar, onde está instalada a
Delegacia de Ordem Política e Social, para os investigadores
que, no palco central, corriam em todas as direções, a fim de
guardarem as saídas do prédio. Ao tempo em que tudo isso
era feito, os executores das ordens, muitos deles obedeciam-
nas automaticamente, não acreditando na causa que motivara
medidas tão excepcionais.
Com a prisão de Prestes todo o Comitê revolucionário para a
América do Sul, se encontra preso. Um dos membros, se
suicidou ontem, atirando-se do segundo andar do edifício da
Polícia Central, ao pátio. Era ele, Victor Allan Baron que
denunciou à polícia, o esconderijo de Prestes. Os demais são:
Leon Valet, Harry Berger, Rodolfo Gioldi ou Luciano
Bostero e agora, Prestes.
Acompanhado de dois investigadores, Prestes foi levado cerca
das 13 horas ao gabinete do delegado Bellens Porto, no
cartório do D.I.P.S. Prestes, entretanto, negou-se a prestar
quaisquer declarações, mantendo-se em imutável silêncio. O
aspecto do chefe revolucionário é o de uma pessoa
extremamente esgotada. O seu rosto tem a cor da terra,
mostrando-se muito abatido."
Gazeta de Notícias, 6 de março de 1936

AS MANCHETES:
A Prisão do Antigo Comandante da Coluna Invicta ( O
Radical)
Preso Chefe Supremo da RevoluçÃo Comunista no Brasil
(Correio da Noite)
Epílogo dos Acontecimentos Vermelhos no Brasil ( Gazeta de
Notícias )
Condenado Aqui e Na Rússia - Luiz Carlos Prestes Preferiu
Ser Preso A Ter Que Presar Contas ao Komintern? ( O
Globo )
Todos Presos! Além de Prestes, a Polícia Encarcera Os Cinco
Membros do Comitê Vermelho da América do Sul ( O
Globo )
Luiz Carlos Prestes Preso no Meyer ( Diário da Noite )
36) Prisão de Pedro Ernesto
(1936)
"Teve a maior repercussão como o facto sensacional do dia, a
prisão do Sr. Pedro Ernesto. Embora esperada a qualquer
momento, a noticia estourou como uma bomba ás primeiras
horas da noite. A esse respeito o gabinete do chefe de Polícia
distribuiu á imprensa a seguinte nota:
- A Polícia deteve, hoje, ás 20,30 horas, o prefeito do
Districto Federal, dr. Pedro Ernesto Baptista. Esta providencia
foi tomada após acuradas diligencias em virtude das quaes
resultaram indicios vehementes, da culpabilidade do dr. Pedro
Ernesto na preparação dos movimentos subversivos que
abalaram a paiz, ultimamente. A Polícia, com serenidade e
energia, prosegue no cumprimento da sua missão.
A prisão foi levada a effeito na Casa de Saude Pedro Ernesto,
pelo tenente-coronel Domingos Ferreira Junior por ordem do
general Lucio Esteves, commandante da Policia Militar.
Em virtude da prisão do Sr. Pedro Ernesto, assumiu, hontem
mesmo, o governo da cidade, na qualidade de seu substituto
legal, o conego Olympio de Mello, presidente da Camara
Municipal.
Momentos antes da sua prisão, o Sr. Pedro Ernesto fez
estampar nos jornaes da tarde, com grande destaque, a nota
que reproduzimos abaixo, sob o titulo - O Prefeito ao Povo:
- Não considero uma diminuição a minha ida á policia para
depor. Cumpri apenas o meu dever de cidadão.
O governador do Districto Federal deve ser o primeiro a dar o
exemplo da obediencia e do acatamento ás autoridades e á
Ordem Constituida. Nem pode ser outro o espirito da
democracia.
Não fui á policia para me defender. Não tinha e não tenho de
que me defender. A minha defesa está no meu devotamento a
esta cidade que eu tenho servido com enthusiasmo das causas
sagradas.
Dei o melhor de mim mesmo para o bem e a felicidade do
Districto Federal."
Diário de Notícias, 4 de abril de 1936

"Desde as primeiras horas da tarde de hontem começaram a


circular as notícias relacionadas com a situação do Sr. Pedro
Ernesto em face das actividades extremistas que tanto vêm
perturbando a vida do paiz.
A principio falou-se com insistencia que o prefeito havia
enviado uma mensagem á Camara Municipal convidando o
conego Olympio de Mello, presidente do Legislativo carioca,
a assumir as funcções de chefe do Executivo municipal. Ao
mesmo tempo que taes boatos era divulgados, informes de
outra natureza eram tambem vehiculados, entre os quaes se
assignalava, com maior persistencia, o que dizia respeito ao
acto do governo federal decretando a intervenção no Districto
Federal. Chegou-se, mesmo, nessa ocasião, a citar nomes
escolhidos para a missão de interventor.
Embora não fosse possivel á reportagem colher dados
precisos dentro das multiplas noticias espalhadas, notava-se,
entretanto, que qualquer acontecimento excepcional estava
para verificar-se. Grande era a actividade nos corredores da
Prefeitura e principalmente nas dependencias do gabinete do
prefeito. À Casa de Saude Pedro Ernesto chegavam a todo
instante politicos e conhecidos amigos do chefe do Partido
Autonomista.
Alguns desses politicos por nós ouvidos pouco antes das 20
horas sobre o caso da propalada renuncia do prefeito
ignoravam por completo que de tal se houvesse cogitado.
No gabinete do ministro da Justiça, quando ali estivemos á
tarde, á procura de esclarecimentos, nada de anormal se
observava. Tambem nenhuma informação segura foi possivel
obter confirmando ou desautorisando as noticias correntes.
Attendiam ao expediente commum o director Lacquitinie e os
officiaes de gabinete.
O ministro Vicente Ráo, como se sabe, estava em Petropolis.
Justamente da cidade serrana chegaram ao nosso
conhecimento informes que induziam a crer que o governo
federal cogitava de tomar alguma providencia de
indisfarçavel importancia.
Afinal, pouco antes das 21 horas, a policia fornecia aos
jornaes e fazia irradiar pelas estações locaes o seguinte
communicado:
- A Policia deteve, hoje, ás 20,30 horas, o prefeito do
Districto Federal, dr. Pedro Ernesto Baptista. Esta providencia
foi tomada após acuradas diligencias em virtude das quaes
resultaram indicios vehementes, da culpabilidade do dr. Pedro
Ernesto na preparação dos movimentos subversivos que
abalaram o paiz, ultimamente. A Policia, com serenidade e
energia, prosegue no cumprimento da sua missão. (...)"
A Noite, 4 de abril de 1936

"A prisão do prefeito Pedro Ernesto foi effectivada pelo


coronel Dominhues José Junior por ordem do coomandante
Lucio Esteves.
A Policia Central teve, hontem, uma noite movimentada. Ás
20 ½ horas chegaram successivamente, ahi, o conego
Olympio de Mello, o general Lucio Esteves, commandante da
Policia Militar, coronel Zenobio Costa, commandante da
Policia Municipal, vereadores Moura Nobre, Henrique
Maggioli e Jorge Bhering de Mattos e o Sr. Luiz Aranha,
vice-presidente do Partido Autonomista. Esses visitantes
estiveram no gabinete do chefe de Policia.
Preso o prefeito, o chefe de Policia tomou as medidas
necessarias para que a sua familia o accompanhasse,
prestando-lhe assistencia moral, tão necessaria, sempre, em
horas como esta.
Com a prisão do dr. Pedro Ernesto vae occupar a Prefeitura
do Districto Federal o conego Olympio de Mello, presidente
do Conselho Municipal.
Embora na direcção interina da Prefeitura, o padre Olympio
de Mello, ao que estamos informados, fará diversas
modificações nos cargos de secretarios e em outros postos de
destaque do governo da cidade. O seu gabinete deverá ficar
constituido ainda hoje.
O padre Olympio de Mello conferenciou, a proposito,
hontem , á noite, e na madrugada de hoje, com os vultos mais
destacados do Partido Autonomista, notadamente com o Sr.
Luiz Aranha. Os seus aposentos estiveram repletos.
O padre Olympio de Mello, logo após os acontecimentos que
o conduziram à Prefeitura, telegraphou ao Sr. Getulio Vargas
e aos governadores dos Estados communicando-lhes que,
como substituto legal do dr. Pedro Ernesto, assumira a chefia
do governo do Districto.
A impressão deixada no espirito publico pelas medidas
decisivas da policia foi de que estavamos na imminencia de
graves acontecimentos. Ante essa espectativa foi necessaria
uma acção energica, sem vacillações, embora serena, o que
foi executado pelo capitão Filinto Muller e seus auxiliares.
Vale assignalar aqui que as autoridades cercaram o preso de
hontem de todas as considerações. Tornando-se necessaria, na
opinião das autoridades, a reclusão do Sr. Pedro Ernesto, esta
se fez com toda a serenidade e com uma linha de rigorosa
elegancia de attitudes e cavalheirismo.
Á hora em que o dr. Pedro Ernesto foi detido, o conego
Olympio de Mello se encontrava no gabinete do chefe de
policia. Foi o capitão Pilinto Muller quem avisou da
occurencia, scientificando-o, em nome do governo, da medida
posta em pratica ficando assim o presidente da Camara
Municipal investido das funcções de governador da cidade."
O Imparcial, 4 de abril de 1936

"O Sr. Pedro Ernesto estava no seu gabinete da Casa de


Saude, que tem o seu nome, escrevendo o discurso que
deveria pronunciar, hoje, no banquete que as classes
conservadoras lhe iam offerecer, quando foi avisado que o
capitão Riograndino Kruel solicitava uma audiencia. O
prefeito carioca mandou-o entrar para a sala em que se
achava. O capitão Kruel fazia-se acompanhar do coronel
Domingos José Pereira Junior. Foi este que passou ás mãos
do Sr. Pedro Ernesto um officio. Dizia o documento que, por
ordem do governo da Republica, o Sr. Pedro Ernesto devia se
considerar preso, em virtude de "vehementes indicios contra
sua pessoa, de ter cooperado no movimento subversivo de
novembro." Estava assignado pelo general Lucio Esteves,
commandante da Policia Militar do Districto.
Segundo contam as pessoas que presenciaram a scena, o Sr.
Pedro Ernesto leu o officio sem demonstrar a menor srpreza
ou qualquer alteração.
- Está bem, foram as sua palavras. E logo acrescentou:
- Peço licença, apenas, para avisar, daqui pelo telephone, a
minha familia.
O coronel Domingos José Pereira Junior, então, lamentou que
lhe tivesse cabido a desagradavel incumbencia de prender um
administrador do porte do Sr. Pedro Ernesto. Mas eram
ordens superiores, que não podiam deixar de ser cumpridas.
(...)
No mesmo momento em que se effectuava a prisão do
prefeito, Dr. Pedro Ernesto, chegavam á Policia Central,
sendo recebidos no gabinete do chefe de Policia, o conego
Olympio de Mello, presidente do Conselho Municipal, o
general Lucio Esteves, commandante da Policia Militar, o
coronel Zenobio da Costa, commandante da Policia
Municipal, vereadores Moura Nobre, Henrique Maggioli e
Jorge Bhering de Mattos, e o Sr. Luiz Aranha, vice-presidente
do Partido Autonomista, que conferenciaram durante algumas
horas com o capitão Felinto Muller.
O conego Olympio de Mello, fôra conferenciar com o chefe
de Policia, em virtude de uma communicação que deste
recebera, scientificando-o, em nome do governo, da prisão do
Dr. Pedro Ernesto.
Em consequencia da medida governamental, o executivo da
cidade foi occupado, automaticamente, em caracter interino,
pelo conego Olympio de Mello, chefe do legislativo
municipal, de accôrdo com a Lei Organica do Districto
Federal. (...)
Diário da Noite, 4 de abril de 1936

"Informam-nos do gabinete do chefe de Polícia: - A Polícia


deteve, hoje, ás 20,30 horas, o prefeito do Districto Federal,
dr. Pedro Ernesto Baptista. Esta providencia foi tomada após
acuradas diligencias em virtude das quaes resultaram indicios
vehementes, da culpabilidade do dr. Pedro Ernesto na
preparação dos movimentos subversivos que abalaram o paiz,
ultimamente. A Polícia, com serenidade e energia, prosegue
no cumprimento de sua missão.
A prisão do Sr. Pedro Ernesto verificou-se na Casa de Saude
de sua propriedade, sendo effectuada pelo coronel Domingos
José Pereira Junior, que lhe entregou um officio do
commandante da Polícia Militar. (...)
O dia de hontem foi de grande movimento na Central de
Polícia. Entre as pessoas que estiveram no gabinete do chefe
de polícia notamos o conego Olympio de Mello, o coronel
Zenobio da Costa, os vereadores Moura Nobre, Ruy de
Almeida e os drs. Mario Piragibe e Luiz Aranha. (...)
Depois da prisão do Sr. Pedro Ernesto, o chefe de Polícia
communicou ao padre Olympio de Mello, presidente da
Camara Municipal, a diligencia que acabava de ser
effectuada, o que importava em ficar transitoriamente
abandonado o cargo de prefeito do Districto Federal.
Inteirado dessa communicação, o padre Olympio de Mello, na
qualidade de substituto legal do Sr. Pedro Ernesto, dirigiu-se
logo para a Polícia Central, onde hontem á noite assumiu as
funcções de chefe do Executivo da cidade.
A titulo de esclarecimento devido aos leitores, estamos
informados que o presidente da República não optou por uma
intervenção no Districto Federal, preferindo que a
substituição do Sr. Pedro Ernesto se operasse normalmente,
isto é, recaisse no seu sucessor natural. O governo considerou
que uma intervenção neste caso importaria na convocação
immediata e extraordinariamente do Congresso Nacional,
além de significar a dissolução do Poder Legislativo da
cidade.
O facto do presidente da Camara Municipal entrar em
exercicio do cargo de prefeito interino do Districto Federal,
como entendeu o governo, parece que assegura a essa Camara
a sua reunião e os seus trabalhos em tempo opportuno. Essas
informações, nós a obtivemos de fonte autorizada. (...)"
Correio da Manhã, 4 de abril de 1936

AS MANCHETES:
A Prisão Do Dr. Pedro Ernesto - Communicam-nos Do
Gabinete Do Chefe De Polícia: - A Polícia Deteve, Hoje, Ás
20,30 Horas, O Prefeito Do Districto Federal, Dr. Pedro
Ernesto Baptista. Essa Providencia Foi Tomada Após
Acuradas Diligencias Em Virtude Das Quaes Resultaram
Indicios Vehementes De Culpabilidade Do Dr. Pedro Ernesto
Na Preparação Dos Movimentos Subversivos Que Abalaram
O Paiz Ultimamente. A Polícia, Com Serenidade E Energia,
Prosegue Na Sua Missão ( O Imparcial )
Foi Preso Hontem O Sr. Pedro Ernesto - A Sensacional
Diligencia Effectuou-se Ás 20,30 Horas Na Casa De Saude
Da Esplanada Do Senado - Assumiu O Governo Do Districto
O Conego Olympio De Mello, Presidente Da Camara
Municipal ( Diário de Notícias )
Preso O Sr. Pedro Ernesto! Assumiu O Governo Da Cidade O
Padre Olympio De Mello - Como Se Realisou A Diligencia
Sensacional ( A Noite )
O Sr. Pedro Ernesto Foi Preso Pela Polícia - Como Se Deu A
Prisão
( Diário da Noite )
Detido O Prefeito Do Districto Federal - Os Acontecimentos
E O Estado De Guerra - Em Communicado Official, A
Chefatura De Polícia Informou Haver Sido Detido Hontem, Á
Noite, O Dr. Pedro Ernesto - Acrescenta O Communicado
Que Essa Providencia Foi Tomada Após Accuradas
Diligencias
( Correio da Manhã )
37) Noel Rosa (1937)
"Morreu Noel Rosa. Após alguns minutos, a cidade inteira já
sabia. Noel o popular cantor e compositor dos morros da
cidade que sempre se destacou pelas suas producções, deixa a
vida para ir de encontro a um novo mundo.
De algum tempo para cá, Noel deixou de apparecer nos meios
radiophonicos e recolheu-se a um sanatorio atacado por
terrivel enfermidade. Os seus "fans" reclamaram; porém, Noel
não podia attendê-los por ter necessidade de absoluto
repouso.
Suas melhores producções, alías, a que lhe deu nome, foi ha
alguns annos o samba "Com Que Roupa". Depois, seguiram-
se outros, e ultimamente "João Ninguem", "De Babado Sim"
e outros.
Encerra-se com o autor de "Pierrot Apaixonado", "Feitiço da
Villa", "Palpite Infeliz" e outras composições populares, uma
etapa verdadeiramente brilhante do samba de nossa terra.
Noel morreu subitamente em consequencia de um colapso
cardiaco, quando na rua Theodoro da Silva n. 382, o querido
compositor encontrava-se em companhia de sua progenitora;
esposa e alguns amigos palestrando recostado no leito. (...)
Cerca de 23 ½ horas, o "sambista philosopho" pediu que fosse
tocada uma das suas composições, no que foi attendido
promptamente. Então, cantando "De Babado Sim", Noel
repentinamente deixou de viver desapparecendo da vida e
deixando saudades. Porém, suas musicas não serão
esquecidas e a sua memoria será tão venerada como a dos
nossos maiores compositores da musica popular.
O seu enterro será realizado hoje á tarde, saindo o feretro da
rua Thedoro da Silva n. 382 em Villa Isabel."
Diário da Noite, 5 de maio de 1937

"O povo carioca perdeu hontem com a morte de Noel Rosa,


um dos interpretes mais perfeitos da sua poesia.
Poeta instinctivo, observador profundo da vida das
populações pauperrimas da cidade, Noel Rosa, compreendeu,
logo no inicio de sua vida de homem a necessidade que havia
de realçar-se a lidima poesia popular da terra, a despeito de
toda a miseria que assoberbava o modo de viver das
populações dos bairros mais afastados da cidade. E foi com a
intenção perfeita de enquadrar no seio da musica folklorica do
paiz as producções do povo da cidade, que esse menestrel
moderno levou para o radio a melhor somma de suas
composições, todas ellas feitas sobre motivos da vida real dos
habitantes dos morros e dos longinquos suburbios do Rio.
Noel Rosa deixa uma lacuna no seio da representação da
musica popular do Rio de Janeiro. Elle, unicamente elle,
compreendia e satisfazia o desejo do povo no tocante a arte
dos sambas e das canções populares desta terra.
O enterro de Noel Rosa realizou-se hontem, com grande
accompanhamento, sendo o seu corpo sepultado no cemiterio
de S. Francisco Xavier."
Diário Carioca, 6 de maio de 1937

"Morreu Noel Rosa. A cidade chora, nesta noticia, o


desapparecimento do expoente maximo do sambista carioca.
A letra era repleta de uma philosophia humana. Sentira a
necessidade de ambientar a musica que vivia nos morros ao
convivio da cidade. Fez letras onde o malandro e o jogo de
chapinha não entravam. Traduzia a propria vida em ritmos e
melodias.
É seu esse samba canção: "Naquelle tempo em que você era
pobre / Eu vivia como nobre / A gastar meu vil metal / E, por
minha vontade / Você foi para a cidade / Esquecendo a
solidão / E a miseria daquelle barracão./ Tudo passou tão
depressa, / Fiquei sem nada de meu / E esquecendo a
promessa, / Você me esqueceu, / E partiu, com o primeiro que
appareceu / Não querendo ser pobre como eu." Dizem que
essa historia foi vivida.
O morro era para elle motivo de verdadeiras chronicas
musicais. "Mangueira" é um exemplo disso.
Seu primeiro sucesso foi "Com Que Roupa". Nesse tempo,
prosseguindo os estudos, elle ingressava na escola de
Medicina. Em pouco tempo, porém, abandonava os estudos,
dedicando-se, inteiramente, á arte que o empolgára. Venceu,
em toda linha, plenamente, quer como autor quer como
violonista. Costumava, constantemente, interpretar, frente ao
microphone, suas producções. É enorme a sua bagagem
musical.
Noel Rosa morreu, victimado por um collapso cardiaco, em
sua residencia, á rua Theodoro da Silva. E - suprema ironia do
destino! -"
A Noite, 5 de maio de 1937

"A cidade, principalmente, os meios bohemios, sentiram


deveras a morte de Noel Rosa, o festejado sambista e cantor
de radio, em plena mocidade. Sem obter melhoras no Piauhy,
Noel Rosa regressou a esta capital para succumbir entre os
desvelos de soa veneranda mãe e de sua esposa. Na hora da
agonia, ouvindo os acordes de uma orchestra proxima ao seu
leito de dôr, mandou pedir a execução de um samba de sua
autoria e logo depois expirava.
O autor de "Com Que Roupa", "Cidade Mulher", e outras
canções que alcançaram sempre popularidade, era filho de
Villa Izabel, tendo nascido em 1907, á rua Theodoro da Silva
n. 380, filho de Manoel de Medeiros Rosa, já fallecido e de d.
Martha de Medeiros Rosa. Era casado com d. Lindaura Rosa.
Na sua mesa de trabalho, no momento da morte, estava
exposto que confeccionava d. Martha Rosa, a partir de 1929,
contendo todas as criticas da imprensa ás composições
literarias e musicaes de Noel Rosa. Mesmo aquelles contendo
irreverências á pessoa do vate nelle estão collecionados,
contornados de vermelho, para maior realce.
Noel, cercado de amigos e de companheiros de aventura,
reconheceu a proximidade da morte e dirigindo-se a Orestes
Barbosa advertiu:
- Seu amigo está acabado...
Momentos depois era fulminado por um collapso.
O enterramento do festejado cantor e compositor teve grande
acompanhamento tendo sido a sepultura aberta no cemiterio
de S. Francisco Xavier."
Correio da Manhã, 6 de maio de 1937

"Noel Rosa era um de nossos mais conhecidos compositores


populares. Suas musicas nunca deixavam de alcançar sucesso
nas temporadas carnavalescas.
Havia mezes vinha elle soffrendo de pertinaz molestia, que
lhe tirava toda a alegria.
Hontem, á noite, em frente á sua residencia, á rua Theodoro
da Silva, 382, em Villa Isabel, realizava-se uma festa familiar.
Os rapazes, que compunham a orquestra, resolveram prestar
uma homenagem a Noel, cantando em voz alta, o samba-
desafio, de sua autoria, intitulado "De Babado Sim..."
O compositor popular, que regressára havia tres dias, de
Pirahy, onde fôra mudar de ares, ao ouvir a musica, teve um
estremecimento e morreu, talvez de emoção.
O seu enterro será realizado hoje á tarde, sahindo o feretro do
endereço acima."
Diário de Notícias, 5 de maio de 1937

"Á meia-noite de hontem falleceu, nesta capital, em sua


residencia, á rua Theodoro da Silva, 382, o compositor de
sambas e marchas, Noel Rosa.
Era uma figura sympathica das rodas radiophonicas e dos
nossos musicistas mais populares.
Muitas de suas producções como "Tarzan, O Filho do
Alfaiate" e "Maria Fumaça", tiveram um exito extraordinario.
Mas o seu samba que mais agradou, foi, sem duvida, "Palpite
Infeliz". De alguns annos para cá, não havia Carnaval
completo sem musica de Noel Rosa.
Encontrava-se elle enfermo ha varias semanas e os que o
conheciam nada auguravam de bom, dado o seu physico
franzino. Entretanto, ainda recentemente, concedeu uma
alegre entrevista a uma de nossas revistas de radio, traçando
então os seus planos para o futuro. Não quiz o destino que se
justificasse o seu optimismo.
O enterro sae, ás 16 horas, de hoje, do referido endereço, para
o cemiterio de S. Francisco de Assis."
O Jornal, 5 de maio de 1937

AS MANCHETES:
Morreu Cantando Noel Rosa A Figura Mais Popular Dos
Nossos Compositores
( Diário da Noite )
Falleceu O Compositor Noel Rosa - Era Autor De Numerosas
Musicas Populares ( O Jornal )
Falleceu Noel Rosa - O Conhecido Compositor Morreu
Ouvindo Cantar Uma Musica De Sua Autoria ( Diário de
Notícias )
A Morte Prematura De Noel Rosa - Foi, Hontem, Sepultado,
O Popular Cantor Do Radio ( Correio da Manhã )
Morreu Noel Rosa ( A Noite )
Noel Rosa - Falleceu Hontem O Maior Cantor Da Alma
Carioca
( Diário Carioca )
38) Golpe de 1937 (1937)
"A cidade recebeu, ontem, com calma os acontecimentos
políticos que determinaram a entrada em vigor de uma nova
Constituição para o Brasil, revogando-se implicitamente, a de
julho de 1934.
O presidente Getúlio Vargas no discurso que pronunciou, à
noite, ao microfone do Departamento Nacional de
Propaganda, falou à Nação com franqueza e desassombro,
mostrando os erros e os vícios que vinham deturpando a
essência do regime democrático e a necessidade de dar à
nossa democracia uma nova forma, capaz de assegurar o
prestígio da autoridade e dar ao governo maiores
possibilidades de resolver os grandes problemas nacionais.
O presidente da República, com as intenções melhores de
servir ao Brasil, deu-lhe uma nova Constituição, a Carta
Magna, trabalho inteligente, de cuidadoso exame das nossas
necessidades sociais, econômicas e políticas, possui uma
uniformidade de pensamento que nào foi possível imprimir à
Carta efêmera de 1934.
A Carta fundamental do regime republicano ontem
promulgada, conserva, nas suas linhas gerais, na perfeição do
seu arcabouço, a viga mestra do espírito democrático. As
alterações que ela apresenta visam, entre outras coisas
fortalecer a representação nacional, criando uma formula
nova para o sufrágio universal, dando aos municípios um
prestígio que eles nunca possuiram, neles reconhecendo a
célula mater da federação.
Respeitando as liberdades públicas e os direitos dos cidadãos,
a Constituição tem os seus alicerces fundamentais no sentido
democrático, do qual a consciência brasileira jamais se
afastou e jamais se afastará. Organizando a disciplina,
restaurando os princípios da hierarquia, opondo reprezas
poderosas à anarquia e à desordem, a nova Carta Magna não
cria círculos de ferro para oprimir e escravizar.
A carta de 1934, a despeito das melhores intenções que
inspiraram os seus autores, não conseguiu conciliar os ideais
da Revolução de 1930. Obra de políticos, por isso mesma
cheia de defeitos e contrasensos, ela sacrificou muitas das
promessas feitas à Nação pelos revolucionários que tiveram
como chefe civil o Sr. Getúlio Vargas. Dando ao Brasil outra
Constituição o Sr. Getúlio Vargas se reimveste na qualidade
de chefe da Revolução de 30 e retoma o ritmo interrompido
de sua grande obra.
É, pois, na autoridade moral do presidente da República, nos
anseios da Nação que quer viver e prosperar sem os tropeços
de formalismos irrealistas e no sangue dos brasileiros
imolados por um Brasil maior, que vamos encontrar a
legitimação da nossa nova Carta Política."
Diário Carioca, 11 de novembro de 1937

"O presidente da República dos Estados Unidos do Brasil:


Atendendo as legítimas aspirações do povo brasileiro à paz
política e social, profundamente perturbada por conhecidos
fatores de desordem, resultante da crescente agravação os
dissídios partidários, que uma notória propaganda
demagogica procura desnaturar em luta de classes, e da
extremação de conflitos ideológicos, tendentes, pelo seu
desenvolvimento natural, a resolver-se em termos de
violência, colocando a Nação sob a funesta imminência da
guerra civil; atendendo ao estado de apreensão criado no país
pela infiltração comunista, que se torna dia-a-dia mais extensa
e mais profunda, exigindo remédios de caráter radical e
permanente; atendendo a que, sob as instituições anteriores,
não dispunha o Estado de meios normais de preservação e da
defesa da paz, da segurança e do bem estar do povo; Com o
apoio das forças armadas e cedendo às inspirações da opinião
nacional, umas e outras justificadamente apreensivas diante
dos perigos que ameaçam a nossa unidade e da rapidez com
que se vem processando a decomposição das nossas
instituições civis e políticas; resolve assegurar à Nação a sua
unidade, o respeito à sua honra e à sua independência, e ao
povo brasileiro, sob um regime de paz social, as condições
necessárias à sua segurança, ao seu bem estar e a sua
prosperidade; decretando a seguinte Constituição, que se
cumprirá desde hoje em todo o país: (...)"
A Batalha, 11 de novembro de 1937

"Ontem pela manhã, realizou-se no Palácio Guanabara,


convocada pelo Sr. Presidente da República, doutor Getúlio
Vargas, uma reunião coletiva do Ministério. Terminada a
reunião, o gabinete do Sr. Chefe de Polícia forneceu à
imprensa a seguinte nota:
Regressando da reunião realizada hoje pela manhã no Palácio
Guanabara, o Sr. Ministro da Justiça declarou aos
representantes da Imprensa acreditados junto ao seu gabinete
que acabava de ser promulgada a nova Constituição da
República, que ainda hoje será publicada. Ipso facto acham-se
dissolvidos o Senado e Câmara Federais, bem como as
Assembléias Legislativas dos Estados e as Câmaras
Municipais.
Às primeiras horas da tarde, foi dado igualmente,
conhecimento aos jornais do seguinte telegrama-circular
remetido pelo Sr. Ministro da Guerra, general Gaspar Dutra,
aos Comandantes das Regiões Militares:
Urgentíssimo - N. 1.352 - Acaba ser decretada nova
Constituição Federal (vg) assinada pelo Presidente da
República e por todo o Ministério (pt) Entrará em vigor desde
já (pt) Segue Proclamação dirigida ao Exército pelo Ministro
da Guerra (pt) Absoluta calma nesta Capital e em todo o país
(pt) Saudações
(a.) General Eurico Dutra - Ministro da Guerra."
A Nação, 11 de novembro de 1937

"A convite do Sr. Francisco Campos, ministro da Justiça,


estiveram, ontem, no seu gabinete, os diretores de todos os
jornais cariocas. O titular da Justiça declarou aos diretores de
jornais que o governo desejava a colaboração da imprensa na
organização do Estado novo, lembrando para isso a
constituição de um Conselho de Imprensa através do qual
pudessem se entender os poderes públicos e os jornalistas.
Está marcada para hoje, na ABI, uma reunião dos diretores de
jornais para o exame das sugestões do ministro da Justiça.
Por decreto de ontem do presidente da República, foi
nomeado interventor no Estado do Rio de Janeiro, o capitão
Ernani Amaral Peixoto. S. Ex prestará compromisso, hoje, às
11 horas, no Ministério da Justiça e tomará posse às 15 horas,
no Palácio do Ingá.
O embaixador Mario de Pimentel Brandão, ministro das
Relações Exteriores, reuniu, ontem, no Palácio Itamaraty, os
chefes de missões diplomáticas acreditadas junto ao nosso
governo, aos quais fez a seguinte exposição:
Acredito que todos tenham lido nos jornais as notícias dos
últimos acontecimentos. Entendi o, comiudo, do meu dever
concocal-os a fim de prestar-lhes mais alguns esclarecimentos
e responder a quaisquer perguntas que entendam de formular.
(...)
Desde 1934, eramos regidos por uma Carta política que não
mais respondia ao espírito da nossa época. Essa carta
restringia o poder do presidente da República, quando, no
mundo interno, o poder executivo tem sido reforçado. A
experiência mostrou que se tornara difícil o exercício do
poder, sobretudo quando as atividades comunistas se
concentraram no Brasil e produziram consequências que são
de todos conhecidas. Em novembro de 1935, acontecimentos
sangrentos se produziram na Capital e nos Estados do norte
do país. O espírito político, a habilidade e o tacto do
presidente da República encaminharam as coisas de modo em
poucos meses tudo se pôde normalizar. E nessa convicção se
abriu a campanha presidencial. E então notou-se que
elementos agitadores se immiscuiam e se infiltravam nos dois
campos opostos, aproveitando da circunstância da luta
eleitoral, de mais a mais acirrada, desde que não fôra possível
concentrarem-se as facções em torno de um único candidato.
Ao meio da luta, chegaram ao governo provas convincentes
de que estavamos em vésperas de um grande abalo político de
consequências impossíveis de prever. Apesár disso o governo
não poupou esforços, através de todos os meios, pelos
conselhos de prudência e sabedoria a fim de encaminhar as
forças políticas para um terreno de conciliação. Tudo porém
foi em pura perda. E à proporção que falhavam essas
tentativas patrióticas, o presidente da República recebia de
todos os cantos do Brasil manifestações inequívocas de que se
fazia em torno dele, por ele e para ele, um movimento que
congregava a totalidade da opinião sã do país, e lhe pedia uma
solução para a crise manifesta.
Depois de um longo e demorado exame da situação, durante o
qual ouviu figuras representativas das forças vitais da
nacionalidade, foi que o presidente decidiu a decretar a nova
Carta política, para atender ao apelo da Nação. Creio que cada
um dos srs. chefes de missão pôde verificar que, de fato, a
atitude de calma e de confiança do País, nesta Capital e nos
Estados, demonstra que o ato do presidente da República
respondeu plena e auspiciosamente aos anseios do povo
brasileiro.
Tendo promulgado uma nova Constituição, de modo a não
atingir nem à Democracia e nem ao sistema representativo, o
governo tem como base a sua política de realizações, para a
qual espera a colaboração das nações amigas, com cuja
simpatia e amizade conta inalteravelmente. (...)"
Diário de Notícias, 12 de novembro de 1937

"Regressando da reunião realizada hoje pela manhã no


Palácio Guanabara, o Sr. ministro da Justiça declarou aos
representantes da Imprensa acreditados junto ao seu gabinete
que acabava de ser promulgada a nova Constituição da
República, que ainda hoje será publicada. Ipso facto acham-se
dissolvidas o Senado e as Câmaras Federais, bem como as
Assembléias Legislativas dos Estados e as Câmaras
Municipais. Às oito horas da noite o Presidente da República
falará à Nação pelo rádio. (...)
Acaba de ser fornecida à Imprensa, para conhecimento do
povo, cópia da nova Constituição promulgada para o Brasil
em reunião realizada pelo Ministério, sob a presidência do Sr.
Getúlio Vargas, esta manhã, conforme nota que divulgamos.
Recebemos do Gabinete do Chefe de Polícia a seguinte nota:
A nova Constituição foi promulgada. A transformação se
operou de modo pacífico, e teve por fim assegurar a paz à
Nação. A Constituição será submetida a plebiscito nacional.
A nova Constituição assegura, de modo mais completo, a
autoridade da União e arma o Governo de meios normais de
defesa da Ordem. Haverá Parlamento e um Conselho
Consultivo de Ecocomia Nacional. São garantidos todos os
direitos e contratos."
Diário da Noite, 10 de novembro de 1937

AS MANCHETES:

Em virtude das resoluções tomadas ontem pelo governo


foram também dissolvidos a Câmara e Senado Federais,
assim como Assembléias dos estados e as Câmaras
Municipais. Todos os governadores com exceção dos Srs.
Lima Cavalcanti e Juracy Magalhães, solidários com o
presidente da República. Falam ao País e ao Exército o
presidente da República e o ministro da Guerra. Assumiram
os governos da Bahia e Pernambuco os coroneis Villanova e
Fernando Dantas. ( A Nação )
Brasileiros! A Defesa Social Brasileira é um novo Arraial do
Bom Jesus erigido como baluarte do Brasil contra a invasão
vermelha. Nenhum patriota poderá ficar alheio ao seu grande
apelo. Alistai-vos! ( A Nação )
A Constituição hoje promulgada criou uma nova estrutura
legal, sem alterar o que se considera substancial nos sistemas
de opinião: manteve a forma democrática, o processo
representativo e a autonomia dos Estados, dentro das linhas
tradicionais da federação orgânica (do discurso do Presidente
Getúlio Vargas) ( A Nação )
A Constituição Federal Promulgada - Tradições que
permaneceram das Constituições de 1824 e 1936.
Democracia, representação popular direta e indireta.
Inexistência de qualquer preconceito. Manutenção do habeas
corpus. Irretroatividade das leis. Paz, Justica e Trabalho ( A
Nação )
Acaba de Ser Promulgada, Em Reunião No Ministério, Nova
Constituição Para A República ( Diário da Noite )
A atmosfera de tranqüilidade e de confiança em que se operou
a transformação do regime é a melhor prova de que o ato do
governo não foi mais do que a sancção de um decreto do
Povo. - Francisco Campos - ( Diário da Noite )
Haverá parlamento no regime da nova Constituição -
Prorrogado o mandato presidencial até a renovação do
plebiscito - Seis anos, o novo período presidencial - As
candidaturas - Guarantidos todos os direitos e contratos.
( Diário da Noite )
Decretada a Intervenção Federal na Bahia, em Pernambuco e
no Estado do Rio
( Diário de Notícias )
Os Motivos que Determinaram A Decretação Na Nova carta
Política
( Diário de Notícias )
39) Revolta Integralista (1938)
"A cidade amanheceu surpreendida com a notícia de um
movimento sedicioso. Pouca gente ouvira o rádio, às
primeiras horas da madrugada, quando foram ocupadas
algumas estações e transmitidas proclamações rebeldes. Só
hoje, pela manhã, a maioria dos cariocas teve conhecimento
da rebelião integralista, sufocada, imediatamente, pelo
Governo da República.
Embora completamente ineficiente, a revolução direitista, por
menos que tenha durado, abalou profundamente o povo da
Capital. É que o carioca se acha integrado com todo o povo
brasileiro, numa fase intensa de atividade construtora. (...)
A vigilância da polícia política espalhada em todos os setores
da cidade, permanentemente, deu a conhecer os primeiros
indícios da intentona. É que no bairro das Laranjeiras, cerca
das 9h da noite de ontem, foram vistos muitos individuos
moradores dos apartamentos dos edificios da Sul-América,
sairem isoladamente, para logo se juntarem a certa distância.
Provavelmente, tinham o ponto indicado para a organização
do bando que, momentos depois levava a efeito grande assalto
armado. Logo, pelo telefonema ficavam o capitão chefe de
Polícia e o delegado especial de Segurança Pública e Social
conhecedores de tais passos suspeitos..
Mal acabava de ser feita a comunicação por um outro
telefonema, a polícia política era informada do assalto levado
a efeito de surpreza ao Palácio Guanabara. Foi um
acontecimento violentíssimo, pois, o grupo assaltante, armado
e municiado conseguiu no primeiro momento estabelecer o
pavor.
Travou-se renhido tiroteio à frente do jardim do Palácio. Foi
um combate que durou pouco porque uma parte da guarda,
composta de Fuzileiros Navais, aliando-se aos atacantes,
colocou-se na mais franca rebeldia. Estava assim reforçada a
horda dos extremistas da direita. A outra parte da guarda que
não quiz aderir aos rebeldes, colocando-se em situação de
indiferença foi feita prisioneira e encurralada a um flanco do
jardim da Guanabara.
Com o primeiro aviso, foi determinada rigorosa prontidão na
Polícia Especial, de sorte que, verificado o assalto ao Palácio
Guanabara, aquela força civil saiu para entrar logo em ação.
À sua aproximação do Palácio, ouviu-se uma farta fuzilaria.
Os rebeldes, já entrincheirados nas suas posições faziam fogo
contra os seus adversários. Houve necessidade de um recuo
estratégico para tomada de posição, ao mesmo tempo que essa
manobra favorecia a localização das forças armadas fiéis ao
governo. Já haviam sido tomadas providências pelo alto
comando do Exército. Assim que, imediatamente, a guarnição
do Forte do Vigia teve ordem de marchar para o Guanabara, a
fim de combater aos rebeldes. Identicas providências foram
tomadas com o Batalhão de Guardas. Essas duas forças sob o
comando do coronel Oswaldo Cordeiro de Farias, interventor
do Rio Grande do Sul, entrando nas suas posições,
ofereceram o primeiro combate.
Prisioneiro que estava no Guanabara, já às escuras, o
Presidente Getúlio Vargas não perdeu a sua serenidade de
espírito. Afeito a embates de tal natureza, aguerrido como se
sabe, o Chefe da Nação manteve a sua atitude energica
enfrentando com heroismo os rebeldes. Foi uma surpresa para
S. Excia. quando se viu ladeado pelo coronel João Alberto e
major Nelson Mello. Esses dois arrojados militares haviam
saltado os muros do Guanabara para se colocarem ao lado do
Presidente. Enquando se observava isso no interior do
Palácio, fora, exposto às balas, o general Gaspar Dutra,
Ministro da Guerra, dirigia em pessoa as operações militares
em defesa do Chefe de Estado.
Em consequência da forte luta, travada contra os rebeldes o
general Gaspar Dutra, recebeu um ferimento produzido por
estilhaço de granada, na orelha esquerda. Não dando
importância ao ferimento recebido, o Ministro da Guerra
manteve a sua posição de comando.
Apesar de senhores da situação, embora por poucos minutos,
os rebeldes não tiveram coragem de prosseguir na investida
até o interior do Palácio Guanabara. É que, lá dentro, o
próprio Presidente da República, de metralhadora em punho,
engrentava o perigo que o ameaçava. Essa atitude corajosa,
contribuiu para impedir o avanço dos rebeldes. (...)"
Correio da Noite, 11 de maio de 1938

"O Brasil tem um grande, um magnífico destino a cumprir. E


não pode mais admitir que brasileiros sem fibra sem o mais
dignificante dos sentimentos humanos que é o da honra, por
simples ambição pessoal, por sectarismo ou por um desvio
intelectual, se voltem contra a Pátria, perturbando a obra
admirável de reconstrução nacional. (...)
Os acontecimentos da madrugada de ontem apresentam, já
agora, uma significação altíssima. A história os registrará,
mas a memória dos homens fixou, desde já, uma
circunstância idelevel. O presidente Vargas empolga, hoje
mais do que nunca, o país que lhe acompanha a magnífica
trajetória de administrador, servido por um patriotismo
incomum e por uma coragem excepcional, qualidade mais de
uma vez postas à prova, através dos acontecimentos que vêm
perturbando o ritmo da vida nacional. (...)
A rua Pinheiro Machado, calma como sempre, nas primeiras
horas de ontem, foi despertada por grossa fuzilaria. É que a
sentinela do Palácio Guanabara, vendo-se aproximar junto ao
referido palácio um caminhão cheio de homens, dá um grito
de alarme. Logo após, um tiro partiu para o ar e teve como
resposta uma fuzilaria, partida dos passageiros do caminhão
que saltaram rapidos do veículo penetrando no portão
principal do Palácio Guanabara.
A guarda tentou reagir, porém, foi dominada em parte,
enquanto outros subiram ao andar principal do Palácio e
comunicaram o ocorrido ao presidente Vargas. S. Ex. já de
pé, rodeado da Exma. Sra. Darcy Vargas sua esposa, de seus
filhos Manoel e Alzira, de seu irmão Benjamin Vargas, e de
seu cunhado Walter Sarmanho, além de dois leais sentinelas,
um fuzileiro naval e um guarda civil.
No hall do Palácio, senhor de uma bravura sem limites, num
gesto resoluto, arma sua família e dispôs-se o presidente
Vargas a resistir os invasores. Já tinham sido tomadas as
providências que o caso exigia, e, em breve ali compareciam
o coronel Cordeiro de Farias, atual interventor do Rio Grande
do Sul, ora nesta capital, que, com uma força do Exército
procurava penetrar no Palácio.
A fuzilaria partida do interior do Palácio presidencial não
permitiu de pronto o acesso ao jardim do Guanabara. Com a
chegada da Polícia Especial e Militar, reforçaram-se
defensores do Governo que usando de um ardil penetraram
pela porta lateral do Palácio passando pelos terrenos do
Fluminense F. Club.
A presença do Ministro da Guerra, com a coragem e energia
que lhe é peculiar, mais encorajou os soldados da lei que
assim rechassaram os rebeldes, já de posse da parte térrea do
Palácio Guanabara.
Com a chegada inesperada dessas forças defensoras do
governo, os assaltantes procuram fugir. Quinze assaltantes
foram imediatamente presos e outros que fugiam às balas
eram atingidos em parte na sua fuga.
Assim terminou essa louca e ousada aventura dos rebeldes
que ficaram desbaratados pela coragem pessoal do chefe da
Nação e pelas providências prontas das nossas autoridades.
(...)"
A Batalha, 12 de maio de 1938

"A grandiosidade tenebrosa do crime, que assombrou com a


sua sequência de tragédias a madrugada de ontem, não
conseguiu sequer empalidecer, com os rios de sangue que
derramou, a não menor grandiosa atitude do Presidente
Vargas, cuja serenidade não traduz apenas a sua coragem
física, mas, ainda e principalmente, a energia moral de um
predestinado à mais alta chefia da nacionalidade.
Não é possível que aquele sangue-frio, aquela calma
admirável, aquele controle absoluto que permitem
providências prontas e eficazes, se limitem a uma significação
tão pequena de um bravo que a si próprio não poupa na
inconsciência da luta. A coragem pessoa de S. Excia., nunca
desmentida, é o resultado de uma envergadura moral que tem
como cerne o complexo dos mais nobres anseios do povo
brasileiro.
Por isso, quando o Presidente Vargas defendia de armas na
mão o Palácio Guanabara contra o assalto dos sediciosos
ensandecidos, não defendia somente o seu lar ameaçado de
pavorosa chacina, mas também a tranqüilidade brasileira, que
não deu procuração a bandoleiros para lhe guardar a trilogia
organicamente nacional.
Até que enfim, desde a madrugada de ontem, viram a
realidade, os que ainda estavam ludibriados na sua boa fé pela
pregação de sentido, manso e evangélico, com que Plínio
Salgado procurava mistificar o movimento de primarios, cujo
único impulso era a sede de sangue e única finalidade o
assalto liberticida do Poder Público. Aí está o que era o
integralismo. Valhacouto de mashorqueiros, coclave
nauseante de "parvenues" do mais baixo sub-solo moral.
A farandula tragica dos ensandecidos que, na madrugada de
ontem, quiz, a passos de almas penadas levar a efeito o ritual
fúnebre, frente à mortalha da nação assassinada, como
entrevia a imaginação delirante, não passou felizmente de um
sonho que está a desafiar a psicanálise da etiologia do crime e
da loucura. (...)"
A Nação, 12 de maio de 1938

"O país recebeu com tristeza e indignação a notícia da


miserável agressão aos poderes públicos, na qual o
"integralismo" renegou mais uma vez as alegações ordeiras de
seu programa, desmascarando-se na ambição, no despeito e
no rancor que são a realidade de seus intuitos.
A tragicômico "putsch" integralista que salpicou de sangue
brasileiro os jardins e as escadarias do Palácio Guanabara
constituiu uma aventura repulsiva e sem precedentes na
prática de montins contra o governo local. Se até pouco
tempo havia iludido os que de boa fé acreditassem nos
processos de purificação anunciados e prometidos pelos
adeptos do Sr. Plinio Salgado, esses, certamente, terão visto,
de ontem para cá, o que realmente significava a
sistematização daqueles preceitos de Deus, Pátria e Família
que acobertavam os propósitos faccinoras, e serviam de base
a uma sedição cuja finalidade era crime contra a Pátria. (...)
O movimento foi iniciado com uma requintada técnica de
perversidade. as casas dos mais eminentes homens públicos e
militares foram escaladas para assaltos brutais e sanguinários.
A paz dos lares e a sensibilidade pelo refugio sagrado das
famílias foram violadas a horas altas da noite. Em seguimento
ea esse prólogo de celeres matanças o drama da escalada do
Palácio Guanabara, residência do chefe da Nação. (...)
Sobre as trágicas horas durante as quais a família do
presidente da República resistiu sem comunicações e balda de
reforços materiais à fúria dos assaltantes, ouvimos ontem um
relato de um daqueles que condividiram o perigo e a incerteza
daquele transe inesperado:
Era uma hora da manhã mais ou menos, quando dois
caminhões repletos de indivíduos disfarçados em fuzileiros
navais chegaram de chofre aos portões do Guanabara,
declaramdo virem de ordem superior para completar a defesa
do palácio, guardado insuficientemente pelo destacamento de
costume. a primeira sentinela, não acreditando na alegação,
deu alarma.. Os atacantes dirigiram-se rapidamente ao outro
portão, chamando à fala a outra sentinela que, ao se
aproximar, foi morta incontinenti.
Varando o portão já eles se dispuseram em ordem de ataque e
se dividiram em grupos em torno do Guanabara, sendo que o
mais numeroso tentou atingir a portaria e subir as escadas.
além da guarda normal cuja posição não era possível
identificar no momento, a nossa guarda interna era constituida
por dois elementos de confiança que procuraram resistir com
duas metralhadoras de que dispunhamos. Uma, porém, estava
desmantelada. A outra é que serviu de ponto de apoio à nossa
resistência lá no interior. Como entre os atacantes figurasse
um sargento que parecia nos ser dedicado, um dos nossos
investigadores a ele se dirigiu confiante, mas foi preso e
dominado.
Ficamos, portanto, reduzidos a um investigador manejando a
única metralhadora. Constituiu uma grande "chance" para
nós, não atinarem os atacantes com o lugar em que nos
encontravamos. Nessa emergência só nos restava o recurso
dos telefones. Os aparelhos da Light tinham sido, porém,
desligados e nos cingimos aos telefones oficiais. Com esse
nos comunicavamos para fora e recebiamos informações dos
nossos amigos.
- Mas eesas informações, perguntamos, eram de molde a
tranquilizar?
- Qual! Houve um momento em que nos avisaram que a casa
do General Góes Monteiro fora assaltada, a do Ministro da
Guerra idem, e que os revoltosos já se achavam de posse do
Ministério da Marinha. esse foi o momento mais cruciante,
porque não nos falavam em reforços.
O presidente, com a sua serenidade habitual, queria percorrer
o palácio, para ver como poderia reforçar a defesa. Nós todos
lhe faziamos apelos a que ele não atendia.
Foi então que o nosso amigo Filinto Muller nos avisou que a
Polícia Especial já penetrara nos jardins do palácio para nos
socorrer.
Estavamos todos alojados na ala esquerda, mergulhados na
escuridão, e procuramos divisar os elementos da Polícia
Especial. De uma janela, pareceu-me ver, deitado, no manejo
de uma metralhadora, alguém que acreditei ser o tenente
Queiroz.
Queiroz, Queiroz, disse-lhe em voz baixa, mas em vez do
reconhecimento amigo caiu sobre o palácio uma chuva de
balas. depois soubemos das providências do ministro da
Guerra e da vinda do coronel Cordeiro de Farias, pelo lado do
Fluminense. Um de nós abriu com cautela a porta secreta do
palácio que dá para o clube e os nossos amigos vieram se
arrastando como crocodilos.
Daí em diante, as providências se sucederam e a reação dos
nossos aumentou. Foi um verdadeiro milagre se não fomos
massacrados. As únicas armas de que dispunhamos eram seis
revólveres de puco alcance. Ao todo eramos seis. Já às quatro
e meia, quando as luzes acenderam, é que vimos os rostos dos
que estavam ao nosso lado. depois de alguns minutos
começamos a ver também os prisioneiros, todos com caras
desconhecidas.
- E o Presidente?
- Sempre o mesmo, concluiu o nosso informante. A sua
preocupação durante todo o tempo consistiu em ver como
poderia aumentar a nossa resistência e como poderia dirigil-a.
Como sempre imperturbável. Com o seu exemplo, todos
permanecemos calmos e confiantes. A coragem de um chefe
vale tanto como uma boa trincheira. Ao lado do presidente,
nós nos sentimos seguros."
Diário Carioca, 11 de maio de 1938

"A Polícia Civil tinha conhecimento de que elementos da


extinta Ação Integralista vinham planejando uma revolução.
Providenciando, fez investigadores especiais juntarem-se às
fileiras do sigma, a fim de melhor orientar-se a respeito do
citado movimento.
Ontem, às 21 horas, a Delegacia Especial de Segurança
Política e Social vio a saber que no Quartel da Polícia Militar
se apresentara um oficial acompanhado de dois civis, levando
uma ordem assinada pelo dr. Israel Souto no sentido de ser
posto em liberdade o coronel Euclydes de Figueiredo. O
oficial de dia, no quartel, desconfiando, dirigiu-se à sala da
Ordem, e dali, pelo telefone, comunicou-se com o delegado
Especial de Segurança Pólítica e Social, tendo o dr. Israel
Souto afirmado não ter dado tal ordem. Era evidente a cilada,
e o oficial negou-se a atender. Diante do ocorrido, o delegado
Israel Souto, imediatamente, tomou providências, distribuindo
investigadores armados por todos os cantos da cidade.
Os policiais, logo de início, notaram desusado movimento em
casas residenciais da rua das Laranjeiras, moradias de
integralistas conhecidos. Outros edifícios, onde entravam e
saiam homens a toda hora, foram sujeitos a estreita vigilância,
sendo o dr. Israel posto a par de tudo que ocorria. A
autoridade, tomando rápidas providências, entendeu-se com
os Ministérios de Guerra e da Marinha, Polícia Especial e
Militar.
Aos 4 minutos de hoje foram ouvidos os primeiros disparos,
partidos de vários pontos da cidade. era o início do levante, e
providências para debelal-o foram tomadas com a maior
urgência. A ação repressora da Polícia Civil fez-se sentir mais
energica no Palácio Guanabara, residência do presidente da
República. No momento em que a guarda ia ser rendida,
houve motim. (...)"
Diário da Noite, 11 de maio de 1938

AS MANCHETES:
Cresce A Repulsa do Povo Brasileiro Contra A Odiosa
Intentona Verde - O Crime Dos Renegados - O Assalto Ao
Guanabara No Impressionante Relato De Um De Seus
Defensores ( Diário Carioca )
Resistindo E Dominando A Intentona Verde O Presidente
Getúlio Vargas Ofereceu Ao Brasil Provas eloquentes De Que
A Nacionalidade Não Podia Escolher Mais Bravo E Nobre
Guardião De Sua Integridade! ( A Nação )
Jugulada A Infâmia Verde ( A Nação )
Jugulada, Completamente, A Segunda Mashorca Integralista
( Correio da Noite )
Dominado O Levante Dos Integralistas ( A Batalha )
Os Revoltosos Serão Julgados Sumariamente Pelo Tribunal
de Segurança -
Golpe Integralista Irrompeu À Meia Noite, Em Vários Pontos
da Cidade
Um Movimento Sedicioso Prontamente Reprimido -
Assaltados O Palácio Guanabara, O Ministério E O Arsenal
Da Marinha, Estações Ferroviárias, Difusoras E Telefônicas,
A Residência Dos Generais Goes Monteiro e Valentim
Benicio -Terrorismo No Centro Urbano - Incêndios, Tiroteios
E Correrias - Tentativa Contra O Tesouro E A Inspetoria de
Veículos - Muitos Mortos E Muitos Feridos ( Diário da
Noite )
40) Vargas Deposto (1945)
"O Brasil viveu ontem horas de intensa agitação provocada
pela atitude de intransigência do Sr. Getúlio Vargas. O
ditador, apoiado pelos "queremistas", planejou e executou o
seu último golpe, com a nomeação de seu irmão Benjamin,
para a Chefatura de Polícia. Indiretamente, fez-se sentir um
grande movimento de repulsa, que culminava com a sua
renúncia ao poder, consequência de seu "ultimatum" que lhe
foi feito pelas classes armadas.
Logo após ter transmitido a chefia de Polícia ao Sr. Benjamin
Vargas, desde ontem titular do posto em substituição ao
antigo coordenador, o Sr. João Alberto esteve no Ministério
da Guerra tendo-se feito acompanhar pelo comandante da
Polícia Especial, o Sr. Eusebio de Queiroz. Ali estiveram em
demorada conferência com o general Góes Monteiro.
Ao terminar a reunião, que durou mais de uma hora, pôde ser
notado intenso movimento naquele Ministério, fato que ainda
mais chamou a atenção em virtude de terem sido trancados os
portões fronteiros e laterais, não sendo permitido, portanto,
nem a entrada nem a saída de civis. Imediatamente foi
proclamada rigorosa prontidão para todas as tropas que
servem ali. Enquanto isso, a cidade se enchia dos mais
alarmantes boatos, e os nossos telefones não cessavam de
tilintar todos ávidos de informações.
Por volta das 18 horas, tropas do Exército ocupavam a praça
da República, colocando imediatamente nos principais
entroncamentos metralhadoras. O trânsito ficou desde logo
impedido para veículos, salvo os de caráter forçado. E quanto
aos pedestres, só podiam passar os que se destinassem a suas
residências.
Às 18,30 horas, tivemos informações de que as tropas
motomecanizadas sediadas no Derbi Clube compostas de
tanques, se dirigiam para o centro da cidade, certamente para
reforçar as que já se encontravam na Praça da República. (...)
Pouco depois das 19 horas, três caminhões do Exército, com
soldados armados, saiam do Ministério da Guerra em direção
ao Palácio do Catete, a fim de guarnecê-lo. Também o Palácio
Guanabara estava guarnecido por tropas que imediatamente
interditaram o trânsito pelas ruas Paissandú e Álvaro Chaves.
(...)
A Avenida Presidente Vargas, em toda a sua extensão, ficou
desde cedo ocupada por tropas do Exército, constituídas do 3o
Regimento de Carros de Combate e, às 20 horas, chegava ao
mesmo local o 1o Grupo de Obuzes. (...)
Depois de tomarem conhecimento da exoneração do Sr.
Henrique Dodworth, os secretários da Prefeitura solicitaram
também exoneração coletiva. Foi oficialmente noticiada a
nomeação do Sr. João Alberto, novo prefeito do Distrito
Federal. A comunicação da exoneração do Sr. Henrique
Dodworth lhe foi dada por telefone pelo Sr. Agamenon
Magalhães. (...)
Às 11,30 da noite de ontem, depois dos acontecimentos que
são do domínio público, o Sr. Getúlio Vargas renunciou,
entregando o Governo ao presidente do Supremo Tribunal
Federal, ministro José Linhares.
Às duas horas e meia, realizou-se, no Ministério da Guerra,
perante os chefes militares, a posse do Ministro José
Linhares, como Presidente da República
Perguntado pelo representante de Resistência, se haveria
restabelecimento de censura à imprensa, o Ministro João
Alberto exclama:
Os senhores estão proibidos de falar sobre esse assunto. Não
há, e jamais haverá censura à imprensa. Peço a todos, pois,
uma colaboração leal e de sentido construtivo, dentro da mais
ampla liberdade."
Resistência, 30 de outubro de 1945

"O general Pedro Aurélio de Góes Monteiro, em nome das


Classes Armadas, declara que o Exmo. Sr. Presidente da
República, diante dos últimos acontecimentos e para evitar
maiores inquietações, por motivos políticos se afastará do
Governo, transmitindo o poder ao Presidente do Supremo
Tribunal Federal (...)
Cumprindo a 1a Região Militar assegurar a ordem na Capital
Federal e evitar qualquer exploração de elementos
indesejáveis, previne-se à população que, por medida de
ordem, foi determinada a prontidão rigorosa de todas as
unidades. Medidas de segurança estão sendo tomadas, de
combinação com a Marinha, Aeronáutica e Polícia Civil e
Militar. Todos os oficiais, sargentos e demais praças, ao terem
conhecimento desde aviso deverão se recolher aos respectivos
quartéis.
No Ministério da Guerra, ontem à noite, o general Cordeiro
de Farias, por incumbência do general Góis Monteiro, falou
aos jornalistas, informando-os a respeito dos acontecimentos
do dia.
O general Cordeiro de Farias começou dizendo que ao serem
informados da nomeação do Chefe de Polícia do Distrito
Federal, os generais estiveram reunidos no Ministério da
Guerra, examinando a situação. A reunião foi presidida pelo
general Góis Monteiro, ministro da Guerra, que se manifestou
solidário com os seus camaradas de armas, enviando ao
presidente da República o seu pedido de exoneração do cargo
que vinha ocupando no seio do governo. Os generais
dirigiram então um apêlo ao general Gois Monteiro para que,
não já como ministro da Guerra, mas como Comandante
Supremo do Exército, se colocasse à testa do mesmo, tendo
em vista os altos interesses da nação brasileira e da
tranquilidade nacional. (...)
O general Góis Monteiro, como Comandante do Exército,
designou para chefe de seu Estado maior o general Cordeiro
de Farias. mais tarde o general Cordeiro de Farias, em
companhia do ministro Agamemnon Magalhães e do general
Firmo Freire, dirigiu-se ao Palácio Guanabara a fim de
informar o presidente Getúlio Vargas, a cerca do que se
estava passando. O presidente autorizou então o general Góis
Monteiro a dirigir ao país a proclamação cuja cópia o general
Cordeiro de Farias deu ali mesmo aos jornalistas. Nessa
proclamação se anuncia que o presidente Getúlio Vargas
declarou que se afastaria do governo, transmitindo-o ao
presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro José
Linhares.
O general Cordeiro de Farias comunicou ainda que o
Ministério da Guerra manteve constante entendimento com os
comandantes de todas as Regiões Militares, as quais se
manifestaram solidárias com a decisão dos generais nesta
capital. O ministro João Alberto reassumiu a Chefatura de
Polícia."
A Manhã, 30 de outubro de 1945
"O general Cordeiro de Farias reuniu os jornalistas, na
madrugada de hoje, para expor os vários fatos que de
desenrrolaram ontem, nesta Capital, e que terminaram com a
renúncia do Presidente da República, que passou o poder ao
Presidente do Supremo Tribunal Federal. O general Cordeiro
de Farias disse de início:
O general Góis Monteiro, quando se tornou pública a
nomeação do chefe de Polícia do Distrito Federal, deliberou
renunciar ao cargo de Ministro da Guerra, dirigindo uma carta
ao Sr. Presidente. No entanto, atendendo a um apelo dos
generais, inclusive em radiogramas dos comandantes das
diversas Regiões Militares que secundaram com o seu apoio
os colegas que aqui se reuniram, resolveu permanecer como
Comandante Em Chefe do Exército Brasileiro, nomeando-me
para Chefe de seu Estado Maior.
Nesta ocasião - continuou Cordeiro de Farias - foram dadas
ordens às Unidades do Exército para se deslocarem para as
proximidades do Quartel General, o que teve início
aproximadamente às 18 horas. Estas forças ficaram em
situação de poder executar qualquer ordem que se fizesse
necessária.
Continuando, disse:
Desde o início, estiveram presentes no Ministério da Guerra
os Srs. general Eurico Gaspar Dutra e brigadeiro Eduardo
Gomes, tendo também comparecido o ministro Agamemnon
Magalhães e o Chefe da Casa Militar do Presidente da
República, general Firmo Freire.
Às 21,30 horas - continuou o general Cordeiro de Farias -
acompanhado do ministro Agamemnon Magalhães e do
general Firmo freire, dirigi-me para o Palácio Guanabara,
onde, em nome do general Góis Monteiro, dei conhecimento
ao Presidente dos acontecimentos que estavam se
desenrolando. Por essa ocasião, transmiti ao Sr. Presidente o
apelo do general Góis Monteiro que, já nesse momento,
falava em nome do Exército, Aeronáutica e Marinha, para
que, com o seu espírito de patriotismo, evitasse o
ensanguentamento da família brasileira - declarando-lhe
também a firmeza da decisão das classes armadas - que não
desejavam a luta, principalmente nas regiões onde estava
sediado o Governo. Atendendo a esse apelo o Sr. Presidente
da República acedeu, dizendo-se pronto a entregar as funções
do Governo ao Presidente do Supremo Tribunal Federal e
dizendo que neste sentido poderia o general Góis Monteiro
fazer uma proclamação ao país. (...)
O Radical, 30 de outubro de 1945

"Apesar das desesperadas tentativas dos políticos das


oposições coligadas, que, com a constante confusão que
estabelecem no espírito público, procuram insinuar que o país
está sendo governado por uma ditadura militar, o povo não
deve iludir-se com essa manobra. O Chefe do Governo é o Sr.
Getúlio Vargas e com ele estão as nossas forças armadas e
Nação."
Correio da Noite, 29 de outubro de 1945

"Resolveu-se em poucas horas, com a rapidez dos


acontecimentos cósmicos, a crise que nos últimos meses
ensombrava os horizontes da Nação, ameaçando, na tarde de
ontem, degenerar em guerra civil.
A mudança de altos dignatários do governo foi sinal decisivo
para a mudança de ritmo nos fatos cujo lento desenrolar era
um cauterio permanente sobre os nervos tensos da população.
A ação do Exército foi rápida. As tropas motorizadas
desceram para a Cidade e tomaram posição nos pontos
estratégicos, foram guardados os palácios do governo,
ocupadas as estações radiotelegráficas, alinhados os tanques
ao longo da Avenida Presidente Vargas e ficaram de
prontidão as tropas no Campo de Santana.
É de justiça ressaltar nesse momento o espírito de renúncia e
o bom senso com que o Sr. Getúlio Vargas aceitou os
acontecimentos, evitando com a sua pronta aquiescencia à
declaração dos generais, momentos de intranquilidade e de
desordem na capital da República. (...)
Segundo informações oficiais reina a mais completa
tranquilidade em todo o pais. Nenhuma modificação foi feitas
nas administrações estaduais, salvo no Pará, onde o
interventor Magalhães Barata havia se demitido, a fim de
concorrer às eleições. Para não ficar o governo acefalo o gal.
Alexandre Zacharias de Assunção, comandante da Região,
tomou posse interina daquelas funções acumulativamente.
Às 11 horas esteve no Palácio da Guerra, onde conferenciou
com o General Góes, o Ministro José Linhares. O novo
presidente da República deverá tomar posse ás 15 horas, no
Palácio do Catete.
O general Góes Monteiro, na manhã de hoje, convidou a
todos os generais para assistirem á cerimonia de entrada em
exercicio do ministro José Linhares no cargo de Presidente da
Republica, que terá lugar ás 15 horas de hoje, no Palácio do
Catete.
Ás 11 horas de hoje, chegou ao Palacio do Exercito o ministro
José Linhares, novo chefe do Governo. S. Excia. entrou logo
em conferencia com o general Góes Monteiro e outras altas
autoridades ali presentes. Essa conferencia prosseguia ainda
ás 12 horas. (...)
Correio da Noite, 30 de outubro de 1945

"Após a cerimônia de posse, no Ministério da Guerra, A Noite


procurou o presidente José Linhares. (...)
A finalidade de minha missão é fazer realizar as eleições já
marcadas para 2 de dezembro próximo.
E depois de tecer considerações em torno da hora que o país
está vivendo, concluiu:
A minha responsabilidade é muito grande mas a das Forças
Armadas é ainda maior.
Pouco depois da meia noite, o Sr. Getúlio Vargas já havia
assinado, no Palácio Guanabara, o ato de sua renúncia formal.
O ministro da Justiça, Sr. Agamemnon Magalhães tomando-a
em màos, deixou imediatamente o Palácio, dirigindo-se, de
automóvel, ao Quartel General, onde se encontravam
reunidos os generais. O documento histórico foi entregue ao
general Góis Monteiro alguns minutos depois. (...)
Cerca de duas horas da madrugada ainda era bem grande o
movimento de militares, autoridades e jornalistas no Palácio
da Guerra, pois corria a notícia de que o ministro José
Linhares, novo presidente da República, dentro de poucos
minutos tomaria posse no mais elevado cargo na
administração do país e que a mesma teria lugar no gabinete
do ministro da Guarra. (...)
Antes de falar à imprensa, por intermédio do general Oswaldo
Cordeiro de Farias, o general Góis Monteiro, lançou a
seguinte nova proclamação:
O general Pedro Aurélio de Góis Monteiro, em nome das
Classes Armadas, declara que o Exmo. Sr. Presidente da
República, diante dos últimos acontecimentos e para evitar
maiores inquietações, por motivos políticos se afastará do
Governo, transmitindo o poder ao presidente do Supremo
Tribunal Federal. O Sr. Presidente fará uma proclamação ao
povo brasileiro, concorrendo com sua renúncia e alto
patriotismo para que a ordem publica não sofra a solução de
continuidade e se mantenha inalterável o prestígio do Brasil."
A Noite, 30 de outubro de 1945

AS MANCHETES:
Nosso Governo É Civil ( Correio da Noite )
Reina Ordem Em Todo O País ( Correio da Noite )
A História E O Tempo Falarão Por Mim, Discriminando
Responsabilidades
Despedindo-se Do Povo Brasileiro, Em Mensagem Antes De
Embarcar O
Ex-Presidente Getúlio Vargas Diz Que Não Guardará Nem
Ódios Nem Prevenções Pessoais - A Integra Do Documento
( Correio da Noite )
Getúlio Vargas Lançará Uma Proclamação Ao Povo
Brasileiro - A Renúncia Do Chefe Do Governo Para Evitar O
Ensanguentamento Da Família Brasileira
O Ministro José linhares É O Novo Presidente - Volta À
Chefia De Polícia O Ministro João Alberto - O General Góis
Monteiro Aclamado Chefe Do Exército - Empossado O Novo
Governo - Outras Notas ( O Radical )
Os Acontecimentos De Ontem - Com A Renúncia Do Sr.
Getúlio Vargas, Assumirá O Governo O Presidente Do
Supremo Tribunal Federal - A Reunião Dos Generais No
Ministério Da Guerra - O General Góis Monteiro No
Comando Do Exército - O General Dutra E O Brigadeiro
Eduardo Gomes Na Reunião ( A Manhã )
Deposto Getúlio Vargas ( Resistência )
Deverá Deixar O Rio, Amanhã, O Sr. Getúlio Vargas
Empossado No Governo O Ministro José Linhares
O Presidente Linhares Fala A A Noite ( A Noite )
Hoje No Catete O Novo Presidente ( A Noite )
Empossado No Governo O Ministro Linhares ( A Noite )
Partiu Para São Borja O Sr. Getúlio Vargas ( A Noite )
41) Fechamento dos Cassinos
(1946)
"O ministerio esteve reunido hoje, pela manhã, sob a
presidência do general Eurico Gaspar Dutra, chefe do
Governo, com a presença de todos os secretarios de Estado e
do chefe do Departamento Federal de Segurança Pública.
A sessão que teve inicio um pouco antes da 10 horas,
prolongou-se até às 12,45. Á saida do ministro da Justiça, dr.
Carlos Luz, abordado pelos jornalistas presentes declarou que
um dos principais assuntos tratados foi o concernente à
medidas de combate ao comunismo.
O nosso redator indagou se havia sido deliberado o
fechamento do Partido Comunista, tendo S. Excia respondido
negativamente, declarando, ainda, que apenas se traçara um
plano geral sobre a questão.
A seguir entregou aos jornalistas uma cópia do seguinte
decreto-lei que manda extinguir o jogo em todo o território
nacional, que hoje foi assinado e que foi o outro assunto
importante ventilado na reunião:
- O presidente da República, usando da atribuição que lhe
confere o artigo 180 da Constituição e considerando que a
repressão aos jogos de azar é um imperativo da consciência
universal; considerando que a legislação penal de todos os
povos cultos contem preceitos tendentes a esse fim;
considerando que a tradição moral, jurídica e religiosa do
povo brasileiro é contrária à prática e a exploração dos jogos
de azar; considerando que das exceções abertas à lei geral
decorreram abrigos nocivos à moral e aos bons costumes;
considerando que as licenças e Concessões para prática e
exploração dos jogos de azar na Capital Federal e nas
estancias hidroterapicas balnearias ou climáticas, foram dados
à titulo precário, podendo ser cassadas em qualquer momento;
Decreta:
Artigo 1º - Fica restaurada em todo o territorio nacional a
vigência do artigo 50 e seus parágrafos da lei de
Contravenções penais, decreto-lei 3.688 de 2 de outubro de
1941.
Artigo 2º - Esta lei revoga os decretos-leis nos 241 de 4 de
fevereiro de 1938, no 5089 de 15 de dezembro de 1942 e no
5192 de 14 de janeiro de 1943 e disposições em contrário.
Artigo 3º - Ficam declaradas nulas e sem efeito todas as
licenças, concessões ou autorizações dadas pelas autoridades
Federai, Estaduais e Municipais, com fundamento nas leis ora
revogadas ou que de qualquer forma contenham autorização
em contrário ao disposto do arigo 50 e seus parágrafos das
leis das contravenções penais.
Artigo 4º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
O titular da Justiça continuando a palestra com os
representantes da imprensa informou que na próxima reunião
ministerial prosseguiria o assunto relativo ao combate ao
Comunismo e que seriam tratados outros assuntos de
relevância, pois, hoje não houvera tempo para isso. O general
Góis, cercado pelos jornalistas fazendo blague, disse apenas: -
Nada houve hoje do meu jogo."
Correio da Noite, 30 de abril de 1946

"O presidente da Republica, general Dutra, reuniu o


Ministério e baixou o decreto que extingue o jogo, em todo o
país. A repercussão dessa providência do govêrno nesta
capital e nos Estados foi mais do que impressionante,
verdadeiramente sensacional. As edições dos vespertinos
esgotaram-se rapidamente, sob o enthusiasmo dos
comentários populares. A decisão enérgica das altas
autoridades da República, a maneira como foi redigido o
decreto, que nem ao mesmo adiou a aplicação de seus efeitos
por um prazo qualquer, de vez que a lei entra em vigor, hoje
mesmo, logo que o "Diário Oficial" a publique - tudo isso
mostra que o chefe do govêrno está allertado e vigilante na
defesa dos mais altos interesses nacionais.
O povo brasileiro congratula-se efusivamente com o
Presidente Dutra por essa lei que acaba de emitir. O Radical
foi o único jornal que, num longo período da vida pública
brasileira, jamais deixou de combater o jogo, vendo nele um
mal social de efeitos terriveis.
Daí decorre a íntima satisfação com que vemos embora sem
surpresa para nós, o gen. Dutra decretar a guerra de morte às
tavolagens, que iam proliferando no Brasil como orelhas de
pau em madeira podre. A onda da jogatina, partindo das
estações termais, passou às estações balneárias, ganhou todo o
interior do país, nas suas várias modalidades, havendo, como
houve, homens do govêrno que tiravam dessa tremenda
infecção social verbas destinadas a despesas com a
administração. (...)"
O Radical, 1 de maio de 1946

"Foi com indisfarçavel surpresa e mesmo com ansiosa


expectativa, que a cidade recebeu a notícia do decreto do
presidente da República, extinguindo o jogo em todo o país.
A medida, pela sua propria natureza, despertou varios
comentários, mas verdade é que, se diga que a maioria viu
com a maior simpatia o decreto governamental.
Em ampla e oportuna "enquête", A Manhã ouviu
representantes de todas as classes sociais. O cardeal D. Jaime
Câmara, com a autoridade de sua palavra, falou ao reporter
sobre os beneficios que advirão dessas medidas. Também se
fizeram ouvir expoentes do espiritismo e do protestantismo.
Não foi esquecido, igualmente o homem do povo que
moureja, e que, mais facilmente, é tentado á batota, deixando
ali, não raro, o produto de trinta dias de árduo labor.
Nesse inquerito que fizemos, e que tão bem compreendido foi
pelos que nêle depuseram, como de resto será pelos nossos
leitores, tivessemos esse mesmo objetivo para o qual foi feito
o decreto de ontem: mostrar que o jogo, efectivamente,
perverte o homem e corrompe a sociedade.
E a reportagem de A Manhã, dando início à sua "enquête",
ouviu na tarde de ontem, algumas horas depois de divulgado
o importante ato, sua Emminencia o Cardeal D. Jaime
Câmara, chefe supremo da Igreja Católica no Brasil. Nossa
reportagem foi gentilmente recebida pelo eminente prelado,
que se pôs inteiramente ao dispor do reporter. Fala-nos sua
Emminencia:
- Já estava esperando tal medida, dada a orientação que o
Govêrno manifestou há tempos passados. Entretanto, não
trabalhei para isto. A medida se impunha para elevar o nivel
moral e social dos brasileiros. Agora, se há problemas anexos
à extinção do jogo... Com um bondoso sorriso de simpatia e
tolerancia sua Emminencia concluiu:
- Foi uma grande solução. O Presidente não é um govêrno de
precipitação. (...)
Passamos pelo largo de S. Francisco quando o imenso sino da
igreja do mesmo nome anunciava, com sonoras e
compassadas pancadas a Ave Maria. Eis que o fotógrafo
Horacio nos dá uma grande idéia: ouvir o sineiro.
Subimos 110 degraus e chegamos ao cimo da torre. José
Lamas, o sineiro de 59 anos de idade, foi tomado de surpresa,
quando ainda acionava as cordas do sino. A pergunta foi-lhe
feita.
- Eu esperava este gesto do brigadeiro Eduardo Gomes, dono
de minha simpatia, caso fosse eleito. Mas, vejo agora, mais do
que nunca, que o Presidente Gaspar Dutra é um grande
presidente; não esperava a medida. Mas gostei. Nunca joguei.
Tenho terrivel aversão ao jogo. As vezes, em casa falam em
jogo do bicho. Quando ouço isso, fico seriamente aborrecido.
Há 23 anos trabalho nesta Ordem e há 41 anos na Ordem de
Terceira de Bom Jesus do Calvário. E concluiu: - Nunca bati
uma Ave Maria com tanto entusiasmo. (...)"
A Manhã, 1 de maio de 1946

"O recente ato do Governo Federal extinguindo o jogo em


todo o território nacional atingiu decisiva e inapelavelmente
um dos pais importantes setores da atividade social: o Teatro.
Não seria exagero acentuar que, realmente existiu de parte do
Governo indesculpável inadvertencia. As condições objetivas
do meio social brasileiro não apresentam, como acontece na
Inglaterra, por exemplo, condições próprias no incentivo do
setor artistico do povo. Por isso julgamos inadvertido o
Governo, atingindo exabrutamente os profissionais que,
trabalhando nos casinos se encontram, da noite para o dia, ao
desemprego e, - o que é catastrofico - se viram
desempregados: atores, cantores, bailarinos, musicos, enfim,
um verdadeiro mundo onde o ingresso independe de simples
desejo de ganhar a vida mas, exige, ao contrário, vocação,
estudo, perseverança e talento. (...)
Abordando a questão nester termos, Resistência, como a
maioria da imprensa democrática do pais, não poderia deixar
de atender uma realidade a existência de um problema cuja
solução se encontra nas próprias mãos de quem, orientando-se
num sentido respeitável e mesmo louvável, decretou o
fechamento do jogo, como necessidade imperiosa diante
problemas gravissimos na vida da nação.
Queremos dizer que, o sr. Presidente Eurico Gaspar Dutra,
usando de atribuições conferidas na transitoriedade da Lei
vigente, poderia, alertado com as novas condições criadas
pelo seu desejo de solucionar problemas sociais, agir
rapidamente e eficientemente no sentido de que, o Teatro
Brasileiro não sofra tão rude golpe em seu futuro. (...)
Coerente com as suas diretivas, Resistência inicia um
movimento de apoio ás reivindicações de todos aqueles que,
por força do decreto-lei que extinguiu o jogo, se viram em
situação de inesperado desajustamento em sua atividade
laboriosa. (...)"
Resistência, 5 de maio de 1946

"É com verdadeira emoção e sem reservas nos aplausos


devidos que, hoje, nestas colunas, onde tantas vezes
profligamos a jogatina e outras tantas vezes nos vimos
privados de combate-la, registramos o ato do Governo da
República determinando a pura e simples vigencia do
sispositivo das leis penais proibitivo da exploração dos jogos
de azar, que havia sido suspenso por um ato típico da ditadura
estadonovista. Não hesitamos em trazer as mais calorosas
congratulações ao presidente, que o assinou, num assomo de
dignificação do poder, verdadeiramente restaurados de linhas
essenciais da moral publica do país, e penetrado de corajoso
ânimo saneador e, em essencia, coerente com o pensamento
do ministro da Guerra signatario de serena e enérgica
recomendação aos seus comandados ao tempo em que a
industria do pano verde era uma das colunas basilares do
regime.
Cumprimos o dever de ressaltar toda a significação do
decreto-lei ontem assinado, recordando que, de inicio, não
pudemos manifestar confiança na firmeza com que o atual
presidente enxergaria o assunto. É que, embora o passado
limpo e a incontestada honradez pessoal de s. ex.
autorizassem a crer na sua sincera aversão ao jogo, não
haviamos de subestimar a influencia das correntes que
apoiaram a sua candidatura, entre as quais se encontraram
fartos exploradores da roleta, em todo o país, alarmados pela
leal e clara definição do candidato adversario, o brigadeiro
Eduardo Gomes. (...)
Maior é, pois, o entusiasmo com que assinalamos a medida
ontem decretada, pois contem ela um inegavel sentido
afirmativo contra certos entorpecentes da ação moralizadora
atribuida ao Estado. Vem ela ao cabo de anos e anos de
campanha tenaz, que este jornal sustentou, sozinho, seja
recusando não só a publicidade ostensiva dos cassinos, como
de suas roupagens artisticas e turisticas, seja profligando
doutrinariamente o vicio, seja provocando pronunciamentos
de vozes autorizadas, muitas vezes sofrendo vedações e
castigos. (...)"
Diário de Notícias, 1 de maio de 1946

"Apesar de não ser um ato politico no sentido restrito do


termo, o Decreto-lei extinguindo os jogos de azar em todo o
território nacional, ontem assinado pelo Presidente da
República, o é, no sentido amplo da palavra, pois que marca
de modo incisivo os rumos moralizadores do novo Governo.
Nesse sentido compreende-se a grande e excelente
repercussão que o mesmo causou em todas as classes sociais
e, principalmente, na Assembléia Nacional Constituinte.
Os comentarios que ali se faziam ao ato do General Eurico
Gaspar Dutra eram os mais elogiosos.
Nos aplausos á decisão moralizadora do Poder Executivo
confundiam-se governantes e oposicionistas.
O sr. Lino Machado que se vem distinguindo pela energia e
continuidade com que critica os atos do Governo passado e
mesmo do atual, foi á tribuna da Assembléia para dizer que,
embora contrario aos Decretos-leis, queria, com a mesma
sinceridade com que, por vezes, discordava do Governo,
aplaudi-lo agora com entusiasmo, pelo seu ato, que
considerava e proclamava um grande Decreto.
E depois de emitir mais algumas considerações, sempre
apoiado pela Assembléia, o sr. Lino Machado abandonou a
tribuna entre os aplausos unanimes da Casa."
Jornal do Brasil, 1 de maio de 1946

AS MANCHETES:
Extinção Do Jogo E Combate Ao Comunismo ( Correio da
Noite )
O General-Presidente Resgata A Palavra Dada À Nação -
Revestiu-se De Aspecto Sensacional A Providencia Do
Governo Extinguindo A Jojatina Em Todo O Pais - O
Boatejar Dos Exploradores Do Jogo Estava Comprometendo
A Honra De Respeitaveis Autoridades Publicas - O Decreto
Restabelece O Respeito Ao Código Penal - O Povo Sempre
Confiou No Presidente Dutra
( O Radical )
Todos Contra O Jogo - "A Manhã" Ouve Representantes De
Todas As Classes Sociais, Acerca Do Sensacional Decreto Do
Govêrno - Três Religiões, Por Seus Intérpretes, Opinam Na
"Enquête" - Também Os Homens Do Povo
( A Manhã )
Duro Golpe No Futuro Artístico Do Pais! ( Resistência )
Extingue-se Uma Praga Social Que A Ditadura Havia
Instituido No Brasil
Não Houve Tempo Para Despedidas... Ontem Mesmo Deixou
De Funcionar A Batota - Os Cassinos Não Abriram Os Salões
Dos "Grills" - Decepção E Satisfação - Opina Um Empregado
- Insulto À Imprensa - As Que Não Se Conformam Com A
Extinção Do Jogo ( Diário de Notícias )
A Repercussão Na Assembleia Constituinte Do Decreto-Lei
Que Extinguiu O Jogo ( Jornal do Brasil )
42) Copa do Mundo (1950)
"Aqueles que compareceram ao Estádio Mendes de Morais,
na tarde de ontem, cheios de fé e alegria no onze brasileiro
jamais poderiam imaginar que, numa partida decisiva, onde
bastava o empate para nos dar o título máximo, pudessemos
deixar o gramado vencidos. E sobretudo vencidos por um
quadro que, embora fazendo jus ao triunfo, por ter
aproveitado as duas oportunidades que se lhe ofereceram, foi,
no atual certame, menos produtivo e menos positivo do que a
equipe brasileira.
Por isso mesmo, o espetáculo que se desenrolou aos nossos
olhos, após o apito final de Georges Reader, foi desses que,
por suas caracteristicas impressionantes, tão cedo não sairão
da retina daqueles que tiveram o ensejo, o triste ensejo,
digamos assim, de presenciá-lo. Aquela multidão de duzentas
mil pessoas não teve coragem de deixar o estádio.
Tinha-se a impressão que estávamos em um Dia de Finados,
assistindo ao enterro de um ente querido. As dependencias do
"Colosso do Derbi", pareciam lotadas por milhares e milhares
de parentes e amigos do suposto defunto, que o pranteavam,
num silêncio só interrompido pelos soluços de muita gente
que não resistiu à intensidade da dôr. Lá em baixo, no
gramado, os jogadores uruguaios, ao comemorar o grande a
grande conquista, pareciam ateus profanando um lugar
sagrado...
Quando, minutos depois, a massa começou a deixar o estádio,
a tristeza estava estampada em sua fisionomia. Por tôdas as
ruas, por tôdos os cantos, a mesma decepção, a mesma dôr. A
cidade adormeceu de luto... (...)
Tristeza geral causou a vitória do Uruguai sôbre a seleção
brasileira, na tarde de ontem, justamente no momento em que
o campeonato do mundo estava ao alcance de nossas mãos.
Tristeza geral, repetimos, mas não a tristeza mansa dos que
sabem perder; era antes uma espécie de revolta contra tudo e
contra todos, a condenação inapelável dos nossos jogadores, a
severa crítica contra a nossa tática de jogo e, finalmente, um
mundo de acusações desabando, implacável, contra o técnico
Flávio Costa. Numerosas substituições de jogadores
começaram, de repente, a ser apontadas como necessárias a
uma vitória que já estava bem distante.
Os mesmos jogadores que abateram com tremendas goleadas
os selecionados da Espanha e da Suécia, já não se
apresentavam aos olhos do público como os esforçados
"cracks" que tantos aplausos mereceram... Tudo estava
esquecido, condenado, imprestável. Zizinho, apenas, era o
condutor das mais belas jogadas. Mas, Jair não passava de um
fantasma dançando na tarde triste do Maracanã; e Ademir, o
goleador em primeiro lugar na Copa do Mundo, era tão inútil
quanto uma coisa morta. Esse o terrivel julgamento do nosso
público após soar o apito final...
Há, porém, muita coisa esquecida. Na pressa das conclusões
ditadas pela decepção da grande surpresa, foi esquecido o
próprio valor dos jogadores uruguaios; o fator sorte, tão
importante em futebol, que favoreceu em todos os sentidos a
seleção oriental; e, mais do que tudo, a própria razão de todos
os acontecimentos.
Um dia, Napoleão, meio louco e meio soldado, saiu da França
e começou a dominar o mundo. Os seus exércitos foram
crescendo em entusiasmo e se transformaram numa
gigantesca horda invencível. A História narra os seus feitos
mais incríveis, as suas conquistas quase impossíveis, os seus
lances de heroismo. Ninguém podia vencer Napoleão e êle,
em seus sonhos de louco, já se considerava o senhor do
mundo. Mas nasceu a derrocada do inesperado: Waterloo.
Seria possivel a destruição dos exércitos e dos planos do
poderoso conquistador? Em Santa Helena, sozinho e
amargurado, êle próprio não encontrou a explicação que o
universo inteiro procurava, atônito. Ele apenas perdera a
batalha...
A seleção do Uruguai equivale ao nosso Waterloo na "Copa
do Mundo". Envolvidos pelo entusiasmo justissimo das
vitórias iniciais, com a nítida superioridade sôbre os
jogadores europeus, esquecemos a possibilidade de uma
surpresa tão desagradável e tão inesperada. Começamos,
portanto, a procurar justificativas numa provável e inexistente
culpa dos nossos jogadores e do seu técnico. Esquecemos
tudo, até mesmo a nossa condição de "donos da casa", de
organizadores, em 1950.
Felizmente, não tiveram maiores consequências os
comentários das rodas exaltadas. Pouco a pouco, vai nascendo
maior ponderação nos julgamentos, menos apressados, e
fazemos raciocínios. Vamos recebendo a amarga derrota
como ela deve ser aceita e acatada: com a certeza de que, pelo
menos, ontem, á tarde, os uruguaios jogaram melhor futebol.
E com êles estava a sorte e o destino da Copa do Mundo..."
Folha Carioca, 17 de julho de 1950.
"E o que ninguém previa aconteceu. O Brasil perdeu o
campeonato do mundo na última partida, ficando o cobiçado
trofeu em poder dos uruguaios. Foi mais uma lição, dentre as
tantas que já temos tido, deixando fugir o triunfo a hora
decisiva. E agora não existe qualquer desculpa. Das outras
vezes culpava-se o ambiente estranho, a torcida contrária, o
juiz e tantas outras coisas que seriam de consôlo ás derrotas
que tantas vezes já nos impuseram argentinos, italianos e os
próprios uruguaios, de quem somos velhos fregueses.
Domingo tinhamos tudo a nosso favor: o campo, a torcida e,
além disso, o "handicap"do empate que nos garantiria o titulo.
O juiz Mr. Reader teve uma arbitragem perfeita e a êle não se
pode atribuir a menor responsabilidade pelo fracasso do nosso
selecionado.
Perdemos porque jogamos menos. Os uruguaios foram
superiores na técnica e no coração. A Taça "Jules Rimet" está
em boas mãos. Nas mãos daqueles que na hora decisiva
souberam disputá-la com classe e com flama. São êles os
merecedores do título de campeões do mundo.
Quem assistiu o quadro nacional jogar com a Suécia e com a
Espanha, uma verdadeira orquestra sinfônica, nem por
sombra reconheceria o mesmo quadro naquele que domingo
jogou no Maracanã contra os orientais. A sinfônica desafinou
e diluiu as esperanças dos duzentos mil espectadores que
madrugaram no estádio e dos milhões de torcedores de todo o
país que pelo rádio acompanhavam ansiosos o desenrolar da
peleja.
Muitos argumentam com o azar para explicar a derrota, mas
não reside no imponderável a explicação do fracasso. Ele veio
em consequência do bom desempenho dos uruguaios e das
falhas do nosso "onze". Falhas que sempre existiram e que
nos cansamos de apontar desde os primeiros jogos. O nosso
quadro jogou sempre, praticamente com três homens na linha
de frente - Zizinho, Ademir e Jair. Os pontas Chico e Friaça
jamais tiveram condições técnicas para integrar a seleção.
Quando se tratava de enfrentar adversarios mais fracos e
principalmente que adotam o sistema europeu de jogo, sem
marcação pessoal sôbre os jogadores, as falhas desapareciam
e os elementos fracos eram esquecidos ante a virtuosidade e a
eficiência do trio central.
Mas com os uruguaios a coisa foi diferente. Eles adotam
sistema de jôgo semelhante ao nosso, marcando rigidamente
os dianteiros, e, além disso, sabiam que o "team do Brasil
resumia-se, na linha atacante, a Ademir, Zizinho e Jair. Sôbre
êstes três homens, foi feita uma marcação eficiente, um
verdadeiro bloqueio e o resultado não se fez esperar. Na final
o "placard" acusava 2 a 1 para os uruguaios.
A responsabilidade principal recai, pois, sôbre o técnico,
teimando em incluir um Friaça bizonho e sem condições de
jôgo e insistindo com um Chico confuso e dispersivo, quando
tinha um Rodrigues em plena forma para ser lançado.
Adãozinho, outro elemento de valor, ficou todos os jogos na
cêrca quando poderia ser lançado no centro, deslocando-se
Ademir para a ponta direita, como o próprio Flávio já fez uma
vez com excelentes resultados, num sul-americano.
Além disso, faltou aos nossos jogadores, a flama necessária,
coisa que sobrou aos nossos adversários. Do naufrágio
salvaram-se Zizinho, Bauer, Augusto e Juvenal. Os restantes
deixaram-se levar pelo nervosismo e jogaram abaixo da
critica, inclusive Jair, acovardado com a marcação severa do
velho Obdulio Varela.
E como se não bastasse tudo isso, Bigode, um jogador sempre
eficiente, disputou uma partida sem qualificativo, fazendo
asneiras a grande e deixando-se bater tôdas as vezes pelo
admirável Gighia, o ponta direita do Uruguai. Também
Barbosa esteve num dia negro, engolindo um autêntico frango
no "goal" que deu a vitória aos orientais. (...)"
Diário do Povo, 18 de julho de 1950

"Perdeu o quadro brasileiro, na tarde de anteontem, uma


oportunidade que jamais teve qualquer outro, para o conquista
do titulo máximo do fuebol mundial. Não foi correspondido o
sacrificio de milhares de torcedores. Para o quadro nacional,
não mediram exigencias, aqueles que tudo receberam com
abnegação as inúmeras dificuldades. Desde noites ao relento
até o perigo constante após, a entrada no Estadio. Sofreu o
torcedor contra todos os fatores, com um unico desejo.
Vitoria do quadro nacional. E, infelizmente, não foi
correspondido todo este sacrificio.
Vimos um quadro sem a mínima noção do que significava
aquela massa humana comprimida desde as primeiras horas
da manhã. Jogaram os nossos, com um completo desinteresse
pelo resultado final da luta contra os uruguaios. Não faltou ao
quadro nacional, nada absolutamente nada para jogarem com
mais estimulo. Assim, o resultado foi um "scratch"
psicologicamente derrotado, se agigantar contra o pseudo
campeão mundial confiante em goals que naturalmente viriam
do céu. Sofreu o selecionado nacional, uma derrota, a perda
de um titulo, contra um quadro que teve a seu favor, apenas
noção de responsabilidade e desejo de vencer.
Teve o selecionado uruguaio o prêmio de uma vitoria que não
pode sofrer contestação. Vencendo o Brasil, conquistaram o
titulo pela segunda vez de campeões mundiais. A êles o nosso
reconhecimento pela fibra e bravura demonstrada na peleja
final do IV Campeonato Mundial de Futebol. Aos nossos, que
a lição sirva de exemplo e em competições futuras recuperem
o prestigio tão tristemente perdido, numa batalha, que ao
povo brasileiro sòmente trouxe a desilusão."
Diário do Rio, 18 de julho de 1950

"A derrota foi um golpe. Ninguem deixou de sentí-lo. Quando


o Uruguai marcou o segundo goal o silencio que se fez no
Estadio - o silencio de duzentas mil pessoas - chegava a
assustar. Era a desolação da derrota. A multidão ficou parada
sem querer acreditar no que via. O Estadio não se enchera
para aquilo. Não fôra para aquilo que se travara a batalha das
cadeiras, das arquibancadas e das gerais. Não fôra para aquilo
que milhares de brasileiros tinham vindo ver o último match
do campeonato do mundo. Todas aquelas duzentas mil
pessoas haviam marcado encontro no Estadio para saudar os
brasileiros como campeões do mundo. Por isso o Estadio se
tornou pequeno: era o maior do mundo mas nele não podia
caber todo o Brasil. As outras cincoenta milhões de pessoas
que ficaram de fora, perto e longe, no centro, no norte e no sul
do Brasil.
Tudo parecia anunciar a vitoria final, embora desta vez os
adversarios dos brasileiros fossem os uruguaios. Fosse,
sobretudo, o coração dos uruguaios. Irresistivelmente se
formou o pior dos ambientes para os brasileiros, o melhor dos
ambientes para os uruguaios. O pior dos ambientes para os
brasileiros porque parecia o melhor; o melhor dos ambientes
para os uruguaios porque parecia o pior. Foi o que não se quis
ver antes do match.
Os uruguaios e não os brasileiros se tinham colocado numa
posição única. Podiam perder de cinco e estava bem.
Voltariam para Montevidéu de cabeça erguida. Todos os
uruguaios, os que tinham vindo animar a "celeste", os que não
tinham podido vir, e que ficaram de longe a torcer por eles,
seriam unânimes em reconhecer que eles haviam feito o
máximo. Qualquer resultado era bom para os uruguaios que
quase tinham perdido da Espanha e da Suecia, goleadas pelo
Brasil. Para o Brasil só havia um resultado bom: a vitoria. O
Brasil tinha tudo a perder, o Uruguai nada tinha a perder.
Tudo explicava e justificava de antemão, uma derrota
uruguaia. Nada parecia sequer explicar ou justificar a simples
hipótese de uma derrota do Brasil. Tudo isso aumentava
tremendamente a responsabilidade do scratch brasileiro.
É preciso levar em conta essa responsabilidade tremenda para
que se compreenda a especie de inibição de alguns jogadores
brasileiros. A inibição de Bigode que em certos momentos
quase não podia caminhar em campo, a inibição de Barbosa
que nos dois lances decisivos se movimentou sempre com
atraso fatal. Quando os jogadores brasileiros foram
surpreendidos pela possibilidade da derrotas não resistiram.
Pouco se mostraram à altura das circunstancias. A ameaça de
derrota veio no pior dos momentos: quando a vitoria que se
esperava parecia consagrada. Depois do goal de Friaça que
valia por dois. O goal de Friaça, porém, não deu ao scratch
brasileiro a tranquilidade necessaria para assegurar a vitoria.
Os brasileiros, em vez de se guardarem, de repousarem mais
na defesa, entregaram todas as esperanças no ataque.
Não se contentaram em vencer: queriam vencer por dois, por
três, queriam golear. Golear um adversario que lutava
sobretudo para não ser goleado. E que, por isso, no um a zero,
se concentrou mais na defesa. Aquele um a zero que surgira
no inicio do segundo tempo servia aos uruguaios como um
grande resultado. Assim os uruguaios não se perturbaram,
lutaram para manter aquele um a zero que embora contra era
sempre uma porta aberta para o empate. Se o um a zero era
um grande resultado para o Uruguai um empate seria como
uma vitoria.
Os brasileiros, pelo contrario, viram no um a zero um placard
pequeno demais para a festa da vitoria. E chegado o empate
receberam-no como um desastre. Sem se lembrarem que o
empate lher daria o campeonato do mundo. Aceitaram melhor
o zero a zero. O zero não os perturbou. Mesmo durante todo
um tempo. A medida que o tempo passava os brasileiros se
sentiam melhor. Daí o volume cada vez maior de ataques que
realizaram.
Houve um momento em que os uruguaios quase perderam a
cabeça. Mas no primeiro tempo. Voltaram mais tranquilos no
segundo tempo. E voltaram mais tranquilos porque o
resultado do primeiro tempo fôra excepcional para eles.
Depois do um a zero até o um a um se contentaram em conter
a ofensiva brasileira que se tornava cada vez mais
desesperada. E digo desesperada porque os brasileiros se
deixaram empolgar pelo dominio e martelgram sempre no
lugar errado. Na especie de ferrolho formado pela defesa
uruguaia. Sem aprovitar a lição de um único goal. A maneira
de invadir a defesa uruguaia não era pelo centro aferrolhado,
era pelas pontas. Tanto que Friaça não teve dificuldade em
abrir o escore. Alem disso no centro só havia Ademir para
invadir a area, e Zizinho para ajudar a invadi-la, para forçar
uma invasão. Jair ficou de fora da area, a ponto de forçar
Chico a deslocar-se para forçar a defesa uruguaia com
arrancadas corajosas. Enqando o placard esteve de um a zero
os jogadores brasileiros se deixaram enganar pelo dominio
parecido ao daquele com a Suiça. Só que desta vez os
adversarios dos brasileiros não eram os suiços, eram os
uruguaios. (...)
O que não estava nos calculos de ninguem era uma derrota
contra o Uruguai. Por isso eu digo que se formou o pior
ambiente para o scratch brasileiro. O ambiente da vitoria
certa. Não foi a certeza de vitoria que derrotou os brasileiros.
Foi a imperiosidade da vitoria. A exigencia de vitoria. E de
grande vitoria. Ninguem discute a superioridade do football
brasileiro sobre o uruguaio. Nem mesmo os uruguaios, até
depois da vitoria. Uma das maiores glorias da celeste há de
ser esta: a de ter derrotado os melhores jogadores de football
do mundo, o quadro que realizara as suas maiores exibições
de que há memoria no football mundial. (...)"
Jornal dos Sports, 18 de julho de 1950

"Não vamos culpar ninguém pelo que aconteceu. Não é justo,


e, além do mais, é um menospreso ao adversári, que foi
valente e fez jús à vitória.
Depois, em nada adiantará. Não nos devolverá o título. É
claro, que houve falhas. Falhas porém, que, para quem
acompanha futebol sabe ser comum em pelejas como a
disputada na tarde fatídica de domingo, no estádio Municipal.
Perdemos um título que parecia ajustado para nós. Perdemos,
todavia resta-nos o consôlo de termos perdido com dignidade,
e para quem, na verdade, são autênticos campeões, - os
uruguaios.
Mas deixamos de lado tudo isso. Passemos aos fatos.
A peleja começouem um ambiente demasiadamente otimista
para os nossos rapazes. Imprensa, rádio, paredros, emfim,
toda aquela imensa massa que se comprimia no estádio
Municipal, inclusive os proprios delegados uruguaios, não
pensavam em insucesso do Brasil. Os recentes feitos contra a
Iugoslávia, Suécia e Espanha não podiam deixar dúvida. O
Brasil jogando em casa, com a assistência a favor e com o
mesmo quadro, não podia perder para o Uruguai, que vinha
de um empate cavado contra os ibéricos e uma vitória difícil
sôbre os nórdicos. Afirmar-se coisa diversa, é querer ser
profeta.
O que se sabia, - e disso nunca discordamos de quem assim
pensava, - era que os "celestes" nos obrigariam a lutar muito
pela vitória. Jamais, porém, podia se supor em derrota,
mesmo levando em conta que em três outras vezes anteriores
(24, 28 e 30), foram os nossos rivais os herois da jornada.
Este otimismo, pois, justo sob todos os títulos, foi a causa da
derrota. Embora Flavio o combatesse energicamente,
conversando com cada "crack" a quem explicava tudo;
embora chegasse até a ser grosseiro com visitantes da
concentração que falavam aos atletas como se já fossem
campeões; nada disso valeu. O otimismo que tomara conta de
todos, e passara-se também aos "cracks". E isso foi fatal para
as nossas cores. Em partidas de futebol ninguém ganha na
véspera. O jogo é jogado em campo, para onde vão onze
atletas de cada bando lutar pelo mesmo objetivo: a vitória.
Enquanto isso ocorria em relação aos brasileiros, no lado dos
orientais tudo era diferente. Pensavam em vitória. Todavia,
encaravam o prélio dentro do prisma certo. Tinham os
uruguaios sobre os ombros a responsabilidade de o prestígio
dos campeões de 24, 28 e 30. Sabiam que um empate seria
fatal. Medindo todas essas coisas foram para campo dispostos
a vencer. (...)"
A Manhã, 18 de julho de 1950

"As lagrimas que humedeceram quase 50 milhões de olhos


bem exprime a dôr, a desolação do publico brasileiro pelo
resultado imprevisto de domingo no Estadio Municipal. E
sem desprestigio da verdade, pode-se dizer que, o publico não
merecia tão dolorosa recompensa pelo sacrificio, por tudo que
fez no sentido de prestigiar o nosso selecionado e render-lhe
as homenagens que fariam jus, no caso da conquista do titulo.
As noites de vigilia por que passou na ansia de adquirir um
ingresso para penetrar no estadio, as horas interminaveis que
permaneceu na fila com tal proposito, amanhecendo ainda na
porta do estadio, sem satisfazer as naturais obrigações de uma
alimentação regular, provou que o povo se mostrou
indiferente a propria razão da normalidade, para presenciar o
choque que consagraria onze jogadores e 50 milhões de
brasileiros! Todos os sacrificios eram infimos de mais, para
atender a tão grandes anseios do coração.
As duas jornadas anteriores não deixavam transparecer
quaisquer duvidas, quanto a possibilidade de conquistarmos o
titulo, porque a convicção do torcedor não se baseava nas
considerações honestas da imprensa e outros veículos de
informações. Ele havia presenciado com os seus proprios
olhos, as duas vitorias gigantescas que não davam margem a
receios, quanto a batalha final, a que seria memoravel e
gloriosa para as nossas cores. E quando chegou o domingo,
nesso domingo de sol e de vida, que seria marcado na
historia, como um dia de gloria para a nossa patria, notou-se
uma agitação sem precedentes, porque o publico já as
primeiras horas da manhã, colocava-se em fila, na ansia de
penetrar no estadio para assistir a um prelio que só seria
iniciado 9 horas depois (!)
Esse povo que esquecendo todas as agruras da vida, havia
aprendido a sorrir em todos os instantes, trazendo nos labios
aquela esperança convicta, emudeceu ao cabo dos noventa
minutos de batalha, porque a decepção o deixou estremecido.
Aquela imensa multidão ficou imovel, paralizada, sem saber o
que fazer, como quem ainda estivesse aguardando alguma
coisa, a jornada gloriosa, o sonho dourado que durante varios
dias, enriqueceu os seus corações. Só mais tarde, quando o sol
se escondeu, foi que o povo compreendeu que a sua presença
na Maracanã de nada mais valia e assim começou a retirar-se
numa lenta e trsistonha procisão, acompanhando o féretro da
ilusão mais linda que viveu. (...)"
O Jornal, 18 de julho de 1950
"Não houve nem as correrias costumazes à saída do estadio.
Era uma autentica retirada que empreendia aquela torcida
exausta, coberta, de pó e tristeza. Esconderam as serpentinas.
Jogaram fora os confetis, entregaram-se ao cansaço. Parecia
até a madrugada de quarta-feira de cinzas. Ninguem falava.
Só no bonde, passados os primeiros instantes, começaram os
argumentos. Procurava-se justificar, ninguém conseguia.
Chegou por fim o desabafo: foi o azar. Azar de que? De
muitas coisas. Não viram que começamos, hoje, pelo lado
contrário? Não viram que pela primeira vez atacamos contra a
avenida Maracanã, de inicio? argumentou um. E logo outro: e
tambem pela primeira vez o Ademir não abriu o escore? tudo
isto deu azar. Só isto, não. Vocês nào viram o principal,
argumentou um terceiro. O maior azar foi o Mendes de
Morais. Êle é que foi o culpado. Como dá azar o nosso
amigo... Surgiram os apartes. É mesmo. começou por chamar
os uruguaios de campeões do mundo... E o locutor: O Prefeito
vos falou uma vez e o time venceu. O Prefeito dá sorte. Puxa,
vai para o olho mecânico a Ramona.
Descemos, pensando na maneira original daquela gente
humilde encarar uma adversidade. Mas tinhamos de continuar
caminho. E lá fomos de lotação para a zona sul. A conversa
interrompida com a nossa chegada, retomou logo o fio:
- Foi mesmo uma atitude infeliz do Mendes de Morais.
Olhamos surpresos. Também ali a superstição vigorava? Mas
não. Desta vez eram outras as razões.
O Prefeito nunca deve ter ouvido em psicologia. Aquela
historia das duzentas mil pessoas esperando pela vitoria e dos
cinquenta milhões querendo o triunfo deveria ser dita numa
situação justamente inversa a da nossa. Se nos sentissemos
inferiorizados, se entrassemos em campo com o moral
abatido, convencidos da impossibilidade de vencer. Aí sim
um estimulo daquela natureza. Porém nunca na situação de
hoje. O Prefeito aumentou-lhes a responsabilidade, trouxe
mais encargos sôbre seus ombros, aumentou o nervosismo,
enfim enfraqueceu-os. O fato é que não podia perder a
oportunidade da demagogia... eram duzentas mil os presentes,
sem falar nos radio-ouvintes..."
Correio da Manhã, 18 de julho de 1950

AS MANCHETES:
Este "Goal" Eliminou O Brasil - Tristeza Na Face De Todos -
Tombou De Pé O Brasil - Os Uruguaios Jogaram Melhor E
Daí A Derrota da Nossa Seleção No Prélio Efetuado Ontem
( Folha Carioca )
Venceram Os Melhores - Merecidamente Os Uruguaios
Sagraram-se Campeões Do Mundo - Ante Um Adversario
Forte, Evidenciaram-se As Falhas Do Nosso Selecionado - A
Culpa Do Tecnico - Novo record Mundial De Renda - Notas
( Diário do Povo )
Faltou Fibra Aos Jogadores Nacionais Que Não
Corresponderam Á Espectativa de 200 Mil Torcedores
Representando 50 Milhões De Brasileiros
( Diário do Rio )
Mario Filho: O Segredo Da Vitória Dos Uruguaios: Só Os
Brasileiros Tinham Tudo A Perder ( Jornal dos Sports )
Vitória De Raça - Lutando Com Alma E Coração,
Reconquistarm Os Uruguaios A Sipremacia Do "Soccer"
Mundial - Não Vamos Culpar Ninguem - Otimismo Fatal ( A
Manhã )
Ainda Nos Resta Um Ingrato Consolo: A "Copa" Ficou Na
América, Provando A Inconteste Supremacia Da Nossa
Escola ( O Jornal )
Vai Para O Olho Mecânico A Romana ( Correio da Manhã )
43) Francisco Alves (1952)
"Num desastre de automóvel ocorrido ontem, às 18,30 horas,
na rodovia Presidente Dutra, morreu, em trágicas
circunstâncias, o popular cantor Francisco Alves, o "Rei da
Voz". O acidente verificou-se na localidade denominada Uná,
município de Pindamonhangaba.
Francisco Alves viajava com destino a esta capital, na
"Buick" chapa número 11-65-80 D.F., de sua propriedade, em
companhia de um amigo, de nome Haroldo Alves. No local
mencionado, a "Buick" colidiu com o caminhão chapa n. 11-
58-84, R.G.S., que seguia com destino a São Paulo, dirigido
pelo motorista João Valter Sebastiani. O choque dos dois
veículos foi violentissimo, resultando ficarem ambos
seriamente avariados e tendo a "Buick", a seguir, se
incendiado. Ao que se presume, Francisco Alves pereceu
imediatamente, pois as chamas que dominaram o carro
carbonizaram-lhe o corpo tornando-o irreconhecível. Seu
companheiro foi projetado fora do carro, sendo recolhido,
momentos depois, por um auto que passou no local, e
conduzido à Santa Casa de Taubaté, onde ficou internado em
estado de coma. O motorista do caminhão sofreu ferimentos
sem importância.
O delegado policial de Pindamonhangaba, retirou o cadaver
de Francisco Alves dentre os escombros do carro,
providenciando para seu transporte à referida cidade, onde em
diligências posteriores foi levantada a sua identidade.
O Dia, 28 de setembro de 1952

"A cidade rendeu ao filho que lhe traduzia a extensão da


sensibilidade e do lirismo romântico, o culto póstumo que ele
merecia. Francisco Alves, sem dúvida, o cantor maior do
canto popular nascido nestas plagas, o intérprete da poesia
pura que brota das almas simples e se amplia em estrofes de
sentido profundo. Da sua garganta privilegiada voaram as
melodias mais lindas que se inventaram para exprimir as
dores e as alegrias coletivas. E os discos que fixaram as
harmonias do trovador magnífico permitiram o milagre dessa
consagração comovente. O homem pereceu no tremendo
desastre que lhe cortou o fio da vida, mas o seu espírito, a sua
alma, ficaram na voz maravilhosa gravada pela radiofonia
para a duração quase ilimitada. As homenagens que as
emissoras prestaram ao cantor prodigioso deram a impressão
de que dos frangalhos da sua carcaça se desprendiam os sons
esplendidos e vibrantes que encheram os ares da metrópole e
do país inteiro, como que afirmando a fragilidade da morte
diante dos impetos do gênio. E Francisco Alves desceu ao
túmulo no mesmo instante em que em todos os quadrantes da
pátria se ouvia a sua voz sentimental e bem brasileira...
Era impossivel ter-se uma idéia exata do número de pessoas
que formavam aquela fabulosa onda humana, que provocou
colápso no trânsito, acompanhando os funerais de Francisco
Alves. Cem, duzentas mil pessoas? Quem sabe ao certo, se a
vista do repórter se perdia ao longo de ruas e avenidas da
zona sul? Foi um espetáculo comovente, o coroamento das
manifestações de dor popular pela morte trágica do Rei da
Voz. Durante as últimas 48 horas, a cidade se transformou de
tal modo, ligando-se ao destino de um artista por vinculo do
mais profundo sentimentalismo, que até parecia não ter
morrido apenas um seresteiro de alta classe, mas um mistico
de poderosa influência sobre multidão deslumbradas. Era o
milagre do talento de um cantor, que soube interpretar, como
ninguém, as tristezas e as alegrias, as venturas e os infortúnios
da sua gente, dizendo no lirismo da sua voz harmoniosa e
tropical o que não se pode expressar em meras palavras. (...)
As filas em frente ao edifício da Câmara Municipal, onde, até
a manhã de ontem, ficou exposto à visitação pública o corpo
do artista, eram engrossadas a toda hora. Pessoas de todos os
níveis sociais ficaram, pacientemente, a espera da
oportunidade de chegar até a urna mortuária, num tributo à
memória do inditoso cantor. Por toda a madrugada de ontem,
a romaria não cessou: dos bairros e subúrbios mais
longinquos surgiam amigos e admiradores de Chico, que
queriam render-lhe a última homenagem. Muitos levaram
lágrimas e flores. Outros ficaram, silenciosos, com um nó na
garganta da eça armada no saguão do legislativo da cidade.
Lá compareceram desde elementos dos meios artisticos e das
camadas mais humildes a figuras representativas da nossa
vida pública, numa comunhão de sentimentos que deu a justa
medida da repercussão que o trágico acontecimento causou
em toda a metrópole. (...)"
O Dia, 30 de setembro de 1952

"São Paulo, 27 Asapress Urgente. Teve trágico fim esta noite,


quando viajava em um automóvel "Buick" de sua
propriedade, desta capital para o rio, o popular cantor
Francisco Alves, uma das figuras mais conhecidas do
"broadcasting" nacional desde longos anos.
Seu carros, à altura do Município de Uná, foi de encontro a
um caminhão do Rio Grande do Sul, dirigido por João Valter
Sebastiani, que foi ligeiramente ferido.
Tremendo choque causou a morte de Francisco Alves, cujo
corpo foi retirado dos destroços quase irreconhecível,
totalmente carbonizado.
Haroldo Alves, que viajava em sua companhia, gravemente
ferido, foi internado no Hospital de Taubaté em estado
desesperador.
Ao que apuramos, Francisco Alves seguia de São Paulo, onde
obteve grande exito na Radio Nacional, para tomar parte no
programa das 12 horas de amanhã no Rio."
Jornal do Brasil, 28 de setembro de 1952

"O que impressionou mais na morte trágica de Francisco


Alves foi o ter sido vitimado no intervalo de duas audições, a
que deu em S. Paulo e a que deveria dar no Rio, no espaço de
poucas horas.
Esse corte brutal do destino, de quase um mesmo programa
de radio transmitido pela mesma emissora, tornou ainda
maior a emoção popular, que passou o dia inteiro a ouvir, por
todas as estações, pelo milagre dos discos - como se quisesse
fazer reparar a tremenda injustiça e a tremenda desgraça - a
grande voz para sempre perdida.
A Cidade, no seu luto, encheu-se, então, da voz de seu cantor,
que nunca lhe pareceu tão bela, tão comovedora e tão triste,
como se chorasse sobre si mesma o desaparecimento de su
dono, daquele bom e simples Chico Viola, filho dos morros,
irmão do samba e amigo das serenatas e do luar.
Francisco Alves fôra, realmente, um caso raro, como é o de
Chevalier na França. Desde os seus dias de estreante e,
depois, de ascensão, nunca diminuira em prestigio. A suas
gloria não conhecera intermitencias. Tinha chegado ao brilho
do sol do meio-dia e parara, sem as ameaças do crepusculo.
Subira, como o vôo dos passaros, sem esforço, sem intrigas,
sem proteções e permanecia, nas alturas, com a naturalidade
das flores alpinas, que lá se encontram porque lá é o seu
lugar, o seu clima e não poderiam viver na planicie.
Assim, o "rei da voz" não perdeu nunca o seu reinado, porque
ele se expandia pela força, que perdura, da alma e do coração
populares, tocados pelo timbre, a sonoridade e a beleza de
uma voz consagrada ás melodias simples e plangentes da
musica sentimental brasileira.
O seu tumulo deveria ser um grande violão, o seu
"companheiro inseparável", que tanto vibrou com as mesmas
canções do grande Chico e que hoje, com as cordas
emudecidas, guarda as ressonancias misteriosas e eternas da
voz que foi a mais bonita do Brasil. - Benjamin Costallat"
Jornal do Brasil, 30 de setembro de 1952

"Enorme massa, em que estavam representados todo o povo,


estações de rádio, clubes e outras entidades populares e
esportivas, figuras de expressão dos meios artisticos, sociais e
políticos, acompanhou, ontem, até o cemitério S. João Batista,
os restos mortais de Francisco Alves.
Dos milhares de pessoas ali presentes, muitos começaram a
chegar à Câmara Municipal, de onde saiu o féretro, desde as
primeiras horas da manhã, ou fizeram parte do grande número
de outras, que, desde domingo, principiaram a afluir ao salão
onde estava armada a câmara mortuária.
O cortejo fúnebre, cujo inicio estava marcado para às 11
horas, começou pouco depois desta hora.
Grande número de carros conduzindo flores e coroas, seguira
a enorme massa que acompanhava o carro do Corpo de
Bombeiros, onde foi colocada a urna funerária.
Durante todo o trajeto pela avenida Rio Branco, Flamengo,
Botafogo, etc., milhares de pessoas presenciavam a passagem
do féretro.
No cemitério, cujos portões foram invadidos pela multidão,
não obstante as medidas tomadas pelas autoridades policiais,
estabeleceu-se grande confusão, pois tôda a imensa massa
queria aproximar-se da urna funerária. Em consequência, a
cerimônia final foi perturbada, ficando os oradores
praticamente impedidos de fazer uso da palavra. Cenas
indiseritiveis de emoção se sucediam, homens, mulheres,
velhos e crianças, que caiam, eram pisados, enquanto outros,
presas de crises nervosas, eram socorridos. Doze pessoas
tiveram que ser atendidas pelo serviço médico. Para fazer a
urna funerária chegar até o local de sepultamento, foi preciso
o trabalho de 12 atletas da Polícia Especial.
Cerca de duas horas levou o cortejo funebre da Câmara
Municipal até o cemitério.
O presidente da República fez-se representar nos funerais de
Francisco Alves pelo capitão José Henrique Acióli.
A sessão de ontem, da Câmara Municipal, durante a qual
reassumiu o Sr. R. Magalhães Júnior, representante do Partido
Socialista, que se encontrava de licença viajando pela Europa,
foi tôda ela dedicada à memória do cantor Francisco Alves,
falecido tragicamente na tarde de sábado último, num desastre
de automóvel, no Estado de São Paulo. (...)"
Diário de Notícias, 30 de setembro de 1952

"Vítima de um desastre de automóvel, na Rodovia Presidente


Dutra, entre Taubaté e Pindamonhangaba, faleceu o cantor
Francisco Alves, que viajava, desta capital para o Rio de
Janeiro, em um "Buick"no 11-56-80.
O carro em que viajava o artista nacional colidiu com um
caminhão, do Rio Grande do Sul. No desastre, saiu
gravemente ferido o companheiro de viagem de Francisco
Alves, Haroldo de tal.
O corpo do "Rei da Voz" foi removido para a necrotério de
Pindamonhangaba, de onde deverá sair para o Rio de Janeiro,
hoje, domingo.
Ao terem notícia do desastre colegas do cantor, das Rádios
Nacional do Rio e desta Capital, viajaram para
Pindamonhangaba.
Francisco Alves nasceu na rua da Prainha no dia 19 de agosto.
Começou sua vida trabalhando em uma fábrica de chapéus.
Cantou no início de sua carreira radiofonica no Pavilhão do
Meier, da emprêsa João M. de Deus e ingressou
posteriormente no elenco teatral do Circo Spinelli.
Interrompeu sua carreira com a gripe de 1918, voltando,
então, mas para o teatro. Contratado pelo empresário Batista,
pai de Amélia de Oliveira, no Politeama de Niterói.
Dissolvida a Companhia, Francisco Alves conseguiu um lugar
de figurante numa revista que estava em cena no Antigo
Teatro São José, da Emprêsa Pascoal Secreto. Figurava no
elenco a formosa chilena, Celia, que, apaixonada por
Francisco Alves, a êle se uniu e é até hoje a esposa do grande
cantor brasileiro. A consagração real de Francisco Alves
começou de fato com o disco, desde "Ora Vejam Só"de Sinhô
a "Pé de Anjo"."
Diário Carioca, 28 de setembro de 1952
"Contristadora a noticia infausta tomou conta da cidade:
morreu Francisco Alves! A fatalidade roubou, assim, em
pleno apogeu de sua carreira artistica aquêle que foi o maior
entre os maiores seresteiros do Brasil. Apagou-se a "Voz do
Violão" e o país inteiro chora a perda do seu astro maior, do
que elevou a música popular brasileira aos pincaros da glória,
do que encheu todo o Brasil com a sua voz melodiosa,
vibrante e viva. O destino tem dessas surprêsas trágicas -
Chico Alves morreu carbonizado no volante de seu carro, na
estrada Rio- São Paulo, como carbonizado morreu também,
num desastre, Carlos Gardel, outra figura do mesmo naipe e
da mesma estirpe de cantores do nosso chorado Francisco
Alves, o nosso querido Chico Alves das rodas boêmias, o
nosso ultra-popularissimo Chico Viola. (...)"
A Manhã, 28 de setembro de 1952

"Chora o povo carioca -o povo de todo o Brasil - a morte


imprevista de Francisco Alves, o "Rei da Voz", o cantor
popular que sempre fôra a alma do violão, o homem de radio
que soubera, décadas após décadas, sustentar o rítimo de sua
expressão nacional, como o maior seresteiro que o Brasil já
produziu, em todos os tempos. Francisco Alves, ou Chico
Alves ou ainda "Chico Viola"como chamavam os seus
intimos. Foi arrematado pela morte quando dirigia o seu
"Buick", na rodovia "Presidente Dutra", no trecho da estrada
que atravessa o municipio paulista de Pindamonhangaba. O
seu carro chocou-se com um caminhão, transformando-se
numa fogueira. Ferido de morte, Chico foi envolvido pelas
chamas, o seu corpo ficou carbonizado. (...)
Francisco Alves pertencia a modesta, mas boa familia
lusitana. Ele, no entanto, era brasileiro e carioca, havendo
nascido na rua da Prainha. Nasceu a 19 de agosto de 1898.
Terminando seus estudos primários, foi empregar-se numa
fábrica. Ali, ao cantarolar enquanto trabalhava, foi notada a
beleza de sua voz. Animado pelos companheiros, começou a
fazer serenatas e cantar em festas íntimas, até que resolveu
ingressar prodissionalmente na vida artistica. Sua estréia no
Pavilhão do Meier, e quando atuou no elenco teatral do Circo
Spinelli foram indices do triunfo nacional que mais tarde
conseguiria. Foi contratado pelo empresário Batista,
trabalhando então no Politeama, de Niterói.
Quando não havia regime de exclusividade artistica nas
emissoras cariocas, Francisco Alves cantava em varias
estações, já então lançando também as suas composições. Na
Radio Cajuti teve ensejo de ser o descobridor de grandes
valores radiofonicos, como João Petra de Barros, Linda e
Dircinha Batista, Orlando Silva e inumeros outros que hoje
são astros do nosso "broadcasting". Ha dez anos era exclusivo
da Nacional, sendo que seus programas dominicais já se
haviam tornado tradição.
O numero de discos que Francisco Alves nos deixa é imenso.
Só na manhã de domingo até ás 12 horas, mais de cem
gravações de sucesso foram retiradas da discoteca da
emissora da Praça Mauá, nesse programa póstumo e
emocionante.
Todos eram lançados com o mesmo sucesso, porque a voz de
Francisco Alves não envelhecia. Ao contrário, cada dia mais
brilhante e firme se tornava, não obstante o trabalho intenso
que dava ás suas cordas vocais, quer no Rio, em São Paulo
(onde ia semanalmente) e mesmo nas festas particulares, onde
Chico Viola, em sua simplicidade e simpatia, jamais se fazia
rogar.
Uma de suas gravações carnavalescas de maior sucesso foi a
dos festejos de Momo, em l951, com a Marchinha "Retrato do
Velho". Lembramo-nos que no baile do Municipal, no
aludido Carnaval, que contou com o comparecimento do
presidente Vargas, recém-eleito, foi entoada em uma só voz,
pelos foliões presentes, que se aglomeraram sob o camarote
presidencial.
E Getulio, sorridente, ouvia a vozearia que, na marchinha
lançada por Francisco Alves reclamava musicalmente: "Bota
o retrato do velho, outra vez, bota no mesmo lugar". (...)
O ultimo disco gravado pelo cantor, cujo desaparecimento
veio confirmar ser ele um idolo popular, foi a canção "Deixai
Vir A Mim As Criancinhas", de sua autoria, cujos direitos
autorais havia oferecido à criança desamparada. Era um
grande coração, sendo imensamente caritativo. (...)"
Diário da Noite, 29 de setembro de 1952

AS MANCHETES:
Num Desastre De Automóvel Morreu Chico Alves ( O Dia )
Cenas Comoventes Nos Funerais De Francisco Alves - Uma
Multidão Incalculável Nas Últimas Homenagens Da Cidade
Ao Seu Filho Querido - Desmaios De Emoção Durante O
Cortejo Fúnebre, Que Durou Mais De Três Horas - O Esquife
Foi Conduzido Ao Som Da Voz Do Inesquecível Cancioneiro
( O Dia )
Morreu Tragicamente O Cantor Francisco Alves - Seu
Automóvel Chocou-se Com Um Caminhão Quando Viajava
De São Paulo Para Esta Capital
( Jornal do Brasil )
Silenciam Os Violões E Chora O Povo A Morte Do Seu
Cantor
Enorme Massa Popular Acompanhou O Féretro Do Cantor
( Diário de Notícias )
Morre Num Desastre O Cantor Chico Alves ( Diário Carioca )
Morte Trágica De Francisco Alves - O Carro Do Popular
Cantor, Após Chocar-se Com Um Caminhão, Foi Presa Das
Chamas - Ficou Carbonizado - Em Una, Próximo De Taubaté,
O Local Do Desastre - Haroldo Alves, A Outra Vítima, Acha-
se Em Estado Gravíssimo - Emudeceu A Voz Do Violão
( A Manhã )
O Povo Chora A Morte De Chico Alves - Carbonizado O
"Rei Da Voz" Em Tremendo Choque De Veículos Na
Rodovia Presidente Dutra - 1 Violão De 2 Mts. ; Cordas De
Prata, A Homenagem Do Povo Carioca - Camara Ardente,
Lagrimas E Dramas Intimos ( Diário da Noite )
44) Morte de Vargas (1954)
"Sobre a Nação desce a sombra de uma tragédia. O gesto do
Presidente Vargas pondo fim ao seu governo e aos seus dias,
estendeu um crepe à consciência dos brasileiros, aos que o
assistiram com compreensão, como aos que o combateram até
o último momento. É a primeira vez que a história
republicana descreve páginas tão trágicas, pois o homem forte
e acostumado às lutas políticas não pôde suportar a
agressividade da circunstância e sucumbiu ao peso do
desalento.
Todo o drama que o Presidente viveu nesta derradeira fase do
governo quebrou sua tempera e, no silêncio de seu gabinete,
recordando a fisionomia cheia de interrogações que ele
considerava uma injustiça ao homem como ao chefe que
encarnava a soberania nacional, o desespero se apoderou do
seu coração. (...)
Depois de todas as reuniões realizadas em Palácio, na calada
da noite, depois de mirar face a face os seus amigos e
auxiliares, vendo neles transparecer o desalento e a
desesperança, observando que ja não havia ouvidos que o
escutassem, sentiu-se desamparado e sem defesa para afastar
o fantasma da suspeita.
Sentindo todo o peso da incompreensão, o chefe do governo
teve necessidade de ir buscar fora de léxico o argumento
capaz de abrir os ouvidos e aclarar as consciências. Selou
com o sacrifício de sua própria vida o drama com que vinha
lutando nos últimos dias, deixando, conforme acreditava, "o
legado de sua morte", para que se pudesse fazer ao morto uma
parte da justiça que o povo reclamou. (...)
Todos clamavam por justiça, mas o clima propício à justiça
cada vez se tornava mais conturbado. Tragedia atrai tragedia
e, nesta hora melancólica que soa para o seu destino, o povo,
sem forças para opinar, subjugado pela surpresa do último
lance, desfila diante do Chefe morto e, sem se recuperar do
espanto, curva-se frente à mágoa que o atingiu nos últimos
dias e que fez estalar o seu coração no sacrifício supremo.
(...)"
Jornal do Brasil, 25 de agosto de 1954

"De nenhum setor, civil ou militar, pode vir garantia ou


segurança para o Governo - afirmou ontem o Vice Presidente
Café Filho, dando conta ao Senado da demarche que realizou
junto ao Sr. Getúlio Vargas para propor ao Presidente a
renúncia de ambos para salvar a unidade nacional e impedir
que o país se precipite no caos. O Sr. Café Filho se decidiu a
promover a renúncia do Presidente da República e a dele
própria depois de uma segura sondagem junto aos líderes
civis e militares, notadamente o líder da maioria na Câmara e
os Ministros da Marinha e da Guerra."
Diário Carioca, 24 de agosto de 1954

"Com a cabeça voltada para o quadro que representa o


juramento da Constituição de 1891 e os pés para o quadro
"Pátria", à cuja frente se acha um crucifixo, o corpo do
presidente Getúlio Vargas recebe, desde às 17,30 horas de
ontem, no salão do Gabinete da Casa Militar da Presidência
da República, no Palácio do Catete, as despedidas de milhares
de populares que lhe vão fazer a última visita.
O embarque do corpo do Sr. Getúlio Vargas para São Borja,
onde será enterrado, está marcado para as 9 horas de hoje, por
via aérea. Tudo faz crer, entretanto, que será adiado, diante do
grande número de populares que desfila ininterruptamente
ante o caixão que contém os despojos de S. Exa.
Imediatamente após a comunicação do falecimento do
presidente, populares acorreram às proximidades do Catete,
no afã de saber de saber pormenores da trágica ocorrência.
Soldados do Exército e da Polícia Militar, no entanto,
isolavam o Palácio, desde a Rua Pedro Américo até a Correia
Dutra, permitindo o acesso apenas aos jornalistas e altas
autoridades. Antes das 13 horas, só estas podiam entrar no
Palácio, ficando os representantes da imprensa defronte à
entrada do Catete.
Enquanto isso, registravam-se alguns casos de exaltação no
meio da multidão, sendo frequente o encontro de homens e
mulheres em lágrimas.
Às 13 horas a entrada do Palácio foi franqueada à imprensa e,
logo em seguida, ao público, que entrava lentamente e em
fila.
O suicídio do presidente Getúlio Vargas, precisamente às 8,30
da manhã, foi precedido de momentos em que se mostrava ele
absolutamente tranquilo.
- Nada fazia crer fosse o Presidente se matar - disseram-nos o
general Caiado de Castro e Jango Goulart, com os quais ele
conversara minutos antes de se recolher.
O Sr. Getúlio Vargas se recolheu ao quarto, sem mais uma
palavra. passados uns minutos - o tempo normal para a troca
de roupa, ouvia-se um disparo. Acudiu, incontinenti, o Sr. N.
Sarmanho, que se encontrava na janela da sala contígua (a do
elevador privativo do presidente). Já o Sr. Getúlio Vargas
agonizava. Da janela, o Sr. Sarmanho fez um sinal para um
oficial, pedindo fosse o general Caiado avisado de que o sr.
Getúlio Vargas se havia matado. Logo em seguida, o general
Caiado chegava ao quarto, onde, não resistindo ao impacto da
tragédia, foi acometido de forte crise de nervos, sofrendo uma
síncope.
A seguir, correndo escada acima, o Sr. Benjamin Vargas
gritava:
- Getúlio se matou!
O palácio ficou em pânico, a família do presidente acorreu,
entre gritos e lágrimas. Também o Sr. Osvaldo Aranha logo
chegou. Chegou junto à cama e, chorando, exclamou:
- Abusaram demais da bondade desse homem!"
Diário Carioca, 25 de agosto de 1954

"Neste nefasto Dia de São Bartolomeu, precisamente às 8, 35


horas, praticou o suicídio o Presidente Getúlio Vargas, com
um tiro de revólver no coração, quando se encontrava em seu
quarto particular, no 3o andar do Palácio do Catete.
O general Caiado de Castro, Chefe do Gabinete Militar da
Presidência da República, correu para os aposentos
presidenciais, ao ouvir o disparo, e ainda encontrou o
Presidente Vargas agonizante. Chamou às pressas a
assistência pública, que dentro de cinco minutos já se
encontrava no Palácio do Catete. Mas o grande Presidente
Vargas já estava morto. Não pode ser descrito o ambiente no
Palácio Presidencial. Tudo é consternação. Membros da
família do Presidente, serviçais, militares que guarnecem o
Palácio choram a morte do insine brasileiro.
O povo em massa acorre para o Palácio do Catete, estando
repletas as ruas que dão acesso à casa em que se matou,
vítima da ignomínia e das campanhas infamantes de
adversários rasteiros, o maior estadista que o Brasil teve,
neste século. Cenas de profunda dor estão sendo assistidas na
rua. Lê-se o pesar no rosto do povo. O povo brasileiro chora a
perda do seu Presidente, por ele escolhido, por ele eleito e que
- na crise gerada por seus inimigos - só saiu do Catete morto."
Última Hora, 24 de agosto de 1954

"Com a morte trágica de Getúlio Vargas perde o Brasil, sem


dúvida nenhuma, um de seus maiores vultos políticos de
todos os tempos. Nesta hora em que os acontecimentos se
sucedem vertiginosamente, quando a situação caminhava para
um desfecho constitucional previsto e que teria de afastar do
poder o presidente, o seu desaparecimento pela forma por que
se verificou enche de tristeza a Nação, suspensa os espíritos
diante do irremediável.
Cobre-se de luto a alma brasileira diante do esquife que
guarda o corpo de alguém que a história não esquecerá, sejam
quais forem os ângulos em que se coloque o observador
sereno da vida do país em quase meio século, tanto foi o
período em que atuou com a sua presença o estadista de
múltiplas facetas, empenhado, realmente, em realizar algo de
útil e permanente para o bem da sua terra.
Inteligência formada na escola que deu ao Rio Grande uma
personalidade da estatura de Julio de Castilhos no alvorecer
da República, Getúlio Vargas pertence à geração nova que
abriu os olhos para as atividades fecundas do regime depois
dos primeiros embates que sucederam à queda do Império, e
tomou a si as tarefas construtoras do sistema que deu ao
Brasil o máximo de seu progresso. deputado Estadual em mil
novecentos e nove, com projeção na Assembléia dos
Representantes do Rio Grande durante vários anos, a sua
carreira se assinalou brilhantemente até ao movimento de
renovação de valores operado no Estado em mil novecentos e
vinte e três, época em que o elegeram para a Câmara Federal,
cujos Anais guardam páginas vigorosas de seu mandato, na
liderança de uma bancada. Nesse posto o encontrou o
Governo de Washington Luis a que serviu na pasta da
Fazenda, e daí ainda o chamaram os seus coestadoanos para a
suprema magistratura estadual de onde ascendeu à
Presidência da República em mil novecentos e trinta.
A sua projeção no cenário nacional, de então para cá, é
tamanha e tão pontilhada de incidentes impressionantes, que
não cabe senão em esboço nas linhas de um perfil traçado em
momento dramático como o que atravessamos. Mas a
consideração que lhe devem os brasileiros impõe, mesmo que
se recordem no tumulto dos fatos destes dias, aspectos
inapagáveis de iniciativas que traziam em si as sementes das
suas altas e nobres preocupações do bem público,
principalmente no terreno econômico e no campo social,
cujos problemas ele sentiu e compreendeu com sinceridade e
com sinceridade procurou resolver.
A História não recusará a Getúlio Vargas o reconhecimento
devido aos seus méritos indiscutíveis, que ele os teve em
proporção acima acima da média dos nossos condutores. Ele
encheu com a sua situação enérgica e os seus propósitos de
dar-se inteiro a determinadas empresas de finalidade
patriótica, uma longa fase da existência do Brasil
contemporâneo, e manda a Justiça, que adversários lhe
devem, se não esconda de um registro rápido como este, em
que a emoção produzida pelo epílogo de um drama, não é
obstáculo a que a verdade ilumine a nossa imensa tristeza.
Esse que encerrou de forma inesperada o seu trânsito pelo
mundo, era um autêntico estadista, dotado de espírito público
invulgar, com a cultura política necessária ao exercício da sua
missão. A seu modo, e enfrentando embaraços que as
circunstâncias opõem constantemente aos que nos países
novos tentam forjar uma obra original que conduza os seus
compatriotas a um destino menos atribulado e os liberte de
preconceitos, Getúlio Vargas fez o máximo que as
contingências permitiriam a um homem do seu temperamento
e da sua formação. Desaparecido subitamente, nem por isso, e
nem por ter preferido a morte a uma luta funesta, o seu nome
será esquecido. O futuro dirá melhor da sua obra. O presente
lastima a sua perda. Reverenciemos o seu túmulo."
O Dia, 25 de agosto de 1954

"Quando o rádio anunciou o suicídio do Sr. Getúlio Vargas,


populares começaram a acorrer às imediações do Catete.
Forças do Exército, em rigoroso policiamento, mantinham-se
em cordão de isolamento, em torno da sede da Presidência da
República, procurando conter o povo. Muitas pessoas
pretendiam penetrar no palácio, no que eram impedidos. Os
grupos foram-se avolumando, com a chegada de gente de
todos os lados. Às primeiras horas da manhã, em diversos
pontos do centro da cidade, formaram-se grupos de populares.
Muitos empunhavam retratos de Vargas e realizavam
manifestações de protesto contra os adversários políticos do
presidente.
A carta deixada por vargas e redigida momentos antes de
varar o coraçào com uma bala, denunciava, em termos bem
claros, os responsáveis pelo golpe, os imperialistas norte-
americanos e seus seguidores do entreguismo.
Pela manhã, grupos de populares atacaram bancas de jornais e
destruiram exemplares de jornais propagandistas do golpe. As
sedes do O Globo e da Rádio Globo foram atacadas. Dois
caminhões dessa empresa foram incendiados. Das 11 ao
meio-dia foram feitas várias investidas populares contra a
Tribuna da Imprensa, contidas por elementos da Polícia
Especial, guardas-civis e investigadores. Vários jornais
cúmplices da propaganda golpista foram mantidos sob guarda
de policiais."
Imprensa Popular, 25 de agosto de 1954

" (...) Às oito horas e quarenta minutos, o rádio anunciou o


inesperado, o chocante, o brutal: o Sr. Getúlio Vargas
suicidara-se com um tiro no coração. Nào se descreve o abalo
causado por esse acontecimento. A cidade inteira vivera no
curso de uma noite uma tragédia Shakesperiana. Uma
tragédia que transcorria com toda a intensidade do real, do
pungente, sacudindo os nervos, minuto a minuto, em que
mentalmente os espectadores viam os quadros, os
personagens, o desenrolar dos diálogos e o explodir das
crises, e que, finalmente, terminava exatamente como nas
cenas últimas do dramaturgo inglês, com a morte da
personalidade em torno da qual se entreteciam os
acontecimentos e as palavras. (...)
O corpo do Sr. Getúlio Vargas foi transportado por via aérea
para sua terra natal, São Borja. Seguiram-no quatro aviões,
com pessoas de sua família e amigos mais íntimos. A família
do Presidente dispensou as honras militares. (...)
A preocupação do Sr. Café Filho é restaurar a ordem nacional
e realizar um Governo de concentração, solicitando o apoio
de todos os Partidos nesta hora gravíssima do País."
A Marcha, 27 de agosto de 1954
"Pouco antes das 9 horas a reportagem de A Noite junto ao
Palácio do Catete transmitia-nos uma informação
extremamente dramática: o Sr. Getúlio Vargas acabava de
suicidar-se. Com um tiro no coração, executara a decisào
extrema. Foi chamada com urgência uma ambulância. Getúlio
Vargas exalara já o último suspiro.
A primeira pessoa a informar sobre o suicídio de Getúlio
Vargas foi o seu sobrinho, capitão Dorneles. Ouvira um tiro.
Acorrera aos aposentos presidenciais. E de lá saía logo com a
notícia impressionante: matara-se Getúlio Vargas.
A ambulância do Pronto Socorro que foi ao Palácio era
chefiada pelo Dr. Rodolfo Perricê. Esse médico informou, ao
regressar, que já encontrara o presidente morto, na cama, em
seus aposentos particulares, cercado de membros da família.
Vestia pijama e apresentava uma perfuração no coração.
Estava com as vestes empapadas de sangue. (...)
Durante toda a noite se desenrolaram os episódios que viriam
a culminar com o suicídio de Getúlio Vargas. Às três horas o
Palácio do Catete era cenário de uma reunião que marcará um
dos episódios mais dramáticos da história do Brasil atual.
Convidado a renunciar, Getúlio Vargas recusou-se a atender
ao apelo. A crise se prolongou. e se acentuava. Veio
finalmente a sugestão que foi redigida sem demora e com a
qual parecia ter se conformado o ex-presidente: a licença, ao
invés da renúncia. Mas a verdade é que Getúlio Vargas ia
cumprir a promessa que fizera de só morto deixar o Catete.
(...)
Após os primeiros instantes de estupefação, dentro do Palácio
do Catete, o general Caiado de Castro conseguiu entrar no
aposento em que se encontrava o Presidente Getúlio Vargas
caído com uma marca de sangue à altura do coração. No
mesmo momento, dona Darcy Vargas que seguia atras do
general Caiado, atirava-se para frente e segurando as pernas
do extinto, puxava-as exclamando:
- Getúlio, por que fizeste isso??
Logo depois entrava no quarto o Sr. Lutero Vargas e sentava-
se ao lado do corpo, em prantos.
Às 9 horas surgia a notícia emocionante. Estavam terminados
os dias do ex-chefe da Nação."
A Noite, 24 de agosto de 1954

"A nação inteira foi abalada na manhã de ontem com a notícia


da morte do Sr. Getúlio Vargas, ocorrida em circunstâncias
patéticas. Cerca de três horas após a histórica reunião da
madrugada de ontem, encerrada com a decisão de licença, o
presidente da República se suicida, com um tiro no coração.
Pouco depois das oito horas, o Sr. Getúlio Vargas encontrava-
se no seu quarto de dormir, no terceiro andar do Palácio. De
pijama, fisionomia tranquila, ali foi surpreendido pelo seu
velho camareiro Barbosa, que entrava no aposento
presidencial, conforme fazia todas as manhãs, para o serviço
de arrumação. Disse-lhe, então, o Sr. Getúlio Vargas, em voz
serene:
- Sai Barbosa, eu quero descansar ainda um pouco.
Foram estas as suas últimas palavras. Instantes depois,
deitando-se no leito, o Sr. Getúlio Vargas comprimia, com a
mão direita uma pistola contra o peito, exatamente sobre o
coração, e com a outra acionava o gatilho. desferido o tiro,
não teve mais que uns poucos minutos de vida.
A cidade viveu ontem horas de profunda tensão nervosa, em
consequência do suicídio do presidente Getúlio Vargas. Às
8,45 quando maior era o movimento de automóveis nos
bairros para o centro da cidade foi a informação do
falecimento divulgado pelo rádio. Na praia do Flamengo
carros particulares, táxis e coletivos paravam em plena
Avenida e seus passageiros estupefatos dirigiam-se aos
passageiros dos outros carros, procurando pormenores
informações como se não quisessem dar crédito ao que
ouviram nas rádios dos automóveis. (...) Uma verdadeira
multidão acorreu ao Palácio do Catete, onde permaneceu de
pé à espera do momento que lhe permitissem ver o corpo do
sr. Getúlio Vargas. E muitos choravam."
Correio da Manhã, 24 de agosto de 1954

AS MANCHETES:
Vargas Ao Marechal Mascarenha De Moraes: Não
Renunciarei!
- Fui Eleito Pelo Povo, Por Cinco Anos, E Cumprirei Meu
Mandato Até O Fim. Não Me Deixarei Desmoralizar ( A
Noite )
Desfecho Tremendamente Dramático: Matou-se Vargas! Um
Tiro No Coração!
A Resolução Extrema Executado Pelo Presidente Que Caia
( A Noite )
O Inesperado Desfecho Da Crise Militar ( A Marcha )
Protesta O Povo Nas Ruas Contra O Golpe E Pelas
Liberdades
União De Todos Os Brasileiros Para A Defesa Da
Constituição
Apoiado Pelos Ianques Café Sucede Vargas ( Imprensa
Popular )
Pus E Lama Escorrem Sobre A Nação Estarrecida
Gregório Explorava A Contravenção, Arrancando Dinheiro
Dos "Bicheiros"
( O Dia )
Afasta-se Vargas Do Governo - Às 4 Horas E 55 Minutos O
Momento Decisivo - O Sr. Vargas Ainda Tentou Resistir,
Recusando-se A Aceitar as Razões Apresentadas Pelos Seus
Ministros - A Reunião Ministerial Durou Cerca De Quatro
Horas ( O Dia )
Lamenta O País A Morte Do Presidente Vargas - Enorme
Massa Popular, Numa Fila Interminável, Na Visitação Do
Corpo Do Presidente Da República, Exposto, Em Câmara
Ardente, No Palácio Do Catete ( O Dia )
A Multidão Desfilou A Chorar Ante Vargas - O Presidente
Morreu
Impressionantes Os Aspectos Do Velório No Catete ( Diário
Carioca )
Dramático Desfecho ( Jornal do Brasil )
Vargas Não Cederá Nem À Violência, Nem Às Provocações,
Nem Ao Golpe
"Só Morto Sairei Do Catete" ( Última Hora )
Última Hora Havia adiantado, Ontem, O Trágico Propósito -
Matou-se Vargas
O Presidente Cumpriu A Palavra! "Só Morto Sairei Do
Catete!"
( Última Hora )
45) Mineirinho (1962)
"Depois de travar violento tiroteio com policiais cariocas,
"Mineirinho", que se encontrava homisiado no Morro da
Previdência, onde fôra receber um "auxílio" de um
contraventor, conseguiu furar o cêrco policial, escalando uma
barreira de aproximadamente 30 metros e tomou destino
ignorado.
Os policiais que provocaram a fuga do perigoso marginal,
seguiram, imediatamente, para o Morro de Mangueira, onde
esperam localizá-lo, num local onde o mesmo havia marcado
com alguns de seus comparsas. O fato ocorreu às últimas
horas da noite de ontem.
Na Rua da América, por onde tem uma das entradas para o
Morro de Previdência, desde às primeiras horas da tarde de
ontem, quando chegou a primeira informação de que
"Mineirinho" ali se encontrava, transformou-se numa
verdadeira praça de guerra: cêrca de 100 policiais, armados de
metralhadoras e com ordem de capturá-lo (de "qualquer
maneira") vasculhavam as ruas da favela.
Já às primeiras horas da madrugada de hoje, os policiais
deslocaram-se para o Morro de Mangueira, onde o marginal
possui muitos amigos. Sua pris!ao poderá ocorrer ainda hoje.
Os policiais estão informados de quais as residências
( barracos ) onde "Mineirinho" poderá fugir ao cêrco
policial."
Diário Carioca, 29 e 30 de abril de 1962

"Com uma oração de Santo Antônio no bôlso e um recorte


sôbre seu último tiroteio com a Polícia, o assaltante José
Miranda Rosa, "Mineirinho", foi encontrado morto no Sítio
da Serra, na Estrada Grajaú-Jacarepaguá, com três tiros nas
costas, cinco no pescoço, dois no peito, um no braço
esquerdo, outro na axila esquerda e o último na perna
esquerda, que estava fraturada, dado à queima-roupa, como
prova a calça chamuscada.
A Polícia após os primeiros exames periciais, afirma que o
assaltante foi morto em outro lugar, pois não foram
encontradas no local suas armas. Logo após ter sido
anunciado que Mineirinho tinha sido encontrado morto,
centenas de pessoas compareceram ao Sítio da Serra para vê-
lo e outro tanto foi ao Instituto Médico Legal, para onde seu
corpo foi removido à tarde. (...)
Até às últimas horas de ontem a Polícia ainda não havia
esclarecido o tiroteio ocorrido domingo último, às 22 horas,
na Rua General Pedra, próximo à esquina da Rua de Santana,
onde se localiza a garagem da emprêsa de transporte Santa
Cecília.
Funcionários desta garagem informaram à reportagem que o
tiroteio foi travado entre vários indivíduos que saltaram de
um carro e três elementos que fugiram. Pouco depois de
acabado o tiroteio, apareceu uma viatura da RP que se retirou
rapidamente, enquanto dois homens colocavam o cadáver de
um dos assaltantes num carro particular, levando-o para local
ignorado.
A reportagem encontrou no local do tiroteio inúmeras
cápsulas de balas calíbre 45mm, usadas nas metralhadoras
"Thompson"e "Ina", e um par de sapatos manchado de graxa.
acredita-se que neste tiroteio tenha sido morto o assaltante
Mineirinho.
Dezenas de pessoas pobres compareceram ao local onde foi
encontrado o cadáver de Mineirinho. Ninguém conseguiu
aproximar-se do corpo, pois a polícia, por ordem do delegado
Agnaldo Amado, do 23o DP, afastava a todos com violência.
Em geral, os moradores do morro se mostravam contrariados
com a morte de Mineirinho, que consideravam uma versào
carioca de Robin Hood.
No Instituto Médico Legal, para onde foi levado o cadáver,
também compareceu grande número de pessoas. A Polícia
fiscalizou a todos que lá foram, na esperança de identificar os
que já pertenceram às suas quadrilhas. Quem identificou o
corpo do assaltante foi seu pai, que o velou durante tôda a
noite.
Ontem, antes de ter sido anunciada a morte de Mineirinho, o
marginal Renê da Silva, "Negrão", membro da sua quadrilha,
que se encontrava prêso na Delegacia de Vigilância, declarou
à reportagem que somente morto êle se entregaria e que êle
fugiu da prisão para matar "Cabo Luís", a quem atribuía sua
prisão.
Milton Fernandes Carvalho, "Faquir", o outro assaltante da
"gang" que se encontra prêso na DV disse também que a
intenção de Mineirinho era matar "Cabo Luís" e que sua
grande paixão sempre foi Maria Helena."
Diário Carioca, 1 de maio de 1962

"A Polícia completou, ontem, o quinto dia de perseguição a


"Mineirinho", travando demorado tiroteio com êle e quatro
comparsas, que se ocultavam no barraco onde sempre morou
o delinqüente no morro da Favela e de onde escaparam
rolando por uma ribançeira de 25 metros de altura.
Depois dêsse episódio, ocorrido quase às 20 horas, as turmas
da Delegacia de Vigilância e da Sub-Seção de Olaria
perderam todas as pistas do bandido, que as autoridades,
apesar de tudo, ainda esperam encontrar, vivo ou morto, nas
próximas 24 horas, contando com a traição de seus
adversarios e com a vigilância dos "olheiros" que mantêm
disfarçados em todos os morros da cidade. (...)"
Diário de Notícias, 29 e 30 de abril de 1962

"Treze vezes varado por disparos de metralhadoras "Ina" e


trajando blusão verde, calça preta e meias azuis, "Mineirinho"
foi jogado morto no capinzal existente a 5 metros do meio-fio
do quilômetro 4 da estrada Grajaú-Jacarepaguá.
Parece que seu último duelo com a Polícia ocorreu na rua
General Pedra, onde, batido em plena madrugada pela turma
do detetive Daniel, procurou refúgio sob um ônibus e se
tornou alvo fácil para as rajadas de balas que vinham de todos
os lados, sobretudo porque seus gritos desesperados de
socorro auxiliavam o ataque furioso dos policiais.
O motorista Arcílio Meneses ( rua "E" no 342, Juiz de Fora )
foi quem deu com o corpo atirado na mata. Parou o seu
caminhão na altura da Cachoeira Grande e, depois de
constatar que o homem estava morto, chamou os guardas de
serviço da rodovia. Em questão de minutos, os policiais
identificaram o homem que tinha uma bala na perna esquerda,
três nas costas, uma no braço esquerdo, uma no pescoço, uma
no punho direito, uma no braço esquerdo, quatro no peito e
uma no coração. Várias delas ainda apresentavam marcas de
pólvora, indicando que os tiros haviam sido desferidos à
queima-roupa.
Em volta do corpo não havia um único sinal de sangue,
evidenciando que a morte não ocorrera naquele local. Além
disso, os moradores dos barracos das vizinhanças
asseguraram que ali não se travara nenhum tiroteio durante a
madrugada. "Mineirinho" fôra mesmo liquidado em outro
lugar e removido para lá. (...)
Logo que se espalhou a notícia da localização do corpo de
"Mineirinho", verdadeira multidão deslocou-se na direção do
quilômetro 4 da estrada Grajaú-Jacarepaguá. Foi necessario
estender um cordão de isolamento sob a orientação do
delegado Cecil Borer e do comissário Amado.
Às 15 horas, o cadáver chegou ao Instituto Médico Legal.
Novamente outra multidão aglomerou-se para tentar ver o
marginal e, no meio dela, as autoridades capturaram diversos
meliantes. Hoje, os legistas farão a autópsia e, possivelmente,
às 16 horas, será feito o enterro.
Desapareceu, assim, um dos criminosos mais famosos dos
últimos tempos. Moço ainda, tinha 107 anos de cadeia por
cumprir. Preferiu a morte à cela perpétua. Por duas vêzes
escapara das grades e se ocultara nos morros quase
inacessíveis aos seus perseguidores. Mas descendo à cidade,
teve de enfrentar de igual para igual aquêles que estavam na
sua pista e terminou levando a pior. Quase 300 homens
andavam no seu encalço desde o dia 23 de abril, quando
escapara calmamente do Manicômio Judiciário jurando que
nunca mais voltaria ao cárcere." Diário de Notícias, 1 de
maio de 1962

"Não foi a Justiça quem decretou a morte do mais temível


assaltante do Rio de Janeiro, conhecido pela alcunha de
"Mineirinho". Êle próprio a procurou, desafiando a
tranqüilidade pública e um aparelhamento policial cujas
metralhadoras sabia não lhe dariam trégua. Careregando 104
anos de prisão, o facinora ainda brincou pelas ruas e favelas
da cidade durante dias, assaltando e baleando - que estas eram
sua razão de viver.
Não há pena de morte, muito menos os policiais têm carta de
legítima defesa permanente, para matar sem dar as devidas
satisfações. Seja a vítima da mais alta periculosidade. Daí seu
corpo ter sido manhosamente transportado para local êrmo,
numa prova de que nem sempre os detetives sabem despistar.
Mas isso é outra história. "Mineirinho" acabou para a crônica
policial. Seu corpo, como outro qualquer, só mereceu do
popular que aparece na foto o gesto de retirar o chapéu de
sôbre a cabeça, em sinal de respeito. Em sinal de respeito aos
leitores, também evitamos focalizá-lo varado pelas balas.
Crivado de balas, foi encontrado ontem à margem da Estrada
Grajaú- Jacarepaguá ( K.4 ), o cadáver do facínora
"Mineirinho" (José Miranda Rosa). O marginal não fôra ali
assassinado. Pessoas que testemunharam um tiroteio nas
fraldas do Morro do Pinto, na Rua General Pedra, ligaram os
fatos e afirmaram que a Polícia metralhou "Mineirinho" na
refrega.
A versão diz que o marginal fôra apanhado de surprêsa, mas
que, rápido, atirou-se ao solo, sob um ônibus estacionado, e
tentou ainda reagir. Uma nova rajada de metralhadora acabou
com o assaltante. ainda a versão diz que um carro de c6or
amarela recolheu "Mineirinho", levando-o para outro local.
José Rosa, conforme noticiamos, fugiu há dias do Manicômio
Judiciário e havia jurado vender caro a liberdade.
Efetivamente, baleou dois policiais que o caçavam,
praticando, ainda, varios assaltos. (...)
E "Mineirinho"morreu. Teve o fim de todos os seus iguais.
Foi talvez, o bandido mais temível de quantos a Polícia
carioca já enfrentou. Fugiu, de maneira ainda não esclarecida,
no dia 23 de abril último, do Manicômio Judiciário, levando o
propósito de eliminar diversos policiais, antes de ser abatido,
pois dos seus planos fazia parte também, só se entregar morto.
Por pouco não cumpria totalmente a promessa. Baleou dois
policiais, um dos quais - gravemente, num "entrevero"em
Tomazinho, no Estado do Rio. Ambos pertencem à 2a
Subseção de Vigilância, que lhe movia a caçada incessante.
O delegado Agnaldo Amado solicitou o comparecimento de
um técnico do Instituto de Criminalística. Os peritos
Diamantino e Ivã estiveram no local, recolhendo em poder da
vítima a importância de 8.120 cruzeiros e uma oração: "Cinco
Minutos Diante De Santo Antônio".
"Mineirinho", segundo a perícia, recebeu um tiro à queima-
roupa na perna esquerda, fraturando-a. Apresentava mais duas
perfurações nas costas, perfazendo um total de 13 tiros.
segundo, ainda, os técnicos do IC, o famoso bandido não foi
assassinado no local. Suas armas desapareceram.
"Mineirinho" portava sempre duas pistolas "45mm". Dada a
rigidez do corpo, e delinqüente fôra eliminado entre 4h30m e
5 horas. O corpo, com guia das autoridades do 23o Distrito
Policial, foi removido para o necrotério do Instituto Médico
Legal. (...)"
Correio da Manhã, 1 de maio de 1962

"José Rosa de Miranda, o Mineirinho, foi encontrado morto,


ontem na Estrada Grajaú-Jacarepaguá, no Rio, com 13 tiros
de metralhadora em várias partes do corpo - três deles nas
costas e quatro no pescoço - uma medalha de ouro de S. Jorge
no peito e Cr$ 3.112 nos bolsos, e sem os seus sapatos marca
Sete Vidas, atirados a um canto. A Polícia atribui o
assassinato do ex-detento "a um seu rival".
(...) Embora a Polícia afirme que nada tem a ver com a morte
de Mineirinho, que fugira há oito dias do Manicômio
Judiciário, apurou-se que foi Paulo Sérgio dos Santos,
conhecido por Gambota e informante do Detetive Daniel,
Chefe do Setor de Vigilância, quem indicou na noite de
domingo o local em que êle iria aparecer.
Levantamento feito pelos jornalistas revelou pormenores que
a própria Polícia se nega a confirmar, embora existam pontos
que indicam a sua participação no episódio. A hipotese de que
êle teria sido morto onde foi achado é afastada pelo
depoimento dos moradores de Cachoeira Grande, que não
ouviram tiros ali.
Segundo os indicios recolhidos pelos jornalistas, Mineirinho
foi morto a 1h30m de ontem, na Rua General Pedra, esquina
da Rua Santana, próximo à Garagem Ipiranga. Dali foi
colocado num auto e levado para a Estrada Grajaú-
Jacarepaguá. Os ocupantes do carro procuraram um lugar
para deixar o corpo - precipicio entre os muitos das
redondezas -, mas a aproximação de outros veículos fêz com
que voltassem e deixassem o corpo no quilometro 4. (...)
O corpo de Mineirinho foi levado por volta das 14h30m para
o Instituto Médico Legal, mas a autópsia nào pôde ser feita
porque havia muita gente querendo vê-lo: uma fila de mais de
mil pessoas se firmara pelas ruas adjacentes. Dessas, pelo
menos sete foram prêsas, por detectives da Delegacia de
Vigilância, pois eram fichados e estavam sendo procuradas. O
legista Nélson Capareli utilizou o corpo para dar aulas a
alguns estudantes de Medicina.
O reconhecimento oficial do corpo de Mineirinho, até à noite
dependia de uma ordem do Chefe de Polícia: para identificá-
lo apareceu seu irmão, o Sr. Romeu Rosa de Miranda,
funcionario da Cia. Siderúrgica Nacional. Segundo o legista
Capareli, a necrópsia será feita às 9h. O entêrro, custeado pelo
Sr. Romeu de Miranda será no Cemitério do Caju,
possivelmente às 15h. (...)
Jornal do Brasil, 1 de maio de 1962

"Treze balas de metralhadora encerraram a existência do mais


atrevido e perigoso bandido que marcou época nos Estados da
Guanabara e do Rio de Janeiro. José Miranda Rosa, o
tristemente famoso "Mineirinho", foi encontrado morto, na
manhã de ontem, pela reportagem de O Dia e A Notícia, à
margem da estrada Grajaú- Jacarepaguá. O cadáver estava à
beira de um grotão, em decúbito dorsal, no lugar chamado
"Pedra do Gambá", no morro da Cachoeira Grande, com a
face esquerda encoberta pela mão do mesmo lado. Tinha dois
balaços no pescoço, dois no maxilar, dois no rosto, dois no
peito, dois nas costas, um na cabeça, um na perna esquerda e
o último no braço direito. (...)
A notícia do encontro do cadáver de "Mineirinho" espalhou-
se com incrível rapidez pelos quatro cantos da cidade.
Estações de rádio e edições de jornais em 2o cliché
contribuiram para isso. Ao meio-dia, mais de duas mil
pessoas se concentravam na estrada Grajaú-Jacarepaguá. Para
que se tenha uma idéia da curiosidade popular, basta dizer
que até lotações foram alugadas especialmente para 6esse
fim. Com "vista" de "especial", despejavam populares nas
imediações da "Pedra do Gambá". Todos queriam ver o corpo
do bandido. A coisa chegou a tal ponto, que o delegado
Amado viu-se na contingência de ter que solicitar uma
guarnição da Polícia Rodoviária para desinterditar o tráfego.
não havia veículo que rompesse a massa humana. (...)
Ao que tudo indica, "Mineirinho" foi morto por uma turma de
policiais, na rua General Pedra, ao findar a noite de domingo,
defronte à garage da "Emprêsa Transportadora Santa Cacília
Ltda". De que a Polícia matou um homem ali, crivando-o de
balas, não há a menor dúvida, conforme declarações feitas a
O Dia pelo mecânico Antônio Elói, daquele estabelecimento.
Disse o seguinte: por volta das 22:30 horas, fazia reparos num
ônibus, quando viu uma viatura policial parar na esquina das
ruas Marquês do Pombal e General Pedra. Saltaram vários
homens armados, espalhando-se e permanecendo em locais
estratégicos.
Pouco depois - continuou o mecânico - um indivíduo moreno,
franzino, alto (são os caracteres físicos de "Mineirinho")
apareceu e, percebendo que estava cercado, tentou fugir em
direção à ponte que dá acesso ao morro da Favela, Os
policiais, porém, fecharam o cêrco e o homem lançou-se
debaixo de um ônibus que ali estava parado, recebendo então
uma saraivada de tiros. Mesmo ferido, tentou saltar um muro,
mas recebeu a descarga de misericórdia.
Apavorado com o que assistia, Eloi escondeu-se também sob
o ônibus que consertava, mas ainda assim pôde observar
quando o sujeito alvejado era arrastado para dentro de um
carro prêto, que arrancou em louca disparada rumo à Zona
Norte. A reportagem de O Dia encontrou, naquele local,
várias cápsulas - algumas intactas. Como se vê, se não foi
"Mineirinho" o alvo da fuzilaria, um inocente foi morto em
seu lugar. (...)"
O Dia, 1 de maio de 1962

AS MANCHETES:
Tiroteio: Polícia X Mineirinho ( Diário Carioca )
"Mineirinho" Morreu Com Oração E Recorte No Bolso
( Diário Carioca )
Polícia Perde Todas As Pistas Que Levam A "Mineirinho"
( Diário de Notícias )
"Mineirinho" Foi Metralhado 13 Vêzes E Atirado No Mato -
Povo Afluiu Para Ver Bandido Morto ( Diário de Notícias )
A Cidade Está Em Paz ( Correio da Manhã )
"Mineirinho"Foi Crivado De Balas E Atirado Na Grajaú-
Jacarepaguá
( Correio da Manhã )
"Mineirinho" Sem Sete Vidas ( Jornal do Brasil )
Delegado Admite Que "Mineirinho" Pode Ter Sido Morto
Pela Polícia
( Jornal do Brasil )
Tombou O Inimigo Público N. 1 - "Mineirinho" Metralhado
Pela Polícia!
Facínora Levou Uma Carga De Chumbo . Ferido, Tentou
Saltar Um Muro E Recebeu A Rajada De Misericórdia. O
Cadáver Foi Descoberto Pela Reportagem De O Dia e A
Notícia. Estava Jogado À Margem Da Estrada Grajaú-
Jacarepaguá Na Altura Do Km. 4, Com Treze Perfurações
Pelo Corpo -
"Coisa Ruim", Amigo Do Bandido, Jura Vingança -
Depoimento Impressionante De Uma Testemunha De Vista
Do Fuzilamento - Fretados Lotações Para Curiosos Verem O
Corpo Do Famoso Marginal ( O Dia )
46) Comício da Central do
Brasil (1964)
"Uma grande multidão encheu a Praça Cristiano para ouvir o
Presidente da República. A manifestação transcorreu em
ordem, apenas com ligeiros incidentes, não políticos; logo
abafados. O acidente mais grave aconteceu quando uma faixa
pegou fogo e, em consequência do pânico, 140 pessoas se
feriram. Antes de começar o comício, a explosão de uma
bomba feriu sete pessoas. (...)
Cerca de cem mil pessoas ouviram, ontem, na Praça Cristiano
Otoni, o Presidente João Goulart e doze outros oradores. A
manifestação transcorreu em ordem, registrando-se apenas
ligeiros incidentes, logo abafados. O acidente mais sério
aconteceu quando uma faixa pegou fogo e se estabeleceu
pânico. Sairam feridas 140 pessoas. Antes de começar o
comício, a explosão de uma bomba feriu sete pessoas. (...)
Às 19h40m, foi anunciada a presença, no palanque, dos três
ministros miltares, General Jair Dantas Ribeiro, do Exército,
Brigadeiro Anisio Botelho, da Aeronáutica, e Almirante
Sílcio Mota, da Marinha. Na oportunidade, também foi feita
alusão ao Almirante Cândido Aragão, comandante do Corpo
de Fuzileiros Navais.
Às 19h44m, chegava ao palanque o Presidente João Goulart,
acompanhado em primeiro plano do Sr. Eugênio Caillard, seu
secretário particular. No momento em que o Sr. João Goulart
subiu ao palanque, discursava o Deputado Doutel de Andrade,
em nome do PTB, criticando o capitalismo, e prometendo
irrestrito apoio ao Presidente e aos trabalhadores.
A Sra. Maria Teresa Goulart trajava um vestido azul-piscina,
e apresentava um penteado que lhe prendia os cabelos no alto.
Entrevistada pelos repórteres, afirmou que estava achando o
comício "maravilhoso" e que era a favor das reformas de
base. (...)
Até depois das 20 horas, quando já estava presente o
Presidente Goulart, continuavam chegando delegações ao
comício, ficando totalmente tomado todo o quarteirão
compreendido entre o Mercado do SAPS e o Panteon Caxias,
passando pela primeira pista da Avenida Presidente Vargas.
No lado oposto da Praça Cistiano Otoni, a massa se
comprimia entre o edifício da Central do Brasil e a ala lateral
do Ministério da Guerra, até as imediações da entrada do
Túnel João Ricardo. (...)
Entre as faixas empunhadas pelos manifestantes da Praça
Cristiano Otoni estavam a s seguintes: "Salve O Glorioso
CGT", "Reconhecimento da China Popular", "PCB, Teus
Direitos São Sagrados", "Viva O PCB", "Encampação de
Capuava", "Abaixo Com As Companhias Estrangeiras", além
de várias outras de saudação ao Presidente João Goulart.
Outras diziam: "Jango Em 65 - Presidente da República:
Trabalhadores Querem Armas Para Defender O Seu
Governo". "Sexta Feira, 13, Mas Não É De Agosto", "Brizola
65 - Solução Do Povo", "Jango - Abaixo Com Os Latifúndios
E Os Trustes", "Jango - Defenderemos As Reformas A Bala".
(...)
O Prof. Darci Ribeiro, chefe do Gabinete Civil da Presidência
da república, por três vezes chegou-se ao Presidente João
Goulart, quando este discursava, falando qualquer coisa a seu
ouvido. Quase imediatamente o Sr. João Goulart passava a
abordar outro assunto ainda não ventilado no discurso. O
Chefe da Nação, que iniciou seu discurso lendo o que fôra
preparado com antecedência, entusiasmou-se com suas
palavras e passou a falar de improviso, daí os "sopros" do Sr.
Darci Ribeiro, para que nada ficasse esquecido.
D. Maria Teresa chegou sorrindo ao palanque, ficando séria
logo após. A cada pedido dos fotógrafos, ela sorria
novamente. Quando começaram a soltar fogos de artifício, ela
preocupou-se e passou a olhar para os lados e para trás.
Durante os 66 minutos do discurso presidencial, permaneceu
ao lado do Sr. João Goulart, passando-lhe, a cada momento, o
copo d'água gelada. (...)
Terminado o comício, o Presidente João Goulart estava
visivelmente exausto. Mal entrou no carro que o conduziria
ao Palácio das Laranjeiras, recostou-se no colo de D. Maria
Teresa, que lhe acariciou carinhosamente os cabelos."
O Globo, 14 de março de 1964

"Cerca de duzentas mil pessoas tomaram parte na


concentração realizada ontem, na Praça da República, em
favor das reformas. Desde as 15 horas, era acentuado o
movimento de populares a caminho do local do comício,
pelas ruas centrais da cidade. A manifestação teve início às 18
horas, quando foi lida a mensagem do povo e autoridades
municipais de Porto Alegre, em nome de todo o Rio Grande
do Sul, saudando o Presidente João Goulart e os líderes
populares pela sua atuação em favor das reformas. A essa
altura dos acontecimentos, já se encontravam no palanque
várias autoridades, entre as quais os senhores Darcy Ribeiro,
Chefe da Casa Civil da Presidência da República, o Marechal
Osvino Ferreira Alves, Presidente da Petrobrás, o Ministro
Júlio Sambaqui, da Pasta da Educação e o Governador Seixas
Dória, de Sergipe. (...)
Antes de ser apresentado o terceiro orador, deputado Sérgio
Magalhães, foi anunciado ao povo que o Presidente da
República acabara de assinar, no Palácio das Laranjeiras, o
Decreto da SUPRA, desapropriando as terras existentes num
raio de dez quilômetros dos eixos das rodovias e ferrovias
federais, além das terras beneficiadas ou recuperadas por
investimentos exclusivos da União em obras de irrigação,
drenagem e açudagem.
Logo após ser ouvida a palavra do Governador Miguel
Arraes, foi anunciada a assinatura do decreto de encampação
das refinarias particulares, como as de Capuava, Manguinhos,
Matarazzo e outras. (...)
Às 19 horas e 50 minutos, foi anunciada a chegada do
Presidente João Goulart, juntamente com a primeira dama do
País, Sra. Maria Teresa Goulart.
Afirmando ao povo que "a hora é das reformas, pois as atuais
estruturas ultrapassadas não mais poderão realizar o milagre
da salvação nacional de milhões de brasileiros", o Presidente
João Goulart pronunciou incisivo discurso no "Comício Pró
Reformas de Base". Continuando, o Sr. João Goulart disse
que "Só conquistaremos a paz social, através à justiça social.
A maioria dos brasileiros não se conforma com a ordem
social vigente, imperfeita, injusta e desumana. Esse é o
motivo que me leva a lutar pelas reformas, de estruturas, de
métodos, de estilos, de trabalho, e de objetivos, pois não é
possível progredir sem reformas." (...)"
A Noite, 14 de março de 1964

"Transformou-se numa autêntica festa popular, o comício


ontem realizado na Praça Cistiano Ottoni. Ao encontro do
presidente da República, uma incalculável multidão deslocou-
se desde as primeiras horas da tarde, entoando cantos e
trazendo faixas e cartazes, alusivos às suas reivindicações e
indicativos do apoio com que pode contar o presidente
Goulart nas medidas que vem tomando na defesa dos
interesses nacionais.
O entusiasmo que recebia as palavras dos líderes políticos,
sindicais e estudantis mostrou uma firme determinação do
povo de lutar unido e coeso pela implantação das reformas
fundamentais de que o Brasil necessita para a consolidação do
seu desenvolvimento. Foi uma evidência, na repercussão que
teve nos aplausos da grande massa popular, o sentimento da
necessidade de uma efetiva e urgente modificação que
reformule o arcaico estatuto da terra ainda vigente entre nós.
Pacífica e ordeiramente, o povo compareceu ao diálogo
democrático com o presidente da República e disse-lhe, pela
voz dos seus líderes autênticos e pala eloqüência dos seus
cartazes e faixas, o que o povo deseja que seja feito para o
bem da Nação.
Foi portanto o comício de ontem, uma extraordinária
demonstração de pujança do regime democrático, com o povo
brasileiro unido ao seu presidente na praça pública, em festivo
ato de pleno exercício da Democracia."
Diário Carioca, 14 de março de 1964

"O Presidente João Goulart, depois de assinar, no Palácio das


Laranjeiras, o decreto da Supra - o passo inicial para a
reforma agrária - e o da encampação de refinarias particulares
de petróleo, anunciou ontem no comício da Central do Brasil
o tabelamento, dentro de horas, dos aluguéis, e prometeu lutar
pela reforma da Constituição, a fim de promover o
"desenvolvimento do País com justiça social".
- Nenhuma força será capaz de impedir que o Governo
continue a assegurar absoluta liberdade ao povo brasileiro. E
para isso podemos declarar, com orgulho, que contamos com
a compreensão e o patriotismo das bravas e gloriosas Forças
Armadas - disse o Sr. João Goulart em seu discurso na Praça
Cristiano Otôni, à noite, perante multidão calculada em 130
mil pessoas e ao lado de sua espôsa Sra. Maria Teresa.
Durante o meeting, cuja ordem foi garantida pela maior
demonstração de fôrça bélica já vista em atos dessa natureza,
esboçou-se um momento de protesto, com a colocação de
velas acessas nas janelas dos apartamentos da Praia do
Flamengo, onde reside, o Governador Carlos Lacerda. A
sugestão dêsse protesto mudo foi dada através de telefonemas
anônimos, mas o movimento restringiu-se a apenas trinta
apartamentos.
Também falaram ao povo, no comício, os Srs. Miguel Arrais
e Leonel Brizola - este o orador mais aplaudido. O ex-
Governador gaúcho pregou a necessidade de uma saída
pacífica para "este impasse a que chegamos", sugerindo "uma
Constituinte para a eleição de um Congresso popular, um
Congresso onde se encontrem trabalhadores e camponeses,
onde se encontrem muitos sargentos e oficiais nacionalistas".
Em Brasília, os líderes oposicionistas Bilac Pinto e Pedro
Aleixo consideraram subversivas e violadoras da lei as
palavras do Sr. Leonel Brizola, estranhando que os Ministros
militares, presentes ao palanque da Praça Cristiano Otôni não
o houvessem preso em flagrante. O Sr. João Goulart
considerou "bom" o discurso do ex-Governador gaúcho. (...)"
Jornal do Brasil, 14 de março de 1964

"Falando a uma multidão de centenas de milhares de pessoas,


no palanque diante do qual se viam as fôrças militares,
montando guarda ao povo, que conduzia cartazes exigindo
sobretudo as reformas e a legalidade do PC, havendo
inclusive o foice e o martelo, o presidente João Goulart
afirmou que "os milhões de brasileiros que nada têm se
impacientam com a demora já agora insuportável, em receber
os dividendos de um progresso também construído pelos mais
humildes".
Depois de salientar que ali estavam trabalhadores, "vencendo
uma campanha de terror ideológico e sabotagem,
cuidadosamente organizada para impedir ou perturbar a
realização do comício", disse que, dentro de associações de
cúpula, de classes convervadoras, "levantou-se voz contra o
presidente pelo crime de defender o povo contra os que o
exploram nas ruas, em seus lares, movidos pela ganância".
Passou, em seguida, a pregar a reforma da Constituição que
tachou de "inadequada, porque legaliza uma estrutura sócio-
econômica já superada, injusta e desumana". Ao anunciar que
acabava de subscrever o decreto da SUPRA, declarou que
"ele não é a reforma agrária pela qual lutamos, ainda não é a
carta de alforria do camponês abandonado", acrescentando
que "reforma agrária com pagamento prévio do latifúndio
improdutivo, à vista e em dinheiro, não é reforma agrária, é
negócio agrário, que interessa apenas ao latifundiário".
Voltando a atacar a Carta Magna, fisou que "em todos os
países civilizados do mundo já foi suprimida do texto
constitucional, a parte que obriga, na desapropriação por
interêsse social, o pagamento em dinheiro". Revelou, ainda, o
Sr. João Goulart que vai promover "rigorosa e implacável
fiscalização dos exploradores" e advertiu: "Aquêles que
desrespeitam a lei, explorando o povo - não interessa o
tamanho de sua fortuna, nem o tamanho de seu poder, esteja
êle em Olaria ou na rua do Acre - hão de responder perante a
lei, pelo seu crime". Atacou a Associação Comercial e, ao
concluir, disse que os funcionários públicos, médicos e
engenheiros terão atendido suas reivindicações. (...)"
Diário de Notícias, 14 de março de 1964

"Guerra civil, fechamento do Congresso, constituinte e até


implantação da socialização crescente da economia do País
foram os elementos essenciais utilizados pelos oradores do
comício de ontem pelas reformas de base, do presidente João
Goulart ao deputado Leonel Brizola; do presidente da SUPRA
ao representante do CGT. O Sr. João Goulart antecipou o
quadro de rovolução civil, ao creditar àqueles que se opõem
às reformas um possível derramamento de sangue no País.
O deputado Leonel Brizola pediu o fechamento do
Congresso, seguido de constituinte e de plebiscito para as
reformas de base que o parlamento não terá votado ao cabo da
atual legislatura. O Sr. Miguel Arrais enfatizou o aspecto
"altamente significativo" da encampação das refinarias de
petróleo. E os demais oradores detiveram-se, entre as
reformas e a revolução. (...)
"Falando à Tribuna logo após o comício da Central, o
governador Carlos Lacerda acusou o Sr. João Goulart de ter,
desta vez, furado a barreira da Constituição, e conclamou o
Congresso a "levantar-se e defender o que resta da liberdade e
da paz neste País".
- O comício - declarou o Sr. Carlos Lacerda - foi um assalto à
Constituição, ao bolso e à honra do povo. O discurso do Sr.
João Goulart é subversivo e provocador, além de estúpido. O
pavor de perder o contrôle sobre as negociatas e escândalos
de toda a ordem, que abafa com a sua autoridade presidencial,
fê-lo perder a cabeça. Esse homem já não sabe o que faz. (...)"
Tribuna da Imprensa, 14 de maio de 1964

AS MANCHETES:
Concentração Servirá De Senda Para Invasão De Terras -
Comício Inicia Agitação -
1) Lavradores Mobilizados Para Invasões De Fazendas
2) Rebeliões Marcadas Para Eclodir Após Concentração
3) Conselho De Segurança Faz Levantamento Da Situação
O Comício Contra A Guanabara ( Tribuna da Imprensa )
1) O Discurso Do Sr. João Goulart, No Comício Da Central
Do Brasil, Deixou Claro Para Os Que O Ouviram Os Seus
Propósitos Espúrios De Continuísmo - Leonel Brizola Voltou
A Ser Cúmplice
2) Concentração Custou Trezentos E Cinqüenta Milhões De
Cruzeiros, Pagos Com Recursos Proporcionados Por
Autarquias - O Instituto Do Açucar Participou Com Duzentos
Milhões De Cruzeiros
3) Encampação Das Refinarias Foi Imposição De Brizola
Para Comparecer À Concentração Sindical
Pedido De Emenda À Constituição Tem Fins Continuístas
Pregação Contra O Congresso Provoca A Reação Parlamentar
Atmosfera Revolucionária No Ato Da Encampação E
Desapropriação
( Tribuna da Imprensa )
Estado Toma Conta De Refinarias E Vai A Latifúndios
Constituição Não Serve Mais ( Diário de Notícias )
Goulart Decreta A Desapropriação De Terras, Encampa
Refinarias E Pede Nova Constituição ( Jornal do Brasil )
Treze Oradores Falaram No Comício Das Reformas ( O
Globo )
No Comício De Ontem Na Central Do Brasil O Presidente
Formula O Seu Programa: Progresso Com Justiça e
Desenvolvimento Com Igualdade
( A Noite )
Pacto Do Povo Com Jango: Reformas A Qualquer Preço
( Diário Carioca )
47) Revolução de 1964 (1964)
"O Presidente da República sente-se bem na ilegalidade. Está
nela e ontem nos disse que vai continuar nela, em atitude de
desafio à ordem constitucional, aos regulamentos militares e
ao Código Penal Militar. Êle se considera acima da lei. Mas
não está. Quanto mais se afunda na ilegalidade, menos forte
fica a sua autoridade. Não há autoridade fora da lei. E, os
apelos feitos ontem à coesão e à unidade dos sargentos e
subordinados em favor daquele que, no dizer do próprio,
sempre estêve ao lado dos sargentos, demonstra que a
autoridade presidencial busca o amparo físico para suprir o
carência de amparo legal.
Pois não pode mais ter amparo legal quem no exercício da
Presidência da República, violando o Código Penal Militar,
comparece a uma reunião de sargentos para pronunciar
discurso altamente demagógico e de incitamento à divisão das
Forças Armadas. (...)"
Jornal do Brasil, 31 de março de 1964

"Quem chegasse às 8h30m da noite de ontem ao Edifício do


Jornal e da Rádio Jornal do Brasil não poderia entrar pois
encontraria na porta, metralhadora em punho, um fuzileiro
naval. E se olhasse pela parede de vidro dos estúdios da Rádio
teria a impressão de assistir a um filme de gangsters: quatro
outros fuzileiros, comandados pelo Tenente Arinos, moviam-
se como gorilas pelo estúdio, seus movimentos tolhidos pelas
metralhadoras que ameaçavam microfones, painéis de
instrumentos e os funcionários, estupefatos com aquela
irrupção de selvajaria tecnológica em plena Avenida Rio
Branco.
Era o Brasil regredindo ao estado de republiqueta latino-
americana. Os fuzileiros navais, ao chegarem, dispararam
dois tiros para o ar diante do prédio e entraram de
metralhadoras em punho, pistolas na cinta, até o 5o andar.
Tinham ordem de quem? indagamos. Do Ministro da
Marinha, disseram. Onde está a ordem? Era verbal. Da Rádio,
o Tenente telefonou a um Almirante, sem lhe dizer o nome. O
prédio era muito grande, disse. Precisavam reforços.
Deixaram dois de guarda na Rádio, outro na porta da rua e
foram em busca dos tais reforços, sem dúvida para ocuparem
todas as dependências do Jornal do Brasil.
Mas deve estar em desespêro o Govêrno do Sr. João Goulart.
Dentro de meia hora, em lugar dos reforços, veio a ordem de
retirar. Amontoados no elevador, capacetes na cabeça,
metralhadoras se entrechocando e se apoiando nas costelas
dêles próprios, desceram. E passaram diante de populares
boquiabertos, na calçada da rua.
Quem humilha assim os bravos Fuzileiros Navais da Marinha
do Brasil? Quem os transforma primeiro em gangsters
violentos e os faz evacuar em seguida, confusos, um pugilo de
homens envergonhados sob o pêso de tanto material bélico?
Quem estimula a indisciplina de marujos e fuzileiros e depois
os transforma em bandidos e em seguida em pobres diabos
pilhados em flagrante?
A partir de 13 de março o Sr. João Goulart tem injuriado
muitos, em muito pouco tempo. Agora, ao que tudo indica, já
lhe resta muito pouco tempo para injuriar quem quer que
seja."
Ao primeiro minuto de hoje teve início a greve geral em todo
o país, por determinação do Comando Geral dos
Trabalhadores e em apoio ao Presidente João Goulart,
paralisando de imediato os trens da Central do Brasil e da
Leopoldina, o Pôrto de Santos e os bondes da Guanabara,
com a adesão de universitários.
A decisão da greve foi precipitada pela prisão ontem, no
Sindicato dos Estivadores, de vários lideres sindicais pela
Polícia Política da Guanabara. A Federação Nacional dos
Marítimos, que decretou a greve ontem à noite, denunciou o
desaparecimento de quatro estivadores, um líder sindical de
Vitória e do Dr. Antônio Pereira Filho, líder dos bancários.
O Partido Comunista Brasileiro responsabilizou ontem os
grupos radicais pela precipitação da crise política, tachando
de imprudente a tática utilizada por líderes extremados. Acha
o PCB que tal atitude conduzirá à união do centro contra a
direita, neutralizando assim a ação dos setores mais
moderados da esquerda, e que, no seu entender, levará à
deposição do Presidente da República, com lastro na opinião
pública."
O Governador Carlos Lacerda, embora tenha dito ao seu
Secretariado que não acredita na crise nacional, montou um
esquema de segurança para o Palácio Guanabara e para as
ruas a êle adjacentes, com a qual pretende resistir contra
qualquer intervenção federal no Estado da Guanabara.
Às três horas de hoje o Palácio Guanabara deu nota oficial
informando que os fuzileiros para lá se dirigiram e chamava o
povo para defender o Governador.
Cêrca de 500 homens da Polícia Militar, sob a ordem direta
do Secretário de Segurança, General Salvador Mandim, são
empregados na defesa do Palácio do Govêrno. Barricadas
foram construídas com sacos de areia e os militares
permanecem em regime de prontidão."
Jornal do Brasil, 1 de abril de 1964

"A Nação não mais suporta a permanência do Sr. João


Goulart à frente do Govêrno. Chegou ao limite a capacidade
de tolerá-lo por mais tempo. Não resta outra saída ao Sr. João
Goulart senão a de entregar o Govêrno ao seu legítimo
sucessor. Só há uma coisa a dizer ao Sr. João Goulart: saia.
Durante dois anos o Brasil agüentou um Govêrno que
paralisou o seu desenvolvimento econômico, primando pela
completa omissão, o que determinou a completa desordem e a
completa anarquia no campo administrativo e financeiro.
Quando o Sr. João Goulart saiu de seu neutro período de
omissão foi para comandar a guerra psicológica e criar o
clima de intranqüilidade e insegurança que teve o seu auge na
total indisciplina que se verificou nas Forças Armadas.
Isso significou e significa um crime de alta traição contra o
regime, contra a República, que êle jurou defender.
O Sr. João Goulart iniciou a sedição no país. Não é possível
continuar no poder. Jogou os civis contra os militares e os
militares contra os próprios militares. É o maior responsável
pela guerra fratricida que se esboça no território nacional.
Por ambição pessoal, pois sabemos que o Sr. João Goulart é
incapaz de assimilar qualquer ideologia, êle quer permanecer
no Govêrno a qualquer preço.
Todos nós sabemos o que representa de funesto uma ditadura
no Brasil, seja ela de direita ou de esquerda, porque o povo,
depois de uma larga experiência, reage e reagirá com tôdas as
suas fôrças no sentido de preservar a Constituição e as
liberdades democráticas.
O Sr. João Goulart não pode permanecer na Presidência da
República, não só porque se mostrou incapaz de exercê-la
como também porque conspirou contra ela como se verificou
pelos seus últimos pronunciamentos e seus últimos atos.
Foi o Sr. João Goulart quem iniciou de caso pensado uma
crise política, social e militar, depois de ter provocado a crise
financeira com a inflação desordenada e o aumento do custo
de vida em proporções gigantescas.
Qualquer ditadura, no Brasil, representa o esmagamento de
tôdas as liberdades como aconteceu no passado e como tem
acontecido em todos os países que tiveram a desgraça de vê-la
vitoriosa.
O Brasil não é mais uma nação de escravos. Contra a
desordem, contra a masorca, contra a perspectica de ditadura,
criada pelo próprio Govêrno atual, opomos a bandeira da
legalidade.
Queremos que o Sr. João Goulart devolva ao Congresso,
devolva ao povo o mandato que êle não soube honrar.
Nós do Correio da Manhã defendemos intransigentemente em
agôsto e setembro de 1961 a posse do Sr. João Goulart, a fim
de manter a legalidade constitucional. Hoje, como ontem,
queremos preservar a Constituição. O Sr. João Goulart deve
entregar o Govêrno ao seu sucessor, porque não pode mais
governar o país.
A Nação, a democracia e a liberdade estão em perigo. O povo
saberá defendê-las. Nós continuaremos a defendê-las."
Correio da Manhã, 1 de abril de 1964
"À partir da tarde de ontem, principalmente depois que
desceram os tanques da Vila Militar, dez dos quais foram
colocados em frente ao Ministério da Guerra, onde também se
encontram numerosos carros blindados e de combate, a crise
político-militar pareceu assumir aspectos realmente perigosos,
com a cidade sob o domínio de grande tensão e povo como
que à espera de uma revolução a qualquer momento.
Á margem dos preparativos da população como que para
prevenir-se, sacando nos bancos e adquirindo mantimentos,
ocorreram diversos incidentes entre populares e policiais, e
dos quais o de maior gravidade se verificou na Federação dos
Estivadores, na rua Santa Luzia. Á esta altura, em
consequência da paralisação dos trens da Central e da
Leopoldina, respectivamente, às 17h30m e às 19h30m, a
cidade parecia em colapso no setor de transportes, com
grandes filas se formando ao longo dos pontos de ônibus e
lotações para a Zona Norte e cidades fluminenses. As sédes
das ferrovias e os demais próprios federais passaram, então, a
ser guarnecidos por tropas do Exército. A tensão crescia à
medida que circulavam as notícias sôbre a situação em Minas,
onde já se teria iniciado a revolução. Tôda Minas,
principalmente a capital e cidades como Governador
Valadares e Juiz de Fora, já anteriormente agitadas, estavam,
segundo os comentários, "pegando fogo". As rodas de
populares discutindo política se formavam e não eram poucos
os incidentes registrados entre os mais exaltados."
"A perspectiva mais alarmante da situação brasileira funda-se
num dado concreto que não é possível obscurecer. É o fato de
que jamais em nossa História, e até o presente, as esquerdas
radicais - nomeadamente o comunismo e suas clássicas
correntes auxiliares - estiveram tão à vontade, desfrutaram
tanto prestígio e aproximaram-se tanto do êxito quanto no
momento atual.
Por mais que negaceie, tergiverse e dissimule, o Sr. João
Goulart, ninguém poderá negar - porque está à vista de todos,
porque é público e ostensivo - que os elementos chamados de
"formação marxista" não somente conseguiram infiltrar-se
fàcilmente em todos os postos, como também são os
preferidos pelo govêrno para êsses postos, sobretudo os de
comando e de direção.
Atualmente, no presente govêrno, que ainda se diz democrata,
a ideologia marxista e mesmo a militância comunista
indisfarçada constituem recomendação especial aos olhos do
govêrno. Como se já estivéssemos em pleno regime
"marxista-leninista", com que sonham os que desejam incluir
sua pátria no grande império soviético, às ordens do Kremlin.
(...)"
Diário de Notícias, 1 de abril de 1964

"Enquanto o Congresso Nacional iniciava, em plena


madrugada, em Brasília, a votação do "impeachment" do Sr.
João Goulart, homiziado no sul, numa sessão tumultuada pela
oposição do PTB, que ameaçava ir até o esfôrço físico para
impedir o debate da matéria, o general Amauri Kruel chegava
a São Paulo para conferenciar com o governador Ademar de
Barros e ultimar os preparativos para os deslocamentos das
tropas que deverão seguir para o Rio Grande do Sul a fim de
esmagar o último foco de rebelião concentrado em Pôrto
Alegre, sob o comando do Sr. João Goulart e Leonel Brizola.
Ao mesmo tempo, deverão ser abastecidos, hoje, em Santos,
os três navios da esquadra, Tamandaré, Pará e Amazonas, que
segundo se anuncia, sob o comando geral do almirante Sílvio
Heck, rumam para o sul a fim de cooperar no completo
esmagamento dos insurretos.
Ao mesmo tempo, por ordem do Sr. Ademar de Barros,
começa hoje em São Paulo, o racionamento de gasolina
fixado em 70% para as indústrias e transportes coletivos e, em
30% para os carros particulares. A medida vai afetar
profundamente o abastecimento de Brasília uma vez que o
govêrno do Estado requisitou todos os estoques que transitam
em direção à capital federal."
Diário de Notícias, 2 de abril de 1964

"Escorraçado, amordaçado e acovardado deixou o poder


como imperativo da legítima vontade popular o sr. João
Belchior Marques Goulart, infame líder dos comuno-
carreiristas-negocistas-sindicalistas. Um dos maiores gatunos
que a história brasileira já registrou, o Sr. João Goulart passa
outra vez à história, agora também como um dos grandes
covardes que ela já conheceu.
Temos o direito de dizer tudo isso do Sr. João Goulart porque
não lhe racionamos os adjetivos certos, por mais contundentes
que fossem, na hora em que êle dominava o poder, e posava
de líder todo-poderoso da Nação. Como não nos intimidamos
na hora em que Jango e os comunistas estavam por cima e
amargamos até cadeia, não precisamos nem fazer a
demagogia da generosidade. Mesmo porque nào pode haver
generosidade nem contemplação com canalhas. E Jango,
Jurema, Assis Brasil, Arraes, Dagoberto, Darcy Ribeiro,
Waldir Pires e toda a quadrilha que assaltou o poder não
passam de canalhas.
E além de canalhas, covardes. E além de covardes, cínicos. E
além de cínicos, pusilâmines. E além de pusilâmines,
desonestos. Bravatearam, fingiram-se machões, disseram que
fariam isto e aquilo, mas aos primeiros tiros sairam correndo
espavoridos e ainda estão correndo até agora. Alguns, como
Aragão, como Assis Brasil, como Crisanto de Figueiredo,
como Arraes, como Cunha Melo, como todo o rebotalho
comunista, não serão encontrados tão cedo. (...)
Nunca se viu homens tão incapazes, tão desonestos e tão
covardes. Agora que o País se livrou do fantasma da
comunização podemos repetir o que vinhamos dizendo
exaustivamente: todo comunista é covarde e mau caráter. Os
episódios de agora vieram provar que estávamos cobertos de
razão. (...)
O Povo brasileiro lavou a alma. O Carnaval que se
comemorou ontem em plena chuva só poderia mesmo ter sido
feito por um povo que estava precisando dessa desforra que
lhe era devida precisamente há 30 meses. O povo que
comemorou ontem a queda de jango foi o mesmo que votou
contra êle em 1960 e foi traído pela renúncia de Jânio. A
comemoração de hoje é pois uma revanche e uma
recuperação.
Precisamos agora de organizar o mais ràpidamente possível o
nôvo govêrno, pois os aproveitadores de sempre já cerram
fileiras em tôrno dos cargos, já se apresentam como os heróis
de uma batalha que não travaram. Junto com a organização do
nôvo govêrno temos que providenciar, também urgentemente,
para que os direitos políticos dos que foram ontem
legitimamente banidos pelo povo, sejam cassados para
sempre. (...)
Não se trata de vingança, nem estamos aqui defendendo o
esquartejamento dos derrotados. Mas quando o destino do
País está em jôgo, quando se trata de decidir da sorte dos que
queriam comunizar o País, não podemos ser generosos ou
sentimentais. Para os civis, cassação dos direitos políticos.
Para os militares como Assis Brasil, Crisanto, Cunha Melo,
Napoleão Nobre, Castor da Nóbrega e para todos os comuno-
carreiristas das Fôrças Armadas, o caminho é um só e
inevitável: a reforma pura e simples. Não falavam tanto em
reforma? Pois apliquemos a fórmula a êles.
Enfim, começa hoje uma nova era para o Brasil. Confiemos
no espírito público dos homens que salvaram a democracia
brasileira, e no discernimento e superioridade com que o
marechal Dutra se conduzirá nos próximos 22 meses."
Tribuna da Imprensa, 2 de abril de 1964

"O Sr. Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados,


poderá assumir ainda hoje a Presidência da República, em
virtude do que dispõe o artigo 79 parágrafo 2o da Contituição,
que declara: - Vagando os cargos de Presidente e Vice
Presidente da República, far-se á eleição 60 dias depois de
abertas a última vaga. Se as vagas ocorrerem na segunda
metade do período presidencial, a eleição para ambos os
cargos será feita 30 dias depois da última vaga, pelo
Congresso Nacional, na forma estabelecida em lei. Em
qualquer dos casos, os eleitos deverão completar o período
dos seus antecessores.
Em consequência, o Sr. Ranieri Mazzilli deverá exercer a
Presidência até a posse do novo presidênte, a ser eleito no dia
1o de maio próximo pelo Congresso Nacional."
"Em face da absoluta normalidade reinante na cidade com a
cessação dos motivos que a determinaram, terminou à zero
hora de hoje a greve geral decretada terça-feira.
Todos deverão retornar tranqüilamente ao trabalho, evitando,
contudo, aglomerações públicas nas ruas.
Sòmente os bancos ainda permanecerão fechados, hoje e
amanhã, em virtude de decreto."
"Brasília, 1o - Até às 22 horas de hoje o Sr. João Goulart
ainda se encontrava na Granja do Torto, nesta capital, em
companhia de sua espôsa e filhos.
No aeroporto militar, achava-se, pronto para decolar a
qualquer instante um "Coronado", moderno jato da Varig, que
tanto poderia se dirigir para Buenos Aires como para a
Espanha, segundo afirmam fontes ligadas à família
presidencial.
Após chegar a Brasília, às 15 horas, o Sr. João Goulart estêve
no Palácio do Planalto uns 15 minutos, fechado em seu
gabinete, retirando-se depois para a Granja do Torto, onde
recebeu poucas pessoas, uma delas o deputado Ranieri
Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados. Pessoas, que
privam com o Sr. Mazzilli, afirmam que êste ouviu do Sr.
João Goulart a declaração de que, antes de partir de Brasília,
lhe transmitiria o cargo de Presidente da República. Outras
fontes adiantam que o Sr. João Goulart, durante a tarde,
estêve redigindo o documento de renúncia, que será enviado
ao Congresso de Pôrto Alegre, para onde irá nas próximas
horas."
"Pôrto Alegre, 1o - O Sr. João Goulart, cêrca das 23 horas,
chegou a esta capital em companhia de sua família e do Sr.
darci Ribeiro. Antes de embarcar em Brasília, o Sr. João
Goulart conferenciou novamente com o Presidente Ranieri
Mazzilli." (...)
"Às treze horas o Sr. João Goulart deixava o Rio, indo para
Brasília e, pouco depois, a Cadeia da Liberdade anunciava
que o Sr. Goulart havia partido nim avião da Varig para
destino ignorado. Todos os comandos militares haviam
aderido ás tropas do general Castelo Branco. Em recife
soldados do IV exército cercaram o Palácio do Governador e
prenderam o Sr. Miguel Arrais, por ordem do general Justino
Alves.
O ministro Lafaiete de Andrade enviou emissário a Minas
para decretar solidariedade ao Supremo Tribunal Federal à
revolução.
Às 16 horas, foi lida esta ordem, firmada pelo general Castelo
Branco:
"Que as tropas do I Exército cessem todas as operaçòes e
voltem aos quartéis".
Era o fim da resistência e a vitória da Revolução.
As autoridades civis e militares estão lembrando a tôda a
população que estão em vigor as leis e os códigos. Os
culpados por atos condenáveis serão punidos. Aconselham
que a população se abstenha de participar de aglomerações e
movimentos coletivos. Avisam ainda que a normalidade
voltou ao País e cessaram, imediatamente, todos os
movimentos grevistas."
"Dezenas de automóveis trafegaram pelo centro da cidade,
tocando suas businas, em sinal de alegria pela vitória da
democracia em todo o País. As estações de rádio e televisão,
que estavam sob censura, iniciaram suas transmissões
normais, pouco depois das 17 horas. Os contingentes de
fuzileiros navais que ocupavam as redações de alguns jornais,
foram recolhidos aos quartéis.
Por volta das 17,15, o Forte de Copacabana anunciava, com
uma salva de canhão, a aproximação das tropas do general
Amauri Kruel, que atingiria o Estado da Guanabara às últimas
horas da noite de ontem.
A população de Copacabana saiu ás ruas, em verdadeiro
Carnaval, saudando as tropas do Exército. Chuvas de papéis
picados caíam das janelas dos edifícios enquanto o povo dava
vazão, nas ruas, ao seu contentamento. (...)"
O Dia, 2 de abril de 1964

"Montevidéu - O Sr. João Goulart é esperado neste páis com


honras de Chefe de Estado - é o telegrama da "United Press
International" distribuído, ontem, aos jornais brasileiros.
Grande número de parlamentares e jornalistas se dirigiu ao
Aeroporto de Carrasco momentos após ter a Rádio
Farroupilha, do Rio Grande do Sul, anunciado apêlo do
presidente deposto no sentido de que cessasse a resistência
"para evitar derramamento de sangue".
Decidiram as autoridades uruguaias que o presidente deposto
seja recebido com honras de Chefe de Estado. Diz mais o
telegrama da agência norte-americana que a fronteira está
patrulhada por fôrças leais ao Sr. João Goulart. Está garantido
qualquer pedido de asilo, para tanto, sido enviadas tropas
uruguaias à linha demarcatória dos dois países.
Um destróier uruguaio foi enviado para as proximidades da
costa brasileira, prevendo-se a possibilidade de conflitos na
fronteira, onde as guarnições continuam leais ao presidente
deposto.
O Legislativo reuniu-se, extraordinariamente, para discutir a
oportunidade de enviar uma mensagem ao Brasil. Ante a
discussão não decisiva, entre as facções favoráveis e
contrárias, foi suspensa a sessão. (ANSA - UPI - DC)
Até o momento de encerrármos os trabalhos desta edição não
havia confirmação oficial da chegada do Sr. João Goulart a
Montevidéu. Não se confirmaram, igualmente, as notícias de
que o presidente Goulart havia se dirigido cara a capital
Paraguaia, Assunção. Notícias de Pôrto Alegre informavam,
entretanto, que Jango havia deixado aquela cidade na tarde de
ontem."
"Dando por encerrada a "Rêde da Legalidade", às 13 horas de
ontem, o prefeito de Pôrto Alegre, Sr. Sereno Chaise, leu a
nota oficial alusiva ao ato, salientando em certo trecho que o
presidente João Goulart, ao transitar pela capital sulina,
dispensara o sacrifício da população gaúcha e de todo o Brasil
na resistência ao movimento que o derrubara do poder.
É o seguinte, na íntegra, a nota: "Ás primeiras horas de hoje,
o presidente João Goulart chegou a Pôrto Alegre. Depois de
ficar algum tempo, seguiu viagem. Antes examinou, com
autoridades militares, amigos e correligionários, as condições
de resistir ao processo golpista e decidiu dispensar o sacrifício
do povo gaúcho e brasileiro.
O deputado Leonel Brizola pede ao povo gaúcho e brasileiro,
a todos os patriotas, que enfrentem com serenidade e calma
esta difícil passagem.
Encerramos a "Rêde da Legalidade", agradecendo a todo o
povo gaúcho e brasileiro que compareceu em massa à sede da
Prefeitura de Pôrto Alegre para resistir contra os golpistas.
Fizemos tudo para manter a legalidade."
"Confirmando que o esquema do golpe estava montado há
algum tempo, o general Olímpio Mourão Filho, já nomeado
pelo ministro da Guerra presidente da Petrobrás, falou, ontem,
à imprensa, do gabinete do general Costa e Silva.
Afirmou aquêle militar que antes de iniciar sua marcha teve
de realizar três operações: silêncio, gaiola e Popay. A
primeira consistiu em articular todo o movimento para que
não pudesse ser fracassada a marcha do Exército
revolucionário, a segunda para propiciar o clima de
tranqüilidade do povo, prendendo os líderes que atuavam nas
massas trabalhadoras e, a terceira, operação guerra.
As declarações do novo presidente da Petrobrás foram
assistidas por vários chefes militares e personalidades do
mundo politico-militar.
"Se não ocorresse a prisão dos líderes sindicais - afirmou -
nós teríamos a marcha dificultada, pois não conseguiríamos
rapidamente o apoio maciço dos companheiros".
O general Olímpio Mourão disse também que "saímos para
lutar, prontos para qualquer situação. Felizmente, em lugar do
primeiro tiro, encontramos os abraços dos nossos
companheiros de farda, porque êles pensavam como
nós" (...)"
Diário Carioca, 3 de abril de 1964

AS MANCHETES:
Reincidência ( Jornal do Brasil )
"Gorilas" Invadem O JB ( Jornal do Brasil )
Fora! ( Correio da Manhã )
Carros Blindados Na Rua Deixam Povo Sob Tensão ( Diário
de Notícias )
Grave Perspectiva ( Diário de Notícias )
Marinha Caça Goulart ( Diário de Notícias )
Democratas Assumem Comandos Militares -
1) Costa E Silva Nomeado Para Pasta Da Guerra 2) I Exército
Tem Ururaí Como Comandante 3) General Taurino Na
Primeira Região Militar
Pela Recuperação do Brasil ( Tribuna da Imprensa )
Revolução Terminou Sem Derramamento De Sangue - Jango
Em Pôrto Alegre
Magalhães Pinto Deu A Arrancada Final Contra A
Comunização Do País
Mazzilli Poderá assumir Ainda Hoje A Presidência Da
República
Terminou A Greve Geral - UNE Incendiada ( O Dia )
Uruguai Espera Jango Como Chefe De Estado ( Diário
Carioca )
Goulart Dispensou O Sacrifício Do Povo Brasileiro ( Diário
Carioca )
Mourão: Golpe Estava montado E Prisão De Líderes Ajudou
Muito
( Diário Carioca )
48) Edson Luis (1968)
"A preparação de uma passeata de protesto, que se realizaria
hoje, contra o mau funcionamento do restaurante do
Calabouço, cujas obras ainda não terminaram, foi a causa da
invasão daquele estabelecimento, por choques da Polícia
Militar, e que resultou no massacre de alunos e na morte do
estudante Edson Luís Lima Souto, assassinado com um tiro
de pistola calibre 45, pelo tenente Alcindo Costa, que
comandava o Batalhão Motorizado da PM do local.
Os estudantes foram surpreendidos com a invasão policial,
tendo os soldados disparado rajadas de metralhadoras
enquanto o tenente que comandava o choque gritava pelo
megafone "parem de atirar, eu não dei ordem para ninguém
atirar". Logo depois, o mesmo oficial sacou sua arma e fêz os
disparos, um dos quais atingiu Edson Luís Lima Souto. O
corpo de Edson ainda foi levado para a Santa Casa, na Rua da
Misericórdia. Ali, o médico Luís Carlos Sá Fortes Pinheiro
anunciou que o aluno já estava morto. Seus colegas, em
seguida, levaram-no para o saguão da Assembléia Legislativa,
onde se formou uma fila de populares para velar o corpo, em
meio a violentos discursos de vários líderes políticos.
O massacre policial continuou após a morte de Edson Luís
Lima Souto e outros estudantes e curiosos foram feridos por
estilhaços de granadas e bombas de gás lacrimogêneo
indistintamente. (...)"
"Estudantes reuniram-se, ontem, no Calabouço, para protestar
contra as precárias condições de higiene do seu restaurante.
Protesto justo e correto. O Correio da Manhã, nesta mesma
página, já condenou a inércia em que o Estado vem-se
mantendo diante das reiteradas reivindicações estudantis.
Apesar da legitimidade do protesto estudantil, a Polícia
Militar decidiu intervir. E o fêz à bala. Há um estudante (18
anos) morto, um outro (20 anos) em estado gravíssimo. Um
porteiro do INPS, que passava perto do Calabouço, também
tombou morto. Um cidadão que, na Rua General Justo,
assistia, da janela de seus escritório, ao selvagem atentado,
recebeu um tiro na bôca. Êste o saldo da noite de ontem. Não
agiu a Polícia Militar como força pública. Agiu como bando
de assassinos. Diante desta evidência cessa tôda discussão
sôbre se os estudantes tinham ou não razão - e tinham. E
cessam os debates porque fomos colocados ante uma cena de
selvageria que só pela sua própria brutalidade se explica.
Atirando contra jovens desarmados, atirando a êsmo,
ensandecida pelo desejo de oferecer à cidade apenas mais um
festival de sangue e morte, a Polícia Militar conseguiu coroar,
com êsse assassinato coletivo, a sua ação, inspirada na
violência e só na violência. Barbárie e covardia foram a
tônica bestial de sua ação, ontem. O ato de depredação do
restaurande pelos policiais, após a fuzilaria e a chacina, é o
atestado que a Polícia Militar passou a si própria, de que sua
intervenção não obedeceu a outro propósito senão o de
implantar o terror na Guanabara. Diante de tudo isto, depois
de tudo isto, é possível ainda discutir alguma coisa? Não, e
não. (...)"
Correio da Manhã, 29 de março de 1968

"A morte do estudante Édson Luís de Lima Souto, de 16 anos


- baleado no peito, às 18h30m de ontem, durante um coflito
da PM com estudantes no Restaurante do Calabouço -
provocou a greve geral de várias Faculdades do Rio e o
movimento deverá estender-se pelo País. O corpo da vítima,
que está sendo velado na Assembléia Legislativa, sairá às 16
horas de hoje para o Cemitério São João Batista.
Os acontecimentos agitaram a sessão noturna da Câmara dos
Deputados onde o Sr. Lurtz Sabiá pediu que o Congresso
fique em sessão permanente, e o Deputado Brochado da
Rocha sugeriu que as duas Casas do Congresso se
transformassem em Comissão Geral para investigar os fatos
ocorridos no restaurante dos estudantes. O Congresso
Nacional e a Assembléia Legislativa da Guanabara
decretaram luto. O Ministro da Justiça, Sr. Gama e Silva, saiu
de Brasília e voltou ontem à noite ao Rio.
O Governador Negrão de Lima, numa reunião de mais de
duas horas com o Secretário de Segurança, General Dario
Coelho, e outras autoridades, no Palácio Guanabara, decidiu
afastar o General Osvaldo Niemeyer da Superintendência da
Polícia Executiva, para que os acontecimentos sejam
apurados com tôda a isenção. Ficou também decidida a
instauração imediata de inquérito policial a ser orientado por
um membro do Ministério Público.
Todos os estabelecimentos de ensino do Estado não
funcionarão hoje em sinal de pesar pela morte de Édson Luís,
por determinação do Sr. Negrão de Lima. Alguns teatros do
Centro e da Zona Sul, que estavam funcionando quando se
verificou o atrito entre a PM e os estudantes, suspenderam os
espetáculos em sinal de solidariedade - e o público, ao ser
inteirado do motivo, aplaudiu de pé.
O Sr. Carlos Lacerda não se alterou ao receber, em São Paulo,
a notícia da morte do estudante. Êle falava no Painel de
Debates da Assembléia Legislativa de São paulo, promovido
pelo MDB, quando recebeu um bilhete sôbre os
acontecimentos do Rio. Fêz uma pausa no discurso, leu o
comunicado e declarou: "Não acredito que o Sr. Negrão de
Lima seja o responsável". Em seguida, prosseguiu no seu
pronunciamento.
Na Câmara Federal, as galerias ficaram lotadas de estudantes,
que aplaudiram sucessivos pronunciamentos dos deputados da
Oposição. O presidente do Congresso, Sr. Pedro Aleixo,
ameaçou várias vêzes de mandar retirar os manifestantes. Em
defesa do Govêrno - sempre atacado pela Oposição - falou
apenas o Sr. Último de Carvalho. Leu um texto oficioso,
afirmando que já estava prevista, há algum tempo, a passeata
dos estudantes, "empunhando as bandeiras do Brasil e do
Vietcong".
Há, por enquanto, duas versões para o atrito de ontem à noite
no restaurante dos estudantes: 1) estes jantavam,
pacificamente, enquanto outros assistiam a uma aula, quando
um choque da PM, chefiado por um tenente de nome Alcindo
ou Costa, invadiu o restaurante e iniciou o espancamento, ao
qual os estudantes reagiram com pedradas que, por sua vez,
provocaram tiros; 2) os estudantes teriam sido colhidos pela
PM, em plena manifestação contra o atraso na conclusão das
obras do restaurante.
Além do estudante morto, do outro ferido a tiro e de vários
espancados pela PM, houve mais uma vítima: o comerciário
Telmo Matos Henriques, ferido na bôca por uma bala quando
estava à sua mesa de trabalho, numa firma próxima. O choque
da PM retirou-se do restaurante desfechando tiros para o ar - e
na passagem por uma galeria deixou nas paredes marcas de
balas que, segundo testemunhas, seriam de metralhadoras.
O estudante Édson Luís foi conduzido pelos companheiros, à
Santa Casa de Misericórdia, onde, constatada a sua morte,
iniciou-se o cortêjo rumo à Assembléia Legislativa. O corpo
foi erguido nos braços da multidão que entoava o brado
"polícia assassina" ao dar entrada na Assembléia. Ali houve,
durante a noite, vários comícios estudantis, de protesto
violento contra o Govêrno - e uma multidão postou-se, até à
madrugada, na expectativa dos acontecimentos.
Em visita à Assembléia, o General Niemeyer defendeu os
policiais. Indagado por que a polícia atirara, respondeu:
- A polícia estava inferiorizada em potência de fogo.
- Potência de fogo? É arma?
- É tudo aquilo que nos agride. Era pedra."
Jornal do Brasil, 29 de março de 1968.
"A ordem era "quebrar tudo" e foi cumprida. A PM cercou o
Calabouço; depois, houve a invasão e o massacre. A
princípio, foram os cassetetes; a seguir, os revólveres. O
ataque só foi suspenso quando havia um morto no chão:
Nelson Luís Lima, uma bala no coração. Outro estudante -
Benedito Frasão Dutra, 20 anos - escapou com vida, fingindo-
se de morto. Sèriamente ferido, foi conduzido pelos
companheiros juntamente com o corpo do estudante-mártir,
até o saguão da Assembléia Legislativa. As violências nào
terminaram: a ordem era prender. Mais tarde vieram as
bombas de gás lacrimogenio e o número de feridos
multiplicou-se.
O massacre virou crise. O Sr. Negrão de Lima reuniu-se com
todos os auxiliares. SNI presente. Aulas de hoje estão
suspensas. Luto é geral: escolas, diretórios, a própria
Assembléia. O general Osvaldo Niemeyer foi afastado;
determinou-se abertura de inquérito. Parlamentares pediram a
queda de tôda a cúpula da PM. A camisa do jovem morto foi
erguida como estandarte por seus colegas: o protesto
continua. Os diretórios acadêmicos de tôdas as faculdades
decretaram greve geral e marcaram assembléia para hoje. Os
teatros da Guanabara fecharam e os artistas hipotecaram
solidariedade aos estudantes, ficando em luto oficial durante
três dias. Pedido o afastamente de Dario Coelho. O
governador mandou prender o tenente assassino. O
sepultamento será às 16 horas, no Cemitério de São João
Batista, por conta do Estado."
" "Vão lá e quembram tudo": a ordem do comandante do
choque foi cumprida e, minutos depois, no Calabouço, usando
revólveres e cassetetes, a Polícia Militar iniciou o massacre
dos estudantes, só parando de bater quando já havia um morto
- Nélson Luís de Lima Souto, 16 anos - e vários feridos, a
bala, a socos e a coronhadas.
Os jovens estavam reunidos no restaurante, quando foi
ordenado o cêrco - seis carros da PM fechando tôdas as saídas
- e, logo que os policiais abandonaram suas posições, os
moços saíram em direção à Assembléia, levando nos braços
um companheiro morto e outro agonizante, para a
manifestação de protesto, até a madrugada.
Às 18 horas de ontem, cêrca de 600 estudantes reuniam-se no
Calabouço, esquematizando a passeata em que reivindicariam
a conclusão das obras do restaurante e do Instituto
Cooperativo de Ensino. De repente, surgiram os carros da PM
e o cêrco foi feito: dois na frente do prédio, quatro atrás. Às
18h30m, os policiais avançaram, em direção à entrada do
restaurante. Quando ocorreu a invasão, os estudantes
procuraram defender-se, usando pedras e sacos de areia.
Começaram os disparos: os soldados da PM atiravam para o
alto, de início, mas logo passaram a acionar suas armas em
tôdas as direções, tanto que chegaram a atingir um
comerciário que assistia a tudo, da janela de uma firma
comercial. Nélson Luís de Lima Souto foi o primeiro a cair:
uma bala no coração derrubou-o na hora. Logo depois, outro
estudante recebia dois tiros: no braço e na cabeça. Só então
veio a ordem do comandante do choque: iniciar a retirada.
(...)"
Diário de Notícias, 29 de março de 1968

"O fuzilamento de estudantes no Calabouço, que provocou a


morte do menor Nelson Luiz Lima Souto, levou o governador
Negrão de Lima a demitir o general Oswaldo Niemeier
Lisboa do cargo de Superintendente da Polícia Executiva,
como primeiro passo visando a que o inquérito que vai apurar
os responsáveis pelo massacre "não fique sòmente no âmbito
policial". Vários outros feridos, entre populares que assistiam
às manifestações, estudantes e jornalistas foram medicados no
Pronto Socorro, uns atingidos pelos cassetetes dos Pms,
outros pelos estilhaços das bombas e balas.
Às 22 horas, o general José Horácio da Cunha Garcia,
comandante do I Exército, decretava a prontidão em tôdas as
guarnições da Guanabara. Os estudantes contrataram o
advogado Sobral Pinto como seu patrono no processo de
punição do autor ou autores da morte de Nelson Luiz.
Enquanto isso o governador Negrão de Lima lamentava a
violência policial e decretava luto oficial, hoje, em tôdas as
Escolas Públicas, com suspensão das aulas. O governador
acentuou também que os estudantes terão "toda a liberdade"
para fazer o entêrro de seu colega morto e, por sua ordem
direta, foram soltos os 14 estudantes presos nos incidentes.
O secretário de Imprensa da Presidência da República,
jornalista Heráclio Sales, decretou, em Brasília, que o
presidente Costa e Silva estava plenamente informado,
através do Ministério da Justiça, de tôdas as ocorrências na
Guanabara e que o Govêrno estava "adotando as providências
necessárias para a manutenção da ordem". Ontem, à noite,
veio de Brasília para o Rio, com instruções do titular da
Justiça, o coronel Florismar Campelo, diretor-geral do
Departamento Federal de Polícia, e hoje deverá chegar ao Rio
o ministro Gama e Silva.
Os estudantes não concordaram em que o corpo de Nelson
Luiz saísse da Assembléia Legislativa e a uma e meia da
madrugada foi feita a autópsia no local onde o estudante está
sendo velado. Em Belo Horizonte, universitários reunidos no
Centro Acadêmico Afonso Pena fizeram uma série de
protestos, com comícios no recinto da Faculdade de Direito.
Também os universitários da Faculdade de Direito do Estado
da Guanabara decretaram luto oficial por três dias e
propuseram às demais Faculdades o não comparecimento às
aulas, hoje, em sinal de protesto.
Os acontecimentos também tiveram pronta repercussão no
Congresso, que, reunido à noite, suspendeu o início da
discussão do chamado projeto dos ociosos, para que diversos
oradores abordassem a situação na Guanabara. O Sr. Raul
Brunini foi o primeiro orador, fazendo um relato das
ocorrências e condenando "o vandalismo e a covardia da
Polícia". O Sr. Mariano Beck falou em seguida, para
expressar a solidariedade gaúcha ao povo carioca, o mesmo
fazendo o Sr. Pereira Pinto, em nome da bancada do Estado
do Rio. Diversos outros oradores sucederam-se na tribuna,
inclusive o lider do MDB, deputado Mário Covas, que
responsabilizou diretamente o governador Negrão de Lima
pelos acontecimentos. A sessão se prolongou até às duas
horas da madrugada."
O Jornal, 29 de março de 1968
"O estudante Nelson Luis Lima Souto, de 17 anos tombou
com um tiro no coração quando a polícia militar invadiu o
Calabouço, na tarde de ontem, iniciando um massacre que
resultou em grande número de feridos e provocou um clima
de tensão em todo o centro da cidade. O comandante do
choque da PM, Tenente Alcindo, é acusado pelos estudantes
de ter assassinado Nélson a sangue-frio, encostando a arma
em seu peito. Grande área do aterro foi transformada em
campo de batalha, com os soldados da Polícia Militar
disparando armas de fogo contra os estudantes, que
denunciaram a participação de tropas da Aeronáutica,
utilizando metralhadoras."
"Três choques da PM e a guarnição de duas viaturas de
patrulha chegaram ao Calabouço no momento em que os
estudantes organizavam a passeata de protesto contra o
aumento de precos das refeições e a demora na conclusão do
restaurante. Auxiliados por uma tropa da Aeronáutica,
entraram no restaurante disparando suas armas e dois
estudantes cairam feridos: Benedito Frazão Dutra e Nélson
Lima Souto. Este morreu pouco depois, nos braços dos
companheiros. Outro tiro feriu o comerciante Talmo
Henrique, em seu escritório."
Última Hora, 29 de março de 1968

"Milhares de pessoas desfilaram, das 6 às 15 horas de ontem,


diante do corpo do estudante Nélson Luís Lima Souto, que foi
velado na saguão da Assembléia Legislativa depois da
autópsia feita pelo legista Nilo Ramos. O corpo estava
envolto na Bandeira Nacional e se achavam sôbre o peito dois
têrços, cravos e um caderno de Geometria, que pertencia ao
extinto. Um representante da Casa do Pará colocou sôbre o
corpo uma Bandeira do Pará, terra natal do estudante. Mais de
trinta coroas foram enviadas à Assembléia por estudantes
sindicais e estudantis.
Cêrca de vinte pessoas, das quais apenas um homem,
sofreram crises emocionais. Uma senhora idosa caiu em
prantos. Um aluno do Pedro II disse à reportagem: "Antes
havia greves e não matavam estudantes". A jovem Carmem
Santos Corrêa, que estava nos jardins da Cinelândia, teve mal
súbito, sendo medicada no Hospital Sousa Aguiar.
Cinco mil pessoas, aproximadamente, se aglomeravam em
frente à Assembléia, não se notando, nas proximidades,
policiais fardados, mas apenas agentes do DOPS e do SNI. O
trafégo foi desviado para a Avenida Rio Branco e Rua
evaristo da Veiga.
Até às 15 horas, os estudantes haviam recebido, de donativos,
três mil cruzeiros novos, que se destinarão à construção de
uma estátua, em homenagem ao morto, em frente ao
Restaurante Central dos Estudantes. o restante, segundo ficou
deliberado, seria enviado à família do estudante, em Belém do
Pará e custearia os funerais, pois foi recusado o oferecimento
do Govêrno estadual.
A Srta. Cléia Martins, prima, em segundo grau, de Nélson
Luís e também comensal do Restaurante Central, disse que
teve conhecimento da morte através do rádio.
Com a presença de milhares de pessoas, na grande maioria
estudantes, realizou-se, às 19h30m de ontem, no Cemitério de
São João Batista, o sepultamento do jovem Nélson Luís de
Lima Souto, abatido a tiro durante um conflito ocorrido no
Calabouço, quando membros da Cooperativa de Ensino
estavam reunidos para acertar detalhes visando à realização
de uma passeata de protesto.
O féretro deixou o recinto da Assembléia Legislativa, onde o
corpo foi velado, às 16h20m e seguiu por várias artérias da
cidade, onde ocorreram alguns incidentes sem gravidade. O
enórme número de acompanhantes atrasou sensívelmente o
entêrro, já que o caixão teve de permanecer por mais de uma
hora à porta do Cemitério, aguardando que a massa humana
fôsse retirada da frente.
Com colegas do morto revesando-se na condução da urna
mortuária, o cortejo fúnebre tomou a Avenida Beira-Mar,
seguindo, após, pela Praia do Flamengo, onde em frente ao
prédio da extinta UNE, um grupo de estudantes queimou uma
bandeira americana, usando da palavra na oportunidade, os
representantes da FUEG Flademir Palmeira e Luís Brito.
Na Praia de Botafogo, utilizando-se de pedras, os
participantes do féretro foram quebrando tôdas as lâmpadas
dos postes. Na Rua da Passagem pediram a dois guardas que
tirassem o quepi à passagem do corpo. Os policiais se
recusaram e os estudantes jogaram seus quepis longe, o que
quse originou nôvo conflito.
Cêrca de 18,20 horas, o cortejo aproximou-se do Cemitério
São João Batista, onde já se encontravam duas tias da vítima,
senhoras Virgília Souto e Enedina Souto Pauferro, esta última
espôsa do 1o Sargento da Aeronáutica Manuel Pauferro.
Dezenas de coroas, a maioria ofertadas por Diretórios
Estudantis, foram depositadas na quadra 14, em frente à
gaveta 602, última morada do jovem Nélson Luís. Os gritos
de "vingança" e de "assassinos" se sucediam, ao mesmo
tempo em que faixas eram desfraldadas. Entre elas
registramos uma dirigida às mulheres: "Senhoras, Nélson
poderia ser seu filho".
Às 19,10 horas o caixão alcançou a entrada da quadra 14, um
corredor com menos de dois metros de largura. Não pôde
porém aproximar-se da gaveta 602, situada ao fundo, pois a
massa humana invadiu o corredor, ansiosa por ocupar um
lugar privilegiado, onde pudesse acompanhar as últimas
homenagens que seriam prestadas ao estudante assassinado.
(...)
Dez minutos mais tarde, a urna com o cadáver de Nélson Luís
foi depositado na gaveta. Grupos de estudantes continuavam a
clamar pr vingança, enquanto rasgavam outra bandeira
americana, com o fogo quase chegando à multidão. (...)"
O Dia, 30 de março de 1968

AS MANCHETES:
PM Mata Estudantes Durante Invasão ( Correio da Manhã )
Assassinato ( Correio da Manhã )
Assassinato Leva Estudantes A Greve Nacional ( Jornal do
Brasil )
Polícia Mata Estudante ( Diário de Notícias )
A Ordem Era Quebrar Tudo: PM Acabou Massacrando
Estudante
( Diário de Notícias )
Negrão Demite Superintendente Da Polícia E Promete Apurar
Tudo
PM Fuzila Estudante No Cabouço ( O Jornal )
Polícia Mata Estudante - Morte No Calabouço - Uma Patrulha
Da PM Abriu Fogo Contra Os Estudantes No Calabouço -
Com Um Tiro No Coração Morreu O Jovem Nélson Lima
Souto De 17 Anos - Assembléia Reunida - O Corpo Do
Jovem Foi Para A Assembléia Legislativa, Que Se Reuniu
Em Sessão Permanente - A Tensão Deu Origem A Sucessivos
Incidentes - Negão Pune Culpados - O Governador Negrão
De Lima Reuniu O Secretariado E Afirmou Que A
Tranqüilidade Será Imediatamente Restaurada E Os Culpados
Punidos
( Última Hora )
PM Mata Estudante A Bala Na Rua ( Última Hora )
Nélson Morreu Nos Braços Dos Companheiros ( Última
Hora )
Milhares De Pessoas No Funeral Do Estudante ( O Dia )
49) Passeata dos Cem Mil (1968)
"Por seis horas, mais de 100 mil cariocas protestaram contra o
Govêrno, apoiando o movimento dos estudantes que,
conforme o previsto, foi sem incidentes, com dezenas
discursos de universitários, operários, professôres e padres,
que definiram "o compromisso histórico da Igreja com o
povo".
Com perfeito dispositivo de segurança, os estudantes
garantiram a realização da passeata, sem depredações,
chegando a prender e soltar um policial que incitava a que
fôsse apedrejado o prédio do Conselho de Segurança
Nacional. A concentração começou às 10 horas, com os
primeiros grupos de padres e estudantes, sem qualquer
policiamento ostensivo.
Entre os primeiros oradores estava o representante da Igreja,
ressaltando que "Calar os moços é violentar nossas
consciências". Presentes cêrca de 150 padres, inclusive o
bispo-auxiliar do Rio de Janeiro, Dom Castro Pinto, que
acompanhou a passeata, durante os 32 minutos de travessia da
Av. Rio Branco. Na Candelária, falou Wladimir Palmeira,
lembrando o assassinato do secundarista edson Luís, "que um
dia será vingado".
A manifestação seguiu para o Palácio Tiradentes onde houve
novos discursos, inclusive de um representante dos favelados,
o mais aplaudido, ao afirmar que agora êles também "estavam
na luta". No local foi queimada uma bandeira dos Estados
Unidos, um policial tentou prender Wladimir Palmeira, mas
não ocorreram incidentes. Ficou decidido dar o prazo de uma
semana ao Govêrno, para atender às reivindicações, entre elas
a de liberdade para todos os presos políticos. Marcaram
também para hoje, encontro de tôda a liderança estudantil,
com o objetivo de analisar os resultados.
Informou a Secretaria de Segurança que ninguém foi detido,
mas o DOPS prendeu cinco estudantes que destribuiam
panfletos. A Polícia Federal pediu ao CONTEL que proibisse
a exibição de filmes e transmissão de reportagens em rádio e
televisão que "mostrem tumultos em que se envolveram os
estudantes", e o governador Negrão de Lima, cercado por 100
soldados da PM, acompanhou, através de informações, todo o
movimento, declarando-se satisfeito com os rumos da
manifestação. (...)"
"A Guanabara ofereceu ontem ao Govêrno edificante
exemplo de maturidade política. Estudantes, professôres,
intelectuais, artistas, jornalistas, clero, pais e populares
realizaram na mais absoluta ordem sua manifestação. O
governador Negrão de Lima autorizou. Recolheu aos quartéis
a Polícia Militar e o DOPS. Entregou a segurança da Cidade
aos próprios manifestantes. Não houve incidentes. A ordem, a
propriedade privada, os próprios federais e estaduais, a vida
das pessoas foram assegurados. A primeira conclusão a
retirar-se dos fatos é a de que a repressão policial contra
atividades políticas legítimas é que gera os conflitos.
Dir-se-á que houve discursos radicais. Mas êsses discursos
não incitaram à desordem. Além disso, proferi-los é direito
garantido pela liberdade de pensamento. O importante não é
constatá-los, mas saber se incitaram ou não ao tumulto.
Ontem, não incitaram. Não tiveram sequer o respaldo de
faixas com os nomes de Guevara, Mao Tsé-tung e Ho Chi
Min, comuns nas manifestações estudantis em todo o mundo.
Elas foram substituídas por algo mais expressivo, para a
inteligência política do Govêrno: o veemente entusiasmo dos
que, não tendo descido às ruas, aplaudiram do alto dos
edificios os manifestantes, emprestando-lhes decidida
solidariedade.
Essa solidariedade significa voto de repulsa popular, não só à
repressão policial dos últimos dias, como rejeição da
consciência nacional ao confinamento do País num sistema
institucional restritivo de suas liberdades, mesmo quando para
mostrar essa restrição não apela para a violência ostensiva."
Correio da Manhã, 27 de junho de 1968

"Em gigantesca manifestação popular que se caracterizou pela


ausência de distúrbios, no qual os únicos policiais presentes
foram os guardas de trânsito, perto de cem mil pessoas
realizaram ontem a anunciada passeata durante a qual o povo,
fazendo causa comum com os estudantes, verberou a omissão
do govêrno nos problemas do ensino. Antes da passeata,
foram presos quatro estudantes sob acusação de conduzirem
material subversivo, e o ministro da Justiça, à noite criticou os
responsáveis pela queima de uma bandeira americana.
Enquanto isso em Pôrto Alegre, as manifestações de rua
acusavam um saldo de seis estudantes feridos e hoje, em
Fortaleza, anuncia-se a realização de manifestação semelhante
à do Rio."
"Uma multidão calculada em 100 mil pessoas realizou ontem,
durante mais de sete horas a anunciada passeata de
estudantes, padres, artistas e mães pela liberdade dos
estudantes detidos pela Polícia, pelo ensino superior gratuito e
contra as Fundações.
O movimento, que não registrou qualquer distúrbio, começou
com uma concentração na Cinelândia, às 10,30 horas, ganhou
o Largo da Candelária às 15 horas onde se deteve por 45
minutos para um comicio, e rumou pela rua Uruguaiana até a
estátua de Tiradentes na Praça Quinze, onde foi encerrado, às
17 horas.
Eram mais de 10 horas quando começaram a chegar à
Cinelândia os primeiros participantes da passeata, trazendo
faixas e cartazes. As escadarias do Teatro Municipal
começaram a encher-se de conhecidas figuras dos meios
religiosos, artisticos e estudantis, entre êles Paulo Autran,
Djanira, Eneida etc.
Aos gritos de "liberdade, liberdade" os estudantes deram
início aos discursos inflamados, clamando por mais verbas
para as universidades, ensino gratuito, contra a tentativa de
transformação das universidades em fundações e em protesto
contra a prisão dos líderes estudantis.
Poucos minutos antes do meio-dia chegou ao local o
estudante Wladimir Palmeira que salientou em breve discurso
"a derrota do govêrno na realização da passeata para a qual
não foi pedida autorização, mas que custou o sangue e muita
pancada nos estudantes".
Volta e meia, enquanto falavam os oradores estudantis
faziam-se apelos contra tentativas de distúrbios, constatando-
se mesmo a presença de grupos de estudantes prontos a
sufocar qualquer início de quebra-quebra. A preocupação de
não danificar automóveis, vitrines e não dar pretexto a
intervenções policiais foi uma constante em todo o
movimento.
Às 13 horas, começaram a falar os sacerdotes e artistas, já
com a presença de Dom José de Castro Pinto, que disse estar
"muito emocionado com o espírito de união do povo".
Poucos minutos antes das 14 horas, teve início a passeata em
direção à Candelária.
Por todo o trajeto, enquanto as moças pintavam inscrições
com "spray"nas paredes, toneladas de papel picado brotavam
do alto dos edifícios, emprestando à manifestação um
colorido festivo. Correspondentes estrangeiros comentavam a
facilidade com que o povo debate os seus problemas mais
sérios e profundos.
Por volta das 15 horas, os manifestantes chegaram à
Candelária, cuja praça ficou literalmente tomada. Em silêncio,
a multidão ouviu os discursos dos líderes e rumou, 45
minutos depois, para a rua Uruguaiana, por onde desceu até a
rua Sete de Setembro, até a Praça 15, ocupando as cercanias
do Palácio Tiradentes.
Novamente se ouviram discursos, inclusive de um favelado, e
por fim o estudante Vladimir Palmeira, admitindo não existir
qualquer estudante prêso, deu por encerrada a manifestação,
saindo sob proteção de um esquema de segurança até a rua da
Assembléia, onde embarcou num carro particular. Em poucos
minutos a multidão dispersou. Estava terminada a passeata."
O Jornal, 27 de junho de 1968

"Apesar de tôdas as promessas, da parte dos estudantes, de


que a passeata de ontem seria pacífica e das garantias, do lado
do Govêrno, de que o dispositivo repressivo não seria usado,
a menos que ocorressem violências graves, foi uma cidade
conturbada e intimidada a que aguardou os acontecimentos.
As portas de todo o comércio se fechavam, as vitrinas se
protegiam com madeirame colocado às pressas, o número de
pessoas que afluiu ao centro era extemamente reduzido, como
atestava o tráfego desafogado.
Nesse ambiente de mal disfarçada ansiedade, realizou-se a
passeata. Eram dezenas de milhares de pessoas que
desfilaram perfeitamente organizadas, manifestando pelas
faixas, pelos discursos, pelos aplausos e seus apupos os seus
sentimentos.
Assim, através dessa demonstração, cuja importância não
pode ser negada, os manifestantes puderam trazer livremente
às ruas a sua mensagem de revolta contra a inação do
Govêrno relativamente aos seus reclamos mais urgentes.
Os organizadores da parada revelaram habilidade extrema e
poder de liderança indiscutível ao conseguir que tudo se
passasse na mais perfeita disciplina e sem qualquer atentado
maior à ordem.
A grande maioria silenciosa dos cidadãos que trabalham, que
pagam seus impostos, que só desejam o bem-estar e o
progresso do nosso povo, não pode deixar de sentir
profundamente abalada pelo espetáculo que uma pequena
parcela da população, organizada e atuante, deu ontem.
Tôda essa gente encheu a Avenida Rio Branco com o seu
prado de protesto. Cabe agora a palavra do Govêrno. Que fará
o Govêrno para enfrentar essa insatisfação tão
eloqüentemente demonstrada? Pensará o Presidente da
República que a triste fala tartamudeante e mal lida do
Ministro Tarso Dutra na televisão, alinhando magros números
e anunciando transformações menores na estrutura
burocrática do Ministério da Educação bastará para contentar
a massa da juventude ansiosa por qualquer coisa que
signifique a verdadeira revolução nos arraiais da Educação?
Ou cuidará o Presidente Costa e Silva que seu discurso
perante os representantes dêsse partido feito em laboratório, a
ARENA, anunciando novas perspectivas para o
desenvolvimento econômico, através de um miraculoso Plano
Estratégico, levará tôda essa gente para casa, a fim de esperar
tranqüila que o desenvolvimento traga como complemento o
fim do descalabro educacional?
O que abalou todo o Brasil ontem foi o sentimento da
ausência de segurança. Ficamos à mercê dos acontecimentos,
que felizmente se desenrolaram de uma maneira que só honra
à organização dos estudantes. Mas o Govêrno não pode
esperar que mais essa omissão, a primeira prudente o
construtiva que praticou desde a sua instalação, resolva
qualquer coisa. Se nada se fizer se repetirão as manifestações
e se extravasará o descontentamento quiçá por maneiras e
métodos menos tranqüilos do que os empregados ontem.
Há um sentido de urgência inadiável em tomar na devida
medida a seriedade do problema com que se acha a braços a
Nação, de examiná-lo em profundidade, de procurar soluções
válidas, de caminhar para atender aos reclamos justos,
colocando de lado ressentimentos de orgulho mal ferido e
bravatas de subdesenvolvidos mentais. Sem isso, sem
restabelecer o ambiente de segurança indispensável à
sobrevivência do regime, é quase cômico falar em planos
mirabolantes de desenvolvimento econômico.
O dia de ontem no rio de Janeiro foi carregado de destino e
denso de significado político. Ou o Govêrno acorda para a
necessidade imediata de uma ação enérgica, organizada,
unânime, para enfrentar a presente crise, ou caminhamos para
momentos terríveis. A fisionomia grave, séria, quase temerosa
com que o Centro da Cidade aguardou ontem os
acontecimentos, contrastava com o ambiente de sorrisos
otimistas e fraterno alvoroço que reinava em Brasília, quando
o Presidente apresentava aos membros da ARENA seus
planos para o futuro distante e grandioso do Brasil. É preciso
que os responsáveis pelos destinos do País se dêem conta de
que sem um presente consolidado num mínimo de segurança
não há nenhum futuro senão o caos. se o Senhor Presidente
olhar para o chão em que põe os pés, ao invés de atentar para
o tremeluzir de estrêlas longínquas, talvez entenda a
mensagem que a mocidade colorida do Rio de Janeiro
estendeu ontem ao longo da Avenida Rio Branco."
Jornal do Brasil, 27 de junho de 1968

"Não só os estudantes marcharam. Foi todo o povo, num


movimento que se estendeu das 10 às 17 horas. A polícia não
compareceu. A ordem foi total. Uns poucos agentes do
DOPS, em atitude de provocação, foram isolados e após
afugentados pelos manifestantes. Vladimir Palmeira e Elinor
Brito - que estavam sendo caçados - falaram em todo o
trajeto. Havia mais de cem mil pessoas desfilando; um
número muitas vêzes maior aplaudindo. A bandeira mais alta,
na concentração final - foto acima - era a do Centro
Acadêmico Édson Luís de Lima Souto. O Sr. Negrão de Lima
congratulou-se com os jovens e soltou a frase: - Foi uma
goleada. O presidente Costa e Silva mandou liberar verbas
para as universidades federais, o que representou a primeira
vitória dos estudantes brasileiros."
"Mais de cem mil pessoas - estudantes, representantes
sindicais, professôres, padres e freiras - participaram da
manifestação de ontem que - sem intervenção policial -
transcorreu em perfeita ordem, embora os discursos fôssem
freqüentes e as faixas conduzidas exigissem, entre outras
coisas, a libertação dos jovens presos, em movimentos
anteriores.
Da Cinelândia, os manifestantes dirigiram-se, sempre
aplaudidos entusiasticamente pelo povo, até o largo da
Candelária, onde falaram dirigentes estudantis, entre êles
Vladimir Palmeira e Elinor Brito, depois de terem ouvido a
Sra. Irene Papi proclamar, em nome das mães dos estudantes,
que estaria sempre ao lado das lutas da mocidade.
Os manifestantes começaram a chegar às 10 horas na
Cinelândia e, formada a primeira concentração, partiram em
direção à Candelária. O esquema de repressão às provocações
funcionou com perfeição. Ao entrar na avenida Rio Branco, o
cortejo foi saudado por uma chuva de papel picado, que
continuou, até a chegada ao largo da Candelária.
O único incidente - minimizado logo pelos manifestantes -
ocorreu na esquina de Rio Branco e Araújo Pôrto Alegre,
quando um agente do DOPS procurar gerar confusão. Houve
violenta reação popular, mas os próprios manifestantes
impediram que o policial fôsse massacrado, facilitando sua
fuga em um taxi.
Quando a passeata atingiu o prédio ocupado pelo
Departamento Estadual de Estradas de Rodagem, os
funcionários vieram para as janelas, lançando uma chuva de
papel picado e aplaudindo delirantemente."
"Agentes do DOPS prenderam ontem na praça da República
(Campo de Santana), dentro do Karmann-Ghia GB 15-13-00,
Antônio Orlando Pinheiro Gomes (rua Airu, 79) , Ciro Flávio
Salazar de Oliveira (rua Hilário Gouveia 74 apto. 301), Mário
Jorge Almeida de Toledo (rua Barata Ribeiro, 253 apto. 301),
Julio Ribeiro (rua Barata Ribeiro 253, apto. 301) e Guilherme
Gomes Lond (rua Saviana, 270 apto. 201). Os cinco foram
levados para o DOPS, acusados de portarem panfletos que as
autoridades consideraram subversivas, embora não
revelassem seu teor. Os policiais apuraram, ainda, que o carro
utilizado pelo grupo pertence a Artur S. Wetreg (rua Marques
Canário, 20) que está sendo procurado. (...)"
"O ministro Gama e Silva, da Justiça, transmitiu, ontem, seu
ponto de vista pessoal sôbre o comportamento dos
manifestantes pelas ruas da cidade, salientando que, "em
princípio, houve ordem e não ocorreram depredações, embora
se abusasse do pixamento de prédios e ônibus, com o que
caracterizavam o desrespeito pela propriedade particular,
além da distribuição de panfletos altamente subversivos".
Lamentou o titular da Justiça que "se tivesse permitido a
queima de uma bandeira dos Estados Unidos, assim como a
exibição de faixas com dizeres ofensivos ao govêrno,
inclusive nas mãos de freiras e padres", mas constatou "o
acêrto com que o govêrno federal decidiu permitir a
realização da passeata sem policiamento ostensivo nas ruas.
(...)"
Diário de Notícias, 27 de junho de 1968

"Ao final de seis horas e meia de manifestações, dos quais


participaram mais de cem mil pessoas, os estudantes,
professôres, intelectuais, artistas, religiosos e populares
decidiram voltar às ruas na próxima semana se o Govêrno
Federal não libertar os colegas presos, reabrir o Restaurante
do Calabouço, liberar verbas para as Universidades e levantar
a censura sôbre as artes.
A manifestação pacífica começou com uma concentração na
Cinelândia, que se prolongou até as duas da tarde, quando a
marcha saiu em direção à Igreja da Candelária. De lá, após
um segundo comício, voltou para o Palácio Tiradentes,
contornando pela rua Uruguaiana. De todos os edifícios por
onde passaram os manifestantes caía uma chuva de papel
picado, enquanto populares acenavam e batiam palmas das
janelas.
O líder Wladimir Palmeira, triunfalmente levado à Cinelândia
por seus colegas, conduziu tôda a manifestação, pronunciando
cinco discursos, nos quais, além de reiterar as reivindicações
estudantis, pediu ordem aos colegas e exigiu o
restabelecimento do clima de liberdade democrática no País, a
defesa dos interêsses nacionais e melhores condições de vida
para os trabalhadores.
O Govêrno Federal acompanhou as manifestações, colocando
agentes em todos os pontos da cidade e o ministro Gama e
Silva, da Justiça, fêz um relatório completo ao presidente
Costa e Silva. As autoridades militares manifestavam-se
preocupadas com o desenrolar dos acontecimentos, embora
reconhecendo que os estudantes marcharam ordeira e
disciplinadamente.
Em São Paulo, uma viatura carregada de dinamite explodiu na
porta do nôvo QG do II Exército, causando a morte da
sentinela. Foi instaurado inquérito, mas até as primeiras horas
de hoje o Exército não tinha uma pista segura para determinar
a autoria do ato terrorista."
"Desde às 8 horas, com a chegada das primeiras faixas e
cartazes, que a manifestação dos estudantes teve início.
Vamos narrar o que vimos e ouvimos durante e depois da
passeata.
1) A concentração do pessoal, na Praça Floriano, na
Cinelândia, bem em frente à Assembléia Legislativa, teve o
seu ponto alto no justo momento em que Wladimir Palmeira
começou a falar (falou durante muito tempo, sempre
apladidissimo).
2) Apesar do mundo de gente, e de ter sido em local sem a
mínima cobertura, a voz de Wladimir Palmeira era ouvida por
quase todos. O sem timbre é muito forte e sua garganta
poderosíssima.
3) Às 13,20 o público começou a se locomover, com destino à
Avenida Rio Branco, da altura do Teatro Municipal. A
chamada ala dos intelectuais estava à frente. Os jornalistas
Antônio Calado e Jânio de Freitas seguravam uma grande
faixa, com os dizeres de solidariedade ao movimento
estudantil.
4) Chico Buarque de Holanda cumpriu sua promessa: chegou
à Cinelândia às 11 horas, tendo sido muito cumprimentado.
Chico, Edu Lôbo, Norma Benguel, Odete Lara e outros
vinham à frente do pessoal artístico.
5) Quando o grupo atingiu a avenida, esquina da Sete de
Setembro, um garôto de 14 anos (fizemos questão de saber
seu nome) Rubens Corrêa Magalhães, trepou numa banca de
jornal e exclamou: "O Povo Armado Derruba A Ditadura."
6) Uma senhora vestida humildemente, com a cabeça
totalmente encoberta por um pano (não era um lenço) , trazia
sôbre suas vestes um cartaz, cujos dizeres dispensavam
qualquer adjetivação: "Por Deus, soltem meu filho!".
7) Em momento algum se verificou um incidente. Ficou
patenteado que não são os jovens que vivem fazendo
arruaças, atirando nos outros, matando, enfim...
8) Antes do início da passeata uma garôta de 16 anos de idade
chamava a atenção de uma sua amiga para a fala do ministro
Tarso Dutra na televisão, no dia anterior: "Ele começou seu
lenga-lenga (palavras da môça), dizendo "Senhores e
Senhoras". E depois (foi ela quem completou) há gente que
não entende o analfabetismo do povo"...
9) Os que presenciaram a passeata de 2 de abril de 1964
(como êste reporter) foram unânimes em afirmar: "a de ontem
superou tudo em manifestações públicas. Em número, grau e
finalidade, a passeata dos estudantes de ontem ficará para
sempre na lembrança de todos".
10) Quando os manifestantes se encontravam na altura da Rua
da Assembléia, um helicóptero começou a sobrevoar a
avenida. O povo respondia com vaias e exclamava:
"Assassinos! Assassinos!".
11) A solidariedade dos populares que se encontravam nos
prédios situados por tôda a Avenida Rio Branco, que atiravam
papéis picados e batiam palmas para as pessoas a pé, foi
também um espetáculo belíssimo, chegou mesmo a
emocionar, por ter sido espontâneo.
12) Para se ter uma idéia do número de pessoas presentes,
basta se citar um exemplo: às 14h25m, o grupo inicial da
passeata se encontrava na avenida, na altura da Rua da
Alfândega. Partimos dali com destino à Cinelândia, onde
ainda era grande o número de pessoas que se organizavam
para ingressar nela.
13) O senador Mário Martins, acompanhado de uma mulher,
fêz todo o cortejo. Os dois estavam com uma fisionomia
muito carregada. Diversos garotos, todos manifestantes,
insistiam em cumprimentar o representante carioca na
Câmara Alta.
14) Indagamos de uma senhora de 65 anos de idade o motivo
de sua participação naquele movimento. Resposta: "Sou
pobre, não posso colocar meus netos em colégio particular,
como não pude fazer com os meus filhos. Hoje, o povo
resolveu se rebelar, na tentativa de encontrar uma solução
para a parte educacional. Deus está nos dando proteção, pois
se trata de um movimento pacífico e honesto"."
Tribuna da Imprensa, 27 de junho de 1968

AS MANCHETES:
Marcha Do Povo Reune Cem Mil ( Correio da Manhã )
Lição De Maturidade ( Correio da Manhã )
Negrão E Sizeno Satisfeitos Com A Manifestação
100 Mil Pessoas Na Passeata ( O Jornal )
Cem Mil Pessoas Clamaram Por Liberdade ( O Jornal )
Momento Grave ( Jornal do Brasil )
Sem Repressão Há Ordem ( Diário de Notícias )
Todo O Rio Foi À Rua Pedir Liberdade Para Os Estudantes
( Diário de Notícias )
Justiça Viu Subversivos Na Passeata ( Diário de Notícias )
Marcha Pacífica Reúne Mais De Cem Mil Na GB ( Tribuna
da Imprensa )
A Marcha Da Paz ( Tribuna da Imprensa )
50) Sequestro do Embaixador
Americano (1969)
"Tôda a Segurança Nacional encontra-se hoje mobilizada a
fim de descobrir o paradeiro do embaixador norte-americano
Elbrick, seqüestrado por terroristas, ontem à tarde, em
Botafogo. Inicialmente os seqüestradores entraram no próprio
carro diplomático - que é à prova de bala e não tem maçanetas
externas - onde esta a diplomata norte-americano e depois
obrigaram-no a passar para a Kombi, já distante do ponto em
que efetuaram a captura do embaixador.
Durante a tarde de ontem, à noite e esta madrugada, foi
grande a movimentação na Embaixada dos Estados Unidos,
pois até então não havia a menor notícia a respeito do
paradeiro de Elbrick.
Por sua vez, o governador Negrão de Lima, tão logo teve
conhecimento do fato, dirigiu-se ao Ministério do Exército
onde se manteve durante algum tempo em conferência com o
general Syseno Sarmento, num encontro que teve caráter
secreto, nada sendo divulgado. A essa hora já havia sido
mobilizado um sistema de segurança nunca antes utilizado,
pois dêle participam os Serviços Secretos do Exército,
Marinha, Aeronáutica e Serviço Nacional de Informações, o
Centro de Informações das três Fôrças, além da Polícia
Federal e do DOPS.
No local do seqüestro os terroristas deixaram dois
documentos: o primeiro, um manifesto que, segundo afirmam,
deveria ser divulgado para conhecimento do País inteiro; o
segundo, uma espécie de instrução de resgate, pois os seus
autores pretendem que 15 elementos que são partidários seus
e que estão presos, deverão ser conduzidos em segurança à
Argélia, Chile ou México. Afirmam os seqüestradores que
sòmente assim o embaixador Elbrick poderá ser libertado.
Caso contrário o representante norte-americano no Brasil
"será justiçado"."
Correio da Manhã, 5 de setembro de 1969
"Na tarde de ontem, no Itamarati, os ministros Magalhães
Pinto e Gama e Silva revelaram oficialmente que o Govêrno
brasileiro aceitava a exigência dos seqüestradores, decidindo
soltar todos os quinze presos políticos exigidos para o resgate
do embaixador Burke Elbrick.
Os titulares das Relações Exteriores e da Justiça distribuíram
nota oficial, afirmando "estarmos decididos a fazer o que
estiver a nosso alcance para evitar que se sacrifique mais uma
vida humana e sobretudo um representante diplomático".
Grande número de jornalistas, fotógrafos e cinegrafistas
estava aglomerado no Itamarati, quando os ministros
Magalhães Pinto e Gama e Silva anunciaram a solução,
depois de reunião, a portas fechadas, que durou três horas.
Dos quinze presos políticos, cuja libertação é o preço do
resgate do embaixador dos Estados Unidos, 8 são de São
Paulo, 5 da Guanabara, 1 de Pernambuco e outro de Minas
Gerais.
São os seguintes os presos a ser colocados em liberdade e
transportados para fora do País: Gregório Bezerra, Vladimir
Gracindo Soares Palmeira, José Ibraím, João Leonardo Silva
Rocha, Ivens Marchetti de Monte Lima, Flávio Aristides
Freitas Tavares, Ricardo Villas Boas de Sá Rêgo, Mário
Roberto Galhardo Zaconato, Rolando Fratti, Ricardo Zaratini,
Onofre Pinto, Maria Augusta Carneiro Ribeiro, Agnaldo
Pacheco da Silva, Luiz Gonzaga Travassos da Rosa e José
Dirceu de Oliveira e Silva.
Por intermédio da Embaixada dos Estados Unidos no Brasil, o
secretário de Estado norte-americano, Sr. William Rogers,
enviou mensagem ao chanceler Magalhães Pinto afirmando
que, "em meu nome e em nome do govêrno dos Estados
Unidos da América, desejo expressar a Vossa Excelência os
nossos agradecimentos pelas medidas que Vossa Excelência e
o Govêrno brasileiro têm tomado para conseguir a restituição
a salvo do embaixador Burke Elbrick".
Dom Umberto Manzzoni, Núncio Apostólico no Brasil,
entregou ontem carta ao ministro Magalhães Pinto,
manifestando "a profunda satisfação do Corpo Diplomático
ao constatar que o Govêrno faz de sua parte todos os esforços
possíveis para salvar a vida do ilustre colega, o senhor
embaixador dos Estados Unidos.
Permito-me acrescentar que, na vida dos povos,
especialmente nos tempos atuais, há casos, como o presente,
em que a concessão não é sinal de debilidade, nem acarreta
perda do próprios prestígio moral de quem a faz."
O embaixador Elbrick dirigiu, ontem, dois bilhetes à sua
espôsa, o primeiro dizendo estar bem e que poderiam ser
perigosas tentativas para localizá-lo, e o segundo
manifestando sua satisfação por ter o Govêrno brasileiro
aceitado as exigências dos seqüestradores, "pois significa que
serei libertado tão logo os 15 prisioneiros cheguem ao
México". o primeiro bilhete foi encontrado às 12h15min na
caixa de donativos da Igreja de Nossa Senhora da Glória, no
Largo do Machado, junto com um manifesto dos raptores, e o
segundo numa caixa de sugestões do Mercado Disco, no
Leblon.
Revelou-se aos primeiros minutos de hoje que já se
encontravam no Aeroporto do Galeão dois aviões preparados
para conduzir os presos liberados para o exterior, não se
sabendo ainda para qual país seriam levados (México, Chile
ou Argélia). Informou-se também que dois dos presos não
desejavam deixar o País: Ricardo Villas Boas de Sá Rêgo e
Maria Augusta Carneiro Ribeiro, que entretanto seriam
transportados de qualquer forma.
O México concedeu asilo aos 15 presos políticos brasileiros,
segundo informou ontem à noite a Secretaria de Relações
Exteriores. Em Santiago do Chile, porta-voz oficial do
ministério d6esse país anunciou, também, a disposição de seu
govêrno em conceder o asilo. Chegou-se a informar que
alguns dos presos chegariam ainda na noite de ontem a
Santiago. Disse o porta-voz que "realmente ignoramos
quantos virão, e quem são, mas o asilo é extensivo a todos os
que chegarem". (...)"
Correio da Manhã, 6 de setembro de 1969
"A posição do Govêrno diante do seqüestro do Embaixador
Charles Elbrick será divulgada hoje em nota oficial redigida
pelos Ministros Magalhães Pinto e Gama e Silva. A decisão
foi tomada ontem à noite em reunião com a Junta do
Govêrno, no Itamarati.
Nessa reunião se resolveu liberar a mensagem deixada pelos
seqüestradores, mas nada foi dito sôbre uma das exigências
para que o Embaixador dos Estados Unidos seja pôsto em
liberdade: a libertação de 15 presos políticos, ainda não
nomeados, que devem ser conduzidos ao México, Chile ou
Argélia como asilados.
O seqüestro do Sr.Charles Elbrick deu-se depois do almôço,
quando o diplomata voltava de sua residência oficial para a
sede da Embaixada, no Centro. Quando seu Cadillac prêto
dobrou da Rua São Clemente para a Rua Marques, em baixa
velocidade, foi fechado por um Volkswagen. Logo três
rapazes com revólveres renderam o motorista e o
Embaixador, forçando-os a seguir até a Rua Caio Melo
Franco, onde uma Kombi já os esperava. Cloroformizado, o
Embaixador Charles Elbrick foi mudado de carro, enquanto o
motorista, liberado, corria ao telefone mais próximo para
comunicar o seqüestro.
Tôda a operação dos seqüestradores, antes e logo depois da
abordagem ao Cadillac, foi acompanhada pela Sra. Elba
Souto maior, espôsa de um capitão-de-mar-e-guerra.
Desconfiada da movimentação, ela telefonara à Delegacia de
Furtos de Automóveis dando a placa dos carros; o policial
disse que os carros não eram roubados; pouco depois os
carros foram usados no seqüestro. E mais tarde confirmou-se
que pelo menos uma placa era roubada.
Ainda ontem o Itamarati divulgou nota oficial afirmando que
o seqüestro é "um ato de puro e símples terrorismo em
detrimento do prestígio internacional do Brasil." Nos Estados
Unidos, o Presidente Richard Nixon convocou o Secretário de
Estado, William Rogers, para uma conferência, assim que foi
informado do seqüestro do Embaixador Charles Burke
Elbrick."
"O Embaixador Elbrick dispensou pessoalmente há cêrca de
duas semanas a proteção especial que recebia de agentes da
Secretaria de Segurança, alegando que estava há pouco tempo
no Brasil e era pouco conhecido.
Apesar de a Embaixada americana ter seu próprio corpo de
segurança, a segurança pessoal do Embaixador era feita
também com a colaboração de agentes estaduais, até que êle
mesmo solicitasse a sua desmobilização. O Sr. Elbrick,
segundo funcionários da Embaixada, gostava de andar
sozinho, principalmente quando saía pelo centro da cidade
para ir ao barbeiro ou fazer compras.
Tôda a polícia carioca foi colocada de sobreaviso ontem a
noite, por ordem expressa do Secretário de Segurança,
General Luís de França Oliveira, através de telex enviado a
todos os órgãos policiais que se mantém mobilizados
intensamente na busca dos seqüestradores do Embaixador dos
Estados Unidos no Brasil.
Ao mesmo tempo, o Secretário de Segurança determinou a
mobilização dos 50 integrantes do Grupo Especial de
Operações, recentemente criado, para se integrar nas
investigações e busca dos raptores em cooperação com as
autoridades militares. Paralelamente, tôdas as radiopatrulhas e
o Departamento Motorizado da Secretaria recebeu instruções
para informar ao comando policial qualquer informação que
possa levar à prisão dos seqüestradores.
O General Luís de França Oliveira não quis comentar o rapto
do Embaixador Charles Elbrick, afirmando apenas que o caso
estava mais no âmbito policial, e que todo o organismo
policial do Estado sôb o seu contrôle, estava mobilizado para
a busca.
Por medida de segurança, 15 presos políticos que estavam no
DOPS foram removidos ontem à noite para a Polícia do
Exército. Policiais da Secretaria de Segurança acreditavam
que os seqüestradores tivessem se dirigido para São Paulo.
Tôdas as barreiras entre a Guanabara e o Estado do Rio estão
guardadas por policiais armados, conforme determinação
dada pelo diretor-geral do Departamento da Polícia Federal.
Mais de 4200 homens, em todo o país, e cêrca de 450 apenas
na Guanabara, com 120 viaturas mobilizadas e em
permanente contato pelo rádio - cuja estação receptora está no
4o andar do prédio 70 da Rua da Assembléia - foram
mobilizados poucos minutos depois que a Polícia Federal
recebeu a comunicação do seqüestro do Embaixador Burke
Elbrick, logo após às 15 horas. (...)"
Jornal do Brasil, 5 de setembro de 1969

"O Chanceler Magalhães Pinto caracterizou como


"inominável atentado" o seqüestro do Embaixador dos
Estados Unidos e, em nome do povo brasileiro e do Govêrno
do Brasil, manifestou a repulsa do País a êsse "ato de puro e
símples terrorismo".
Todos os dispositivos de segurança estavam, ontem,
mobilizados para deter os subversivos que, à tarde,
seqüestraram o Sr. Charles Burke Elbrick, deixando no local
da investida dois documentos: um de crítica ao Govêrno e
outro fazendo descabidas e insultosas exigências, como a de
libertação e da divulgação de um manifesto nitidamente
subversivo. A partir das 21 horas, realizava-se, no Itamarati,
uma reunião com a presença dos Ministros Augusto
Rademaker, Lira Tavares, Sousa Melo, Magalhães Pinto e
Gama e Silva, presentes ainda os Generais Siseno Sarmento e
Jaime Portela.
O Presidente Nixon, em sua residência de verão, já tomou
conhecimento do atentado e recebeu do Govêrno brasileiro a
informação de que tudo está sendo feito para localizar o Sr.
Elbrick e punir os criminosos."
"Às 13h50min de ontem. o Embaixador norte-americano
Charles Burke Elbrick saía, no Cadillac CD-23, da residência
oficial, na Rua Sào Clemente, 288. Logo depois de passar
pelo Largo dos Leões, o carro foi interceptado pelos
ocupantes de dois automóveis Volkswagen - SP 40-05-61 e
ES 96-35-8. Os homens, armados de metralhadoras,
ordenaram ao motorista Custódio Abel da Silva que se
dirigisse a uma ladeira nas proximidades. O Embaixador foi
transferido para a Kombi ES 9-51-58, sendo liberado o
motorista, depois de retirado o rádio e a chave de ignição do
carro diplomático. Abel, mais tarde, declarou que os bandidos
usaram narcóticos. Outro detalhe: um homem viu, da janela
de sua casa, os primeiros lances do seqüestro. Não pôde
impedi-lo.
O Cadillac CD-23 foi interceptado justamente quando atingia
a Rua Marques. Os ocupantes dos dois carros entraram no
automóvel de diplomata e, imediatamente, arrancaram o
rádio, ordenando ao motorista que dirigisse o veículo a um
dos morros vizinhos, onde já se encontrava estacionada a
Kombi. Após terem retirado a chave do carro, transferiram o
Embaixador Charles Elbrick para a Kombi, partindo para
lugar ignorado.
O motorista Custódio Abel da Silva, depois de descer o morro
a pé, telefonou para a Embaixada dos EUA, relatando a
ocorrência.
Um dos automóveis utilizados para interceptar o carro do
diplomata foi localizado, pela RP 8-192, estacionado na Rua
Ministro João Alberto, 191. Em seu interior foi encontrado
um objeto estranho, levado para exame pericial.
No carro da Embaixada, foram deixados dois documentos. O
primeiro é um manifesto de crítica ao Govêrno brasileiro. O
outro é simplesmente uma exigência de que o manifesto
subversivo fosse entregue a um dos Ministros militares e
fosse lido por autoridades constituídas, em tôdas as rádios
brasileiras. Davam um prazo de 24 horas para a libertação de
15 presos políticos, cuja relação seria enviada posteriormente,
para que fôssem entregues, pelo govêrno, nas Embaixadas do
Chile, México e Argélia. Ameaçaram não libertar o diplomata
a não ser que todos esses itens fôssem atendidos.
Todo o dispositivo de segurança entrou imediatamente em
ação. Além das autoridades estaduais, foram mobilizados a
Polícia Federal e até o Corpo de Bombeiro. Foi expedida
ordem para fechamento das barreiras com adoção de contrôle
do máximo rigor.
O Chanceler Magalhães Pinto, acompanhado do General
Siseno Sarmento e do Chefe da Casa Militar do Palácio
Guanabara, Coronel Alcir Miranda, estêve no Laranjeiras e
dirigiu-se, a seguir, à Embaixada dos Estados Unidos.
O motorista Abel da Silveira foi levado à Secretaria de
Segurança e, depois de prestar declarações, foi encaminhado
aos arquivos do DOPS, na tentativa de se conhecer, entre as
fotos de subversivos, os autores do seqüestro. Abel chegou a
declarar que, pelo jeito, os bandidos usaram narcótico,
durante a operação.
Mais tarde o motorista foi levado ao I Exército. Êle trabalha
na Embaixada há cinco anos e foi, por sua conduta exemplar,
escolhido para as funções de motorista do Sr.Charles
Elbrick."
Diário de Notícias, 5 de setembro de 1969

"O govêrno brasileiro, em comunicado dado à divulgação às


13h30min de ontem, pelo chanceler Magalhães Pinto,
concordou com a transferência para o exterior, dos 15 presos
políticos, cuja libertação foi exigida pelos seqüestradores do
embaixador Charles Burke Elbrick.
Cêrca de duas horas antes, um telefonema anônimo
comunicara que numa das caixas de esmolas da Igreja de
Nossa Senhora da Glória existia um bilhete do próprio punho
do embaixador à sua espôsa, bem como um manifesto às
autoridades.
Realmente, tais documentos foram encontrados no lugar
indicado e levados a quem de direito, sucedendo-se logo uma
reunião de cúpula, no decorrer da qual ficou acertado que
seriam aceitas as condições impostas pelos seqüestradores.
Enquanto desde a véspera todo o dispositivo de segurança do
Estado da Guanabara era movimentado no sentido de se
conseguir uma pista que levasse aos autores do seqüestro,
com participação do Departamento de Polícia Federal e, já na
manhã de ontem, com o concurso de agentes do FBI, era dado
um aviso por parte dos seqüestradores a respeito da caixa de
esmolas da Igreja de Nossa Senhora da Glória.
Constatou-se a veracidade da informação e, no bilhete, do
próprio punho do embaixador Charles Burke Elbrick, êle
avisava à sua espôsa de que estava fisicamente bem,
esperando que sua libertação não demorasse muito, para
poder vê-la em breve. Dizia ainda estar tentando não ficar
preocupado e que as autoridades deviam tentar localizá-lo,
para evitar mal maior, já que o pessoal que o havia
seqüestrado era verdadeiramente decidido.
No manifesto encontrado junto, os elementos da ALN
referiam-se ao bilhete e exigiam que as autoridades
suspendessem as diligências no sentido de localizá-los., bem
como o pronunciar-se publicamente até às 14h50min,
concordando com a libertação de 15 prisioneiros, cujos nomes
oportunamente fariam chegar ao seu conhecimento. Só depois
que as agências noticiosas informassem que os 15 elementos
já se encontravam em plena segurança no estrangeiro, é que
se procederia à libertação do embaixador, mantido como
refém.
Cientificado o fato às autoridades superiores, antes da hora
marcada, 14h50min, o chanceler Magalhães Pinto fêz de
público a seguinte comunicação:
"São do conhecimento público as circunstâncias ligadas ao
seqüestro do embaixador dos Estados Unidos da América, Sr.
C. Burke Elbrick, por terroristas empenhados na subversão da
ordem pública nacional.
Em manifesto lançado na ocasião do delito, os terroristas
exigem, sob ameaça de matar o embaixador Elbrick, que o
govêrno faça divulgar na íntegra aquêle manifesto e envie
para o exterior 15 indivíduos atualmente detidos por atividade
subversiva.
Convencido de interpretar com fidelidade os sentimentos
profundos e autênticos do povo brasileiro, o govêrno decidiu
fazer o que está a seu alcance para evitar que se sacrifique
mais uma vida humana, sobretudo quando se trata da pessoa
de um representante diplomático, ao qual o Estado brasileiro,
tradicionalmente hospitaleiro, deve proteção especial.
O govêrno já autorizou a divulgação do manifesto e
determinará a transferência para o exterior dos 15 detidos
cujos nomes lhe forem indicados.
Dêsse modo, recairá totalmente sôbre os seqüestradores a
responsabilidade por qualquer dano à incolunidade da pessoa
do embaixador C. Burke Elbrick." (...)"
Luta Democrática, 6 de setembro de 1969
"Com desembarque previsto para as 14 horas (hora do Rio),
chegam hoje ao México os 15 asilados cuja libertação foi
exigida pelos terroristas que seqüestraram o embaixador
norte-americano Burke Elbrick. O embarque no Rio, a que
não tiveram acesso os reporteres, foi precedido de forte
dispositivo de segurança, até que o Hércules da FAB, prefixo
2456, levantou vôo às 17,10, com destino a Recife, onde
deveria recolher o ex-deputado Gregório Bezerra. O Itamarati
viveu ontem outro dia de intenso nervosismo, que atingiu
climax quando o chanceler Magalhães Pinto foi informado de
que, contràriamente ao que êle já havia anunciado à imprensa,
o avião ainda nào levantara vôo, por "motivos técnicos". O
Departamento de Estado dos EUA confessou-se preocupado
pela possibilidade do seqüesto provocar uma onda de
atentados similares no mundo."
"Com chegada prevista para às 17 horas (14 horas do Rio)
desembarcam hoje no México os 15 ex-prisioneiros cuja
liberdade foi exigida pelos terroristas que seqüestraram o
embaixador norte-americano Burke Elbrick.
Às 17h05m o "Hércules" C-130.2456 da Força Aérea
Brasileira decolou rumo ao México do Aeroporto Militar do
Galeão levando em seu interior os prisioneiros políticos
exigidos pelos seqüestradores para libertarem o embaixador
norte-americano Burke Elbrick.
Soldados da Aeronáutica exerceram severa vigilância não
permitindo a penetração da imprensa. Os presos foram
conduzidos para o Aeroporto Militar de helicópteros e carros
blindados da radiopatrulha. Ricardo Villas Bôas Sá Rêgo foi o
primeiro a chegar."
"A imprensa manteve-se durante a manhà de ontem em
constante expectativa esperando a chegada dos prisioneiros ao
Galeão. Às 12,02 horas Ricardo Villas Bôas Sá Rêgo
conduzido por policiais do DOPS e Secretaria de Segurança
Pública chegou ao local de embarque. Os carros de
rádiopatrulha entraram pela pista comercial e ali
permaneceram durante alguns minutos.
Uma ordem dada fez com que o prisioneiro fosse transportado
imediatamente para a Base Aérea. Ali a imprensa não
penetrou ficando há cêrca de 1.200 metros dos aviões parados
na pista de pouso. Dois aviões da Força Aérea Americana
estavam sendo abastecidos.
Às 12h25 minutos informava-se ter sido determinado o
abastecimento do avião da FAB que levaria os prêsos para o
México. A movimentação na Base Aérea do Galeão
continuou e os repórteres permaneciam na sacada do
Aeroporto Internacional utilizando teleobjetivas possantes.
Mais três carros da radiopatrulha chegavam às 12,28 horas
dêles desembarcando algumas pessoas. Dez minutos depois
um helicóptero pousava na pista da Base Aérea e segundo as
informações teria conduzido o jornalista Flavio Tavares.
A movimentação de veículos policiais foi intensa. Novas
viaturas chegavam, mas, em virtude da distância em que
estavam os repórteres não foi possível identificar ninguém.
Dois "Hércules" permaneciam parados e já estavam
abastecidos. Soldados da Aeronáutica guarneciam tôda a área
adjacente. (...)
Às 16,35 horas pousava junto ao avião "Hércules" um
helicóptero. Dêle desceram, segundo apurou-se, quatro
pessoas, uma das quais foi embarcada no avião. A partir daí
os carros que ainda permaneciam na pista foram se retirando
gradativamente.
Precisamente às 16,46 horas a primeira hélice da asa direita
do "Hercules" começou a girar. Seguiram-se as outras e logo
depois o avião acionava todos os motores. Permaneceu
parado durante 2 minutos e às 16,52 horas dirigiu-se à
cabeçeira da pista, decolando às 17,05 horas."
"Foi encontrada na escultura localizada em frente ao edifício
da revista "Manchete", na Praia do Russel, nova mensagem
do embaixador norte-americano e de seus seqüestradores. São
os seguintes os textos:
"Nota da Ação Libertadora Nacional e do Movimento
Revolucionário 8 de Outubro -
Tomamos conhecimento das declarações do Chanceler
Magalhães Pinto segundo as quais nossos 15 companheiros
partiram para o México. Solicitamos às emissoras de rádio
que confirmem no Ministério das Relações Exteriores e na
Embaixada do México se os que partiram são os constantes na
lista já divulgada. Aguardamos, como nos comprometemos,
apenas a confirmação da chegada através das agências
internacionais para liberar o embaixador dos Estados Unidos,
que envia sua mensagem final até o momento de reencontrar a
família.
Rio, 6/9/69 - ALN - MR8"

A nota dos raptores está acompanhada da seguinte carta do


embaixador Burke, à sua espôsa, escrita em inglês:
"Estou bem ansioso para vê-la brevemente. Li nos jornais de
hoje que você recebeu minhas duas cartas de ontem e fui
informado pelos que me prendem, que êles estão esperando
confirmação do Govêrno brasileiro e da Embaixada mexicana
sôbre o nome dos 15 presos, que foram libertados e que estão
agora presumivelmente a caminho do México. Espero que
receba uma confirmação para que eu possa ser libertado a
qualquer momento, amanhã. Com todo o meu amor, Burke."
"Falando, cêrca das 22,30 horas de ontem, o Chanceler
Magalhães Pinto confirmou que treze elementos subversivos,
libertados no Rio, já haviam partido com destino ao México,
além de um de Recife, devendo o outro ser apanhado em
Belém.
A declaração do Ministro constituiu uma resposta a nova
mensagem dos raptores do Embaixador Burke Elbrick ao
Govêrno que reclamavam esclarecimentos sôbre o embarque.
As palavras do Sr. Magalhães Pinto foram préviamente
gravadas e em seguida, irradiadas para conhecimento dos
terroristas."
O Jornal, 7 de setembro de 1969

"77 horas e 55 minutos depois de haver sido seqüestrado, o


Embaixador norte-americano Charles B. Elbrick regressou
ontem a sua residência oficial, num táxi, apanhando
inteiramente de surprêsa a Embaixada, sua família e os
jornalistas de plantão na Rua São Clemente. Fôra abandonado
momentos antes próximo ao Largo da Segunda-Feira, na
Tijuca.
Tão logo as autoridades tomaram conhecimento do regresso
do diplomata, foi desencadeada uma vasta operação de cêrco,
na tentativa de localizar os seqüestradores. Tôdas as barreiras
nas estradas foram fechadas e a Polícia passou a investigar.
O Embaixador, ao regressar, trajava terno cinza escuro,
camisa azul clara, sem gravata, e apresentava um ferimento
na testa, produzido por uma coronhada. Segundo seu relato,
foi a única violência física dos seqüestradores, que o trataram
"muito bem". Eram todos jovens, segundo disse, e não
usavam disfarces."
"Às últimas horas da noite de ontem, o Secretário de
Imprensa da Presidência da República, Sr. Carlos Chagas,
informou sôbre o teor de uma carta em que o Presidente
Richard Nixon agradece ao Presidente Costa e Silva e aos três
Ministros militares no exercício do govêrno os esforços
desenvolvidos para a libertação do diplomata: "Desejo
expressar - diz a carta - a minha mais profunda gratidão, e a
de meu govêrno, pelos bem sucedidos esforços a fim de
assegurar a liberação do Embaixador Elbrick. Estou
plenamente ciente da complexidade da tarefa e das difíceis
decisões adotadas."
"Os quinze prisioneiros libertados pelo govêrno brasileiro em
troca da devolução do Embaixador chegaram ao México
ontem à tarde e foram encaminhados a um hotel."
"Num táxi Volkswagen, placa GB 5-11-43, o Embaixador
norte-americano Charles Burke Elbrick regressou à sua
residência às 19h45m de ontem, exatamente 78 horas e 55
minutos depois de haver sido seqüestrado próximo à Rua São
Clemente.
Cercado imediatamente pelos reporteres e fotógrafos de
plantão, o Sr. Elbrick entrou imediatamente em sua casa, onde
falou com a esp6osa. Quinze minutos mais tarde pelo
telefone, fêz um relato completo ao Presidente Nixon, a quem
disse que "felizmente acabou tudo bem".
Logo em seguida, ainda pelo telefone, foi cumprimentado
pelo Ministro Magalhães Pinto, que a seguir mandou à Rua
São Clemente o Secretário Geral do Itamarati, Embaixador
Gurgel Valente. Em todos os relatos, disse o Embaixador que
não foi cloriformizado, como se anunciara. Recebeu uma
coronhada na cabeça, que sangrou um pouco.
- Mas a partir daí fui muito bem tratado. Êles até me deram
charutos e lavaram minha camisa.
Revelou ainda o Embaixador que durante todo o tempo em
que permaneceu seqüestrado foi mantido num quarto
pequeno, com pouca luz. E tanto no trajeto de ida para esse
refúgio, como quando de lá foi retirado mantiveram-no de
olhos vendados. Por isso, não pode precisar onde estêve.
As primeiras palavras do Embaixador, ao chegar à sua
residência, foram estas:
- Sinto-me feliz por estar de volta. Alegra-me que meus
captores tenham mantido a palavra, deixando-me partir. Estou
muito grato ao Govêrno brasileiro por haver tomado tôdas as
medidas necessárias para levar a cabo minha libertação.
O Sr. Elbrick foi deixado pelos seqüestradores em frente ao
número 40 da Rua Eduardo Ramos, próximo à Rua Conde de
Bonfim e Largo da Segunda-Feira, na Tijuca. Recebeu ordens
para aguardar quinze minutos, mas aproveitou a passagem do
táxi para voltar à sua residência. O motorista José Mateus de
Sousa, que o recolheu imediatamente, perguntou-lhe se não
era o Embaixador norte-americano. E acrescentou:
- Pobrezinho... (...)"
"A notícia da libertação do Embaixador Burke Elbrick foi
recebida na sede da Embaixada por volta das 20 horas. O
Encarregado de Negócios, Sr. William Belton, e o
Conselheiro John Mowinckel, tomaram imediatamente o
carro placa CD-818 e seguiram para a residência do
Embaixador, na Rua São Clemente.
Dez minutos depois, um funcionário do Setor de Informações
transmitia aos jornalistas as primeiras declarações do
Embaixador Burke e sua explicação para o ferimento que
mostrava no lado direito da testa:
- Êles não tinham a intenção de me fazer mal algum, mas eu
ignorava isto e por êste motivo resisti quando me disseram
para fechar os olhos enquanto me transferiram para outro
carro. Eu não estava disposto a fechar meus olhos para
ninguém naquele momento.
O Embaixador resistiu e tentou afastar as armas apontadas
para êle e nesse momento foi fortemente atingido. (...)"
Última Hora, 8 de setembro de 1969

AS MANCHETES:

Govêrno Faz Mobilização Geral Para Salvar Embaixador Dos


EUA
( Correio da Manhã )
Govêrno Libera Presos Políticos E Preserva Vida Do
Embaixador
( Correio da Manhã )
Govêrno Fixa Hoje Sua Posição Sôbre O Seqüestro ( Jornal
do Brasil )
Elbrick Dispensara Segurança Pessoal Oferecida Pelo Estado
Há Duas Semanas ( Jornal do Brasil )
Seqüestro De Embaixador É Inominável: País Revoltado
( Diário de Notícias )
Govêrno Salva Vida Do Embaixador - Terroristas Atendidos -
Tudo Agora Depende Dos Raptores ( Luta Democrática )
Só Falta Agora A Volta De Elbrick - Asilados Hoje À Tarde
No México
( O Jornal )
Raptores Só Aguardam Chegada Dos 15 Presos ( O Jornal )
Embaixador Salvo E Terror Cercado ( Última Hora )
Nixon Grato ( Última Hora )
Por Que Êle Foi Ferido ( Última Hora )
OS 62 JORNAIS CONSULTADOS:
O BALUARTE - A BATALHA - BOA NOITE - O BRASIL
- O CARBONÁRIO - O COMBATE A CRÍTICA - CIDADE
DO RIO - CORREIO DA MANHÃ - CORREIO DA NOITE
- CORREIO DA TARDE - CORREIO DO POVO - O
DEMOCRATA - O DIA - O DIARIO - DIÁRIO CARIOCA -
DIÁRIO DA NOITE - DIÁRIO DE NOTÍCIAS I - DIÁRIO
DE NOTÍCIAS II - DIÁRIO DO COMMÉRCIO - DIÁRIO
DO POVO - DIÁRIO DO RIO - A ESQUERDA - FOLHA
CARIOCA - FOLHA DA TARDE - FOLHA DO DIA -
GAZETA DA TARDE - GAZETA DE NOTÍCIAS - O
GLOBO - O IMPARCIAL - A IMPRENSA - IMPRENSA
POPULAR - O JORNAL - JORNAL DO BRASIL -
JORNAL DO COMMÉRCIO - JORNAL DOS SPORTS -
LUTA DEMOCRÁTICA - A MANHÃ - A MARCHA - A
NAÇÃO I - A NAÇÃO II - A NOITE - A NOTÍCIA -
NOVIDADES - O PAIZ - A PÁTRIA - O RADICAL - A
RAZÃO - A REPÚBLICA - REPÚBLICA BRAZILEIRA -
RIO JORNAL - RESISTÊNCIA - A RUA - RUA DO
OUVIDOR - O SÉCULO - O TEMPO - A TRIBUNA -
TRIBUNA DA IMPRENSA - ÚLTIMA HORA - A UNIÃO -
O UNIVERSO - VIDA FLUMINENSE
Texto proveniente de:
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Dezembro - 1999

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