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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS

Centro de Economia e Administração

Faculdade de Ciências Econômicas

ANÁLISE DA ESTRUTURA DE MERCADO DA CONCORRÊNCIA RELIGIOSA:

O OLIGOPÓLIO DA FÉ

Marcos Guilherme Cassolato de Oliveira

Campinas, São Paulo


2005
i

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS

Centro de Economia e Administração

Faculdade de Ciências Econômicas

ANÁLISE DA ESTRUTURA DE MERCADO DA CONCORRÊNCIA RELIGIOSA:

O OLIGOPÓLIO DA FÉ

Marcos Guilherme Cassolato de Oliveira

Monografia apresentada à Faculdade de Ciências


Econômicas do Centro de Economia e
Administração da PUC Campinas, como requisito
parcial para a obtenção do título de Bacharel em
Ciências Econômicas, sob a orientação do Prof.
Mestre Antonio Carlos de Azevedo Lobão

Campinas, São Paulo


2005
ii

Autorização do aluno

Autorizo a disponibilidade desta monografia na Biblioteca da PUC Campinas para


consultas públicas e referências bibliográficas, mas reproduções, total ou parcial,
somente poderão ser feitas mediante autorização expressa do autor, conforme o
que dispõe a legislação vigente sobre direitos autorais.

Nome legível do aluno Assinatura do aluno

_________________________________________________________________

Local e data

Campinas, 16 de dezembro de 2005.


iii

DEDICATÓRIA

À minha querida Li e nossos


familiares, pelo amor e
compreensão sem os quais
nada disso seria possível
iv

AGRADECIMENTOS

O presente trabalho acadêmico é o resultado de um longo período de


estudos na Pontifícia Universidade Católica de Campinas, que teve indispensável
contribuição de professores, colegas e várias outras pessoas. Com as desculpas
por alguma eventual omissão, apresento, em seguida, meus agradecimentos
sinceros a todas essas pessoas que, direta ou indiretamente, contribuíram para
que este estudo fosse concluído:

Ao Prof. Dr. Cândido Ferreira da Silva Filho, na condição de Diretor da Faculdade


de Ciências Econômicas do Centro de Economia e Administração da PUC
Campinas, pelo apoio institucional e atenção.

Ao Prof. Dr. Josmar Cappa, coordenador da atividade de monografia da


Faculdade de Ciências Econômicas do Centro de Economia e Administração da
PUC Campinas, pelo apoio institucional e atenção.

Ao Prof. Mestre Antonio Carlos de Azevedo Lobão, orientador e incentivador dos


meus trabalhos de graduação na Faculdade de Ciências Econômicas da PUC
Campinas, pelo apoio, atenção e amizade.

Ao Prof. Dr. Márcio Roberto Pereira Tangerino, co-orientador e incentivador dos


meus trabalhos de graduação na Faculdade de Ciências Econômicas da PUC
Campinas, pelo apoio, atenção e amizade.

À Profa. Mestre Ivana Pereira Goulart, pela atenção e apoio pedagógico na área
de marketing e orientação acerca dos métodos e técnicas para realização de
entrevistas acadêmicas.

Ao Prof. Dr. Carlos Alberto da Cunha Almendra, pela atenção e orientação acerca
dos métodos e técnicas para realização de entrevistas acadêmicas.
v

Ao Prof. Dimas Alcides Gonçalves, incentivador dos meus trabalhos de


graduação, pelo apoio, atenção e amizade.

Ao Prof. Mestre Arnaldo Lemos Filho, pela atenção e apoio bibliográfico.

Aos Profs. Dr. Lineu Carlos Maffezoli e Dra. Nelly Maria Sansigolo de Figueiredo,
pelas aulas indispensáveis para elaboração deste trabalho.

Ao Arcebispo Metropolitano de Campinas e Grão-Chanceler da PUC Campinas,


Sua Eminência Reverendíssima, Dom Bruno Gamberini, pela atenção, incentivo,
e concessão de entrevista acadêmica.

Ao Pastor Presbiteriano Abimael Etz Rodrigues, pela atenção, incentivo e


concessão de entrevista acadêmica.

Ao Prof. Mestre Antônio Miguel Kater Filho, idealizador e 2º vice-presidente do


Instituto Brasileiro de Marketing Católico (IBMC), pela atenção e concessão de
entrevista acadêmica.

Finalmente, a todos os familiares, amigos e colegas sem os quais este estudo não
seria possível, pela atenção, incentivo e compreensão, sempre presentes nas
inesgotáveis e proveitosas conversas.
vi

SUMÁRIO

Lista dos Anexos ........................................................................................... viii

Lista dos Apêndices ...................................................................................... ix

Relação das siglas usadas no texto .............................................................. x

RESUMO ....................................................................................................... xii

INTRODUÇÃO .............................................................................................. 1

CAPÍTULO 1 – Oligopólio: estrutura de mercado .................................... 8


1.1 – Retrospectiva: concentração de capital e a consolidação da
etapa monopolista do capitalismo .............................................. 8

1.2 – O oligopólio segundo seus pressupostos ................................... 12

1.3 – Configurações da estrutura oligopolista ..................................... 16

1.3.1 – Oligopólio puro ou concentrado .................................... 18


1.3.2 – Oligopólio diferenciado ................................................. 19

1.3.3 – Oligopólio misto ............................................................ 20

1.4 – Barreiras à entrada ..................................................................... 21

1.4.1 – Economias de larga escala como barreiras à entrada .. 22


1.4.2 – Vantagens de custo absoluto das empresas
estabelecidas como barreiras à entrada ....................... 23

1.4.3 – Vantagens por diferenciação de produtos das


empresas estabelecidas como barreiras à entrada ...... 25

1.5 – Estratégias de mercado em oligopólio ....................................... 26

1.5.1 – Bases de competição extra-preço ................................ 28

1.5.2 – Alianças estratégicas .................................................... 30

1.6 – Exemplo de mercado oligopolizado: a indústria de bebidas no


Brasil .......................................................................................... 33

CAPÍTULO 2 – O campo religioso .............................................................. 35


2.1 – O que são as igrejas e o que elas “vendem” .............................. 35
vii

2.2 – Noção de campo religioso .......................................................... 41

2.3 – A concorrência religiosa ............................................................. 44

2.4 – Panorama do campo religioso brasileiro – aspectos qualitativos


das denominações cristãs e suas respectivas taxas de
participação na sociedade .......................................................... 49

CAPÍTULO 3 – Aspectos concorrenciais da religião no Brasil ............... 58


3.1 – Grau de concentração do setor religioso e a recente evolução
do cenário concorrencial ............................................................ 58

3.2 – O surgimento de novas competidoras e as barreiras envolvidas 62


3.3 – Estratégias de competição ......................................................... 67

3.3.1 – Serviços diferenciados .................................................. 69

3.3.2 – A importância do marketing .......................................... 78

3.3.3 – Práticas ecumênicas ..................................................... 89

CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................... 93

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................. 103

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA .................................................................. 109

ANEXOS ....................................................................................................... 111

APÊNDICES ................................................................................................. 129


viii

LISTA DOS ANEXOS

ANEXO I – Base de competição dos setores oligopólicos segundo o


grau de diferenciação dos produtos ...................................... 111

ANEXO II – Exemplo de cartão do Cadastro Nacional de Pessoas


Jurídicas – CNPJ de instituição religiosa .............................. 112

ANEXO III – Sub-classes CNAE para enquadramento fiscal das


instituições religiosas ............................................................ 113

ANEXO IV – Classificação de religião adotada pelo IBGE para o Censo


Demográfico de 2000 ............................................................ 114

ANEXO V – População residente, por sexo, segundo a religião – Brasil


– 2000 ................................................................................... 120

ANEXO VI – Distribuição percentual da população segundo a religião –


Brasil – 1872-2000 ................................................................ 122

ANEXO VII – Média de anos de estudo por religião – Brasil – 1991-2000 123

ANEXO VIII – Evolução do percentual de urbanização e de pessoas sem


religião – 1890-2000 ............................................................. 124

ANEXO IX – Quantidade de paróquias, presbíteros, diáconos, irmãos e


irmãs católicos das circunscrições eclesiásticas da
Regional Sul 1 da CNBB ....................................................... 125

ANEXO X – Exemplos de panfleto distribuído pela Igreja Universal do


Reino de Deus com intuito de atrair fiéis .............................. 127

ANEXO XI – Screenshot de enquête da Igreja Universal do Reino de


Deus para classificação dos fiéis segundo o motivo de
filiação ................................................................................... 128
ix

LISTA DE APÊNDICES

APÊNDICE A – Gráfico da Curva de Lorenz e Coeficiente de Gini


aplicado às denominações religiosas, segundo a
distribuição de fiéis – Brasil – 2000 ................................. 129

APÊNDICE B – Gráfico do Índice Herfindahl-Hirschman (IHH) de


concentração industrial do campo religioso, segundo a
participação no total de fiéis – Brasil – 1960-2000 e
Gráfico da redução percentual do Índice de Herfindahl-
Hirschman (IHH) – Brasil – 1970-2000 ............................ 130

APÊNDICE C – Gráfico da evolução das participações católicas,


evangélicas e sem-religião no total da população –
Brasil – 1950-2000 .......................................................... 131

APÊNDICE D – Análise gráfica das vantagens estratégicas de


segmentação dos fiéis pelas denominações religiosas ... 132
x

RELAÇÃO DAS SIGLAS USADAS NO TEXTO

ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica

CADE Conselho Administrativo de Defesa Econômica

CBA Companhia Brasileira de Alumínio

CERIS Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais

CMI Conselho Mundial de Igrejas

CNAE Classificação Nacional de Atividades Econômicas

CNBB Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

CNPJ Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas

CONCLA Comissão Nacional de Classificações

CONIC Conselho Nacional das Igrejas Cristãs

CPS Centro de Políticas Sociais

FGV Fundação Getúlio Vargas

GM General Motors

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IBMC Instituto Brasileiro de Marketing Católico

IBRE Instituto Brasileiro de Economia

ICAR Igreja Católica Apostólica Romana

ICOS Igreja Católica Ortodoxa Siriana do Brasil

ICR Igreja Cristã Reformada

IEAB Igreja Episcopal Anglicana do Brasil

IECLB Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil

IHH Índice Herfindahl-Hirschman

(continua)
xi

(continuação)

IM Igreja Metodista

IPU Igreja Presbiteriana Unida

IURD Igreja Universal do Reino de Deus

OPEP Organização dos Países Exportadores de Petróleo

PMR Partido Municipalista Renovador

PUC Pontifícia Universidade Católica

RCC Renovação Carismática Católica

USP Universidade de São Paulo


xii

RESUMO

CASSOLATO OLIVEIRA, M. Guilherme. Análise da estrutura de mercado da


concorrência religiosa: o oligopólio da fé. Campinas, 2005. Monografia,
Graduação em Ciências Econômicas, Pontifícia Universidade Católica de
Campinas, 2005.

O presente estudo propõe-se a compreender, à luz das teorias microeconômicas


e da sociologia da religião, o fenômeno da concorrência religiosa, que, uma vez
reconhecido, conduz-nos à problemática centrada nos aspectos estruturais que
definem o presente mercado de bens simbólicos associados à religião. Assim, na
ausência de maiores pretensões, empenha-se no objetivo de analisar a estrutura
de mercado da concorrência religiosa, orientado, sobretudo, pelos esforços de
legitimação das hipóteses de que ela não só existe, como também, tem sua
estrutura de mercado imersa em características típicas de um oligopólio secular.
Referenciado pela associação de uma análise conjuntural do campo religioso
brasileiro à uma revisão bibliográfica que compreende algumas das principais
obras relacionadas à teoria do oligopólio e ao fenômeno sociológico da
mercantilização da religião, demonstra cientificamente o conjunto de elementos
que permitem caracterizar a estrutura do mercado religioso como uma dinâmica
de competição tipicamente oligopólica; passando necessariamente pela avaliação
do grau de concentração industrial e dos instrumentos de competição
empregados, que se estendem da segmentação dos fiéis por prestação de
serviços diferenciados ao uso calculista e deliberado das técnicas de marketing.

Termos de indexação: mercado, estrutura de mercado, competição, oligopólio,


concorrência, religião, mercado religioso, sociologia da religião.
1

INTRODUÇÃO

A percepção acerca do comportamento da sociedade e do mundo, seja ela,


orientada pela sua ótica filosófica, econômica, política, religiosa ou antropológica,
no tangente às particularidades que se evidenciam para cada um nós, em meio
ao emaranhado de relações sob e sobre as quais a história da humanidade é
escrita, deve ser sempre o suficiente para despertar o aspecto investigativo que
reside em todo ser humano. Parte deste espírito de descobrimento, organizado ou
intuitivo, o processo pelo qual a sociedade se constrói, destrói e reconstrói
novamente. Dele somos servidos desde a primeira tentativa de compreensão do
ambiente no qual nos inserimos, às inspirações para as maiores descobertas de
todos os tempos.
Imersos num pequeno arbusto da incomensurável árvore de idéias tão
somente resultante desta propriedade que, pelo que se sabe, nenhuma espécie
melhor do que a nossa desenvolveu, atentamo-nos, à luz da formação humana,
social e econômica, a um fenômeno de dimensões infinitesimais, mas que ainda
assim permite-se incorporar a todos nós, inevitavelmente, de uma forma ou de
outra. Como que centrados microscopicamente numa única folha do arvoredo
sem fim, deparamo-nos com o fenômeno sociológico e, ao mesmo tempo,
econômico, protagonizado pela instituição da religião; através do qual se
reconhece a noção conflituosa do campo que a compreende e sua respectiva
convergência para um padrão comportamental secular, caracterizado pela
metáfora do mercado.
Em outros termos, propusemo-nos a compreender o fenômeno da
concorrência religiosa, que, uma vez reconhecido, conduz-nos à problemática
centrada nos aspectos estruturais que definem o presente mercado de bens
simbólicos associados à religião. Ou seja, se de fato pode-se tratar o campo
religioso em termos de concorrência e mercado; do ponto de vista econômico, sob
qual estrutura de normas, valores e padrões comportamentais esta dinâmica se
define? Assim, na ausência de maiores pretensões, empenhamo-nos no objetivo
de analisar a estrutura de mercado da concorrência religiosa.
2

Norteados por este propósito, apropriar-nos-emos de parte dos arsenais


teóricos das ciências econômicas e sociais para testar formalmente a hipótese
que se apóia na autenticidade do tratamento das relações sociais do campo
religioso em termos de mercado e, mais do que isso, se define pela possibilidade
efetiva de atribuição do comportamento das instituições religiosas às
características gerais dos segmentos oligopólicos seculares. Dedicar-nos-emos,
portanto, aos esforços de legitimação da hipótese de que a concorrência religiosa
não só existe, como também, tem sua estrutura de mercado imersa em
características típicas de um oligopólio qualquer.
Entendemos que a presente proposta de análise científica encaixa-se
positivamente no conjunto de esforços que se somam na busca por explicações
satisfatórias dos sucessivos processos de transformação da sociedade. À medida
que a sociedade se transforma, redefine-se a estrutura social que compreende o
conjunto de normas, valores e padrões comportamentais regentes das próprias
interações entre os indivíduos, grupos e classes que se sucederam nesta mesma
sociedade.
O processo ao longo do qual a sociedade vem se transformando
intensamente nos últimos séculos teve suas origens na percepção aparentemente
racional das vantagens sociais de especialização do trabalho, que destituiria o ser
humano da auto-suficiência imediata, tornando-o satisfeito por vias indiretas,
através da dinâmica do mercado. Analogamente à natureza, que fora tratada por
terra e mercantilizada como que de controle exclusivo daqueles que a cercam e
bradam pela sua propriedade, as horas de vida humana transformaram-se em
mercadoria, chamadas de trabalho e negociadas de acordo com a lógica da livre
ação dos mercados de ofertantes e demandantes.
Esta transformação tão bem tratada por moinho satânico1 instituiria as
bases pelas quais a sociedade naturalizaria a lógica do mercado para tudo que se
pudesse agregar utilidade; transformando-nos em incontroláveis negociantes de
bens e serviços que se estenderiam dos mais primordiais para subsistência
humana à nossa própria personalidade. A legitimação deste novo regime pela
sociedade asseguraria o estabelecimento de uma nova estrutura social, capaz de

1
Karl Polanyi. A grande transformação – as origens da nossa época. 5ª ed. Rio de Janeiro: Campus, 2000,
349 p.
3

normalizar as relações de troca para quaisquer necessidades de cujas


suficiências houvesse alguém desprovido.
Neste contexto, a religião, não mais própria do homem e já
institucionalizada e disposta na forma de capital religioso (ou qualificação
religiosa) sob o domínio de um corpo seleto de especialistas, adaptar-se-ia
facilmente à nova dinâmica social; transformando-se também numa mercadoria
para o consumo. No mercado de bens simbólicos que se associam à religião,
legitimado e aceito pela sociedade, a disposição de sua estrutura, traduzida pelo
conjunto definido de normas e valores eticamente incorporados, definiria os
padrões comportamentais das relações sócio-econômicas ocorridas nesta esfera.
Em outras palavras, o reconhecimento da estrutura do mercado religioso
permite-nos compreender a lógica social, econômica e cultural que orienta suas
relações. Na prática, oferece-nos um meio de compreensão crítica do processo
de mercantilização da religião, de acirramento da concorrência religiosa e do
conjunto de interações deste campo com os segmentos mais seculares da
sociedade.
A partir desta análise busca-se sentido para as recentes mudanças nas
formas de interação das instituições religiosas com a sociedade. Atualmente, no
Brasil, estas interações conformam um cenário no qual se faz presente a atuação
das igrejas e seitas através da grande mídia, até mesmo como controladoras de
emissoras de rádio e televisão2; também na política, tendo seus interesses
representados em praticamente todas as instâncias de governo, o que inclui no
presente momento o Congresso Nacional e a vice-presidência da República3.
Presenciamos o nascer dos padres e pastores midiáticos que, à medida
que tocam seus trabalhos de evangelização, são responsáveis pelo comércio de
livros, CDs e afins, que movimentam milhões a cada ano. No Brasil, estima-se
que pelo menos meio bilhão de reais anuais seja girado somente em produtos
evangélicos; grupo ao qual se atribui também as grandezas de 1 milhão de
empregos gerados e cerca de 10 000 novos pontos de pregação abertos a cada

2
As Redes Record de rádio e televisão (terceira maior do país) e Mulher de televisão, por exemplo, são
grupos de emissoras de propriedade da Igreja Universal do Reino de Deus; ao mesmo tempo, a Igreja
Católica Apostólica Romana do Brasil desenvolve suas três emissoras de TV: Rede Vida, Canção Nova e
Século XXI.
3
José de Alencar, vice-presidente da República durante o mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
filiou-se em 2005 ao Partido Municipalista Renovador (PMR), criado pela Igreja Universal do Reino de
Deus, na figura de seu fundador, o bispo Edir Macedo.
4

ano4. Na sociedade americana, estes números se multiplicam exponencialmente


em venda de livros5, quantidade de emissoras de rádio e televisão
exclusivamente cristãs, e nas bilheterias de cinema e produtos associados a
filmes e seriados desta natureza6.
Diante desta realidade, procuramos compreender os aspectos estruturais
que definem a dinâmica de concorrência no mercado religioso, bem como sua
origem e similaridade com os segmentos econômicos mais seculares.
Entendemos que as características estruturais deste mercado, vistas pela ótica
das ciências econômicas em associação às teorias sociológicas da religião, têm
muito a nos oferecer em discernimento deste fenômeno singular, ainda que
intimamente relacionado a fatores que o precedem. Uma vez sociologicamente
compreendido, apropriamo-nos das teorias econômicas para analisar este
fenômeno acerca das especificidades que permitem caracteriza-lo quanto a sua
estrutura de mercado, distinguindo-o dentro dos conceitos de monopólio,
concorrência perfeita e seus intermediários, capazes de definir as relações de
poder e competição que se envolvem.
Com base nesta orientação, trabalharemos nas próximas páginas a teoria
do oligopólio, cujo objeto se associa hipoteticamente à problemática deste estudo,
procurando resgatar historicamente alguns dos elementos observáveis ao longo
do processo pelo qual esta estrutura de mercado tornou-se predominante na
economia mundial, distinguindo-se por suas especificidades de outras formas de
organização. Entenderemos a tipologia do oligopólio e algumas de suas
características genéricas mais relevantes, tais como as barreiras econômicas ao
acirramento da dinâmica de concorrência e os instrumentos estratégicos de
competição que lhe são típicos. Neste contexto, procuraremos compreender os
aspectos teóricos característicos da dinâmica que se subentende ao conceito de
mercado oligopolizado, procurando, dentro do possível, exemplifica-lo em termos
práticos.
Num outro pólo abordaremos o objeto ao qual se pretende relacionar as
teorias microeconômicas adotadas, formando um conceito sobre o campo

4
Luciana Farnesi. Um mercado movido pela fé. Revista Exame, 16 Fev. 2005, p. 60-61.
5
A venda de livros religiosos nos EUA representa cerca de 11% de uma indústria cujo faturamento se
aproxima de US$ 14 bilhões, de acordo com Sérgio Dávila. Direita religiosa mostra rosto e lucra nos EUA de
Bush. Folha de São Paulo, Califórnia, 27 Mar 2005, caderno A, p. 15.
6
Sérgio Dávila, op. cit.
5

religioso, a partir da compreensão dos agentes que o protagonizam.


Procuraremos desenvolver as principais características que permitem definir as
instituições religiosas e os serviços que elas prestam, num contexto de
convergência destes elementos para os aspectos de organização que permitem
associa-las ao conceito de firmas atuantes. À luz do pensamento sociológico,
desenvolveremos a noção clássica de campo religioso que pressupõe a natureza
de conflito das relações dadas nesta esfera social, passando pelo processo
através do qual se formariam as bases para a constituição de um mercado de
bens simbólicos associados à religião.
A noção de concorrência religiosa adentra sociologicamente nestas bases
para explicarmos o conjunto de transformações sociais que propulsaram o
processo de mercantilização da religião, definindo uma situação de pluralidade do
campo religioso, cuja interação se traduziria pela dinâmica da concorrência de
mercado e se arrastaria, intensificando-se nestes padrões, até os dias de hoje.
Neste contexto, trabalharemos o panorama atual do campo religioso brasileiro,
quanto à posição dos agentes que o compõem, suas respectivas taxas de
participação na sociedade e alguns dos aspectos qualitativos que permitem
distingui-los entre si, no tangente às parcelas da população que detêm.
Finalmente, desenvolveremos os elementos que permitem relacionar em
definitivo as teorias microeconômicas dos mercados estruturados em oligopólio à
dinâmica de concorrência do campo religioso. Analisaremos os principais
aspectos do mercado brasileiro de bens simbólicos associados à religião, quanto
ao grau de concentração do setor e a recente evolução do cenário concorrencial,
destacando o surgimento de novas competidoras e as barreiras que
eventualmente se fazem presentes. Dentro disso, procuraremos entender os
elementos estratégicos mais importantes pelos quais a dinâmica de competição
toma forma; demonstrando a importância de práticas que envolvem a
diferenciação dos serviços religiosos e a segmentação dos fiéis, a adoção dos
instrumentais de marketing e o papel das chamadas ações ecumênicas neste
processo.
Para tornar tudo isso possível, recorremos a uma revisão bibliográfica
mínima de títulos que se estenderam das teorias microeconômicas mais clássicas
no tratamento dos oligopólios a alguns dos principais pensadores da sociologia da
religião, notadamente, os que centraram a análise ao seu inter-relacionamento
6

com a esfera econômica. Neste grupo destacam-se célebres como Max Weber
(1967), Pierre Bourdieu (1974) e Peter Berger (1985); subsidiando os estudos que
se confrontariam com as idéias econômicas de Paolo Sylos-Labini (1986), Joe
Staten Bain (1956; 1963) e tantos outros. Somados a isso, contamos com
dezenas de textos oriundos das mais diversas fontes, dentre as quais se
destacam notícias, matérias e artigos de jornais e revistas da grande e pequena
imprensa; dissertações e um conjunto de dados e informações relevantes,
organizados por institutos de pesquisa como o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) e o Centro de Políticas Sociais (CPS) do Instituto Brasileiro de
Economia da Fundação Getúlio Vargas (IBRE/FGV). Além terem contribuído
grandemente os resultados de entrevistas com representantes de instituições
religiosas ou relacionadas, e as muitas discussões informais com professores e
amigos propiciadas no ambiente acadêmico e pessoal.
O presente assunto que muitas vezes tem sua abordagem polemizada em
decorrência da natureza dos valores que são postos à prova em cada discussão,
centrou-se tão somente em sua proposta acadêmica mais simples, que relaciona
dois conceitos muito próprios através de um estudo imparcial e, portanto,
tecnicamente desprovido de preconceitos que pudessem eventualmente distorcer
tendencialmente seus resultados. Assim, limita-se às fronteiras do método
científico sem invadir o campo das opiniões pessoais.
Desta forma, ao presente trabalho não atribuímos nem tampouco o menor
resquício de pretensão de reduzir o campo da religião tão somente ao aspecto
econômico e de mercado pelo qual o abordamos. Pelo contrário, reconhecemos
seus vieses independentes em absoluto deste padrão de abordagem e o absurdo
que nos parece submeter a grandeza da religião exclusivamente à dinâmica de
concorrência entre os grupos que a compõem. Neste sentido, em hipótese
alguma este trabalho contempla a idéia de que os indivíduos direta e
indiretamente envolvidos nas relações sociais ligadas ao fenômeno religioso o
fazem por motivações de caráter estritamente econômico. A fé e crença das
pessoas são plenamente reconhecidas e respeitadas, independendo, portanto, da
dinâmica de mercado à qual acreditamos que o campo religioso esteja
inevitavelmente submetido; dada a sucessão de transformações sociais que nos
antecedem e permanecem.
7

Ainda que especificado este foco e não obstante ao conjunto de referências


sob as quais este estudo foi desenvolvido, reconhecemos suas limitações e
deficiências no tangente à profundidade de análise de cada elemento presente.
Admitimos, neste sentido, a superficialidade com a qual alguns dos pontos de
menor relevância foram tratados, ainda que extremamente férteis para uma
análise mais apurada. Contudo, o presente estudo traz consigo, dentro destes
limitantes, um empenho maximizado, orientado a uma análise modesta da
estrutura de mercado da concorrência religiosa, pautadas sobre os princípios de
moralidade e ética de uma iniciação científica séria e dedicada.
8

CAPÍTULO 1 – OLIGOPÓLIO: ESTRUTURA DE MERCADO

1.1 Retrospectiva: concentração de capital e a consolidação da etapa


monopolista do capitalismo

Para o entendimento da consolidação do oligopólio enquanto estrutura de


mercado predominante na economia moderna e cuja teoria é instrumento desta
monografia de conclusão de curso, recorremos a uma retrospectiva dos fatos ao
longo da história econômica que explicaram o surgimento do capitalismo
propriamente dito, bem como as substanciais modificações em sua estrutura.
Devido a suas características marcantes, usa-se conceituar a primeira
etapa do sistema capitalista como concorrencial, que teve como lócus a Grã-
Bretanha da 1ª Revolução Industrial. Nesta fase o processo de desdobramento do
capital de sua forma acumulativa primitiva para a forma industrial foi marcado pelo
aparecimento de muitas pequenas unidades fabris conduzidas por “homens
práticos”; em geral, seus próprios proprietários, operando em condições de
competição mais ou menos perfeitas, nas quais os preços eram determinados
pelas forças de oferta e procura (dos tempos de Adam Smith e David Ricardo).
A associação de um padrão tecnológico relativamente simples, de fácil
aprendizado, transmissão e absorção7, ao baixo volume de capital inicial
requerido para se instalar um novo empreendimento e, fundamentalmente, às
condições manufatureiras, mercantis e de distribuição8 pré-existentes na
Inglaterra, criou condições para que neste país o processo de expansão
capitalista tivesse sua gênese.
Com a facilidade para que novas empresas se instalassem no mercado e a
facilidade de mobilidade dos fatores de produção, em particular, do capital, a

7
Anotações de aula de Desenvolvimento sócio-econômico, ministrada pelo professor Lineu Carlos
Mafezolli.
8
E. J. Hobsbawm (1978) apontou em Da Revolução Industrial Inglesa ao Imperialismo como fator de
vantagem da Grã-Bretanha no campo dos transportes e das comunicações o fato de que nenhuma parte do
país achava-se a mais de 112 Km do mar e menos ainda de algum curso de água navegável.
9

etapa concorrencial do capitalismo foi também caracterizada pela “tendência a


igualdade da taxa de lucro entre os vários capitais investidos na economia”9.
O professor Alonso em sua tese de doutoramento (OLIVEIRA, 1978)
afirmou sobre o capitalismo concorrencial, que esta fase “conforma uma estrutura
econômica cuja reprodução é regulada por mecanismos puramente econômicos”
e, portanto, sua expansão podia dispensar apoios externos, que, na fase da
acumulação primitiva, foram oferecidos pelo estado absolutista. O que garantia
novos investimentos às empresas eram os seus próprios lucros.
No entanto, a partir da segunda metade do século XIX, “nas principais
economias centrais, começa a se desenvolver a emergência da etapa
monopolista do capitalismo”10. Durante esta fase de re-configuração do sistema
pôde-se observar a intensificação do processo de concentração do capital,
“centrado, ao mesmo tempo, numa aceleração do ritmo de incorporação do
progresso técnico e numa nova tecnologia [...], baseada na aplicação direta da
ciência e da investigação científica”11.
Este processo de concentração, durante a 2ª Revolução Industrial, “vai
promovendo a monopolização dos principais mercados industriais por empresas
cada vez maiores”12, minimizando a importância da concorrência via preços como
forma de ocupar uma maior fatia do mercado, e transformando a concorrência
numa “rivalidade oligopolista"13.
Como explicação das razões da intensificação do processo de
concentração capitalista, várias óticas podem ser assumidas, tal como a da
revolução dos transportes, com o advento das ferrovias. Esta inovação elevou a
capacidade das empresas de atenderem regiões mais distantes, as quais
procuraram expandir suas plantas de modo a poderem produzir mais, com
menores custos, extraindo ganhos de escala que lhes colocassem em posição de
vantagem frente às concorrentes, incorporando fatias de mercado.

9
Anotações de aula de Desenvolvimento sócio-econômico, ministrada pelo professor Lineu Carlos
Mafezolli..
10
Material de apoio às aulas de Desenvolvimento sócio-econômico, ministradas pelo professor Lineu Carlos
Mafezoli, 2º semestre de 2004.
11
Idem.
12
Idem.
13
Márcio Andreolli, A estrutura oligopolista de mercado: a indústria de cerveja como oligopólio
diferenciado. São Paulo: PUC/SP, 1999. O emprego do termo “rivalidade”, em especial quando associado ao
oligopólio, será explicado no próximo tópico (1.2).
10

Bain (1963 apud ANDREOLLI, 1999, p. 20) apontou a expansão da ferrovia


como responsável pela unificação dos mercados, que, associada aos avanços
tecnológicos, teria promovido o processo de concentração na economia
americana.
Para Hilferding (apud ANDREOLLI, 1999, p. 17), no entanto, o que leva à
passagem da fase concorrencial para a monopolista é genericamente a busca
incessante do maior lucro possível. O capitalista aumenta seu lucro expandindo
sua área de atuação, vendendo em outros mercados, que oferecessem margens
de lucro superiores à média; ou devido ao seu mercado estar oferecendo
margens de lucro inferiores à média. Para o autor, neste momento de migração
para outros mercados, o capitalista se defronta com outras empresas já instaladas
e, por conta disso, com necessidade de capital substancialmente maior,
explicando, nos ramos mais dinâmicos da economia, a substituição das pequenas
empresas, características do capitalismo concorrencial pelas grandes.
A ampliação da escala de produção pode conduzir à incorporação de
capitais já estabelecidos em um mercado, por outras empresas. Esta
incorporação é uma tendência paralela à natureza de acumulação e concentração
típica do capitalismo e caracteriza um fenômeno importante do sistema: a
centralização de capital; definida por Marx como a “expropriação de capitalista por
capitalistas, transformação de muitos capitalistas menores em poucos capitalistas
maiores”14.
Pode ser entendido como derivado do processo de concentração, com
centralização de capital, o fenômeno conhecido como verticalização ou integração
vertical, com a formação de grupos econômicos nos quais várias empresas de
diversos setores – industriais ou não – são de propriedade de um mesmo capital.
Estes grupos são comumente formados a partir do momento que uma empresa
identifica uma dependência sua em relação a uma fornecedora, de insumos
básicos como o algodão para a indústria têxtil, por exemplo; ou em relação um
intermediário do intervalo da cadeia produtiva que a une aos seus clientes, tais
como os fornecedores de crédito ao consumidor. Esta empresa pode resolver,
portanto, produzir para si mesma aquilo que lhe gera dependência, incorporando
a empresa fornecedora, e constituir com isso um grupo vertical.

14
Karl Marx, “A lei geral da acumulação capitalista”. O Capital. Livro I. 2ª ed., Coleção Os economistas.
São Paulo, Ed. Nova Cultural. 1985 (1867), vol. I, Cap. XXIII: p. 196.
11

A título de exemplo, pode ser apontada a iniciativa realizada pelo Grupo


Votorantim, do empresário Antônio Ermírio de Moraes, que construiu usinas
produtoras de energia elétrica para atenderem a fabricação de alumínio de sua
companhia, a CBA – Companhia Brasileira de Alumínio15.
Chandler (1962 apud ANDREOLLI, 1999, p. 19) apontou em seus estudos
que o processo de concentração da economia americana seria decorrente de dois
fatores, dentre eles a incapacidade da rede atacadista de propiciar crédito ao
consumidor e assistência técnica aos bens duráveis, e, no que diz respeito aos
bens perecíveis, incapacidade de armazenamento. Com isso o caminho lógico
para o crescimento da empresa seria através das fusões e da contribuição das
Sociedades Anônimas (ANDREOLLI, 1999).
Teve, portanto, além do crédito voltado à produção, papel fundamental no
processo de centralização econômica, que marcou a etapa moderna do
capitalismo oligopolista, as grandes corporações de capital aberto, Sociedades
Anônimas (S/A’s), “dirigidas por executivos e não mais por seus proprietários;
empresas virtualmente ‘socializadas’ e atuando em mercados oligopolísticos, de
competição imperfeita, de preços e salários ‘administrados’, a salvo praticamente
das incertezas da oferta e da procura”16.
Todo este “crescimento das forças produtivas, do progresso tecnológico e
da produção por uma maior escala”, sejam eles decorrentes da acumulação com
concentração inerente ao próprio modo de produção capitalista ou da
centralização, “resultam num enorme incremento do capital”, como afirma
Andreolli (1999). Para o autor este crescimento acentuado de capital implica não
somente a sua dificuldade de transferência, uma vez imobilizado, mas
principalmente a exigência de maiores montantes de capital disponível nas mãos
de um indivíduo para aplicação em determinados setores.
Em decorrência desta exigência de maiores montantes de capital, fruto da
etapa monopolista, ou, a partir de agora, melhor diríamos, etapa oligopolista do
capitalismo, vieram novas barreiras à mobilidade, as quais, para Hilferding (apud

15
Atualmente a CBA é apontada como proprietária de pelo menos quinze usinas geradoras de energia elétrica
– duas delas ainda em construção –, responsáveis em conjunto por aproximadamente 2,1469% do potencial
energético brasileiro, de acordo com dados do Banco de Informações de Geração da Agência Nacional de
Energia Elétrica – ANEEL. Disponível em <http://www.aneel.gov.br>. Acessado em 19 Abr. 2005.
16
Material de apoio às aulas de Desenvolvimento sócio-econômico, ministradas pelo professor Lineu Carlos
Mafezoli, 2º semestre de 2004.
12

ANDREOLLI, 1999, p. 18), substituíam as “velhas e antigas barreiras jurídicas”,


na forma de novas “barreiras econômicas, que limitavam a liberdade do capital”17.
Em resumo, fatores econômicos, intrinsecamente associados ao sistema
capitalista, sustentaram a superação da etapa concorrencial, em direção ao
capitalismo oligopolista. A acumulação, a concentração em relação ao número de
trabalhadores e, fundamentalmente a centralização de capitais conformaram um
cenário novo às economias mundiais, no qual um número restrito de grandes
corporações, geridas por executivos, que disputam e ao mesmo tempo protegem
seus mercados, sobre os quais têm poder, visando, sobretudo, ganhos aos seus
acionistas.

1.2 O oligopólio segundo seus pressupostos

O objetivo central deste tópico do capítulo primeiro desta dissertação


consiste na definição do conceito de oligopólio à medida que este é comparado
ao conceito de concorrência perfeita, evidenciando as distinções entre essas duas
estruturas de mercado. O entendimento destes conceitos é de fundamental
importância não só para este estudo, mas, de modo geral, para todo o estudo da
realidade econômica, como pôde ser observado no tópico anterior que
demonstrou o processo histórico de superação da estrutura concorrencial no
capitalismo.
A palavra oligopólio é fruto da união do prefixo grego olígos – elemento
presente na composição de várias palavras com significação de pouco18 – com a
palavra pólio, derivada de poléo, cujo significado é negociar; exercer poder ou
influência19. Portanto, etimologicamente oligopólio significa “poder de negociação
de poucos”.
A origem etimológica da palavra denuncia sua distinção econômico-
conceitual mais importante: oligopólio é um tipo de estrutura de mercado, no
sentido de padrão de organização, caracterizado principalmente pelo número
limitado de empresas ofertantes presentes em um determinado setor da

17
Estas barreiras serão tratadas no item 1.4, de acordo com os estudos de Bain.
18
Oligo também pode significar pequeno ou deficiente, de acordo com o Grande Dicionário da Língua
Portuguesa (NOVO BRASIL, 1987), verbete “oligo”.
19
Dicionário Priberam, disponível em <http://www.priberam.pt>. Consultar verbete “monopólio”.
13

economia, bem como pela participação deste mercado detida por cada um dos
ofertantes.
O oligopólio pode também ser entendido com uma “tendência que reflete a
concentração da propriedade em poucas empresas de grande porte, pela fusão
entre elas, incorporação ou mesmo eliminação (por compra, dupping e outras
práticas restritivas) das pequenas empresas”, como definiu Sandroni (2001)20.
Naturalmente, este número limitado de ofertantes que concentra
significativos montantes de capital nas mãos de poucas empresas, o que lhes
permite conquistar um poder de mercado diferenciado em relação ao existente em
situação de concorrência entre muitos ofertantes (concorrência perfeita ou,
simplesmente, concorrência), exige dos dirigentes das empresas oligopolistas
atenção redobrada às decisões tomadas por suas rivais.
O emprego do termo rival é, em geral, mais apropriado para definir a
relação existente entre as empresas oligopolistas de um setor, como sugere
Ferguson (2003, p. 369) ao afirmar que “no oligopólio, tecnicamente, falta a
concorrência, porém muitas vezes há intensa rivalidade ou concorrência no
sentido popular”.
O mesmo Ferguson (2003, p. 369) afirma “existir oligopólio quando mais de
um vendedor estiver no mercado, porém quando o número não [grifo nosso] for
tão grande a ponto de se poder negligenciar a contribuição de cada um”,
encerrando, portanto, a definição clássica de oligopólio; trata-se de uma estrutura
de mercado caracterizada pela de existência de poucos ofertantes – pelo menos
dois – de modo que as decisões tomadas individualmente por cada firma não só
podem mas, em geral, de fato afetam o comportamento do setor como um todo.
Doravante conceituado, retornamos então à abordagem do oligopólio do
ponto de vista do problema econômico envolvido, o qual transcende o viés
quantitativo da definição do conceito21, diferenciando qualitativamente esta
estrutura de mercado das demais contempladas pela teoria microeconômica.
De acordo com Ferguson (2003, p. 370), “quando existem poucos
vendedores, cada um deve estar consciente das ações de seus rivais e de suas
reações às mudanças em sua política”; por esta mesma razão, Pindyck e

20
Paulo Sandroni, Novíssimo dicionário de economia. 7ª ed. São Paulo: Best Seller, 2001. Ver verbete
Oligopólio.
21
O número de participantes num mercado é o ponto de partida para definir sua estrutura. Ferguson apontou
como “conveniente” a classificação dos mercados segundo essa diferença. Ver FERGUSON, 2003. p. 269.
14

Rubinfeld (2002, p. 427) associaram complexidade à administração da empresa


oligopolista uma vez que “as decisões relativas ao preço, nível de produção,
propaganda e investimentos envolvem importantes considerações estratégicas”.
Completam, “pelo fato de haver poucas empresas concorrendo, cada uma deve
cautelosamente considerar como suas ações afetarão as rivais, bem como as
possíveis reações que suas concorrentes terão” (PINDYCK; RUBINFELD, 2002,
p. 427).
Pindyck e Rubinfeld (2002, p. 427) exemplificam esta discussão, ensaiando
a situação hipotética da Ford – uma empresa oligopolista no mercado
automobilístico norte-americano – considerar a possibilidade de conceder um
desconto de 10% sobre as vendas, no intuito de estimular sua demanda. Por
outro lado, a Chrysler e a GM, “sensibilizadas” pela iniciativa unilateral da rival,
poderiam resolver oferecer o mesmo desconto e reduzir a massa de lucro total do
setor; ou iniciar uma guerra de preços com conseqüentes reduções drásticas nos
lucros das companhias, ao concederem descontos de, digamos, 15%, no mínimo.
Por conta desta complexidade administrativa, os rivais podem tentar
adivinhar os planos de cada participante; podem tacitamente concordar em
competir através da propaganda, diferenciação de produtos, reputação, serviços
aos clientes, etc; ou formar expressamente um acordo e cooperar, reconhecendo
seu o potencial de monopólio (FERGUSON, 2003, p. 370). Segundo Ferguson
(2003, p. 370), “há tantos resultados diferentes quanto há oligopólios”, o que
inviabilizaria o exame de cada um deles.
Ao evidenciarmos a restrição do número de empresas participantes, que
são de grande porte e concentram um significativo montante de capital, e, por
conta disso, a existência de um inter-relacionamento entre as ações dos
competidores, chegamos, portanto, ao terceiro pressuposto básico para
caracterização de uma estrutura de mercado oligopolizada: a existência de
barreiras à entrada.
É predominante numa estrutura oligopolizada a existência de barreiras ao
ingresso de novos rivais. Em geral essas barreiras são naturalmente constituídas,
na forma de exigências mercadológicas quanto à escala de produção, padrão
tecnológico, exclusividades no fornecimento de insumos e manipulação das
fontes de matérias-primas, concentração de capital inicial necessário, entre outros
exemplos que serão abordados no item 1.4 deste mesmo capítulo.
15

Em associação a estas características apresentamos a observação


presente na análise do oligopólio de Labini (1986), a qual atribui à preocupação
motriz da empresa oligopólica a manutenção de sua participação no mercado e,
fundamentalmente, sua ampliação. É evidente que, enquanto entidades
capitalistas, não só objetivam, mas inclusive dependem da obtenção de lucros,
contudo a preocupação preponderante seria, de acordo com Labini (1986), focada
na parcela do mercado que detêm.
Outra característica importante para a definição do oligopólio é a base de
competição, a qual, em geral, é menos presente na forma de concorrência de
preços do que na forma de diferenciação de produtos, como atesta Ferguson
(2003, p. 402) ao afirmar que, “em termos práticos, a concorrrência-preço ativa é
raramente observada nos mercados oligopolísticos [e...] a concorrência extra-
preço envolve a diferenciação do produto”. Para Dorfman (1972 apud
ANDREOLLI, 1999, p. 16) também, “os oligopólios se enfrentam recorrendo a
publicidade, variação de produtos, espionagem industrial, mas não via preço”.
Com a diferenciação, as empresas do mercado oligopólico visam assegurar
aos seus produtos um caráter de exclusividade, retirando-os da concorrência.
Assim, as empresas podem conseguir, de acordo com Andreolli (1999),
“vantagens com relação aos seus concorrentes como, por exemplo, a fidelidade
dos consumidores a uma determinada marca em comparação a outra”. Para o
autor, “os meios mais importantes e mais utilizados para acentuar a diferenciação
de um produto a outro são: reputação, embalagem, formato, qualidade, cor, sabor
e investimento publicitário, principalmente através da propaganda” (ANDREOLLI,
1999). No item 1.5, estas bases de diferenciação serão abordadas na forma de
instrumentos estratégicos de competição.
Finalmente, ao tratarmos do oligopólio, pressupomos (i) um mercado
caracterizado por um número pequeno de grandes ofertantes, os quais
concentram um elevado montante de capital e detêm parcelas significativas deste
mercado, sobre o qual têm poder de imposição de preços22. Por conta disso (ii)
estão inter-relacionados, no sentido de que as ações de uma empresa
individualmente afeta as demais, assim como as possíveis reações das demais
também a afetarão. Estas poucas grandes empresas (iii) agem principalmente em

22
Adam Smith já afirmava em A riqueza das nações que “quando o número de empresários é ou tornou-se
reduzido, fica fácil, para eles, estabelecerem um acordo de controle de preços”, apud Labini (1986).
16

defesa de suas parcelas do mercado e contam com a imposição natural de (iv)


barreiras à entrada de novos competidores. Competidores que, uma vez
integrantes de um mercado oligopolizado, disputam espaço fundamentalmente
por meio políticas extra-preço, com destaque à (v) diferenciação de produtos,
propaganda e serviços aos clientes.
O conjunto dessas pressuposições evidencia a diferença da estrutura de
mercado oligopolista da abstração teórica da concorrência propriamente dita
(concorrência perfeita), na qual há um (i) elevado número de vendedores e
compradores, de modo que estes são tão pequenos em relação ao mercado, a
ponto de não possuírem influência no preço daquilo que compram e vendem.
Mesmo que vendedores ou compradores individualmente deixem ou ingressem
no mercado, este não sofreria influência. Na concorrência, (ii) o produto é
homogêneo e, portanto, as alternativas de consumo são perfeitamente
substituíveis; (iii) há livre entrada e saída de empresas23; (iv) as informações
detidas por todas as unidades econômicas são plenamente simétricas; e, (v) não
existem restrições de oferta e de demanda dos produtos, já que o mercado seria
naturalmente equilibrado (Lei de Say).

1.3 Configurações da estrutura oligopolista

Este tópico visa caracterizar os tipos de oligopólio segundo as clássicas


configurações possíveis nesta estrutura de mercado propostas fundamentalmente
por Labini (1986); contudo, para seu entendimento, julga-se importante uma
explanação preliminar da origem desta discussão, ainda com a crítica de Piero
Sraffa (apud LABINI, 1986) à teoria marshalliana.
Os economistas neoclássicos usavam classificar as formas de mercado por
meio da observação do número de empresas operando em um setor produtivo. À
medida que o número de empresas fosse relativamente pequeno ou relativamente
grande, o mercado poderia ser classificado como monopólico ou em concorrência,
respectivamente. Segundo esse princípio, quando a produção de um determinado
setor estivesse dividida entre grande número de empresas as conclusões

23
Inexistência de barreiras.
17

específicas da teoria de concorrência poderiam ser aplicadas, mesmo no caso de


poderem ser observadas imperfeições na relação de troca de mercadorias. Essas
trocas seriam consideradas atritos que simplesmente retardariam ou modificariam
ligeiramente os efeitos das forças da concorrência, os quais, em tese,
prevaleceriam.
Para Sraffa (apud LABINI, 1986) essa opinião parecia ser
“fundamentalmente inaceitável”, já que essas imperfeições à condição essencial
da concorrência jamais poderiam ser qualificadas como “atritos” simplesmente;
elas representariam “forças ativas que produzem efeito permanentemente
cumulativos”, ao ponto de serem “objeto de uma análise baseada em condições
estáticas”. Portanto aquilo que assumia caráter insignificante para os economistas
neoclássicos na qualificação de uma estrutura de mercado era, para Sraffa (apud
LABINI, 1986), fator culminante neste processo de determinação da estrutura de
mercado. Concluiu, então, que o número de empresas em um dado ramo não
prova que há ou não concorrência.
A partir desta crítica de Sraffa (apud LABINI, 1986), economistas puderam
questionar a noção comum segundo a qual as grandes empresas, pelo fato de
serem grandes, possuem poder de monopólio. O fizeram aplicando a observação
de Sraffa (apud LABINI, 1986):

Se é verdade que o grande número de empresas em dado setor


de atividade não constitui em si prova e evidência de que naquela
atividade prevaleça a concorrência, é também verdade o
contrário: um número limitado de empresas não significa que
essas empresas tenham poder monopolístico. (LABINI, 1986)

A estrutura de mercado não é determinada, portanto, simplesmente pelo


grau de concentração numa empresa. É fato que em geral essa concentração
acrescenta poder de mercado às empresas, já que se reconhece que a produção
de cada uma das empresas influencia nos preços, mesmo que sensivelmente,
pois exclui a concorrência pura (LABINI, 1986); contudo, via de regra, não se
pode relacionar irrestritamente o poder de mercado com o grau de concentração
deste mercado.
18

Labini (1986) considerou, a título de exemplificação desta observação, a


situação existente na produção de produtos manufaturados de consumo e nas
atividades comerciais, nas quais predominam a existência de muitas pequenas
empresas, aparentemente em concorrência entre si, mas na realidade dotadas de
poderes de mercado bem definidos24. Neste caso, os produtos são diferenciados
entre os vários produtores e cada ofertante é monopolista do seu próprio produto.
A amplitude do “mercado em geral”25 só pode então ser medida a partir do grau
de substitutibilidade, ou mais exatamente, do grau de “elasticidade indireta” da
demanda.
Diante destas considerações, Labini (1986) procurou analisar o oligopólio
considerando-o, em relação à teoria da concorrência imperfeita, “uma posterior
aproximação com a realidade”, e re-classificou esta estrutura de mercado em sub-
estruturas: oligopólio puro ou concentrado, oligopólio diferenciado e oligopólio
misto.
Também foi proposta por Leftwich (1974 apud ANDREOLLI, 1999), em O
sistema e preços e alocação de recursos, uma classificação dos tipos de
oligopólio, segundo o grau de organização corrente entre os participantes do
mercado. O oligopólio conivente e organizado, que corresponde aos cartéis; o
oligopólio conivente e não organizado, caracterizado pelos acordos informais ou
tácitos; e, por último, o oligopólio não conivente e não organizado, no qual as
empresas agem independentemente umas das outras.
Nesta obra trabalharemos com as configurações de oligopólio propostas
por Labini.

1.3.1 Oligopólio puro ou concentrado

Oligopólio concentrado, também chamado de oligopólio puro, foi a


classificação atribuída por Labini (1986) às estruturas de mercado oligopolistas
nas quais existem um elevado grau de concentração técnica e econômica, o que
significa que um número restrito de empresas detém uma parcela significativa do

24
A análise destas formas de mercado foi aprofundada por teóricos da concorrência imperfeita e/ou
monopolística, tais como o próprio Piero Sraffa e Joan Violet Robinson (apud LABINI, 1986).
25
Para Labini (1986), na competição entre produtos não homogêneos o conceito de indústria perde seu
significado e para o conceito de mercado deve-se distinguir o mercado “particular” dos produtos de cada
empresa do mercado “geral”, no qual competem todos os produtos relativamente diferenciados, substitutos
mais próximos uns dos outros.
19

mercado. J. Galbraith (1948, p. 107 apud LABINI, 1986) afirma que o “oligopólio é
a maneira mais apropriada para se analisar os mercados industriais dos Estados
Unidos”, baseando-se nas conclusões de vários estudos empíricos da estrutura
da indústria americana26.
Andreolli (1999) atribui a esse alto grau de concentração a ocorrência de
economias técnicas de escala, do elevado montante de capital inicial mínimo, do
controle de tecnologia ou dos insumos e do privilégio dessas unidades produtivas
em relação às condições de financiamento e crédito.
Além do elevado grau de concentração técnica e econômica (i), são
também características do oligopólio concentrado segundo Andreolli (ii) a
existência de barreiras criadas pela técnica em relação aos rivais27; (iii)
homogeneidade de produtos, em que a diferenciação, quando existe, se dá ao
nível da qualidade ou de especificações dos produtos; (iv) liderança de preço de
uma empresa; (v) técnicas importantes de produção, que permitem a coexistência
de empresas de vários tamanhos numa indústria, gerando, por conseqüência,
diferentes níveis de custos de produção.
Os principais setores onde podem ser observadas situações características
de oligopólio concentrado são as indústrias produtoras de insumos básicos como,
por exemplo, ferro, aço, matérias-primas químicas farmacêuticas, eletricidade,
petróleo, cimento, papel e celulose (ANDREOLLI, 1999, p. 27).

1.3.2 Oligopólio diferenciado

Para caracterizar as situações de estruturas de mercado nas quais tem


relevância certa diferenciação de produtos, Labini empregou o termo “oligopólio
diferenciado” ou “oligopólio imperfeito”, expressão esta última por ele considerada
mais apropriada (LABINI, 1986, p. 35).
Para Andreolli (1999) o oligopólio diferenciado é predominante dentre as
indústrias produtoras de bens de consumo não duráveis e suas particularidades
consistem, basicamente, em (i) elevados custos de comercialização, vendas e
propaganda, explicado pela alta diferenciação de produtos; (ii) concorrência entre

26
J. Galbraith, Monopoly and the concentration of economic power. In: Survey of Contemporary Economics.
Coordenado por H. S. Ellis. Philadelphia: Blakiston, 1948, p. 107. (apud LABINI, 1986).
27
Andreolli (1999) não se refere às barreiras ligadas ao produto final, mas ligadas à técnica de produção.
20

as empresas via publicidade, principalmente, lançando novos produtos; (iii) pouca


diversidade de técnicas utilizadas pelas empresas; (iv) inexistência de liderança
de preços; (v) minimização dos custos de distribuição, de comercialização e de
transporte; (vi) existência de barreiras à entrada de novas firmas, tanto internas
(ligadas ao produto, tal como marca) quanto externas (gastos e investimentos
necessários para instalação de fábricas com capacidade de produção igual ou
superior à capacidade de produção das fábricas já existentes)28.
O capital requerido das firmas ingressantes nos mercados em oligopólio
diferenciado exige destas firmas a superação das dificuldades de obtenção de
recursos, melhores condições de financiamentos. Terão de captar clientes em
número suficiente para ressarcir o capital investido, ao passo que enfrenta a
reputação de mercado conquistada pelas empresas já instaladas dos clientes
que, no decorrer do tempo, criaram “lealdade” aos produtos que consomem. São
também barreiras à entrada destas empresas no setor caracterizado por esta sub-
estrutura os gastos com publicidade e tecnologia29.
Andreolli (1999, p. 28) também fez questão de destacar como barreira à
entrada, no oligopólio diferenciado, relacionada com a extensão do mercado, a
imposição de dimensões amplas de mercado, impostas pelas empresas situadas,
exigindo que as novas rivais contem com um volume de vendas relativamente
grandes desde o início.
Podem predominantemente ser qualificados como oligopolistas
diferenciados os setores produtores de cigarros, de produtos farmacêuticos,
perfumes, conservas, licores e bebidas30.

1.3.3 Oligopólio misto

Típico de indústrias produtoras de bens de consumo duráveis, tais como


automóveis, pneus, eletroeletrônicos e eletrodomésticos em geral, o oligopólio
misto consiste na forma intermediária entre os dois primeiros conceitos.
Apresenta as características de concentração de capital e de diferenciação de
produtos.

28
Márcio Andreolli, op.cit.
29
Idem, ibidem.
30
Idem, ibidem.
21

1.4 Barreiras à entrada

À medida que os mercados vão se concentrando em um número limitado


de grandes empresas oligopólicas, as características individuais de uma firma têm
forte participação na determinação das características do setor como um todo. Se
num mercado oligopolizado houver uma firma estabelecida que possua uma
determinada capacidade produtiva instalada, de modo que determine seu raio de
atuação, empresas que almejem ingressar neste mercado devem incluir em sua
análise de viabilidade do empreendimento um pré-requisito no que tange ao
tamanho da planta, condizente com o da empresa já estabelecida.
Nos oligopólios, as empresas contam com poder de mercado e, portanto,
discriminam preços de acordo com suas estruturas de custo. Conseqüentemente,
capitais entrantes em potencial somente se sentirão atraídos a ingressarem de
fato no mercado se, ao preço praticado pelas estabelecidas, tiverem expectativas
de lucros compensatórios do investimento.
Implicações como estas são tratadas como barreiras à entrada de novas
empresas competidoras em um mercado. Caracterizam uma condição estrutural
que, em geral, são medidas e analisadas constantemente por firmas
estabelecidas, que visam pelo menos a manutenção, por meio da proteção, de
suas condições de lucratividade, e por firmas entrantes, que apuram suas
possibilidades de extrair retornos. Para Bain (1963, p. 262), estas “condições de
entrada como características estruturais de uma indústria se referem às
vantagens que gozam os vendedores já estabelecidos na indústria sobre os
vendedores potenciais que desejam entrar nela”31.
As barreiras à entrada estruturalmente constituídas (econômicas) se
associam às barreiras legais ou jurídicas e podem também ser entendidas como o
resultado de ações deliberadas dos grandes oligopólios, no sentido de
protegerem seus mercados da contestabilidade por capitais entrantes em
potencial. A teoria dos mercados contestáveis de Baumol (1947) assume que um

31
“Las condiciones de entrada como característica estructural de una industria se refieren a las ventajas que
gozam los vendedores ya estabelecidos en la industria sobre los vendedores potenciales que deseen entrar en
ella” (BAIN, 1963. p. 262).
22

mercado é considerado contestável quando, dentre outros fatores, inexistem as


barreiras à entrada e à saída (ausência de custos irreversíveis) de capitais. Neste
caso, uma firma pode entrar no mercado contestando a estrutura de custos das
empresas já estabelecidas e competindo com elas, extraindo lucros até que uma
reação do mercado a convença a deixar a competição32.
Com base nos estudos de Bain (1956), seguiremos classificando e
definindo estas barreiras à entrada que fazem parte da caracterização da
estrutura de mercado oligopolística, dividindo-as em três tipos: barreiras
constituídas por economias de escala, barreiras constituídas pelo custo absoluto e
barreiras constituídas por diferenciação de produtos.

1.4.1 Economias de larga escala como barreiras à entrada

Empresas que operam com grandes escalas de produção naturalmente


apresentam custos médios reduzidos, já que a parcela fixa dos custos e despesas
totais é rateada entre uma quantidade maior de produtos fabricados e, portanto,
pode-se dizer que quanto maior a escala de produção; menores os custos
unitários. Baseando-se nesta observação, Bain (1956) apontou como uma
barreira à entrada de novas empresas competidoras a escala mínima de
produção que lhes são requeridas para que operem com custos médios similares
aos apresentados pelas empresas estabelecidas no mercado. Caso uma empresa
entrante não seja capaz de operar em grande escala, ela encontrará
desvantagens quanto aos seus custos, que podem, inclusive ser superiores aos
preços praticados.
Presume-se que empresas com capacidade de investimento publicitário
que resulte em significativos incrementos na quantidade vendida, tal como
informe comercial em rede de televisão aberta durante o horário considerado
nobre, tendam a pagar menos por unidade acrescida nas vendas do que
empresas que anunciem num jornal de distribuição regional restrita, às quartas-
feiras, por exemplo33. Neste caso específico, a empresa com poder de opção pela

32
Baumol (1947) acreditava que, no intuito de prevenirem-se da contestação, as empresas estabelecidas
tenderiam à máxima eficiência. Assim, manter-se-iam num nível de custos que lhes permitissem transacionar
a preços baixos, de modo que os rivais em potencial não se sentiriam motivados a ingressar no mercado.
33
O exemplo do anúncio de jornal distribuído em quarta-feira deve à presunção de que, em geral, às quartas-
feiras vendem-se menos jornais do que aos domingos.
23

publicidade de TV, obteria ganhos de escala superiores aos da rival menos


poderosa.
Podem ser apontadas como principais economias de escala as obtidas de
acordo com o nível de produção, pesquisa, marketing e serviços. Andreolli (1999)
associa também às barreiras à entrada por economias de escala o acesso aos
canais de distribuição, para os quais geralmente são privilegiados os fabricantes
de produtos com maior aceitação junto aos consumidores.

1.4.2 Vantagens de custo absoluto das empresas estabelecidas como


barreiras à entrada

As barreiras à entrada constituídas pela vantagem de custo absoluto das


empresas estabelecidas em relação às entrantes consistem no pressuposto de
Bain (1956) de que “os custos unitários de produção das firmas potencialmente
entrantes são geralmente, e mais ou menos a quaisquer escalas comuns de
operações, superiores aos das firmas estabelecidas”34. Em terminologia da teoria
de preços, significa afirmar que a curva de custo médio a longo prazo em função
da quantidade produzida encontrar-se-ia em um nível mais elevado para a
empresa entrante do que para a empresa já estabelecida.
Para Bain (1956), essa vantagem da empresa estabelecida existiria no
caso de a empresa entrante apropriar-se de técnicas de produção inferiores às
utilizadas, ou sujeitar-se ao pagamento de preços mais elevados dos fatores de
produção, tais como trabalho, materiais, plantas e capital monetário. Bain (1956)
categorizou as principais fontes de vantagens por custo absoluto em quatro tipos:
(1) As empresas estabelecidas podem apresentar um controle
superior das técnicas de produção, o que lhes permitiria
inclusive, caso as empresas entrantes sejam coniventes, cobrar
taxas de royalty pela utilização das técnicas que detêm. O
controle dessas técnicas pode ser exercido através de patentes,
procedimentos secretos, ou ambos.
(2) Pode haver imperfeições de mercado que assegurem às
empresas estabelecidas o fornecimento de fatores produtivos a

34
“[...] unit costs of production of potential entrant firms are generally and more or less at any common scale
of operations, higher than those of established firms” (BAIN, 1956. p. 144).
24

preços mais baixos do que àqueles que seriam oferecidos às


empresas entrantes.
(3) As reservas de fatores estratégicos, especialmente fontes de
recursos naturais, utilizados como insumos e matérias-primas da
produção, podem ser de propriedade ou controladas pelas
empresas estabelecidas, de modo que estas disporiam da
prerrogativa de fornecer a preços muito altos ou mesmo negar o
acesso às empresas entrantes, obrigando-as a adquirir de outros
fornecedores a preços elevados ou com qualidade inferior.
(4) Finalmente, o quarto tipo de vantagem por custo absoluto
indicado por Bain (1956) refere-se ao crédito para fornecimento
de recursos financeiros com finalidade de investimentos. O
mercado de fundos para investimento poderia impor condições
de custo mais elevado para tomar recursos emprestados às
empresas novas do que às já estabelecidas. Com dificuldades de
obtenção de grandes capitais para investimentos, as empresas
entrantes em potencial encontrar-se-iam em situação de
desvantagem em relação às empresas já estabelecidas, mais
aptas a viabilizarem suas expansões, uma vez que, ao contrário
das primeiras, disporiam de estrutura instalada suficiente para
avalizar o empréstimo.
Em derivação do quarto tipo de vantagem por custo absoluto proposto por
Bain (1956), a exigência de grande volume de capital para investimento é
lembrada, de modo geral, como uma barreira à entrada de novas empresas rivais;
contudo, Andreolli (1999) observa que o requisito de um volume de capital
expressivamente grande apenas pode ser considerado como barreira, caso
consideremos que “os prováveis ingressantes sejam indivíduos de patrimônio
relativamente pequeno perto do montante necessário para montar uma indústria”.
No entanto a realidade nos mostra que, para o caso das grandes indústrias, esta
barreira não teria peso importante, já que estas “poderiam ingressar em qualquer
setor de atividade industrial” com o capital que dispõem.
Andreolli (1999) prossegue sua observação destacando que “não é o
volume de capital em si que se torna uma barreira. Mais importante e significativo
é o fato de que em diversas indústrias, além da massa de capital necessária, o
25

retorno de capital relativamente baixo e o longo prazo de maturação do


investimento afasta os grandes investidores”.

1.4.3 Vantagens por diferenciação de produtos das empresas


estabelecidas como barreiras à entrada

“Compradores podem ter uma preferência, temporária ou permanente, por


alguns ou por todos os produtos estabelecidos [no mercado] quando comparados
aos produtos recém-chegados, e isso pode essencialmente levantar barreiras à
entrada”35. Esta é a afirmação de Bain (1956) que sustenta a indicação da
diferenciação de produtos enquanto barreira à entrada.
Para Andreolli (1999), “a diferenciação de produtos é a forma de barreira à
entrada que reflete, entre outras coisas, a lealdade dos consumidores aos
produtos das empresas estabelecidas há mais tempo”. Em geral, os
consumidores tendem a ser leais a uma marca já conhecida. Por lealdade, hábito
ou mesmo pela inércia de consumo “preferem um ou alguns de uma variedade de
produtos substitutos muito similares” (CHARBERLIN, 1933 apud BAIN, 1956, p.
114). A dificuldade envolvida na transposição desta lealdade e conseqüente
afirmação da nova marca no mercado é a verdadeira barreira à entrada às novas
empresas competidoras.
Para Bain (1956), a diferenciação entre produtos pode se dar através do
desenho ou da qualidade física de cada um, pela embalagem, pela marca mais ou
menos difundida no mercado, pelos serviços auxiliares prestados aos clientes e
por esforços promocionais de venda voltados às especificidades dos
consumidores. Atualmente, podem ser apontadas inúmeras tentativas das
empresas de diferenciarem seus produtos dos de suas rivais, que se estendem
desde a diferença física propriamente dita aos sistemas de financiamentos
oferecidos para aquisição do produto.
Bain (1956) afirma que, em conseqüência da diferenciação dos produtos
pelas empresas estabelecidas, estas asseguram para si próprias a prerrogativa
de elevarem ligeiramente seus preços em relação às rivais, no equivalente ao
excedente que os consumidores se dispõem a perder para não terem que optar

35
“Buyers may have a preference, transitory or permanent, for some or all established products as compared
to new-entrant products, and this may in essence erect some barrier to entry” (BAIN, 1956. p. 114).
26

por uma marca desconhecida. Mesmo com a perda de uma pequena parcela dos
consumidores de seus produtos, às empresas são compensatórias as elevações
de preços. Não obstante, é prática comum, embora não absoluta, a diferenciação
entre produtos de uma mesma empresa, formando linhas de um mesmo produto,
com níveis de preços diversos, visando atender várias classes de consumidores.
A fidelidade dos clientes pelos produtos das empresas estabelecidas
implica esforços de superação desta barreira pela empresa entrante em potencial,
sujeitando-se à prática de preços mais baixos; com incorporação de tecnologia
superior evidente; e, sobretudo, com muito investimento publicitário e promocional
de vendas para demonstrar a superioridade (física ou abstrata) de seu (ou seus,
eventualmente) produto em relação àqueles que os clientes estão habituados a
consumir.
A diferenciação de produtos é, certamente, o mecanismo de autodefesa
mais importante da estrutura oligopolista. Permite às empresas estabelecidas
vantagens de manutenção do preço praticado, concentrando os esforços de
disputa das participações de mercado nas diferenças de qualidade, embalagem,
durabilidade, desenho, reputação, distribuição, serviços aos clientes e,
fundamentalmente, associado a essas, no emprego da propaganda para
fortalecer sua marca.
A escala de produção em geral reduzida da empresa entrante, quando
comparada às das já estabelecidas, em associação aos esforços de superação da
barreira de diferenciação de produtos, pode resultar em dupla desvantagem à
nova empresa. A combinação de custos médios mais elevados, decorrentes da
baixa escala, com preços reduzidos, com intuito de superar as preferências dos
consumidores, compacta a margem de lucro da empresa entrante, a qual, muitas
vezes, é obrigada a operar com prejuízos por tempo indeterminado, até que seu
produto conquiste adesão e, consequentemente, afirme sua participação no
mercado.

1.5 Estratégias de mercado em oligopólio

Como pôde ser observado no segundo item deste capítulo, compõe o


escopo de pressuposições da estrutura oligopolista de mercado um modelo de
27

competição pouco (ou nada) centrado na disputa de preços. Mesmo nos modelos
mais pragmáticos de abordagem do oligopólio, tal como o de Cournot36 –
excetuando-se o de Edgeworth (FERGUSON, 2003) – o preço era tratado como
estável, “sendo a concorrência para vendas no mercado estabelecida em bases
outras que não a concorrência-preço ativa”, como afirmou Ferguson (2003, p.
402).
Ferguson (2003) fez questão de lembrar que no oligopólio “as guerras de
preços ocasionalmente acontecem”, porém isso não seria indicação de
concorrência-preço, propriamente dita. Segundo o autor, uma guerra de preços
indicaria que “os canais de comunicação (provavelmente implícitos) entre as
firmas no mercado estão temporariamente obstruídos”, e, portanto, é temporária
até que se re-estabeleçam as vias prioritárias de competição.
De acordo com Ferguson (2003) os mecanismos de concorrência extra-
preço são os mais diversos, contudo, dentre eles, destacam-se no oligopólio os
meios que envolvem a diferenciação do produto mais ou menos homogêneo, cuja
importância enquanto meio de imposição de barreiras à entrada de novas rivais
foi tratada anteriormente.
Os graus de diferenciação dos produtos das indústrias, em geral, podem
ser classificados por faixa de intensidade, as quais se associam às técnicas de
concorrência extra-preço comumente utilizadas, que incluem a propaganda, a
qualidade do produto, o desenho, os serviços complementares prestados aos
clientes, etc. Estrategicamente, as empresas compõem um mix destas técnicas,
que neste tópico procuraremos exemplificar.
Este item, de modo geral, visa analisar modestamente os instrumentos
estratégicos adotados pelas empresas oligopolistas diante do mercado, com o fim
de atenderem aos seus objetivos de expansão de suas participações (“atrair
fregueses”37) e obtenção de lucro. Sendo assim, além dos meios de concorrência
extra-preço, estão presentes também nesta discussão as estratégias de redução
da concorrência, alianças na forma de cartéis e lideranças colusivas, que
aumentam a rigidez da indústria e, de acordo com as teorias clássicas, roubam o
excedente dos consumidores.

36
Sobre o modelo de Cournot podem ser consultados PINDYCK & RUBINFELD (2002) e FERGUSON
(2003). O assunto não foi abordado nesta pesquisa devido à inviabilidade de tratamento das variáveis preço e
quantidade para o objeto deste estudo: a concorrência entre as religiões.
37
Expressão utilizado por Ferguson (2003, p. 402).
28

1.5.1 Bases de competição extra-preço

Ferguson (2003) evidencia dentre as técnicas de competição extra-preço,


que visam romper a barreira da diferenciação de produtos e conquistar para a
firma participação no mercado, a propaganda, os diferenciais de qualidade e as
diferenças de desenho.
A propaganda, para o autor, é talvez a técnica mais importante e tem sido o
mais “aceito e aceitável” método de “atrair fregueses”, dentre os homens de
negócios, nos Estados Unidos e nos países europeus. O autor aponta a
propaganda como uma “prática estabelecida e presumivelmente válida porque, de
outra forma, os empresários não continuariam gastando bilhões de dólares
anualmente nesse tipo de concorrência extra-preço” (FERGUSON, 2003), mesmo
diante da “obscuridade” da discussão dos prós e contras dos gastos com a
propaganda.
A criação de diferenciais de qualidade entre os produtos é também uma
forma importante de concorrência extra-preço. Em geral, a empresa oligopolista
procura segmentar, de acordo com o potencial de consumo, os mercados em sub-
mercados, para os quais desenvolve produtos com diferentes qualidades e,
conseqüentemente, possam atender ao poder de compra de cada classe. A
segmentação do mercado em sub-mercados permite ao oligopólio discriminar
preços diversos, em função da qualidade dos produtos ofertados, de acordo com
o ponto da curva de demanda que se encontram os consumidores, protegendo-se
da exclusão das fatias de mercado sem correspondência com o preço único
praticado.
Ferguson (2003) cita a indústria de automóvel como exemplo da
concorrência extra-preço por criação de diferenciais de qualidade. No Brasil,
igualmente, o exemplo pode ser utilizado; a General Motors (marca Chevrolet, no
Brasil) produz veículos com diferenciais de qualidade de acordo com o público-
alvo ao qual se destina. A empresa fabrica os modelos Corsa e Celta (populares);
Astra (médio); e Vectra ou Ômega (executivos).
Contudo, bem como a GM, as outras empresas rivais também adotam a
estratégia. A Volkswagem, de capital alemão, oferece ao mercado os modelos
Gol e Fox (populares); Pólo e Golf (médios); e Passat (executivo). A italiana Fiat,
29

por sua vez, possui os modelos Uno e Palio (populares); Brava e Stilo (médios); e
Marea (executivo). À medida que todas as empresas tendem a adotar a estratégia
de diversificar suas linhas de produção com produtos de diferentes qualidades e
preços, os modelos de uma companhia passam a disputar mercado com os
modelos das demais companhias. Assim os modelos Gol, Corsa e Palio disputam
entre si a liderança na categoria popular; tanto quanto os modelos Ômega, Passat
e Marea. Dessa forma, “no mercado amplo existe não só a concorrência para criar
novas classes de qualidade e obter a superioridade competitiva de ser o primeiro
no mercado, como também a concorrência dentro das classes” (FERGUSON,
2003, p. 403).
É importante lembrar que os diferenciais de qualidade não implicam
necessariamente um avanço tecnológico que promova aumento do bem-estar do
consumidor; podem limitar-se a diferenças estéticas, por exemplo, que não
apresentem a rigor variações de qualidade de uso. Isso nos leva a um terceiro
tipo de concorrência extra-preço: as diferenças de desenho.
Regularmente as fabricantes buscam dar novos designs aos seus
produtos. As gerações do modelo Gol, da Volkswagem, apresentaram evoluções
efetivas na qualidade das peças e do motor, no entanto o que distingue uma
geração de outra é, fundamentalmente o design. Outro exemplo pode ser
encontrado na indústria de eletroeletrônicos, com destaque ao aparelho de
telefonia celular; boa parte dos modelos de uma mesma fabricante possui
basicamente as mesmas funcionalidades, sem diferencial de qualidade,
entretanto são vários os desenhos, que podem custar R$ 300,00 ou R$ 1.500,00.
Ferguson (2003) cita como exemplo o mercado dos clubes de golfe. Os
produtores “mudam os modelos” anualmente para manter a assiduidade dos
freqüentadores. Campos de golfe, mais do que automóveis ou celulares, limitam a
concorrência praticamente somente ao desenho, como afirmou Ferguson (2003,
p. 403).
É certo que propaganda, diferenciais de qualidade e desenho são apenas
três das inúmeras formas de concorrência extra-preço. A estas se associam ainda
a reputação, os serviços prestados aos clientes e, entre outras, os canais de
distribuição.
Baseando-se nos estudos de Bain (1956), Andreolli (1999, p. 37) procurou
classificar algumas indústrias segundo o grau de diferenciação de produtos e
30

associá-las à base de competição – ou mix de técnicas de concorrência extra-


preço – predominante. O quadro conclusivo do estudo de Andreolli, disponível no
Anexo I desta monografia, indica que indústrias com elevado grau de
diferenciação de produtos, tais como de bebidas, cigarros e automobilística,
baseiam suas estratégias de competição principalmente na propaganda. A
indústria de automóvel agrega ainda ao mix as diferenciações de desenho e a
reputação de mercado.
A propaganda é também a base de competição predominante na indústria
com moderada diferenciação de produto. Pneus, calçados e refino de petróleo
associam ainda os diferenciais de desenho, distribuição e serviços aos clientes,
respectivamente. Já o terceiro grupo, com pouca diferenciação de produto
montam seus mixes estratégicos preferindo os serviços aos clientes (indústria de
aço) e a propaganda e o desenho (indústria esferográfica).
No pólo oposto, encontram-se as empresas com diferenciação de produtos
pouco significativa, tais como as ofertantes de cobre, cimento, papel e celulose e
matérias-primas em geral, que não possuem base de competição por
diferenciação de produtos.
Andreolli (1999) conclui neste estudo que “a diferenciação de produtos é,
notadamente, mais importante nas indústrias de bens de consumo do que nas de
bens de capital”. E, portanto, instrumentos como a propaganda são mais
utilizados pelos setores que atendem o mercado consumidor final (massa
assalariada, por exemplo) do que pelos setores que atendem empresas.

1.5.2 Alianças estratégicas

As alianças entre empresas oligopolistas rivais são ações de mercado


estratégicas para as empresas que visam limitar a atuação das forças
competitivas. A forma mais objetiva das alianças é o cartel. Trata-se do acordo
explícito (formal) entre produtores para firmarem entre si preços e níveis de
produção a serem praticados no mercado. Muito embora os cartéis eventualmente
tomem a forma de coalizão aberta, geralmente são compostos em reuniões
secretas, pois as empresas encontram-se sob a fiscalização constante das
autoridades que zelam pelo exercício da livre concorrência, a qual supostamente,
31

traria eficiência aos mercados e, por conseguinte, qualidade de vida dos seus
integrantes.
No Brasil, o órgão federal responsável pelo acompanhamento dessas
condições de mercado é o Conselho Administrativo de Defesa Econômica
(CADE). É uma agência judicante transformada em autarquia vinculada ao
Ministério da Justiça que, entre outras atribuições, “zela pela livre concorrência,
difunde a cultura da concorrência por meio de esclarecimentos ao público sobre
as formas de infração à ordem econômica e decide questões relativas às mesmas
infrações. As atribuições da agência estendem-se a todo território nacional”38.
“Os cartéis de conspiração aberta e secreta oferecem os melhores
exemplos de cartéis”. Contudo, de acordo com Ferguson (2003, p. 393),
associações comerciais e órgãos de classe, latu sensu, “realizam muitas funções
normalmente associadas a um cartel”.
Os cartéis são freqüentemente acusados de promoverem acordos que
viabilizem a prática de preços superiores àqueles resultantes da competição entre
os participantes, de modo a maximizarem seus lucros. Podem também acordarem
cláusulas de quotas de mercado que correspondam aos interesses de todos os
integrantes do cartel, dada as estruturas de custo e capacidade produtiva de cada
um.
Um famoso exemplo de cartel é a OPEP. Uma organização dos maiores
países em produção de petróleo, inicialmente fundada por Arábia Saudita, Iraque,
Irã, Kuweit e Venezuela e, posteriormente, integrada por Argélia, Equador,
Gabão, Indonésia, Líbano, Nigéria, Qatar e a União dos Emirados Árabes, que
surgiu com o objetivo de estabelecer uma política comum em relação ao petróleo
e que há vários anos vem “obtendo sucesso na elevação dos preços mundiais do
petróleo bem acima dos níveis competitivos”, como afirmaram Pindyck e
Rubinfeld (2002, p. 450).
Segundo Pindyck e Rubinfeld (2002) há duas condições principais para que
um cartel tenha sucesso. A primeira é que os membros respeitem as cláusulas
negociadas, formando uma organização estável, o que pode se apresentar uma
tarefa mais difícil do que se imagina. Embora a coalizão seja coletivamente
racional, membros do acordo podem se sentir tentados a quebrar o pacto, pois se

38
Conselho Administrativo de Defesa Econômica. O que o é CADE. Disponível em
<http://www.cade.gov.br/apresentacao/cade.asp>. Acessado em 03 Mai. 2005.
32

apropriar da vantagem relativa com preços inferiores aos praticados por todos os
outros membros, mesmo que por um tempo limitado, pode ser individualmente
mais racional. Inicialmente a OPEP, por exemplo, habituou-se a praticar preços
acordados por todos os membros, no entanto, a partir de 1976, um sistema dual
de preços foi introduzido devido à decisão da Arábia Saudita e dos Emirados
Árabes de manutenção de preços mais baixos do que os demais praticados pelos
membros do cartel39.
A segunda condição apontada por Pindyck e Rubinfeld (2002) é a
existência de condições de exercício de poder de monopólio; ou seja, a
elasticidade da demanda é um fator importante para determinação das forças de
imposição de preços por um cartel.
A existência de um cartel não está condicionada à participação de todas as
empresas atuantes em um mercado. Basta que as integrantes do acordo,
conjuntamente, possuam poder de mercado suficiente para impor suas cláusulas
às demais através do próprio mercado. Os cartéis podem ser constituídos
também por um grupo seleto de integrantes que objetivem “aniquilar” um
concorrente comum dentro da indústria.
Além desta conivência organizada entre as empresas oligopólicas na
determinação das variáveis de mercado – preço e quantidade, por exemplo –, são
também uma espécie de aliança as lideranças não organizadas, nas quais
tacitamente algumas empresas decidem seguir as diretrizes escolhidas por uma
empresa líder.
Em geral este tipo de acordo não organizado, principalmente no que se
refere à determinação do preço, pode se dar pelo (i) domínio do mercado por uma
empresa líder, ou seja, quando uma firma detém pelo menos metade do total das
indústrias e as outras não são grandes o bastante para contrapor sua liderança;
(ii) quando, simplesmente, as empresas reconhecem o interesse comum tendo
um comportamento cooperativo, ou seja, sobrepõem os interesses coletivos aos
individuais (liderança colusiva); e, finalmente, (iii) quando uma empresa assume a
liderança por desempenhar bem o papel de “barômetro” das condições de
mercado, medindo suas pressões (liderança barométrica).

39
Paulo Sandroni, Novíssimo dicionário de economia. 7ª ed. São Paulo: Best Seller, 2001. Ver verbete OPEP
– Organização dos Países Exportadores de Petróleo.
33

1.6 Exemplo de mercado oligopolizado: a indústria de bebidas no Brasil

Márcio Andreolli (1999), para obtenção do título de Mestre em Economia


pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, apresentou em dissertação de
1999, A estrutura oligopolista de mercado: a indústria de cerveja como oligopólio
diferenciado, como o próprio título sugere, um estudo que procurou classificar a
indústria de cerveja brasileira como um oligopólio diferenciado; ou seja, composta
por poucas grandes empresas atuantes num mesmo mercado, centradas na
diferenciação de produtos enquanto característica marcante.
Andreolli (1999) concluiu que a compatibilidade era justificável, em sua
maior parte, pelos aspectos diferenciáveis do produto, pela dificuldade envolvida
na entrada de novas firmas competidoras no setor, pela quantidade de empresas
atuantes no mercado e, “fundamentalmente”, pela “identificação de um processo
de concorrência priorizando o investimento publicitário” (ANDREOLLI, 1999, p.
93).
Dentre os aspectos diferenciáveis do produto, apontou que todos que
tangem à qualidade, formato e sabor “têm sua parcela de importância”. O aspecto
qualidade é tratado pelas cervejarias com investimentos em profissionais e em
laboratórios que sustentem um alto nível de qualidade para o produto. Nos
quesitos formato e tipo de embalagem, as empresas constantemente procuram
desenvolver novas embalagens. Bem como estudam novas fórmulas de
fabricação e as fórmulas de suas concorrentes no intuito de providenciarem
aprimoramentos no sabor (gosto).
Em associação aos aspectos diferenciáveis do produto, as empresas
recorrem ao “que há de melhor em termos de marketing” para conquistar a
simpatia do consumidor e defender sua reputação de mercado. Juntos
“constituem elementos de grande importância para a performance mercadológica
e financeira da indústria de cerveja”.
Andreolli (1999) indicou como barreira à entrada de novas firmas
competidoras na indústria de bebidas a (i) necessidade de grandes investimentos
em vendas, ou seja, a alta escala de produção exige da empresa entrante
investimentos em pontos de venda e distribuição e mão-de-obra qualificada; (ii)
altos investimentos na compra de equipamentos e na aplicação de tecnologia,
34

que requer cuidados especiais dada a irreversibilidade e inadaptabilidade para


outras atividades, configurando não só barreira de capital, mas também uma
barreira à saída; e (iii) investimentos elevados em publicidade, especialmente
para TV, rádio e jornal, de modo a romper a barreira de diferenciação de produtos
que atribui a preferência dos consumidores aos produtos já estabelecidos.
Poucas empresas dominam o mercado. No ano da pesquisa, Antarctica,
Brahma, Kaiser e Skol destacavam-se no mercado. Logo em seguida, a indústria
concentrou-se ainda mais com a formação da AmBev. A reputação destas
empresas estabelecidas gera grande dificuldade de conquista de espaço no
mercado pela empresa entrante.
Ações ou reações isoladas de qualquer das maiores empresas presentes
na indústria interferem no comportamento do mercado, no entanto, Andreolli
(1999) afirmou que dentre as empresas líderes até então, “acordos” ou “parcerias”
preveniam grandes impactos no mercado e procuravam manter o sucesso dos
produtos de cada empresa.
O instrumento de concorrência predominante na indústria analisada por
Andreolli (1999, p. 96) é o investimento publicitário, o qual permitiria modificar a
posição de demanda de um produto no mercado, “através das informações
levadas ao consumidor por um veículo de comunicação, sobre a marca, a
qualidade, a beleza, o formato e o sabor de um produto”. “Através da divulgação
eficiente da propaganda, as cervejarias pretendem alcançar seus objetivos de
manter e ampliar suas vendas e conseqüentemente obter o maior lucro possível”
(ANDREOLLI, 1999, p. 95).
O conjunto destas características foi suficiente para Andreolli (1999)
configurar a indústria de cerveja no Brasil como um oligopólio diferenciado, cujas
características foram tratadas no item 1.3.2 desta monografia.
35

CAPÍTULO 2 – O CAMPO RELIGIOSO

2.1 O que são as igrejas e o que elas “vendem”

Ao longo deste segundo capítulo procuraremos definir o objeto de estudo


chave deste trabalho e apontar algumas de suas características comportamentais
mais importantes para o contexto em que se insere. Em específico neste primeiro
tópico, trabalharemos as instituições religiosas enquanto indivíduos que compõem
um setor de atividade e, portanto, analisaremos, em termos de mercado, suas
características mais genéricas. Em outras palavras, desenvolveremos o conceito
de instituição religiosa pela ótica da troca, na qual estas prestam um serviço à
sociedade a qual, de alguma forma, lhes retribui; transação esta que objetiva,
sobretudo, a máxima satisfação das partes envolvidas.
As observações reunidas a partir de agora se fazem válidas para todas as
instituições religiosas, independentemente de suas participações; contudo,
centrar-nos-emos com saliência na figura específica de uma delas: a igreja.
Reconhecemos algumas das particularidades que distinguem a igreja, por
definição, de outros conceitos de instituição religiosa, tal como a seita. Enquanto
as primeiras teoricamente são pluriclassistas (não discriminam seus adeptos de
acordo com perfis), defendem a salvação universal e aceitam o mundo; as outras
se definem antagonicamente por serem, em geral, monoclassistas, pela prédica
de uma salvação exclusiva para os iniciados na religião e pela recusa do mundo,
ou seja, pela crença na proximidade do fim dos dias.
Ainda que observadas essas particularidades e, principalmente,
considerada suas importâncias para algumas conclusões ex-post às
considerações finais desta pesquisa, em termos de abrangência da aplicabilidade,
trabalharemos com uma simplificação num primeiro momento. O termo igreja será
usado em referência a todas as instituições representantes da religião cristã,
notadamente, pela predominância deste tipo específico de instituição religiosa na
sociedade brasileira – lócus desta análise – e pela possibilidade de associação
das principais idéias a seguir também às demais instituições representantes de
36

outras religiões como as mesquitas islâmicas, as sinagogas judaicas, ou mesmo o


conjunto que reúne os chamados “sem religião”.
De acordo com enciclopédia eletrônica Wikipédia, o termo religião nasceu
com a língua latina, podendo ter três interpretações diferentes: (i) “re-legio" (re-
ler), um significado atribuído por Cícero40 para descrever a repetição de
escrituras; (ii) "re-ligio" (re-ligar), o que poderia significar a tentativa humana de
"religar-se" às suas origens, ao seu criador ou ao seu passado; e (iii) "re-ligio" (re-
atar), no sentido de "prender", não de "conectar", significando uma restrição de
possibilidades. “Independente da origem, o termo é adotado para designar
qualquer conjunto de crenças e valores que compõem a fé de determinada
pessoa ou conjunto de pessoas. Cada religião inspira certas normas e motiva
certas práticas”41.
Embora consideremos também passível de associação, dispensaremos
neste estudo a extensão do conceito de religião às organizações isentas da idéia
de divindade, tais como grupos simpatizantes de determinadas ideologias sociais
ou econômicas. No intuito de manter uma similaridade42 mínima entre agentes
analisados, trabalharemos com a noção restrita de religião ao institucionalismo
dos serviços ou cultos a uma divindade qualquer, “expresso por meio de ritos,
preces e observância do que se considera mandamento divino“43.
Neste contexto a igreja é uma instituição de natureza religiosa, portanto
centrada nos serviços ou cultos a uma divindade – neste caso, um Deus
onisciente, onipresente e onipotente, criador do universo – e pautada em uma
doutrina, num sistema dogmático e moral que envolve tudo que é sagrado,
devoção e fé.
Etimologicamente, o termo igreja tem origem na palavra grega ekklesia,
cujo emprego era dado para designar uma assembléia ou congregação de
pessoas. No versículo 39 do 19º capítulo do livro de Atos dos Apóstolos, da Bíblia
Sagrada do cristianismo, ekklesia é utilizada no sentido de “assembléia legal” (ou

40
Filósofo, orador, escritor, advogado e político romano (106 a.C.- 43 a.C.), juntamente com Demóstenes é
considerado o melhor expoente da oratória clássica.
41
Enciclopédia eletrônica Wikipédia – A enciclopédia livre, verbete “religião”, disponível em
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Religi%C3%A3o>
42
Esta similaridade traduzir-se-á, em termos econômicos, no grau de substitutibilidade dos serviços prestados
pelas instituições religiosas.
43
Michaelis – Moderno Dicionário da Língua Portuguesa, disponível em
<http://www2.uol.com.br/michaelis/>, verbete “religião”.
37

câmara municipal)44. A partir desta origem, o conceito de igreja evoluiu do ponto


de vista religioso para seu significado mais aceito, pelo qual ela representa para o
cristianismo o conjunto de todas as pessoas que crêem em Jesus como o Filho de
Deus, o Messias. Em Colossenses, no 18º versículo do primeiro capítulo, Jesus
Cristo é tido como “a Cabeça do corpo, que é a Igreja”45 e, portanto, para a fé
cristã, a igreja pode ser definida como a totalidade dos seguidores dos princípios
de Jesus Cristo. Esta idéia pôde ser unanimemente observada numa etapa de
entrevistas com representantes de três instituições religiosas, contemplada por
esta pesquisa. De acordo com Sua Eminência Reverendíssima, o Arcebispo
Metropolitano de Campinas e Grão-Chanceler da Pontifícia Universidade Católica
de Campinas, Dom Bruno Gamberini, o elemento básico para existência e
funcionamento de uma igreja é o próprio povo. Em suas próprias palavras, “sem
povo não existe igreja”.
Em extensão ao conceito de totalidade, a palavra igreja também é
empregada para designar denominações específicas do cristianismo,
segmentando-as de acordo com suas particularidades. Desta forma, pode-se
pensar em várias igrejas dentro de uma igreja; ou, em termos práticos, a Igreja
cristã é composta por diversas denominações: Igreja Luterana, Igreja
Presbiteriana, Igreja Metodista, etc. Neste trabalho, empregaremos o termo
“igreja” para referenciar toda instituição religiosa cristã; o termo “denominação
religiosa”, por sua vez, será empregado no intuito de evidenciar as
particularidades entre as igrejas (ex: Igreja Católica Apostólica Romana, Igreja
Universal do Reino de Deus, Igreja Batista e Igreja Assembléia de Deus enquanto
denominações religiosas do cristianismo).
As igrejas – assembléias de pessoas que crêem em Jesus Cristo como
Filho de Deus – compartilham de um objetivo comum principal que gira em torno
da evangelização. A percepção própria de cada denominação cristã acerca dos
27 livros do Novo Testamento da Bíblia Sagrada do cristianismo (o Evangelho) é
dirigida aos leigos, de modo a prover-lhes conhecimento da vida e obra de Jesus
Cristo. Este objetivo foi apontado pelos representantes da Igreja Católica
Apostólica Romana de Campinas e da Igreja Presbiteriana Unida de Jundiaí e

44
BÍBLIA, Português. Bíblia Sagrada. Tradução: Ivo Storniolo & Euclides Martins Balancin. Edição
Pastoral. São Paulo: Paulus, 1990.
45
Idem.
38

está presente formalmente na missão da Igreja Católica de Campinas afixada na


sala de espera para audiências com o arcebispo, na Cúria Metropolitana:

“Diante dos desafios do novo milênio, atentos à realidade urbana


de nossa igreja e na vivência da mística trinitária, eucarística e
pascal, evangelizar [grifo nosso]: na força do Espírito, anunciando
Jesus Cristo e o projeto do Pai, à luz da opção preferencial pelos
pobres e excluídos, com o testemunho profético de uma igreja de
comunhão e missão, misericordiosa e solidária com os que
sofrem, acolhedora e aberta ao diálogo, para construção de um
mundo de justiça e liberdade, de irmão e irmã, sinal do Reino
definitivo”46.

No entanto, a evangelização para os religiosos pode também ser entendida


como um meio para a realização de um objetivo ainda maior: a construção do
próprio Reino dos Céus. De acordo com um pastor da Igreja Universal do Reino
de Deus, vice-responsável pelo trabalho da Catedral da Fé em Jundiaí, foi
apontado como objetivo de sua denominação, em entrevista concedida, o
“salvamento de almas para o Reino dos Céus”.
Podemos perceber, desta forma, que, ainda que apontada inicialmente
como um objetivo das igrejas, a evangelização se estende facilmente, em última
análise, à posição de meio de realização do real objetivo de todas as igrejas: a
construção do Reino dos Céus; constituído de boas ações e respectivos
resultados em vida, ou então, pela salvação e vida eterna após a morte no
paraíso. Esta idéia pode ser observada na própria missão da Igreja Católica
Apostólica Romana de Campinas, que incluiu a construção de um mundo
coerente com o “Reino definitivo”.
Neste contexto de construção de um mundo melhor, as igrejas são
procuradas por seus fiéis demandantes de bem-estar espiritual, paz, saúde,
prosperidade ou realização financeira, inclusão social, oportunidade de
participação numa uma boa ação, dentre outras carências. Com base em suas
crenças e fé, as instituições religiosas prestam seus serviços no sentido de suprir
essas necessidades, ofertando conhecimento acerca da “Divina Verdade” ou
46
Missão da Igreja Católica Apostólica Romana de Campinas, publicada na 6º PPO – 2002 / 2005 e afixada
na sala de espera para audiências com o Arcebispo, na Cúria Metropolitana.
39

habilidades milagrosas (ou sobrenaturais) de solução. Segundo Kater Filho47, do


Instituto Brasileiro de Marketing Católico – IBMC, “o produto que a igreja vende –
que na verdade é um serviço – é a salvação”48.
Pierre Bourdieu enriquece o conceito do produto afirmando que:

“os leigos não esperam da religião apenas justificações de existir


capazes de livra-los da angústia existencial da contingência e da
solidão, da miséria biológica, da doença, do sofrimento ou da
morte. Contam com ela para que lhes forneça justificações de
existir em uma posição determinada, em suma, de existir como
de fato existem, ou seja, com todas as propriedades que lhes são
socialmente inerentes”49.

A relação de troca se completa à medida que as igrejas ofertam a salvação


– em vida ou após a morte – dos males vivenciados pela sociedade, com prédica
do evangelho ou milagres e, por outro lado, recebem a fidelidade de sua demanda
e, com isso, a garantia de construção de um “Verdadeiro Reino dos Céus”; ou, em
outros termos, a legitimidade do monopólio na prestação de serviços religiosos
para um determinado grupo de leigos (BOURDIEU, 1974).
A manutenção dessa dinâmica depende de um caráter organizacional que
as igrejas assumem. Uma estrutura hierarquizada procurar assegurar o bom
funcionamento das denominações religiosas. A Igreja Universal do Reino de Deus
segue parâmetros hierárquicos, tanto para os membros quanto para as próprias
sedes da denominação, como declarou o pastor de Jundiaí em entrevista
concedida. Assim, uma unidade está diretamente submetida às diretrizes de outra
superior; à matriz, por exemplo. Segundo Sua Eminência Reverendíssima, o
Arcebispo Metropolitano de Campinas, essa estrutura é uma exigência para o
“funcionamento humano da igreja”.

47
O Mestre Antonio Miguel Kater Filho é idealizador e 2º vice-presidente do Instituto Brasileiro de
Marketing Católico – IBMC, consultor em marketing, escritor e professor universitário com mestrado pela
USP.
48
Entrevista concedida aos 27 de setembro de 2005, das 17h às 18h, na sede do IBMC, na Av. João Erbolato,
50 – sala 20 – Castelo – Campinas (SP).
49
Pierre Bourdieu. A economia das trocas simbólicas. Cap. 2 – Gênese e estrutura do campo religioso.. São
Paulo: Perspectiva, 1974. p. 48.
40

A Igreja Presbiteriana Unida, por exemplo, segundo o Pastor Abimael Etz


Rodrigues50 de Jundiaí, dispõe de um conjunto de instrumentos de estrutura
organizacional que se inicia pela manutenção de uma hierarquia de apoio – que
embora não contemple em sua totalidade o exercício de autoridade strictu sensu,
socializa um suporte de natureza intelectual e, excepcionalmente, financeiro. Essa
organização se inicia pela subordinação do Presbitério – conjunto de igrejas de
uma determinada região – à Assembléia Geral. Ao Presbitério subordinam-se as
igrejas presbiterianas e, a estas, a Assembléia interna da própria igreja, que
aprova um estatuto civil e religioso e elege sua administração na figura de um
Conselho de Presbíteros. Ao Conselho subordinam-se os diáconos, zeladores
pelos aspectos físicos da igreja (manutenção predial, por exemplo).
A organização hierárquica assume, portanto, aspecto fundamental no
funcionamento das igrejas, analogamente à dependência do nosso corpo de sua
estrutura óssea, para viabilizar sua sustentação e locomoção51. A estruturação
formal viabiliza a busca pela otimização dos processos desempenhados pelas
igrejas no cumprimento de seus objetivos de atendimento às necessidades
religiosas da população.
Com base nestas definições básicas das instituições religiosas,
observamos uma característica implícita típica de uma firma, que oferta um
serviço em troca de uma compensação; neste caso, um serviço de salvação pela
satisfação de salvar pessoas e de cumprir a doutrina na construção do Reino dos
Céus. Esta dinâmica procura ser otimizada com base no suporte de uma
organização estrutural, em geral, hierarquizada.
Legalmente, pelo Novo Código Civil de 2002, notadamente a partir da Lei
10.406/2002 que instituiu prazo de 1 ano após sua vigência para adaptação, nos
padrões impostos pelo novo Código, de todas as associações, sociedades e
fundações – dentre as quais se incluem as instituições religiosas – constituídas na
forma de leis anteriores, as atividades religiosas institucionalizadas são
minimamente regulamentadas pelo instrumento principal da sua organização: o
Estatuto Social (GARCIA, 2003). Este documento, aprovado em assembléia, deve

50
Abimael Etz Rodrigues é pastor da Igreja Presbiteriana já há 45 anos, formado em teologia pelo Seminário
Presbiteriano de Campinas, em 1959. Concedeu entrevista para este trabalho aos 29 de agosto de 2005.
51
A analogia da necessidade da estrutura óssea para o corpo humano com a organização estrutural da igreja
para o funcionamento de suas atividades foi utilizada por Sua Eminência Reverendíssima, o Arcebispo
Metropolitano de Campinas, Dom Bruno Gamberini, em entrevista concedida aos 25 de agosto de 2005, na
Cúria Metropolitana de Campinas.
41

incorporar as especificidades de cada denominação, podendo ter caráter


centralizado na sede nacional ou específico de cada unidade. Contém elementos
que discorrem sobre seguintes assuntos: denominação; fins; sede; governo;
membros e ministros, quanto à admissão e desligamento, direitos, deveres e
suspensões; atribuições e competências das administrações nacional, regional,
distrital, e de cada igreja local; demonstrações contábeis, patrimônio e recursos
econômico-financeiros; e aspectos gerais dos conselhos fiscais52.
Do ponto de vista fiscal, as instituições religiosas são registradas como
empresas sem fins lucrativos. A Comissão Nacional de Classificação – CONCLA,
ligada ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, estabeleceu
classes fiscais para o Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) das
igrejas. As classes pertencem ao grupo “Outras atividades associativas” (código
919) da divisão “Atividades associativas” (código 91), na seção “Outros serviços
coletivos, sociais e pessoais” (código O). “Atividades de organizações religiosas”
é a nomenclatura de classe mais comum (código 9191-0)53, no entanto, há
possibilidade de maior especificação por subclasses, descritas na tabela do
Anexo III.
A CNAE atribui à classe “Atividades de organizações religiosas” as
seguintes atividades: (i) atividades de organizações religiosas ou filosóficas; (ii)
atividades de igrejas, mosteiros, conventos ou organizações similares; e (iii) a
catequese, a celebração ou organização de cultos. Distingue-as, observando a
não compreensão das seguintes atividades na classe: (i) educativas (80), de
atenção à saúde (85.1) ou de cunho social (85.3) realizadas por estas
organizações; (ii) a edição e impressão de jornais, revistas, etc., por estas
organizações (22.1); e (iii) as atividades de astrólogos, videntes e similares (9309-
2/99).

2.2 Noção de campo religioso

52
Estatuto Social da Igreja de Deus no Brasil. Goiânia: Igreja de Deus no Brasil – IDB. Disponível em
<http://www.idbcampinas.com.br/estatutosocial.htm>. Acesso em 20 Set 2005.
53
Disponível em <www.cnae.ibge.gov.br>.
42

O sociólogo francês Pierre Bourdieu, em A economia das trocas


simbólicas54, analisou, a partir da fusão de alguns fundamentos clássicos da
sociologia da religião – notadamente os de Durkheim, Marx e Weber –, a gênese
e a estrutura do campo religioso, no qual, o surgimento de denominações
religiosas propriamente ditas implica uma relação de conflito no campo que as
comporta, diante dos leigos.
Bourdieu observou um relacionamento entre o nascimento e o
desenvolvimento das cidades e, em particular, os progressos da divisão do
trabalho e a aparição da separação do trabalho intelectual do trabalho material, às
tendências de constituição de um campo religioso relativamente autônomo e ao
desenvolvimento de uma necessidade de “moralização” e de “sistematização” das
crenças e práticas religiosas. Para ele, “a aparição e o desenvolvimento das
grandes religiões estão associadas à aparição e ao desenvolvimento da cidade”.
Em citação a Weber, Bourdieu ressalta o fato de que a urbanização, com
as transformações que provoca (tecnológicas, econômicas e sociais), “contribui
para a ‘racionalização’ e para a ‘moralização’ da religião”, cujo peso aumentaria
ao passo que o campo ampliasse sua autonomia, mas “apenas na medida em
que a religião favorece o desenvolvimento de um corpo de especialistas
incumbidos da gestão dos bens da salvação”. O desenvolvimento do sentimento
de “pecado” e o desejo de “redenção” são alguns dos traços que se
desenvolveram paralelamente à urbanização e substituíram a religião camponesa,
centrada, basicamente, na subordinação ao mundo natural, na “idolatria da
natureza” e na “não racionalização” dos fenômenos, intrinsecamente associada à
sazonalidade do trabalho agrícola. Como conseqüência, dentre outros, “uma
transferência da noção de pureza da ordem mágica para a ordem moral” – ou
seja, a transformação do erro em pecado –; e a própria legitimidade da existência
de um grupo de especialistas nestes assuntos.
Com a morfose da religião, imediatamente correlata ao processo de
urbanização, e a “monopolização da gestão dos bens de salvação por um corpo
de especialistas religiosos, socialmente reconhecidos como detentores exclusivos
da competência específica necessária à produção ou à reprodução de um ‘corpus’
deliberadamente organizado de conhecimentos secretos (e portanto raros)”, a

54
São Paulo, Editora Perspectiva, 1974.
43

constituição de um campo religioso foi acompanhada da “desapropriação objetiva


daqueles que dele são excluídos e que se transformam por esta razão em leigos
(ou profanos, no duplo sentido do termo55), destituídos do capital religioso
(enquanto trabalho simbólico acumulado) e reconhecendo a legitimidade desta
desapropriação pelo simples fato de que a desconhecem enquanto tal”.
Em outros termos, Bourdieu explica o surgimento do campo religioso a
partir da separação entre o corpo técnico, dotado de capital religioso –
“qualificação” religiosa para Weber –, além de hierárquica e racionalmente
estruturado, e os leigos, tecnicamente “destituídos” do saber religioso. O que não
significa, para o autor, em primeira análise, uma necessária “pauperização”
religiosa, mas um processo de concentração e acumulação nas mãos de um
grupo particular, de um capital religioso até então distribuído igualmente entre
todos os membros da sociedade. Este capital tradicional, que passa da condição
de dominante para a condição de dominado, pela sua simples desvalorização
diante da nova forma de capital, tende a deteriorar-se; implicando finalmente a
“pauperização” religiosa da sociedade pela “separação entre o saber sagrado e a
ignorância profana que o segredo exprime e reforça”.
Bourdieu reforça o argumento com a análise da transformação dos
resquícios de capital tradicional (original), uma vez “pauperizada” a população do
saber religioso, depois de desapropriada, em magia (prática profana), diante do
novo capital religioso dominante. Os aspectos formais, estruturados e racionais da
religião dominante suprimiram facilmente as práticas profanas à condição de
submissão, dado o seu estágio de desenvolvimento relativamente superior
quando confrontada com as culturas tradicionais. Para tanto, em cada espaço
geográfico conquistado, a “nova religião” pôde inclusive apropriar-se de
características tradicionalmente estabelecidas, como alguns elementos tribais;
uma vez reconhecida sua capacidade de elevada adaptação, sustentada por uma
estrutura racionalmente organizada e administrada por um grupo de sacerdotes,
responsáveis com exclusividade pelos novos padrões sociais de moral e ética.
Este caráter dinâmico da religião, que acompanha o processo de
urbanização, permite, sobretudo sob uma organização hierarquizada, que se

55
Em referência aos sentidos de “ignorantes da religião” e “estranhos ao sagrado e ao corpo de
administradores do sagrado”. Pierre Bourdieu. A economia das trocas simbólicas. Cap. 2 – Gênese e
estrutura do campo religioso.. São Paulo: Perspectiva, 1974.
44

assegure da contestação da legitimidade do monopólio eclesiástico dos


instrumentos de salvação sobre os leigos; e, por outro lado, abre espaço para o
surgimento de ideologias religiosas capazes de fazer com que o “campo religioso
recubra o campo das relações de concorrência que se estabelecem no próprio
interior da Igreja” na luta entre a ortodoxia e a heresia, potencializada quando da
solidariedade de parte do clero com interesses anti-clericais de uma fração dos
leigos.
Em resumo, a noção de campo religioso está associada à relação de
conflito entre os capitais religiosos que surgem e se estabelecem na sociedade,
tendo como origem principalmente identificada a partir da desapropriação do
saber religioso coletivo, com superposição de um capital organizado e
estruturado, próprio de um corpo de especialistas. E “as relações de transação
que se estabelecem, com base em interesses diferentes, entre os especialistas e
os leigos, e as relações de concorrência que opõem os diferentes especialistas no
interior do campo religioso, constituem o princípio da dinâmica do campo religioso
e também das transformações da ideologia religiosa”. (BOURDIEU, 1974, p. 50)
Externamente, mesmo em condições de monopólio eclesiástico absoluto
dos instrumentos de salvação sobre os leigos, o campo religioso foi submetido à
relação de concorrência com os opositores dos padrões dominantes; ora com o
foco nas críticas sobre o sistema de indulgências que fora estabelecido pela Igreja
Medieval, ora pelo pela simples prédica das possibilidades de salvação
alternativas. Os feiticeiros na forma de “empresários independentes” prestavam
clandestinamente seus serviços de cura notadamente às classes inferiores (em
particular, os camponeses) e, defensivamente, impunham “à Igreja a ‘ritualização’
da prática religiosa e a canonização das crenças populares”. Os profetas e as
seitas, conjugados com as críticas intelectualistas de certas categorias de leigos,
por outro lado, também concorriam perifericamente com a Igreja, a qual, diante da
ameaça, tendia a acelerar o ritmo de produção de escritos canônicos.
(BOURDIEU, 1974, p. 67-68)

2.3 A concorrência religiosa


45

Centrado originalmente na esfera econômica, o mundo vivenciou, de modo


quase geral, a partir da era que marca oficialmente o início do capitalismo e da
sociedade industrial, um processo de secularização; ou seja, uma transferência
dos padrões ético-religiosos de regimento para uma tendência à racionalização
(padrões leigos, do ponto de vista da religião), neste caso, das atividades
econômicas. Neste sentido, Peter Berger, em O dossel sagrado56, procurou
apontar a natureza correlata entre o processo de secularização (introduzido por
Weber) e a conformação de uma “pluralidade” do campo religioso, que se
traduziria numa relação de concorrência aberta entre as denominações religiosas
e, consequentemente, na superação do conceito de “campo religioso” pelo de
“mercado religioso”, propriamente.
Com base na teoria sociológica da religião de Berger57, que incorpora
elementos weberianos e durkheiminianos e, mais implicitamente, faz uso da
lógica dialética marxista, e em parte dos escritos de Lemuel Guerra58, procuramos
apresentar o processo pelo qual a natureza estritamente conflitiva do campo
religioso passou a ser analisada pela ótica do mercado, da concorrência.
Nas proximidades do processo de industrialização, estratos altamente
secularizados foram surgindo e, com isso, a religião foi sendo isolada do núcleo
econômico da sociedade, tornando conseqüente, assim, uma “crise de
credibilidade” das instituições religiosas. Em outras palavras, a secularização, que
se centrou na área econômica e, mais tarde, expandiu-se para outros pólos da
sociedade, consubstanciou uma ameaça à legitimação do monopólio dos
instrumentos de ordem da sociedade pela Igreja; ou, nos termos de Berger,
“acarretou um amplo colapso da plausibilidade das definições religiosas
tradicionais da realidade”. (BERGER, 1985, p. 139)
As raízes deste processo, segundo Berger, estão nos “processos de
racionalização desencadeados pela modernização (isto é, pelo estabelecimento
de uma ordem sócio-econômica capitalista e industrial)” na sociedade, de tal
modo que passou a fazer sentido o apontamento de um “território livre” da
religião, localizado no centro da sociedade. Território esse que “tem uma posição

56
Peter Berger. O dossel sagrado – elementos para uma teoria sociológica da religião. São Paulo: Paulinas,
1985. 194 p.
57
Idem.
58
Lemuel Dourado Guerra Sobrinho. Mercado religioso no Brasil: competição, demanda e a dinâmica da
esfera da religião. João Pessoa: Idéia, 2003. 198 p.
46

tão central na economia capitalista industrial, que qualquer tentativa para


‘reconquistá-lo’ em nome do tradicionalismo político-religioso ameaça a
continuação do funcionamento desta economia”59. Desta forma, justifica-se,
portanto, inclusive, a permanência de um corpo técnico e científico na sociedade,
dotado de características que pressupõem um alto grau de racionalização e isento
de ameaças de uma possível “tentativa de reconquista” do segmento econômico
da sociedade pela ética religiosa tradicional, sob o risco de desmantelamento da
nova ordem, que vinha garantindo o progresso.
Neste momento a religião “polarizou” sua presença mais ativa nos
extremos mais públicos e mais privados da ordem institucional; respectivamente,
o Estado e as famílias, e mesmo diante da “ampla secularização da vida cotidiana
no trabalho e nas relações que o circundam, ainda se encontram símbolos
religiosos ligados a [estas] instituições”. Berger exemplificou afirmando que “na
medida em que se admite que ‘a religião pára no portão da fábrica’, deve-se
admitir também que não se começa uma guerra ou um casamento sem os
símbolos religiosos tradicionais”60.
Contudo, Berger escreveu em explicação do processo de secularização, a
partir do momento que atinge também o Estado:

Como o Estado moderno ocupa-se cada vez mais com os


requisitos políticos e legais do gigantesco mecanismo de
produção industrial, ele deve dirigir sua própria estrutura e
ideologia para esse fim. A nível de estrutura, isso significa acima
de tudo o estabelecimento de burocracias altamente racionais; a
nível de ideologia, significa a manutenção de legitimações que
sejam adequadas para essas burocracias. Assim,
inevitavelmente, desenvolvem-se afinidades, tanto em estrutura
quanto em “espírito”, entre as esferas econômica e política61.

Com isso, a secularização passou então da esfera econômica para a


esfera política e conformou um movimento – tipicamente associável de alguma
forma a todas as economias industrializadas (independentemente do regime
59
Peter Berger. O dossel sagrado – elementos para uma teoria sociológica da religião. São Paulo: Paulinas,
1985. p. 143.
60
Idem, p. 141.
61
Idem, p. 144.
47

econômico adotado) – de “divórcio” entre o Estado e a instituição da Igreja, em


nome da manutenção dos interesses propriamente econômicos, de racionalização
da produção e da vida social, de modo geral.
Na sua relação para com a família, no entanto, a religião, segundo Berger,
mantém um potencial de “realidade” considerável e, portanto, sua relevância “em
termos de motivos e auto-interpretações das pessoas nessa esfera da atividade
social cotidiana”. Para tanto, fez-se necessárias adaptações às novas realidades,
de modo a assegurar a legitimação da religião inclusive diante das classes
familiares mais secularizadas (sócio-economicamente melhor dispostas), como a
aceitação da “individualização”.
Neste contexto, Berger define a “religião privatizada” (não mais
intimamente associada ao Estado) como uma questão de “escolha” ou
“preferência” do indivíduo ou do núcleo familiar e menciona a suspensão da
capacidade de desempenhar a sua tarefa clássica de “construção de um mundo
comum, no âmbito do qual toda a vida social recebe um significado último que
obriga a todos. Ao contrário, essa religiosidade limita-se a domínios específicos
da vida social que podem ser efetivamente segregados dos setores secularizados
62
da sociedade moderna” . Completa exemplificando essa realidade com a
ilustração de “um homem de negócios ou um político que podem aderir fielmente
às normas da vida familiar legitimadas pela religião, ao mesmo tempo em que
conduzem suas atividades na esfera pública sem qualquer referência a valores
religiosos de qualquer tipo”.
O processo de secularização, desta forma, pode ser entendido como
beneficiário e, ao mesmo tempo, condutor da situação de pluralidade religiosa, e,
portanto, do fim dos monopólios das tradições religiosas sobre a ordem social.
Assim sendo, os ex-monopólios63 religiosos deixam de contar com a submissão
de suas populações. E, uma vez que a submissão passa a ser voluntária, é
também incerta e, portanto, insegura. Para Peter Berger:

62
Idem, p. 145.
63
Peter Berger discute a existência de monopólios de tradições religiosas em várias partes do mundo
ocidental e oriental, que, cedo ou tarde, em maior ou menor intensidade, foram submetidos à perda de
legitimação do poder de determinação da ordem social como um todo com o advento da secularização
associada à industrialização.
48

Resulta daí que a tradição religiosa, que antigamente podia ser


imposta pela autoridade, agora tem que ser colocada no
mercado. Ela tem que ser “vendida” para uma clientela que não
está mais obrigada a “comprar”. A situação pluralista é, acima de
tudo, uma situação de mercado. Nela as instituições religiosas
tornam-se agências de mercado e as tradições religiosas tornam-
se comodidades de consumo64. E, de qualquer forma, grande
parte da atividade religiosa nessa situação vem a ser dominada
pela lógica da economia de mercado.

A situação de pluralidade religiosa define, portanto, uma condição a qual as


denominações religiosas diversas põem seus serviços religiosos no mercado para
que sejam “escolhidos” pelos indivíduos, com base em suas “preferências”, com
intuito, notadamente, de legitimação de suas condições de existência, pelos
princípios religiosos da salvação, da cura, etc. É conseqüência (Marx) e, ao
mesmo tempo, causa (Weber), do processo de secularização da sociedade que
se iniciou na esfera estritamente econômica e estendeu-se para a relação de
intimidade entre o Estado e o clero. Mais do que isso, representa a conformação
de uma condição de concorrência entre as denominações religiosas que se
assemelham, pela adesão dos fiéis, carentes, dentre outras coisas, de normas
para a vida familiar legitimadas pela religião.
Nestas condições são válidas ao campo religioso as regras de competição
do mercado secularizado, caracterizando um “mercado religioso”, de bens
simbólicos. Essa idéia é reforçada por Rodney Stark e George Finke que
compartilham da proposição de uma análise mercadológica do fenômeno
religioso, definindo as instituições que o compõem como “fornecedoras de
produtos para consumo religioso, atuando sob regras especificas de concorrência
pela preferência dos indivíduos”. (apud GUERRA, 2003)
O resultado da colocação das diferentes ideologias religiosas, que formam
muitas vezes doutrinas divergentes, sob uma dinâmica de “livre mercado da

64
Campos (1997, p. 213) manifesta sua insatisfação quanto à expressão “comodidades de consumo”,
empregada pelo tradutor de The sacred canopy (O dossel sagrado), de Peter Berger, para língua portuguesa
(1985). Segundo ele a sentença original “[...] the religious institutions become marketing agencies and the
religious traditions become consumer commodities […]” fora melhor traduzida em sua versão espanhola:
“[…] las instituciones religiosas se convierten en agencias comerciales y las tradiciones religiosas en
mercanderias para el consumidor […]”.
49

religião” – constituído a partir da destituição deste capital da sociedade comum e


do suprimento desta demanda social não mais imposto pela autoridade65 – é a
potencialização das diferenças e a transformação inevitável dos agentes
religiosos em concorrentes.

2.4 Panorama do campo religioso brasileiro – aspectos qualitativos das


denominações cristãs e suas respectivas taxas de participação na sociedade

Na trajetória de séculos de mudanças, ao ritmo das próprias


transformações da sociedade como um todo, o campo religioso se desenvolveu.
Desapropriou e, em seguida, pauperizou a população comum do saber religioso;
constitui-se tecnicamente e fortaleceu-se na legitimação do monopólio sobre a
orientação da ética social.
Adiante, tendo sua legitimação contestada quanto à capacidade de
acompanhamento do ritmo secular de desenvolvimento econômico, o campo
religioso foi isolado da esfera da economia e, posteriormente, do próprio Estado.
Reservado apenas na sua influência social sobre as famílias, viu-se privatizado, e,
consequentemente, obrigado a ofertar suas tradições no mercado; agora não
mais em caráter monopólico, mas de pluralidade.
As denominações religiosas ganharam o mundo por seus missionários;
conquistaram preferências e segmentaram os fiéis livres para optarem, pelas leis
do mercado, sobre as tradições religiosas que melhor atendiam suas
necessidades.
No Brasil, o Estado laico anunciado com a Proclamação da República no
final do século XIX tornou coerente no país o princípio do livre mercado religioso.
Ainda que muito distante da possibilidade de fazer sombra ao predomínio
absoluto da Igreja Católica Apostólica Romana, imigraram representantes do
cristianismo protestante e de inúmeras outras tendências religiosas, instalando-se

65
Ivone Lima Ferreira Botelho, diretora acadêmica do seminário evangélico Faculdade Latino-Americana de
Teologia Integral, lembra que, na “Idade Média, por exemplo, o fiel não tinha alternativa senão adaptar-se à
religião. [...] Hoje o que vale é a flexibilidade, tudo é relativo, Você escolhe a igreja que quiser”. Ricardo
Westin. Evangélicos criam igrejas sob medida. O Estado de São Paulo, São Paulo, 26 Jun. 2005, Caderno A,
p. 24.
50

por todo o território nacional. Hoje, religiões oriundas das mais diversas partes do
globo possuem adeptos no país.
De acordo com o estudo Retratos das Religiões no Brasil66, realizado com
base nos microdados do Censo Demográfico de 2000 (IBGE), pelo Centro de
Políticas Sociais (CPS) vinculado ao Instituto Brasileiro de Economia da
Fundação Getúlio Vargas (IBRE/FGV) no Rio de Janeiro, as 10 denominações
religiosas mais representativas na população nacional num grupo de 140 eram,
no período analisado: a Católica Apostólica Romana (73,55%), o grupo dos
chamados Sem religião (7,35%), a Igreja Evangélica Assembléia de Deus
(4,89%), Igreja Evangélica Batista (1,73%), Igreja Congregacional Cristã do Brasil
(1,46%), Espírita Kardecista (1,32%), Igreja Universal do Reino de Deus (1,24%),
Outras Evangélicas Pentecostais (0,89%), Igreja Evangelho Quadrangular
(0,77%) e Igreja Evangélica Adventista do Sétimo Dia (0,67%). Dentre as cinco
classificações menos representativas apareceram a Neoxamânica, Declaração
Múltipla de Católico/Candomblé, Outras Islamismo, Outras de Missão Episcopal
Anglicana, Outras de Origem Pentecostal Universal do Reino de Deus; todas com
população inferior a 100 adeptos.
No ranking agregado das religiões, o estudo apresentou liderança católica
com 73,89% na soma das 8 denominações que constituem o grupo67, mantendo-
nos na posição de maior nação católica do mundo (cerca de 126 milhões de
adeptos), sucedida pelo conjunto das denominações evangélicas (16,22% da
população nacional)68, dos Sem religião (7,35%), Outras religiões (1,99%) e
Espiritualistas (1,35%).
No país, o estado do Piauí apareceu como o mais católico (90,03% da
população total). Ceará, Paraíba, Rio Grande do Norte e Maranhão sucederam a
lista das 5 maiores participações católicas na população total, com,
respectivamente, 86,70%, 84,94%, 83,77% e 82,60%. Os 5 estados menos
católicos são: Rio de Janeiro (56,19%), Rondônia (57,61%), Espírito Santo
(63,23%), Distrito Federal (66,62%) e Roraima (66,78%).

66
Disponível em <http://www.fgv.br/cps/religioes/inicio.htm>. Acesso em: 21 Abr. 2005.
67
Católica Apostólica Romana; Católica Carismática, Católica Pentecostal; Católica Armênia; Católica
Ucraniana; Católica Apostólica Brasileira; Católica Ortodoxa; Ortodoxa Cristã; Outras Ortodoxas Cristãs; e
Outras Católicas.
68
Dentre o conjunto dos evangélicos estão presentes os subconjuntos das protestantes tradicionais ou de
origem de missão (4,09%) e as protestantes pentecostais ou de origem pentecostal (12,1%).
51

No ranking dos estados mais evangélicos, Rondônia lidera a lista com


27,19% da população. Espírito Santo (24,96%), Roraima (22,49%), Rio de Janeiro
(21,98%) e Amazonas (21,07%) sucedem a lista. Já o estado menos evangélico
pelo Censo de 2000 era o Piauí (6,01%). Sergipe, Ceará, Paraíba e Rio Grande
do Norte parecem em seguida com percentuais na faixa de 7% a 9% da
população estadual do total.
No grupo dos Sem religião a participação predominante era do estado do
Rio de Janeiro, com 15,76% da população integrando esta classificação.
Rondônia, com 12,70%; Bahia, 11,39%; Alagoas, 9,80%; e Acre, 9,70%. Dentre
os estados que apresentaram menor taxa de participação desta classificação,
Santa Catarina liderou o ranking, com apenas 1,97% da população estadual.
Piauí, Ceará, Paraná, e Tocantins sucederam a lista com taxas variando entre
3,05% e 4,55%.
Dentre os 10 municípios mais católicos do país, 9 pertencem ao Rio
Grande do Sul, sendo que 4 deles com participação de 100% da população nesta
classificação (Nova Roma do Sul, Nova Alvorada, União da Serra e Vespasiano
Correia). Apesar disto, 5 dentre os 10 municípios mais evangélicos do Brasil no
ano 2000 também pertenciam ao estado do Rio Grande do Sul, incluindo o líder
do ranking, o município de Quinze de Novembro, com 80,37% da população se
declarando evangélica.
Nova Ibitá, na Bahia, foi o único município com mais da metade da
população declarada Sem religião (59,85%). No estado de Goiás, os municípios
de Palmelo e Professor Jamil foram os que apresentaram maior participação de
espiritualistas na população, com 42,10% e 24,98%, respectivamente.
O estudo do CPS do IBRE/FGV também analisou as taxas das religiões de
acordo com a situação do setor para as classificações religiosas Católica,
Evangélica, Sem religião e Outras declaradas em Quartéis, Aglomerados
subnormais69, Penitenciárias, Asilos e Aldeias indígenas. Dentre a população do
grupo Quartel, apenas as taxas de participação das religiões Católica e Outras se
apresentaram acima das taxas nacionais. Ao passo que nos aglomerados
subnormais a predominância em variação da distribuição nacional foi da religião

69
O termo aglomerado subnormal é geralmente empregado para designar assentamentos informais, como por
exemplo, favela, mocambo, alagado, barranco de rio, etc.
52

evangélica, onde 20,61% da população deste setor se declararam evangélicos,


contra 15,41% no total nacional.
Muito acima da média brasileira de declaração no grupo Sem religião
estiveram as populações dos aglomerados subnormais (13,14% do total),
penitenciárias (16,28%), asilos (19,13%) e aldeias indígenas (25,68%); contra
uma taxa de 7,35% da população nacional.
O grupo Outras religiões, cuja participação nacional neste nível de
agregação das classificações religiosas era de 3,34% da população, teve
participação abaixo desta taxa registrada pelo país apenas nos aglomerados
subnormais (2,78%) e muito superior nas penitenciárias (19,23% dos internos) e
asilos (14,22%).
Quanto ao tamanho da cidade, o estudo pôde afirmar que os evangélicos
estão mais presentes em regiões metropolitanas (capital e periferia) e outros
grandes centros urbanos. Ao contrário da religião católica, mais presente em
centros urbanos de médio e pequeno porte e zonas rurais. Nas periferias das
regiões metropolitanas brasileiras 20,72% desta população se declarou
evangélica e 10,15% como Sem religião, contra 15,41% e 7,35% de participação
destas classificações na população total do país.
A análise da classificação etária das populações das religiões, agregadas
em quatro grupos – Católicos, Evangélicos, Sem religião e Outros –, apontou
coeficiente de variação na distribuição dos fiéis, acerca das quatorze faixas de
idade propostas pelo IBGE, substancialmente menor para o conjunto de Outras
religiões; em média 22,85% é o grau de relacionamento do desvio padrão para
com a média de adeptos por faixa etária nesta classificação, a qual inclui
mórmons, Testemunhas de Jeová, espíritas, judeus, muçulmanos, budistas,
tradições indígenas e esotéricas, etc. Este coeficiente de variação médio oculta,
no entanto, as grandes diferenças de perfis etários das denominações que
compuseram o grupo de agregação. Enquanto que os espiritualistas e seguidores
de religiões orientais possuem uma distribuição mais diversificada, os mórmons
se concentram mais em algumas faixas (54,24% dos fiéis possuem entre 10 e 34
anos de idade).
Entre católicos e evangélicos o coeficiente de variação na distribuição
etária dos fiéis diferem muito pouco, tanto na população total quanto entre as
mulheres. Na comparação entre as distribuições da população masculina, essas
53

agregações ampliam um pouco a diferença existente entre elas. No total de


homens e mulheres, as denominações católicas apresentaram diversificação
etária muito pouco superior a de evangélicos (coeficiente de variação de 35,14%,
contra 38,02% dos evangélicos). Dentre os homens, os evangélicos se
concentram pouco mais em algumas faixas do que os católicos; em geral, sua
taxa da população masculina com idade inferior a 15 anos é superior à média
nacional.
Incluindo homens e mulheres, quando comparados com as taxas
nacionais, os evangélicos são mais representados por pessoas com idade de 5 a
14 anos e de 25 a 44 (51,63% do total distribuído nas 6 faixas que incluem essas
idades). Já os católicos superam as taxas nacionais na população com idade
igual ou superior a 50 anos; ¼ de todos os seus fiéis se encontram nesta faixa,
contra apenas 15% dos evangélicos. No grupo dos Sem religião, o menos
diversificado em termos de distribuição etária, 75% dos fiéis têm menos de 35
anos de idade, com maior concentração entre as crianças com menos de 5 anos
e jovens e adultos de 15 a 34 anos.
Quando cruzados os dados de idade com tempo de estudo, a pesquisa do
CPS demonstrou que, dentre a população brasileira do ano 2000 com pelo menos
12 anos de estudo, os católicos mantinham a mesma participação em torno de
74%. Já os evangélicos perdiam representatividade significantemente, contando
com apenas 10,3% dos brasileiros com esse nível de escolaridade, contra 16,2%
de participação na população total (independente do tempo de estudo). Os
espiritualistas, ao contrário, que representavam 1,35% da população nacional em
2000, dentre as pessoas com pelo menos 12 anos de estudo, eram 6,4% do total.
As religiões orientais, afro-brasileiras e outras religiões também eram mais
representadas na faixa da população com pelo menos 12 anos de estudo,
saltando de 1,21% do total (independente desta variável) para 2,8% da população
nacional na análise controlada pelos anos de estudo. Excetuando-se católicos
(73,96%), evangélicos (10,27%) e sem religião (6,54%), as demais religiões
representavam 9,23% da população com 12 ou mais anos de estudo no ano
2000.
54

Uma publicação do IBGE baseada no Censo de 200070 demonstrou que


espiritismo, umbanda e candomblé são as religiões com os maiores graus de
escolaridade do Brasil. De acordo com o estudo, os católicos apostólicos romanos
tinham em média 5,78 anos de estudo e o total de evangélicos 5,83, sendo que,
dentre estes, os evangélicos de missão tinham 6,94; os pentecostais, 5,34; e as
demais evangélicas, 6,41. Os espíritas apresentaram em média 9,58 anos de
estudo, primeiro lugar no ranking, sucedidos pela classificação umbanda e
candomblé, com média de 7,19 anos de estudo. A média total do país era de 5,86
anos de estudo por pessoa, pelos resultados do Censo Demográfico de 2000.
Em termos de ocupação profissional o estudo Retratos das Religiões no
Brasil demonstrou participação católica abaixo da média apenas entre os
brasileiros desempregados no ano 2000; os inativos, os empregados com carteira
de trabalho assinada, empregados sem carteira e pessoas que trabalhavam por
conta-própria eram católicos em torno de 74% (mesma participação de católicos
no total da população nacional). Os católicos superavam a média entre os
brasileiros classificados como empregadores (76,4%) e “próprio consumo”
(87,4%). Os evangélicos eram mais representados nos grupos dos
desempregados e dos inativos, mantendo-se abaixo da média para os demais
grupos de ocupação profissional. Os Sem religião superavam a média nas
classificações “desempregado” ou “empregado em carteira”. Para as demais
religiões, a pesquisa apontou destaque proeminente para a classificação
“empregador”. Em média, 6,48% dos empregadores brasileiros não eram em
2000 nem católicos, nem evangélicos e nem sem religião; no total geral da
população nacional (independente da ocupação) as outras religiões
representavam neste ano apenas 3,34%.
A pesquisa também mostrou que em geral, evangélicos, adeptos de
religiosidades afro-brasileiras e sem religião possuíam no ano 2000 renda
domiciliar per capita pouco inferior a dos católicos; enquanto que espiritualistas e
orientais tinham renda bem superior, de maneira coerente com os diferencias de
escolaridade já citados. O exercício de comparação do rendimento de pessoas de
diferentes religiões, mas iguais atributos socioeconômicos, revelou que “a renda

70
Última etapa de divulgação do Censo 2000 traz os resultados definitivos, com informações sobre os 5.507
municípios brasileiros. Censo Demográfico 2000. IBGE. Disponível em
<http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/20122002censo.shtm>. Acesso em 2 Nov. 2005.
55

familiar per capita de evangélicos e sem religião são 6,9% e 6%, respectivamente,
inferiores aos dos católicos. Similarmente os diferenciais da renda do trabalho
principal são 2,6% e 1% menores”71.
Para o IBGE, nos resultados do Censo Demográfico de 2000, os espíritas
foram os adeptos que apresentaram os melhores indicadores entre as religiões
mais numerosas, tanto em termos de escolaridade (98,1% são pessoas de 15
anos ou mais de idade alfabetizadas), como em termos de rendimento: “8,4%
deles ganhavam mais de 20 salários mínimos, enquanto para o total da
população, apenas 2,7% tinham esse rendimento. Entre aqueles que ganhavam
até 1 salário mínimo, os espíritas tinham a menor proporção (7,9%) e os católicos
apostólicos romanos e os evangélicos, as maiores (26,3% e 23,5%,
respectivamente)”72.
O rendimento mediano mensal dos espíritas, segundo o IBGE73, era quase
três vezes mais do que o dos evangélicos pentecostais (R$ 700,00 contra R$
260,00), enquanto que os católicos e os sem religião tinham o mesmo rendimento
(R$ 300,00).
Na comparação entre algumas características de católicos e evangélicos
das metrópoles brasileiras, o estudo do CPS nos permitiu observar que, no
período analisado, os católicos eram, em geral, mais sindicalizados e pertenciam
mais a órgãos de classe profissional; percebiam mais a incorporação regular de
novos equipamentos no trabalho; eram mais bem pagos74; estavam mais
satisfeitos quanto à ocupação assumida; atribuíam mais importância do trabalho
como perspectiva de ascensão social75; no entanto, participavam menos de
associações comunitárias. 17,26% dos evangélicos em média participavam de
pelo menos uma reunião por ano de associações comunitárias; apesar disso, os

71
Marcelo Neri. A ética pentecostal e o declínio católico. Conjuntura econômica. Maio de 2005. Disponível
em <http://www.fgv.br/cps/religioes/Apresenta%E7%E3o/CPS.FGV-A%20%E9tica%20pentecostal-
Conjuntura%20Economica-maio%202005.pdf>. Acesso em 21 Abr. 2005.
72
Notas sobre o Censo Demográfico de 2000. IBGE. Disponível em
<http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/27062003censo.shtm>. Acesso em 02 Nov. 2005.
73
Idem.
74
Apesar disso, católicos e evangélicos num nível de agregação das religiões em 7 grupos, possuíam os dois
menores percentuais de fiéis classificados em situação de mais bem pagos da ocupação. Contrariamente, os
judeus lideravam a participação de adeptos classificados como bem pagos (55% deles), além de também
serem os mais sindicalizados.
75
81,55% dos judeus atribuíam importância do trabalho como perspectiva de ascensão social, superando os
espíritas kardecistas, segundo lugar da pesquisa, em praticamente 25 pontos percentuais. A participação de
católicos e evangélicos que responderam positivamente era de 53,84% e 50,43%, respectivamente.
56

católicos estavam mais presentes em associações de bairro/moradores, ao passo


que os evangélicos em associações de cunho religioso.
No que diz respeito à posição na família, os filhos são os que mais
superam a média no grupo dos sem religião, que é composto mais por homens do
que por mulheres (60%). Ao contrário dos evangélicos, dentre os quais a
população do sexo feminino é mais presente (56%).
Quanto ao setor de atividade de trabalho, 84,51% dos trabalhadores
agrícolas do Brasil eram católicos no ano 2000, enquanto que o grupo dos
evangélicos apresentava distribuição mais diversificada e com menor participação
justamente deste setor. Sem religião era a classificação de 11,22% dos
trabalhadores da construção civil, superando a média de 7,35% da população
nacional declarada nesta opção de religiosidade.
Os católicos também apresentaram participação muito acima da média
dentre o percentual de brasileiros cuja situação conjugal era de casamento civil e
religioso ou apenas de casamento religioso. Os evangélicos, contrariamente,
tinham participação elevada do percentual de brasileiros casados apenas no civil.
Dentre os sem religião, observou-se destaque à participação acima da média de
pessoas com união consensual e pessoas solteiras. As demais religiões tinham
participação maior de desquitados e divorciados.
A análise da participação religiosa com base na cor ou raça dos brasileiros
apresentou pouca divergência da distribuição do total da população para as
classificações “banca” e “parda”. Os negros são pouco menos católicos e mais
sem religião; assim como os amarelos são menos católicos e evangélicos e mais
sem religião ou adeptos de outras religiões, particularmente, orientais. A
população de raça indígena foi a que se apresentou mais diversificada em relação
à média nacional; são bem menos católicos (apenas 59,48%) e bem mais
evangélicos (20%), sem religião (14,38%) e outras religiões (6,14%), incluindo,
obviamente, as próprias tradições indígenas.
Finalmente, observamos o tratamento da questão da imigração
interestadual pela pesquisa do CPS do IBRE/FGV. O maior destaque foi da
população de evangélicos, com participação acima da média dentre os brasileiros
que haviam imigrado de outras Unidades Federativas. Enquanto que o total de
evangélicos na população nacional representava 15,41% da população em 2000,
todas as classificações de brasileiros que migraram de estados (há menos de 1
57

ano no momento da pesquisa, de 1 a 5 anos, de 6 a 10 anos ou há mais de 10


anos) tinham percentuais da população neste grupo de religião superior a 18,4%,
chegando a 19,2% dos haviam imigrado a menos de 1 ano.
58

CAPÍTULO 3 – ASPECTOS CONCORRENCIAIS DA RELIGIÃO NO BRASIL

3.1 Grau de concentração do setor religioso e a recente evolução do


cenário concorrencial

Para o real propósito deste estudo, mais do que uma noção do panorama
do campo religioso brasileiro, se faz necessária uma análise da concorrência
religiosa em termos de concentração do mercado e tendências de acirramento da
competitividade. Para tanto, recorremos à aplicação do método de mensuração
do grau de concentração industrial de Herfindahl-Hirschman, popularmente
conhecido como Índice HH ou, simplesmente, IHH, controlado pela variável
quantidade de fiéis por denominação religiosa; analisado em termos históricos
com base nas publicações de tendências demográficas do IBGE. Além deste, a
concentração industrial e a desigualdade entre os agentes do campo religioso
brasileiro também foram analisadas pela aplicação do método de Gini (Coeficiente
de Gini).
A relação de concentração (C) e o IHH – este último representado pela
soma dos quadrados das participações de mercado (market shares) das
empresas atuantes em uma determinada indústria e podendo variam entre 0 e
10000 pontos - foram aplicados ao caso das denominações religiosas, tendo sido
as participações destas no mercado calculadas com base no total de fiéis que
possuíam de acordo com o Censo Demográfico de 2000.
A primeira análise foi aplicada para o total da população brasileira no
conjunto das denominações religiosas desagregado em 138 classificações; sendo
135 religiosidades propriamente ditas, mais 3 classificações (SEM RELIGIÃO,
SEM DECLARAÇÃO e NÃO DETERMINADA / MAL DEFINIDA). Tomando como
base a classificação adotada pelo IBGE no Censo de 2000 (vide tabela no Anexo
IV), apenas 5 denominações religiosas foram excluídas do estudo76; dada a nula
representatividade delas nos números publicados. Estiveram presentes também
as classificações de declaração de múltipla religiosidade.

76
Outras DE ORIGEM PENTECOSTAL CADEIA DA PRECE, Outras IGREJA DE JESUS CRISTO DOS
SANTOS DOS ÚLTIMOS DIAS, Budismo Theravada, Discipulos Oshoo e A Barquinha.
59

A relação de concentração (C) com corte nas sete primeiras denominações


mais representativas foi de 91,54%. O grupo selecionado, cuja população total
envolvida era próxima de 155,5 milhões de brasileiros no ano da pesquisa, foi
composto pelas seguintes declarações religiosas: Católica Apostólica Romana
(73,55% da população nacional), Sem religião (7,55%), Igreja Evangélica
Assembléia de Deus (4,89%), Igreja Evangélica Batista (1,73%), Igreja
Congregacional Cristã do Brasil (1,46%), Espírita Kardecista (1,32%) e Igreja
Universal do Reino de Deus (1,24%).
O Índice Herfindahl-Hirschman (IHH) para o conjunto das 138
classificações foi de 0,550 (ou 5500 pontos). O aspecto qualitativo deste resultado
pode ser obtido pela sua correspondência com faixas de uma escala de
concentração. O Departamento de Justiça dos Estados Unidos da América, por
exemplo, considera resultados inferiores a 1000 pontos como sendo próprios de
mercados competitivos; aqueles cuja pontuação oscila entre 1000 (inclusive) e
1800 pontos (exclusive) como nível moderado de competição; e IHH igual ou
superior a 1800 pontos como próprio de mercados altamente concentrados77.
Na análise aplicada com exclusividade sobre a população de idade igual ou
superior a 60 anos, apesar da relação de concentração cortada para as sete
primeiras classificações mais representativas ter se apresentado praticamente a
mesma (91,50%), o IHH permitiu concluir uma concentração das denominações
religiosas ainda superior em relação àquela válida para toda população
(independente da variável idade), apontando 5986 pontos.
Fechando-se o estudo para a população com idade igual ou superior a 60
anos, as classificações Sem religião e Igreja Evangélica Assembléia de Deus
trocam de lugar no ranking das sete principais em participação de mercado; assim
como o fazem as classificações Espírita Kardecista e Igreja Evangélica Batista.
O Coeficiente de Gini – “medida de concentração, mais frequentemente
aplicada à renda, à propriedade fundiária e à oligopolização da indústria”78 – foi
calculado também no intuito de evidenciar o grau de concentração e desigualdade
entre os agentes atuantes no campo religioso. Com base nos dados do Censo

77
THE HERFINDAHL-HIRSCHMAN INDEX. United States Department of Justice. Disponível em
<http://www.usdoj.gov/atr/public/testimony/hhi.htm>. Acesso em 28 Nov. 2005.
78
Paulo Sandroni, Novíssimo dicionário de economia. 7ª ed. São Paulo: Best Seller, 2001. Ver verbete
Coeficiente de Gini.
60

Demográfico de 2000, para um conjunto de 97 classificações de religiosidade79, o


coeficiente com resultado apresentado de 0,957 (ou 95,7%) pôde ser evidenciado
graficamente no Apêndice A. É representado pela proporção da área
compreendida entre a Curva de Lorenz e a linha da perfeita distribuição (45º),
relativa ao triângulo formado pela própria linha da perfeita distribuição
(hipotenusa) e os eixos crescente de acumulação percentual da quantidade de
denominações religiosas (horizontal) e respectivas fatias de mercado (vertical).
Neste sentido, quanto mais próximo de zero for o coeficiente, mais iguais serão os
agentes; quanto mais próximo de 1 (100%), mais desiguais serão os agentes.
O Índice Herfindahl-Hirschman (IHH) calculado para um nível de agregação
de 138 classificações de religiosidade adotadas pelo IBGE, cujo resultado para o
ano 2000 foi de 5500 pontos, foi também analisado em termos históricos, de
acordo com as tendências demográficas. Porém, neste caso, a não conformidade
nas terminologias empregadas pelo instituto de pesquisa ao longo dos anos
analisados, requereu a agregação das classificações de religiosidade em apenas
6 grupos: Católicos apostólicos romanos, Evangélicos, Espíritas, Outras religiões
e Sem declaração – este último sem impactos significativos sobre os cálculos.
Esta agregação altera para o ano 2000 o IHH, subindo de 5500 (com 138
classificações de religiosidade) para 5711 (com 6 classificações de religiosidade).
Na liderança do ranking se manteve, evidentemente, a Igreja Católica Apostólica
Romana, concentrando sozinha 73,57% da população brasileira; sucedida pelo
conjunto dos evangélicos (15,41%), os sem-religião (7,35%), outras religiões
(1,79%), espíritas (1,64%) e, finalmente, os sem-declaração (0,23%).
Aplicado aos períodos que compõem o relatório de Tendências
demográficas do IBGE, o método Herfindahl-Hirschman demonstrou uma queda
substancial no grau de concentração do campo religioso brasileiro desde a
década de 1960, quando o IHH era de 8690 pontos; passando para 8452 em
1970, 7962 em 1980, 6992 em 1991 e 5711 em 2000. Durante os anos 1960 a
redução do índice foi de 2,73%, registrada em 1970; já na década seguinte a
variação duplica, tendo reduzido o índice em mais 5,8%; e duplica novamente nos

79
A limitação do número de classificações de religiosidade a um total de 97 deve-se a exclusão de todas as
agregações do tipo “outras religiosidades”, adotadas pelo IBGE para cada grupo de denominações. Pelo
método de cálculo do Coeficiente de Gini, a não exclusão dessas classificações implicaria na distorção do
índice, reduzindo artificialmente o grau de concentração e desigualdade entre os agentes do campo religioso,
podendo ser aceita somente no caso de a agregação significar algum impacto real para o mercado; ou seja, se
a agregação representasse uma coalizão de interesses sobre o campo.
61

anos 1980, com variação de 12,19% medida em 1991. Desde então até o último
Censo, a taxa de variação do IHH medida anteriormente é multiplicada por 1,5,
reduzindo o índice nos anos 1990 em 18,32%, suavizando desta forma, neste
último período, a tendência abrupta de redução geométrica da taxa de
concentração80.
Em termos de relação de concentração (coeficiente C), este
comportamento também pôde ser observado, contudo, de modo mais suave. O
corte na participação dos três principais grupos religiosos na década de 1960
(Católicos apostólicos romanos, Evangélicos e Espíritas) atribuía 98,49% da
população declarada associada a uma dessas três classificações. Em 1970, esta
participação decresce para 98,21%. Em 1980, os espíritas tiveram sua
participação aumentada levemente de 1,27% para 1,29%, mas ainda assim foram
superados no ranking das 6 agregações pelo grupo dos Sem religião e o corte
dos três maiores passaria a representar 97,22% da população brasileira. Com
esta mesma composição de liderança, a participação de católicos, evangélicos e
sem-religião se reduziria para 96,68% e 96,34%, respectivamente, nos resultados
apresentados pelos censos de 1991 e 2000.
No período todo, de 1960 a 2000, a queda acumulada em pontos do IHH
foi de 2979 (34,28%) e de 2,18 a variação em pontos percentuais na participação
dos três maiores grupos religiosos do país, sofrendo uma mudança na
composição somente nos anos 1970. Esta observação nos permite antecipar a
conclusão de que, ao longo dos últimos 40 anos que antecederam o Censo
Demográfico de 2000, a grande desconcentração do campo religioso brasileiro,
de trajetória sempre crescente mesmo que levemente suavizada a partir dos anos
1990), se deu principalmente dentre os principais grupos (católicos, evangélicos e
sem-religião). Marcelo Néri, chefe do Centro de Políticas Sociais do IBRE/FGV,
afirmou em maio de 2005 que “se fôssemos traçar um retrato atual, ou filmar a
história recente das religiões brasileiras, os personagens principais seriam os
católicos, os sem-religião e os evangélicos, com especial destaque às seitas
pentecostais”81.

80
Tanto a linha de tendência do IHH quanto a sua taxa de redução a cada década no período 1960-2000 estão
representadas graficamente no Apêndice B.
81
Marcelo Neri. A ética pentecostal e o declínio católico. Conjuntura econômica. Maio de 2005. Disponível
em <http://www.fgv.br/cps/religioes/Apresenta%E7%E3o/CPS.FGV-A%20%E9tica%20pentecostal-
Conjuntura%20Economica-maio%202005.pdf>. Acesso em 21 Abr. 2005.
62

É certo o fato de que a desconcentração do campo religioso no Brasil e,


consequentemente, a ampliação da sua condição de pluralidade religiosa e o
acirramento da concorrência ao nível das igrejas e destas para com propostas
alternativas de religiosidade, incluindo as céticas e secularizadas, se deu à custa
da perda de participação da Igreja Católica na população brasileira. De 1960 a
1980 o catolicismo apostólico romano teve seu market share reduzido em 4,17
pontos percentuais (p.p.); nos 20 anos seguintes, esta perda seria agregada de
mais 15,38 p.p., totalizando no período de 1960 a 2000 uma redução de 19,54
p.p. A fatia de mercado religioso de 93,12%, que lhe era atribuída em 1960,
passaria a 91,77% em 1970, 88,95% em 1980, 82,97% em 1991 e 73,57% em
2000. Em média, registrou-se uma variação negativa anual de praticamente meio
ponto percentual durante os 40 anos analisados, por conta principalmente do
movimento de “descatólicalização” associados ao crescimento populacional
proporcionalmente superior na esfera das denominações rivais.
Por outro lado, o conjunto das denominações evangélicas saltou de pouco
menos de 4% da população brasileira em 1960 para 15,41% em 2000 –
crescimento de 11,44 p.p., sendo 8,8 a partir da década de 1980. Paralelamente,
as declarações de sem-religião que se limitavam a 0,5% da população em 1960,
chegaram em 2000 a 7,35%, multiplicando por 14,7 a percentagem dessa fatia da
população. Em 40 anos, enquanto a taxa de católicos caía cerca de 20 p.p.,
evangélicos e sem-religião protagonizavam o surgimento de um panorama mais
diversificado e competitivo do campo religioso brasileiro, com aumentos de 11,4
p.p. e 6,9 p.p., respectivamente (vide Apêndice C com gráfico de evolução destes
grupos).

3.2 O surgimento de novas competidoras e as barreiras envolvidas

Grandes alterações se deram, portanto, no campo religioso brasileiro no


sentido de expansão do seu grau de pluralidade, desde o começo do século XX,
intensificado a partir dos anos 1950 quando os evangélicos representavam ainda
apenas 3% da população. O movimento do neopentecostalismo82, por exemplo,

82
“Naquele país [EUA], atribui-se o termo ‘neopentecostalismo’ a pessoas com mentalidade pentecostal, mas
que se consideram adeptas de uma ‘renovação espiritual’ dentro dos próprios quadros denominacionais a que
63

cuja força foi ganha no mundo religioso norte-americano nos anos 1970, invadiu
também a América Latina nesta época, provocando o surgimento de novas
igrejas, seitas e denominações. Em acompanhamento, registraram-se inúmeras
cisões nas principais denominações protestantes brasileiras, entre elas,
Metodista, Batista, Presbiteriana, Congregacional e outras. (CAMPOS, 1997, p.
50)
De simplesmente evangélicos, passaram a “evangélicos de origem de
missão” e “evangélicos de origem pentecostal”. No sub-campo religioso
pentecostal, a segmentação em várias denominações permitiu, inclusive, a
criação de várias propostas de tipologias, das mais objetivas às mais extensas e
abstratas83. Ao “pentecostalismo clássico” são relacionadas a Igreja Assembléia
de Deus e a Congregação Cristã do Brasil; Paul Freston (1993 apud CAMPOS,
1997, p. 51) – que separa o surgimento dos neopentecostais em “ondas”
associadas ao ciclo de início, expansão e reversão dos movimentos religiosos no
decorrer do tempo –, fala em uma “segunda onda” que incluiria as Igrejas “O
Brasil para Cristo”, “Deus é Amor” e “Evangelho Quadrangular”84. A “terceira
onda” ou “pentecostalismo autônomo” ou, simplesmente, “neopentecostalismo”
(MENDONÇA, 1994 e MARIANO, 1995 apud CAMPOS, 1997, p. 51) inclui as
denominações como a Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Internacional da
Graça de Deus, Comunidade Sara Nossa Terra, Igreja Renascer em Cristo e
Igreja Nacional Palavra da Fé. (CAMPOS, 1997, p. 51)
Para o Professor Mário Sérgio Cortella, do Departamento de Teologia e
Ciências da Religião da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP),
o crescimento das denominações evangélicas é explicado por três motivos: a
urbanização do Brasil (“nas cidades há garantia de anonimato e liberdade de
culto, menor controle social”), a democratização do país (“antes, para abrir uma

pertencem. De uma maneira geral, esse ‘neopentecostalismo’ enfatiza o exorcismo, cura divina, dons
espirituais, continuidade da revelação divina através de líderes carismáticos, e uma parte dele aceita a
‘teologia da prosperidade’”. Leonildo Silveira Campos. Teatro, templo e mercado – Organização e
marketing de um empreendimento neopentecostal. Petrópolis: Vozes, 1997.
83
Apesar das tipologias propostas, devido à dificuldade de distinção entre as características assumidas pelas
denominações da segunda e terceira onda que dividiriam o sub-campo pentecostal no Brasil, adotaremos a
terminologia mais simples, empregando pentecostais em referência às denominações mais clássicas, e
neopentecostais para as demais.
84
Este grupo de denominações pentecostais também é tratado por pentecostais “de cura divina”.
(MENDONÇA, 1989 apud CAMPOS, 1997, p. 51)
64

igreja cristã não-tradicional, era preciso ter autorização policial”) e a globalização


(“agora aceita-se muito mais a pluralidade”)85.
Atualmente, segundo a Revista Exame86, cerca de 10.000 novos pontos de
pregação evangélicos são abertos a cada ano em várias regiões do país. Dentro
disso, o fato que nos chama atenção neste segundo tópico do terceiro capítulo é a
questão da susceptibilidade destes projetos de novas denominações religiosas às
barreiras à entrada presentes no mercado.
Se por um lado, não se fazem mais presentes os impedimentos legais para
o surgimento de denominações alternativas ao monopólio católico típico de
séculos passados; por outro, em tempos atuais, a criação de denominações
inteiramente novas, as cisões decorrentes das divergências em termos
ideológicos ou meramente organizacionais e administrativos87, ou mesmo a
simples expansão da abrangência territorial de uma determinada denominação
estabelecida pela abertura de um novo ponto de pregação, passam pela análise
dos requisitos mínimos necessários para a realização do projeto.
Segundo o Mestre Antonio Miguel Kater Filho88, “os pontos de venda do
produto [salvação] são milhares, dependendo da magnitude”. Para ele, não
somente os templos, mas “cada batizado em uma igreja é um portador da
salvação. É alguém que chega, sentado, ao lado de uma pessoa num avião, num
ônibus ou num ponto de ônibus, dentro de um prostíbulo, num botequim. Eu
posso chegar para uma pessoa num buraco e falar de salvação e traze-lo a
salvação”. Apesar disso, as igrejas, no seu sentido de congregação e para que
possam realizar os rituais que eventualmente integrem a sua cultura teológica,
carecem de uma estrutura física e, portanto, de recursos passíveis de
transformação em capital fixo imobilizado.
Em geral, o ativo fixo mínimo das igrejas inclui, senão o próprio edifício,
que pode eventualmente ser alugado, pelo menos os móveis (bancos, mesas,
cadeiras, etc.), equipamentos de áudio e instrumentos musicais. De acordo com a

85
Ricardo Westin. Evangélicos eram 3% do País em 1950. Hoje são 15%. Folha de São Paulo, São Paulo, 26
Jun. 2005, Caderno A, p. 24.
86
Luciana Farnesi. Um mercado movido pela fé. Revista Exame, 16 Fev. 2005, p. 60-61.
87
A respeito das cisões em denominações religiosas, Campos (1997, p. 50) afirmou que ocorrem em sua
maioria “mais por questões administrativas e organizacionais do que teológicas”.
88
Em entrevista concedida aos 27 de setembro de 2005, das 17h às 18h, na sede do Instituto Brasileiro de
Marketing Católico – IBMC, na Av. João Erbolato, 50 – sala 20 – Castelo – Campinas (SP).
65

Revista Exame89, “cada um dos 150.000 templos [evangélicos] espalhados pelo


Brasil tem uma banda musical, ou, como os evangélicos preferem chamar, um
grupo de louvor”. Tanto que, segundo a mesma matéria, metade das vendas da
fábrica Weril90 de trombones, flautas, trompetes e outros instrumentos sopro, são
destinadas ao público evangélico. A aquisição destes bens requer uma soma de
capital mínimo, oriunda, geralmente, de doações dos próprios fiéis e líderes que
se prontificam a iniciar o novo trabalho.
Essa noção subjetiva de requisito mínimo de capital pode se transformar
em barreira ao surgimento de uma nova denominação à medida se compara com
o conjunto das denominações já estabelecidas, no que tange aos seus objetivos
de oferecer condições estruturais coerentes com aquelas que o mercado já
oferece. Nesse sentido, passa a ser relevante a questão do número mínimo de
fiéis – em termos econômicos, diríamos escala mínima eficiente – para
manutenção da estrutura física ao menor custo por fiel possível.
A determinação arbitrária em fase de projeto, ou a percepção ao longo do
processo prático de atuação, do volume em número de fiéis almejado pela
denominação religiosa, sejam quais forem seus interesses e motivações, se
associa aos meios reais dos quais ela fará uso para atingir esse objetivo. Ou seja,
é provável que as igrejas escolham os veículos que as levem ao mercado alvo em
função da escala almejada. Um número muito alto de fiéis implica a necessidade
de se produzir mais material gráfico, talvez o controle de estações rádio ou até
mesmo de televisão. E, é claro, a propriedade destes meios acumulados expande
a quantidade mínima de fiéis necessários para sua manutenção ao menor custo
unitário possível. A escala de prestação de serviços religiosos (quantidade de
fiéis) deve, obviamente, caber na realidade do mercado; caso contrário, significa
para a nova igreja a necessidade de predisposição à superação das
denominações já estabelecidas, atraindo para si parte dos fiéis destas. Em
resumo, ou um grupo mais concentrado se prontifica a bancar a estrutura física da
igreja ou a escala necessária de fiéis deve ser compatível com o mercado.
É possível também pensarmos no conceito de barreira quanto aos
empenhos necessários, por parte da nova igreja, no sentido de superar as

89
Luciana Farnesi. Um mercado movido pela fé. Revista Exame, 16 Fev. 2005, p. 60-61.
90
De acordo com o próprio site da empresa (www.weril.com.br), presente em mais de 40 países além do
Brasil, é uma das cinco maiores empresas de instrumentos musicais de sopro do mundo, e líder do segmento
de instrumentos de sopro no país.
66

denominações já estabelecidas na formação de contratos e parcerias com


empresas e órgãos públicos e privados diversos para a realização de atividades
almejadas. Como, por exemplo, negociações de aquisição ou concessão de um
terreno para a construção do templo; possivelmente mais facilitado às igrejas já
existentes.
Todos estes possíveis inibidores ao surgimento de novas denominações
estão, entretanto, muito condicionados ao tamanho do empreendimento que se
planeja. Contudo, um outro fator muito relevante para o caso das igrejas enquanto
barreira ao estabelecimento, tanto de novas denominações, quanto de novos
pontos de denominações já existentes, são os esforços necessários de serem
empenhados pela igreja entrante no campo religioso, no sentido de quebrar a
reputação das igrejas já estabelecidas.
Em geral, é possível afirmar que a população, em sua maioria pelo menos,
já tem sua opção religiosa determinada. Por isso, uma igreja que pretenda se
estabelecer em determinada região está fortemente exposta a um estímulo de
bloqueio pela exigência de se conseguir convencer parte daquela população da
sua superioridade como instituição prestadora de serviços religiosos. Esses
esforços de demonstrar a diferenciação dos seus serviços em relação àqueles
que já estão sendo prestados e, naturalmente, a superioridade ou, em muitos
casos, até mesmo a inofensividade deles, passam pela questão da imagem e da
publicidade necessária, contra o preconceito e discriminação que podem estar
presentes nas comunidades onde as igrejas entrantes focam seu
estabelecimento.
Tomemos como exemplo a relação entre católicos e espíritas kardecistas.
As divergências quanto a alguns pontos específicos de cada doutrina, associadas
à crença na verdade absoluta das prédicas de cada religião, inspiram, em algum
momento, a inviabilidade na declaração de múltipla religiosidade. Neste momento,
ambas defendem suas doutrinas perante os leigos, potencializando com isso a
competição. Os resultados da preocupação acerca da perda eminente no total de
adeptos de cada uma podem ser, apesar das críticas mútuas, a adoção de certo
grau de tolerância quanto às divergências sobre o assunto da reencarnação.
Embora as religiões não tenham propriamente rompido com a sua doutrina, o
discurso pode incorporar elementos de diferenciação em função do nível de
acirramento da competição; ora mais ortodoxos e críticos, ora mais tolerantes.
67

Essa diferenciação, atribuída no exemplo ao grau de tolerância para com


as divergências doutrinárias, dada por antecipação se consubstancia em barreira
à entrada de nova doutrina. A tolerância de católicos, por exemplo, quanto a
elementos da doutrina espírita incorporados por alguns de seu corpo de leigos,
mesmo que isso contradiga a sua própria doutrina, seria somada às duras críticas
pelos sacerdotes ao espiritismo enquanto religião, rompendo com as razões que
motivariam a substituição de uma religião pela outra. Afinal, apesar desses
elementos contraditórios não serem aceitos pela doutrina, a crença neles não
transforma o leigo em pecador e, portanto, não haveria motivação à migração
para uma outra religião.
O exemplo anterior toma forma ainda mais realista quando aplicado à
relação entre católicos e pentecostais. Por mais que um conjunto relevante de
sacerdotes católicos se manifestasse (e parte dele ainda se manifesta) contrário à
incorporação de alguns elementos associados ao pentecostalismo que, a partir da
década de 1960 seria tratado por “movimento de renovação carismática” na Igreja
Católica, percebeu-se o emprego (deliberado ou não) da “diferenciação de
produtos” aos serviços religiosos91. Essa pluralidade interna de uma própria igreja
ampliaria a partir dos anos 1970 a demanda por esforços de quebra da reputação
católica por parte das denominações neopentecostais incipientes.

3.3 Estratégias de competição

O acirramento da concorrência religiosa, decorrente do surgimento de


novas denominações competidoras, viabilizado primeiramente pela consolidação
da perspectiva de privatização da religião na sociedade – isolamento das relações
econômicas e dissociação do Estado como bases para a situação pluralística – e
intensificado pela sucessão urbanização, democratização e globalização,
submeteu o campo religioso à lógica mundana capitalista; pela qual o caráter
individualista assume posição de protagonista do sistema, focado no

91
Para o Professor Antônio Miguel Kater Filho, do IBMC, a Renovação Católica Carismática (RCC) foi um
“despertar” de parte da Igreja Católica às práticas adotadas pelos pentecostais, de comunicação através do
“Espírito Santo” e, apesar de reconhecer a existência de opiniões contrárias, ele atribui ao movimento o
mérito de ter realizado para a Igreja Católica um “trabalho fantástico”.
68

desenvolvimento de aptidões próprias contra o aspecto selvagem da dinâmica de


concorrência.
Neste sentido, os agentes envolvidos no mercado de bens simbólicos
associados à fé como prestadores de serviços religiosos – e nesta classificação
cabem as igrejas, seitas, centros, terreiros, e quaisquer outras terminologias
empregadas em referência a instituições burocratizadas detentoras e ofertantes
de capital religioso; inclusive, os pregadores dos movimentos céticos ou de não-
religião – viram-se expostos à face dura do sistema de mercado. Uma vez
inseridas na dinâmica de livre concorrência, as denominações religiosas, na luta
pela sobrevivência, são obrigadas a lançar mão de verdadeiras estratégias de
competição.
Este aspecto secular da lógica conflituosa do campo religioso, uma vez
reconhecido no sistema, expande-se analogamente à dinâmica econômica da
concorrência capitalista; envolve, portanto, indiscriminadamente todos os agentes
atuantes, atingindo inevitavelmente cada instituição. Estas, em nome da própria
sobrevivência no mercado, adaptam-se às regras do jogo e agregam
obrigatoriamente empenhos estratégicos orientados à defesa de seus interesses,
traduzidos, fundamentalmente, nas tentativas de aumentar o número de
praticantes e, naturalmente, de preservar a instituição. Em citação à Igreja
Católica, Mariano (1999 apud CORREIA, 2003) ajuda-nos a observar a maneira
como se dá a percepção desta realidade:

João Paulo II, quando esteve no Brasil em 1991, atento à


diminuição de seu rebanho e ao crescimento dos concorrentes,
cobrou dos cerca de 300 bispos reunidos em Natal durante o
congresso Eucarístico Nacional uma ação mais eficaz contra a
ignorância religiosa e a carência de doutrina que deixam o povo
vulnerável à sedução das seitas (MARIANO, 1999, p. 13 apud
CORREIA, 2003, p. 36).

Assim, hoje, no campo religioso, visto pela sua ótica de mercado, podem
ser observadas iniciativas, com maior ou menor intensidade de planejamento
deliberado, no sentido de criar condições de proteção contra o surgimento de
novas competidoras; levantando barreiras à entrada, que se estendem do capital
69

mínimo relacionado à escala (quantidade de fiéis) ao fortalecimento da reputação


pela diversificação dos serviços em função dos perfis atendidos. Paralelamente,
empenhos são dedicados à disputa pela adesão dos fiéis entre as próprias
inúmeras opções de religiosidade já estabelecidas, e, desta forma, o mercado
religioso segue, cada vez mais, podendo ser caracterizado por um conjunto de
medidas estratégicas de competição: inovações e as barreiras à entrada versus a
contestabilidade (interna e externa ao mercado) da legitimação da prestação dos
serviços religiosos por opções já estabelecidas, por parte de outros capitais
religiosos ainda incipientes (ou mesmo dentre os bem constituídos); geralmente
através de mais inovações.
Analisaremos, portanto, neste tópico que encerra o terceiro capítulo de
nossa dissertação, algumas destas estratégias de competição adotadas pelas
denominações religiosas, observadas a partir de uma bibliografia mínima (livros,
notícias de jornais e revistas e entrevistas realizadas com representantes de
instituições religiosas), subdividindo-o em três itens de grande relevância.
Trataremos da questão da diferenciação dos serviços religiosos prestados, da
importância do marketing e da utilização dos meios de comunicação em massa e,
finalmente, das práticas ecumênicas enquanto mecanismos fortalecedores do
poder de mercado das instituições religiosas.

3.3.1 Serviços diferenciados

A compreensão do relacionamento entre as bases para a constituição de


um mercado religioso e os fenômenos seculares de urbanização, democratização
e, posteriormente, de globalização permite-nos subentender que as alterações
dadas no campo religioso ocorreram não somente pela simples diversificação das
doutrinas religiosas estrategicamente comandadas por lideranças ofertantes, mas,
principalmente, pelas alterações no perfil dos consumidores de bens simbólicos
ligados à religião; portanto, da demanda. Em outras palavras, as transformações
sociais atingiram todas as esferas da sociedade, da economia à religião, e
constituíram uma classe de leigos mais carente de alternativas para a explicação
da realidade social e instrumentos de salvação; ou seja, exigência de maior
diversificação nos serviços religiosos, até então prestados por legitimados
monopólios da fé.
70

Para Weber (1967), em A ética protestante e o espírito do capitalismo, o


asceticismo secular do protestantismo, que explicaria a percepção de uma “ética
protestante” em contraposição aos princípios católicos hegemônicos e
monopólicos do campo religioso ocidental até a Reforma Calvinista, oferecia
maior correspondência ao “espírito capitalista” em desenvolvimento e, portanto,
teria influenciado positivamente no surgimento do capitalismo. A partir da
valorização de uma “ética do trabalho” pelo protestantismo – isto é, a valorização
do próprio trabalho, mais que seus resultados – e da libertação psicológica da
“aquisição de bens das inibições da ética tradicional, rompendo os grilhões da
ânsia de lucro, com o que [o protestantismo ascético] não apenas a legalizou,
como também a considerou (no sentido aqui exposto) como diretamente desejada
por Deus”92, os países de tradições protestantes teriam se desenvolvido mais do
que os católicos. Contrariamente a estes princípios, pela tradição católica, “uma
pessoa só deveria obter riqueza suficiente para viver bem” (FUKUYAMA, 2005),
culpando a acumulação de capital e inibindo a lógica da divisão do trabalho,
caracterizando, com isso, uma ética “que jogava para outra vida a conquista da
felicidade” (NERI, 2005).
O argumento de Weber em relação à importância do Puritanismo para o
capitalismo, tanto quanto Sombart (1951 apud CORREIA 2003, p. 10) o faria em
relação ao Judaísmo, bem nos serve para demonstrar a maneira como o
surgimento de doutrinas alternativas ou serviços religiosos diferenciados sempre
encontraram espaço na sociedade ao longo da história; notadamente em
momentos nos quais que ela passou por grandes transformações, como o
surgimento do capitalismo. Naturalmente, durante a fase incipiente da
industrialização ou do crescimento das tendências reformistas do campo religioso,
aqueles que almejavam obter sucesso nos negócios capitalistas encontrar-se-iam
mais bem respaldados pelas doutrinas protestantes (ou mesmo judaica) do que
pela católica.
Para o cristianismo, portanto, a Reforma Protestante representou, em
termos de mercado religioso, a quebra do monopólio católico através da inovação
nos serviços prestados; diversificando, desta forma, o campo religioso ocidental

92
Max Weber. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Pioneira, 1967, p. 122.
71

em duas grandes qualidades de religiosidade cristã tão bem distinguidas por


Weber: catolicismo e protestantismo.
Assim, podemos de alguma forma associar o surgimento de novas
denominações às propostas alternativas de prestação de serviços religiosos e,
consequentemente, ao aumento da heterogeneidade dos produtos ofertados no
mercado de bens simbólicos associados à religião; ou ainda, em outras palavras,
à maior diversificação dos serviços prestados. Concluímos desta forma que, à
medida que se permite associar a existência de uma demanda potencial por tipos
específicos de serviços religiosos aos interesses de oferta, capitais religiosos
inteiramente novos podem ser introduzidos ao mercado. Com o surgimento da
oferta especializada, o campo religioso torna-se mais segmentado e os serviços,
em termos gerais, mais diversificados. Essa diversificação, neste caso analisada
como instrumento estratégico de competição, se objetiva na prática pelas
variações de linguagem e elementos incorporados aos discursos e ritos.
Atualmente, sob condições de intensificação do cenário concorrencial entre
as diversas denominações presentes no campo religioso, especialmente a partir
do surgimento das igrejas evangélicas pentecostais no começo do século XX e,
principalmente, neopentecostais, a partir dos anos 1970, a prestação de serviços
diferenciados – como já sugerido – avança o aspecto de coesão com as
transformações sociais; consubstanciando-se, mais do isso, em instrumento
fundamental da disputa pela legitimação dos serviços religiosos no mercado. A
diversidade cultural da sociedade, o agravamento dos problemas correlatos à
urbanização, a liberdade de expressão e a maior propensão em se aceitar a
pluralidade reforçam os aspectos de estímulo à segmentação dos fiéis em grupos
de identidades e perfis próprios, que, uma vez identificados, têm para si
pregações e ritos adaptados.
Recentemente, em publicação do diário O Estado de São Paulo, sob o
título “Evangélicos criam igrejas sob medida”93, o movimento de segmentação dos
fiéis em grupos para os quais serviços diferenciados são prestados foi apontado
como uma tendência que tem ajudado a manutenção do elevado ritmo de
crescimento das igrejas evangélicas. De acordo com a matéria94, o sociólogo Dr.

93
Ricardo Westin. Evangélicos criam igrejas sob medida. O Estado de São Paulo, São Paulo, 26 Jun. 2005,
Caderno A, p. 24.
94
Idem.
72

Ricardo Mariano95 associa a segmentação do mercado religioso à aplicação da


lógica mundana capitalista à espiritualidade da religião, fazendo “muito sentido na
situação atual do País, de grande concorrência entre os grupos religiosos”. Para
ele, “é uma questão de sobrevivência no mercado”96.
A diferenciação dos serviços com intuito de segmentação dos fiéis e
especialização da oferta de bens simbólicos associados à religião resulta no
agrupamento dos mais diversos perfis, incluindo “grupos [específicos] de ricos,
surfistas, gays e até pessoas que querem aprender a falar com Deus em inglês”97.
Voltada especialmente ao público formado por empresários, a Comissão Cristã de
Homens de Negócios, por exemplo, declara como missão “apresentar Jesus
Cristo como Senhor Salvador a homens de negócios e profissionais liberais e
treina-los para que cumpram a Grande Comissão dada por Jesus”98.
A Igreja Sara Nossa Terra, apelidada de “igreja dos ricos”, sediada em
Brasília e especializada nos fiéis da classe A, salienta a importância de se
abordar problemas com filhos de famílias nobres, “que costumam não dar muito
valor ao que possuem e se envolvem com briga, bebida e drogas”99. Segundo o
bispo da igreja, “é mais fácil transmitir a mensagem de Deus quando os fiéis são
homogêneos”100. Analogamente, igrejas como a Acalanto e a Igreja Para Todos,
voltam-se com especificidade ao público gay, em defesa de que o
“homossexualismo não é pecado”101; com direito à utilização do arco-íris como
símbolo, presente na decoração do templo ou estampado sobre a Bíblia, além de
celebrações matrimoniais com “assinatura em livro de relacionamentos estáveis
homossexuais, devidamente registrada em cartório”102.
Dentre estes exemplos, inúmeras outras denominações se somam na
prática de especialização da prestação dos serviços religiosos e ajudam a
segmentar o campo religioso em grupos específicos de fiéis. O Pastor Robson

95
Ricardo Mariano. Neopentecostais: sociologia do novo pentecostalismo no Brasil. São Paulo: Loyola,
1999.
96
Ricardo Mariano citado por Ricardo Westin. Evangélicos criam igrejas sob medida. O Estado de São
Paulo, São Paulo, 26 Jun. 2005, Caderno A, p. 24.
97
Ricardo Westin. Evangélicos criam igrejas sob medida. O Estado de São Paulo, São Paulo, 26 Jun. 2005,
Caderno A, p. 24.
98
Idem.
99
Bispo Rodovalho, fundador da Igreja Sara Nossa Terra, citado por Ricardo Westin. Evangélicos criam
igrejas sob medida. O Estado de São Paulo, São Paulo, 26 Jun. 2005, Caderno A, p. 24.
100
Idem.
101
Ricardo Westin. Evangélicos criam igrejas sob medida. O Estado de São Paulo, São Paulo, 26 Jun. 2005,
Caderno A, p. 24.
102
Idem.
73

Pereira, por exemplo, reuniu seus conhecimentos como ex-professor de inglês e


adaptou os cultos da Igreja Cristã Evangélica do Brasil de modo a compatibilizar
os ensinamentos bíblicos com o aprendizado de um segundo idioma. Os
estudantes que se dirigem regularmente à igreja para aprender a falar com Deus
em inglês têm sido os responsáveis pela maneira “surpreendente como o
movimento [da igreja] tem aumentado a cada mês”103. O Pastor Rina, por sua vez,
no comando da Igreja Bola de Neve, expande a denominação com a abertura de
novos templos, usando calça jeans e tênis nas pregações diante de um púlpito em
forma de prancha de surfe, voltadas a centenas de jovens, dentre os quais,
muitos de chinelo, gel e tatuagens à mostra104.
Estas especificidades que se fazem presentes para parcelas da classe
leiga da sociedade, e se intensificam à medida que as transformações sociais
tendem à maior liberdade de expressão cultural, podem, naturalmente, se auto
excluírem do campo religioso tradicional. Por exemplo, a sociedade brasileira até
poucas décadas recobria-se de preconceitos à respeito da dissolução de
casamentos por separações, desquites ou divórcios. Neste contexto, as pessoas
separadas de seus cônjuges, principalmente as mulheres, podiam ser vítimas de
discriminação até mesmo dentro das congregações religiosas que freqüentavam.
Desta forma, o surgimento de denominações mais tolerantes com esta questão –
considerando-se insignificantes todas as demais implicações à entrada no campo
religioso – asseguraria o oferecimento de melhor assistência a esse perfil
específico da sociedade e, com isso, essas novas igrejas tomariam para si esta
fatia do mercado de religião.
Atualmente, o exemplo acima se faz ainda mais presente devido a maior
heterogeneidade social. Nas igrejas cujos discursos voltam-se à classe pobre, por
exemplo, os muito ricos podem sentir-se desprovidos da salvação ou das
explicações legitimantes da sua condição social; o mesmo vale para o caso dos
homossexuais e das incontáveis tribos jovens que se formam a cada geração.
Assim, o surgimento de novas denominações especializadas com adaptações do
discurso para um público específico encontra espaço no campo religioso e
ameaça as fatias de mercado das denominações já estabelecidas. Observamos

103
Pastor Robson Pereira, da Igreja Cristã Evangélica do Brasil, citado por Ricardo Westin. Evangélicos
criam igrejas sob medida. O Estado de São Paulo, São Paulo, 26 Jun. 2005, Caderno A, p. 24.
104
Ricardo Westin. Evangélicos criam igrejas sob medida. O Estado de São Paulo, São Paulo, 26 Jun. 2005,
Caderno A, p. 24.
74

ao longo da pesquisa, no entanto, que estas últimas, no intuito de protegerem-se


da contestabilidade de suas condições de atender o campo como um todo por
capitais religiosos ainda incipientes (entrantes), tendem a internalizar a
diferenciação de produtos, assegurando para si a escala de fiéis já atendida.
Até mesmo as denominações especializadas em segmentos específicos de
leigos, para poderem crescer, não resistem à especialização e se submetem, num
segundo momento, à internalização da diferenciação de produtos, como o
Professor Antônio Flávio Pierucci da Universidade de São Paulo procurou explicar
em matéria do jornal O Estado de São Paulo:

Para o professor da Universidade de São Paulo (USP) Antônio


Flávio Pierucci, especialista em Sociologia da Religião, “não há a
possibilidade sociológica de um grupo se manter especializado
por muito tempo”. Esta seria apenas uma estratégia para se
viabilizar e depois conquistar novos fiéis. “Ninguém quer ser
minoria para sempre”105.

Apesar da orientação principal de se instalar geralmente em regiões que se


encontram sob condições sócio-economicamente agravadas – o que poderia ser
entendida como uma forma geral de especialização –, comprovada em entrevista
concedida por um pastor de Jundiaí (SP) ao afirmar que sua denominação
procura abrir novos templos sempre em locais “onde tem muitas pessoas
sofrendo (prostituição, roubo, etc.)”, a Igreja Universal do Reino de Deus se
apresentou como um exemplo típico de diferenciação internalizada dos serviços
religiosos prestados. Ao longo da semana tipos específicos de reuniões são
celebrados e voltam-se claramente a parcelas particulares da membresia. As
descrições abaixo foram extraídas de um dos sites oficiais da Igreja Universal do
Reino de Deus e explicam algumas das principais reuniões realizadas106.

Segunda-feira, Nação dos 318 – Conhecida também como o


maior congresso empresarial do Brasil, a nação dos 318 tem por

105
Professor Antônio Flávio Pierucci (USP) citado por Ricardo Westin. Evangélicos criam igrejas sob
medida. O Estado de São Paulo, São Paulo, 26 Jun. 2005, Caderno A, p. 24.
106
As reuniões in: Templo Maior – Igreja Universal do Reino de Deus. Disponível em
<http://www.catedralmundial.com.br/reuniao.php>. Acesso em 03 Dez. 2005.
75

objetivo mostrar à pessoa a importância de ter uma vida


próspera. A cada reunião, o congressista ministra palestras
sempre enfocando o aspecto financeiro e empresarial aliado a fé
em deus. Quem já participa da nação dos 318 tem conquistado o
sucesso financeiro e a realização profissional.

Terça-feira, Sessão de Descarrego – A sessão do descarrego é


um tratamento espiritual para aquelas pessoas que sofrem com
problemas causados por encostos. As atuações mais comuns
acontecem na área familiar, como separações, vícios, e traições;
na área espiritual, visões, depressão, desejo de morrer, medo e
nervosismo; na saúde, doenças que os médicos não
diagnosticam; na área financeira, dívidas

Quinta-feira, Reunião das Mulheres de Deus – A Reunião das


Mulheres de Deus tem a finalidade de orientar a base espiritual
da família que tem a mulher como responsável da edificação.
Nesta reunião 70 esposas de pastores e bispos atendem antes e
após a reunião.
Estas consagram um bálsamo por uma semana para consagrar
todas as mulheres nesta concentração. A reunião acontece todas
as quintas-feiras às 15 horas.

Quinta-feira, Reunião de Oração pela Família – A reunião de


oração pela família é uma reunião onde as pessoas clamam a
Deus para que suas famílias sejam abençoadas e que hajam (sic)
transformações em suas vidas.

Sábado, Terapia do Amor – Tratar das feridas na área


sentimental. Esse é o objetivo da terapia do amor, uma reunião
para quem sofre as dores do amor, que deseja encontrar a outra
metade, restaurar o casamento, vencer a ansiedade e curar as
desilusões, decepções e mágoas. O palestrante aborda esses
assuntos e explica a luz da bíblia (sic) como é possível ser feliz e
amado, ter uma família que viva em harmonia e deixar sempre
acesa a chama do amor.
76

Domingo, Concentração de Fé e Milagres – Nesta reunião,


acontecem momentos de louvor e adoração a Deus, clamor pela
cura e libertação, oração para os casais e a benção da
prosperidade. Uma reunião completa, que já se tornou a maior
concentração de fé que acontece aos domingos no Rio de
Janeiro.

Campos (1997) apropriou-se das categorias de classificação de produtos


criadas por Levitt (1988 apud CAMPOS, 1997, p. 224), segundo o qual os
produtos podem ser genéricos (benefício principal esperado pelo consumidor;
“Bênçãos de Deus”, no caso da religião), específicos ou esperados
(desdobramento dos produtos genéricos em “curas”, “prosperidade”, “sucesso”,
etc.) e ampliados (formas de agregação de vantagens aos produtos genéricos;
cuidados com a estética e suspensão de vícios, por exemplo, associados à cura
do corpo e emprego melhor associado à prosperidade), para explicar a estratégia
de diferenciação de produtos adotada pela Igreja Universal. O autor permite
explicar como, no caso particular desta denominação, a criação de serviços
específicos, agrupados em “famílias de produtos” – identificadas inclusive com
logotipos próprios –, atende a um objetivo estratégico desenvolvido a partir de um
grupo de idéias centradas ao redor da expressão “Cristo salva, cura e faz
prosperar os que aceitam a Igreja Universal do Reino de Deus”107.
Esta segmentação estratégica dos fiéis de uma denominação pela
prestação de serviços religioso diferenciados, que permite, por um lado, precaver-
se da contestabilidade de sua legitimidade enquanto instituição provedora de
religiosidade por novos capitais religiosos ou mesmo por rearticulação das
próprias rivais estabelecidas; por outro, se muito previamente planejada como no
caso da IURD, demanda o emprego de instrumentos capazes de fundir de fato as
características desenhadas dos produtos às necessidades interiores dos fiéis.
Neste sentido, o templo é apontado não somente como o local onde se celebram
ritos isolados, mas, mais do que isso, como o “lócus do ‘acabamento’ dado ao
produto, isto é, de sua adaptação [pelos pregadores] e distribuição aos

107
Leonildo Silveira Campos. Teatro, templo e mercado – Organização e marketing de um empreendimento
neopentecostal. Petrópolis: Vozes, 1997, p. 224.
77

‘consumidores’ devidamente segmentados”, para o “despertar da fé”. (CAMPOS,


1997, p. 224-225)
Na Igreja Católica também, de alguma forma, a diversificação dos serviços
religiosos prestados pode ser observada. Independente do aspecto estratégico
que possa ou não ter assumido quando da sua criação, o Movimento de
Renovação Carismática (RCC) surgiu e se desenvolveu mais fortemente
justamente ao passo que a sociedade acolheu mais intensamente as
denominações pentecostais e neopentecostais, a partir da segunda metade do
século passado. Com a incorporação de elementos menos tradicionais, como os
cânticos populares comandados por bandas compostas de instrumentos nada
eruditos (guitarras, baterias, etc.), os grupos de oração e as práticas de cura e
fala em línguas, a Igreja Católica no Brasil conseguiu segmentar os fiéis de
acordo com a preferência por missas mais tradicionais ou mais carismáticas.
Imaginando-se, por exemplo, que nós pudéssemos relacionar o
crescimento de denominações evangélicas mais carismáticas às regiões nas
quais os problemas sócio-econômicos se agravam, tais como nas zonas
periféricas dos grandes centros urbanos, a adaptação das missas católicas nestas
áreas seria, antes de tudo, visto o campo religioso pela sua ótica de mercado,
uma questão de sobrevivência. A proliferação do movimento de RCC nas
instâncias católicas poderia significar uma motivação à reaproximação de um fiel
inativo em substituição à sua adesão por uma nova doutrina evangélica
pentecostal108. Esta é uma idéia que muitos têm tentado comprovar. Para
Marques (2001, p. 4) é inegável o fato de que a RCC “tem minimizado o
esvaziamento da Igreja Católica”. Acredita-se que a segmentação dos serviços
religiosos, internalizada pelo catolicismo romano no Brasil, de modo a assemelhar
em algumas paróquias os discursos e práticas aos dos pentecostais, tem atendido
seus objetivos estratégicos. Segundo a revista Veja:

ao contrário do catolicismo tradicional, em que se reza pela vida


eterna, aqui o que se pede, entre transes e apelos ao Espírito
Santo, é qualidade de vida na terra mesmo. Ao mesmo tempo em
que pregam a necessidade do perdão e do testemunho, os

108
No Apêndice D procuramos desenvolver graficamente as vantagens estratégicas de diferenciação dos
serviços no que tange à possibilidade de se assegurar a escala de fiéis, tomando o caso da religião católica
como exemplo.
78

padres da Renovação falam em “prosperidade” e “bem-estar”.


(OYAMA apud MARQUES, 2001, p. 4)

Lemos Filho (1996) procura demonstrar em seu estudo, por meio de uma
análise do catolicismo na cidade de Itapita (SP), a existência de vários
catolicismos brasileiros conflitantes entre si, apesar da aparente homogeneidade
ideológica; decorrentes da passagem do monopólio absoluto da religião católica
para uma situação de concorrência com outros grupos religiosos ou mesmo entre
os diversos grupos internos da própria igreja. Para efeito de análise, o autor
construiu uma classificação a partir de depoimentos no intuito de evidenciar as
divergentes atuações da igreja católica da cidade, quanto aos princípios básicos,
a ênfase pastoral, as relações da igreja com a sociedade e com os fiéis
propriamente e a relação dos padres entre si, observados em cada uma das
quatro paróquias.
A coexistência de características específicas de cada paróquia quanto aos
indicadores citados assegurou, no caso de Itapira, uma maior identificação de
cada grupo social da cidade com as estas particularidades. Desta forma, os
setores mais conservadores da sociedade local mantiveram-se associados à
paróquia que reservou maior grau de tradicionalismo; enquanto que os grupos
ligados às classes subalternas se identificavam mais com a paróquia que
incorporou maiores alterações popularizantes nos discursos e ritos, nos moldes
propostos pela Teologia da Libertação (LEMOS FILHO, 1996, p. 128-133).
Embora, houvesse forte relação de conflito entre as quatro paróquias de Itapira,
enquanto a estrutura organizacional fosse capaz de sustentar a unidade
denominacional, estaria assegurada a fatia de mercado da Igreja Católica e, neste
contexto, comprovada a eficácia estratégica da internalização da diferenciação de
serviços religioso por uma denominação.

3.3.2 A importância do marketing

Em geral, o emprego do termo marketing é constantemente associado às


relações econômicas de natureza capitalista, isto é, nas relações de troca
centradas no objetivo de gerar excedentes às partes envolvidas. Desta forma,
com o relacionamento imediato pela maioria das pessoas deste termo a conceitos
79

como “venda” e “propaganda”, implicam-se dificuldades de se considerar a


importância da aplicação de seus instrumentais às atividades desempenhadas
pelas igrejas. No entanto, para Kater Filho109, a área de “vendas nem está
relacionada a marketing”; são estas, na verdade, áreas distintas, apesar da
função estratégica do emprego dos recursos de marketing para facilitar as vendas
das empresas; mas, ainda assim, cada qual com suas características particulares,
não se subordinando uma a outra. A atividade de propaganda, por sua vez, não
pode ser considerada suficiente para explicar o conceito de marketing; como uma
de suas áreas ela trata tão somente da visibilidade do trabalho de marketing110.
Mais do que isso, a área de marketing esta associada ao estudo e à
facilitação dos processos de troca, diante do aspecto humano que os envolve.
Neste sentido, Philip Kotler define marketing como “a atividade humana dirigida
para a satisfação das necessidades e desejos, através dos processos de troca” e,
portanto, associa-se ao conjunto de conhecimentos e ferramentas que tem por
tarefa coordenar, planejar e controlar os processos de concretização desses
objetivos. (KOTLER, 1980 apud CAMPOS, 1997, p. 207)
A compreensão das relações de trocas, nas quais são centradas as
análises da área de marketing, uma vez pautadas na suposição de um
envolvimento mínimo do fator racionalidade, permite-nos afirmar que os agentes
orientados ao mercado, via de regra, não empreendem relações aleatórias de
oferecimento de seus produtos e serviços a qualquer pessoa. Como vimos
anteriormente, mais do que isso, os agentes de mercado desenvolvem suas
estratégias planejando-as cuidadosamente; adaptando, possivelmente, suas
orientações aos interesses assimétricos dos consumidores, inclusive
segmentando-os, quando necessário. Este é o espírito do marketing e “o
resultado é a elaboração de uma teoria e técnicas, que incluem a mentalidade
racional e calculista, para interferir nos processos de troca e explica-los”,
ressalvando-se, contudo, o envolvimento do aspecto humano que sujeita a
relação de troca também às possibilidades de ausência da racionalidade
econômica. (CAMPOS, 1997, p. 209)

109
Idealizador e 2º vice-presidente do Instituto Brasileiro de Marketing Católico – IBMC, consultor em
marketing, escritor e professor universitário com mestrado pela USP, em entrevista concedida aos 27 de
setembro de 2005, das 17h às 18h, na sede do IBMC, na Av. João Erbolato, 50 – sala 20 – Castelo –
Campinas (SP).
110
Idem.
80

Essa pressuposição da área de marketing acerca da possibilidade de se


pesquisar, descobrir, alterar e atender as necessidades e preferências das
pessoas, quanto ao consumo de produtos e serviços diversos, vai de encontro
com os objetivos das instituições religiosas, quando entendidos os benefícios
ofertados por estas como necessidades humanas ainda fortemente presentes,
mesmo após grandes transformações seculares da sociedade. Assim, a partir de
uma primeira análise, estritamente conceitual, que parte da premissa que o
marketing se define pelo empenho, através de instrumentais próprios, orientado à
satisfação das necessidades das pessoas e que 70% destas necessidades são
consideradas de natureza espiritual, percebemos a intimidade existente entre a
religião e o marketing (KATER FILHO, 2005, entrevista concedida).
Philip Kotler (1988 apud CAMPOS, 1997, p. 211) foi um dos pioneiros da
ligação entre as práticas de marketing à religião. A partir das idéias principais
cunhadas em seu livro Marketing para organizações não lucrativas (1988 apud
CAMPOS, 1997), e desdobradas por ele e outros companheiros com
especificidade ao caso das organizações religiosas, principalmente as igrejas e
sinagogas norte-americanas, no texto Marketing for congregations - choosing to
serve people more effectively (SHAWCHUCK et al, 1992 apud CAMPOS, 1997),
Kotler propôs a adoção de técnicas formais de marketing às denominações
religiosas. Compreendeu-as como organizações sem fins lucrativos que reúnem
pessoas, materiais e instalações, e que procuram atingir alguns propósitos em
relação à sociedade e, portanto, necessitam da formalidade das técnicas
mercadológicas para melhor entender e atender seus consumidores. Como objeto
de estudo, Kotler e Shawchuck (et al, 1992 apud CAMPOS, 1997) tomaram a
religião institucionalizada dos Estados Unidos, sob o pressuposto de crise em
algumas denominações, correlata à perda de “membresia” e a queda na demanda
por serviços tradicionalmente prestados por elas. Discutiram como primeiro
problema as resistências comumente observadas ao emprego das técnicas de
marketing às instituições religiosas, as quais se estendem do argumento de
desperdício do “dinheiro de Deus” à caracterização “dessacralizada” desta
mentalidade que liga religião à venda e a conceitos como “produto”, “troca”,
“mercado”, “demanda”, “clico de vida de produtos”, e outros.
George Barna (Marketing the church, 1994 apud CAMPOS, 1997, p. 212)
também apontou o “espírito de aversão e de objeções” (ao marketing) de alguns
81

religiosos como um empecilho à utilização de suas técnicas como importantes


instrumentos das estratégias de crescimento das igrejas. Segundo o autor, o
principal problema que afeta as igrejas protestantes dos Estados Unidos é o “fato
de não adotar um apoio de marketing – num meio que se tornou apoiado por ele”.
Para Barna (1994 apud CAMPOS, 1997, p. 212), por conta dessa má-vontade
com relação ao marketing, o pastor protestante – o que igualmente valeria para os
sacerdotes católicos, segundo Kater Filho111 – passa pelo seminário teológico
sem perceber que “ao assumir a direção de uma igreja, esta sendo chamado para
dirigir um negócio [...] e o negócio ao qual a igreja se dedica é o ministério”.
Peter Berger (1985) já ligava a tendência à racionalização das estruturas e
procedimentos das instituições religiosas, resultantes da pluralidade, às
necessidades de as denominações apresentarem resultados concretos de suas
atuações no campo religioso. Contrariamente à situação de monopólio, que
implicava a não cobrança de resultados das organizações religiosas, a
concorrência, dada numa dinâmica de mercado religioso, transforma o marketing
num conjunto indispensável de instrumentos de competição. Kater Filho (2005)
compartilha do argumento entendendo que “a concorrência é a grande arma do
marketing; sem concorrência não existe marketing”.
Diante desta “imposição de mercado” que se traduz de uma mentalidade
calculista e pragmática das relações de competição entre as denominações
religiosas, alguns líderes foram levados a buscar, “no universo do marketing,
princípios, técnicas e estratégias, que os ajudassem a melhorar a performance de
suas organizações, no ranking do mercado religioso” (CAMPOS, 1997, p. 213).
Campos (1997, p. 213) ressalva, no entanto, que esta descoberta se deu
“tanto por meio de uma opção consciente e calculista de uma assessoria como
também através de processos [meramente] intuitivos” e cita a Igreja Renascer em
Cristo como exemplo de estratégia calculista no uso do marketing. Segundo ele, o
fundador desta denominação, Estevan Hernandes Filhos, havia sido gerente de
marketing de grandes empresas, além de palestrante e autor de textos sobre o
“marketing na igreja”; as gravações de suas palestras em fitas de vídeo
percorriam igrejas para subsidiar pastores e lideranças interessadas em
estratégias de crescimento de suas denominações. O autor também citou a Igreja

111
Em entrevista citada.
82

Universal do Reino de Deus e a Igreja Pentecostal “Deus é amor” como


denominações que possivelmente chegaram “a técnicas mais ou menos
elaboradas de marketing, através de uma prática baseada muito mais na intuição
de uma liderança obcecada pelo crescimento a qualquer preço e do ‘ensaio e
erro’ do que em uma teoria, calculadamente implantada”.
O administrador e publicitário Mestre Antônio Miguel Kater Filho,
idealizador e fundador (1998) do Instituto Brasileiro de Marketing Católico – IBMC,
sediado em Campinas (SP) e hoje oficialmente presidido por Sua Eminência
Reverendíssima, o Arcebispo de Florianópolis Dom Murilo Sebastião Krieger,
defende uma associação irrestrita (calculista) das estratégias de marketing adotas
pelas empresas às atividades desempenhas das pelas igrejas. Afirma que, na
verdade, “não há diferença nenhuma” entre as estratégias de marketing pensadas
para as empresas e aquelas orientadas para as igrejas, desde que definido
claramente o conceito de marketing como meio de se “ir ao encontro das
necessidades das pessoas” (KATER FILHO, 2005, em entrevista concedida).
Afirmou ainda em um trabalho próprio, reforçando o aspecto estratégico do
marketing na competição entre as igrejas, que:

o marketing, adequadamente aplicado à Igreja Católica, resolverá


satisfatoriamente o problema da evasão dos católicos e a falta de
motivação entre seus fiéis, levando-os a um renovado interesse e
amor pela Igreja. (KATER FILHO, 1996 apud MARQUES, 2001)

Autor de uma dissertação pela Universidade de São Paulo (USP),


Marketing aplicado à Igreja Católica (1994), cujo intuito foi a elaboração de
instrumentais de marketing formal voltados à manutenção e ao crescimento do
quadro de fiéis católicos, diante da recente evasão experimentada por esta
instituição religiosa, notadamente a favor dos evangélicos112, Kater Filho procurou
justificar suas idéias em matéria da revista Veja:

Atualmente a Igreja Católica se recolhe dentro do casulo, como


uma tartaruga. Leva vida vegetativa, porém protegida pelo seu

112
KATER FILHO, Antônio Miguel. Marketing Aplicado a Igreja Católica. São Paulo: USP, 1994. Resumo
disponível em <http://www6.ufrgs.br/infotec/teses92-96/html/usp94.htm>. Acesso em 07 Set 2005.
83

casco. Vive sob a lógica do comerciante que fecha o restaurante


na hora do almoço. O padre abre a igreja às 7 horas da manhã,
celebra a missa para umas doze velhinhas. Aí fecha a igreja e só
abre às 7 noite da noite, quando essas mesmas doze velhinhas
voltam para rezar o terço. Aí fecha outra vez.113

O IBMC, na figura central do professor e consultor Kater Filho, apesar de


não ser um órgão da CNBB, com base nestas colocações, tem contado com a
simpatia de vários bispos influentes no país. Segundo seu idealizador, "aos
poucos, cresce entre os bispos a consciência de que o marketing não é uma arma
diabólica do capitalismo. Nos dias de hoje, é uma ferramenta indispensável para a
reaproximação com os fiéis"114 Um dos bispos com os quais o instituto tem
contado com o entusiasmo é o cardeal-arcebispo de São Paulo, Sua Eminência
Reverendíssima, Dom Cláudio Hummes. Segundo Kater Filho, “ele [o cardeal]
aposta no marketing como alternativa para fazer com que o sacramento chegue
ao coração do público”115. Tarefa esta que o IBMC tem procurado cumprir através
de cursos e consultorias ministrados às dioceses católicas, publicação de uma
revista especializada chamada Marketing Católico e a realização anual um
encontro de marketing, que reúne membros da Igreja Católica e publicitários
simpatizantes.
Philip Kotler (1980) definiu o composto básico dos instrumentos de
marketing a partir do planejamento estratégico dado em quatro instâncias
fundamentais, conhecidas como os famosos quatro Ps ou marketing mix: produto,
preço, praça (ou ponto de venda) e promoção. Questionado sobre a aplicabilidade
deste conceito às denominações religiosas, Kater Filho simplificou, associando,
de maneira objetiva, o produto – que na verdade é um serviço – à salvação; o
preço a um custo fantástico igual a zero116; a praça aos infinitos pontos nos quais

113
Citado pelo site Católica Net, disponível em
<http://www.catolicanet.com.br/interatividade/enquetes/enquetes.asp?cod=4>. Acesso em 07 Set 2005.
114
Antonio Miguel Kater Filho, citado por Marcelo Marthe e Ricardo Valladares. Os católicos contra-atacam.
Mater Ecclesiae. Disponível em <http://www.mrp.com.br/mater/contra-ataque.htm>. Acesso em 07 Set
2005.
115
Luiza Villaméa. Nas mãos do Espírito Santo. Isto é – Especial João Paulo II, 13 Abr 2005. Disponível em
<http://www.terra.com.br/istoe/1852/especial_joao_paulo/1852_nas_maos_do_espirito_santo.htm>. Acesso
em 07 Set 2005.
116
Neste trabalho nos abstivemos de qualquer análise à respeito do preço dos produtos religiosos por
pressupormos sua irrelevância nos processos decisórios de compra e venda de bens simbólicos no mercado
religioso. Apesar das possibilidades teóricas de associação deste componente ao dízimo ou a outros
84

a salvação pode ser oferecida, independente dos templos; e, finalmente, a


promoção ao “P” no qual as instituições vão de fato trabalhar, no sentido de
compor estratégias de publicidade, propaganda e “promoção de vendas”, tal como
a “venda pessoal”; incluindo, neste último componente da aliteração, também as
estratégias de escolha dos canais de comunicação. (KATER FILHO, 2005)
Em termos mais objetivos, o componente do mix de marketing que
corresponde à análise do produto contempla o estudo e as decisões estratégicas
em torno da escolha dos serviços que as denominações religiosas pretendem
prestar, bem como a compatibilização de suas respectivas características aos
interesses particulares de cada grupo de fiéis. Segue, portanto, diretrizes muito
em torno dos assuntos analisados no primeiro tópico do capítulo anterior e no
item 3.3.2, respectivamente, sobre a definição do produto da religião e as
abordagens estratégicas da diferenciação e segmentação do share de mercado;
passando ainda, necessariamente, no caso do marketing, pela questão da
qualidade dos serviços que se prestam, traduzida no caso da religião, dentre
outras coisas relativas aos interesses dos consumidores, para o grau de
capacitação teológica incorporada aos discursos religiosos.
Pudemos compreender que, mais que a salvação propriamente dita, o
produto da religião se compõe de todas as suas formas de desdobramentos em
serviços demandados, independendo do nível de objetividade prática. Desta
forma, a estratégia de marketing das igrejas voltada aos serviços que presta está
relacionada, antes de tudo, aos pontos enfatizados por cada denominação
religiosa (paz espiritual, saúde, tranqüilidade financeira, respostas sobre a
condição social, conteúdo teológico, etc.) através dos elementos que incorpora
aos discursos e ritos e que vão ajudar a compor, de fato, a doutrina e os dogmas
da religião.
Ao marketing estratégico de produtos das igrejas podemos também
relacionar os serviços prestados aos fiéis paralelamente àqueles estritamente
religiosos. Estes serviços são observados, em geral, nas mais diversas áreas de
apoio à comunidade, desde a promoção gratuita das atividades profissionais
desempenhadas por alguns fiéis junto à congregação, às parcerias firmadas com

elementos mais subjetivos como o tempo do fiel, compreendemos que a escolha da religiosidade menos se
determina pelo fator preço do que pelos demais componentes aqui tratados em termos de composto de
marketing.
85

segmentos seculares da sociedade como, por exemplo, bancos. Os grupos


religiosos Renascer, Assembléia de Deus, Adventista do Sétimo Dia e
Congregação Batista Brasileira, por exemplo, mantêm, em parceria com o banco
Bradesco, cartões de crédito – inclusive de bandeira Visa – destinados com
exclusividade a seus públicos evangélicos117.
A determinação da praça ou ponto de oferta dos serviços religiosos
também é um importante componente estratégico do composto de marketing.
Embora a salvação ultrapasse a questão espacial pelo ponto de vista das igrejas
e do professor Kater Filho, é no templo que os ritos são celebrados e a prestação
dos serviços religiosos é legitimada, em especial, sob condições de elevada
racionalização (ou marketing calculista) no prévio planejamento destes serviços
(CAMPOS, 1997, p. 224-225). Neste sentido de indispensabilidade da figura da
sede, o marketing estratégico pode incluir a análise em termos logísticos da
disposição geográfica das igrejas, de modo a melhor atender as necessidades
dos fiéis.
Os componentes produto e praça oferecem, portanto, férteis ambientes
para exploração estratégica do composto de marketing das igrejas. Contudo, é
somente na área da promoção que estas ganham maior visibilidade, e, neste
sentido, a presença dos canais de comunicação tem se tornado cada vez mais
indispensável para o mercado religioso. Kater Filho, em entrevista à revista Veja,
lembrou que "o primeiro veículo de comunicação de massa da História foi o sino
[...] três badaladas rápidas significavam que o padre estava chamando para a
missa, badaladas lentas avisavam as mortes "118. Hoje, mais do que os próprios
meios embutidos nas instituições tradicionais, as igrejas tornaram-se dependentes
da mídia para acompanhar o ritmo de desenvolvimento da sociedade, como
afirma Campos (1997):

[...] as pessoas deixaram de orientar suas ações pelos programas


embutidos nas instituições tradicionais e se tornaram
dependentes da mídia, como fonte de modelos para regular seu
comportamento. Por isso, é impossível visualizarmos o drama
social, as relações humanas ao redor do sagrado e as trocas dos

117
Luciana Farnesi. Um mercado movido pela fé. Revista Exame, 16 Fev. 2005, p. 60-61.
118
Citado por Daniel Liidtke. Católicos versus evangélicos: ao vencedor, as ovelhas. Canal da Imprensa.
Disponível em <http://www.canaldaimprensa.com.br/debate/vint2/debate1.htm>. Acesso em 07 Set 2005.
86

bens simbólicos, sem uma análise do papel desempenhado pela


propaganda e publicidade na montagem de um sistema religioso
orientado pelo marketing.119

Leonildo Silveira Campos (apud MARQUES, 2001, p. 3) acrescenta que a


“propaganda é a espinha dorsal do sucesso das igrejas como a Universal do
Reino de Deus”. Desta forma, num primeiro momento, a mídia impressa, figurada
pelos livros, jornais e revistas, e, a seguir, a mídia eletrônica (rádio, televisão,
internet) associaram-se aos veículos tradicionais de se oferecer visibilidade do
trabalho desempenhado, consubstanciando, cada vez mais, em instrumentos de
grande importância para as igrejas sob as atuais condições de acirramento da
concorrência religiosa. No que tange à mídia impressa, pode dizer que, em
termos absolutos, católicos e evangélicos praticamente equiparam-se; tendo sido
potencializados estes últimos por edições de revistas como a Eclésia e jornais
como a Folha Universal120. No mercado de livros, 91 milhões de reais foi o
faturamento das editoras católicas em 2002, contra 87 milhões das editoras
evangélicas121.
No campo da mídia eletrônica, na principal disputa do mercado religioso
brasileiro, católicos versus evangélicos, destacando os pentecostais e
neopentecostais, a Igreja Católica admite a dianteira evangélica. Somados os
empreendimentos destas últimas (pentecostais e tradicionais) o Brasil já é o
“segundo produtor mundial de programas evangélicos na televisão” (ORO, 1991
apud MARQUES, 2001, p. 3). Os evangélicos já contam com 30 gravadoras
musicais, enquanto que os católicos com apenas 4; no rádio são 470 as
emissoras evangélicas e 200 as católicas122. E na televisão as estatísticas são
ainda mais conturbadas pela posse da Rede Record de televisão pela Igreja
Universal do Reino de Deus123. Por isso mesmo, em ocasião da 35ª Assembléia

119
Leonildo Silveira Campos. Teatro, templo e mercado – Organização e marketing de um empreendimento
neopentecostal. Petrópolis: Vozes, 1997, p. 239.
120
Daniel Liidtke. Católicos versus evangélicos: ao vencedor, as ovelhas. Canal da Imprensa. Disponível em
<http://www.canaldaimprensa.com.br/debate/vint2/debate1.htm>. Acesso em 07 Set 2005.
121
Marcelo Marthe e Ricardo Valladares. Os católicos contra-atacam. Mater Ecclesiae. Disponível em
<http://www.mrp.com.br/mater/contra-ataque.htm>. Acesso em 07 Set 2005.
122
Daniel Liidtke. Católicos versus evangélicos: ao vencedor, as ovelhas. Canal da Imprensa. Disponível em
<http://www.canaldaimprensa.com.br/debate/vint2/debate1.htm>. Acesso em 07 Set 2005.
123
Nos Estados Unidos, registra-se cerca de 250 emissoras de TV exclusivamente cristãs e 1600 estações de
rádio nas mesmas condições. Sérgio Dávila. Direita religiosa mostra rosto e lucra nos EUA de Bush. Folha
de São Paulo, Califórnia, 27 Mar 2005, caderno A, p. 15.
87

Geral da Comissão Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, realizada em 1997


sob o tema "Igreja e Comunidade Rumo ao Novo Milênio", os católicos se
intensificaram nos empenhos voltados à reversão do domínio evangélico na
televisão, trabalhando para modernizar as programações de suas emissoras:
Rede Vida, TV Canção Nova e TV Século XXI124. Dom Fernando Antônio
Figueiredo, superior do Padre Marcelo Rossi e grande apoiador do marketing
católico entende que a igreja não pode negligenciar os meios de comunicação
como a TV e a imprensa escrita para divulgar a mensagem de Deus; segundo ele,
estes meios fazem parte de uma das estratégias escolhidas pela igreja católica
para “aumentar seu rebanho”125
No cinema, a promoção dos propósitos da igreja também ganha espaço,
entretanto, neste caso, a liderança absoluta é da Igreja Católica. Mundialmente,
dentre muitos outros, o filme A paixão de Cristo (2004), de Mel Gibson126, teve
gigantesca repercussão. No Brasil as iniciativas neste campo, apesar de ainda
menos desenvolvidas do que as experiências norte-americanas, também se
fizeram presentes em produções respeitadas quanto ao volume de recursos
empreendidos. É o caso de Maria, Mãe do Filho de Deus, produção católica no
cinema brasileiro cujo objetivo orientado à atração de “ovelhas para o rebanho
católico” foi apontado pelo padre midiático Marcelo Rossi127.
Outro veículo de transmissão do Evangelho de Jesus Cristo pelas igrejas
cuja utilização tem crescido nos últimos anos é justamente a promoção de padres
e pastores; no caso da Igreja Católica, tratados por “padres midiáticos”, em geral
associados à RCC. Talvez neste segmento o maior nome seja o do padre Marcelo
Rossi, que, com mais de 6 milhões de discos vendidos, seis livros editados, e
acirrada disputa de sua participação em programas de rádio e televisão para
entrevistas e programas de auditório128, “começou a chamar a atenção por volta

124
Idem.
125
Citado por Daniel Liidtke, op. cit.
126
Ator e produtor de cinema conhecido também pelo seu fervor católico-tradicionalista; rejeita muitas das
diretrizes expedidas pelo Concílio Vaticano II, nos anos 60, por considerá-las excessivamente liberalizantes.
Seu filme, A Paixão de Cristo, rendeu cerca de 370 milhões de dólares, uma das maiores bilheterias
domésticas de todos os tempos, de acordo com o jornal Folha de São Paulo. Sérgio Dávila. Direita religiosa
mostra rosto e lucra nos EUA de Bush. Folha de São Paulo, Califórnia, 27 Mar 2005, caderno A, p. 15.
127
Marcelo Marthe e Ricardo Valladares. Os católicos contra-atacam. Mater Ecclesiae. Disponível em
<http://www.mrp.com.br/mater/contra-ataque.htm>. Acesso em 07 Set 2005.
128
Sílvia Regina Alves Fernandes. "Ver para crer" as novas investidas do catolicismo no Brasil através do
Padre Marcelo Rossi. In: CESNUR 2000 – INTERNATION CONFERENCE, 29-31 Aug 2000, Riga, Latvia:
CESNUR – Center for Studies on New Religions, 2000.
88

de 1998, celebrando missas que tinham sessões de aeróbica, muita dança e


cantoria”129. Padre Rossi esteve entre os primeiros a participar dos cursos
ministrados pelo consultor de marketing Antonio Miguel Kater Filho, através do
IBMC, que considera que:

o padre Marcelo Rossi é um excelente produto. Seus pontos


fortes são a simplicidade e o grande apelo emocional. Além
disso, as mulheres se sentem atraídas pelo jeito de garotão dele.
Com um produto desse, o lucro é sempre certo130

André Ricardo Souza (2005 apud FERNANDES, 2005) permite-nos


argumentar sobre impacto estratégico da atuação dos padres midiáticos, a partir
dos resultados de sua enquête realizada no Santuário Bizantino, templo onde são
celebradas as missas do padre Marcelo Rossi. Segundo o autor, “76% dos
entrevistados eram católicos tradicionais e foram atraídos para as missas do
Santuário graças à mídia eletrônica; 16% passaram a freqüentar a missa depois
do sucesso do padre e 8% freqüentavam outra religião e passaram a ir às missas
católicas”131, dentre os quais 6% eram evangélicos.
O conjunto de todos estes elementos citados e tantos outros cuja menção
se inviabilizaria neste trabalho, dada a infinidade de possibilidades, compõe o mix
de marketing das denominações religiosas e determinam a importância deste viés
de abordagem às estratégias de competição no mercado de bens simbólicos
ligados à religião. Dentro disso, o IBMC promove cursos às dioceses católicas
para ensinar aos padres técnicas de oratória, noções de como se portar diante
das câmeras se necessário, entre outras dezenas de sugestões. Segundo Kater
Filho (2005, em entrevista concedida), atualmente, todos os segmentos seculares
da sociedade valorizam o consumidor e, por isso mesmo, a igreja num contexto
de mercado religioso também deve fazê-lo. Portanto, assuntos como a
disponibilidade de estacionamento, a qualidade dos assentos, o sistema de som,

129
Marcelo Marthe e Ricardo Valladares. Os católicos contra-atacam. Mater Ecclesiae. Disponível em
<http://www.mrp.com.br/mater/contra-ataque.htm>. Acesso em 07 Set 2005.
130
Antonio Miguel Kater Filho em comentário à revista Veja, citado pelo site Católica Net, disponível em
<http://www.catolicanet.com.br/interatividade/enquetes/enquetes.asp?cod=4>. Acesso em 07 Set 2005.
131
Sílvia Regina Alves Fernandes, Padres cantores e o catolicismo – as interfaces do espetáculo e da fé.
CERIS, 2005. Disponível em <http://www.ceris.org.br/textos/_busca.asp?codDoc=152>. Acesso em 25 Out
2005.
89

o horário das missas e cultos e até a instalação de sistemas de ar condicionado


devem ser discutidos pelas igrejas em termos de marketing.
Kater Filho entende que os pastores evangélicos pentecostais têm
ganhado fatias do mercado católico por conta da habilidade de comunicação do
proselitismo evangélico associados a técnicas mais amplas de marketing.
Enquanto um padre católico leva de oito a doze anos para se formar e só então
assumir o comando de uma paróquia, os pastores (neo)pentecostais, apesar da
insuficiência de conteúdo teológico da maioria dos casos, de seis meses a um
ano são técnicos em comunicação e recebem uma igreja. “Ele tem menos
conteúdo dogmático, menos conteúdo teológico, e tem mais capacidade de falar”;
Para Kater Filho os pastores pentecostais são, por estas características,
verdadeiros “vendedores” (KATER FILHO, 2005, em entrevista concedida).

3.3.3 Práticas ecumênicas

Certamente, é paradoxal a atribuição do termo ecumenismo às estratégias


de competição adotadas pelas igrejas no mercado religioso; afinal, por definição,
o ecumenismo, geralmente mais associado com exclusividade às igrejas cristãs,
pressupõe a unidade de todos os povos contidos na mensagem do Evangelho de
Jesus Cristo numa única fé e, portanto, a superação das divisões do cristianismo
em várias denominações, muito à frente, sobretudo, da autoridade eclesial.
Nomeado a partir do termo grego oikoumene, cujo significado é “mundo habitado”
ou "aquilo que pertence a este mundo", o movimento ecumênico entende que é
da natureza da igreja de Cristo a unidade dos povos na profissão de um
Evangelho comum. O Pastor Abimael Etz Rodrigues, da Igreja Presbiteriana
Unida do Brasil, atestou este ponto de vista afirmando em entrevista concedida
que a “natureza da igreja é ecumênica”.
O Conselho Mundial de Igrejas – CMI, que existe desde 1948, pode,
provavelmente, ser apontado como o maior nome ao nível internacional na
prédica dos princípios do ecumenismo. Em 1991, reuniu mais de 300 igrejas
cristãs de todo mundo numa assembléia realizada em Camberra, Austrália.
Apesar disso, até hoje a Igreja Católica Apostólica Romana não é filiada ao
90

organismo; apenas algumas denominações católicas mais ortodoxas132. No Brasil,


talvez o maior representante do pensamento ecumênico seja o Conselho Nacional
das Igrejas Cristãs – CONIC, fundado em 1982 na forma de uma fraternidade de
igrejas confessas desta natureza ecumênica do cristianismo. Atualmente, apenas
sete denominações são oficialmente filiadas ao CONIC: Igreja Católica Apostólica
Romana – ICAR, Igreja Católica Ortodoxa Siriana do Brasil – ICOS, Igreja Cristã
Reformada – ICR, Igreja Episcopal Anglicana do Brasil – IEAB, Igreja Evangélica
de Confissão Luterana no Brasil – IECLB, Igreja Metodista – IM e Igreja
Presbiteriana Unida – IPU133.
A própria Igreja Católica opta pelo ecumenismo em seu discurso oficial,
atestado por documentos recentes da instituição que “preconizam o diálogo com
outras religiões e expressam a não reivindicação do monopólio religioso católico”
(ORO apud MARQUES, 2001). Na própria Campanha da Fraternidade de 1989, a
Igreja Católica recorda seu compromisso de promover uma comunicação
ecumênica:

Outra realidade no campo da comunicação na Igreja é o exercício


do Ecumenismo e do Diálogo Religioso. Pela comunicação é
possível eliminar o que divide. O Ecumenismo requer diálogo
com os cristãos, ‘abertura crescente para o diálogo com as
religiões não-cristãs e com pessoas, movimentos e grupos de
não-crentes. E até com grupos fechados ao Transcendente, em
vista do conhecimento mútuo, enriquecimento recíproco e ação
conjunta em favor das grandes causas da humanidade. (CNBB,
1989 apud MARQUES, 2001)

Não se pode contestar, portanto, os empenhos de reaproximação entre


cristãos de igrejas diferentes que se fazem presentes – mesmo que numa escala
não muito grande –, em plena situação de acirramento da concorrência entre as
denominações religiosas. Talvez justamente devido a esta contradição que o
padre argentino Enrique Cambón, especialista em ecumenismo, entenda o
movimento ecumênico como “uma exigência evangélica e uma urgência histórica”
132
World Concil of Churches. Member churches, associate member churches and national council bodies.
Disponível em <http://www.wcc-coe.org/wcc/who/mch-e.html >. Acesso em 06 Dez 2005.
133
Conselho Nacional de Igrejas Cristãs. Igrejas-Membros. Disponível em < http://www.conic.org.br/>.
Acesso em 06 Dez 2005.
91

(CAMBÓN, 1994 apud MARQUES, 2001). Entretanto, à medida que a


concorrência entre os grupos religiosos se intensifica, é possível pensarmos no
distanciamento da possibilidade real de as denominações abdicarem das
particularidades de suas doutrinas e dogmas em função de uma unidade. Ou seja,
a concorrência religiosa, ainda que admitida a existência de pensamento
ecumênico puro, amplia as diferenças – no sentido aqui empregado de rivalidade
– entre as igrejas, inviabilizando como isso, cada vez mais, a adoção absoluta de
elementos unificantes (credo único).
O pastor luterano e professor da Universidade Metodista de São Paulo Dr.
Milton Schwantes afirmou durante um seminário de orientação da estratégia da
Campanha da Fraternidade 2005 para religiosos e professores de colégios
católicos, em São Paulo, que a grande dificuldade para se realizar práticas
efetivamente ecumênicas é que “às vezes a igreja não promove o ecumenismo
[aqui expresso no sentido literal]; cada uma quer as ovelhas para o seu
aprisco”134.
Neste contexto, as práticas que comumente são tratadas por ecumênicas
limitam-se, na verdade, ao diálogo inter-religiões ou ao que poderíamos chamar
de ecumenismo limitado à cúpula das denominações religiosas. Isto porque as
igrejas eventualmente celebram suas crenças ecumenicamente sem, no entanto,
abrirem mão de suas identidades próprias. Nestas condições, o ecumenismo,
apesar da impropriedade do termo, refere-se a ações não necessariamente
excludentes da concorrência religiosa.
Este item trata, portanto, de algumas possibilidades de diálogo inter-
religiões no tocante ao compartilhamento de ações limitadas, basicamente, ao
nível de cúpulas; ou seja, a coalizão de denominações religiosas voltadas para
um objetivo comum sem, no entanto, perderem suas particularidades e,
consequentemente, a divisão que as distingue umas das outras. Estas ações
conjuntas são possíveis muitas vezes, em primeiro lugar, pela coincidência de
objetivos e, segundo, pelas possibilidades de as denominações auferirem
vantagens na realização da ação em parceria, superiores às que o fariam
individualmente. Estas vantagens podem, por exemplo, ser traduzidas em termos

134
Milton Schwantes. Solidariedade e paz à luz da teologia. In: SEMINÁRIO DE ORIENTAÇÃO DA
ESTRATÉGIA DA CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2005 – ECUMÊNICA, 20 Nov 2004. São Paulo:
CONIC, 2004.
92

de custo e estarem inseridas num elaborado de diretrizes estratégicas, inclusive


de competição.
A Campanha da Fraternidade, cuja bandeira é geralmente comandada
somente pela Igreja Católica, tem sido um dos maiores exemplos de
empreendimento ecumênico de cúpula. Em 2000 e 2005 foi declarada
participação ecumênica na promoção da campanha, ficando, neste último ano,
toda a coordenação à critério do CONIC. Com a promoção conjunta, as
denominações envolvidas visam cumprir objetivos comuns de evangelização e,
possivelmente, de atração de fiéis para os princípios que consideram corretos e
verdadeiros e, ao mesmo tempo, gozam da vantagem de pulverização dos
investimentos necessários.
O professor Kater Filho (2005, em entrevista concedida) citou também
como exemplo de ação conjunta inter-denominações religiosas a existência da
Sociedade Bíblica do Brasil; uma entidade resultado de um acordo entre
denominações evangélicas para a fabricação e adoção de uma Bíblia única. A
edição gráfica em grande quantidade permitiu naturalmente, a redução do custo
por unidade impressa e, desta forma, a produção da Bíblia mais barata do Brasil,
recomendada aos fiéis pelas igrejas fraternas do acordo.
No tangente ao aspecto estratégico na competição religiosa, as práticas
ecumênicas de cúpula assumem forma de instrumento ainda mais coerente com a
relação pluralística concorrencial ao passo que se compreende a inviabilidade de
extensão de sua abrangência a todas as denominações, bem com a ocorrência
de recusas aos convites de participação por igrejas não simpatizantes dos
propósitos. A preocupação por católicos e protestantes tradicionais com o avanço
das denominações neopentecostais, por exemplo, podem incentivar estes grupos
à intensificação do diálogo sobre as mudanças ocorridas do campo religioso que
as teriam feito perder fiéis. Em alguns casos, a coalizão de um grupo seleto de
denominações pode resultar, inclusive, em celebrações religiosas conjuntas
(cultos e missas ecumênicas), mais comuns por ocasiões comemorativas.
93

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Empenhamo-nos no sentido de analisar alguns aspectos do fenômeno


social secular de transformação dos serviços religiosos em mercadoria
comercializável, a partir da destituição do capital religioso da sociedade comum e,
posteriormente, da dissociação da igreja de suas instituições legitimantes
enquanto monopólio religioso sobre ética social como um todo e, portanto, da
constituição de um verdadeiro mercado de religião; dentro do qual se faz
justificado o emprego da terminologia econômica, como concorrência, oferta e
demanda; orientados pela hipótese de caracterização da disposição estrutural
desta dinâmica de maneira coerente com as teorias microeconômicas do
oligopólio, em superação ao senso comum que eventualmente metaforiza o
processo pelas definições da concorrência pura, strictu sensu.
Ainda que reconhecidas as limitações técnicas que nos foram impostas
para a análise do objeto em sua totalidade, pudemos comprovar a autenticidade
dos empenhos de tratamento do campo religioso pela sua ótica de mercado e,
consequentemente, de concorrência religiosa; servindo-nos como base sólida de
sustentação para o propósito maior de caracterização desta dinâmica pelas
definições econômicas da uma estrutura industrial oligopólica secular.
Confirmando, desta forma, a aplicabilidade dos conceitos de oligopólio
diferenciado ao mercado de bens simbólicos ligados à religião.
Reconhecemos a noção de conflito compreendida nas transformações do
campo religioso, desde a destituição social, na sua esfera mais coletiva, de todo
seu trabalho simbólico acumulado – que define o conceito de capital religioso (ou
qualificação religiosa) –; sucedida pela efetiva pauperização da sociedade,
através da substituição definitiva dos padrões religiosos tradicionais de
organização da vida humana por uma constituição classista de separação do
corpo social em leigos de um lado – destituídos do saber e, por conseguinte, não
mais autônomos do ponto de vista religioso, ainda que dependente deste
conhecimento até os dias de hoje –; e, por outro lado, técnicos institucionalmente
organizados, dotado das qualificações necessárias para legitimar em monopólio
todo o comportamento social. Assim, observamos a formação de uma religião
94

institucionalizada cuja dominância dos princípios atingia todas as esferas da


sociedade, orientando a vida econômica, política e social.
Todavia, uma vez perdida a correspondência entre a capacidade de
organização dos monopólios religiosos em todo mundo sobre as atividades
econômicas e os interesses seculares que sobre elas são exercidos, devido ao
crescimento da demanda por maior emprego das explicações racionalizantes das
relações ocorridas neste viés da sociedade, correlata ao processo de
intensificação da industrialização e, principalmente, dos princípios de livre
mercado, o poder de legitimação da religião não mais pôde ser exercido sobre as
atividades econômicas, mantendo-se concentrado nas esferas mais públicas e
privadas da sociedade; respectivamente, sobre o Estado e as famílias. Esta
situação seria mantida até que fosse reconhecida a intimidade imprescindível
entre os interesses econômicos e políticos que implicaria a racionalização dos
governos e, consequentemente, a sua dissociação dos princípios religiosos.
Desta forma, a religião monopolizada que por milhares de anos esteve
diretamente associada ao poder em todas as esferas sociais – com destaque ao
mundo ocidental, embora não se limitando a –, não mais seria imposta à
sociedade e, portanto, passou a considerar a incerteza acerca da garantia de sua
legitimação única sobre as famílias, sobre as quais sua influência assumia
teologicamente maior importância e relevância; ou seja, o risco eminente de ter
que administrar as “heresias” não mais isoladas e apoiadas pela autoridade legal,
mas na forma de competição pela preferência dos fiéis. Assim, ao ritmo do
surgimento de ideologias alternativas de legitimação da vida social (centradas na
esfera familiar) – o que define a situação de pluralidade religiosa –, o campo da
religião foi se transformando em direção à dinâmica de concorrência entre capitais
religiosos divergentes em doutrinas e práticas e, cada vez mais, permitindo a
substituição de sua nomenclatura pelo conceito de mercado religioso.
Tendo incorporado elementos seculares à sua dinâmica de conflito, o
campo religioso moldado pelo padrão de mercado compôs-se de agentes
institucionalizados cujas preocupações incluíram inevitavelmente o aspecto
selvagem da concorrência. Situação esta que se intensificaria com o tripé
urbanização, democratização e globalização; o qual, pelo oferecimento à
sociedade de garantias de anonimato e menor controle social que
potencializariam a liberdade de culto nas cidades, sob condições de ausência da
95

imposição legal da religião e maior aceitação da pluralidade e heterogeneidade


cultural, ajudaria a desmontar a estrutura religiosa monopolista de legitimação da
vida social. Portanto, o campo religioso seria marcado pela sua trajetória de
acirramento da concorrência e, consequentemente, pela caracterização dos
agentes envolvidos na prestação dos seus serviços como firmas organizadas na
disposição de um produto de consumo para o mercado, independente do aspecto
sagrado que prioritariamente as orientassem em suas ações e objetivos.
No mundo ocidental, primeiro pela separação do cristianismo em duas
grandes correntes religiosas hegemônicas e, posteriormente, pelas infindáveis
cisões, imigrações e inaugurações de capitais religiosos, o desmonte do
monopólio católico trazido da Idade Média melhor observar-se-ia na atual
coexistência de incontáveis denominações de cunho religioso. Se distintas em
doutrina, dogmas e ritos incorporados, similares, no entanto, quanto à posição de
ofertantes de “bênçãos de Deus”, salvação, paz, amor, bem-estar espiritual, entre
outras tantas traduções possíveis para nebulosa simbólica da religião.
Assim, em primeira análise, como que num verdadeiro mercado, inúmeras
agências prestadoras de serviços religiosos colocaram-se à disposição da
sociedade para a livre escolha pelos leigos, daquelas que julgassem melhor
atender-lhes; em troca, seriam recompensadas pela oportunidade de orientação
teológica destes leigos, de maneira correspondente aos seus propósitos de
evangelização (idéia extensível em outros termos também às instituições
religiosas não cristãs) e, consequentemente, de construção dos princípios
coerentes àquilo que consideram divino e sagrado – aqui possivelmente
entendidos por termos mais objetivos como o “Reino dos Céus”, a sintonia com a
natureza, etc.
Embora orientadas em torno de um propósito religioso comum, as
adversidades administrativas e organizacionais, muitas vezes superiores às
teológicas, ainda que transparentadas por elas, na forma de divergências acerca
dos elementos que compõem o produto geral do mercado religioso – subjetivo em
determinação, contudo objetivo quanto às doutrinas e práticas incorporadas –,
inviabilizaram a conduta de unidade entre as denominações religiosas. Em outras
palavras, cada denominação religiosa como dona da sua própria Verdade, se
orientadas ao objetivo de anunciar esta verdade ao maior número de pessoas
possíveis, “libertando-os da ignorância”, o intuito de manutenção no campo
96

transcende a capacidade econômica de explicação e consubstancia-se, mais do


que isso, pelo viés espiritual, numa questão de bem-estar da humanidade. Uma
vez inseridas na dinâmica de mercado, no entanto, esta luta pela sobrevivência
assume forma ainda mais intensificada em racionalização, impreterivelmente. As
instituições não mais limitar-se-iam à simples organização da estrutura
corporativa, em geral, hierarquizada, conduzindo-se cada vez mais à justificada
adoção de verdadeiras práticas estratégicas de competição, absolutamente
reconhecíveis pela dinâmica secular de concorrência, dada a forma conflituosa na
qual se inserem.
Analisando o mercado religioso brasileiro, pudemos concluir alguns dos
aspectos sob os quais tem ocorrido o processo de desconcentração do número
de fiéis por denominação religiosa – isto é, o acirramento da concorrência
religiosa, viabilizada pela instituição oficial de um Estado laico, com a
Proclamação da República –, bem como do conjunto de estratégias competitivas
das quais as igrejas se apropriam na disputa pela sobrevivência. Apesar das
evidências empíricas que poderiam subsidiar a falácia de uma tendência à
consolidação gradual de condições de concorrência plenamente simétrica entre
as denominações religiosas presentes no mercado, a situação pluralística no
Brasil demonstrou-se intensificada na manutenção de uma concorrência
imperfeita tipicamente oligopolista.
A análise dos dados levou-nos a concluir que, atualmente, embora nas
últimas décadas tenha havido um substancial crescimento das denominações
evangélicas, sendo as mais tradicionais num primeiro momento, seguida pelas
pentecostais e, mais recentemente, pelas neopentecostais notadamente, a
percepção da dinâmica concorrencial pelas igrejas e afins tem sido responsável
pela resistência de uma distribuição altamente concentrada dos fiéis. Apesar da
coexistência de centenas de denominações religiosas genealogicamente
derivadas das mais diversas religiões do mundo, a quase totalidade da população
brasileira se mantém declarada em cerca de apenas seis ou sete classificações;
confirmando a natureza imperfeita da dinâmica de competição que tem se feito
presente no mercado religioso brasileiro.
Acreditamos, portanto, que a resistência da concentração do mercado
religioso, ainda que reconhecida a forte quebra do monopólio absoluto da Igreja
Católica, está diretamente relacionada com a adoção de estratégias competitivas
97

resultantes da viabilidade de acompanhamento do funcionamento do mercado;


que se associa justamente ao número limitado de denominações dominantes,
cujas ações individualmente realizadas exercem influência no campo como um
todo e, por conta disso, são consideradas no comportamento de cada uma das
prestadoras de serviços religiosos. Em outros termos, entendemos que as
denominações religiosas, ora pelo emprego calculista de estratégias de
competição, ora, simplesmente, pela percepção intuitiva da dinâmica de
concorrência imperfeita sob as quais defendem seus interesses, organizam-se de
modo a proteger suas fatias de mercado – representada pelo percentual de fiéis
sobre a população total –; buscando precaverem-se da contestabilidade da
legitimação da prestação de seus serviços religiosos sobre a parcela de leigos
que detêm, por capitais religiosos incipientes, ou mesmo pelas denominações já
bem estabelecidas no mercado.
Este aspecto de imperfeição da concorrência religiosa – ou seja, de
desigualdade de forças competitivas entres os agentes atuantes – que permite o
emprego de estratégias de mercado, focadas no market share das denominações
e respectivos empenhos de proteção contra a contestabilidade das legitimações
sobre a orientação religiosa na vida das famílias, permite a observação de
barreiras à mobilidade dos capitais religiosos; a serem consideradas nas
investidas de entrada no mercado. O impacto destes estímulos de bloqueio à
atuação de novos capitais no mercado se demonstrou em parte intimamente
associado à escala almejada pelas denominações (quantidade de fiéis), no
tangente às barreiras por larga escala ou custos absolutos envolvidos. Contudo,
com relação aos empenhos de superação das reputações dos capitais já
estabelecidos, demonstraram-se influentes enquanto barreiras à entrada,
independentemente da escala de atendimento religioso.
A ausência de pretensões quanto a elevada escala de atendimento
religioso pode eximir as denominações religiosas incipientes de algumas ameaças
ao seu estabelecimento definitivo no campo, pelo menos no que tange à
capacidade de absorção da escala pelo mercado e aos investimentos mínimos
necessários. No entanto, àqueles capitais cujas metas compreendem uma
elevada escala de atendimento, mantêm-se válidos fortemente os estímulos de
bloqueio à entrada. A construção por uma denominação religiosa de uma
estrutura coerente com as presentemente dispostas no mercado, em geral,
98

associada ao domínio dos grandes canais de comunicação e de outros


empreendimentos beneficiadores da atividade principal – tradução material do
objetivo implícito de tomada abrupta de uma parcela muito significativa da
população para a condição de adeptos –; se, por um lado, permitiria considerar
estímulos de incentivo pela possibilidade de redução dos custos fixos unitários de
manutenção das atividades, dado pelo rateio dos custos totais em uma base mais
extensa de fiéis; por outro, implica a aceitação da capacidade de absorção pelo
mercado desta escala considerada.
Em termos econômicos, pudemos concluir, portanto, que no mercado
religioso fazem-se presentes para os grandes capitais as barreiras à entrada por
economias de larga escala; isto é, incapacidade de absorção pelo mercado da
escala mínima eficiente (que garante o custo médio mínimo). Como, em geral, a
população, pelo menos em sua maioria, já possui opção religiosa determinada, a
entrada de capitais capazes de atender uma escala elevada de fiéis deve,
necessariamente, pressupor (i) a capacidade de financiamento dos custos de
manutenção das atividades por uma parcela mais reduzida dos adeptos da
denominação, naturalmente, mais propensa à concentração do investimento em
suas mãos; ou (ii) a predisposição à superação das denominações já
estabelecidas, atraindo para si parte dos fiéis destas. Em resumo, ou um grupo
mais concentrado se prontifica a bancar a estrutura física da igreja ou a escala
necessária de fiéis deve ser compatível com o mercado.
A partir da percepção desta possível predisposição à superação das
denominações já estabelecidas, pelos capitais religiosos entrantes, é que se
evidencia o exercício da barreira à entrada por diferenciação de produtos;
aplicável independentemente da escala de atendimento. Como citado, a
declaração da maioria absoluta da população em alguma classificação de
religiosidade implica às novas denominações a predisposição de superação das
já estabelecidas, através do convencimento de sua superioridade ou, até mesmo,
de sua inofensividade para alguns casos mais críticos. Desta forma, a maior
barreira à entrada de novos capitais religiosos no mercado demonstrou-se
associada à quebra das reputações estabelecidas pelo convencimento da
população da superioridade dos serviços diferenciados entrantes na legitimação
da sociedade, frente ao preconceito e discriminação do novo.
99

Compreendidas por antecipação, as barreiras à entrada de novos capitais


religiosos tornam-se instrumentos fundamentais para as denominações já
estabelecidas, que buscam eleva-las através de suas estratégias competitivas,
protegendo-se, desta forma, da contestabilidade de sua legitimação na prestação
de serviços religiosos, por capitais religiosos auto-considerados mais aptos para o
atendimento da população. Os meios estratégicos dos quais as denominações
religiosas de fato se apropriam na dinâmica de concorrência oligopolista do
mercado de bens simbólicos associados à religião centram-se, notadamente nos
empenhos de diferenciação dos serviços, especialização e segmentação dos fiéis
em classes, propaganda e marketing, e, eventualmente, alianças estratégicas.
A dificuldade de análise destes instrumentos estratégicos de competição
em termos de preço, para o caso da concorrência religiosa, não impede o
tratamento do fenômeno pela ótica das teorias microeconômicas; pelo contrário,
demonstra-se coerente com a realidade apresentada pelos segmentos
econômicos oligopolizados, que pautam o conjunto de estratégias competitivas
nos instrumentos extra-preço. Somamos a isso a compreensão do fato de que
quaisquer elementos teoricamente associáveis aos preços dos bens simbólicos
ligados à religião, tais como o dízimo ou o tempo dedicado pelo fiel à atividade,
são irrelevantes para o processo de mercantilização da religião; conformando-se,
para fins de análise, tão somente em instrumento democraticamente incorporado
e necessário para manutenção das atividades.
Dentre os instrumentos estratégicos de competição extra-preço
empregados pelo mercado religioso destacou-se a diferenciação de serviços. Ao
nível do mercado, instituições religiosas incipientes apropriam-se da vantagem de
especialização dos serviços religiosos prestados num segmento particular da
sociedade. É o caso das denominações religiosas que adaptam seus discursos,
ritos e práticas a grupos específicos, tais como os constituídos por fiéis
homossexuais, jovens, roqueiros, surfistas, entre outras diversas especificidades
de segmentação, como, por exemplo, quanto à classe sócio-econômica. A
especialização, em geral, facilita, portanto, o rompimento de barreiras à entrada,
ao passo que viabiliza o atendimento de uma parcela específica da população
possivelmente não tão bem atendida pelas instituições religiosas mais ecléticas,
atribuindo às denominações especialistas o benefício da legitimação do
monopólio sobre a prestação de serviços religiosos ao segmento particular que se
100

destinam. Em outros termos, cada instituição torna-se monopolista do seu próprio


produto.
Ao nível da denominação, por outro lado, a segmentação dos fiéis se
demonstrou um importante instrumento estratégico na dinâmica de competição
oligopolista. Nos intuitos de protegerem-se da contestabilidade pelas instituições
especializadas e de expandirem suas fatias de mercado pela maior
disponibilidade de serviços diferenciados, as denominações religiosas mais
organizadas internalizam a prática de segmentação dos fiéis em classes de
necessidades específicas, para as quais voltam seus serviços, adaptados para
cada caso. Neste sentido, tendo em vista que as decisões das denominações
oligopólicas possuem efeito sobre o mercado como um todo, a proliferação do
movimento de Renovação Carismática nas instâncias católicas, por exemplo,
poderia ter significado, dentre outras coisas, uma motivação à reaproximação de
um fiel inativo em substituição à sua adesão em uma doutrina evangélica
pentecostal. De acordo com esta lógica, pudemos observar denominações dentro
das quais eram mantidas, dependendo das condições sócio-econômico-culturais
do público ao qual se destinavam em cada ponto de pregação, celebrações mais
tradicionais ou mais carismáticas; analogamente, outras segmentam seus fiéis em
função dos produto específicos no quais traduzem o produto genérico da religião:
saúde, realização financeira, reconhecimento, entre outros.
Nesta busca pelo melhor atendimento dos fiéis as denominações
submetem-se, mais do que isso, inclusive à incorporação de instrumentos
seculares de marketing estratégico, de acordo com os quais procuram avaliar o
melhor composto de serviços; analisando o público-consumidor e moldando
estratégias relacionadas ao produto, propriamente dito, à disposição geográfica
dos pontos de pregação e, principalmente, à promoção dos serviços prestados.
Nesta última apresentaram-se sob forte relevância a propaganda e os meios de
comunicação impressos e eletrônicos, notadamente, os voltados para a grande
massa (rádio, televisão, internet). O acirramento da concorrência tem levado
algumas denominações até mesmo à substituição deliberada dos meios intuitivos
de atendimento otimizado à demanda, pelos métodos calculistas que se somam,
a partir da colaboração de consultores das técnicas marketing.
Além destes, cujo número de combinações estratégicas possíveis já se
demonstrou à frente da capacidade de exemplificação deste estudo, outras
101

estratégias de competição têm se somado às práticas paralelas das


denominações religiosas na luta pela sobrevivência no mercado de bens
simbólicos, tal como as alianças estrategicamente constituídas; capazes de
convergir paradoxalmente os princípios ecumênicos ao fortalecimento da
competição religiosa. A reconhecida inviabilidade de fusão definitiva dos
princípios comuns de cada denominação, num contexto de unidade coerente com
o pensamento ecumênico – em geral associado às igrejas cristãs –, transforma o
discurso inter-religioso em alianças momentâneas, nas quais não se abstêm da
identidade própria em benefício do coletivo. Estas alianças ecumênicas,
centradas somente ao nível da cúpula das igrejas e não a suas bases, podem
eventualmente oferecer vantagens estratégicas em termos de custo nos projetos
levados em conjunto (e.g., Campanha da Fraternidade e Sociedade Bíblica do
Brasil), além de benefícios relacionados ao objetivo de atração de fiéis para os
princípios que as participantes do acordo consideram mais próprios.
Paralelamente, a não participação de algumas igrejas e seitas nestes encontros
tende a fortalecer as diferenças que potencializam a competição.
Assim, ao ritmo das próprias transformações da sociedade, o campo
religioso toma forma de mercado e vai constituindo uma estrutura competitiva
imperfeita e assimétrica, marcada pelo domínio de poucas denominações sobre
uma parcela muito significativa da população. Por conta disso, suas ações
tomadas individualmente são reconhecidas pelo mercado e estrategicamente
consideradas pelas principais rivais, de maneira intuitiva ou calculista; orientando-
se pelo foco primordial da participação em fiéis que detêm no total da população.
Nesta disputa, em nome do bem-estar da humanidade, alcançado através da
aceitação generalizada dos princípios que cada denominação considera correto e
sagrado, as estratégias seculares de mercado são os meios impostos pela
sociedade. As religiões buscam, a cada dia, maior adaptação às necessidade de
uma sociedade heterogênea, pluralista; criando serviços religiosos diferenciados
para as necessidades específicas, fazendo uso da propaganda, do rádio, da
televisão, do cinema, da mídia em geral. Tudo isso à medida que procuram
“proteger a sociedade” do surgimento de novas doutrinas concorrentes, elevando
barreiras, menos legais – como as já extintas em praticamente todo mundo –, do
que propriamente econômicas.
102

Esta configuração do mercado de bens simbólicos ligados à religião, típica


de um oligopólio diferenciado secular, é resultado da exigência de mais do que
compreensão das instituições religiosas acerca dos problemas sociais; muito
além, resulta da incorporação dos novos padrões competitivos que regem a
sociedade contemporânea como único meio de combate às tendências
dessacralizadas que substituem a fé na legitimação da vida social e ajudam a
fazer dos homens indivíduos solitários, problemáticos e infelizes na dinâmica
artificial do mercado. Assim, padres, pastores e afins se obrigam a agregar à
posição de orientadores religiosos a de executivos no comando de um verdadeiro
oligopólio da fé.
103

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1168-0.
111

ANEXO I – Base de competição dos setores oligopólicos segundo o grau


de diferenciação dos produtos

1 – INDÚSTRIA COM GRANDE DIFERENCIAÇÃO DE PRODUTO

INDÚSTRIA BASE DE DIFERENCIAÇÃO

Bebidas Propaganda
Cigarros Propaganda
Automobilística Propaganda, desenho, reputação

2 – INDÚSTRIA COM MODERADA DIFERENCIAÇÃO DE PRODUTO

INDÚSTRIA BASE DE DIFERENCIAÇÃO

Pneu Propaganda, desenho


Calçados Propaganda, distribuição
Refino de petróleo Propaganda, serviços aos cliente

3 – INDÚSTRIA COM POUCA DIFERENCIAÇÃO DE PRODUTO

INDÚSTRIA BASE DE DIFERENCIAÇÃO

Aço Serviços aos clientes


Esferográfica Propaganda, desenho

4 – INDÚSTRIA COM DIFERENCIAÇÃO DE PRODUTO POUCO


SIGNIFICATIVA (INDÚSTRIA SEM BASE DE DIFERENCIAÇÃO)

Cobre, cimento, papel e celulose, matérias-primas em geral

Fonte: ANDREOLLI, 1999, p. 37


112

ANEXO II – Exemplo de cartão do Cadastro Nacional de Pessoas


Jurídicas (CNPJ) de instituição religiosa

Fonte: SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL


113

ANEXO III – Sub-classes CNAE para enquadramento fiscal das instituições


religiosas

CÓDIGO DESCRIÇÃO CNAE

9191-0/00 ARQUIDIOCESE
9191-0/00 CASA DE BENÇÃO
9191-0/00 CASA DE ORAÇÃO
9191-0/00 CASA MAÇÔNICA
9191-0/00 CENTRO DE UMBANDA
9191-0/00 CENTRO ESPÍRITA
9191-0/00 CONGREGAÇÃO RELIGIOSA
9191-0/00 CONVENTO
9191-0/00 CULTO RELIGIOSO; CELEBRAÇÃO E ORGANIZAÇÃO
9191-0/00 EXÉRCITO DA SALVAÇÃO; ASSOCIAÇÃO DO
9191-0/00 IGREJA
9191-0/00 INSTITUIÇÃO RELIGIOSA
9191-0/00 IRMANDADE RELIGIOSA
9191-0/00 MESQUITA
9191-0/00 MISSÃO RELIGIOSA
9191-0/00 MOSTEIRO
9191-0/00 ORGANIZAÇÃO FILOSÓFICA
9191-0/00 ORGANIZAÇÃO RELIGIOSA
9191-0/00 SINAGOGA
9191-0/00 TEMPLO
9191-0/00 TEMPLO RELIGIOSO
9191-0/00 TENDA ESPÍRITA
9191-0/00 TERREIRO DE CANDOMBLÉ
9191-0/00 TERREIRO DE MACUMBA
9191-0/00 TERREIRO DE UMBANDA

Fonte: CONCLA – Comissão Nacional de Classificação


114

ANEXO IV – Classificação de religião adotada pelo IBGE para o Censo


Demográfico de 2000

000 SEM RELIGIÃO

11 CATÓLICA APOSTÓLICA ROMANA


110 Católica Apostólica Romana
111 Católica Carismática, Católica Pentecostal
112 Católica Armenia; Católica Ucraniana

12 CATÓLICA APOSTÓLICA BRASILEIRA


120 Católica Apostólica Brasileira

13 CATÓLICA ORTODOXA
130 Católica Ortodoxa

14 ORTODOXA CRISTÃ
140 Ortodoxa Cristão
149 Outras

19 OUTRAS CATÓLICAS
199 Outras Católicas

21 EVANGÉLICA DE MISSÃO LUTERANA


210 Igrejas Luteranas
219 Outras

22 EVANGÉLICA DE MISSÃO PRESBITERIANA


220 Igreja Evangélica Presbiteriana
221 Igreja Presbiteriana Independente
222 Igreja Presbiteriana do Brasil
223 Igreja Presbiteriana Unida
224 Presbiteriana Fundamentalista
225 Presbiteriana Renovada
229 Outras

23 EVANGÉLICA DE MISSÃO METODISTA


230 Igreja Evangélica Metodista
231 Evangélica Metodista Wesleyana
232 Evangélica Metodista Ortodoxa
239 Outras

(continua)
115

(continuação)

24 EVANGÉLICA DE MISSÃO BATISTA


240 Igreja Evangélica Batista
241 Convenção Batista Brasileira
242 Convenção Batista Nacional
243 Batista Pentecostal
244 Batista Bíblica
245 Batista Renovada
249 Outras

25 EVANGÉLICA DE MISSÃO CONGREGACIONAL


250 Igreja Evangélica Congregacional
251 Igreja Congregacional Independente
259 Outras

26 EVANGÉLICA DE MISSÃO ADVENTISTA


260 Igreja Evangélica Adventista do Sétimo Dia
261 Igreja Evangélica Adventista Movimento de Reforma
262 Igreja Evangélica Adventista da Promessa
269 Outras

27 EVANGÉLICA DE MISSÃO EPISCOPAL ANGLICANA


270 Igreja Evangélica Episcopal Anglicana
279 Outras

28 EVANGÉLICA DE MISSÃO MENONITA


280 Igreja Evangélica Menonita
289 Outras

30 EXÉRCITO DA SALVAÇÃO
300 Exército da Salvação

31 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL ASSEMBLÉIA DE DEUS


310 Igreja Evangélica Assembléia de Deus
311 Igreja Assembléia de Deus Madureira
312 Igreja Assembléia de Deus Todos os Santos
319 Outras

32 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL CONGREGACIONAL CRISTÃ


DO BRASIL
320 Igreja Congregacional Cristã do Brasil
329 Outras

(continua)
116

(continuação)

33 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL O BRASIL PARA CRISTO


330 Igreja Evangélica Pentecostal O Brasil Para Cristo
339 Outras

34 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL EVANGELHO


QUADRANGULAR
340 Igreja Evangelho Quadrangular
349 Outras

35 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL UNIVERSAL DO REINO DE


DEUS
350 Igreja Universal do Reino de Deus
359 Outras

36 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL CASA DA BÊNÇÃO
360 Igreja Evangélica Casa da Bênção
369 Outras

37 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL CASA DE ORAÇÃO


370 Igreja Evangélica Casa de Oração
379 Outras

38 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL DEUS É AMOR


380 Igreja Evangélica Pentecostal Deus é Amor
389 Outras

39 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL MARANATA


390 Igreja Evangélica Pentecostal Maranata
399 Outras

40 EVANGÉLICA RENOVADA Sem Vínculo Institucional


400 Evangélica Renovada,Restaurada,Reformada Sem Vínculo
Institucional
401 Pentecostal Renovada,Restaurada e Reformada Sem Vínculo
Institucional
409 Outras

41 EVANGÉLICA PENTECOSTAL Sem Vínculo Institucional


410 Evangélica Pentecostal Sem Vínculo Institucional
419 Outras

42 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL COMUNIDADE CRISTÃ


420 Igreja Evangélica Comunidade Cristã
429 Outras

(continua)
117

(continuação)

43 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL NOVA VIDA


430 Igreja de Origem Pentecostal Nova Vida
439 Outras

44 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL COMUNIDADE EVANGÉLICA


440 Igreja Evangélica Comunidade Evangélica
449 Outras

45 OUTRAS IGREJAS EVANGÉLICAS DE ORIGEM PENTECOSTAL


450 Outras Igrejas Evangélicas Pentecostais

46 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL AVIVAMENTO BÍBLICO


460 Igreja Pentecostal Avivamento Bíblico
469 Outras

47 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL CADEIA DA PRECE


470 Igreja Evangélica Cadeia da Prece
479 Outras

48 EVANGÉLICA DE ORIGEM PENTECOSTAL IGREJA DO NAZARENO


480 Igreja do Nazareno
489 Outras

49 EVANGÉLICA NÃO DETERMINADA


490 Evangélica Não Determinada
491 Evangélica Sem Vínculo Institucional
492 Declaração Múltipla de Religião Evangélica
499 Outros Evangélicos

51 IGREJA DE JESUS CRISTO DOS SANTOS DOS ÚLTIMOS DIAS


510 Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias / Mormons
519 Outras

52 EVANGELICOS TESTEMUNHA DE JEOVÁ


520 Testemunha de Jeová
529 Outras

53 LBV / RELIGIÃO DE DEUS


530 Legião da Boa Vontade / Religião de Deus

59 ESPIRITUALISTA
590 Espiritualista
599 Outras

(continua)
118

(continuação)

61 ESPÍRITA
610 Espírita, Kardecista
619 Outras

62 UMBANDA
620 Umbanda
629 Outras

63 CANDOMBLÉ
630 Candomblé
639 Outras

64 OUTRAS DECLARAÇÕES DE RELIGIOSIDADE AFRO BRASILEIRA


640 Religiosidades Afro Brasileiras
641 Declaração Múltipla de Religiosidade Afro com Outras Religiosidades
649 Outras

71 JUDAÍSMO
710 Judaísmo
719 Outras

74 HINDUÍSMO
740 Hinduísmo
741 Ioga
749 Outras

75 BUDISMO
750 Budismo
751 Nitiren
752 Budismo Theravada
753 Zen Budismo
754 Budismo Tibetano
755 Soka Gakkai
759 Outras

76 NOVAS RELIGIÕES ORIENTAIS


760 Igreja Messiânica Mundial
761 Seicho No-Ie
762 Perfect Liberty
763 Hare Krishna
764 Discipulos Oshoo
765 Tenrykyo
766 Mahicari

(continua)
119

(continuação)

79 OUTRAS RELIGIÕES ORIENTAIS


790 Religiões Orientais
791 Bahai
792 Shintoismo
793 Taoismo
799 Outras

81 ISLAMISMO
810 Islamismo
819 Outras

82 TRADIÇÕES ESOTÉRICAS
820 Esotérica
821 Racionalismo Cristão
829 Outras

83 TRADIÇÕES INDÍGENAS
830 Tradições Indígenas
831 Santo Daime
832 União do Vegetal
833 A Barquinha
834 Neoxamânica
839 Outras

85 RELIGIOSIDADE CRISTÃ SEM VÍNCULO INSTITUCIONAL


850 Religiosidade Cristã Sem Vínculo Institucional

89 NÃO DETERMINADA
890 Religiosidade Não Determinada /Mal Definida
891 Declaração Múltipla de Religiosidade Católica / Outras Religiosidades
892 Declaração Múltipla de Religiosidade Evangélica / Outras
Religiosidades
893 Declaração Múltipla de Religiosidade Católica/ Espírita
894 Declaração Múltipla de Religiosidade Católica/Umbanda
895 Declaração Múltipla de Religiosidade Católica/Candomblé
896 Declaração Múltipla de Religiosidade Católica/Kardecista

990 SEM DECLARAÇAO

Fonte: IBGE
120

ANEXO V – População residente, por sexo, segundo a religião – Brasil –


2000

RELIGIÃO TOTAL HOMENS MULHERES

Católica apostólica romana 124 980 132 61 901 888 63 078 244
Católica apostólica brasileira 500 582 250 201 250 380
Católica ortodoxa 38 060 19 495 18 565
Evangélicas 26 184 941 11 444 063 14 740 878
Evangélicas de missão 6 939 765 3 062 194 3 877 571
Igreja evangélica luterana 1 062 145 523 994 538 152
Igreja evangélica presbiteriana 981 064 427 458 553 606
Igreja evangélica metodista 340 963 146 236 194 727

Igreja evangélica batista 3 162 691 1 344 946 1 817 745


Igreja evangélica congregacional 148 836 64 937 83 899
Igreja evangélica adventista 1 209 842 538 981 670 860
Outras igrejas evangélicas de missão 34 224 15 642 18 582
Evangélicas de origem pentecostal 17 617 307 7 677 125 9 940 182
Igreja assembléia de Deus 8 418 140 3 804 658 4 613 482
Igreja congregacional cristã do Brasil 2 489 113 1 130 329 1 358 785

Igreja Brasil para Cristo 175 618 76 132 99 485


Igreja evangelho quadrangular 1 318 805 545 016 773 789
Igreja universal do reino de Deus 2 101 887 800 227 1 301 660
Igreja casa da benção 128 676 51 557 77 119
Igreja Deus é amor 774 830 331 707 443 123
Igreja maranata 277 342 117 789 159 553
Igreja nova vida 92 315 35 352 56 964
Sem vínculo institucional 1 046 487 454 087 592 400
Evangélicos 710 227 309 380 400 847
Evangélicos de origem pentecostal 336 259 144 707 191 552

(continua)
121

(continuação)

RELIGIÃO TOTAL HOMENS MULHERES

Outros evangélicos 581 383 250 657 330 725

Outras cristãs 235 532 103 483 132 049


Cristãs 230 325 101 090 129 235
Outras religiosidades cristãs 5 208 2 394 2 814
Igreja de Jesus Cristo dos santos dos últimos dias 199 645 92 197 107 448
Testemunhas de Jeová 1 104 886 450 583 654 303
Espírita 2 262 401 928 967 1 333 434
Espiritualista 25 889 10 901 14 987
Umbanda 397 431 172 393 225 038

Candomblé 127 582 57 200 70 382


Judaísmo 86 825 43 597 43 228
Hinduísmo 2 905 1 521 1 383
Islamismo 27 239 16 232 11 007
Budismo 214 873 96 722 118 152
Outras religiões orientais 7 832 3 764 4 068

Novas religiões orientais 151 080 58 784 92 295


Igreja messiânica mundial 109 310 41 478 67 831
Outras novas religiões orientais 41 770 17 306 24 464
Tradições esotéricas 58 445 27 637 30 808
Tradições indígenas 17 088 9 175 7 913
Outras religiosidades 15 484 7 393 8 091
Sem religião 12 492 403 7 540 682 4 951 721
Não determinadas 357 648 159 191 198 458
Sem declaração 383 953 206 245 177 708

TOTAL 169 872 856 83 602 317 86 270 539

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000.


122

ANEXO VI – Distribuição percentual da população segundo a religião –


Brasil – 1872-2000

SEM
ANO CATÓLICOS EVANGÉLICOS ESPÍRITAS OUTRAS
RELIGIÃO

1872 99,7 - - 0,3 -


1890 98,9 1,0 - 0,0 0,1
1940 95,0 2,6 1,1 0,8 0,5
1950 93,5 3,4 1,6 0,8 0,8
1960 93,1 4,0 1,4 0,8 0,6
1970 91,8 5,2 1,3 1,0 0,8
1980 89,0 6,6 1,3 1,0 1,9
1991 83,3 9,0 1,6 1,2 5,1
2000 73,6 15,4 1,4 2,1 7,5

Fonte: Censo Demográfico (1872, 1890, 1940, 1950, 1960, 1970, 1980, 1991,
2000) apud CORREIA, 2003
123

ANEXO VII – Média de anos de estudo por religião – Brasil – 1991-2000

RELIGIÃO 1991 2000

Católica apostólica romana 4,63 5,78


Total de evangélicos 4,68 5,83
Evangélica de missão 5,79 6,94
Evangélica pentecostal 4,00 5,34
Outras evangélicas 5,28 6,41
Testemunha de Jeová 5,36 6,49
Espírita 8,34 9,58
Umbanda e Candomblé 6,25 7,19
Outras religiosidades 6,41 7,01
Sem religião 5,06 5,65
TOTAL 4,72 5,86

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1991-2000


124

ANEXO VIII – Evolução do percentual de urbanização e de pessoas sem


religião – 1890-2000

PORCENTAGEM PORCENTAGEM
ANO DE DE PESSOAS
URBANIZAÇÃO SEM RELIGIÃO

1890 -135 0,1%


1940 31,2% 0,5%
1950 36,2% 0,8%
1960 44,7% 0,6%
1970 55,9% 0,8%
1980 67,6% 1,9%
1991 75,6% 5,1%
2000 81,3% 7,5%

Fonte: Censo Demográfico (1872, 1890, 1940, 1950, 1960, 1970, 1980, 1991,
2000) apud CORREIA, 2003

135
Dado não localizado pelo autor.
125

ANEXO IX – Quantidade de paróquias, presbíteros, diáconos, irmãos e


irmãs católicos das circunscrições eclesiásticas da Regional
Sul 1 da CNBB

136 137
CIRCUNSCRIÇÕES ÁREA POPULAÇÃO PAROQUIAS PRESBITEROS
138
DP IRMÃOS IRMÃS
ECLESIÁSTICAS
Km² total hab/km² total hab/par total hab/presb

AMPARO 2355,6 341655 145,0 22 15529,8 32 10676,7 1 1 133


APARECIDA 1303,0 165989 127,4 15 11065,9 94 1765,8 2 51 179
ARAÇATUBA 9620,6 454829 47,3 30 15161,0 42 10829,3 1 2 45
ASSIS 9165,2 279699 30,5 25 11188,0 37 7559,4 0 0 52
BARRETOS 8771,5 307597 35,1 19 16189,3 28 10985,6 0 8 53
BAURU 5892,1 443578 75,3 37 11988,6 65 6824,3 0 14 82
BOTUCATU 10348,6 435581 42,1 42 10371,0 51 8540,8 5 6 112
BRAGANÇA
PAULISTA 4492,5 784856 174,7 44 17837,6 70 11212,2 1 2 84
CAMPINAS 2133,2 1625893 762,2 72 22581,8 162 10036,4 2 40 386
CAMPO LIMPO 1463,4 1464925 1001,0 60 24415,4 101 14504,2 4 12 320
CARAGUATATUBA 1943,4 196973 101,4 10 19697,3 15 13131,5 4 4 54
CATANDUVA 4587,6 261387 57,0 27 9681,0 32 8168,3 0 1 25
FRANCA 6795,9 535900 78,9 28 19139,3 49 10936,7 1 6 48
GUARULHOS 317,1 1095874 3455,9 31 35350,8 41 26728,6 1 18 81
ITAPETININGA 8144,1 361669 44,4 23 15724,7 24 15069,5 17 0 36
ITAPEVA 14150,7 377977 26,7 19 19893,5 35 10799,3 1 18 26
JABOTICABAL 5175,6 433766 83,8 36 12049,1 47 9229,1 1 3 81
JALES 13086,8 354225 27,1 28 12650,9 22 16101,1 0 0 21
JUNDIAÍ 2256,9 860144 381,1 47 18300,9 82 10489,6 66 8 199
LIMEIRA 4915,2 937443 190,7 53 17687,6 81 11573,4 0 2 136
LINS 8654,5 269815 31,2 31 8703,7 41 6580,9 1 8 59
LORENA 5123,0 254277 49,6 23 11055,5 41 6201,9 18 15 52
MARÍLIA 11958,6 623743 52,2 57 10942,9 72 8663,1 1 22 164
MOGI DAS
CRUZES 2519,5 1188971 471,9 42 28308,8 65 18291,9 1 3 76
N.SA. DO LÍBANO
EM SÃO PAULO - - - 6 - 5 - 0 0 0
N.SA. DO
PARAÍSO EM SÃO
PAULO - - - 5 - 7 - 4 0 0

(continua)

136
IBGE, Estimativa da população
137
Incluídas as Quase-Paróquias
138
Diáconos Permanentes
126

(continuação)
139 140
CIRCUNSCRIÇÕES ÁREA POPULAÇÃO PAROQUIAS PRESBITEROS 141
DP IRMÃOS IRMÃS
ECLESIÁSTICAS
Km² total hab/km² total hab/par total hab/presb

OSASCO 2495,5 2072703 830,6 44 47106,9 88 23553,4 0 29 269


OURINHOS 7104,3 292602 41,2 29 10089,7 38 7700,1 0 2 59
PIRACICABA 4663,2 805654 172,8 50 16113,1 90 8951,7 16 15 134
PRESIDENTE
PRUDENTE 15512,3 500664 32,3 34 14725,4 43 11643,3 0 4 48
REGISTRO 13291,1 254021 19,1 14 18144,4 28 9072,2 0 2 12
RIBERÃO PRETO 8782,4 879371 100,1 52 16911,0 89 9880,6 15 25 106
RIO PRETO 14634,0 788815 53,9 73 10805,7 96 8216,8 0 3 43
SANTO AMARO 328,9 1455399 4425,1 68 21402,9 115 12655,6 0 9 226
SANTO ANDRÉ 825,3 2343280 2839,3 87 26934,3 124 18897,4 6 33 141
SANTOS 2402,5 1362722 567,2 39 34941,6 76 17930,6 2 3 135
SÃO CARLOS 13056,5 932114 71,4 71 13128,4 120 7767,6 1 11 127
SÃO JOÃO DA
BOA VISTA 7085,1 577869 81,6 46 12562,4 99 5837,1 3 16 143
SÃO JOSÉ DOS
CAMPOS 3270,5 731003 223,5 34 21500,1 68 10750,0 33 0 250
SÃO MIGUEL
PAULISTA 200,2 2013634 10058,1 72 27967,1 99 20339,7 0 27 267
SÃO PAULO 580,1 5402918 9313,8 277 19505,1 914 5911,3 0 318 1986
SOROCABA 4236,1 815389 192,5 36 22649,7 71 11484,4 26 5 133
TAUBATÉ 4533,7 531816 117,3 34 15641,6 92 5780,6 23 64 304

REGIONAL 248176,3 35816740 144,3 1892 18930,6 3591 9974,0 257 810 6887

Fonte: CERIS – Departamento de Estatística e Pesquisas Sociológicas

139
IBGE, Estimativa da população
140
Incluídas as Quase-Paróquias
141
Diáconos Permanentes
127

ANEXO X – Exemplos de panfleto distribuído pela Igreja Universal do


Reino de Deus com intuito de atrair fiéis

Fonte: CAMPOS, 1997, p.145

Fonte: do próprio autor


128

ANEXO XI – Screenshot de enquête da Igreja Universal do Reino de Deus


para classificação dos fiéis segundo o motivo de filiação

Fonte: Site oficial da Igreja Universal do Reino de Deus (http://www.iurd.org.br/)


129

APÊNCIDE A – Gráfico da Curva de Lorenz e Coeficiente de Gini aplicado


às denominações religiosas, segundo a distribuição de
fiéis – Brasil – 2000

Fonte: RETRATOS, 2005.

Baseado em 97 classificações de religiosidade, adotadas pelo Censo


Demográfico 2000. Exclui agregações do tipo “outras denominações”.
130

APÊNCIDE B – Gráfico do Índice Herfindahl-Hirschman (IHH) de


concentração industrial do campo religioso, segundo a
participação no total de fiéis – Brasil – 1960-2000 e Gráfico
da redução percentual do Índice de Herfindahl-Hirschman
(IHH) – Brasil – 1970-2000

Fonte: IBGE, Tendências Demográficas.


131

APÊNCIDE C – Gráfico da evolução das participações católicas,


evangélicas e sem-religião no total da população – Brasil – 1940-2000

Fonte: Censo Demográfico (1872, 1890, 1940, 1950, 1960, 1970, 1980, 1991,
2000) apud CORREIA, 2003
132

APÊNCIDE D – Análise gráfica das vantagens estratégicas de


segmentação dos fiéis pelas denominações religiosas

O diagrama acima procura ilustrar graficamente a vantagem estratégica de


uma denominação religiosa diferenciar internamente os serviços que presta,
segmentando seus fiéis de acordo com as especificidades que determinam cada
perfil. Este apêndice reporta-se, portanto, à discussão realizada no item 3.3.1, no
qual abordamos as estratégias de competição por serviços diferenciados.
Imaginemos a situação hipotética de uma denominação qualquer, como,
por exemplo, a Igreja Católica, na qual o conjunto total dos fiéis pudesse ser
segmentado em dois grandes grupos142: um com perfil mais tradicional e outro
com perfil mais carismático, cujos graus de satisfação são representados no
gráfico, respectivamente, pelas curvas S t e S c .

142
Evidentemente, a segmentação dos fiéis em dois grupos atende caráter meramente hipotético, servindo
exclusivamente para fins de análise teórica. Na prática, reconhecemos a existência de n perfis passíveis de
uma construção tipológica e, portanto, a maior complexidade em se tratar a estratégia de segmentação nos
termos aqui propostos, ainda que viável.
133

No diagrama, o eixo horizontal representa o grau de tradicionalismo ou


carisma que se associa com o composto de serviços secundários derivados do
produto principal da religião. Em termos práticos, consideremos, por exemplo, na
extremidade esquerda deste eixo, a presença de elementos muito tradicionais,
tais como – mantendo-se a Igreja Católica como exemplo – “missa em latim” e
“padre de costas para a congregação”. Analogamente, na extremidade direita do
eixo horizontal, podemos considerar elementos ditos mais carismáticos, tais como
“falar em língua desconhecidas” e “rituais de cura”. Desta forma, consideremos o
eixo horizontal como um conjunto gradiente de composições eclesiásticas finitas,
que variam do tradicional extremo ao carismático extremo, sem que, no entanto, a
identidade da denominação religiosa seja prejudicada a qualquer dos níveis
possíveis. Isto é, sejam os serviços religiosos prestados pela Igreja Católica
considerados mais carismáticos ou mais tradicionais, a igreja mantém sua
identidade católica.
Assim, as curvas S t e S c correspondem, portanto, ao percentual de

satisfação dos fiéis de cada um dos dois perfis aqui teoricamente analisados
(mais tradicionais ou mais carismáticos, respectivamente), indicado no eixo
vertical ( S ), em função do grau de tradicionalismo ou carisma da composição de
serviços eclesiais adotada pela denominação. Consideraremos ainda que, à
esquerda da origem, a denominação é dita tradicional; assim como à direita, é
considerada carismática. Desta forma, o elemento θ corresponde ao grau de
tolerância máximo de cada um dos grupos à adoção de serviços religiosos cujo
gênero (tradicional ou carismático) difere da opção prioritária. Ou seja, θ c é o grau

de tradicionalismo máximo tolerado pelo grupo de perfil carismático; à esquerda


deste ponto, não existe possibilidade de satisfação deste grupo de fiéis. A mesma
lógica se aplica ao grupo mais tradicional.
O ponto A , traduzido num composto particular de elementos eclesiais –
neste caso mais carismáticos do que tradicionais –, expressa as condições de
satisfação de cada grupo de fiéis, assumindo-se que a denominação limita a
prestação de seus serviços somente aos elementos correspondentes a este
ponto; ou seja, é especializada num produto cujos elementos de composição
possuem grau de carisma igual a A . Neste ponto, evidentemente, o grupo de fiéis
134

predominantemente demandantes de serviços mais carismáticos se encontra


mais satisfeito do que os fiéis mais tradicionais ( S cA > S tA ).

Alternativamente, os pontos B e B' sugerem a condição de segmentação


dos fiéis de acordo com os perfis (mais tradicionais e mais carismáticos),
prestando-lhes serviços diferenciados e, portanto, especializados nos segmentos
aos quais se destinam. Na prática, esta situação pode ser representada, por
exemplo, pela manutenção de dois templos pela mesma denominação; um no
qual os elementos eclesiais mais tradicionais são predominantes ( B ), e outro,
mais carismático ( B' ). Segmenta-se, portanto, os fiéis de acordo com os perfis,
prestando-lhes serviços diferenciados e, consequentemente, oferecendo-lhes
maior grau de satisfação.
Finalmente, se pensarmos no número de fiéis como função do grau de
satisfação que se oferece ao nível determinado de qualificação dos serviços
prestados, a diferenciação dos serviços ao nível da denominação, e conseqüente
segmentação dos fiéis de acordo com os perfis correspondentes, permite que as
instituições religiosas protejam ou mesmo aumentem suas fatias de mercado.
Neste contexto, são válidos os esforços de tolerância entre tendências
antagônicas, como a Teologia da Libertação e a Tradição Família Propriedade
para a Igreja Católica; tanto quanto as estratégias mais calculistas, pela prestação
de atendimento religioso com foco em demandas específicas, a saber, solução de
problemas de saúde, financeiros, no amor, com os filhos, etc.

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