Professional Documents
Culture Documents
Como quase todos, consideramos que as reformas, as boas reformas são importantes
factores de mudança, sem os quais nenhuma sociedade evolui ou sequer sobrevive.
Sempre assim foi e sempre assim será. Mas essas reformas, as que são feitas para
durar, as que visam efectivamente conduzir as sociedades no sentido do progresso
são aquelas que se estendem ao domínio das mentalidades e comportamentos, quer
individuais, quer colectivos quer institucionais Só nesta perspectiva é garantida a sua
eficácia, aceitação e sustentabilidade. Não são, de facto, novas leis, decretos,
despachos ou declarações de intenção, desfasadas da realidade, que asseguram a
transformação das mentalidades e o progresso das sociedades. As coisas passam-se,
exactamente ao contrário. Ora, moldar mentalidades é connosco. É o nosso ofício e o
nosso dever. Sabemos, também, que nenhuma reforma se faz no abstracto. Fazem-
se com as pessoas, às vezes contra algumas pessoas, frequentemente contra muitas
pessoas mas nunca contra todas as pessoas. Quando se ultrapassa este limite, foi-
nos desde cedo ensinado, que entramos numa zona nebulosa que, quase sempre
inevitavelmente, degenera no autoritarismo e na prepotência, incompatíveis com
qualquer sociedade que se rege por princípios democráticos.
1
ouvidas e tidas em consideração as sugestões e alternativas que contribuam para o
consenso imprescindível para a construção de uma escola melhor, mas também para
valorizar uma profissão e uma carreira cuja dignidade e importância todos se fartam
de sublinhar. Trata-se da velha questão da adequação do Papel ao Estatuto. O que só
acontece nas sociedades civilizadas e que querem crescer. Isto é, trata-se de saber
se este Estatuto está de acordo com a importância do Papel que a sociedade atribui à
profissão docente. Se ninguém imagina um país civilizado que quer continuar a
desenvolver-se sem uma escola de qualidade, será possível aceitar passivamente a
galopante desvalorização do seu Estatuto quer em termos remuneratórios quer em
termos sociais? Pedir tudo em troca de nada nunca foi um bom princípio. E é também
a pior forma de negociar. Será possível ficar impassível face ao clima de
desmotivação, menorização e cansaço que grassa entre os professores?
Será possível não entender como tal se reflecte negativamente na escola de todos os
dias?
Será possível não entender que esta não é uma questão de conjuntura, mas um
problema estrutural que condicionará o futuro de, pelo menos, uma geração de
portugueses?
Um documento que divide em duas categorias pessoas que fazem as mesmas coisas
não é bom. Mas é ainda pior quando as pessoas que fazem melhor as mesmas
coisas se sentem injustiçadas ou amesquinhadas. Como se mede a mestria, o
dinamismo, os conhecimentos e a autoridade dos professores? Por grelhas? Por
critérios quantitativos? Os professores que nos marcaram positivamente foram, é
claro, os melhores. Às vezes, faltavam às aulas. Não fazemos ideia de como se
comportavam nas reuniões de Departamento, nunca soubemos o número de
impressos ou questionários que tiveram de preencher. Não sabemos sequer se o
fizeram bem ou mal. Foram apenas os nossos melhores professores. Aqueles que
nos ajudaram a crescer e com quem gostávamos de aprender. Eram mestres, não
burocratas.
Na questão da qualidade e da quantidade, nós preferimos a qualidade. Preferimos o
bom senso e a justiça.
Mas, entretanto, em todo este processo, o professor foi transformado num ilhéu onde
desagua todo o corolário dos equívocos da comunidade que ele serve e é
sentenciado por tudo o que se reflecte na vida dos seus alunos. A lógica de se
responsabilizar quase exclusivamente os professores pelo insucesso e abandono
escolares, penalizando-os a este nível na avaliação de desempenho, indicia uma
insensibilidade grave, por parte de quem tutela, por tudo o que falta fazer nas
comunidades, na consciencialização das famílias e na concertação social que importa
mobilizar para todos os problemas que envolvem o estado da educação. Porque, não
nos iludamos, a educação como paixão foi sempre missão única e solitária dos
professores que hoje se sentem, também eles, sós e desprezados. Hoje mais do que
nunca!
Então, por nos ser cada vez mais difícil conciliar as nossas convicções com aquilo
que nos é exigido…
Por sentirmos que a nossa função como professores está a esvair-se de conteúdo…
E, fundamentalmente por não acreditamos que as reformas a que nos temos referido,
contribuam minimamente para melhorar o ensino dos nossos jovens.