You are on page 1of 17

NASCIDOS DE NOVO.

(Compreendendo o porque e o processo do Novo Nascimento)


*Joelson Gomes1

Um dia aconteceu um encontro entre Jesus e um homem religioso


chamado Nicodemos, a Bíblia descreve este encontro assim:
“Havia um fariseu chamado Nicodemos, uma autoridade entre os
judeus. Ele veio a Jesus, à noite, e disse: “Mestre, sabemos que ensinas
da parte de Deus, pois ninguém pode realizar os sinais miraculosos
que estás fazendo, se Deus não estiver com ele”. Em resposta, Jesus
declarou: “Digo-lhe a verdade: Ninguém pode ver o Reino de Deus, se
não nascer de novo”. Perguntou Nicodemos: “Como alguém pode
nascer, sendo velho? É claro que não pode entrar pela segunda vez no
ventre de sua mãe e renascer!” Respondeu Jesus: “Digo-lhe a verdade:
Ninguém pode entrar no Reino de Deus, se não nascer Espírito. O que
nasce da carne é carne, mas o que nasce do Espírito é espírito“ ” (Jo.
3:1-6, NVI).

A doutrina da Regeneração ou Novo Nascimento é central no


cristianismo, só que mesmo esta doutrina tendo tanta importância, poucos
estão capacitados para discorrer sobre a mesma com base bíblica. Muitos
sabem dizer que o ser humano precisa nascer de novo, ser regenerado, mas
provar isto biblicamente e explicar o porquê é mais difícil. Pensando nisso
este texto foi preparado, com o objetivo de dar subsídios bíblico-teológicos
para o cristão normal, não o teólogo, saber defender sua fé. Isto porque este
ensinamento está na base do evangelismo, ninguém evangeliza se não
souber explicar o que é o Novo Nascimento e como ele acontece em nossa
vida. Assim, para uma comunicação eficaz do evangelho precisa-se conhecer
bem esta verdade. Então, tome fôlego se ajeite na cadeira e mãos à obra, o
estudo lhe espera. Ah, leia todos os versículos citados, eles vão fazer você
entender e confirmar as explicações dadas, não esqueça isso.

1
* Joelson Gomes é pastor reformado, formado em Teologia (Th.B.) pelo
Seminário Teológico Congregacional do Nordeste (órgão filiado a ASTE e a
AETAL), tem Pós Graduação em História, e faz parte do quadro de Ministros da
ALIANÇA das Igrejas Evangélicas Congregacionais do Brasil, e do corpo
de liderança da Igreja Evangélica Congregacional da Vitória- PE.

1
1. POR QUE TEMOS QUE NASCER DE NOVO?

Muitas pessoas com justiça fazem a pergunta: “Por que nascer de novo?”
Bem, para responder a mesma temos que começar olhando a condição do ser
humano natural diante de Deus. O que somos nós, seres humanos
descendentes de Adão e Eva?
As Escrituras têm algumas definições para o ser humano terreno
(natural).
 Ele é um ser carnal (Jo. 3:6);
 Ele é um ser escravo (Jo. 8:34);
 Ele é um ser separado de Deus (Is.59: 1-2);
 Ele é um ser cego (2Co. 4: 4-6 );
 Ele é um ser carente da glória de Deus (Rm. 3:23);
 Ele é um ser morto espiritualmente (Ez. 18: 4; Mt.8: 18-22;
Ef. 2: 1-6; Cl. 2: 13).

Este é o testemunho das Escrituras sobre o ser humano descendente de Adão


e Eva aqui na terra. O fato da Queda no pecado acontecida no Éden (Gn. 3)
teve um alcance muito extenso, pois, pelo pecado do primeiro casal a
humanidade que viria depois sofreu as conseqüências. Observe:

Portanto, da mesma forma como o pecado entrou no mundo por um homem, e


pelo pecado a morte, assim também a morte veio a todos os homens, porque todos
pecaram; pois antes de ser dada a Lei, o pecado já estava no mundo. Mas o pecado
não é levado em conta quando não existe lei. Todavia, a morte reinou desde o tempo
de Adão até o de Moisés, mesmo sobre aqueles que não cometeram pecado
semelhante à transgressão de Adão, o qual era um tipo daquele que haveria de vir.
Logo, assim como por meio da desobediência de um só homem muitos foram
feitos pecadores,assim também, por meio da obediência de um único homem
muitos serão feitos justos (Rm. 5:12-14, 19, NVI, destaques meus).

O Senhor Deus havia dado uma ordem ao casal para não comer da
árvore da vida, só que esta ordem de nada adiantou. “A cobiça (desejo) da
carne, a cobiça dos olhos e a ostentação da vida”, que são os três fatores sempre

2
usados por toda a história para levar os seres humanos a errar (1Jo. 2:16),
foram mais fortes. E a mulher, quando viu que:

...a árvore era boa para se comer (desejo da carne), agradável aos olhos (desejo dos olhos)
e árvore desejável para dar entendimento (ostentação da vida) tomou-lhe, e deu também ao
marido (que estava com ela segundo o original hebraico), e ele comeu (Gn. 3:6, parêntesis
meus).

Este foi o fracasso total da raça humana, o primeiro pecado. Aqui


vários relacionamentos foram rompidos, várias coisas foram desligadas,
desajustadas de seu estado original como Deus havia criado. O Diabo,
tentador, cumpriu o seu propósito, pois a serpente na tentação era símbolo
do Diabo (Ap. 20: 2), ele embaralhou, separou e misturou tudo.2 Observe os
resultados do pecado nos seguintes aspectos:

 Psicológico (Gn 3:7)- Romperam-se os relacionamentos


psicológicos, ou seja, do ser humano consigo mesmo. Diz-nos o
relato que apareceu a vergonha. Segundo o velho e bom Aurélio,
vergonha é: “sentimento de insegurança provocado pelo medo do
ridículo”. É quando a pessoa fica insegura, não estando mais a
vontade consigo, acha que tem algo errado em sí. O primeiro casal
perde a segurança de antes quando estavam nus e não se
envergonhavam (Gn. 2: 25).

 Social (Gn. 3: 12-16)- Começou a haver discórdia entre o homem e


a mulher. Ele joga a culpa pelo erro nela, naquela que antes era ele
mesmo, pois ele havia dito: “Esta, sim, é osso dos meus ossos e carne
da minha carne! Ela será chamada mulher, porque do homem foi tirada”.

2
“Se derivarmos a palavra “diábolos” de diabállein, que significa “embaralhar”, então é o demônio
aquele que procura baralhar tudo.”FEINER, Johannes e LOEHER, Magnus (eds), Mysterium Salutis,
II/4, 2ª ed. (Petrópolis: Vozes, 1984), p. 55. Derivando a palavra diábollos do verbo diaballô, em sua
etimologia estaria os significados de: desajuntar, desunir. RUSCONI, Carlo. Dicionário do Grego
do Novo Testamento (São Paulo: Paulus, 2003), p. 122.

3
(Gn. 2: 23, grifo meu). Agora ela não é mais sua carne, é um corpo
estranho que o levou a errar e merece culpa.

 Ambiental (Gn. 3:17-19)- Deus planejou para Adão que ele fosse
jardineiro ... é verdade! Por isso plantou um jardim e o colocou lá
como o seu jardineiro cuidando do mesmo (Gn. 2:8), e neste
jardim tudo era bom (Gn. 2:9). Mas o ato do primeiro casal
descontrolou esta harmonia, e a terra passa a produzir o que é
mau. O trabalho de jardinagem que a principio era prazeroso,
torna-se agora penoso, e fruto de muito suor. O apóstolo Paulo
diz que só quando os filhos de Deus aparecerem na glória final,
haverá a restauração ambiental do planeta que até agora está
sujeito a escravidão (Rm. 8: 19-22). Eis a razão dos desastres
ambientais e naturais, a terra foi afeada como o ser humano pelo
primeiro pecado, tudo ficou desajustado, e só com a volta de
Cristo haverá também uma restauração ecológica, tudo voltará a
harmonia e entrará nos eixos.

 Espiritual (Gn. 3: 8-10, 22-24)- Este foi o maior estrago que a


desobediência do primeiro casal causou: o rompimento do
relacionamento do ser humano com Deus. O casal agora se
esconde de Deus, e Deus os expulsa do jardim, estava decretada a
separação. A vida espiritual foi perdida, pois Deus afirmara que
no dia em que eles comecem deste fruto, nesse dia morreriam (Gn.
2:16-17). E a separação de Deus foi sua morte espiritual.

Conclusão: se “todos pecaram” (Rm. 3:23), e se a conseqüência primária


do pecado é a morte espiritual e a separação de Deus, então todos estão
separados de Deus e naturalmente, todos estão mortos, essa é a condição do
ser humano natural atualmente.

4
Mas, e o que fazer nessa condição? Cristo responde a esta pergunta na
sua conversa com Nicodemos. Cristo afirma: “ninguém pode ver o Reino de
Deus se não nascer de novo” (Jo. 3:3, grifo meu). Mas, porque isso? Calma,
vamos por parte.

2. A QUESTÃO DA NATUREZA.

Estas palavras de Jesus não são sem razão, Ele fala dessa necessidade
do Novo Nascimento porque como já vimos, o ser humano está morto e traz
em si a natureza humana carnal, morta e escrava no pecado de seu
antepassado Adão. Vamos entender isso.
As conseqüências da Queda, quando o primeiro casal pecou, não se
limitaram apenas a eles. Elas foram transmitidas hereditariamente para toda
humanidade. Isto por que eles eram nossos representantes diante de Deus,
logo nós pecamos neles.3 O que acontece aqui é o que se chama de
“Solidariedade da Raça”. Veja como Paulo expõe o caso:

Portanto, da mesma forma como o pecado entrou no mundo por um homem, e


pelo pecado a morte, assim também a morte veio a todos os homens, porque
todos pecaram; pois antes de ser dada a Lei, o pecado já estava no mundo. Mas o
pecado não é levado em conta quando não existe lei. Todavia, a morte reinou
desde o tempo de Adão até o de Moisés, mesmo sobre aqueles que não
cometeram pecado semelhante à transgressão de Adão, o qual era um tipo
daquele que haveria de vir... Se pela transgressão de um só a morte reinou por
meio dele, muito mais aqueles que recebem de Deus a imensa provisão da graça e
a dádiva da justiça reinarão em vida por meio de um único homem, Jesus Cristo.
Conseqüentemente, assim como uma só transgressão resultou na condenação de
todos os homens, assim também um só ato de justiça resultou na justificação que
traz vida a todos os homens. Logo, assim como por meio da desobediência de
um só homem muitos foram feitos pecadores, assim também, por meio da
obediência de um único homem muitos serão feitos justos. (Rm. 5: 12-14, 18-19,
NVI, grifos meus).

O Dr. William Barclay é muito preciso quando observa:

Esta é a idéia da solidariedade. O judeu não se considerava a si mesmo


individualmente, senão sempre como parte de uma tribo, de uma família ou nação,
3
Para todo este assunto veja: HOEKEMA, Anthony. Criados à Imagem de Deus (São Paulo: Cultura
Cristã, 1999), pp.167-168.

5
separado da qual não tinha identidade real. Assim é como Paulo vê Adão: não como
individuo, senão como o representante de toda a humanidade; e, como tal, seu
pecado foi o de todos os seres humanos.4

Portanto, quando nascemos neste estado trazemos em nós este


pecado, chamado de Pecado Original que Calvino definia como:

...um corrupção e perversão hereditária de nossa natureza, difundidas em todas


as partes da alma; a qual, primeiramente, nos faz culpáveis da ira de Deus, e ,
além do mais, produz em nós o que as Escrituras denominam de “Obras da
Carne”.5

Esta é a condição de pecaminosidade em que o ser humano nasce.


E esta condição do ser humano o faz escravo do mundo, das paixões
carnais, ele tem os sentidos embotados para enxergar as coisas de Deus (Gn.
6:5; Ef. 2:1-5), ele não pode obedecer a Lei de Deus (Rm. 8: 7-8), está escravo
(Jo. 8:44; Rm. 6: 16). Assim, o ser humano nasce incapaz, nasce na condição
de “filho da ira” por natureza (Ef. 2:3). Mas, o que é a natureza?
A natureza é a essência das coisas. De novo usando o nosso Aurélio,
ele a define como: “Índole do individuo, temperamento, caráter”. Nossa natureza
carnal, herdada de nosso pai Adão, é uma natureza pecaminosa (Gn. 6:5; Jr.
17: 9; Mt. 15: 19; Rm. 3: 9-20). Assim nossa essência natural é pecaminosa.
Para Deus “a natureza humana é corrupta, como chaga podre, inútil, sem esperança
diante de Deus, poderia reformar-se?”6 A natureza humana é má e continuará
sempre má, pois “aquilo que é torto não se pode endireitar” (Ec. 1:15). Não há
conserto. Nessa situação só há uma saída: o ser humano precisa ser criado de
novo. Isto por que Deus não trabalha com melhoramentos, consertos, mas
com recriação.

3. COMO ACABAR COM A VELHA NATUREZA.

4
Romanos (Barcelona: CLIE. 1995), pp. 101-102.
5
Institutas, II. 1,8
6
MACKINTOSH, C. H. “O Que é o Novo Nascimento” em Leituras Cristãs 37/3 (São Paulo:
Depósito de Literaturas Cristãs), pp. 97-118.

6
R. F. K. escrevendo sobre as naturezas: carnal e espiritual diz o
seguinte:

É muito importante atentarmos para duas coisas nas Escrituras: O PECADO (a


velha natureza) e os PECADOS (o fruto dessa natureza- as ofensas correntes).
Podemos ver o contraste entre o PECADO e PECADOS em 1 João 1:8-9: “Se
dissermos que não temos PECADO” (a natureza pecaminosa), “a nós mesmos
nos enganamos, e a verdade não está em nós. Se confessarmos os nossos
PECADOS, Ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados”.7

Aqui a palavra PECADO está significando a velha natureza humana


como também nos seguintes textos as expressões Velho Homem, Corpo do
Pecado:

Pois sabemos que o nosso velho homem foi crucificado com ele, para que o corpo
do pecado seja destruído e não mais sejamos escravos do pecado; pois quem
morreu, foi justificado do pecado... Da mesma forma, considerem-se mortos para
o pecado, mas vivos para Deus em Cristo Jesus. Portanto, não permitam que o
pecado continue dominando os seus corpos mortais, fazendo que vocês
obedeçam aos seus desejos. Não ofereçam os membros do corpo de vocês ao
pecado, como instrumentos de injustiça; antes ofereçam-se a Deus como quem
voltou da morte para a vida; e ofereçam os membros do corpo de vocês a ele,
como instrumentos de justiça. Pois o pecado não os dominará, porque vocês não
estão debaixo da Lei, mas debaixo da graça (Rm 6: 6-7, 11-14, NVI, destaques
meus).

Portanto, somos embaixadores de Cristo, como se Deus estivesse fazendo o seu


apelo por nosso intermédio. Por amor a Cristo lhes suplicamos: Reconciliem-se
com Deus. Deus tornou pecado por nós aquele que não tinha pecado, para que
nele nos tornássemos justiça de Deus (2Co. 5:20-21, NVI, destaques meus).

Conscientes disso perguntemos: como acabar com a velha natureza?

Uma natureza só se acaba com a morte. É como se pedíssemos para


uma pessoa para de respirar.

...a única maneira de evitar que ele respirasse seria matá-lo, e, assim, acabava-se
com ele... porém se estivéssemos, de fato, mortos teríamos saído completamente
do mundo. Cristo tomou o nosso lugar na cruz, foi o nosso Substituto em graça e
foi feito PECADO. E, em Romanos 6:6, lemos “Sabendo isto, que foi crucificado
com ele o nosso velho homem, para que o corpo do PECADO (e não dos
PECADOS) seja destruído, e não sirvamos mais ao pecado como escravos”.
7
“As Duas Naturezas do Crente” em Leituras Cristãs 39/1 (Depósito de Literatura Cristã), p. 33
(Grifos dele).

7
Assim, pela fé, sabemos que os nossos pecados não somente são tirados, mas a
questão do nosso PECADO (por natureza) foi também resolvida; o corpo do
pecado foi destruído- tendo sido o velho homem (nós próprios como filhos de
Adão) crucificado com Cristo, o nosso Substituto, morreu; e o que é verdadeiro
sobre nosso Substituto, é verdadeiro a nosso respeito.8

O que acontece nesse processo não é a melhora da velha natureza,


mas a morte dela. O velho homem é levado para a cruz com Cristo, o lugar
de sua morte. Assim aí está a Velha Natureza que trazemos em nós desde
Adão tem que morrer.

4. POR QUE A VELHA NATUREZA TEM QUE MORRER.

O ser humano descendente de Adão é pecador e está debaixo de uma


sentença. A morte é o salário de todo pecador (Ez. 18:4; Rm. 6:23). Assim, sua
essência, que na realidade é ele mesmo, está condenada, sentenciada. Nesse
estado ele nasce morto, condenado. Não tem justiça própria e não pode
satisfazer a exigência de santidade proposta por Deus (Lv. 11: 45; 19:2; Mt.
48; 1Pd. 1:13-15). Logo, o ser humano já nasce devendo ao Código de Ética de
Deus, a sua Lei. E esta dívida só se paga com a vida: “O salário do pecado é a
morte” (Rm. 6:23). Assim foi determinado.
Toda lei é feita para ser cumprida:

Porque os simples ouvidores da lei não são justos diante de Deus, mas os que
praticam a lei hão de ser justificados (Rm. 2:13).

Ora, a lei não procede de fé, mas: Aquele que observar os seus preceitos, por eles
viverá (Gl 3:12).

A justificação do ser humano exigia dele uma perfeita obediência a


Lei de Deus

Portanto os meus estatutos e os meus juízos guardareis; cumprindo os quais o


homem viverá por eles: eu sou o SENHOR (Lv. 18:5).

8
Ibid.,pp.33-34.

8
Ora, Moisés escreveu que o homem que praticar a justiça decorrente da lei, viverá
por ela (Rm. 10:5).

Pois, qualquer que guarda toda a lei, mas tropeça em um só ponto, se torna culpado
de todos (Tg. 2:10).

Mas o ser humano carnal não cumpriu e nem pode cumprir esta Lei
(Rm. 7: 14; 8:1-5), portanto, o ser humano está em pendência com esta Lei. E
a sentença para quem está em pendência com a Lei é como já foi dito a
maldição da morte:

Maldito aquele que não confirmar as palavras desta lei, não as cumprindo. E todo o
povo dirá: Amém (Dt. 27:26).

Todos quantos, pois, são das obras da lei, estão debaixo de maldição: porque está
escrito: Maldito todo aquele que não permanecer em todas as cousas escritas no
livro da lei, para praticá-las. E é evidente que pela lei ninguém é justificado diante
de Deus, porque o justo viverá pela fé. Ora, a lei não procede de fé, mas: Aquele que
observar os seus preceitos, por eles viverá (Gl. 3:10-12).

Sem misericórdia morre pelo depoimento de duas ou três testemunhas quem tiver
rejeitado a lei de Moisés (Hb. 10:28)

Bem, nesta situação estamos diante de um impasse, o que fazer?


Temos que satisfazer a Lei de Deus, cumpri-la, para ser justo e
conseqüentemente ter vida. Como fazer isso então se nossa natureza,
essência, está corrompida desde a Queda? Podemos ser salvos mesmo sem
cumprir a Lei?A resposta e a saída para este dilema obtemos em Rm. 3: 21-
26:

Mas agora se manifestou uma justiça que provém de Deus, independente da Lei,
da qual testemunham a Lei e os Profetas, justiça de Deus mediante a fé em Jesus
Cristo para todos os que crêem. Não há distinção, pois todos pecaram e estão
destituídos da glória de Deus, sendo justificados gratuitamente por sua graça,
por meio da redenção que há em Cristo Jesus. Deus o ofereceu como sacrifício
para propiciação mediante a fé, pelo seu sangue, demonstrando a sua justiça. Em
sua tolerância, havia deixado impunes os pecados anteriormente cometidos; mas,
no presente, demonstrou a sua justiça, a fim de ser justo e justificador daquele
que tem fé em Jesus (NVI, destaques meus).

9
É isso. Em Jesus Cristo a justiça que faltava ao ser humano foi
comunicada. Observe agora o que esta morte vicária (como sacrifício no
lugar de) de Cristo pode dar a todos os que crêem:

 Satisfação das exigências da Lei. a) Como você já sabe, a


Lei de Deus exigia o nosso cumprimento, Cristo a cumpriu
em sua vida de santidade absoluta (Mt. 5: 17; Jo. 8:46; 1Pd.
1:19; 1Jo. 3:5);
b) A Lei de Deus exigia o nosso pagamento com a morte
por não tê-la cumprido, pois nós pecamos em adão nosso
representante, por isso esta nossa natureza antiga, nossa
essência original, tem que morrer, porque senão, ela
continua em dívida com Lei que não cumpriu. Cristo foi
este pagamento morrendo (2Co. 5:21; Gl. 3:13). Se nós
estamos nEle, e cremos que Ele é nosso substituto, fez tudo
em nosso lugar, é como se morrêssemos também com Ele.
A Lei foi satisfeita.

 Satisfação da necessidade de justiça do homem. O ser


humano natural está em um estado de pendência, de
dívida com Deus, pois, necessita ser justo, cumprir a justiça
da Lei, mas não cumpre, é injusto, e é assim que Deus o vê
(Ec. 7:20; Rm. 3:19; Tg. 2:10). Então, Jesus sendo sem
pecado, justo, atribui (comunica) a Sua justiça aos que
exercerem fé nEle, justificando-os:

Sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção


que há em Cristo Jesus...Concluímos, pois, que o homem é justificado
pela fé, independentemente das obras da lei (Rm. 3:24,28).

Sim, deveras considero tudo considero tudo como perda, por causa da
sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus meu Senhor; por amor
do qual, perdi todas as cousas e as considero como refugo, para ganhar
a Cristo, e a ser achado nele, não tendo justiça própria, que procede de

10
lei, senão a que é mediante a fé em Cristo, a justiça que procede de
Deus, baseada na fé (Fp 3: 8-9, destaques meus).

 Satisfação da justiça de Deus. A Lei do Senhor havia sido


ultrajada pelo ser humano, que a descumpriu. Esta Lei é o
padrão do caráter de Deus, ele não salvará ninguém que
não se enquadre nesse padrão. E agora? Bem, Jesus Cristo
foi o único que cumpriu a Lei satisfazendo a justiça divina.
Ele não conheceu pecado (1Pd. 1:19; 2:22; 1Jo. 3:5), e se
pecado é a quebra da Lei (1Jo. 3:4), Cristo não pecando, não
a quebrou, cumpriu-a totalmente. Assim, a justiça que Deus
exigia do homem, Cristo a teve em Sí mesmo, por isso pôde
ir a cruz em lugar de pecadores. 9

Cristo, através de sua obediência e morte, quitou plenamente o


débito de todos aqueles que são assim justificados, e fez uma
justa, real e plena satisfação à justiça de seu Pai, em favor deles.
Todavia, visto que lhes foi dado pelo Pai, e sua obediência e
satisfação aceitas em lugar deles, e ambas gratuitamente, e não por
algo existente neles, sua justificação é tão somente da livre graça;
para que tanto a exata justiça quanto a rica graça de Deus fossem
glorificadas na justificação dos pecadores (Destaques meus).10

Em Jesus morre tudo o que era velho e nasce algo novo (2Co. 5:17),
esta é a obra de regeneração, e é feita estritamente por Deus em quem Ele
quer (Mt. 11:27).

5. DE QUEM É A OBRA DA REGENERAÇÃO?

Porque creio? Porque sou regenerado? Isso está em meu poder? Posso
ser regenerado a hora que eu quiser, e com os meus esforços? Preste atenção:

Por fim, a regeneração é somente obra de Deus, desde o principio


até o fim. Ele é que opera, o homem é o feliz e privilegiado objeto
dessa ação. Não se busca a sua colaboração numa obra que levará o
selo de uma mão todo-poderosa. Deus operou sozinho na criação;

9
HOEKEMA, Anthony. Salvos pela Graça, 2ª Ed. (São Paulo: Cultura Cristã, 2002), p181.
10
Confissão de Fé de Westiminster, XI.iii

11
de igual maneira, deve executar sozinho a gloriosa obra da
regeneração.11

O Antigo Testamento já mostrava que só Deus pode fazer uma


mudança radical na natureza de uma pessoa pecadora, capacitando-a para
fazer o que ele quer.

O SENHOR, o seu Deus, dará um coração fiel a vocês e aos seus descendentes, para
que o amem de todo o coração e de toda a alma e vivam (Dt. 30:6, NVI)

“Esta é a aliança que farei com a comunidade de Israel depois daqueles dias”,
declara o SENHOR: “Porei a minha lei no íntimo deles e a escreverei nos seus
corações. Serei o Deus deles, e eles serão o meu povo (Jr. 31:33, NVI)

“Pois eu os tirarei dentre as nações, os ajuntarei do meio de todas as terras e os trarei


de volta para a sua própria terra. Aspergirei água pura sobre vocês e ficarão puros;
eu os purificarei de todas as suas impurezas e de todos os seus ídolos. Darei a vocês
um coração novo e porei um espírito novo em vocês; tirarei de vocês o coração de
pedra e lhes darei um coração de carne. Porei o meu Espírito em vocês e os levarei a
agirem segundo os meus decretos e a obedecerem fielmente às minhas leis (Ez. 36:
24-26, NVI).

E o Novo Testamento ensina com clareza que a natureza do ser


humano natural está corrompida pelo pecado, ninguém pode obedecer a
Deus por sua própria vontade se o próprio Deus não agir e lhe resgatar. A
natureza humana é escrava do pecado e mal.

Pois do interior do coração dos homens vêm os maus pensamentos, as imoralidades


sexuais, os roubos, os homicídios, os adultérios, as cobiças, as maldades, o engano, a
devassidão, a inveja, a calúnia, a arrogância e a insensatez. Todos esses males vêm
de dentro e tornam o homem ‘impuro’ (Mc. 7:21-23, NVI).

Como está escrito: “Não há nenhum justo, nem um sequer; não há ninguém que
entenda ninguém que busque a Deus. Todos se desviaram, tornaram-se juntamente
inúteis; não há ninguém que faça o bem, não há nem um sequer” “Suas gargantas
são um túmulo aberto; com suas línguas enganam” “Veneno de serpentes está em
seus lábios” “Suas bocas estão cheias de maldição e amargura” “Seus pés são ágeis
para derramar sangue; ruína e desgraça marcam os seus caminhos e não conhecem o
caminho da paz” “Aos seus olhos é inútil temer a Deus” (Rm. 3:10-18, NVI).

A mentalidade da carne é inimiga de Deus porque não se submete à Lei de Deus,


nem pode fazê-lo. Quem é dominado pela carne não pode agradar a Deus (Rm 8:7-8,
NVI).
Só Deus pode transformá-la.
11
C. H. Mackintosh, p. 103.

12
Contudo, aos que o receberam, aos que creram em seu nome, deu-lhes o direito de
se tornarem filhos de Deus, os quais não nasceram por descendência natural, nem
pela vontade da carne nem pela vontade de algum homem, mas nasceram de Deus
(Jo. 1:12-13, NVI, destaque meu).

Ninguém pode vir a mim, se o Pai, que me enviou, não o atrair; e eu o ressuscitarei
no último dia (Jo.6:44, NVI).

Vocês estavam mortos em suas transgressões e pecados, nos quais costumavam


viver, quando seguiam apresente ordem deste mundo e o príncipe do poder do ar, o
espírito que agora está atuando nos que vivem na desobediência. Anteriormente,
todos nós também vivíamos entre eles, satisfazendo as vontades da nossa carne
seguindo os seus desejos e pensamentos. Como os outros, éramos por natureza
merecedores da ira. Todavia, Deus, que é rico em misericórdia, pelo grande amor
com que nos amou,deu-nos vida com Cristo, quando ainda estávamos mortos em
transgressões — pela graça vocês são salvos (Ef. 2:1-5, NVI, destaque meu).

Por toda esta sua incapacidade é que o ser humano é totalmente


passivo no ato do Novo Nascimento (regeneração), 12 ela é uma obra da mão
do Criador de todas as coisas. A transferência do estado de morte espiritual
do ser humano, para a luz só acontece com intervenção do Espírito Santo que
é quem abre os olhos do ser humano cego para as palavras da vida (1Co.
2:14).

6. COMO ACONTECE O NOVO NASCIMENTO (OU A RECEPÇÃO DA


NOVA NATUREZA).

Pois bem, sabedores que a natureza do ser humano escravo no pecado


tem que morrer, e que esta é uma obra de Deus? Como acontece este Novo
Nascimento?
Para entendermos esse processo temos que nos reportar as palavras
de Cristo tão importantes para este estudo em Jo. 3: 5: “Respondeu Jesus:
“Digo-lhe a verdade: Ninguém pode entrar no Reino de Deus, se não nascer da água
e do Espírito””.
Aqui Jesus descreve o processo do Novo Nascimento. Este processo
não é como pensava Nicodemos nascer naturalmente de pai e mãe aqui na
12
É importante notar que a expressão grega gennethe que aparece em Jo. 3: 3, e pode ser traduzida
por nascer, gerar está na forma verbal aoristo passivo, isto mostra que o ser humano realmente não
participação neste ato, é o objeto passivo do mesmo, não seu agente. O agente é somente Deus. Veja:
HOEKEMA, Anthony. Salvos pela Graça, 2ª Ed. pp. 102,103.

13
terra, pois como já vimos a natureza do homem é caída, não adianta quantas
vezes nasça aqui. “Um segundo nascimento natural não teria maior valor que o
primeiro. Nem ainda que nascesse dez mil vezes, pois, o que é nascido da carne, é
carne”.13 Ele teria que ser regenerado, nascer de uma outra maneira.

 O Nascimento da água. Para entendermos estas palavras de Jesus


temos que prestar atenção a alguns textos bíblicos.

a) “Por sua decisão ele nos gerou pela palavra da verdade, para que
sejamos como que os primeiros frutos de tudo o que criou”(Tg. 1:18, NVI,
grifo meu).

b) “Pois vocês foram regenerados não de uma semente perecível, mas


imperecível, por meio da palavra de Deus, viva e permanente” (1 Pd.
1:23, NVI, grifo meu).

c) Embora possam ter dez mil tutores em Cristo, vocês não têm muitos pais,
pois em Cristo Jesus eu mesmo os gerei por meio do evangelho (1 Co.
4:15, NVI, grifo meu).

Estes textos nos mostram que o que produz o nascimento espiritual no


ser humano, o nascimento no Reino de Cristo, é a Palavra de Deus. O profeta
Ezequiel já havia usado a água como um símbolo da Palavra de Deus no
Antigo Testamento:

Então aspergirei água pura sobre vós e ficareis purificados; de todas as


vossas imundícias e de todos os vossos ídolos vos purificarei. Dar-vos-ei
coração novo e porei dentro em vós espírito novo; tirarei de vós o coração de
pedra e vos darei coração de carne (Ez. 36:25-26).

13
C. H. Mackintosh, p. 106.

14
É claro que nesta passagem o Senhor não ia dar banho em ninguém,
mas o profeta fala simbolicamente da conversão, da purificação que só a
Palavra de Deus pode fazer. Esta purificação só aconteceria na Nova Aliança,
como já havia sido anunciado em Jeremias 31: 31-34.

O apóstolo Paulo é mais claro ao falar disso:

Maridos, amem suas esposas, assim como Cristo amou a igreja e entregou-se
a si mesmo por ela para santificá-la, tendo-a purificado pelo lavar da água
mediante (pela ARA) a palavra (Ef. 5: 25-26, NVI, grifo meu).

É isso. A água é um símbolo do evangelho a Palavra de Deus. É por ela que o


ser humano nasce de novo, nasce pela fé para ser filho de Deus (Jo. 1:11-13;
Gl. 3: 26). “O Espírito é o que vivifica; a carne (natureza carnal) para nada
aproveita; as palavras que eu vos tenho dito são espírito e são vida” (Jo. 6:63).

Jesus em suas palavras esclarece quando fala aos seus discípulos:

“Declarou-lhe Jesus: Quem já se banhou não necessita de lavar senão os pés;


quanto ao mais estais limpos, mas não todos” (Jo. 13:10).

E quem os havia limpado?

“Vós já estais limpos, pela palavra que vos tenho falado” (Jo. 15:3).

Nascer da água, portanto é nascer da palavra de Deus, o evangelho


que é o que gera para uma nova vida.14
Wayne Grudem escreve:

Quando Jesus fala de “nascer da água” aqui, a interpretação mais provável disso é
que ele esteja referindo-se à purificação espiritual do pecado, que o profeta Ezequiel

14
Vd. GRUDEN, Wayne. Teologia Sistemática (São Paulo: Vida Nova, 2000), p. 820.

15
profetizou quando disse: “ Então aspergirei água pura sobre vós, e ficareis
purificados; de todas as vossas imundícias e de todos os vossos ídolos vos
purificarei. Dar-vos-ei coração novo e porei dentro de vós espírito novo” (Ez 36: 25-
26). Aqui a água simboliza purificação espiritual do pecado, exatamente como
coração novo e espírito novo falam da nova vida espiritual que Deus dará.15

 O Nascimento do Espírito. O Espírito é o agente que aplica a


Palavra de Deus (a água) ao coração do pecador. O Próprio
Senhor disse que o Espírito quando viesse era quem guiaria os
discípulos a toda verdade (Jo. 16: 13-14). É Ele quem aplica à
palavra de Deus a alma.

A água lava o objeto sobre o qual é empregada com esse fim... Com seu
poder purificador, a palavra de Deus, aplicada pelo Espírito Santo,
produz uma nova vida no homem. Quando a consciência é atingida pela
palavra fica purificada juntamente com o coração, as próprias
inclinações, os pensamentos e os atos, e o Espírito Santo gera uma nova
vida. Não se trata de uma existência natural, mas por ser originada pelo
Espírito Santo, de uma vida divina; de modo que um filho de Deus é
nascido de Deus (Jo 1:13; 1Jo 3: 9,10; 5:18).16

O ser humano nascido aqui na terra de maneira natural é mais uma


criatura de Deus, mas quando passa por esse processo de novo nascimento,
torna-se um filho de Deus (Jo. 1:11-13), pela recepção do Espírito Santo e fé
(Rm. 8: 9-17; Gl 3:26), tudo isso por pura graça. Não há participação do ser
humano neste processo, só de Deus.

Não por causa de atos de justiça por nós praticados, mas devido a sua
misericórdia, ele nos salvou pelo lavar regenerador e renovador do
Espírito Santo, que ele derramou sobre nós genericamente por meio de Jesus
Cristo nosso salvador (Tt. 3: 5-6, NVI, grifo meu).

CONCLUSÃO:

15
Ibid, p. 591.
16
HEIJJOOP, H. L. O Espírito Santo, 2ª ed. (Lisboa: Depósito de Literatura Cristã, 1978), pp. 23-24.

16
Assim, este é o processo pelo qual acontece o Novo Nascimento. Esta
obra do Espírito Santo da qual todos necessitam, chama-se graça especial. É
uma graça regeneradora que cria um novo ser humano diante de Deus,
justificado e libertado do pecado, e reconciliado com Deus. O Espírito Santo
é quem aplica toda esta obra ao ser humano, abrindo-lhe os olhos (1Co. 2:14).
Com esta operação do Espírito Santo o ser humano recebe a natureza divina,
espiritual (2Pd. 1:3-4), e tudo que foi separado com o pecado é reconciliado,
pois Cristo é o Reconciliador (Cl. 1:19-23). Observe como Cristo desmancha
tudo o que o pecado separou no inicio:

 Aspecto psicológico, em Cristo o homem passa a ter paz consigo


mesmo (1Jo. 3: 14, 19-24);
 Aspecto social, em Cristo o homem passa ater paz com o
semelhante (1Co. 7:15; Ef. 2: 14-16);
 Aspecto ambiental, no final com a volta de Cristo o meio
ambiente será restaurado na glória dos filhos de Deus (Rm. 8: 19-
22; Cl. 1:20);
 Aspecto espiritual, em Cristo o ser humano antes inimigo de
Deus, separado, passa agora a ser seu amigo (Rm. 5:1,2).

Este é o Novo Nascimento, a Regeneração, esta é a maravilhosa obra


de salvação de Deus operada por Cristo.
Soli Deo Glória!

Endereço do autor
joelsonfgomes62@hotmail.com

17

You might also like