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SEXUALIDADE APÓS ENFARTE AGUDO DO MIOCÁRDIO – BREVE REVISÃO SISTEMÁTICA____________7

1 - INTRODUÇÃO

Este trabalho faz uma breve revisão sobre a informação transmitida aos
doentes vítimas de enfarte agudo do miocárdio (EAM), acerca da sua sexualidade.
Pretende-se desmistificar a abordagem da sexualidade pelos profissionais de saúde,
pois esta faz parte da reabilitação total do indivíduo, melhorando a sua qualidade de
vida.
Após o EAM, os doentes têm muitas questões sobre medicamentos, tratamento
e prognóstico. No entanto, como nos diz STEINKE e PATTERSON-MIDLEY (1998),
uma área frequentemente negligenciada, é a função sexual.
A actividade sexual (AS) pode ser exprimida das mais diversas maneiras. Para
a maioria das pessoas a AS significa relação sexual, mas pode simplesmente querer
dizer ter o companheiro ou companheira junto de si, ou só tocar, agarrar e/ou
expressar ternura.
É opinião geral, como constatado na revisão bibliográfica efectuada, que no
campo da reabilitação cardíaca a sexualidade é um aspecto muito pouco abordado,
continuando, ainda, a ser tabu em muitas das ocasiões.
Para BRIGGS (1995), o facto de a AS muitas vezes, não ser abordada com o
doente deve-se por um lado a estes e por outro aos enfermeiros. A autora refere que
em relação aos doentes muitos destes acreditam que retomar a AS após um EAM
poderá ser um perigo para a sua saúde, uma vez que, citando ROSA (1998, p.30),
“… há aumento da sobrecarga cardíaca e esforço cardíaco e, em alguns casos, o
início das queixas da sua doença pode ter ocorrido durante o acto sexual, …”.
Muitas vezes a doença cardíaca é associada ao envelhecimento. Os doentes
que sofreram um EAM podem, segundo BRIGGS (1995), sentir que esta doença se
trata de um último aviso e abster-se da actividade sexual.
Ainda no que diz respeito aos doentes, PAPADOPOULOS et al (1983), no seu
estudo realizado com doentes do sexo feminino, verificaram que uma das suas
principais preocupações era, já não serem consideradas atraentes pelos respectivos
parceiros.

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Por último, BRIGGS (1995), afirma que o medo da incapacidade de manterem


o seu padrão sexual habitual após o EAM, a duração da estadia no hospital e a falta
de comunicação entre o casal poderão ser outros factores que perturbem a AS.
No que se refere aos enfermeiros, a evidência indica que estes não fornecem
informação/conselhos adequados sobre a AS após a ocorrência de um EAM devido
a inúmeras razões.
Para JONES (1992) cit in BRIGGS (1995), a equipa de enfermagem pode estar
relutante em tratar deste assunto com o doente, o que pode causar embaraço para
ambas as partes.
Por outro lado, ROSA (1998) salienta dois aspectos:
• A maioria dos enfermeiros são recém formados e normalmente
ainda não têm confiança e maturidade para abordarem assuntos
mais desta natureza.
• Existe uma tendência para se diminuir a informação a doentes
“aparentemente” inactivos sexualmente, como é o caso dos
indivíduos solteiros, divorciados, viúvos, homossexuais e idosos.

Após um EAM, segundo TAYLOR (1999), aproximadamente 25% dos doentes


referem cessação da AS, no entanto, a maioria diz que sente que a podiam manter.
O autor refere ainda que após a doença cardíaca, a maioria dos doentes mostrou
alguma falta de interesse sexual: aproximadamente 60% demonstra não ter
interesse ou uma marcada perda de interesse, 10% refere uma perda ligeira e cerca
de 25% demonstrou não ter alteração do seu interesse sexual.
VACANTI e CARAMELLI (2005), estudaram a incidência das alterações na AS
após o EAM e as possíveis variáveis associadas à disfunção sexual em doentes que
não a apresentavam previamente. Foram incluídos no estudo 43 homens e mulheres
dos 18 aos 75 anos, sem factores conhecidos que pudessem ser a causa da
disfunção sexual. Receberam informação acerca do reinício da AS e voltaram seis
meses depois para responderem a dois questionários, sendo um sobre o
comportamento sexual e outro sobre saúde mental na comunidade. Os doentes
reiniciaram a sua AS cerca de 20 dias após o EAM e 9,3% não a retomaram até ao
final da investigação. Os que reiniciaram a AS apresentaram uma redução de 8 para
5 relações sexuais por mês, ou seja redução de 40%. Até ao sexto mês 60,5% dos

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doentes apresentaram disfunção sexual. Todos os doentes com presença de


distúrbios psicológicos apresentaram disfunção sexual até ao final do estudo. Dos
que não apresentaram distúrbios psicológicos, 46,9% apresentaram disfunção
sexual. O grupo com disfunção sexual era significativamente mais velho que o sem
disfunção. Os autores concluíram que houve significativa redução da AS e elevada
incidência de disfunção sexual após o EAM. Uma maior incidência de disfunção
sexual após EAM esteve associada à presença de distúrbios psicológicos e idade
mais avançada.
Num estudo longitudinal realizado por DRORY et al (1998), com 276 doentes
do sexo masculino com idades compreendidas entre os 30 e os 65 anos (média de
51 anos), que sofreram um primeiro EAM e que eram sexualmente activos antes de
ocorrer o EAM, verificou-se que 88% dos doentes retomaram a sua AS. Destes, 50%
retomaram a AS no espaço de um mês, 35% relataram uma redução na frequência e
igual percentagem relataram uma redução da satisfação, comparado com a AS
antes da ocorrência do EAM. Uma redução tanto na frequência como na satisfação
foi descrita por 10% dos doentes e uma redução em um dos parâmetros (frequência
ou satisfação), foi referida por 25% dos doentes. Foi também referido por 20% dos
doentes um aumento da frequência ou da satisfação sexual. Foram ainda estudadas
outras variáveis e a sua relação com a AS após o EAM e verificou-se que o aumento
da idade, o nível de educação e a depressão, são factores que diminuem a
frequência e/ou satisfação sexual.
Para reduzir a incidência de disfunção sexual após a ocorrência de um EAM, é
importante que os profissionais estejam bem preparados e neste campo os
enfermeiros têm um importante papel a desempenhar. São eles que normalmente
conhecem as necessidades psicossociais dos doentes, encontrando-se por isso em
situação privilegiada para os abordar e esclarecer acerca das suas preocupações
sexuais.

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2 - ALTERAÇÕES CARDIOVASCULARES DURANTE A ACTIVIDADE SEXUAL

Segundo BRIGGS (1995), a resposta sexual normal passa por quatro fases:
• Excitação - fase em que ocorrem estímulos psicogénicos ou
periféricos que aumentam a tensão sexual resultando em
vasoconstrição.
• Planalto - esta fase ocorre com a tensão sexual intensificada.
Pode demorar 30 segundos a 3 minutos.
• Orgasmo - esta fase pode ser descrita como o clímax da relação.
• Resolução - fase em que o corpo retorna ao seu estado de
descanso.

Para DRORY (2002), citando HELLERSTEIN (1970), STEIN (1977) e BOHLEN


(1984), a preponderância da literatura relativamente à AS em voluntários saudáveis
e doentes com doença coronária sugere que a frequência máxima varia
aproximadamente entre os 104 e 131 bat/min, a pressão sistólica máxima entre os
150 a 180 mmHg e o consumo metabólico entre 2 MET`s (“1MET é a exigência
básica de oxigénio de um corpo inactivo sendo 3,5ml de oxigénio/kg/min.” BRIGGS
(1995)), antes do orgasmo e 5 a 6 MET`s durante o orgasmo.
Os primeiros estudos realizados nesta área foram realizados na década de 50 e
60. O estudo de MASTERS e JONHSON (1966) cit in STEIN (2000) debruçou-se a
variação da frequência cardíaca e da pressão arterial durante o coito em casais de
estudantes voluntários, que estavam monitorizados electrocardiograficamente em
quartos no seu laboratório. Os valores máximos obtidos para a frequência cardíaca
foram de 140-180 bat/min, a pressão sistólica aumentou cerca de 80 mmHg e a
pressão diastólica 50 mmHg. No entanto, é importante referir que este estudo não foi
realizado no ambiente natural dos casais.
O estudo realizado por HELLERSTEIN e FRIEDMAN (1970) cit in STEIN
(2000), com homens de média idade com e sem doença arterial coronária, foi o
primeiro a ser realizado com doentes reais e em locais reais da vida. Ao contrário do

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estudo anterior, neste foram utilizados monitores electrocardiográficos em


ambulatório em casais cuja relação se desenrolava no seu local habitual, na posição
habitual e na hora habitual. Neste estudo a média de idades dos indivíduos foi de
47.5 anos. A frequência cardíaca máxima durante o orgasmo foi em média de 117.4
bat/min com uma variação entre os 90 e 144 bat/min. Tratou-se de um achado
interessante uma vez que o valor obtido foi inferior aquele que normalmente se
atinge durante as actividades de vida diária (média de 120.1 bat/min). Neste mesmo
estudo, foi ainda calculado o consumo de O2 (VO2) durante o coito. O consumo de
oxigénio do corpo total foi medido através de uma bicicleta que produziu valores
cardíacos (pulso e pressão arterial) semelhantes aos máximos atingidos durante o
coito, sendo o valor médio obtido de 16 mlO2/min/kg. Este valor correspondeu ao
máximo atingido por 60 % dos sujeitos. A implicação clínica é que o coito, de
maneira geral, em homens de média idade, impõe apenas um modesto custo
fisiológico, com valores máximos cardíacos com duração inferior a 15 segundos.
Outro estudo realizado por STEIN (1977) cit in STEIN (2000) debruçou-se
sobre o pico dos valores cardíacos durante o coito em 16 doentes depois de
sofrerem um EAM e que estavam prestes a entrar num programa de treino físico. Os
doentes foram monitorizados 24 horas em ambulatório no seu domicílio e durante o
coito com as suas esposas duas ocasiões antes e duas depois de terem sido
completadas 16 semanas de um programa de treino em bicicleta. Seis doentes
serviram de grupo controlo (sem treino físico), durante este período. A média da
frequência cardíaca durante o coito foi de 127 bat/min (120-130) e depois do
programa de treino a média foi de 120 bat/min (115-122).
No que se refere às posições a adoptar, muitas vezes é dada a informação aos
doentes do sexo masculino no sentido de durante a relação escolherem a posição
inferior, partindo-se do pressuposto de que esta acarreta menor trabalho cardíaco.
Alguns estudos foram realizados nesta área, como o de NEMEC et al (1976) cit in
STEIN (2000). Estes autores realizaram um estudo com 10 sujeitos do sexo
masculino (com uma média de idades de 29,3 anos), tendo coito com as esposas
em suas casas em duas posições (homem em cima e mulher em cima). Os
resultados obtidos não foram significativamente diferentes para os sujeitos, o que
parece indicar que não há base fisiológica no homem para aconselhar uma alteração
de posição.

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DRORY (2002), referindo o estudo de BOHLEN et al (1984), salienta que


existem variações substanciais nos parâmetros metabólicos e hemodinâmicos entre
indivíduos saudáveis com diferentes actividades sexuais. Essas actividades incluem
o coito com o homem em cima, o coito com a mulher em cima, estimulação não
coital do homem pela mulher e auto estimulação pelo homem sozinho. Neste estudo,
realizado com dez casais saudáveis com idades compreendidas entre os 25 e os 43
anos (média de 33 anos), os valores máximos de frequência cardíaca, tensão
arterial, e VO2 foram atingidos durante o breve intervalo do orgasmo (10-16
segundos), e depois aproximaram-se rapidamente dos níveis base durante as fases
de resolução. A frequência cardíaca obtida foi de 102 bat/min durante o orgasmo
com auto-estimulação e estimulação pelo parceiro, 120 bat/min com a esposa por
cima e 127 bat/min com o homem por cima. Apesar destes valores, não houve
diferenças estatisticamente significativas para nenhuma das quatro actividades. Os
valores de VO2 foram modestamente elevados durante a auto e estimulação pelo
parceiro (1.7 e 1.8 MET`s respectivamente), enquanto que para a posição da mulher
por cima durante o coito e para a posição de homem por cima durante o coito os
valores são mais elevados, mais precisamente de 2.5 MET`s e 3.3 MET`s.
Num outro estudo sobre a masturbação, realizado por SANDERSON et al
(1982) cit in STEIN (2000), verificou-se que a frequência cardíaca máxima obtida
durante a masturbação foi de 117 bat/min para o homem e de 120 bat/min para a
mulher.
Por fim, no que diz e respeito à resposta fisiológica durante o coito com
parceiros extra matrimoniais não existem muitos estudos. Um caso único é descrito
por CANTWELL (1981) cit in STEIN (2000). Neste caso, um sujeito foi monitorizado
durante 24 horas em ambulatório. Foi observado que durante uma relação sexual
extraconjugal ao meio-dia a sua frequência cardíaca aumentou de 96 para 150
enquanto que com a sua esposa, no mesmo período, aumentou de 72 para 92.
São bastante escassos os estudos sobre o início da AS da mulher após EAM
e sobre as suas alterações fisiológicas.
De acordo com STEIN (2006) não há dados que mostrem grandes diferenças
entre os dois sexos, excepto a maior prevalência de anorgasmia e a possibilidade de
terem orgasmos múltiplos durante cada relação sexual.
A doença coronária, geralmente, atinge a mulher numa idade mais avançada
do que o homem, trazendo uma maior morbilidade e mortalidade. Nesta faixa etária,

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muitas delas são sexualmente inactivas e algumas apresentam disfunção prévia ao


EAM (VACANTI e CARAMELLI, 2005).
PAPADOPOULOS et al (1983) estudaram a AS das mulheres após EAM, das
130 mulheres entrevistadas, 51% revelaram medo de reiniciar a AS e 27% não a
reiniciaram. Para 44% houve uma redução da frequência e apenas em 27% não
houve alterações.
SMITH, FRANKEL e YARNELL (1997) encontraram nos estudos consultados,
dados suficientes para concluir que a frequência da AS estava inversamente
associada com a mortalidade nos homens e que a satisfação na AS estava
inversamente relacionada com a mortalidade nas mulheres.

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3 - ACTIVIDADE SEXUAL E ENFARTE AGUDO DO MIOCÁRDIO

O EAM, é o processo que leva à morte de parte ou de todo o músculo


cardíaco por falta de suprimento adequado de nutrientes e oxigénio. A interrupção do
fluxo sanguíneo é normalmente causada pela obstrução de uma artéria coronária ou
de um dos seus ramos. Esta obstrução ocorre frequentemente pela formação de um
coágulo sobre uma placa de arteriosclerose que sofreu alguma alteração, como o
aparecimento de uma ruptura na placa.
A diminuição ou mesmo a ausência de circulação impede a chegada de
nutrientes e de oxigénio ao território suprido pela artéria lesada, causando uma
redução imediata e progressiva da contractilidade do miocárdio.
O sintoma mais importante e típico do EAM é a dor ou desconforto intenso
retroesternal que é muitas vezes referida como aperto, opressão, peso ou sensação
de queimadura, podendo irradiar para o pescoço, mandíbula, membros superiores
e/ou dorso. Frequentemente esses sintomas são acompanhados por náuseas,
vómitos, suores, palidez e sensação de morte iminente.
Actualmente, a doença das artérias coronárias aparece não só associada às
variáveis de risco físicas, mas também psicológicas. As emoções parecem ter um
papel preponderante neste processo e a sua influência na saúde física, em particular
na doença coronária, leva a que as intervenções sejam feitas no sentido de
identificar, para assim controlar, os factores de risco.
A perspectiva ecológica da saúde e da promoção da saúde, passa a ter em
conta que os próprios factores de risco clássicos das doenças cardiovasculares e
em particular da doença coronária dependem também de padrões comportamentais
e reacções emocionais apreendidas, que se constituem como estilos de vida
regulares em resposta às agressões e pressões do meio ambiente (TRIGO,
COELHO e ROCHA, 2002).
Um dos factores que tem sido referido como causa de EAM é a AS. Mas
como nos afirma DRORY (2002), esse risco é baixo.
Alguns estudos parecem reforçar a afirmação anterior. No estudo realizado
por MULLER et al (1996) com um total de 1774 doentes com EAM entrevistados em
45 hospitais de toda a parte dos EUA, 858 doentes eram activos sexualmente no
ano anterior ao EAM. Destes, 79 (9%), relataram AS nas 24 horas que precederam o
EAM, e 27 (3%), relataram AS nas 2 horas que precederam o começo dos sintomas

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do EAM. O risco relativo do EAM ocorrer nas 2 horas após a AS é de 2.5 (95% IC,
1.7-3.7), para indivíduos sem história prévia de doença cardíaca, enquanto que, o
risco relativo da AS desencadear o começo de um EAM entre os doentes com
história prévia de angina de peito é de 2.1 (95% IC, 0.8-5.8), e de EAM é de 2.9
(95% IC, 1.3-6.5). Os autores deste estudo concluíram que a AS pode desencadear
um EAM em apenas 0.9% dos casos e que o exercício regular está associado a um
risco decrescente.
Noutro estudo realizado, MÖLLER et al (2001) incluíram todos os cidadãos
suecos com idades compreendidas entre os 45-70 anos e a viver em Estocolmo,
sem história prévia de EAM. Durante o período de colheita de dados foram
entrevistadas 699 pessoas entre o período de Abril de 1993 a Dezembro de 1994,
sendo o número de casos final após a exclusão por informação inadequada e outros
motivos de 659 pessoas.
Dos doentes que não tiveram sintomas premonitórios 1.3% (5/399), estiveram
expostos a AS durante as duas horas antes do EAM. Durante a hora antes do EAM
(0-60minutos) um valor de 2.01 (95% IC, 0.7-6.5), foi encontrado e durante a hora
antes (61-120 minutos) um risco de 1.4 (95% IC, 0.3-5.9) permanece. A estimativa
do risco relativo durante o total das duas horas foi de 1.8 (95% IC, 0.7-4.3). Os
autores concluíram que o risco de EAM aumenta após a AS embora o risco absoluto
seja baixo. Também neste estudo se verfifica que o exercício regular leva a um
menor risco.
No grupo dos doentes que normalmente realizam pouco exercício o risco
relativo é de 4.4 (95% IC, 1.5-12.9), enquanto que o risco relativo é de 0.7 (95% IC,
0.1-5.1) para os doentes com um padrão de exercício mais activo.
PARZELLER, RASCHKA e BRATZKE (2001), investigaram o número de
mortes relacionadas com a AS no registo de autópsias realizadas ao longo de 27
anos. Em 26901 autópsias realizadas, apenas 48, ou seja, 0.18% revelaram morte
natural durante a AS. Destes, 45 eram homens com uma média de 60,6 anos de
idade. O primeiro EAM foi a causa de morte em 12 e repetição de EAM foi a causa
de morte de 13. Do total de óbitos, 36 ocorreram durante ou depois de uma relação
sexual e 12 depois de outra AS. Grande parte dos óbitos (75%), ocorreu fora da
relação conjugal, sendo a maioria deles com prostitutas jovens.
Num outro estudo, realizado na mesma área por UENO (1969) cit in STEIN
(2000), concluiu-se que 34 dos 5559 casos de morte súbita ocorreram durante o

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coito e destas 34 mortes, 18 tiveram causa cardíaca. Ainda dos 34 casos, 27


ocorreram durante o coito extra matrimonial. A AS extra matrimonial pode ser mais
perigosa e arriscada porque acontece, normalmente, com uma pessoa mais nova
que a parceira habitual e, frequentemente, após ingestão excessiva de comida e/ou
bebida. A situação pode provocar sentimentos de culpa e embaraço em se queixar
de dores no peito (WALBROEHL, 1994 cit in RERKPATTANAPIPAT, STANEK e
KOTLER, 2001).

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4 - ACONSELHAMENTO SEXUAL – QUE INFORMAÇÃO É TRANSMITIDA AOS


DOENTES

O aconselhamento sexual é uma componente importante do tratamento após


EAM. (RERKPATTANAPIPAT, STANEK e KOTLER, 2001; KIRBY, 2005)
Vários estudos apontam no sentido de que a informação fornecida aos doentes
é insuficiente.
YILMAZ e EMIROGLU (2005), realizaram um estudo com 187 doentes com
EAM, em que estes foram entrevistados nas 48 horas após a admissão no hospital,
dois dias antes da alta e no primeiro e no décimo quinto dia após a alta. Nos
resultados foi possível constatar que os doentes não apresentavam informação
suficiente relativamente ao diagnóstico e tratamento, os doentes não colocavam
questões embora tivessem dúvidas e os doentes sem informações apresentam mais
dificuldades no tratamento. Dois dias antes da alta, apenas 3,7% dos doentes
tinham recebido informação sobre a AS. No primeiro dia e no décimo quinto dia após
a alta, 57,8% e 54,0% respectivamente, previam ter dificuldades relacionadas com a
AS. Dos doentes que receberam informação dois dias antes da alta e dos que não
receberam informação nenhuma, 50,0% e 57,7% respectivamente, também
pensavam encontrar dificuldades. Os autores do estudo concluíram que a
informação dada aos doentes se limitou à que o médico forneceu no último dia de
internamento e que os enfermeiros não participaram nesse processo. Terminar a
hospitalização com falta de informação relativa à doença pode acatar problemas aos
doentes e aos seus familiares. Os autores sugerem que sejam estabelecidos planos
para a alta dos doentes com EAM e que os enfermeiros participem activamente
neste processo.
O estudo de STEINKE e PATTERSON-MIDGLEY (1998) realizado com 96
adultos com mais de 18 anos e que experimentaram um primeiro EAM verificou-se
que apenas 33% dos sujeitos responderam que a informação sobre a AS foi
discutida durante a hospitalização. A informação foi maioritariamente fornecida pela
equipa de reabilitação cardíaca (28%, n=27), enquanto que o pessoal de
enfermagem apenas contribuiu com 3% (n=3). Neste mesmo estudo foi possível,

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ainda, constatar que no grupo de indivíduos com idades compreendidas entre os 60


e os 74 anos, 13 (42%), dos 31 sujeitos receberam conselhos e no grupo de
indivíduos com mais de 75 anos apenas 2 (14%), dos sujeitos receberam conselhos
sobre a AS. No que diz respeito ao estado civil verificou-se que 27 (39%), dos 69
indivíduos casados receberam conselhos sexuais, enquanto que dos sujeitos viúvos
apenas 1 dos 16 (6%), e dos indivíduos divorciados apenas 1 dos 6 sujeitos (17%),
receberam conselhos sobre a AS.
No estudo realizado por PAPADOPOULOS et al (1983), foram entrevistadas
130 mulheres que sofreram o seu primeiro EAM. Após a alta constatou-se que a
percentagem de doentes que receberam instrução acerca da AS antes e após a alta
hospitalar permanece inadequado – 48% do grupo total entrevistado e 62% do grupo
de mulheres que tinha uma vida sexual activa não receberem qualquer tipo de
informação a esse nível.
Por último, interessa referir o estudo efectuado por TEIXEIRA et al (2001) no
serviço de cardiologia/ Unidade de Tratamento Intensivo Coronário do Centro
Hospitalar do Funchal em 2001 em que os autores tinham como objectivos principais
avaliar os conhecimentos dos doentes com EAM no momento da alta hospitalar,
sobre o auto-cuidado nas diferentes AVD´S, em que se incluía o expressar da
sexualidade. Os resultados mostraram que os conhecimentos que os doentes
vítimas de EAM possuíam no momento da alta sobre todos os aspectos das AVD
eram apropriados, enquanto que sobre a sexualidade a informação era inapropriada
uma vez que apenas 39.4% dos doentes receberam informação sobre esse tema.
Para iniciar o aconselhamento sobre AS a um doente após EAM deve colher-se
a sua história prévia. Doentes que não tinham AS e assim se sentem felizes não
devem ser incentivados a mudar. É importante, ainda, avaliar o estado geral do
doente e a sua tolerância ao exercício (STANEK, 1985 cit in RERKPATTANAPIPAT,
STANEK e KOTLER, 2001)
No que se refere ao início da AS foi estabelecida uma classificação segundo o
risco por um conjunto de peritos para o manuseamento da AS em doentes com
patologia cardíaca onde se incluem os doentes com EAM. Nesta classificação são
estabelecidos três graus de risco: baixo risco, risco intermediário e alto risco. No
baixo risco são incluídos os doentes que sofreram um EAM à mais de 6 – 8
semanas. Nestas situações o doente tem um baixo risco de a relação sexual com
coito induzir um novo EAM, pelo que se o teste de stress físico após EAM for

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negativo o doente pode iniciar a sua AS. No risco intermediário, foram incluídos
todos os doentes que sofreram um EAM entre o período de 2 a 6 semanas. Neste
ponto intermediário encontram-se todos os doentes cuja condição cardíaca é incerta.
Neste caso, o doente pode ter ainda um risco considerável de o coito causar
isquémia e re-enfarte, assim como uma arritmia maligna. Este risco deve ser
avaliado através do teste de stress físico. No alto risco foram incluídos todos os
doentes que sofreram um EAM à menos de 2 semanas. Trata-se do período com
máximo risco para o doente pelo que a AS não é recomendada durante este período
(DEBUSK et al, 2000).
A parceira habitual deve ser incluída no aconselhamento ao doente. Em geral,
determinadas guidelines podem ser de grande ajuda a todos os doentes após EAM
e profissionais de saúde.
STANEK (1985) cit in RERKPATTANAPIPAT, STANEK e KOTLER (2001)
apresenta algumas situações em que a AS deve ser evitada:
•Durante as 3 horas que se seguem a uma refeição “pesada”;
•A seguir a ingestão de bebidas alcoólicas;
•Expostos a temperaturas extremas;
•Momentos de maior cansaço;
•Quando houver limitações no tempo disponível.

Os autores alertam ainda para que se evitem situações furtivas e arriscadas e


recomendam a manhã, depois de uma noite de descanso, como o momento ideal
para a AS.
Deve ser referido ao médico quaisquer alterações sentidas durante a AS. O
uso de nitratos antes da AS pode aliviar os sintomas e fazer diminuir o medo de que
estas surjam, no entanto este medicamento está contra-indicado em doentes que
recorrem ao sildenafil para tratamento da disfunção eréctil.

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5 - ESTRATÉGIAS DE ENSINO

Nesta área a investigação é ainda muito escassa. Como já foi referido


anteriormente, vários são os doentes cuja informação acerca da AS que devem ter
após o EAM é nula, ou muitas vezes inadequada. Trata-se de um tema muito
sensível e que apenas alguns profissionais se sentem capazes de abordar.
Entre os profissionais que poderiam e deveriam assumir essa função estão os
enfermeiros, no entanto estes têm-se mantido distantes desta temática por várias
razões. De acordo com STEINKE (1995) cit in STEINKE (2002) estas são a falta de
tempo, conforto e a educação.
Dois estudos foram encontrados sobre esta temática. Um realizado por LINDEN
(1995) cit in STEINKE (2002), estudou a eficácia de um programa de reabilitação
com informação detalhada. Este incluiu um manual com informação detalhada sobre
exercício, conselhos informais e informação relaxada, assim como uma cassete
áudio para relaxamento e manuseamento de stress. Os doentes que receberam o
manual obtiveram após 6 semanas, comparando com um grupo controlo, um score
mais elevado nos seguintes aspectos:
• Confiança numa recuperação total;
• Percepção do progresso da condição física e menos ansiedade;
• Não houve alteração nos scores de depressão durante as seis
semanas quando comparado com o grupo controle.

O outro estudo, realizado por STEINKE et al (2002), procurou verificar a


eficácia de uma cassete de vídeo que os doentes poderiam levar para casa e onde
abordavam questões relacionadas com a sexualidade. Os doentes poderiam então
observar o vídeo no conforto das suas casas com os seus parceiros. Este tipo de
abordagem dá oportunidade aos doentes de observarem o vídeo num local
confortável, o número de vezes que pretenderem e com o parceiro que quiserem,
providenciando assim um método adicional na educação do doente. Este tipo de

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abordagem parece segundo STEINKE (2002), ideal para a abordagem deste tópico
bastante sensível.

6- CONCLUSÃO

A sexualidade faz parte de todo o ser de uma pessoa, no entanto, muitas vezes
ela é colocada em segundo plano.
Após ter ocorrido um EAM, o ensino sobre a AS é de extrema importância, no
entanto, muitas vezes este não é realizado ou não é abordado da forma mais
adequada.
Pelos estudos consultados verifica-se que a AS acarreta diversas alterações
fisiológicas que, no entanto, em situações normais são equivalentes a uma
actividade de vida de intensidade moderada.
Exceptuando o estudo de MASTERS e JONHSON (1966) cit in STEIN (2000),
que foi realizado em laboratório, verifica-se que a frequência cardíaca, a pressão
arterial e o consumo metabólico são equivalentes a uma actividade de vida diária
moderada, atingindo o seu máximo durante o orgasmo, como se pode constatar
através dos estudos de HELLERSTEIN e FRIEDMAN (1970), STEIN (1977) cit in
STEIN (2000) e BOHLEN et al (1984) cit in DRORY (2002). Sendo assim parece ter
algum fundamento o doente poder iniciar a sua AS assim que conseguir subir dois
lanços de escadas seguidas.
No que se refere à posição sexual que o doente deve adoptar, também nesta
área alguns estudos foram realizados, contradizendo a ideia de que o homem deve
ficar por baixo. Nos estudos de NEMEC et al (1976) cit in STEIN (2000) e BOHLEN
et al (1984) cit in DRORY (2002), foram estudadas várias posições não se tendo
verificado diferenças estatisticamente significativas no que diz respeito ao pico da
pulsação nas diferentes posições. No entanto, no estudo de BOHLEN et al (1984) cit
in DRORY (2002), o consumo de VO2 é menor quando ocorre auto estimulação ou
estimulação pelo parceiro pelo que parece ser indicado aconselhar o doente a iniciar
a sua AS por esta prática.
No que se refere à resposta fisiológica do organismo à AS, parece que esta é
maior em situações de stress como é o caso das relações extra matrimoniais. O

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caso descrito por CANTWELL (1981) e UENO (1969) cit in STEIN (2000), assim o
parecem indicar no entanto, estes estudos são escassos para retirar conclusões
definitivas.
Um dos factores que parece condicionar a AS dos doentes após terem sofrido
um EAM, é o medo de se sentirem mal ou morrerem durante a relação. No entanto,
embora tal possa ocorrer, pelos estudos observados, parece que esse risco é baixo.
No estudo de MULLER et al (1996), parece que o risco parece está circunscrito às
primeiras duas horas após a AS.
Noutro estudo, realizado por MÖLLER et al (2001), equivalente na sua
metodologia ao estudo anterior, os valores obtidos foram semelhantes.
Em ambos os estudos foi possível ainda verificar que praticar exercício
regularmente leva a uma redução do risco de um EAM.
Muitos são os doentes que após terem sofrido um EAM reduzem ou abdicam
da sua AS, o que se traduz normalmente numa menor qualidade de vida. Estudos
como o de VACANTI e CARAMELLI (2005), e DRORY et al (1998), assim o parecem
demonstrar. Em ambos os estudos houve um número significativo de doentes que
não retomaram a sua AS e daqueles que a retomaram, uma percentagem
significativa teve uma redução significativa da frequência e satisfação sexual.
Alguns factores como a idade, depressão e nível educacional, são apontados
como intervenientes neste facto como se pode verificar no estudo de DRORY et al
(1998).
Os profissionais de saúde não podem deixar de estar atentos a estes factos e
devem por isso ter um papel mais activo. Vários estudos indicam que a informação
transmitida aos doentes não é suficiente e dos grupos de profissionais que poderiam
intervir, os enfermeiros parecem afastar-se deste processo. Os estudos de YILMAZ e
EMIROGLU (2005), STEINKE e PATTERSON-MIDGLEY (1998), PAPADOPOULOS
et al (1983), e o estudo realizado por TEIXEIRA et al (2001), apresentam valores
entre os 60 e 70% em relação ao número de doentes que não receberam
informação alguma sobre sexualidade durante o tempo de permanência no hospital.
Os enfermeiros parecem que têm contribuído para estes números pois no estudo de
YILMAZ e EMIROGLU (2005), verificou-se que os enfermeiros não participaram no
processo de ensino ao doente e no estudo de STEINKE e PATTERSON-MIDGLEY
(1998), o pessoal de enfermagem apenas abordou esta questão com 3% do total
dos sujeitos.

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No que se refere à melhor estratégia de ensino para abordar esta temática com
os doentes, os estudos são ainda escassos. No entanto, na bibliografia consultada,
duas estratégias parecem ter resultados positivos. O estudo realizado por LINDEN
(1995) cit in STEINKE (2002), demonstrou que a utilização de material como um
manual e uma cassete áudio para o doente levar para o domicílio pode trazer
benefícios para este.
No mesmo sentido, embora com a utilização de material de apoio diferente, o
estudo de STEINKE (2002), parece ir de encontro ao estudo anterior. A utilização de
métodos adicionais na educação do doente parece ter benefícios inequívocos para
este, no entanto, mais estudos nesta área seriam necessários para obter conclusões
mais fidedignas.

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