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Anlise do poema No meio do caminho de Carlos Drummond de Andrade

Por Jos de Paula Ramos Jr, no livro Amor de Pedra

O que chama ateno na pea , de fato, a redundncia. O primeiro verso repetido duas vezes (no quarto e no ltimo versos), o segundo verso idntico ao penltimo, e o terceiro, ao antepenltimo. Alm disso, o segundo e o penltimo versos so uma simples inverso dos termos do primeiro, quarto e ltimo versos. Mais, o terceiro verso, idntico ao antepenltimo, repetido como um dos termos constituintes dos versos 1, 2, 4, 9 e 10, ou seja, a expresso tinha uma pedra comparece em 7 dos 10 versos da composio. Ainda outra redundncia ocorre com o sintagma Nunca me esquecerei, que inicia os versos 5 e 7. Eliminadas todas as repeties, o texto se reduziria a dois perodos simples: No meio do caminho tinha uma pedra. Nunca me esquecerei desse acontecimento na vida de minhas retinas to fatigadas [...] Agora, o que h de to importante na ocorrncia s se revela na anlise dos termos do discurso e na interpretao de seus significados, bem como da relao que se estabelece entre eles. preciso investigar o que se esconde sob a constatao aparentemente banal da pedra no meio do caminho. Assim, pedra, em sentido prprio, matria slida da classe dos minerais, enquanto o termo caminho significa passagem livre ao trnsito. No entanto, em sentido figurado, a expresso pedra no caminho entendida como obstculo que impede o trnsito, sendo que o caminho, tambm figurativamente, pode ser visto como metfora de vida. O texto sugere claramente essa analogia. importante observar que o desvio da norma culta, presente no uso coloquial do verbo ter em lugar de haver, provoca um deslize semntico que, em vez de entender a pedra (obstculo) como uma presena fortuita no caminho (vida), a considera como algo prprio dele, isto , em vez de a pedra simplesmente existir no caminho, alheia a ele, como teramos na frmula culta havia uma pedra, ela vista como pertencente ao caminho, tanto pelo verbo usado em registro popular (tinha uma pedra) quanto pela presena da preposio indicativa de lugar interior (No meio do caminho). Desse modo, o lugar comum coloquial se torna o lugar incomum de uma descoberta: que o impasse (a pedra) da natureza da vida (caminho). Da, mais um motivo para repetir, na lngua errada do povo / lngua certa do povo (3), a lio paradoxal, que iguala obstculo e trnsito, impasse e passagem, fim e comeo, morte e vida.

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