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oTAO DA Fistca Fritjof Capra (a? parte) Em novembro de 1977 a Seco Americana da Socie dade TeosSfica organizou, através do seu Centro de Pesquisas Cientfficas, um Seminario sobre "Tao da Fisica" o qual contou com a presenga de va- vios cientistas, inclusive o Pr. Capra que abriu © Seminario com a palestra abaixo transcrita. Ne- la, o autor procura estabelecer pontos de conta to entre o Misticismo orientalea Fisica conten poranea. Nesta palestra explorarei as relagdes entre ciéncia emis ticismo, o que significa que falarei a respeito de dois tipos de conhecimento, dois estados de consciéncia, que sempre foram veconhecidos como caracteristicas basicas da natureza e da men te humana. Costumam ser chamados de "racional" e “intuitivo", indo tradicionalmente associados 4 ciéncia e 4 religiio. Os chi © chamaran de "Yang" e "Yin", Na cultura chinesa esses ne dois estados da natureza humana nunca foram vistos como perten centes a duas categorias diferentes, mas sempre como sendo ape nas aspectos diferentes de uma iinica realidade, pdlos extremos de um Gnico conjunto. Na viedo chinesa, todas as manifestagces da realidade, incluindo ae da natureza humana, sao geradas pe- la interagdo dindmica entre estes dois pdlos arquet{picos: o "Yin" © o "Yang". Diz um antigo texto chings: 0 "Yang", tendo atingido seu climax, retrocede em favor do "Yin"; 0 "Yin", t do atingido seu climax, retrocede em favor do "Yang". Nesta in teragao cficlica um avanga e o outro retrocede e emseguida o s¢ gundo avanga e o primeiro retrocede. Penso sermuito instrutivo observar as atitudes de nossa ciedade em relagio a es: dois pdlos. © aspecto de "Yang" © lado masculino da natureza humana, seu lado racional, ativo, competitivo, cientifico. 0 aspecto "Yin" @ o lado feminino, con descendente, cooperativo, intuitivo, mistico. Se mantivermo: ses dois termos para descrever os aspectos de nossa mente, v: remos que nossa sociedade esta constantemente enfatizando o “Yang” sobre o "Yin", a atividade sobre a contemplag&io, o conhecimen- to racional sobre a sabedoria intuitiva, a competigde sobre a cooperagao, a ciéncia sobre a religido, etc. Além disso, aoin vés de reconhecer que a personalidade de cada homem ov mulher desenvolve-se por interacgao entre os elementos masculino e fe- minino, nos estabelecemos uma ordem rigida em que se supde que todos os homens devem ser masculinos e todas as mulheres femi- ninas. Além de enfatizar o aspecto "Yang" ou masculino, nossa sociedade deu ao homem os papSis de chefia e a maioria dos pri vilégios, reprimindo a mulher. Nesta andlise podemos ir mais longe e dizer que, junto com a mulher a sociedade tem reprimi do todas ae forgae que operam predominantemente "Yin". Para dar alguns exemplos, ela tem reprimido os pretos, os indios ameri- canos, homossexuais, psiquicos, atc. Esses aio grupos de pe soas bem diferentes mas que tém em comm um modo de operagéo predo minantemente "Yin", e nossa sociedade nio lhes permite que se expressem deste modo. Entretanto estamos agora testemunhando o infcio de um tre mendo movimento evolutivo. Como diz o texto chingés: "0 Yang" tendo atingido seu extremo, retrocede em favor do "Yin". £ is to que estamos agora testemunhando. Vemos um intere: crescen, te em relagéo a ecologia, misticismo, fenémenos ps{quicosja re . degcoberta de métodos holfsticos na cura de doengas e preserva gio da saide, e um crescente feminismo das mulheres. Fenso que todos esses movimentos e fendmenos sao manifestagces desta ten dencia evolutiva, desde uma énfase acentuada sobre o "Yarg", pa va um balango entre o "Yin" eo "Yang". Tais tendéncias astio fadadas a se realizarem independentemente de nossa resisténcia. Podemos reconhecé-las e trabalhar com elas ou vivermos frustra dos pelo fato de as resistirmos. £ neste contexto uqe vejo meu proprio trabalho, relacio- nando ciéncia e misticiomo, Vejo a ciéncia como a mani festagao extrema da mente racional e o misticismo como uma especializa- go extrema da mente intuitiva, Ambas sao abordagens totalmen te diferentes, mas complementares, significando que nenhuma de las esta compreendida ou que possa reduzir-se na outra, mas que ambas complementam-se mutuamente e s40 necessdrias para se ob- ter uma figura completa da realidade. No século XX os fisicos tiveram uma influéncia profunda na compreenso da realidade, obtida através do método racional e cient{fico. A exploragao dos mundo atémico e subatémico mos- trou uma limitag&o nfo suspeitada das idéias cldssicas e nos forgou a modificar de uma maneira drastica muitos de nossos con ceitos basicos sobre a realidade. Por exemplo, a aparencia da matéria na fisica subatamica é-totalmente diferente da idéia tra dicional de uma substancia material na fisica classica. 0 mes mo @ verdadeiro para conceitos como espago, tempo, causae efei. to, objeto e im por diante. Estes conceitos sao fundamen- tais para se ter um panorama completo do mundo 4 nossa volta, Com essas transformagdes radicais, uma nova maneira de ver o mn do comegou a emergir, uma viséo fortemente relacionada com a dos misticos de todos os tempos e tradigées. Deste modo a fisi ca moderna eat& tendo contato com um outro estado de conscién- cia: o "Yin", mistico e intuitive. Eu estive pessoalmente interessado no misticismo oriental, na filosofia religiosa do hindufamo, budismo e taolsmo. Mos- trar-vos-ei como a visao destas tradicSes religiosas esti se a proximando da que agora emerge, das teorias da fisica atémica e@ subatémica. Antes de discutir essas semelhangas, descreverei rapidamente a antiga visio da fisica classica que foi modifica da pelas descobertas da fisica moderna. Podemos chami-la de vi s&o ocidental, tradicional do mundo. Esta visio, a mecaniscista, teve sua origem na filosofia dos atomistas gregos do séc. V a.C, Esta escola filosdfica via amatéria como sendo feita de varios blocos constitutivos basi cos, 4 que davam o nome de Stomos, movidos por forgas externas usualmente associadas ao dominio espiritual. A matéria era 6d lida, inerte e totalmente passiva, Assim foi criada uma dicotomia, uma imagem que se tornou sencial ao pensamento ocidental dos séculos subsequentes. Deu origem ao dualismo entre espfrito e matéria, a menteeo corpo, © "Eu" dentro do corpo e o mundo de fora. Este dualiemo foi for mulado em sua forma mais acentuada na filosofia de Descartes, no século XVII. Descartes baseou toda sua visdo da natureza na divisdo fundamental entre dois reinos separados e independen- tes: o da mente eo da matéria. Em decorréneia, os cientistas do séc, XVII viam o mundo completamente separados deles pré- prios, consistindo de objetos que trabalhavam em alguma espécie de maquina imensa, A materia era completamente inerte e inde- pendente da observagao cientifica. Tal vis&o mecanicista do mun do foi apoiada por Newton, que construiu sua mecdnica neseas ba ses filoséficas, estabelecendo o fundamento da ffsica classica. Desde a segunda metade do séc. XVII até o fim do séc. XIX,a vi sao mecanicista newtoniana prevaleceu em todo o pensamento ci- entifico, e este dominio ainda @ forte em nossos dias. Em contraste com a mecanicista, a visio eriental do mundo pode ser descrita e caracterizada por palavras como organica, holistica, ecolégica. Sob tal prisma, o mundo n&o @ conatitul do de objetos separados, mas fundamentalmente inter-relaciona- dos e interconectados. Todos os fendmenos que percebemoe com os sentidos sic tidos como sendo diferentes manifestagses de uma mesma realidade. Nossa tendéncia de dividir o mundo perceptivel em eventos e objetos individuais e de nos vermos como entidades e indivi- duos isolados, provém, dizem os misticos, do intelecto classi- ficador, da mente racional. Esta divisdo € muito til e neces saria no nivel pratito de todos os di No entanto, e: nao. @ uma feigGo fundamental da realidade. Furdmentalmente nao exis tem objetos separados. Para o mistico, cada objeto tem um cara ter fluido e sempre em mudanga, pois depende em grande parte do estado de consciéneia no qual se est& operando. A visao orien tal & sempre dinamica pois contém o tempo e a mudanga como ca vacteristicas essenciais. 0 Cosmos € visto como uma realidade Ansepardvel, para sempre em movimento, viva, orgénica, espiri- tual e material ao mesmo tempo. Tentared agoramostrar-vos como essas caracter{sticas prin cipais aparecem na Fisica moderna, isto &, na Fisica que come- gou no infeio do século com regultados sensacionais e totalmen te inseparados. Naquela época os cientistas penetraram na matéria numa tal extensdo que foram capazes de realizar experimentos com atomos e estudar a estrutura atémica. 0 que acharam foi surpreendente e inesperado. Até ent&o pensavam que os Atomos eram particulas duras e sSlidas: os blocos constitutivos basicos da matéria. Descobriram entdo que os A&tomos consistiam essencialmente de es pasos vazios com um miniisculo niicleo central e elétrons giran- do num espago relativamente vasto ao seu redor. £ muito diffcil ter-se uma idgia da ordem de grandeza dos Gtomos pois elas n&éo s&o tao distantes de nossa percepgdo sen- séria cotidiana que palavras como “extremamente pequeno" ndo des- creve muito bem © quadro. Eu poderia dizer que o diametro de um 4tomo & um centésimo de milionésimo da polegada, mas quando chegamos a ordem de grandeza t4o minGscula perdemos a capacida de de visualizagdo. 0 que podemos fazer sao modelos e analo- gia Para construir tal analogia podemos perguntar quantos 4 tomos existem numa laranja. Todos nds sabemos qual @o tamanho de uma laranja e, portanto, temos uma escala. 0 que faremos en t&o em nossas mentes sera aumentar a laranja até que possamos ver os Stomos. Para uma laranja do tamanho da Terra, os dtomos terao o tamanho de cerejas. Imaginemos toda a terra cheia de cerejas coladas umas as outras. Este € um quadro simplificado de uma laranja e seus &tomos. Agora escolhamos a Terra para o tamanho da laranja, com as cerejas diminuindo em proporgao, e teremos a id@ia de quao pequeno @ um afamo. Um atomo € extremamente pequeno em comparagdo a objetos ma

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