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Garra Vestibular conhecimento é a própria história da busca da

1º ano
verdade.
Filosofia
Cláudio Luís Silvestre O conhecimento
Dá-se o nome de conhecimento à relação que
se estabelece entre um sujeito cognoscente (ou uma
consciência) e um objeto. Assim, todo conhecimento
O que é o conhecimento
pressupõe dois elementos: o sujeito que quer conhecer
Ontem à noite, já em minha cama, de luz
e o objeto a ser conhecido, que se apresentam frente a
apagada, sentindo aquele agradável relaxamento que
frente, dentro de uma relação. Isso equivale a dizer
antecede o sono, entregue a devaneios, quase sonhos,
que o conhecimento é o ato, o processo pelo qual o
fui violentamente trazida de volta à realidade por
sujeito se coloca no mundo e, com ele, estabelece uma
estranho ruído.
ligação. Por outro lado, o mundo é o que torna
Seria uma porta batendo? Alguém teria
possível o conhecimento ao se oferecer a um sujeito
entrado em minha casa?
apto a conhecê-lo. Só há saber para o sujeito cognos-
Algo que caíra lá fora?
cente se houver um mundo a conhecer, mundo este do
O salto de um gato descuidado?
qual ele é parte, uma vez que o próprio sujeito pode
Ou será que minha imaginação teria pregado
ser objeto de conhecimento.
uma peça em meus sentidos quase adormecidos?
Por extensão, dá-se também o nome de
O ruído teria sido real ou imaginado?
conhecimento ao saber acumulado pelo homem
"Como saber?" ou "como conhecer?" é uma
através das gerações. Nessa acepção, estamos tratando
das perguntas fundamentais que vêm perseguindo o
o conhecimento como produto da relação sujeito-
ser humano desde que o homem é homem. As
objeto, produto que pode ser empregado e
respostas têm sido as mais variadas, dependendo da
transmitido.
cultura, do período histórico, do próprio saber
O conhecimento pode ser concreto, quando o
acumulado, do aparato tecnológico etc.
sujeito estabelece uma relação com um objeto
Hoje conhecemos o aspecto das crateras
individual. Por exemplo, o conhecimento que temos
lunares porque temos acesso a várias informações,
de um amigo determinado, com todas as suas
inclusive às imagens transmitidas pelos satélites. Na
características individuais. E pode ser abstrato,
Grécia antiga, algumas pessoas consultavam o
quando estabelece uma relação com um objeto geral,
Oráculo de Delfos quando tinham algum problema
universal. Por exemplo, o conhecimento que temos de
grave. Os egípcios liam seu destino nas entranhas de
homem, como gênero.
pássaros e outros animais. No mundo contemporâneo,
No processo de abstração, o conceito torna-se
há os que jogam búzios, recorrem às cartomantes ou
mais extenso à medida que o conteúdo intuível
ao Tarô. Há os que lêem livros e fazem pesquisas.
(imediato) se torna mais pobre. O conceito de homem,
Como saber qual desses conhecimentos é
por exemplo, é muito mais extenso que o conceito de
verdadeiro? Sempre que nos indagamos a respeito do
amigo, porque o primeiro recobre todo o gênero
conhecimento estamos, automaticamente, tratando do
humano, incluindo homens e mulheres, jovens e
problema da verdade. A história da busca do
velhos, amigos ou não. Além disso, o conteúdo
passível de ser apreendido pela intuição sensível objeto, com interferência mínima do sujeito), lógico,
(conhecimento direto pelos sentidos) esvazia-se, uma através de métodos desenvolvidos para manter a coe-
vez que o conceito de homem "não tem cara, nem rência interna de suas afirmações. A aplicação da
sexo, nem idade, nem cor, nem características de ciência resulta no conhecimento tecnológico.
personalidade" definidas. A filosofia, por sua vez, propõe-se oferecer um
Assim, se de um lado o conhecimento abstrato tipo de conhecimento que busca, com todo o rigor, a
nos ajuda a organizar e compreender um número origem dos problemas, relacionando-os a outros as-
imenso de acontecimentos, por outro ele nos afasta da pectos da vida humana, numa abordagem
realidade concreta. O verdadeiro conhecimento se dá globalizante.
dentro do processo dialético de ida e vinda do Já o conhecimento proporcionado pela arte nos
concreto para o abstrato, processo esse que jamais tem dá não o conhecimento de um objeto, mas de um
fim e que vai revelando o mundo humano na sua mundo, interpretado pela sensibilidade do artista e
riqueza e diversidade. traduzido numa obra individual que, pelas suas
Devemos, ainda, ressaltar que a relação de qualidades estéticas, recupera o vivido e nos
conhecimento implica uma transformação tanto do reaproxima do concreto.
sujeito quanto do objeto. O sujeito se transforma Estes modos de conhecimento serão tratados
mediante o novo saber, e o objeto também se individualmente nos capítulos que compõem esta
transforma, pois o conhecimento lhe dá sentido. Unidade e na Unidade V, Estética.
Modos de conhecer o mundo Conhecimento, pensamento e linguagem
Há muitos modos de se conhecer o mundo, Como essa relação entre sujeito e objeto,
que dependem da postura do sujeito frente ao objeto chamada conhecimento, se manifesta?
de conhecimento: o mito, o senso comum, a ciência, a Todo conhecimento manifesta-se por meio do
filosofia e a arte. pensamento. Pensar é articular signos, ou seja, é ligar
Todos eles são formas de conhecimento, pois ou unir as representações em cadeias.
cada um, a seu modo, desvenda os segredos do O pensamento é concreto quando se utiliza de
mundo, atribuindo-lhe um sentido. imagens visuais, sonoras, olfativas, táteis, cinestésicas
O mito proporciona um conhecimento que é ou de paladar. Quando escolhemos as imagens que
mágico porque ainda vem permeado pelo desejo de farão parte de um filme e as montamos numa
atrair o bem e afastar o mal, dando segurança e con- determinada seqüência, quando articulamos as cores
forto ao homem. sobre uma tela, ou, ainda, quando cantarolamos,
O senso comum ou conhecimento espontâneo procurando os sons adequados para uma composição
é a primeira compreensão do mundo resultante da musical, certamente estamos pensando a partir de uma
herança do grupo a que pertencemos e das expe- determinada linguagem e mostrando um
riências atuais que continuam sendo efetuadas. conhecimento de mundo. Este tipo de pensamento,
A ciência, procurando descobrir o chamado não-verbal, está preso ao mundo sensível.
funcionamento da natureza através, principalmente, Podemos, também, pensar de forma abstrata,
das relações de causa e efeito, busca o conhecimento através de idéias e conceitos mais gerais. Neste caso,
objetivo (isto é, fundado sobre as características do utilizamo-nos de linguagens como as da matemática,
da química, da linguagem verbal, isto é, da própria abstração e com ela elaboramos conceitos e emitimos
palavra, que permitem um maior grau de abstração. julgamentos.
Por muito tempo, considerou-se que o É bom frisar, no entanto, que as linguagens
pensamento só poderia se efetivar através da não-verbais também nos permitem pensar, pois são
linguagem verbal. Kant, filósofo alemão do século articuláveis em signos. O tipo de pensamento, porém,
XVIII, na Crítica da razão pura, diz: "Pensar é é diferente, uma vez que essas linguagens não operam
conhecer através de conceitos". Nos Prolegômenos a por conceitos nem emitem juízos.
qualquer metafísica futura que possa vir a ser
considerada como ciência, ele vai mais longe: "Pensar Exercício
é unir as representações na consciência. {.--) A união
das representações em uma consciência é o juízo. 1. Quais são os elementos que compõe o
Pensar, portanto, é julgar". conhecimento?
Ao identificar pensamento com formação de 2. Por que o conhecimento pode ser abstrato? Dê
conceitos e juízos, Kant liga imediatamente um exemplo.
pensamento e linguagem verbal. Vejamos por quê. 3. Qual é a importância do conhecimento
A linguagem verbal é um sistema simbólico, abstrato?
isto é, um sistema de signos arbitrários com relação ao 4. Por que o conhecimento implica
objeto que representam e, por isso mesmo, conven- transformação?
cionais e dependentes da aceitação social. Tomando 5. Quais são os modos de explicar o mundo?
como exemplo a palavra "livro", percebemos que não 6. Como se manifesta o conhecimento?
há nada no objeto entendido como livro que me leve a 7. O que é pensar?
pronunciar essa palavra. Assim, nosso ato de designar 8. Por que a linguagem verbal é simbólica?
um determinado objeto por um nome (livro) é arbi- 9. O que são as palavras?
trário e, para sermos compreendidos, devemos estar 10. Explique o pensamento não-verbal.
amparados por uma convenção, aceita pela
comunidade dos falantes de língua portuguesa, que LEITURA COMPLEMENTAR
garanta a ligação entre o som "livro" (ou sua forma [Situação cognitiva]
escrita) e o objeto representado. Alguém sabe alguma coisa: é sob
O nome, ou a palavra, é o símbolo dos objetos esta forma condensada que se apresenta
que existem no mundo natural e das entidades toda a situação cognitiva. Antes de nos
abstratas que só existem no nosso pensamento e dobrarmos sobre as modalidades desta
imaginação. Fixa na nossa memória, enquanto idéia, relação e sobre as suas diversas
aquilo que já não está ao alcance dos nossos sentidos, expressões, vamos esforçar-nos por
criando um mundo estável de representações que nos explicitar o que se entende e subentende
permitem falar do passado e fazer projetos para o por esta afirmação.
futuro. Para que haja situação cognitiva, é
A palavra, portanto, transcende, vai além da preciso que a relação seja completa, isto é,
situação concreta, do vivido. A palavra já é uma que haja alguém que saiba alguma coisa.
Por outras palavras, toda a situação como o saber dos animais, ou o dos
cognitiva implica a existência de um ordenadores, só se dizem cognitivas por
sujeito cognoscente e de um objeto conhe- analogia. (...)
cido, unidos por uma relação cognitiva que SCHLAMGER, Jacques. in AMADO,
se exprime sob a forma de um saber. Todo João, GAMA, João e MORÃO, Artur. O prazer
o saber implica a existência de um sujeito de pensar. 11º ano de filosofia. Lisboa,
cognoscente e de um objeto conhecido em Edições 70, 1989. p. 34-35.
virtude de que, para lá das palavras — ou
outros elementos cognitivos — que A partir do texto de leitura complementar
compõem esse saber, há um sujeito que de Schlanger, responda:
conhece, isto é, que domina as palavras, e a) O que é uma situação cognitiva?
um objeto conhecido, a que as palavras se b) Que pólos existem em tal situação?
aplicam. Somos assim levados a afirmar c) Por que a situação cognitiva é
que não pode haver saber fora da situação especificamente humana?
cognitiva, não pode haver saber em si.
Afirmar que não há saber sem sujeito
cognoscente significa que todo o saber é
um ato, uma atividade, e não uma
essência. O saber não subsiste a título de
entidade independente, só por
contaminação é que se fala do saber
contido nos livros. Essencialmente, o saber
é uma certa relação do homem ao seu
mundo, uma certa aptidão e atitude do
homem relativamente ao que existe: do
ponto de vista do homem, sujeito
cognoscente, o saber consiste
essencialmente na atividade cognitiva. É
sobre o homem considerado como sujeito
cognoscente que aqui se põe toda a
insistência, na medida em que se
considera que a situação cognitiva, com o
que ela implica de verbalidade, de
possibilidade autônoma de progresso, de
espontaneidade, de troca, é uma situação
especificamente humana, pelo menos no
estado atual do saber. Outras situações,

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