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Artigo Cargo Julho 2010

Flexibilidade no Trabalho Portuário

A ESPO (European Sea Ports Organisation) publicou recentemente com o apoio do


ITMMA (Institute of Transport and Maritime Managemente Antwerp), da Universidade
de Antuérpia um texto muito importante sobre o trabalho portuário na Europa, enquanto
factor chave de reforma e da competitividade dos portos, disponível no site da
organização.

Um dos temas fundamentais que aborda é a flexibilidade laboral como instrumento


fundamental para que os portos europeus sejam mais competitivos, mostrando o estado
diverso em que se encontram os portos e os países nesta matéria.

O aumento da complexidade das relações entre a procura e a oferta nos portos implica a
necessidade de uma maior flexibilidade do trabalho portuário nas suas diversas
vertentes, que pode ser incentivada com os devidos bónus:

a) Flexibilidade das horas de trabalho – passar de flexibilidade passiva com horários


impostos nos termos legais, para uma flexibilidade activa que atribui maior iniciativa
aos trabalhadores e empregadores;

b) Flexibilidade da quantidade de trabalhadores – possibilidade de adaptar a força de


trabalho às necessidades do porto, com a criação de “pools” de trabalhadores portuários
negociadas e a possibilidade de recorrer às empresas de trabalho temporário em caso de
necessidade;

c) Flexibilidade de tarefas e funções – aposta nas multi-aptidões, na multi-formação e


na multi-funcionalidade do trabalho portuário, facilitando a mobilidade entre funções e
tarefas e entre terminais, evitando falta de trabalhadores numa tarefa, quando há excesso
noutra;

d) Flexibilidade de turnos e de equipas – Possibilidade de afectar o trabalhador à


equipa onde é mais necessário, de mudanças de elementos entre equipas e navios no
mesmo turno, de alteração da composição e dimensão das equipas, dentro dos limites
legais e humanos relacionados com a produtividade;

Tem que se ter em atenção que uma maior produtividade e flexibilidade da mão-de-obra
portuária deve ser acompanhada por maiores salários, como é definido no modelo da
flexisegurança dinamarquês. Quando existem elevados salários num porto, mas a
produtividade e a flexibilidade são reduzidas, o porto enfrenta uma séria desvantagem
competitiva.

Para além dos custos da estiva, vários são os custos das ineficiências da mão-de-obra
portuária em certos portos:
a) falta de trabalhadores em picos que levam a custos de espera dos navios ou menores
produtividades;
b) falta de formação e estragos causados às cargas que provocam custos de
produtividade ou de reputação do porto;
c) greves isoladas ou prolongadas, que causam custos elevados para os portos e para a
economia;
d) alta taxa de acidentes de trabalho devido à falta de formação ou cansaço;
e) absentismo de trabalhadores já afectados a tarefas;
f) falha na comunicação entre o navio e a empresa de estiva ou avaria dos
equipamentos.

Grande número de portos europeus obrigam a que apenas os trabalhadores registados


possam trabalhar na estiva, por imposição do Estado, da autoridade portuária ou de
acordos entre empresas e sindicatos. A reforma desta questão implica habitualmente
uma grande oposição dos sindicatos, o que pode ser considerado uma limitação à
liberdade de movimentação dos trabalhadores na própria União Europeia.

Em alguns portos, o trabalho portuário limita-se às operações de carga e descarga dos


navios na área portuária, enquanto noutros inclui também as operações logísticas
processadas em terra, após a descarga e parqueamento da carga ou antes do embarque.
Em Antuérpia foi criada uma categoria especial de trabalhadores portuários, com salário
mais baixo, para efectuarem as operações logísticas.

Uma grande variedade de classificação dos trabalhadores portuários pode ser observada
nos portos europeus, mas geralmente envolve três elementos:
a) os trabalhadores efectivos com contrato de trabalho com as empresas de estiva;
b) os trabalhadores registados contratados pela(s) “pool(s)” do porto, utilizados pelas
empresas como fonte primária de recursos humanos;
c) os trabalhadores temporários que recebem um mínimo de remuneração para estarem à
espera dos picos de trabalho.

Os esquemas de redução da precariedade da mão-de-obra portuária diferem em duas


vias:
a) no poder dos sindicatos “de facto” para escolherem e controlarem a afectação do
trabalho aos trabalhadores portuários;
b) e nas fontes e níveis de rendimento dos trabalhadores registados que ficam sem
trabalho fora dos picos.

Em alguns casos, os trabalhadores em período sem trabalho recebem rendimentos da


“pool” ou das empresas directamente, noutros recebem do Estado em parte. O
financiamento deste aspecto da “pool” dos portos pode vir das empresas de estiva, do
Estado ou mesmo das autoridades portuárias.

A maior parte das reformas efectuadas nos portos dos países da Europa levaram a
poucas mudanças nos acordos existentes nas “pools”, mas em alguns casos verificaram-
se alterações significativas, designadamente os trabalhadores passaram a ser
directamente contratados pelas empresas operadoras dos terminais, em vez de ser via
“pool”. Por exemplo, na Alemanha e na Holanda as empresas podem contratar
directamente o efectivo do mercado de trabalho, mas o trabalho temporário adicional
tem que vir da “pool”, embora algumas destas”pools” tenham sido privatizadas. Existe a
tendência para a criação de “pools” abertas e autónomas, até mais que uma por porto,
com apoio em último caso das empresas de trabalho temporário gerais.
A ESPO pediu à Comissão Europeia para esclarecer este tema com a aprovação do
princípio “os fornecedores de serviços portuários devem ter total liberdade de contratar
o pessoal qualificado que entendam e emprega-lo nas condições requeridas pelo serviço,
desde que aplicada a legislação de segurança e social”.

Por outro lado, existe uma tendência nos portos da Europa para o trabalho contínuo com
paragens individuais (e não colectivas), horários com início flexível, turnos com tempo
variável, novos esquemas de trabalho extraordinário, turnos nocturnos e trabalho ao
fim-de-semana.

Uma outra questão são as categorias profissionais, para além da divisão entre
trabalhadores permanente e não permanente, mais relacionadas com as tarefas e
funções, a especialização por tipo de carga, as aptidões e formação, a forma como foram
contratados, os planos de carreira ou o treino profissional. Alguns sistemas dão especial
importância às categorias profissionais, com esquemas de mobilidade entre categorias,
outros assentam mais nas qualificações profissionais para a afectação ao tipo de trabalho
mais adequado.

Na Inglaterra, com a abolição do NDLS (National Dock Labour Scheme) em 1989, foi
eliminada a legislação anterior e neutralizados os sindicatos, deixando estes de poderem
fazer greve que não seja devido a disputas com as empresas de estiva, sob pena de os
bens pessoais poderem ser sequestrados em tribunal. Muitos trabalhadores aceitaram as
generosas compensações para redução do efectivo, tendo a indústria portuária britânica
sido revitalizada, de acordo com a ESPO. A maioria das empresas contrata quem quer
para efectivo e conta com as empresas de trabalho temporário gerais para satisfazer os
picos.

Vítor Caldeirinha

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