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Na ponta do lápis

Almanaque do Programa Escrevendo o Futuro


Ano 1
Número 2
Agosto/Setembro
2005
SUMÁRIO
Iniciativa
Fundação Itaú Social
Realização
Centro de Estudos e Pesquisas em Educação
Cultura e Ação Comunitária – Cenpec
ENTREVISTA
“Uma experiência humanizadora”, Coordenação
com a professora Ecléa Bosi Sonia Madi
2 Equipe de edição
RECADO DO LEITOR Luiz Henrique Gurgel (edição de texto e
4 consultoria)
QUESTÃO DE GÊNERO Maria Aparecida Laginestra
Ana Lima escreve sobre o Regina Andrade Clara
texto de memórias Leitura crítica
5 Anna Helena Altenfelder
Maria Estela Bergamin
Marta Wolak Grosbaum
Revisão
Simone Zaccarias
PÁGINA LITERÁRIA
“Uma definitiva presença”, Edição de arte
texto de Bartolomeu Campos de Queirós Eva Paraguassú de Arruda Câmara
6 José Ramos Néto
Camilo de Arruda Câmara Ramos
ESPECIAL
“Crianças escutam memórias e Ilustrações
aprendem história” Suppa
Conceição Cabrini Criss de Paulo
8 Colaboradores
Edileuza Alves Santana, Elizamar de Castro Trajano
do Nascimento, Ivani Alencar, Maria Antonieta
Rizzotti Oliveira, Marina Brant de Carvalho Martins,
Tathyane Fernandes Tudda.
ONDE ESTÁ O FUTURO
Fontes consultadas
“Crianças do Brasil mantêm viva nossa
O lugar mítico da memória – Cláudia Cerqueira do
memória”
Rosário (Morpheus, 2002)
10
São Paulo de Piratininga: de pouso de tropas a
DE OLHO NA PRÁTICA metrópole – O Estado de São Paulo
12 (Terceiro Nome, 2003)
Se bem me lembro – Memórias – Anna Helena
Altenfelder e Regina Andrade Clara (2004)
Portos de Passagem – João Wanderley Geraldi
REPORTAGEM (Martins Fontes, 1991)
“Lembranças que viram história” Revista da Folha – SP-450 – Edição Especial
14 (25/01/2004)
TIRANDO DE LETRA Amigos da Escola – Com vocês as Artes – A arte é
CAPA: ILUSTRAÇÃO DE SUPPA SOBRE SOBRE FOTO ARQUIVO/AE

16 de todos (Cenpec)
Propaganda brasileira – Francisco Gracioso e
HISTÓRIA DE ALMANAQUE
J.Roberto Whitaker Penteado (São Paulo: Mauro
“Foi assim”
Ivan Marketing Editorial, 2004)
18
Convite à Filosofia – Marilena Chauí (São Paulo,
O QUE VEM POR AÍ Ática, 1994)
19 Agradecimentos
Memorial da Propaganda do Mercado Central de
Fortaleza – CE
Escola superior de Propaganda e Marketing ESPM
Contato com a redação
TEXTO VENCEDOR Rua Dante Carraro,68 – São Paulo – SP
CEP 05422-060 – Telefone: 0800-7719310
“Da lamparina à luz elétrica”
E-mail: programaescrevendofuturo@cenpec.org.br
20
COISAS DEALMANAQUE
21
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

E d iittori
oriaal
Uma Mensagem
Reter e guardar o tempo do Cenpec
Em recente artigo publicado na revista
científica Nature, uma das mais prestigiadas
do mundo, cientistas norte-americanos divul-
garam que para cada lembrança específica
A valorização da memória
de um ser humano, é possível que exista um como ferramenta de trabalho não
neurônio responsável por ela. Como cada propõe a volta a um passado crista-
um de nós tem bilhões dessas minúsculas
células no cérebro, talvez isso explique nos-
lizado e acabado, muito menos
sa capacidade de armazenar uma infinidade constitui uma tentativa de priorizar
de lembranças. costumes, tradições e valores de
E o tema principal da segunda edição do
outros tempos.
Na ponta do lápis é a criação de textos de
memória. Crianças de todo o Brasil recolhe- A articulação do passado e do
ram histórias, descobriram antigas novidades
e as mantiveram vivas por meio dos textos presente por meio da memória de
1
que elaboraram. Dessa maneira, fizeram aqui- sujeitos anônimos, protagonistas de
lo que é a própria definição de memória, se-
gundo a professora Marilena Chauí: “a capa-
um mundo que nos diz respeito, pre-
cidade humana de reter e guardar o tempo tende criar um diálogo em que cos-
que se foi para salvá-lo da perda total”.
tumes e valores que fazem parte de
Propondo aos professores o trabalho com
nossa história sejam reconhecidos
esse gênero de texto, o Programa Escreven-
do o Futuro quer aliar práticas de ensino da como integrantes da trajetória pes-
escrita a ações que estimulem a cidadania e soal de cada um. Trata-se de viver
a identidade com o local em que se vive. “É
uma ação humanizadora”, nos disse Ecléa em um espaço de pertencimento, de
Bosi, professora do Instituto de Psicologia da sentir-se enraizado, apropriando-se
Universidade de São Paulo e especialista em
narrativas de memória, em entrevista espe- da herança das gerações anteriores,
cial publicada nesta edição. Outro convida- de modo a reelaborá-la.
do que trata do tema é o escritor Bartolomeu
Campos Queirós, que escreveu história ex- É um olhar diferente sobre nossa
clusiva para a Página Literária, seção das mais realidade, relacionado a um passa-
apreciadas por nossos leitores.
do que nos diz respeito, e que per-
E para os professores que desejarem tra-
balhar com seus alunos esse gênero de tex- mite destacar tempos distintos e cul-
to, as seções De olho na Prática e Tirando turas diversas convivendo, muitas
de Letra trazem indicações e orientações de
especialistas com base nas produções dos vezes, no mesmo espaço. São mani-
estudantes para o Programa Escrevendo o festações vivas, de raízes profundas,
Futuro.
diretamente ligadas aos múltiplos
Também queremos agradecer às dezenas
de cartas recebidas, parabenizando-nos pelo modos de ser hoje.
lançamento do almanaque e indicando novos
conteúdos que serão pensados pela equipe.
Esse intercâmbio com os leitores é a razão Maria Alice Setubal
de ser da publicação. Continuem enviando Presidente do Cenpec – Centro de
suas sugestões, impressões e experiências. Estudos e Pesquisas em Educação Cultura
A todos um bom trabalho e boa leitura. e Ação Comunitária
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

ENTREVISTA ECLÉA BOSI

“Uma experiência humanizadora”


Assim a professora Ecléa Bosi, do Instituto de Psicologia da USP, define as atividades de
crianças com histórias e memórias de idosos. Ela é autora, entre outros, de Memória e
sociedade: lembranças de velhos, um dos mais importantes trabalhos sobre o gênero,
incluído pelo Ministério da Educação entre as cem obras sobre o Brasil que devem compor
as Bibliotecas Escolares Públicas. Desde menina sempre gostou de ler e escutar histórias.
Traduziu autores como Leopardi, Ungaretti, Garcia Lorca e Rosalia de Castro. Ela chama
atenção para o compromisso que se assume com alguém
quando escutamos e registramos sua história de vida: “o
escutador torna-se responsável eticamente pela narrativa e
pelo narrador, não pode abandoná-lo”. Atualmente coordena
o programa Universidade Aberta à Terceira Idade, na mesma
USP. Em sua sala, no Instituto de Psicologia, recebeu nossa
2 equipe para a entrevista.

dessa testemunha é uma narrativa grande em São Paulo, que só essa


em que há susto, emoção. Ainda que narrativa ingênua de uma pessoa ile-
não seja perfeitamente objetiva, traz trada, embora sábia como dona Ri-
alguma coisa profundamente verda- zoleta, pudesse dar idéia do que te-
deira: a emoção que o desastre de- nha sido.
sencadeou e que atravessa a narrati-
va. Em 1910, o cometa Halley atra- Qual a função social da
vessou o céu de São Paulo. Entrevis- memória? De que forma o
Como foi seu envolvimento com a tei pessoas da época e ouvi manei- trabalho com a memória pode
pesquisa de memória? ras diferentes de falar da passagem colaborar para o enfrentamento
do cometa. Qual a verdadeira? Não dos problemas atuais?
Quando eu era criança havia
nos cabe dizer. Uma das entrevista- Depoimentos que você colhe não
uma invasão menor da mídia den-
das, a dona Rizoleta, me disse “Ah! são para serem arquivados. Todo de-
tro das casas, pouca televisão. A
grande distração da criança, além O cometa Halley. Eu vi sim, foi no poimento existe para transformar a ci-
das brincadeiras de rua, era escutar dade em que ele floresceu.
histórias dos pais e avós. Caminhá- Escutar uma narrativa
vamos muito em São Paulo. Eu mo- desencadeia em você,


rava perto da rua Oscar Freire e es- ouvinte, compro-
tudava nos Campos Elíseos, ia e vol-
Escutar uma misso com o nar-
tava a pé. Nessas caminhadas, meus narrativa desencadeia rador. Mais ainda,
companheirinhos pediam que eu um compromisso
contasse histórias, para abreviar o
em você, ouvinte, com a própria ci-
tempo. Quando escrevi Memória e compromisso com o dade em que a
sociedade: lembranças de velhos, narrativa floresceu.
uma tese defendida em 1978, co-
narrador. Mais ainda, um Você é responsá-
meçou em toda parte uma onda de compromisso com a vel. Por exemplo,
no meu caso, eu
pesquisas sobre memória e esses pes- própria cidade em que a
quisadores diziam haver se inspira-
do nesse trabalho. Penso que a ins- narrativa floresceu. Você “ entrevisto pessoas
muito idosas e
piração veio para mim e para os ou- é responsável. sensíveis às trans-
formações urbanas.
tros pesquisadores da necessidade
de um encontro com o passado mais Isso desencadeia um
próximo de nosso tempo. compromisso com o
plano diretor da cidade. Em
Como pensar a história a partir da dia em que o Papa morreu e a terra uma pesquisa que fiz, verifiquei, por
memória de velhos? tremeu.” Sabe-se que nem o Papa exemplo, que a maioria dos idosos
A memória de velhos é diferen- tinha morrido, nem a terra tremido. acidentados na seção de ortopedia
te da história oficial. Os depoimen- Acontece que nenhuma outra nar- do Hospital das Clínicas de São Pau-
tos são cheios de lacunas, diferentes rativa mostra a emoção que se sen- lo não era um caso de médico, mas
da história que se lê nos livros. Você tiu, pessoas se atiraram do viaduto caso de advogado, por causa das
ouve um depoimento de alguém que achando que era o fim do mundo, calçadas da cidade, das casas po-
assistiu a um desastre, a narrativa houve uma convulsão social tão pulares mal construídas...

AS CRIANÇAS ESTÃO PRATICANDO A VERDADEIRA CULTURA QUE É A INSERÇÃO DO PASSADO NO PRESENTE.


NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
Todas as entrevistas e sobre a sua vida, para ela é um ato mais humanizadoras. Eu me lembro
depoimentos são aproveitados? de amizade; e o escutador tem que de uma pesquisa maravilhosa feita
Que critérios a senhora usa para responder a esse ato de amizade pela atriz Lélia Abramo (1911 –
selecionar os melhores com outro ato de amizade. Ele se tor- 2003). Ela trabalhou na Secretaria
depoimentos? na responsável eticamente pela nar- de Cultura de São Paulo com a pre-
Não, nem todos são aproveita- rativa e é um pesquisador diferente feita Luiza Erundina. Foi às escolas
dos. Ou por falhas técnicas ou aci- dos outros porque também se torna públicas municipais e pediu que as
dentes biográficos do idoso, que não responsável pelo narrador e não crianças falassem sobre seus avós.
pode continuar. Não existe uma pode abandoná-lo, ele tem de visi- Eu li as produções. Esse trabalho
narrativa que seja completa. Em mostra o cerne do problema social
certo momento o ouvinte pára do idoso, embora contado por
e o narrador pára, mas a his- crianças muito novas. É uma
tória continua tanto na ca- situação que se reproduz nos


lares. Deseja-se que o ido-
beça do ouvinte como na
cabeça do narrador. A his-
Fazer com que a so ajude a lavar louça, a to-
tória se completa em nós criança procure o tio mar conta dos pequenos,
faça trabalhos por vezes
mesmos e para você regis- idoso, o avô, o velho pesados. Mas se ele quiser
trar uma história de vida
seria preciso um escutador de asilo que ninguém dar um conselho para um
adolescente sobre compor-
infinito. Todos os depoi- mais visita e que se tamento, a escola, a educa-
mentos são bons e mere-
cem o mesmo respeito.
sente banido, ção e o uso do tempo do
Eles não são motivos de
nostalgia, mas de luta para
é uma experiência
“ neto, ele é convidado a se
calar. Do idoso se deseja o
quem merece escutá-los.
humanizadora. braço servil, mas não o con- 3
selho. Ele tem experiência,
Que sugestões e conselhos a tem memória, discernimento
senhora daria aos professores e tudo o que é necessário para
que estão trabalhando o gênero dar um conselho. Por isso fazer
memórias? tá-lo. Estamos recebendo um alento com que a criança procure o tio
Essa pergunta me foi feita tantas da pessoa, as horas, seu tempo de idoso, o avô, o velho de asilo que
e tantas vezes, que eu escrevi no li- vida, ela está nos dando uma coisa ninguém mais visita e que se sente
vro O tempo vivo da memória um preciosíssima. Somos tão responsá- banido, é uma experiência huma-
capítulo sobre isso. O estudioso da veis por ela quanto um amigo é res- nizadora. Embora se fale muito
memória deve ser uma pessoa pre- ponsável pelo outro. dos direitos da terceira idade, o
parada para isso, não basta que co- que acontece é que nós vivemos na
nheça metodologia de pesquisa. Ele No Programa Escrevendo o Futuro época do descartável, do consumo
precisa compreender o depoimento as crianças são pesquisadores da e tal época não é favorável ao ofe-
como um trabalho do idoso, ele não memória e, orientadas por seus recimento da memória, da expe-
pode registrar sem que o idoso te- professores, procuram os idosos riência. Fazer com que a criança
nha conhecimento da narrativa. Por em suas comunidades, ouvem se volte precocemente para a his-
mais simples que seja, esse idoso tem suas histórias e as reescrevem. tória oral contada pelos mais velhos
o direito de reler aquilo que falou e Que importância a senhora vê é uma experiência das mais impor-
ver se está de acordo. É uma ques- nisso? Como avalia esse tipo de tantes. É uma valorização pública
tão ética. Entre todos os conselhos trabalho? do idoso.
de método que eu dou, o mais im- Eu acho que as crianças estão
portante é a responsabilidade pelo praticando a verdadeira cultura que Entrevistadores: Luiz Henrique
outro, porque dada a natureza da é a inserção do passado no presen- Gurgel, Maria Antonieta de
pessoa idosa que faz o depoimento te, as pesquisas das crianças são Oliveira e Cida Laginestra.

Entre as obras de Ecléa Bosi estão Velhos amigos, O tempo vivo Ecléa Bosi e o marido Alfredo
da memória e Memória e sociedade. Bosi

OS DEPOIMENTOS NÃO SÃO MOTIVOS DE NOSTALGIA, MAS DE LUTA PARA QUEM MERECE ESCUTÁ-LOS.
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

RECADO DO LEITOR
Carta Enigmática
N+ – rinho – de

Gerando frutos –p +sa


“Desde que conheci o material pe-
dagógico do Programa Escreven-
do o Futuro, aprendi uma nova me-
todologia nas aulas de produção
textual. Leciono na 5a e 6a séries e
desenvolvo um trabalho com tex-
–v
+h
–p
+r ( )
tos narrativos, em que as histórias
produzidas em sala de aula serão or-
ganizadas para a edição do nosso RESPOSTA NA PÁGINA 21.
primeiro livro de histórias infantis.”
Aucielly de Sousa Melo
Pombal (PB)
4 SABIA
VOCÊ ?
A experiência dos alunos
“O almanaque vai orientar os pro- Para evitar o calote,
fessores no trabalho com a escrita inventaram o selo
em sala de aula. Todas as seções
são interessantes, mas sugiro uma Na Inglaterra, antes da
seção em que os alunos participan- criação dos selos, os
tes do concurso pudessem relatar mensageiros que levavam as
suas experiências na elaboração de correspondências em longas
texto.” viagens a cavalo ou carroça
Irandir Gomes Paiva
deveriam ser pagos pelos
Fortaleza (CE) que recebiam as mensagens. Primeiro selo postal, emitido na
Muitas vezes os destinatários Inglaterra em 6 de maio de
negavam-se a pagá-los. Com 1840, todo preto, com o valor
os selos garantia-se o de 1 penny e a efígie da rainha
Viagem pelo conhecimento pagamento antecipado. Vitória.
“Quando fui convidada a represen-
tar os professores de meu municí-
pio no lançamento do Programa Es-
crevendo o Futuro, nem imaginava Cartas trazem opinião e novos leitores
que naquele momento começaria
uma “nova viagem” em minha vida Os leitores que preencheram e enviaram
como educadora. O programa me as cartas-resposta à redação elegeram
proporcionou e continua proporcio- a seção Página Literária
nando uma viagem pelo caminho do como a melhor da publi-
conhecimento e como dizem meus cação. Em seguida fica-
alunos: “Uma viagem só de ida...” ram Questão de Gênero
Juliana Barbosa Cassimiro e Tirando de Letra.
São Roque (SP) Os educadores tam-
bém indicaram profes-
sores amigos que, a par-
Mestres e aprendizes tir de agora, passarão a
“Vocês nos deixaram muito com
receber as novas edições
que pensar. Nos deram, também, a do almanaque. Se você
tarefa de colaboradores. Vocês já também deseja opinar, fa-
imaginaram os aprendizes ensinan- zer comentários e indicar
do com os mestres? É bárbaro! Sin- outro professor para rece-
to-me honrada de ter sido convida- ber o Na ponta do lápis,
da a dar sugestões no almanaque. basta preencher a
Estou à vontade para sugerir e o carta-resposta,
farei com carinho.” encartada nesta S:
PARA NÓ
Silvia Modesto de Oliveira edição, dobrar, colar e ESCREVA
AR , 68
O
pôr no correio, sem precisar T E CAR R
Camocim (CE) RUA DAN 4 2 2 -0 60
pagar a postagem. CEP 05
LO-SP
SÃO PAU

E A SUA CARTA? DO QUE VAI FALAR?


NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

Questão de Gênero

O gênero Memórias Ana Lima*


Etimologicamente, ‘recordar’ vem de re + cordis (coração),
significando, literalmente, “trazer de novo ao coração algo que,
devido à ação do tempo, tenha ficado esquecido em algum
lugar da memória”. Podemos dizer que, em linhas gerais, é
exatamente essa a função de um texto do gênero Memórias.
U m texto de memórias objetiva resgatar um passado, a partir das
lembranças de pessoas que, de fato, viveram esse passado. Ele repre- Digna de uma deusa
senta o resultado de um encontro, no qual as experiências de uma gera- Protetora das artes e da história,
ção anterior são evocadas e repassadas para uma outra, dando assim musa da poesia épica, Mnemosyne
continuidade ao fio da História, que é de ambas; porque a história de era a deusa da memória para os
cada indivíduo traz em si a memória do grupo social ao qual pertence. gregos, a que conferia imortalida-
É esse resgate das lembranças de pessoas mais velhas passadas conti- de aos mortais. Ela dava aos poe-
nuamente às gerações mais novas, por meio de palavras e tas o poder de voltar ao passado
gestos, que liga os moradores de um lugar. O fato de e de lembrá-lo para a coletivida-
de. O humano que tivesse regis-
entender que a história de alguém mais velho é nossa
própria história desperta um sentimento de pertencer
trado em obras a fisionomia, os 5
gestos, os feitos e as palavras nun-
a determinado lugar e a certa época, e ajuda a au- ca seria esquecido, pois ao tornar-
mentar a percepção de um passado que foi realmente se memorável não morreria jamais.
vivido e não está morto nem enterrado.
Alguém que almeje escrever um texto de memórias tem uma árdua
tarefa pela frente: identificar pessoa(s) que possa(m) realmente contri-
buir para a elaboração do texto, com suas lembranças; realizar uma
entrevista com essa(s) pessoa(s); selecionar e organizar as informações
relevantes coletadas e, finalmente, escrever o texto.
Não podemos contudo esquecer que a entrevista é
um gênero da modalidade oral da língua, e, se foi gra-
vada, certamente apresentará várias marcas da oralida-
de. O escritor de memórias deve estar ciente disso, e
seu trabalho será transformar aquele texto oral em
texto escrito. Além disso, precisa atentar para al-
gumas características específicas desse gênero, que
devem ser atendidas. O escritor, por exemplo, deve assumir a voz da
pessoa entrevistada, ou seja, o texto deve ser em primeira pessoa. Não
se trata de um simples reconto do que ouviu na entrevista, e sim de uma
reinterpretação, que deve resultar em um texto de natureza literária,
narrativo em sua maior parte.
Ademais, em nenhum momento se pode perder de vista
que há um leitor curioso para conhecer o passado, de
modo que o texto deve ser escrito com criatividade, de
tal maneira que esse leitor se sinta envolvido por ele.
Alguns elementos normalmente presentes nos textos de
memórias são as comparações entre passado e pre-
sente, a presença de palavras e expressões que
transportam o leitor para uma certa época do “No contexto mítico, recordar sig-
passado (“antigamente”, “naquele tempo”, etc.), nifica resgatar um momento ori-
referência a objetos, lugares e modos de vida do ginário e torná-lo eterno em con-
traposição à nossa experiência
passado, descrições (se couberem) de lugares ou pessoas e explicação
ordinária do tempo como algo que
do sentido de certas expressões antigas ou de palavras em desuso. passa, que escoa e que se perde.
Enfim, cabe ao escritor das memórias posicionar-se A recordação, como resgate do
como um pesquisador que busca recuperar a memória co- tempo, confere imortalidade àqui-
letiva de sua cidade, e, por meio do seu texto, possibilitar lo que ordinariamente estaria per-
dido de modo irrecuperável sem
que os leitores “tragam para o coração” um passado que,
esta re-atualização.”
mesmo não tendo sido vivido por eles, foi decisivo para que Cláudia Cerqueira do Rosário (trecho
sejam o que são atualmente. de O lugar mítico da memória,
publicado na revista Morpheus, 2002)
* Professora do Departamento de Letras
da Universidade Federal de Pernambuco

TRAZER DE NOVO AO CORAÇÃO ALGO QUE TENHA FICADO ESQUECIDO EM ALGUM LUGAR DA MEMÓRIA.
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

Página LITERÁRIA

Nas lembranças do premiado escritor Bartolomeu


Campos de Queirós, ficou marcada a figura da
professora que lia histórias para ele e seus colegas
numa escola do interior de Minas Gerais. O escritor aos sete anos

Uma definitiva presença


Bartolomeu Campos de Queirós

E la entrava na escola abraçando os nossos E como Dona Maria Campos sabia! Para
cadernos “Avante”. (A sala tinha cheiro de rou- tudo ela tinha uma resposta ou uma outra per-
6
pa lavada. Tudo limpo como água de mina e o gunta na ponta da língua. Dava aulas como se
mundo ficava mudo para escutá-la. Sobre a sua estivesse recitando uma poesia feita de água,
mesa pousava uma jarra sempre com flores do névoa ou nuvem. Eu achava minha professora
mato que os alunos colhiam pelo caminho). Ao mais bonita que os poemas. E não era difícil
abraçar os cadernos era como se a professora decorar os versos e repeti-los depois, no escu-
me apertasse sobre seu coração, me perdoan- ro do meu quarto. Guardava tudo de cor sem
do, com antecedência, os meus erros e acer- esforço.
tos. Eu ainda não lia ou escrevia de “carreiri- E quando ela pegava no giz branco e passa-
nha”. Mas seu olhar foi o meu primeiro livro! Ela va o ponto, no quadro negro, eu mordia a pon-
me acariciava com seus olhos e derramava so- ta da língua esforçando-me para imitar a sua
bre mim uma luz mansa de luar, capaz de alve- escrita. Ela fazia as letras tão bonitas que não
jar meu desejo obscuro de aprender. Seus olhos me bastava apenas copiar: eu desejava apren-
me permitiam a liberdade. Sua presença inteira der também a sua letra. E como me emociona-
me trazia uma paz azul e uma certeza de que o va aqueles “as” redondinhos, aqueles “emes”
futuro era possível. como cobrinhas, aqueles “eles” como orelha de
É que Dona Maria Campos levava nossas coelho espantado.
composições, ditados, cópias, para corrigir em Em meus momentos de calma eu enchia
casa. Eu morria de inveja do meu caderno por páginas e outras páginas com seu nome, o nome
saber que ele conhecia onde a professora vivia. de minha mãe, de meu pai, de minha escola.
Seu lápis, metade azul e metade vermelho, bor- Era minha maneira de ter sempre a Dona Ma-
dava em nossos trabalhos as notas que iam de 0 ria Campos ao meu lado.
a 10. E trazia sempre uma observação: “muito
bom”, “parabéns”, “ótimo”, “mais atenção”, “é E quando escolhido para passar o ditado no
preciso estudar mais”. Eu recebia meu caderno quadro, para os colegas corrigirem o deles, mais
com o coração descontrolado. Parecia que uma eu caprichava na letra.
borboleta tinha vindo morar em meu peito. Ti- O difícil era o quadro não ter linha, pois
nha medo de não corresponder aos seus ensi- seguir em linha reta, sem estrada, dependia tam-
namentos. Não queria que a professora dei- bém do olhar. Mas para alegrar a professora toda
xasse de me amar. dificuldade era pouca. Se ela me elogiava eu

UMA LUZ MANSA DE LUAR, CAPAZ DE ALVEJAR MEU DESEJO OBSCURO DE APRENDER.
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

baixava a cabeça. Por fora muita vergonha e canto. O mundo ficava maior e minha vontade
por dentro um herói. era não morrer nunca para conhecer o mundo
5
7
Nas horas de leitura em voz alta eu não inteiro e saber muito, como a professora sabia.
media esforços. Cada menino lia um pedaço. O livro me abria caminhos, me ensinava a es-
E a professora escolhia alternado. Ninguém colher o destino.
sabia sua hora. Eu acompanhava as linhas do Eu pedia o livro emprestado, depois que
livro com o dedo. Cheio de medo e desejo Dona Maria terminava. Levava para casa e
esperava minha vez. Lia devagar cada palavra, brincava de escola com meus irmãos menores.
obedecendo a pontuação, Assentava com o livro, com
controlando o fôlego. Dona pose de professor, e lia para
Maria Campos dizia que nas eles. Era difícil guardar tan-
vírgulas a gente respirava
e no ponto final dava uma
paradinha.
“ a
Mas para alegrar
professora toda
ta beleza só para mim.
Não sei se gostavam da lei-
tura ou se imaginavam, um
Mas o melhor era quan- dificuldade era pouca. dia, serem alunos da minha
escola.
do ela nos mandava guardar
os objetos. A gente fechava
Se ela me elogiava Meu pai, assentado na
o caderno, guardava o lá- eu baixava a cabeça. escada da casa, prestava
pis e a borracha dentro do atenção na minha leitura,
estojo e esperava com os Por fora muita de maneira despistada.
braços cruzados sobre a car- vergonha e por De noite, antes de dormir,
teira. Assim, ela continuava curioso, ele queria que eu
dentro um herói.
mais um pedaço da histó-
ria. Parecia com a Sant’Ana
da capela com o livro no
” adiantasse um pouco mais
da história. Mas eu não
contava. Sabia que imaginar
colo. Eu não acreditava que fazia parte da leitura.
podia existir outro céu além da nossa sala de
aula. Bartolomeu Campos de Queirós é escritor.
Recebeu os prêmios Jabuti, APCA,
Ficava intrigado como num livro tão peque- Bienal de São Paulo, Fundação do Livro Infantil e
no cabia tanta história, tanta viagem, tanto en- Juvenil entre outros.

FICAVA INTRIGADO COMO NUM LIVRO TÃO PEQUENO CABIA TANTA HISTÓRIA, TANTA VIAGEM, TANTO ENCANTO.
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

ESPECIAL
A Professora Conceição Cabrini analisa as atividades vivenciadas
pelos alunos e os textos produzidos nas oficinas sobre o gênero Memórias,
destacando os conceitos históricos presentes

Crianças escutam memórias e


aprendem história Conceição Cabrini*

 L endo os textos de memó- ram o procedimento de entre-


rias elaborados pelos alunos vista e, de porte dessa ferra-
A vida não é que participaram do Prêmio Es-
crevendo o Futuro em 2004
menta, provocaram a memó-
ria de idosos. Estes, sentindo-
a que a gente viveu, nos damos conta de que em- se provocados, evocaram suas
bora esse projeto tenha como experiências e fizeram emer-
e sim a que a principal objetivo colaborar gir pessoas, lugares, sons, chei-
com os professores no ensino ros que impregnaram suas
gente recorda, da escrita, ele faz mais do que memórias ao longo da vida. Fa-
e como recorda isso: penetra em outras áreas
de conhecimento e constrói
laram de sua infância, de como
era a vida antigamente, descre-
para contá-la. conceitos também de História. veram a cidade onde moraram
Isso acontece principal- e aquela na qual residem atu-
Gabriel Garcia Márquez – mente nas oficinas propostas almente, as mudanças ocorri-


Viver para contar no fascículo Se bem me lem- das, compararam o presente
bro (Kit Itaú de Criação de Tex- ao passado. A partir desses re-
to) em que os alunos aprende- latos as crianças escreveram

O RELATO ORAL É TAMBÉM UMA FONTE HISTÓRICA.


NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
textos como se fossem os en- tórias recriadas não são espe- compreendessem que os epi-
trevistados, tornando-se assim lhos dos relatos ouvidos: elas sódios contados não são os
produtores de memórias do indicam as possíveis mudanças acontecimentos em sua totali-
lugar onde vivem. permeadas pelas novas expe- dade e colocassem em ques-
Recolher memórias propi- riências do viver cotidiano. tão o conceito de “realidade”.
ciou aos alunos a oportunida- Esses relatos também se tor- Essa reflexão permite apresen-
de de compreender que o re- naram tema de conversa entre tar o conceito de verdade na
lato oral é também uma fonte as crianças e seus familiares, explicação histórica, a qual
histórica. Eles também foram vizinhos e amigos. Nesses diá- tem como alimento a memó-
em busca de outras fontes, pro- logos, puderam perceber que ria e seus registros e uma ex-
curaram objetos antigos, foto- as reminiscências não perten- plicação de que a “realidade”
grafias, cartas, registros, os ciam apenas aos entrevistados, é feita de recortes. O discurso
quais entenderam e valoriza- mas foram construídas coleti- histórico é uma verdade e não
ram como importantes docu- vamente no dia-a-dia das pes- a verdade.
mentos históricos. soas que viviam num mesmo Retomando a frase de Gar-
lugar. É por isso que se pode cia Márquez citada no início
Formação do dizer que a memória de um in-
divíduo é constituída na me-
deste texto: a realidade é o que
contamos dela – a verdade é
pensamento mória coletiva. sempre uma versão do real.
histórico Muitas vezes os relatos E nesse eterno contínuo está
9
Valendo-se desses procedi- eram complementados e ques- a vida, ou seja, a história.
mentos, os alunos puderam tionados nas conversas infor-
mais e o professor podia cha- * Doutora em semiótica e ciência
localizar fatos significativos e da comunicação. Autora da
refletir sobre o tempo da vida mar a atenção para o fato de
publicação Ensino revisão urgente
das pessoas que contaram que quem relata seleciona (EDUC) e de livros didáticos.
suas memórias. As entrevistas uma parte da experiência vivi-
possibilitaram aos alunos, por da, dá importância maior a de-
exemplo, verificar se a divisão terminados acontecimentos, Para saber mais sobre
do trabalho, as relações de enquanto outros são esqueci- o tema memória e
poder e o modo de vida (par- dos. Além disso, o narrador, ao história
ticipação do homem, da mu- recuperar suas lembranças,
HALBWACHS, Maurice. A me-
lher, da criança e dos idosos atribui um novo significado aos mória coletiva. São Paulo: Vérti-
nas atividades de sobrevivên- acontecimentos, o que possi- ce, 1990.
cia, os responsáveis pela to- bilita às pessoas construírem FERREIRA, Jerusa Pires. Arma-
uma nova representação dos dilhas da memória. Cotia, SP:
mada de decisão na família,
fatos. Cada ouvinte, por sua Ateliê Editorial, 2003.
assim como a forma de mora- ZUMTHOR, Paul. Tradição e es-
dia e de religiosidade) muda- vez, traduz essas lembranças
quecimento. São Paulo: Huci-
ram ou permaneceram inalte- em uma nova versão do epi- tec, 1997.
rados na sucessão de gera- sódio relatado. BOSI, Ecléa. Velhos amigos.
ções. Com isso, tiveram a base Todos esses aspectos cola- São Paulo: Companhia das Le-
para desenvolver as noções trinhas, 2003.
boraram para que os alunos
imprescindíveis na formação
do pensamento histórico: gru-
po social, tempo e espaço, do- O ensino de História
minação e resistência, perma- No início do século XIX, na França, a História era
nência e mudança, semelhan- dominada pela Literatura e pela Filosofia.
ça e diferença. A pesquisa histórica estava a cargo dos intelectuais
Os textos trouxeram remi- contrários à República, que se preocupavam em
niscências do passado e os alu- contar a sucessão dos reis.
nos puderam perceber que há No Brasil a introdução do ensino de História no currículo
práticas antigas ainda comuns escolar teve como marco o século XIX após a
em seu cotidiano. Com isso Independência. Literatura e História a partir de então
estabeleceram um elo de liga- tornam-se disciplinas independentes, pois a segunda
ção entre o passado e o pre- teria como incumbência explicar a formação da nação
sente e aprenderam os concei- brasileira que se iniciava em 1822. Em 1837 torna-se
tos de permanência e mudan- disciplina obrigatória, seguindo o modelo francês.
ça histórica. Entretanto, as his-

O DISCURSO HISTÓRICO É UMA VERDADE E NÃO A VERDADE.


NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

ONDE ESTÁ O FUTURO

“A narração da própria vida é o


Crianças do Brasil m
Dezoito horas
testemunho mais eloqüente dos andando na mata
modos que a pessoa tem de lembrar.” “Na época que cheguei em
(Ecléa Bosi) Feijó, não havia transporte
terrestre, apenas os
Com base em entrevistas com comboios que transportavam
borracha e
gente da própria comunidade, mercadorias para os
crianças recontam histórias seringueiros. Vim a pé,
de vida restituindo o diálogo depois de caminhar
18 horas por varadouros
entre passado e presente. cheios de lama e perigo, pois passava próximo
às aldeias dos Kaxinawás e os Kalinas.”
Eles mal passaram dos dez anos Aluno: Hiago Briner Barroso da Silva,
de idade. São alunas e alunos de 11 anos, 4a série - Cidade: Feijó – AC
Entrevistada: Dolores Fernandes Barroso, 86 anos
quarta e quinta séries que escreve-
ram textos com histórias e sensações
as mais distantes de suas experiên- Do trem a liturina
cias de vida. “Na época não tinha
Foi durante as oficinas do Pro- carro, era carroça
puxada por bois e
10 grama Escrevendo o Futuro que os
cavalos; as mercadorias
alunos participantes entrevistaram vinham no trem ou na
pessoas de suas próprias localidades, liturina, um veículo
revelando e mantendo vivas histó- que andava nos trilhos.”
rias de brasileiros. Aluno: Kassiopéia Sousa Coelho,
11 anos, 5a série
As crianças perceberam e sele- Cidade: Guajará-Mirim – RO
cionaram situações significativas do Entrevistada: Adelaide
cotidiano dos entrevistados e das co- Leite Carvalho, 83 anos
munidades, trazendo detalhes para
a narrativa que passariam desper-
Anos Dourados
cebidos a um ouvinte desatento. Na
“Vó Lydia contava que
voz de cada entrevistado, encontra-
quando mudou para
ram a reconstrução de um tempo e Goiânia, tudo era diferente.
o sentimento de pertencimento a As casas, as ruas, as praças.
uma comunidade. Na avenida Goiás, as
pessoas costumavam
Meninos e meninas assumiram a
ficar sentadas conversando, enquanto
posição de pesquisadores e transfor- esperavam a jardineira (ônibus).
maram o que ouviram em narrativas Tudo era calmo e as pessoas,
de memórias. mais amigas. Nos finais de semana
os pais levavam os filhos para brincar
no Jóquei Clube. E nos salões do

Mãosnosàsabemobdars ahistór! ias Grande Hotel realizavam-se


as grandes festividades.”
Aluna: Letícia Aparecida R. Silvério, 10 anos, 4a série
O que seus alu Cidade: Goiânia – GO - Entrevistada: Lydia Barbosa

de vida da comunidade? as de Freitas Oliveira, 80 anos

Valorizam a experiência rem das pesso


melhor
mais velhas para conheceem? A arte de fazer
o lugar onde viv carroça
descobrir “Aprendi com o amigo Zé,
O que as crianças podem já falecido. Ele usava o
e contar? tronco do ipê amarelo,
opostas no
Aproveite as orientaçõesopr
uma árvore típica do
A pé era mais
... do Kit Itaú cerrado, para o
fascículo Se bem me lembr4, para planejar varal da carroça ficar mais firme rápido que de trem
criação de texto - 200po“ com sua turma. e mais leve, pois é onde arreia o cavalo.
Para o banco usava o pinho, porque
“Na Várzea Grande ficavam

uma viagem “naquele tem ças do passado, segundo ele ‘afofa o banco’.”
a antiga estação ferroviária e o
‘rabicho’ – espécie de trilho espe
an
Depois de reviver as lems bra escreverem as Aluno: Amâncio José de Lima Neto, 10 anos,
4a série – Cidade: Três Lagoas – MS
onde o trem manobrava para co
convide seus aluno subir a serra. A demora na subid
dores entrevistados. Entrevistado: Manuel José de Souza, 91 anos
serra da Várzea Grande era tanta
memórias de um dos mora contando algumas pessoas preferiam subi
Professor, escreva-nos e depois pegar o trem novament
sua experiência. Aluna: Justine Prinstrop, 11 anos, 5a
Cidade: Gramado – RS
Entrevistada: Selmida Fischer, 90 an

NA VOZ DE CADA ENTREVISTADO, ENCONTRARAM A RECONSTRUÇÃO DE UM TEMPO, DE UM LUGAR.


NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

mantêm viva nossa memória


Jeri, antes dos turistas Ir de cambiteiro para a festa
“Lembro-me de tudo como se fosse hoje. Aqui não “A festa de Reis era a mais animada
existia turista, nem eletricidade. À noite fazíamos de todas. Vinham pessoas da cidade
fogueira para assar peixes e em volta da fogueira e dos engenhos vizinhos a pé, a
cantávamos e ouvíamos dos amigos histórias cavalo ou de cambiteiro – um
sobre a lenda da Pedra Furada, do Serrote pequeno trem, que servia para
e da Pedra do Jacaré. Jericoacoara transportar a cana para a usina
era conhecida como Serrote.” Cruangí.”
Aluno: Juverlan Araújo Cunha, 11 anos, Aluno: Pedro Severino da
5a série - Cidade: Jijoca de Silva, 17 anos, 5a série
Jericoacoara – CE Cidade: Timbaú – PE
Entrevistado: Antônio Entrevistado: Severino
Belarmino de Souza, Correia de Souza, 51 anos
83 anos

13
11
Fogão a lenha, café no bule
“Onde eu morava, tinha uma cozinha de
madeira, um fogão a lenha com chaminé,
sempre aceso, com bule de café quentinho
sobre a chapa. Que saudades tenho do barulho
dos carros de boi passando pelas ruas de terra.
Às vezes, vinham carregados do nosso ‘ouro
verde’, o café, que até hoje impera na nossa cidade.”
Aluno: Guilherme A.
Chagas Silva, 12 anos,
5a série
Cidade: Itamogi – MG
Entrevistado: Vitor Pedro
da Silva, 70 anos

Cinema sem
pipoca e com
bolo de fubá
“(...) no cinema
montado pela
família Zampronha,
na frente da vendinha de ferragens,
não sei o que era melhor, se a tela
de pano molhado para não
incendiar com o calor do refletor
que ficava atrás dela, se o
achocolatado e o bolo de fubá
servido nos intervalos.“
Aluna: Moniele Cristina
dos Santos, 11 anos,
5a série - Cidade:
Nova Granada – SP
Os dengo-dengo Entrevistado:
Cezar Monteiro,
de Santa Catarina 86 anos
“Os habitantes eram,
curiosamente, chamados de
ecial ‘dengo-dengo’ porque na igreja matriz
onseguir tinha um sino que fazia um barulho
da da parecido com dengo-dengo-dengo.
a que Até hoje as pessoas mais
ir a pé antigas nos chamam assim.”
te.” Aluna: Isabela Caroline dos Santos, 9 anos,
a
série 4a série - Cidade: Navegantes – SC
Entrevistada: Adélia de Souza Fernandes,
nos 89 anos

O DIÁLOGO ENTRE O PASSADO E O PRESENTE.


NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

De olho na prática ALMANAQUÊS...

No tempo de dantes
Um dos grandes desafios que o professor Em 1929, um bonde trafega pela
rua Catumbi, no bairro do Belém,
enfrenta em sua prática é ajudar seus alunos a em São Paulo (SP), quando um ele-
escreverem textos de qualidade. O primeiro fante fugido de um circo aparece
no meio da pista. Para espantar o
passo para o êxito desse trabalho é conhecer bicho, o motorneiro aumenta a ve-
locidade e toca forte a campainha.
bem o gênero que se vai ensinar. Sentindo-se ameaçado, o elefan-
Por isso, propomos um desafio: o que você sabe te mete a tromba no bonde, bate a
cabeça na lataria e desmaia. A par-
sobre o gênero Memórias? tir de então a palavra “trombada”
passou a ser usada como sinôni-
mo de acidente, colisões.
Memórias versus memória... 
Você conhece palavras, expres-
1 - O gênero Memórias... sões que marcam o tempo passa-
a - explora o ambiente em que o aluno vive. do? Você pode imaginar o que
b - traz uma abordagem nostágica da cidade. significam? Então dê a “definição”
das palavras abaixo. Não vale con-
c - ajuda o indivíduo a planejar mudanças na cidade onde vive. sultar o dicionário.
12 d - é um meio de articular o passado ao presente – a história de cada
indivíduo traz em si a memória do grupo social a que pertence. Dantes Oitão
Ramona Tramela
2 - Resgatar as lembranças das pessoas mais velhas relaciona- Coreto Ceroula
das ao lugar onde vivem é muito importante para: Janota Anágua
a - conhecer suas opiniões. Pracinha
b - constituir o sentimento de pertencer ao lugar onde vive.
c - saber com exatidão os acontecimentos ocorridos no lugar. Resposta na página 21

d - respeitar todas as informações dos mais velhos.

3 - No trabalho com Memórias, o aluno será colocado no lu- Faz-se a luz


gar do pesquisador que busca recuperar a memória coleti- Até 1829 não havia ilu-
minação de rua em
va de sua cidade, por meio de: São Paulo. Nesse ano
a - entrevista. 22 lampiões, alimenta-
b - pesquisa de livros. dos a óleo de peixe ou
mamona, são afixados
c - observação de objetos contemporâneos.
nas paredes das residên-
d - visita aos pontos turísticos da cidade. cias mais centrais – cabia
aos moradores das casas
4 - Para marcar um “tempo de relembrar”, que é o tempo das onde estavam instalados
memórias, o autor usa: conservá-los e acendê-
a - os verbos no futuro. los. Até então, ninguém
b - os verbos no pretérito perfeito, imperfeito e algumas palavras e saía à noite, a não ser em
expressões. lua cheia. Quem convida-
va os amigos para jantar,
c - a descrição do espaço. hábito disseminado na
d - a evocação dos sentimentos e impressões. época, marcava a refei-
ção para as cinco horas,
5 - Os autores evocam emoções, sentimentos e sensações quan- porque aos últimos rai-
do discorrem sobre o tempo passado. Esse recurso é utili- os de solo povo tinha
zado para: de se recolher.
a - convencer o leitor de sua opinião. Por o carro na frente dos
b - escrever reportagem sobre a cidade. burros
c - mobilizar, enredar e atrair o leitor.
d - revelar os costumes da época.

6 - Ao escreverem memórias, os autores recorrem...


a - aos recursos de linguagem poética: rimas, aliterações e metáforas.
b - à ordenação de fatos ao longo do tempo. Em 1872 a Companhia Carris de
Ferro inaugurou o primeiro sistema
c - à descrição de um acontecimento que presenciaram.
de transporte coletivo de São Paulo
d - à comparação entre o tempo antigo e o atual, evidenciando as (SP): bondes puxados por burros.
diferenças e mudanças ocorridas. Esses veículos, quando em declive,
desciam a ladeira seguidos pelos
Confira o resultado na página 21. burros, enquanto os condutores
equilibravam o veículo no breque.

A IMPORTÂNCIA DA MEMÓRIA PARA A CONSTITUIÇÃO DO SENTIMENTO DE PERTENCIMENTO.


NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

Se bem me lembro...
Fazendo o teste da página 12, você ativou seus conhecimentos sobre o gênero Memó-
rias. É hora de colocá-los em prática. Leia alguns trechos escritos pelos alunos e descu-
bra por que se distanciam dos critérios de avaliação apresentados no fascículo de Me-
mórias do kit Itaú de Criação de Textos.
TEXTO 1 TEXTO 2 TEXTO 3
Título: O lugar onde eu moro Título: O lugar onde vivo Título: Samambaia do Leste
“(...) O lugar onde moro é muito “(...) Moro numa cidade pequena. “(...) Moro em um povoado chama-
legal, a minha vida é só brincar. Antigamente esse lugar era mais do Samambaia do Leste que foi fun-
Quando eu era pequena todo tranqüilo e as pessoas não ficavam dado por um alemão chamado Dr.
mundo gostava de mim principal- preocupadas com os assaltos. Todo Alberto Fritz no ano de 1956. Ele
mente o meu pai e minha mãe. mundo se conhecia e não tinha foi um batalhador por Samambaia
Agora tenho 10 anos e estou fican- violência. As ruas eram de terra e do Leste, criando inclusive a coo-
do grande, moro com minha famí- as crianças podiam brincar de perativa Companhia do Café Alto
lia no sítio. Tenho muitos amigos. amarelinha, mãe-da-rua, pular cor- Noroeste (CCAN). Anos depois, em
Gosto de brincar de correr e de da sem medo. Os mais velhos sen- sua homenagem, a cidade passou
jogar bola com eles. (...)” tem saudade do lugar. (...)” a se chamar Alberlândia. (...)”
13
Se você não conseguir recuperar na memória os critérios de avaliação, leia as observações e
identifique nos lembretes quais correspondem a cada texto analisado.

relata experiências não traz marcas foca o relato foge ao tema,


vivenciadas no presente. temporais ou expressões de uma criança e pois não ressalta aspectos
que indiquem um não evidencia a entrevista do lugar onde vive.
passado distante. com uma pessoa mais
velha da comunidade.

as informações não traz Assemelha-se não traz indícios


da história da cidade não informações que a um relato histórico. da realização de entrevista
incluem as experiências permitam ao leitor com uma pessoa
vividas por pessoas mais identificar a cidade. mais velha.
velhas da comunidade.

Confira o resultado na página 21.

o ma
e é ——
ess——
que—— is adeq—— ——ao
uado ——
 Po r —— —— ——
Um dedo d—— pro
e —— sa
————————
—— ——
nosso objetivo? ————————————
—————————— ——————————
pr op or o de—————— cas próprias
Em——
——
la de
sa—— ——au—— la,—— an——tes——
 Qu ais as característi
——————————
——————————
pa——ra seu s ——
de tex
o —— to—— ——
traba
—— —— lho
—— de——pro——duçã—— —— desse gênero? ————————————
——————————
cisa—— conh er be
ec—— m cular ? Em que
aluno
—— ——s,——o pro——
sor——
fes—— pre—— —— ——
 On de o texto vai cir——
——————————
————————
za ——
re—— da ——
ém—— ter—— cla blicado?
o gê ne——ro ——e ta—— mb—— —— portador será pu——————————
——
—— ——
lev a
ar————ca bo ——————————
ação de——pro——duçã—— o.—— Para—— ——
situ—— ——
Ao pé da letra
—— sor
fes——
é pre
, —— o qu
cis—— e o——pro——
e tra——
ess——
——
balho—— —— ——
——no
co ——r
de—— rre gênero Memória
comp art—— -o co
ilhe—— —— m——sua—— turma —— E você, já trabalhou com o
—— —— com sua turma?
das——oficin as : —————————————— contam histórias
—— —— ——
e —— Leu para os alunos textos que
que—— estam——os
esc endo
rev—— ——est——
do passado, organizou exposiç
ão de fotos,
 Po
—— —— r —— —— ——
? Pes quisou fatos
finali da——de?—————— documentos, obje tos anti gos
to? Co que——
m —— ——
——tex—— —— ——
interessantes do lugar? Ent
rev u antigos
isto
em ——vamo s esc rev er? Quem
—————————— interessantes?
 Pa
—— —— ra—— qu—— —— moradores? Criou ativ idad es
ore——
s leit—— s? ———————— esc rita , con vido u seu s alunos a se
ão sso——
no—— E na hora da
——ser
—— —— rev ista do e retomou
os——be——m o—— assun ou————
to—— colocarem no lugar do ent
 Co
—— —— nh—— ecem
—— ——
com eles a situ açã o de pro duç ão?
mais——
r —— orm——
inf—— açõe—— s? experiência.
am—— busca
os —— Escreva-nos contando sua
——pre——cis —— ——
..
du zir——um—— to do
tex—— ——
nero.
gê—— ——
 Va—— mo ——s pro
—— ——
——

NO LUGAR DO ENTREVISTADO, A CRIANÇA ASSUME A VOZ DE QUEM CONTA A HISTÓRIA.


NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

REPORTAGEM

Professoras Onélia e
Afria contaram
histórias de Campos
Novos

Lembranças que viram histórias


Alunos da pequena Campos Novos Paulista encontram a história da
cidade nas memórias de antigos moradores, transformando relatos em textos e
fortalecendo a identidade com o lugar.
14
Luiz Henrique Gurgel

A luz acabava às 10 rador que fornecia


da noite. Pouco antes, energia à cidade e que
um apito soava pela ci- regulava as atividades
dade avisando que o de seus moradores.
gerador seria desligado Hoje ele se encontra
e tudo ficaria às escu- exposto em praça pú-
ras. As pessoas corriam blica, como um marco
aos lares para não ca- da história sentimental
minhar na escuridão do lugar, monumento à
ou, dependendo da máquina que ilumina-
noite, sob a luz do luar. va Campos Novos.
Dentro das casas, velas Igreja matriz de Campos Novos Paulista Para as entrevistas,
e lampiões eram acesos tarefas que os alunos
e, no terceiro e último deviam realizar em
sinal, a luz era cortada. uma das oficinas, fo-
Histórias como essas, ram escolhidas as pro-
de décadas passadas, fessoras aposentadas
impressionaram as cri- Onélia Magdalena de
anças de Campos No- João, de 79 anos, e
vos Paulista, cidade de Afria Bertoncini Man-
5 mil habitantes no ex- zano, de 68 anos, que
tremo oeste do Estado haviam lecionado no
de São Paulo. Alunos de Professor Theodorico
5ª série da Escola Esta- desde sua fundação.
Escola reunida para a leitura dos textos
dual Professor Theodo- Também foi entrevista-
rico Oliveira entrevistaram an- geu com o Hotel Climático, fe- do o atual diretor da escola, o
tigos moradores, ouviram as chado em 1999, que desde os professor Alcir Magdalena Gi-
histórias e transformaram em anos de 1960 atraía visitantes ovani, de 51 anos. “Eu fiquei
textos a memória afetiva da ci- de várias partes do Brasil, mo- morrendo de medo de alguma
dade, para participar do Prê- tivo de orgulho entre os habi- gozação, dos entrevistados se
mio Escrevendo o Futuro. tantes da cidade. Até hoje, as sentirem mal. Mas desde o iní-
Antiga estância climática, lembranças relacionadas ao cio tratamos do respeito para
localizada entre os rios do Pei- hotel estão presentes na me- com essas pessoas, tanto que
xe e Paranapanema, Campos mória coletiva. Também mar- os alunos selecionaram as per-
Novos Paulista viveu seu apo- ca essa memória o antigo ge- guntas da turma, fizeram um

A MEMÓRIA DE CAMPOS NOVOS PASSOU A FAZER PARTE DA VIDA DELAS.


NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE
roteiro e no dia organizaram funcionava”, disse Silvana,
um café com bolo e bolacha sobre o gerador que operou
para os entrevistados”, expli- até 1961. O hotel também
cou Silvana Barbosa, professo- despertou curiosidade: “as
ra que estimulou os alunos a crianças queriam saber como
participarem do Prêmio. As funcionava, por que as pes-
histórias envolveram os estu- soas vinham para cá”. A mo-
dantes. Terminadas as ques- bilização de todos para co-
tões do roteiro prévio, eles nhecer o passado local con-
continuaram a perguntar. tribuiu para a valorização da
“Nossa cidade é tão pequena Professora Silvana Barbosa
história e da memória da ci-
e os pais não contam as histó- dade e para a construção da
rias para os filhos, eles não co- identidade cidadã dos alunos.
Toda comunidade
nheciam a história de Campos No final do projeto, duran-
Novos”, queixou-se Silvana. A
participou
Ao decidir participar do Prêmio,
te a escolha do texto que seria
entrevistada Afria também fi- enviado ao Prêmio, a escola
a professora Silvana Barbosa,
cou admirada: “É impressio- envolveu seus alunos, as famíli- fez festa e reuniu pais, alunos,
nante o interesse dessas crian- as, a escola e outras pessoas da professores e depoentes para
ças. Parecia que queriam cap- comunidade em um projeto de
uma audição coletiva. O resul-
tar no ar as palavras da gente”. leitura e escrita, no qual os alu-
nos deveriam fazer várias ofici- tado final surpreendeu a pro-
nas até chegar à produção do fessora: “Foi importante poder 15
Identidade e texto final. Ela não imaginava
mobilizar tanta gente. “Quando
trabalhar com eles dessa for-
ma, poder conversar com cada
memória falei sobre o prêmio e contei
todo o processo, os pais já fica-
um, conviver com eles fora da
Histórias do gerador que ram animados”. Em uma das sala. Isso me ajudou, porque
fornecia energia elétrica e era primeiras oficinas, a professora mesmo aqueles alunos que
desligado à noite; o antigo ho-
pediu fotos e objetos relaciona- não escreviam nada no final
dos à história de Campos No- das oficinas estavam escreven-
tel que recebia muitos turis- vos Paulista e às lembranças
tas, agora abandonado e em das pessoas entrevistadas. Os
do. Eu achava que não ia con-
ruínas; os namoros escondi- alunos se mobilizaram e, além seguir. No final, eles vinham,
dos atrás da igreja, entre ou- de fotos, trouxeram utensílios e conversavam, falavam de si
instrumentos de trabalho: penei- mesmos. Isso os ajudou a se
tras histórias, foram temas dos ras de fibras trançadas, enxa-
textos. Antes da redação final, soltarem.”
das, arados, máquinas de cos-
as crianças fizeram um tour tura, ferros de passar roupa à As antigas novidades, não
pela cidade, visitando os pon- brasa, caldeirões e até uma má- imaginadas pelas crianças, re-
quina para debulhar milho.
tos citados pelos entrevista- forçaram os laços com a comu-
O apoio foi tanto que a turma
dos. “Eu mesma não conhe- decidiu montar uma nidade e sua história. Para a
cia, nem meus alunos. Nós já exposição na entrevistada Onélia, “a memó-
tínhamos visto o gerador, mas escola. ria de Campos Novos passou
ninguém havia falado como a fazer parte da vida delas”.

Gerador que fornecia luz à cidade. No detalhe, placa do “marco histórico”

OS ESTUDANTES TRANSFORMARAM EM TEXTOS A MEMÓRIA AFETIVA DA CIDADE.


NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

TIRANDO DE LETRA

Superando obstáculos
Com poucos recursos e muita força de vontade, professora do Pará conta como
envolveu e motivou seus alunos a pesquisarem e produzirem textos de memórias.
Maria do Socorro Braga Reis*
Q uando li na revista Nova rar o grupo para a entrevista. Sem
Escola o quadro que falava do recursos para as gravações, divi-
Prêmio Escrevendo o Futuro, fi- di com os alunos a responsabili-
quei interessada em participar. dade de anotar as respostas dos
Queria encontrar respostas para entrevistados.
reverter a situação de minha tur-
Colher as memórias não foi
ma de 5ª série: um grupo de alu-
fácil, pois as pessoas escolhidas
nos com inúmeras dificuldades
pelo grupo não queriam se des-
em leitura e produção de texto.
locar até a escola. Depois de al-
16 Contei aos alunos que havia gum esforço conseguimos entre-
feito a inscrição no Prêmio Es- vistar três pessoas: o Sr. Nestor
crevendo o Futuro. Mostrei o Gato, de 73 anos, a Sra. Joana
material e expliquei à turma Mecena, de 65 anos, e a Sra.
cada gênero textual. Depois de Faustina, de 71 anos.
uma longa conversa, optamos
O primeiro entrevistado – Sr.
por “memórias”. Propus a pri-
Nestor Gato – brincava muito,
meira oficina. Começava assim
contava piadas, não era o que
um novo jeito de trabalhar. Mes-
Dona Faustina da Silva queríamos. Dona Joana só con-
mo com novos alunos chegan-
Rosário, 71 anos. tava fatos do presente, embora
do e outros faltando (para aju-
houvesse bastante insistência por
dar os pais na roça ou na maré)
parte das crianças. Já Dona Faus-
as oficinas iam fluindo. Eu insis-
tina (Tia Fausta como é conheci-
tia para que não faltassem.
da) nos contagiou desde o pri-
Pedi aos alunos que escolhes- meiro momento, quando come-
sem um dos depoimentos colhi- çou a falar do bairro de Nova
dos na pesquisa e, com base nes- Olinda.
ses dados, se colocassem no lu-
De volta à sala de aula, orga-
gar do entrevistado e escrevessem
nizamos todas as informações.
o primeiro texto de memórias.
Pedi aos alunos que se colocas-
Dando continuidade ao tra- sem no lugar da entrevistada e
balho, lemos o texto da Zélia assim todos viraram “Faustinhas”,
Gattai (solicitei ajuda de algumas escrevendo suas memórias.
pessoas para reproduzir os tex-
tos que foram entregues aos alu- Passei o domingo corrigindo
nos). Também estudamos, nos os textos. Notei que alguns ain-
textos de memória – os que es- da apresentavam dificuldades em
tão ao final do fascículo Se bem empregar os tempos verbais. Fiz
me lembro... – o uso dos verbos as intervenções necessárias e, na
“Faustinhas” escrevendo suas seqüência das oficinas, fui per-
no pretérito perfeito e imperfei-
memórias. cebendo o avanço dos alunos
to e as expressões que indicam
o tempo e a comparação entre (participando mais das aulas, se
acontecimentos do passado e do alunos desconheciam a história colocando no lugar de pesquisa-
presente. e a escola não dispunha de ví- dores, assumindo a preocupação
deo, levei-os até minha casa, de revisar até mesmo os peque-
Contei à turma que há outras
para uma sessão de cinema im- nos textos). Na atividade final de
formas de registrar as memórias.
provisada. reescrita do texto, constatei o
Perguntei se assistiram ao filme
quanto eles aprenderam.
Titanic, cujo roteiro foi elabora- E assim foram acontecendo as
do a partir do relato de memórias oficinas. Mimeografei algumas * Semifinalista em 2004,
de uma velha senhora. Como os dicas com o objetivo de prepa- Augusto Corrêa, PA.

DONA FAUSTINA NOS CONTAGIOU DESDE O PRIMEIRO MOMENTO.


NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

PARA O ÊXITO DESTE TRABALHO,


A PROFa MARIA DO SOCORRO NÃO SE INTIMIDOU:
BUSCOU SAÍDAS E SUPEROU MUITOS OBSTÁCULOS. TANTA
DEDICAÇÃO TROUXE RESULTADO: O TEXTO DE SUA ALUNA
Análise do texto
ROSEANE PINHEIRO DO ROSÁRIO FOI SELECIONADO
ENTRE OS SEMIFINALISTAS EM 2004.
L
embranças de um tempo e lugar, de acontecimentos
testemunhados pela entrevistada Dona Fausta e recriados
pela aluna Roseane em “Ontem alegria, hoje solidão.”
Fazemos dois convites: o primeiro a ler e se emocionar com a narrativa e, depois, a
acompanhar a análise detalhada do texto.

O título sugestivo
Ontem alegria, hoje solidão
————————————————————————
convida à leitura.

————————————————————————
Naqueles tempos a vida passava devagar,
————————————————————————
era um sossego, tudo era tranqüilo, tínhamos
————————————————————————
a alegria, aliás alegria era comum.
————————————————————————
Levantávamos cedo para encher água na cabeceira, depois
———————————————————————————————
íamos lavar as roupas e tomar banho no rio.
——————————————————————————————— 17
O carro não vinha até aqui, ficava na parada Zé
———————————————————————————————
Expressões e Castor. Para ir até Bragança ou tinha que andar muito
———————————————————————————————
verbos no ou ir a pano (canoa) atravessar as maresias.
———————————————————————————————
pretérito
imperfeito
Notícias eram tão distantes de nós, a não ser as do
———————————————————————————————
marcam povoado: uma mulher que paria, uma moça que fugia.
———————————————————————————————
o tempo Os anos passavam devagar e nós aproveitávamos o luar, as
———————————————————————————————
passado,
tempo de
brincadeiras de roda, lembranças do bombaqueiro, sapatinho
———————————————————————————————
relembrar. branco, brincadeira do anel, tudo girava em torno da alegria.
———————————————————————————————
A comida era farta, muito peixe, caranguejo, ostra, Experiências
——————————————————————————————— relatadas na
Adjetivos e siri. Podíamos escolher do tamanho desejado. A vida
——————————————————————————————— primeira pessoa
advérbios corria livre, sem grandes barulhos, a não ser os músicos do
——————————————————————————————— do plural mostram
enriquecem Sereno, que nos faziam correr pulando numa grande dança. o sentimento de
——————————————————————————————— pertença à
a descrição.
A maré enchia, a maré vazava e nós sempre tomando
——————————————————————————————— comunidade.
banho no rio, às vezes ouvíamos um ralho, um cipó que
——————————————————————————————— A primeira pessoa
do singular traz a
O autor evoca teimava em nos marcar.
——————————————————————————————— voz e marca a
emoções e Como era simples viver sem correrias, ouvindo os
——————————————————————————————— história pessoal
sentimentos
do tempo pássaros, os gritos da Matinta-Pereira. Os grandes
———————————————————————————————
do entrevistado.
vivido, que morcegos rasga-mortalha faziam-nos tremer de medo nas
———————————————————————————————
envolvem noites escuras.
o leitor. ———————————————————————————————
Em Nova Olinda era assim. Hoje com a chegada do
———————————————————————————————
A comparação
ônibus as coisas não são as mesmas, a energia elétrica
———————————————————————————————
do tempo transformou as pessoas, nem se brinca mais, todos assistem
———————————————————————————————
antigo com à televisão, é uma correria das motos e os meninos estão
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o atual
evidencia cada vez mais malcriados. A alegria deu lugar à solidão.
———————————————————————————————
diferenças e Somos ainda uma comunidade pequena, no entanto existem
———————————————————————————————
mudanças tantas mudanças que parece que o tempo é outro. Não se
———————————————————————————————
ocorridas
no lugar. conversa mais, todos estão ocupados demais em suas casas.
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Da minha porta sentada fico pensando, por que tantas
———————————————————————————————
mudanças? Isso era para ser exclusividade dos camaleões.
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Sem netos para alegrar os meus dias, sinto-me cada vez
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mais só, solitária com as minhas lembranças.
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Roseane Pinheiro do Rosário, 11 anos, 5a série, semifinalista em 2004.


E.M. André Alves, Augusto Correa (PA)

NAQUELES TEMPOS A VIDA PASSAVA DEVAGAR.


NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

HISTÓRIA DE ALMANAQUE

Foi assim...
Era uma manhã fria do mês de agosto. Abri a janela do
meu quarto e olhei para uma quaresmeira da praça. Lembrei-
me da minha infância, quando havia muitos prédios que com o
passar do tempo foram demolidos. Não ouvíamos músicas pela televisão, nem
18 pelo rádio. Havia um coreto no largo da praça onde, aos sábados e domin-
gos, lindas músicas eram tocadas. Os casais iam lá “trocar olhares” (naquela
época era namorar). Quantos olhares troquei. Os ciprestes da praça eram
cortados em formato de instrumentos musicais. Havia um canteiro de flores
com as iniciais J.S., do Prefeito José Sureti e com o nome da cidade Nova
Resende, destruído pela rivalidade política. Aranhas e Caranguejos eram
partidos políticos rivais da época. Um banquinho era o símbolo da vitória
política: quando colocado do lado de cima da praça, vitória dos Aranhas;
do lado debaixo, vitória dos Caranguejos.
Recordo-me do dia da inauguração da luz. Era uma manhã ensolarada.
Um morador antigo, o Quincas Neto, ficou encarregado de hospedar em
sua casa a banda da Ventania, vinda da cidade vizinha com o mesmo nome.
A banda executava as canções, quando os políticos da situação, os Ara-
nhas, resolveram subir até a rua dos políticos derrotados, os Caranguejos,
para a inauguração da Casa da Luz.
Naquela época a cidade era dividida mais ou menos ao meio: da casa do
senhor Rosendo Gonçalves de Rezende para cima, eram eleitores e políticos
dos Caranguejos. Dali para baixo, dos Aranhas.
Recordo-me como se fosse hoje, apesar de esse fato ter ocorrido há mais
ou menos 75 anos. A banda, junto com os Aranhas, percorria um pequeno
trajeto até a Casa da Luz. Quando iam se aproximando, a banda foi
interrompida por um grito do senhor João Gaspar (caranguejo) que estava
acompanhado por outros amigos.
— Daqui para cima não passam!
Nesta hora o senhor Tonico Araújo respondeu:
— A banda da Ventania não passa, mas eu passo!
Dona Zota, uma moradora da cidade, vendo a confusão, tentou
impedir. Quando o primeiro tiro foi disparado, acertou a perna dela.
ARANHAS E CARANGUEJOS ERAM PARTIDOS RIVAIS DA ÉPOCA.
NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

As pessoas tentavam se salvar como podiam: mães protegendo seus filhos,


pessoas gritando, músicos se enroscando nos instrumentos. O tocador de bum-
bo tinha dificuldade para correr com seu instrumento. Naquele desespero,
falou aos berros:
— Desgraçado, vai para um lado, que eu vou para o outro.
O bumbo rolou rua abaixo, como se atendesse às ordens do dono.
Papai nos colocou para dentro de casa e eu escutava o zumbido das balas.
De repente, o sino da igreja Matriz soou e voltei aos dias atuais. Tenho
84 anos e faço um pedido: zelem por essa praça que foi e sempre será a sala
de visitas de nossa querida Nova Resende.

Beatriz Cristina B. Cardoso tem 10 anos e participou do Programa Escrevendo o Futuro em 2004, sendo orientada por sua 19
professora Eneida Evangelista Silva Pereira na 4a série da E.E. Padre Luiz Moreno, em Nova Rezende – MG.
Seu texto foi escrito a partir da entrevista com dona Edite Sales, de 84 anos e moradora à praça Santa Rita, em Nova Rezende.

O que vem por aí

Capacitação de professores Virtualmente


unidos
ação presencial
Já começaram as ações de form Na segunda qu
inzena de agos
das secr etarias estadu- entra no ar a to
de professores e técnicos Comunidade
para o Prog ram a Escrevendo o Escrevendo o Virtual
ais de educação Futuro, nova fre
m os primeiros
Futuro. Ceará e Pernambuco fora de comunicaç
ão na internet
nte
oco rrido s na primeira professores do com
Estados a realizar os cursos, Brasil. Podem
ago sto, aco ntec em ações cadastrar todo se
quinzena de junho. Em s que participa
rina, Pará e Goiá s. Cap acita ções em do Programa ram
em Santa Cata Escrevendo o
o prog ram adas. Futu-
outros Estados também estão send ro. Troca de ex
periências, pl
rrem enco ntro s de avali- jamento de aç ane-
No mês de setembro oco res ões para o di
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ação no Ceará in- aula; bate-pap
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lizad as com as data s, loca is e in- formações e , in-
traz notícias atua links sobre pr
ação. áticas
formações sobre as ações de form de ensino da
Língua Portugu
notícias sobre esa;
projetos e even
educacionais tos
; indicações
vros e filmes de li-
estarão dispon
24 horas por íveis
dia.
www.escrevend O endereço é
oofuturo.org.b
r

Mais uma conquista: Top Social ADVB – 2005


O Programa Escrevendo o Futuro, iniciativa da Fundação Itaú Social, recebeu
em 22 de junho o Prêmio Top Social – 2005 da ADVB (Associação dos Dirigen-
tes de Vendas e Marketing do Brasil).
Dos 232 projetos inscritos, 31 foram premiados. Essa premiação reconhece e
divulga práticas de ações socialmente responsáveis desenvolvidas pelas or-
ganizações do terceiro setor.

DE REPENTE, O SINO DA IGREJA MATRIZ SOOU E VOLTEI AOS DIAS ATUAIS.


NA PONTA DO LÁPIS – ALMANAQUE

Texto vencedor do prêmio Escrevendo o Futuro em 2004

Da lamparina à energia elétrica


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O sítio da vovó Valdenice fica em São João de Iracema, num lugar muito
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bonito e, o melhor de tudo , é que é pertinho da cidade. É para lá que eu vou aos
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finais de semana. No sábado passado, eu resolvi ir ao sítio à noite. Eu já tinha
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atravessado a porteira quando, de repente, a luz se apagou..., mas pernas pra te
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quero! Ao perceber que eu tinha medo de escuro, vovó caiu na risada e resolveu me contar sobre a
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sua infância, onde apenas uma lamparina e a lua brilhante iluminavam a singela casa de pau-a
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pique onde morava com sua família. “ O escuro não me amedrontava, só incomodava um pouco na
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hora de ir na privada que ficava afastada da casa: eu tinha receio de cair no buraco.”
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Eu nasci e fui criada na nossa pequena e sossegada São João de Iracema, mais precisamente
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onde o Judas perdeu as botas, na calorenta região Noroeste do Estado de São Paulo. Antigamente,
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nossa cidade era conhecida como os “Os Poços”, devido aos boiadeiros que aqui passavam para
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20 abastecerem-se de água e refrescarem-se do calor do sertão agreste.
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Na vila, a criançada só cuidava de duas coisas: brincar e aprender. Eu nunca mais consegui
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me esquecer do dia em que a ranzinza da professora me colocou ajoelhada em cima dos grãos de
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milho e me deu dois tapas na orelha. Que dureza era estudar naquela época!
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Nas ruas de terra esburacadas eu me sentia livre e feliz. Divertia-me jogando terra em quem
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passava, depois caía na gargalhada. Como naqueles tempos todo mundo era amigo de todo mundo,
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as————————————————————————————————————————————————
caras feias eram raras. Quando eu sentia o cheiro bom da comida feita por mamães no fogão à
lenha, ia correndo para casa encher a barriga. Que delícia!
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O tempo foi passando devagar, pois aqui até o vento sopra lentamente... A vila foi virando
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cidade e as casas de pau-a pique foram sendo derrubadas e substituídas pelas de tijolos. Os moradores
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faziam mutirão para ajudar. Em 1966, eu já estava com meus doze anos, quando a cidade
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acordou diferente: para meu espanto e de toda população a energia elétrica havia chegado! Foi um
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alvoroço, era o fim das lamparinas! Mais do que depressa o meu pai Ezequiel fechou a barbearia
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e————————————————————————————————————————————————
foi o primeiro morador da cidade a ir até Fernandópolis comprar um liquidificador e uma
televisão. A casa dos meus pais tornou-se a novidade do momento e ficou movimentadíssima: toda
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hora os vizinhos queriam usar o liquidificador para bater sucos e assistir à televisão.
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A danada da televisão era em branco e preto e só pegava um único canal. Quando ela resolvia
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sair do ar o pessoal ficava vendo listras por um tempão, nem colocar bombril na antena resolvia.
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Meu pai faleceu bem velhinho e em homenagem ao morador antigo, o nome Ezequiel Pinto
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Cabral foi colocado na rua onde eu passei a minha infância, bem em frente à
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praça da igreja matriz. ”Encho-me de saudade toda vez que passo por essa rua”.
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Após abrir o seu coração vovó emocionada me disse:
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_ Ӄ, minha neta. Apesar de ser do tempo da lamparina, eu jamais poderia
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esquecer as recordações que ficaram na minha mente até hoje”.
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Nós sorrimos e ficamos abraçadas por um longo tempo. Desde
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então, perdi o medo do escuro e percebi que apesar da minha cidade ser
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simples e pequena no tamanho, com seus um mil oitocentos e cinqüenta habitantes,
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ela é grande no meu coração e inesquecível na mente dos moradores.
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Texto escrito por Tarine Silva Ribeiro, de 10 anos, aluna da 4a série da


E.E.Professora Joanita B.B. Carvalho, São João de Iracema (SP),
a partir de entrevista com Valdenice Cabral Minales Satin, de 51 anos.

A LUA BRILHANTE ILUMINAVA A SINGELA CASA DE PAU-A PIQUE


COISAS DE ALMANAQUE

A alma do negócio desde 1500


Há quem diga que o primeiro anúncio feito no país foi escrito por Pero Vaz de Caminha em
1500. Sem utilizar imagens, a carta que enviou ao rei de Portugal exaltava as qualidades de
nossa terra – águas, florestas e animais sem fim –, omitindo desvantagens: os donos da
terra não queriam entregar o patrimônio e, ainda por cima, boa parte deles era de canibais.
Mas a propaganda funcionou e os portugueses resolveram ocupar o Brasil.
Do mero anúncio à moderna propaganda que seduz consumidores, dita modas, costumes e
idéias, a publicidade brasileira é considerada uma das melhores do mundo. Na ponta do
lápis selecionou alguns anúncios, reclames e propagandas que apresentam a evolução desse
tipo de comunicação no Brasil.

Em 1865, a Viação Rio Grande


apresentava seus serviços com o
Em 1919, a máquina de escrever era
desenho de uma bela e confortável
equipamento de última geração nos
carruagem para atravessar a serra
escritórios. No Brasil, até o começo da
entre São Paulo e Santos, no litoral.
década de 1990 ainda eram comuns.
A revolução causada pelo computador
as transformou, do dia para a noite, em
peças de museu. Crianças de uma
escola paulistana que viram uma
máquina de escrever elétrica recostada Nos anos de 1940, enquanto boa
num canto da secretaria espantaram-se parte do mundo estava em guerra, a
com a novidade: “Veja, um computador propaganda ajudava a criar hábitos
sem tela que já vem com impressora”. novos como o uso de creme dental.

No início do rádio no Brasil, os programas


aceitavam qualquer anunciante. Na
década de 1930, no Programa de Ademar
Casé, o compositor Nássara bolou texto
Do final do século 19 até as primeiras para um laboratório farmacêutico. O
décadas do 20, farmácia ainda se locutor, de voz empostada, apresentava o
escrevia com “ph” e os remédios reclame: “Um casal de noivos brigou. E
eram preparados no próprio ele, arrependido, quis fazer as pazes e se
estabelecimento. aconselhou com a sogra, pois a noiva
estava irredutível. Sugerido um presente,
comprou-lhe jóia caríssima. Não fez efeito.
RESPOSTAS Deu-lhe um casaco de peles. Não fez
CARTA ENIGMÁTICA (p.4) efeito. Então, lembrou-se de dar a ela um
Nosso passado é nossa história. (Borges) vidro de Manon Purgativo... Ahhh! Fez O ator Carlos Moreno é recordista
MEMÓRIAS VERSUS MEMÓRIA... (p.12) efeito!!! Manon Purgativo, à venda em mundial: primeiro garoto-propaganda
Resposta: 1-d , 2-b, 3-a, 4-b, 5-c, 6-d
todas as farmácias e drogarias”. do planeta a trabalhar para uma
PÁG. 13:
Texto 1 – , , e mesma marca durante vinte e cinco
Texto 2 – e anos seguidos, entre o final dos anos
Texto 3 – , e de 1970 até a década de 1990.
ALMANAQUÊS (p.12)
DANTES: antes, antigamente.
RAMONA: marca de grampo para prender cabe-
los.
CORETO: pavilhão erigido em praças ou jardins
públicos, para concertos musicais.
JANOTA: pessoa bem vestida, elegante.
PRACINHA: soldado da Força Expedicionária Bra-
sileira que lutou na Itália na II Guerra Mundial.
OITÃO: alvenaria, construção.
TRAMELA: peça que gira ao redor de um prego
para fechar porta, porteira.
CEROULA: tipo de cueca.
ANÁGUA: espécie de saia íntima que as mulhe-
res usavam sob o vestido. Em tempos de ditadura militar (1972), a propaganda não podia ficar atrás:
usava imagens e slogans que agradavam ao regime político.
AÇÕES DE FUTURO
Em 2005, o Programa Escrevendo o Futuro
amplia as atividades de formação para profissionais de
educação.

Comunidade
Virtual
Portal na internet
exclusivo para os
25 mil professores
de todo o Brasil
que participam do
programa. Além das
informações e dicas
sobre o ensino da
língua, educadores
poderão conversar e
trocar experiências
em tempo real.

Almanaque Formação de Educadores


Na ponta do lápis
Um almanaque com
informações sobre o
programa, gêneros de
textos trabalhados com
os estudantes, análise Programa de oficinas e cursos
de especialistas e ministrados pelo Brasil por formadores do
entrevistas. Cenpec, em parceria com as secretarias
estaduais de educação, sobre o ensino de
língua portuguesa com gêneros de textos.

Informe-se pelo telefone: 0800 – 7719310


Ou acesse as páginas
www.fundacaoitausocial.org.br
www.cenpec.org.br

Iniciativa Apoio Parceria Realização

Ministério de Educação

Conselho Nacional de
Secretarias de Educação

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