PEDRO GUILHERME ACCORSI LUNARDELLI
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ISENCOES
TRIBUTARIAS
‘Sao Paulo - 199973
IV - A Iseng&o Tributaria
IV.1 - O Significado da Express&o “Exclusao do Crédito Tributario”
Prevista no CTN. A Isencao e a Anistia
Inclinamos nossas ateng6es, agora, para 0 propésito de desvendar o
significado normativo do art. 175 do Cédigo Tributario Nacional, vazado nos
seguintes termos:
“Art. 175. Excluem o crédito tributario:
I- aisengo;
TI - a anistia.
Pardgrafo tinico. A exclusdo do crédito tributdrio nao dispensa o
cumprimento das obrigagGes acessérias, dependentes da obriga-
Ao principal cujo crédito seja exclufdo, ou dela conseqiiente”.
Um primeiro ponto deve ser ponderado.
Contém este dispositivo fendmenos normativos diametralmente dis-
tintos, muito embora estejam contidos em um nico contexto gramatical.
Verifique-se que “exclusio do crédito tributario” est4 englobando
tanto 0 caso da isengio, quanto o da anistia, cujo pressuposto, segundo o
prescrito no art. 180 daquele mesmo Diploma, € 0 cometimento de infra-
Ges, ou seja, a realizagao de um ilicito.
Tal situagdo poderia causar espécie se j4 de antemfo nao estivésse-
mos avisados de que 0 contexto sintdtico-semAntico-normativo nao coinci-
de com o gramatical, sendo esse apenas 0 indice tematico para a devida in-
quirigao daquele.
Dessa feita, cumpre ao hermeneuta, em face da estrutura da norma
juridica completa - norma priméria dispositiva + norma primdria sanciona-
toria + norma secundaria - ir saturando os respectivos categoremas com as
significagdes que extrai dos enunciados normativos postos no sistema juri-
dico.
Assim, a construgao das normas jurfdicas dependera das proprie-
dades retiradas daqueles enunciados e, ainda, do modo como serao organi-
zados os conjuntos de elementos relacionados aos aspectos dos respectivos
antecedentes e conseqiientes das mencionadas normas juridicas.74 IsencOes TRIBUTARIAS
Examinando-se, entao, o previsto no inciso I, do art. 175 do CTN,
somos surpreendidos por concepgées de crédito tributdrio bastante distin-
tas daquelas observadas nos t6picos anteriores, atreladas ao direito subjeti-
vo de o fisco exigir a prestagdo tributdria.
Temos aqui duas concepgées, quais sejam, uma que se vincula &
norma tributdria geral e abstrata, e outra que se liga a relacao jurfdica isen-
cional, derivada de norma de isengdo geral e abstrata, cuja pertinéncia ao
ordenamento jurfdico sustentamos haver.
Vejamos a primeira. Se, por exemplo, as propriedades componentes
da significagao dos enunciados normativos nao permitirem ao intérprete a
construco de conjuntos aptos a preencher todos os categoremas da norma
juridica, a concepgao de “exclusao de crédito tribut4rio” estar4 voltada para
as modificagées havidas apenas no 4mbito da norma tributdria geral e abs-
trata.
Com efeito, imaginemos a situagdo prevista no inciso VI, do art. 5°,
do Regulamento do IPI, aprovado pelo Decreto Federal 2.637, de 25.06.98,
segundo a qual nao se considera industrializac&o a manipulagdo em far-
mdcia, para venda direta ao consumidor, de medicamentos oficinais e ma-
gistrais, mediante receita médica.
Abandonando a escrita do direito positivo, nem sempre apegada aos
cuidados que a anilise cientifica exige, terfamos o fenémeno normativo isen-
cional avangando sobre o critério material da norma tributdria geral e abs-
trata, particularmente sobre o verbo que lhe da sentido, para empregar-lhe
nova roupagem, de modo que de tal industrializacgZo nao mais configuraria
suporte fatico suficiente para ensejar 0 evento tributdvel que daria ensejo a
relagdo do imposto sobre produtos industrializados'.
Sustenta a doutrina de Paulo de Barros Carvalho que tal fenémeno
normativo produziria efeitos exclusivamente na esfera da norma tributéria,
em um ou varios de seus aspectos, sempre modificando parcialmente sua
estrutura.
No exemplo supra mencionado, haveria alteragdéo do aspecto mate-
rial, por forga da modificagao de seus critérios conotativos, pois a operacio
de aviar medicamentos para consumidor, mediante receita médica, deixa-
ria de figurar no conjunto dos respectivos elementos da norma tributéria.
A isengao, portanto, seria norma de estrutura, intrometendo modifi-
cago no dmbito da regra-matriz de incidéncia tributdria, esta sim, norma
de conduta*.
' Paulo de Barros Carvalho, Curso de Direito Tributdrio, p. 332.
? Paulo de Barros Carvalho, Curso de Direito Tributdrio, p. 329.
Peoro GuitHeRMe Accors! LUNARDELLI 75
Particularmente, arriscamos dissentir desta respeitavel opiniao, por
entender que a norma de isengao poder4 apresentar-se também como nor-
ma de comportamento, atingindo diretamente a conduta do particular. To-
das essas questdes, estaremos expondo no tépico seguinte.
Por ora, fiquemos com 0 registro de que, segundo essa vertente dou-
trindria, o significado de “exclusao do crédito tributdério”, de acordo com o
art. 175, inciso I, do CTN, apontaria para aquelas alteragGes ocorridas nos
aspectos da regra-matriz tributaria.
Vé-se, assim, que a concepgao de crédito tributario no mais diz res-
peito ao direito subjetivo de o fisco exigir do contribuinte a prestagao tribu-
téria, porquanto, ocorrendo 0 encontro de norma tributéria e de isengao, ain-
da no seu estado geral e abstrato, nfo estaremos autorizados a falar em evento
€ respectiva relagao juridica e, conseqiientemente, nas respectivas relagdes
de crédito e débito tributario.
Exclusao do crédito tributdrio seria, assim, 0 fendmeno juridico da
ndo-incidéncia, ou conforme nossa concepgdo, uma incidéncia fraca, de-
corrente da modificagao da norma tributdria geral e abstrata.
Vejamos, agora, a concepgdo com que mais nos afeigoamos, segun-
do a qual exclusao de crédito tributdrio refere-se a uma relagao juridica en-
tre fisco e particular, portanto, atrelada a uma norma de comportamento.
Abordaremos aqui apenas um exemplo que constitui a aplicagao dos fun-
damentos doutrindrios expostos no tépico subseqiiente.
Considerando ent&o que nosso indice tematico do direito positivo
permite-nos adequar significagdes aos componentes de uma estrutura juri-
dica, advird daf a prefalada regra-matriz isencional, com compostura sintd-
tica semelhante & da regra-matriz tributdria, cuja hip6tese descreverd abs-
tratamente a concretizacdo de um evento, implicando o conseqiiente que, por
sua vez, conter a prescrigao, também abstrata, de um efeito, uma relagao
juridica isencional.
Como se vé, hé semelhanga formal entre tais regras-matrizes, no
correspondida, todavia, quando abordamos 0 respectivo vetor semantico.
Uma norma tributdria, cujo antecedente preveja a futura concretiza-
¢40 da conduta “X”, implica o conseqiiente, no qual teremos uma relacdo
juridica entre fisco e contribuinte.
Em tal relagdo, crédito tributario corresponder4 ao direito subjeti-
vo de o fisco exigir a prestagao tributdria (esté permitido exigir), contraposto
ao débito tributdrio do contribuinte, que denominamos dever subjetivo de
cumprir a prestagio (esta obrigado a prestar).