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Dentro desse espírito e com o intuito exclusivo de colaborar com aqueles que têm
legalmente a competência para a realização desses ajustes, trazendo-lhes à colação alguns anos
de vivência na área, teceremos alguns comentários sobre a contratação de serviços não
enquadrados como de engenharia, em vista das disposições da Lei nº 8.666/93.
No Capítulo I, o diploma legal em questão trata, na Seção III, que engloba desde o art.
7º até o art. 12, DAS OBRAS E SERVIÇOS; na Seção IV, DOS SERVIÇOS TÉCNICOS
PROFISSIONAIS ESPECIALIZADOS; na Seção V, DAS COMPRAS; e, finalmente, na Seção
VI, DAS ALIENAÇÕES. É exatamente a Seção III que aqui abordaremos, por nos parecer um
dos pontos da Lei que precisa, em prazo curto, ser revisto, de forma a evitar dificuldades que vêm
surgindo, com freqüência acima da desejável, na sua aplicação.
E é assim que, de uma forma mais ampla, a Lei vem sendo interpretada e aplicada, não
só por aqueles que com ela lidam nas suas tarefas de rotina, como até mesmo pelos órgãos de
controle de contas. Poucos são aqueles que ousaram discordar desse posicionamento, até porque,
por estarem sujeitos ao controle, preferem simplesmente agir da forma como este orienta.
No entanto, a análise mais cuidadosa de cada um dos artigos que compõem a Seção III
deve conduzir a um resultado que é, no fundo, bastante diferente desse posicionamento,
mostrando, a toda evidência, que o legislador teve a intenção de ali tratar exclusivamente das
obras e dos serviços de engenharia, como procuraremos demonstrar a seguir.
O caput do art. 7º define a seqüência a ser adotada nas licitações que objetivam essas
contratações, falando, então, em projeto básico e projeto executivo. Trata-se, como sabem os
mais afeitos ao assunto, de terminologia adotada, de longa data, na área da engenharia e nela
praticamente com exclusividade; somente após a promulgação da Lei nº 8.666/93 é que se passou
a ver o emprego desses termos para todos os outros serviços, nos quais, até então, usavam-se
expressões do tipo "especificações", "descrição dos serviços" etc.
Para definir o que é projeto básico, o legislador foi mais extenso e o fez no inciso IX
do art. 6º, utilizando-se de seis alíneas. A leitura dessas alíneas mostra, de forma insofismável,
que o legislador está ali tratando, de forma exclusiva, de trabalhos na área de engenharia. Veja-se
que todas essas alíneas são dirigidas à realização de obras: "desenvolvimento da solução
escolhida de forma a fornecer visão global da obra..."; "soluções técnicas globais e localizadas
... e de realização das obras e montagem"; "identificação dos tipos de serviços a executar e de
materiais e equipamentos a incorporar à obra..."; "informações que possibilitem ... condições
organizacionais para a obra..."; "subsídios para montagem do plano de licitação e gestão da
obra..."; "orçamento detalhado do custo global da obra...". Apenas na alínea "b", além de obra,
o legislador fala em montagem. Todas as demais referem-se exclusivamente às obras.
Pergunta-se, então: onde estão os demais serviços, os serviços que não são de
engenharia? Como elaborar, então, um projeto básico e um projeto executivo para serviços, por
exemplo, de limpeza, se o próprio texto legal diz que esses projetos referem-se somente às obras?
Ainda mais: no mesmo parágrafo, o legislador diz que as obras e serviços só poderão
ser licitados quando o produto delas esperado estiver contemplado nas metas estabelecidas no
Plano Plurianual de que trata o art. 165 da Constituição Federal. Evidentemente, o Plano
Plurianual não trata dos serviços comuns, rotineiros, como os de limpeza já citados, mas
tão-somente dos investimentos a serem realizados pela Administração Pública, como as obras
e serviços de engenharia.
Poderíamos continuar analisando artigo por artigo da Seção III e, em todos eles,
encontraríamos, sempre, indicações claras, evidentes, de que se referem, única e exclusivamente,
às obras e serviços de engenharia, como, só para citar mais um exemplo, as expressões
"empreitada por preço global", "empreitada por preço unitário", "tarefa" e "empreitada integral",
todas elas de uso corriqueiro entre os profissionais de engenharia e, invariavelmente, pouco
utilizadas nos demais serviços.
Tudo isso leva a uma conclusão que parece tão evidente que se torna indiscutível: a
Seção III da Lei nº 8.666/93 aborda, exclusivamente, as obras e serviços de engenharia. Somente
para esses trabalhos são dirigidas as disposições ali inseridas. E onde estariam, então, no texto
legal, as exigências relativas aos demais serviços, serviços outros que não sejam de engenharia?
A conclusão a que se chega é a de que esses outros serviços simplesmente não constam do texto
legal, estando aqui uma das falhas da Lei, que precisa ser corrigida.
É hora, pois, de se corrigir essa falha da Lei. Tantas e tantas vezes a Lei nº 8.666/93,
desde o início de sua vigência, foi alterada por medida provisória. Pois bem, essa é uma situação
de efetiva urgência, que justifica plenamente a utilização desse instrumento legal para corrigir
um problema que vem sendo criado para o real exercício da Administração Pública, sempre
voltada aos interesses da coletividade. A introdução de uma nova seção, a VII, no Capítulo I,
tratando, aí sim, das licitações para os OUTROS SERVIÇOS (complementando, ainda, o título
da Seção III, que passaria a ser DAS OBRAS E SERVIÇOS DE ENGENHARIA), é um desafio
que se impõe e que merece ser enfrentado urgentemente, de forma a regularizar esse tipo de
contratação, evitando os problemas que, com uma freqüência indesejável, surgem entre os
aplicadores da Lei e os representantes dos órgãos de controle.