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PATRICIO, Patricia Helena Santos Souza '- UPMG GT: Didatica / 0.04 Agencia Nao contou com financiamento “De fades 0¢ professores qe deisaram em min alguma marca. 0 fet competéncia & 0 mais chega e voce percebe que a praia é dele, eu paro 0 que eu estou fazendo, desde adolescente até aimatnente Da mesma forma como 0 cara que mio demonsia confang € como se ele etvesse me ddanto ua icenga para ders A competéncia ai, ndo é puramente intelectual niio, € a competéncia intelectual associada aquela Sensacto que agente tom quanto o professor poe o pé ma sla eo epago ¢ ele. St esas dias Cosas a competencainetecual ec competenctade administra do espago" (Aten, 2002) 1 - Contextualizagao do trabalho Por que alguns docentes envolvem seus alunos na compreensio dos contetidos, ¢ outros nao? O que caracteriza esse professor considerado bem-sucedido? De quais naturezas sio 0 recursos internos de que dispdem os professores e que desenham sua competéncia? Tais, questées deram origem ao argumento deste trabalho, que ao analisar a pritica de Atena e Apolo, apontados por seus alunos como professores brilhantes; “deuses” ¢ competentes; buscou construir um referencial de andlise desses saberes que possa contribuir para a compreensio e problematizagio dos fundamentos que sustentam a formagio docente. Desta forma, apresento os fatores que geram sucessos na perspectiva da atuaglio desses professores, tentando identificar a natureza de seus saberes. [As pesquisas sobre formagao de professores tém destacado a importincia de se analisar & pritica pedagégica como algo relevante, opondo-se, assim, as abordagens que procuravam separar a formagiio e a pritica cotidiana. Na realidade brasileira, embora ainda de uma artir da década de 90 que se buscam novos enfoques ¢ forma um tanto timida, € a p pedagdgicos ¢ ara compreender a pritica pedagdgica e os saberes paradigmas pi ado/aprendido, Nesse contexto, epistemoldgicos relativos a0 contetido escolar a ser ensin: e os saberes docentes surgem, mormente, na as pesquisas sobre a formagio de professores gbgica do Colégio Santo " Mestra, professora de Didatica substituta da FAE/UFMG e coordenadora ped ‘Agostinho. Produgao intelectual inter nal, mento de 18 que utilizam a al internaci i q mi 7, com desenvolvimer ido: ilizam uma abordagem teéri “srico-metodolog eo \ctodoldgica que dé voz ao professor, a partir da andlise de su: Segundo Né 902" as ‘6voa (1992), esta nova abordagem veio em oposigao aos estudi 10S estudos anteriores que ai re \abaram eduzit i Por reduzir a profissiio docente a um conjunto de competéncias ias € técnicas, ‘as, gerando uma cri i crise de identidade dos professores em decorréncia de uma separaga Paracdo entre o eu profissional e eu pessoal Considei ido a relagdo di cs igo do professor com o saber, a tese central de Mello(1982) passa, hesse momento, pela eténcia técnica do professor, vist . . a como mediaga pela defesa da competéncia té fe vis Te através da qual i se realizari . oe ealizaria © sentido politico da educagdo escolar. Nestes termos, @ competénc . ” técnica env como o s ‘ ‘olveria tanto 0 dominio dos contetidos de ensino pelo professor, eu entendi a ee mento a respeito das relagdes entre os varios aspectos da escola, -se 0 pes fi " Peso da formagao sobre o modo como percebe a organizagdo da escola € os resultados de sua ago © enco idi ntro cotidiano entre professores ¢ alunos em sala de aula, com o objetivo de construit ci truir 0 conhecimento, envolve uma série de fatores que vao determinar tanto a qualidade da aprendizagem como a qualidade da formagio mais ampla das criangas € jovens que freqiientam a escola. A sala de aula é pois, um espago privilegiado de aprendizagem, ndo somente para o aluno, mas, também para o professor. Considerar as falas desses alunos em relagio as priticas de seus professores € mais um recurso rico para ¢ desenvolvem ou incorporam um diseurso que, de uma certa forma, ribuindo para o repensar do trabalho analise. Os aluno: fornece dados para uma avaliagio das aulas, conti escolar. Dentre as falas? dos alunos, citarei os registros mais relevantes: ssor consegue prender a atengdo da turma ¢ transmitir 0 conteiido de forma nio com as atualidades ou com o di amigo da turma, E tem paciéncia par “Um bom profe monétona & relacionando-o m deixar de ser ‘a-a-dia. Ele respeita 0 aluno como pessoa ca explicar novamente e também exige respeito, $e ue ocaluno traga e que ndo se prenda ao ivro" ‘a matéria ou algo extra q oud, Chevallard, Fourquin, Tardif, entre outros isa de eampo, em conversas informals com alunos do Et somo Névoa, Perret 2 através de autores C4 im extraidos de pes ste conteudos forar Médio. in care ate sabe como ensinar de mantra criatvae que fa com gu o al apreseme Ineresse ensign Wt 08 climes em difcutdaes qe sibaa hora de brinca, mos qe sana anon Esses depoimentos levam-me a refletir sobre um contetido importante que nao esté nos Surriculos escolares, mas sim, no fazer de cada professor, levando-se em consideragao seu Teferencial tedrico e cultural, suas erencas, seus hdbitos, sua Personalidade, enfim, sua Subjetividade, © que faz 0 diferencial no momento da sua atuagtio: - Por que alguns docentes envolvem seus alunos na compreensio dos Contetidos, ¢ outros nao? Afinal, como Pergunta Pimentel (1994), ensinar & uma ciéncia, um conjunto de técnicas ou uma arte? do profissional da Essas questdes voltam a tona sempre que se pensa a competéncia téc educacao. A teflexo aqui apresentada pretende alimentar a compreensio acerca dos recursos de que dispoem esses professores considerados bem-sucedidos, a fonte de aquisiglo desses io de conhecimentos. Tecursos, articulando-os a uma nova concepgaio de escola e de aq Por entender que cada profissional se forma através de seu empenho e de seus recursos, a formagio € tinica, tendo suas caracteristicas peculiares. Portanto, neste artigo nfo trato de definir um roteiro de como fazer ou dever-ser, mas sim, promover uma socializagao de Priticas que tém “dado certo” no contexto definido, percorrendo ¢ observando-se 0 caminho de origem dessas praticas. 2 — Siio Deuses os Professores? Os mitos, ensinados desde cedo As criangas, estavam profundamente enraizados na cultura grega e, particularmente, na literatura, na arte e na filosofia. Sua importancia ultrapassou até mesmo a Grécia e os séculos que nos separam dos gregos. Neste contexto, utilizo como recurso literaério, uma espécie de metafora que considero oportuna pela sua relaco com esta pesquisa. Trata-se de associar essa situago 4 vivida pelos Deuses gregos que, por serem considerados divindades, eram enaltecidos por todos, 0 mesmo acontecendo com os professores citados nesse artigo que so chamados de Atena e Apolo. Apolo, na mitologia grega, era considerado uma figura complexa e enigmitica, que transmitia aos homens os segredos da vida e da morte. Nessa pesquisa, Apolo, o professor de Fisica, 6 igualmente enigmatico, reconhecido pelos seus alunos pela capacidade de Prender a atengio dos mesmos com um simples estalar de dedos, pritica comum em suas aulas. Apolo relata algumas caracteristicas profissionais e pessoais que fazem com que seus alunos tenham um desempenho muito bom em sua disciplina e, aliado ao bom desempenho, um excelente relacionamento professor-aluno. “Bom, primeiro sao os experimentos, depois os desafios! Eles falam que eu sou gente boa. Acho que é como eu avalio, acho que eu sei como considerar um trabalho, dar atengdo & idéia do trabalho, isso ai eu acho que destaca, é notério, porque um desafio para nds, é fazer uma avaliacdo condizente com 0 que foi tratado em sala, até mesmo porque minhas aulas sao mais movimentadas e como fazer uma prova para medir se 0 aluno aprendeu? E a ssdio, para mostrar-Ihes que eu fiz a avaliagdo ndo como um instrumento de pres avaliagdo por uma questo de ferra-los, de descontar pontos na disciplina. Outro perfil que eu acho que o professor tem que ter é saber controlar a disciplina: a conversa tem um certo grau de necessidade, ndo pode ser totalmente calado, mas nao pode ser balburdia (...) tinha uma turma com muita afinidade. Eno, ficavam brincando mesmo, e depois me chamavam para a avaliagao, ¢ um deles citou uma coisa assim — E 0 tinico professor que prende a atengao de todo mundo, ai vem Ié, 0 tinico professor que conseguia zoeira, palavras deles, com 0 aprendizado eficaz ¢ consegue brincar na hora certa ¢ cobrar seriedade na hora certa, e isso & muito dificil, até eu chegar a fazer isso, quase dois anos de convivéncia, e mesmo assim com muito euidado. E quando precisava parar, parava e eles percebiam. Mas, é essa brincadeira, esse estar do lado, quando eu falei de avaliagdo como uma coisa que eu i até que ponto eu consigo, mas para eles, para me ” Apolo procuro sempre fazer, néio se pre dar a impressio de que eu estou do lado deles. diferenciar, & se (2002) 5 Apolo esboca, detalhadamente, domais, enfatizo alguns Suas caracteristicas que o fazem se destacar dos © sim, Pontos: @ avaliagdo para ele ndo é um momento de acerto de contas, uma oportuni hea * oPerttinidade do aluno demonstrar tudo 0 que aprendeu, inclusive porque ele, lo, es: Polo, esclarece que a prova tem que ser um retrato fiel da aula. Essa concepgao, a meu ver, is professores der € uma caracteristica que os demai: \ima pratica de avaliagtio formativa ¢ processual. Outro -veriam incorporar, por se tratar de Ponto €a maneira com que ele lida Som disciplina, Parece-me que nao existe um grande rigor, mas uma cumplicidade, que & Su# Pereepsio do papel do professor, nllo como um mandante, mas como um orientador. Nese momento eu me perguntei em que ponto de sua formagio ele aprendeu e/ou descobriu esses modelos. Passo, nesse momento, a falar de Atena. jegundo a Mitologia Grega, Atena é a deusa da Vitoria © do combate, mas também da sabedoria, protetora da vida politica, das ciéncias artes, A ela eram consagradas a coruja e a serpente, e também o galho da oliveira. Atena, a professora de Histéria, + aproxima-se da caractetizada pela mitologia, pela sua sabedoria, e para seus alunos Atena € reconhecida como “aquela que sabe muito de Histéria e que hipnoti @ todos os alunos”, “ninguém pisca quando ela esté falando” diz um grupo de alunos do 1° ano do Ensino Médio. “Eu ndo dou conta, pelo menos cons cientemente, de fazer nada mal feito, qualquer coisa que eu fago, isso é uma caracteristica negativa, mas eu tenho que tentar fazer 0 methor possivel. Se eu tivesse que dar aula, ndo passava pela minha cabeca que a aula pudesse ser ruim, ela tinha que ser uma aula boa, de preferéncia tinha que ser a methor aula.” (Atena,2002.) Como professora, ela mantém a mesma exigéncia com seus aluno: “Sou rigorosa e exigente! Na minha aula tem que calar a boca, tem que sentar direito, nao pode colocar o pé em cima da carteira, coisas desse tipo: eu sou exigente na postura, na disciplina, e sou exigente em provas, trabalhos, Portugués correto e capricho.” (Atena, 2002) Ao contririo de Apolo, Atena é muito severa com seus alunos. A principio, nao gostava de adolescentes, até que um dia ela se lembrou de como ela era nessa época de sua vida e Sentiu desejo de chegar perto para compreendé-los, mesmo porque, sem essa aproximagio a aula nao aconteceria. 3- Referencinis teéricos da formagao docente Dentro da importante produsto de trabalhos focalizando os “saberes” ou “conhecimentos” do professor, ressalto a diversidade conceitual e metodolégica das pesquisas, © essas diferentes classficagdes e tipologias dio uma idéia da diversidade de enfoques e do evidenciando 0 reflexo da expanstio do campo, ecletismo presente em algumas pesquisas, n '© qual os pesquisadores buscam langar luzes sobre as diferentes facetas, aspectos, caracteristicas, dimensoes, “Aracteristicas, dimensdes, ete. que envolvem o ensino e os saberes dos professores. Considerando duas hipéteses de natureza da competéncia e da transposigao didatica como facilitadores do trabalho docente, Develay(1995) afirma que, tanto numa pedagogia que valoriza a ago de ensino por parte do professor, como aquela em que o professor & visto como um mediador da aprendizagem dos alunos, sempre existem contetidos a serem apropriados. Esse dominio pelo professor dos conteiidos a ensinar implica ir além do seu wento do que cle chama “competéncia de conhecimento, tornando necessario o desenvolvit natureza epistemolégica” — dominio da matriz disciplinar (Develay, 1995, p.12), ou de Procedimentos de transposigao didatica (Chevallard, 1991). Os processos de transposigao didatica’, ou seja, a passagem do saber sabio, de referencia ou cientifico, ao saber ensinado, que 0 distingue do saber de considerando que hé uma especificidade em sua constitu referéncia, considera o conhecimento escolar, embora tenha sua origem no conhecimento ago, rarefagaio ou distorgdo desse cientifico ou em outros saberes, nao & mera simpl conhecimento. E um conhecimento com ldgica propria que faz parte de um sistema didatico 0 resultado da transposigao didtica - pode ser objeto de estudo cientifico através — proces de uma epistemologia propria (Chevallard, 1991, p.14). fa pela primeira vez por Verret, em ‘ \do Forquin (1992), a nogao de transposigdo didatica foi enuncia pr pees Les ‘Temps Ge Etudes, Gefendida em 1975, na Franga. Posteriormente ¢ Chevallard(1991) estudaram a questo da transposigdo didatica na Matemética. utros, - E um conhecimento pessoal experimental, quotidiano, intuitivo, do tipo que leva a Pessoa a agir sem saber como age, em concepg: 40 oposta a da racionalidade técnica, Perrenoud analisa, com base em Piaget, a nogdo de competéncia uti izando 0 conceito de avaliagdo, decisto ou de acto; existem no estado estrutura de ago. Perrenoud(1996) utiliza, Bourdieu(1987), esquemas operatérios de percepgio, Portanto, nfo sio Pritico (1996,p.137). Os esquemas sto a também, Tepresentagdes: sao outra coisa, © conceito de habitus, de como sistema de esquemas de que dispde um ator. A referéncia & formagao do habitus justifica-se por hipdteses relacionadas a priticas docen ites que regulam @ nossa relagdo com o tempo, Com 0 espago e com os outros, e que escapam largamente A nossa consciéneia e que, também, nio se apéiam em uma aprendizagem oriunda de um Nesse caso, como enfatiza Perrenoud (1997), curriculo escondido no sentido mais forte curriculo formal, pode-se falar de um da palavra, sendo a nogao de curricul lo escondido, No seu sentido restrito, referente as condigSes ¢ as rotinas da vida escolar que regularmente Seram aprendizagens desconhecidas. No caso do habitus, a aprendizagem € duplamente rmacaio do habitus, mas os do se desconhece apenas o papel da escola na 0 is funcionando escondida: é ‘ a ii ientes, réprios esquemas que o constituem permanecem parcialmente inconscte! num estado puramente pratico. 3.1- Os saberes docentes segundo os professores “bem-sucedidos As propostas educativas atuais tém provocado um clima de diividas incertezas sobre a Pritica docente que acarreta 0 movimento de busca de novos caminhos para a docéncia e, Porque nao falar, de um novo sentido para este trabalho. Ser professor hoje é conviver com incerteza, agindo na urgéncia ¢ fazendo novas escolhas, “porque as certezas nos a nos diz Atena. E na busca de novos caminhos que o trabalho docente se abandonaram”, ref i . {az © que © cotidiano dos professores se movimenta, em contraponto com a rotina que enrijece © que nao permite criar novas possibilidades. Nessas mudangas, aprende-se izagdo intuitiva, autodidata, seguindo a rotina dos outros. A mediante um processo de so construgdo de novos modelos de ensinar motiva e desafia. Porém, os professores sentem-se angustiados pela necessidade de mudanga, que desinstala, criando incertezas, Participando de uma reuniao pedagégica no campo da pesquisa, ouvi de um professor de tenho medo de softer da sindrome da desisténcia, um mal que vem \eertezas e das indmeras demandas de Geografia o seguinte: “. acometendo muitos dos professores por causa das As vezes chego a pensar que eu nao sei mais dar aula”. mudanga nas prati Os saberes docentes sdo plurais, compésitos, heterogéneos, pois trazem a tona conhecimentos e manifestagdes bastante diversificados ¢ provenientes de fontes variadas, as quais podemos supor, também, que sejam de natureza diferente. Noutras palavras, 0 Jo é um conjunto de contetidos cognitivos definidos de uma vez por saber dos professores todas, mas um processo em construgdo ao longo de uma carreira profissional, na qual 0 professor aprende, progressivamente, a dominar seu ambiente de traballo, ao mesmo tempo em que se insere nele ¢ 0 interioriza por meio de regras de aydo que se foram parte integrante de sua “consciéncia pratica”. Fago mengdo novamente a essa definigao porque da competéncia dos professores. penso ser esse 0 pice do entendimento “ Por exemplo, do co: “Passer essa mater nhecimento da sua m Passar a matérign » complementando que esse *jeito de @sté associado a um modelo de pr : fessor que tiveram, e nao se referem Pensar nas disciplinas lecionadas nos Cursos d nada: Uursos de Formagao docente (Pedagogia, licenciatura ster da Unive Em en isa, po “revista com os sujeitos desta pesquisa, pdde-se idemtticar que aos seus saberes, eles Se referem de vérias maneiras. Para dar voz.a esses sujeitos, quando relatam suas histo de vida, de formasao e de profissio, S Pontuando suas rotinas e entusiasmando-se com investigacoes e descobertas de novas idéias, transerevo fragmentos de suas entrevistas para caracterizar seus saberes, por meio dos contetidos de seus discursos. Aten as de sustentacAo da pi ‘Eu tive alguns suportes que funcionaram realmente como colunas de sustentagao até que eu conseguisse criar minha prética. Em primeiro lugar, esse suporte foi a minha paixao pela histéria, em segundo lugar eu tive pelo menos um grande exemplo que, na minha cabeca era um excelente exemplo de professor. Foi o meu professor de Portugués, no Ensino Médio. Ele é 0 individuo mais competente que eu conheci. Ele conhecia portugués profundamente, sabia latim, ... além disso, era um individuo que tinha um ar um pouco formal, mas ao mesmo tempo ele era capaz de se tornar intimo de nds alunos, ele era capaz de transmitir a idéia nitida de que para ele cada um de nds era importante, sabe? Ele tinha um jeito de olhar, uns gestos... eu pelo menos era * Utitizo com abundincia a fala dos sujeitos para caracterizi-los e, principalmente, para trazer @ tona conteidos de andlise sobre seus saberes. Transcrevo as falas respeitando 0 padrio da oralidade para nio perder a naturalidade dos conteiidos, bem como sua personificagio. E necessério esclarecersinda, que no temos a intengdo de fazer um trabalho formal de andlise do discurso por nio ser este 0 recurso metodol6gico escolhido. vida dele, e isso tinha yrque eu gostava de fazer convencida que ele gostava de mim, que eu fazia diferenga na uma forca, porque eu estudava para as provas dele nao $6 po? Portugués, ndo sd porque eu queria aprender, ndo sé porque eu tinha que vestibular, mas eu tinha vergonha de fazer wma prova dele e tirar una nota baixa. E ele era muito exigente. Entééo na hora que eu entrei na profissdo, ele me aparecelt como modelo que eu quero, eu quero ser como ele!” (Atena, 2002). A Polo, também se refere a um modelo de docéneia que se diferencia dos demais ¢ que € referencial de competéncia: ‘Mas um que é inesquecivel é 0 professor de Fisica que tive na faculdade: ele deu aula para mim seis periodos dos oito, e eu acho que 90% do que eu faco em sala, em termos de experiéncias e em termos de contetido mesmo, grande parte eu devo a ele, claro que eu fiz a minha parte, mas falo do papel do professor. Ele era assim: tinha uma coisa com a gente sabe? Ele era 0 defensor do nosso curso da licenciatura noturna. Entéo, entre os doze professores, tinham mais uns quatro ou cinco que cumpriam 0 compromisso com a turma, Ai ele se dispunha a dar aula para nds a noite, ele preparava as aulas. de uma maneira que a gente via que era muito bem preparado, ele era exigente ao extremo, mas exigéncia com carinho sabe? Mandava a gente fazer um resumo de um capitulo, “agora voce fecha o livro e faca 0 resumo At ele brincava com a gente dizendo assim: “o ‘em uma pagina, com suas palav o segundo vocé sua suor normal mesmo, primeiro resumo voce vai suar sangue, yocé vai sentir a necessidade de depois de um tempo voc’ adguire uma fluéncia que fazer isso”, a questo de escrever 0 que a gente pensa, Fantastico aquilot Outro a ressaltar € 0 dominio de contetido: ele sabia a matéria dele mesmo era entao é a historia da fisica, ele é doutor em Historia da pono a gente tem aquele evolucdo das idéias da fisica, ‘sabe de eventos, tipo assim, ele sabia tudo de historia Filosofia, Entio ele sabe de datas, coisa bem mito de professor sabe tudo, entao a gente finka esse Mil da fisica, ¢ extensivo a fisiea também. Entdo dar aula para ele, era uma ‘preparada, uma coisa bem feita, Endo em dominio de conteiido ele era fantastico, rade, valeu, nao tinka igual .”(Apolo, 2002)- juntava com carinko e boa vont Vej JAMOS, Nos dois relato S 08 entrevi i s , vist i endo muito importante, ‘ados citam primeiramente, Anna € por isso eu entendi como > nc traduzi como um moe ja de um modelo de docéncia que tiveram, Podemos lelo que foi observ: — ad « hoi referencia de pritca de lo, considerado € que serve, até hoje, como Won sucesso, Bem, os eventos comuns inio de contetido qu. duas falas se referem ao le — rsp cles chamam de competéncia intelectual, exigéncia com os “Oprios estudos e com mit @ formagaio desse habito em seus alunos, € aos professores como quele que ocupa um lugar de destaque na ago educativa; aquele que tem a batuta da Orquestra na mao e dé o tom da musica. E fantastico perceber a aproximagao de suas falas com as falas dos seus alunos referindo-se a eles. Chego a acreditar que Atena e Apolo incorporaram um modelo de docéneia que eles acreditaram ser um padrio de competéncia, © seus alunos reconhecem tais caracterfsticas nas suas priticas e também consideram-nas de sucesso. Isso nos remete para a importincia dos professores na vida dos futuros formadores. E essa questo precisa ser retomada nas instituiges formadoras. Pude constatar que, tanto para esses sujeitos como para seus alunos, os professores sfo referéncia e modelos a serem seguidos. Portanto, 0 papel do professor tanto nos processos de ensino e de apren gem, nos diversos niveis de ensino e, especificamente no Ensino Superior nas situagdes de formagio docente, necessit tam ser revisitados como um elemento de anilise e de redefinig&io. Em um processo de resgate da concepgao tradicional, ouso dizer que, em outra dimensio, o professor precisa tomar seu lugar de autoridade da mediagao do saber. Ap Acump! le entre professor ¢ seus alunos “O professor tem que ser flexivel e tem que ser um negociador com os alunos. Por exemplo, eu ouco de colegas que marcaram 0 trabalho para o dia tal e ponto final Eu tenho recebido trabalhos fora do prazo, dependendo do contexto, sempre procuro ouvir 0 que o aluno tem a dizer.” (Apolo, 2002) Nas caracterizagées dos alunos ouvidos nesta pesquisa, muitos identifiearam como uma caréncia na relagio com seus professores, a falta de atengao para com eles. Apolo: Ensinando Fisica, refletindo a vida iserem copiar eu “Desafiar & outro ponto. Deixar claro para eles que se eles qui eu falo isso muito, fazer, pode inclusive nem vou saber, mas ele esté enganando a si mesmo, muito mesmo, para ele fazer por ele mesmo. Se ndo dew tempo de entregar depois, dependendo do argumento! (Apolo, 2002). isica, para Apolo, é um permanente desafio, Como se depreende de sua fala, ensinar incluindo o trabalho com valores: responsabilidade, autonomia e verdade. Apolo: Aprendiz Miituo Comentando sobre os saberes que advém das trocas com seus pares, enfatiza a importancia de valorizar as experiéneias de seus colegas e, nesse momento, assume que seu saber também tem origem em trocas de experiéncias com seus pares: “Dou a methor aula que eu tiver no primeiro encontro com a turma. Eu aprendi, eu Sesto de ouvir muito os meus colegas mais experientes e um amigo meu é professor de cursinho e muito bem sucedido, e ele falou uma coisa interessante, pode ser como marketing, pode ser como superstigao dele, mas ele falou que na primeira aula dele, tem que ser aquela aula”. (Apolo, 2002). Apolo: A aula dialogada gosto pela Fisica faz com que Apolo contagie seus alunos através dos seus olhos e de sua postura corporal, culminando com o desenvolvimento da capacidade de aprender os contetidos. Primeiramente, 100% de siléncio. Ai comego comentando sobre 0 que vai ser tratado, aquilo que tem a ver com o dia a dia deles, para que tomem sentido na matéria e para que eles estudem, depois vem a exposicdo. Outra coisa que eu acho estdo pensando a respeito: um fundamental & que eles tém que falar 0 que eles eu concordo, eu discordo, eu desafio, ai a explica uma coisa, outro explica outra, eu desafiando, eles respondendo. (Apolo, 2002) aula vai fluindo deste jeito, to, sua contribuigdo remete-nos ao repensar constante da Pratica, em busca de novas alternativas, Atena eo Teatro “O professor tem que ser agradivel, esse agradiivel pode ser traduzido em funcaio das caracteristicas pessoais de cada profissional, no meu caso, por caracteristicas que eu tenho, e pelo 0 que eu jd aprendi da vida até agora, esse agradavel se traduz no que eu chamo de teatro, quer dizer, quando & possivel, eu brinco, faco muita piada engragadinka, mas... essa agradabilidade néio pode comprometer a seriedade da aula, Entdo, ela nao & uma constante, ela tem que entrar nos momentos em que ou as circunstincias, ou 0 conteiido permitem, Mas por outro lado, ela nito pode ficar ausente. Quando a agradabilidade néio pode se manifestar com uma brincadeira, com um momento assim mais descontraido, ela tem que, no meu caso, ela se manifesta assim, eu passo a méo na cabeca de um, eu ando na sala de um lado para outro, eu asso na carteira e puxo a camisa para 0 cara sentar direito, eu faco o sinalzinho, baixa 0 pél! Enquanto isso, estou dando aula, quer dizer, 0 magistério tem talvez mais do que outras profissdes, ele tem que ser uma atividade de descoberta, nio s de cometido, ndo s6 de competéncias, mas tem que ser uma atividade de descoberta no sentido de o que fazer para tornar menos pesado, 0 que fazer para tornar mais agradével, 0 que fazer para tornar mais sensivel, isso ai, a gente tem que estar observando o retorno." (Atena 2002) Neste ei i istéri comentario, Atena define o magistério como uma atividade de descoberta. Pode-se inch nessa atividade as praticas de formagdo de professores que se organizam rim Primordialmente 4 volta do desenvolvimento pessoal ¢ profissional que produz uma reflexdo autoformadora. A P, tena: Para o aluno, 0 professor é uma tabua de salvacao! ‘O adolescente nao gosta de quem é parecido com ele, porque ele quer alguém que empurre a causa, alguém que ele possa se segurar para passar essa fase de transi¢do, (...) € por isso que a competéncia é uma coisa que chama tanto a atencdio do adolescente porque 0 outro lado da competéncia é a seguranga, eu acho que essa associagao € automitica na cabega do adolescente, é competente, é seguro, entéo eu posso segurar nessa tdébua, por que nessa tébua eu vou com ela na hora que eu chegar do lado de Id da margem, eu solto, nao é ?” (Atena 2002) Essa sensibilidade fez com que Atena aproximasse de seus alunos ¢ oferecesse a eles contetidos afetivos de que necessitam tanto... Ressalte-se a associagto, segundo Atena, que os alunos fazem, entre a competéncia ¢ a seguranga. E natural que eles confiem naquele que sabe 0 que esti falando, ficando traduzido na maxima: Quem tem a palavra, tem 0 poder, ou seja, quando se acredita no que esti falando, o convencimento ¢ imediato Atena: As Américas Este 6 0 titulo do texto que Atena pediu para que seus alunos lessem individualmente. ApOs a leitura, Atena pergunta se tem alguma davida de vocabulirio. Como, geralmente, 0 aluno responde que no, ela replica: “Que dtimo, pois ew tenho!”. E entdo, ela comega a dissecar 0 texto com os alunos, detectando termos ou expressdes, cujo significado nao conhecem ou sobre 0s quais nao estéio muito seguros. Das perguntas sobre vocabulirio, Atena parte para com 0 t apreen, EXO, prati SHO do contes Pritica mletido de cada paragrat a cr ‘ada pardgrafo, ensinando-os a dialogar lesvela a mediagay ¢ cilita a Sompreensio pelos alun ee nena alin 0 profes $ alunos. Dessa forma, essa pr ‘or em rae . Felagiio a a © tabalha interpre, 's#0 A uma grande difieuldade encontrada lo e, SHO ©, conseqtientemente, do estudo eficiente pelo dicta @ formagio de professores mantém um : Politico em relago aos saber Se espera hoje do profi es docentes ¢ ao perfil de competéncia que ssional da educagi aa eeneaerad - Segundo Amaral, 2002, a adjetivacdo esta posta S Hagdo de professor: pri hee Professor intelectual, professor reflexivo, professor '0 longo do tempo, a representa simplesmente professor, Porém, perdemos, a professor, exata do que é ser Atena essore: © Apolo, professores observados nessa pesquisa, apontam-nos, na pritica, algumas nuances de suas ages que trazem bastante contetido para um referencial de andlise da pratica docente e, quic4, propostas de parametros curriculares, 4 — Sintetizando.. Considerando a pergunta principal deste trabalho: “Por que alguns docentes envolvem seus alunos na compreensdo dos contetidos, ¢ outros néo?”, concluo que para essa questio nio existe uma tinica resposta, haja vista a diversidade de priticas entre Atena e Apolo € suas caracteristicas pessoais bem distintas. Mas, existem caracteristicas profissionais que sto comuns € que definem suas competéncias, sendo elas: o gosto pela ciéncia ¢ pela pesquisa, ‘a consisténcia de sua formagao inicial, a exigéncia para com seus alunos, organizagio didética, 0 bom relacionamento com os discentes € a preocupagdo com o objeto de ensino Finalizando as argumentag6es, apresento, resumidamente, alguns aspectos trabalhados no decorrer da andlise, para que possam ser sintetizados e, mais uma vez, ressaltados como pontos relevantes do saber docente, «© Os estudos utilizaram uma abordagem tedrico-metodologiea que di voz a0 professor, & partir da andlise de trajetérias, historias de vida, ete * Mello (1982) afirma que a competéneia técnica envolveria tanto 0 dominio dos contetidos de ensino pelo professor, como o seu entendimento a respeito das relagdes entre os varios aspectos da escola; * Considerando as hipoteses de natureza da competéncia como facilitadores do trabalho docente, (Chevallard, 1991) apresentou 0 conceito de transposigao didatica que, de acordo com as observagdes em campo, ficou evidente que essa passagem do saber sibio 0 saber ensinado, é um conhecimento com légica propria que faz parte de um sistema didatico que implica mobilizagdes subjetivas e pessoais; * Segundo Schén(1995), esses saberes sto criados pelos docentes como um conhecimento especi ido & ago: é um conhecimento pessoal, ticito ¢ nfo sistematico, espontineo, intuitivo, experimental, cotidiano, do tipo que leva a pessoa a agir sem saber como age, em concepgio oposta a da racionalidade técnica, Nesse caso, a tese de Schén foi constatada, in loco, quando das entrevistas, em que os sujeitos no conseguiram explicar, objetivamente, suas estratégias de ensino, elas apareciam corporificadas nos exemplos priticos. ¢ Outra investigagdo que compés os objetivos da pesquisa foi em relagdo a natureza dos saberes docentes. Buscamos em Tardif (2002), a definigao desse saber que preconiza estabelecer uma articulago entre os aspectos sociais ¢ individuais dos saberes dos professores. Ele afirma que o saber é social, porque é partilhado por todo um grupo de agentes — considera, também, que a abordagem & social, porque € adquirida no contexto de uma socializago profissional, onde € incorporada, modificada, adaptada em funga0 dos momentos e das fases de uma carreira, ao longo de uma historia profissional onde 0 professor, também, aprende a ensinar, fazendo o seu trabalho. Em suma, o saber dos professores contém conhecimentos ¢ um saber-fazer cuja origem & patente, Por exemplo, alguns deles provém da familia do professor, da escola que © formou soal; outros vém das universidades ou das escolas normais; outros estio ede sua cultura pes sm dos pares, dos cursos de aperfeigoamento, etc. ligados a instituigo; outros, ainda, provét Nesse sentido, 0 saber profissional esté, de um certo modo, na confluéncia de varios eres oriundos da sociedade, da instituig: dos outros atores educacionais, das 0 escolar, sab a universidades, etc. RE E FERENCIAS BIBLIOGRAFICAS AMARAL, A, AMARAL. poe biti. A adjetivay % s ‘do do professor: i 131-154, Formagéo de profe: oor do professor: uma identidade perdida? Wn: VEIGA B 8 — politicas e debates. Campinas: Papirus, 2002. pp BOURDIEU. EV, Pierre. ° ' Perspectiva, 1987, ©. A economia das trocas simbélicas. Trad. Sérgio Miceli, Sao Paulo: CANDAU, Vera Mari |, Vera Maria, Repensando a diddtica. Campinas: Papirus, 1991. CHEVALLARD, . 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