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Há uma ampla variedade de opiniões quanto ao sentido de θύραν ἠνεῳγμένην (porta aberta).
Muitos estudiosos (Swet, R. Charles, Hort, Ramsay, Caird, Walvoord, Hemer, P. Hughes,
Harrington) interpretam a expressão como uma referência à oportunidade missionária,
correspondente ao uso que Paulo faz de “porta aberta” aos gentios (1Co 16:9; 2Co 2:12; cf.
Atos 14:27), e à situação de Filadélfia como a de uma “cidade missionária” propagando a
cultura helenista. Outros vêem isso como indicação do martírio como “porta” para Deus
(Kiddle 1940:49), de oração como a “porta” (Barclay 1960:1.164) ou de Cristo como a “porta”
para a salvação (Moffatt 1983:366; Sweet 1979:103, com base em João 10:7-9, a “porta das
ovelhas”). Entretanto, a visão mais comum atualmente (Beckwith, Lohmeyer, Ladd, Mounce,
Johnson, Prigent, Krodel, Thomas, Fekkes, Giesen, Aune, Beale) é interpretar a expressão como
a “porta” para o reino. Embora a igreja tenha sido excluída da sinagoga, Cristo tem as “chaves”
para o reino. Ele tem aberto a “porta” e “ninguém pode fechar”. Essa possibilidade se
harmoniza melhor com 3:7.
Depois do parêntese, Cristo se volta para os “pontos fortes” dos crentes. Ainda que eles
fossem uma pequena igreja, eram fiéis e perseveraram. Um pequeno número de pregadores
(principalmente uns poucos pregadores populares; não encontrei nenhum comentarista que
entenda o texto dessa forma) interpreta μικρὰν ἔχεις δύναμιν (tens pouca força) como
repreensão, e não aprovação, dizendo que a igreja tem “pouco poder (espiritual)”. Isso é
bastante improvável, pois todo o contexto apresenta a igreja de Filadélfia de forma positiva.
Em vez disso, a expressão indica que a igreja não tinha tamanho nem estatura dentro da
comunidade, era desprezada e perseguida. Seus membros tinham “pouca autoridade” ou
influência, mas eram fiéis, e este é sempre o critério para a benção divina, não o sucesso.
As duas orações, como em 3:7b, afirmam o mesmo fato, primeiro positivamente e, então,
negativamente. Dos cristãos de Filadélfia se diz que “guardaste a minha palavra e não negaste
o meu nome”. Os dois verbos no aoristo poderiam ser constativos, resumindo a vida da igreja
como fidelidade, ou simplesmente falando de uma perseguição na qual os crentes
perseveraram. A maioria dos comentaristas supõe a segunda possibilidade, mas, nesse caso,
existe a dificuldade com o tempo presente ἔχεις (tens) da oração anterior. Teria a igreja de
Filadélfia pouca força no presente, ainda que no passado tivesse sido fiel? Parece mais
provável que, como em outros lugares do livro (cf. 2:3,13,14; 3:4), a vida da igreja é resumida
primeiro pelo presente, depois pelo verbo aoristo (constativo). Em 2:26 e 3:3, a igreja recebe a
ordem de “guardar” ou permanecer fiel às obras de Cristo (2:26) e às verdades da igreja (3:3).
A “palavra de Cristo”, como a palavra de Deus em 1:2,9, refere-se às suas verdades reveladas,
à mensagem do evangelho. Eles não apenas têm “guardado” (uma conotação desse verbo) o
evangelho, mas têm lhe “obedecido” (outra conotação) em meio à severa perseguição. A idéia
de “não negaste meu nome” remonta à carta anterior, especialmente a 3:5b e sua alusão a
Mateus 10:32-33. O versículo 32 (“quem me confessar”) está por trás de 3:4, enquanto o
versículo 33 está por trás de 3:8 (“quem me negar”). Ao contrário da maioria dos cristãos de
Sardes, os crentes de Filadélfia se recusaram a “negar” Jesus.
Uso do AT no NT
Em 1:18b, temos as chaves “da morte e do Hades”, mas em 3:7b uma citação de Isaías 22:22
substitui “da morte e do Hades”: “o que tem a chave de Davi; o que abre e ninguém pode
fechar, e o que fecha e ninguém pode abrir”. A substituição tem o propósito de intensificar a
idéia da frase original de 1:18b, ressaltando a soberania que Cristo exerce sobre a esfera “da
morte e do Hades/inferno”.
O texto de Isaías 22 descreve o controle absoluto de Eliaquim sobre o reino de Israel, embora
mais tarde ele tenha sido deposto. A referência a Eliaquim como “meu servo”, em Isaías 22:20,
poderia ser facilmente associada com as profecias acerca do “servo” de Isaías 40-53, posto que
a expressão ocorre ali treze vezes (a mesma expressão ocorre apenas duas vezes em outras
passagens de Isaías, em referência ao próprio profeta (20:3) e a Davi (37:35). A descrição de
por a “chave da casa de Davi [= a responsabilidade administrativa do reino de Judá] sobre os
ombros [de Eliaquim]”, a designação do rei como “pai para os moradores de Jerusalém e para
a casa de Judá” e como “um trono de honra” facilita a compreensão tipológico-profética de
Isaías 22:22, uma vez que essa formulação estabelece um paralelo impressionante com a
profecia de Isaías 9:6-7 acerca do futuro governante israelita: “o governo está sobre os seus
ombros, e o seu nome será [...] Pai Eterno”, que está assentado no “trono de Davi”. Assim, o
controle temporário de Eliaquim sobre o reino como "primeiro-ministro” do rei de Israel é um
padrão histórico-profético que aponta para a soberania maior e eterna de Jesus Cristo sobre
um reino superior.
Se levarmos em conta a forte influência de Isaías 40-60 em 3:7-9, uma alusão a Isaías 45:1
também pode ser percebida em 3:8 – compare “para abrir diante dele as portas, para que não
sejam trancadas” (Is. 45:1) com “tenho posto diante de ti uma porta aberta que ninguém pode
fechar” (Ap. 3:8). Assim como Israel era fraco, em comparação com seus adversários, mas se
tornaria forte pela obra restauradora de Deus executada por Ciro (cf. Is. 45:2-7), Deus também
tornaria eficaz o testemunho da pequena igreja de Filadélfia entre seus adversários (assim
Lövestam 1965)
Comentário do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento – G.K. Beale e D.A. Carson
(p.1336)
QUEM É QUEM
Eliaquim (Heb. “Deus levanta”), filho de Hilquias, ocupava uma posição proeminente na corte
do rei Ezequias. Em Isaías 22:22-24 vemos que, para todos os efeitos, era primeiro-ministro.
Segurava a “chave da casa de Davi”. Fez parte da delegação que saiu para falar com o
comandante do exército assírio que sitiara Jerusalém em 701 a.C. (2Rs. 18:18,26,37; 19:2). Não
conseguiram chegar a um acordo de paz e, assim, os assírios proferiram uma mensagem para o
rei Ezequias em hebraico (2Rs 18:19-25). A palavra declarava que o Senhor estava do lado
deles e enfatizava com sarcasmo a posição precária na qual o rei Ezequias se encontrava
naquele momento. Tinha confiado no Egito, a quem os assírios agora referiam-se como esse
“bordão de cana quebrada ... no qual, se alguém se encostar, entrar-lhe-á pela mão e a
trespassará” (v.21).
Eliaquim ficou profundamente preocupado com os soldados que estavam sobre os muros da
cidade, pois, se entendessem a mensagem proferida em hebraico, ficariam desencorajados.
Assim, pediu aos assírios que falassem em aramaico, a linguagem falada na corte. Isso apenas
provocou ainda mais o comandante, que gritou mais ameaças, dessa vez dirigidas diretamente
às pessoas que estavam na muralha. Apelou especialmente para que não dessem ouvidos às
promessas de Ezequias (2Rs 18:28-35). Eliaquim, Sebna, seu secretário, e os outros oficiais
voltaram à presença de Ezequias com grande tristeza e medo. Esse desfecho, entretanto, fez
com que o rei se voltasse para o Senhor e buscasse ajuda e direção, algo que já deveria ter
feito muito antes. Deus, que sempre estava pronto para ajudar seu povo quando clamava por
Ele, respondeu à oração de Ezequias por livramento (2Rs 19:14-19) e interveio diretamente ao
matar 185 mil soldados assírios numa única noite no próprio acampamento deles (vv.35ss; veja
também Isaías 36:1-22; 37:2)