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SETE DITOS DE JESUS

Para além dos quatro evangelhos conhecidos vários estudos revelam que terá havido uma fonte muito
próxima das palavras do próprio Jesus, hoje designada por fonte Quelle ou Fonte Q. Considera-se que
terá estado na origem dos evangelhos de Mateus e Lucas, junto com o Evangelho de Marcos. Aqui
sugerimos sete ditos que se dizem pertencer a essa fonte Q. Sete sugestões de leitura bíblica, de reflexão e
oração para a vida cristã.
Fonte: The New Interpreter's Bible, Lucas por Alan Culpepper e Mateus por Eugene Boring.

1. SOBRE O PAI NOSSO Mt 6,9-13


«Rezai, pois, assim: Pai nosso»
Situado em pleno centro do conhecido Sermão da Montanha, o Pai nosso é ensinado quando Jesus fala
sobre piedade e oração, numa reorientação para a autenticidade. Jesus declara a relação entre os homens e
Deus, como de um filho para um pai. A reverência está no louvor do santo nome, ou seja, da própria pessoa
de Deus. O desejo da Sua presença aqui e agora está no pedido do Reino, de tal modo que os homens O
acolhem e seguem de acordo com a Sua vontade. O pedir do pão diário, que simboliza as nossas
necessidades básicas, revela a nossa total dependência do Pai. O perdão das ofensas é devido na medida em
que nos dispomos também a perdoar imerecidamente. O mal é concreto e a tentação faz parte do caminho
que conta com a sobrenatural ajuda paterna.

2. SOBRE AMAR OS INIMIGOS Lc 6,27-36


«Amai os vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, abençoai os que vos amaldiçoam, rezai pelos
que vos caluniam.»
Jesus apresenta uma alternativa ética, revolucionária e radical, à habitual resposta à ofensa recebida. Está
em causa a resposta aos adversários dos discípulos. O biblista Alan Culpepper refere bem que o gesto de
bater numa das faces não é apenas uma agressão física, mas também uma humilhação, um ato de desprezo
e desrespeito. Ao propor que nessa situação se mostre a outra face, Jesus pretende quebrar com o ciclo de
violência, um interminável vaivém que nunca satisfaz qualquer uma das partes. O gesto de amor é
inesperado, incomum, inédito, contracorrente, impensável, aparentemente ingénuo, mas imitador do
próprio Deus que «é bom até para os ingratos e os maus».

3. SOBRE A PUREZA DOS ATOS Lc 11,39-52


«Vós, os fariseus, limpais o exterior do copo e do prato, mas o vosso interior está cheio de rapina e de
maldade. (…) Antes, dai esmola do que possuís, e para vós tudo ficará limpo.»
À dureza das palavras de Jesus facilmente olhamos para aqueles que agem nas aparências. Porém estas
palavras são dirigidas para todos. Como A. Culpepper afirma: «Este texto, não serve para agredir as falhas
dos outros, mas serve como um espelho no qual podemos ver as falhas dos nossos próprios bons atos
piedosos.» Somos surpreendidos. Ao falar da limpeza de copos e pratos, Jesus denuncia a sujidade do
interior dos homens. Mais ainda, é pela dádiva de si que o interior e o exterior ficam limpos. A pureza,
transparente como água, mostra nos atos o que diz o coração. Esta é uma grande sabedoria.

4. SOBRE A PORTA ESTREITA Lc 13,23-30


«Esforçai-vos por entrar pela porta estreita, porque Eu vos digo que muitos tentarão entrar sem o
conseguir.» Somos uma vez mais derrubados pelas palavras de Jesus. A noção de que muitos não se vão
salvar lança um clima de receios e medos. Jesus é deliberadamente ambíguo, de tal modo que não deixa
qualquer dúvida: “o esforço por entrar” tem de ser levado a sério. Viver segundo o Evangelho é, de facto,
um esforço e uma luta constante. Mas, é preciso perceber que a salvação dependerá não só desse esforço
perseverante, mas da graça de Deus. «Age como se tudo dependesse de ti, mas consciente de que na
realidade tudo depende de Deus», disse Inácio de Loyola. E na verdade, como A. Culpepper sublinha, Jesus
não diz que serão poucos os que vão entrar, mas sim que muitos pensam que vão entrar…

5. SOBRE O GRÃO DE MOSTARDA Mt 13,31-32


«O Reino do Céu é semelhante a um grão de mostarda (…) É a mais pequena de todas as sementes; mas,
depois de crescer, torna-se a maior planta do horto e transforma-se numa árvore». Segundo o biblista
Eugene Boring, a semente de mostarda produz um arbusto grande mas que não se transforma numa árvore.
A grande árvore mencionada era utilizada na antiguidade como símbolo dos grandes impérios. Ora, Jesus
aponta para um horizonte impossível. Para melhor compreendermos E. Boring conta outra sugestiva
parábola: «O reino de Deus é semelhante a um pregador que todos os domingos pregava para um conjunto
de vinte e cinco pessoas numa cidade de dois milhões de habitantes. O pregador continuou a pregar, até que
um dia, toda a cidade acreditava no evangelho.» Jesus fala da impossibilidade possível da graça de Deus.
A transformação acontece: há uma ligação fundamental entre o mais pequeno e ridículo gesto de amor e o
maravilhoso esplendor da glória de Deus.

6. SOBRE A OVELHA QUE SE PERDE Mt 18,12-14


«Que vos parece? Se um homem tiver cem ovelhas e uma delas se tresmalhar, não deixará as noventa e
nove no monte, para ir à procura da tresmalhada? E, se chegar a encontrá-la, em verdade vos digo: alegra-
se mais com ela do que com as noventa e nove que não se tresmalharam.»
Esta parábola em Mateus destina-se aos discípulos de Jesus. Não pretende ser uma exortação à
evangelização, mas sim uma exortação para cada um tomar atenção aos membros que já estão na
comunidade e que se podem desviar do caminho. Estes que se desviam são os pequeninos, como as crianças
naquela altura, considerados como menores que os outros, excluídos, à margem da sociedade. Jesus não
quer perder estes pequenos. Por isso avisa-nos a estarmos atentos, a não deixarmos ninguém se perder.

7. SOBRE PERDOAR SETE VEZES Lc 17,3-4


«Se o teu irmão te ofender, repreende-o. E, se ele se arrepender, perdoa-lhe. Se te ofender sete vezes ao dia
e sete vezes te vier dizer: “Arrependo-me”, perdoa-lhe.»
A chave para compreender esta passagem está naquele que perdoa e não no que se mostra arrependido. Para
quem perdoa, não se trata de averiguar as razões daquele que pede perdão. A ofensa requer a sua repreensão.
Mas a ofensa requer também o perdão ao arrependido. Sete vezes significa sempre. Jesus é exigente. Em
Mateus, os discípulos percebem como é literalmente difícil perdoar tanta vez, à mesma pessoa, no mesmo
dia, e por isso pedem a Jesus que lhes aumente a fé. Mas Deus não nos perdoa sempre? A sua Misericórdia
não é infinita? Como sugere A. Culpepper, esta é sem dúvida a maior exigência: confiar na graça de Deus
e fazer a Sua vontade.

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