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Capítulo 1.1.2 – O lago dos patos

O procedimento para criar música de ballet é a seguinte:


Seleciona-se um tema. O libreto é então desenvolvido pela
Administração do Teatro, de acordo com os seus meios
financeiros. Seguidamente, o coreógrafo trabalha no projeto
detalhado das cenas e das danças, indicando não somente o ritmo
exato e o caráter da música, mas inclusive o número de compassos.
Só então o compositor pode começar a escrever a música
(Tchaikovsky, 1990)1.

Quando os domingos despontam ensolarados, como é o caso, o compositor


Tristão Ventura gosta de começar o dia com uma caminhada. No seu bairro existe um
jardim de dimensões agradáveis, nem muito grande nem muito pequeno, e é para lá que
ele encaminha os seus passos. A esta hora da manhã, ainda pode ouvir o sobressalto
madrugador dos pássaros e apreciar uma relativa solidão, enquanto a cidade prolonga a
sua preguiça domingueira. Com os olhos na copa das árvores e as mãos dadas atrás das
costas, vai apreciando o contraponto chilreado que anima o arvoredo com uma jovialidade
leve e transparente. Aprecia esse espaço acústico irregular, descontínuo e requebrado,
movimentando-se lentamente na direção dos apelos trinados, invertendo por vezes o
sentido ao assobio de um melro, desviando subitamente o seu rumo ao chamado
inesperado de um pintarroxo. A sua deambulação acaba por o levar para as margens do
lago e resolve sentar-se num banco, para maior conforto do devaneio ornitológico.

O lago tem dimensões consideráveis para um jardim daquele tipo, desenhando


uma espécie de meia lua aninhada na base de uma enorme palmeira e embaixo da qual se
situa uma pequena casota. Essa casota está, por sua vez, assente sobre uma plataforma de
concreto da qual desce uma rampa em direção à água. É nesse cenário que se fixa o olhar
de Tristão Ventura. Na água está um pato branco, adulto, ou provavelmente uma pata,
porque no concreto observam-na dez patinhos amarelos, atentos aos seus movimentos,
como se recebessem uma lição, o que na verdade deveria ser o caso. A pata mergulha a
cabeça até ao final do pescoço, como como se adivinhasse algum petisco no fundo do
lago e tencionasse submergir por completo, mas logo retoma a compostura inicial e
remata com um sacudir de penas, composto por um breve mas frenético movimento de

1
[Tradução nossa].
2

asas e um vigoroso sacolejar da cauda, num reboliço de pingos, borrifos e ondulações


aborrascadas. O grupo dos pupilos amarelinhos recua alvoroçado perante a turbulência,
mas a um grasnido da presumida genitora dão meia volta e aproximam-se novamente da
borda de água, num pipilar débil e entrecortado. O compositor Tristão Ventura dá conta,
nesse momento, de uma articulação sutil entre o tecido heteróclito dos chilreios silvestres
que se desdobra sobre a sua cabeça e as acentuações contrapontísticas entoadas pela
família de patos em cena, frente a seus olhos. A coreografia pedagógica vai-se repetindo,
com pequenas variações tanto na técnica de imersão da pata-mestra como nas reações
desiguais dos seus filhotes, mantendo-se, todavia, a mesma dinâmica na relação entre
solista e corpo de baile: a pata mergulha e estrebucha, os patinhos assustam-se e retornam.
A esta dramaturgia minimalista sobrepõe-se, como uma campanula acústica, o sinfonismo
dos chilros, trinados, assobios e glissandos das aves, pontuados por outros sons da cidade
que despontam à medida que a manhã se vai adiantando: um automóvel que contorna a
quadra, um par de crianças que ocupa o parque infantil, uma porta que se fecha por perto,
um breve diálogo sonoro na distância. O espírito do compositor deixa-se enlevar por esta
harmonia domingueira, que acaba por inflamar a sua propensão especulativa e por
exorbitar extrapolações fantasiosas, muito próprias destas ocasiões. Este lago dos patos
podia perfeitamente ser uma sequela do Lago dos Cisnes, esta mãe extremosa uma versão
amadurecida (e um pouco mirrada pelos anos) da bela Odette, e estes patinhos passariam
muito bem por descendentes do príncipe Siegfried2... Por momentos, as copas do arvoredo
reconfiguram-se numa espécie de fosso de orquestra invertido e a rampa que liga a
pequena plataforma de concreto às águas do lago, com suas margens ajardinadas,
transmutam-se no cenário romântico de um palco imaginário.

O compositor Tristão Ventura pensa que o cinzel do tempo, assim como esculpiu
o destino desta frágil e apaixonada Odette, agora convertida numa sólida matrona
dedicada à educação da sua prole, modelou igualmente, e de forma porventura ainda mais
radical, o pensamento estético e as modalidades processuais dos coreógrafos e dos
compositores musicais, porque no que respeita à relação entre episódio iniciático que
observa e o ambiente sonoro que o envolve, mais depressa se revê perante uma associação
aleatória de Cage com Cunningham do que assistindo a uma récita da obra de

2
Odette e Siegfried são os nomes dos personagens principais do libreto de o “Lago dos Cisnes”, o popular
bailado coreografado originalmente por Julius Reisinger sobre partitura do compositor Piotr Ilyich
Tchaikovsky, estreado a 4 de maio de 1877 no teatro Bolshoi, em Moscou (N.doA.).
3

Tchaikovsky, ainda que na perene versão de Petipa. Mas que dupla de criadores seria
capaz de atingir a autenticidade absoluta do que se desenrola perante os seus sentidos, a
sinceridade espontânea e imanente da relação entre esta aula de natação e a arquitetura da
sua sonoridade envolvente, na total conexão expressiva entre o tecido modulado pelas
aves canoras e a poética naturalista dos patos?

Ei-lo lançado nas suas recorrentes divagações! Mas as suas divagações são uma
espécie de “cair em si”, um movimento recorrente de organização mental, uma imposição
da sua natureza meticulosa e um imperativo da sua inquietude espiritual. Pensar no
processo criativo de obras coreográfico-musicais sempre transporta Ventura, num
primeiro momento, para a indagação de aproximações semânticas entre música e
movimento, o que o leva a questionar que semânticas são essas, se elas existem, o que o
precipita em indagações históricas sobre a produção de sentido na música e na dança, o
que o aproxima de uma semiótica da performance coreográfica e da composição musical,
o que o orienta a uma conjetura cartográfica das relações de dependência expressiva entre
música e movimento, o que o instiga à pesquisa ou identificação de um vocabulário
comum, de uma ementa funcional para a gestão paramétrica do tempo, criando eixos de
análise rítmica, frásica, dinâmica, textural, pesquisando convergências formais e
macroestruturais, uma ementa aromatizada com o tradicional mistério do que nasce
primeiro, a música ou o movimento, abandonando-o no limbo histórico das relações
colaborativas entre grandes compositores e grandes coreógrafos, Tchaikovsky e Petipa,
Stavinsky e Nijinsky ou Balanchine, Cage e Cunningham, Copland e Graham, De Mey e
Anne Teresa, tudo em prol de uma cartilha operacional que resolva esse dilema
composicional, organizando um pensamento produtivo que aproxime da obra um
compositor cego e um coreógrafo surdo.

É esta separação entre a gênese do movimento e a origem da música que o


perturba, quando assiste a uma manifestação de grande intimidade entre o que vê e o que
ouve. O compositor Tristão Ventura conjectura que a distância entre a visibilidade do
movimento dos patos e a percepção auditiva da vibração ornitológica funda um abismo
que as separa, sem quebrar as grilhetas que as unem no urdir de uma duração comum. Se
visibilidade e audição se conjugam de modo a deixar Ventura tão absorto, ou como que
hipnotizado perante o singelo espetáculo que lhe calhou presenciar, é porque alguma
ponte neutralizou esse abismo, algum equilíbrio se estabeleceu e criou uma fonte de
intensidades compósitas, agora capturadas pela agitação visual, a seguir dominadas pela
4

singularidade auditiva, mas trilhando em cada momento uma reciprocidade propícia à sua
correlação expressiva.

É claro que compor é moldar a natureza e não apanhá-la desprevenida, e há muito


tempo que o compositor Tristão Ventura procura descobrir a engenharia competente para
a edificação satisfatória dessa ponte. Ouve recorrentemente vozes interiores que emergem
das suas leituras, Dalcroze dizendo que a música deve ser mantida dentro de certos
limites de modo a permitir que o movimento se afirme3, Riegger opinando que dança e
música devem formar uma unidade orgânica distinta, uma fusão em alguma coisa ainda
sem nome4, Engel defendendo que coreógrafos e compositores se deveriam
ocasionalmente retirar, um em favor do outro5, Limón considerando que a obra seria bem
sucedida se não fosse possível separar os seus componentes6. A harmonia contrapontística
percebida entre a movimentação dos patos e o fraseado fragmentário dos passarinhos
aponta-lhe essa totalidade como um mistério da natureza, totalidade que, ao longo da sua
experiência pessoal já vislumbrou, já festejou e já desperdiçou, sem lograr concluir dessa
experiência um ensinamento definitivo para futuras investidas. Por isso o invade um
familiar arquejo de ansiedade perante a tão singela concórdia que se ergue desta
performance bucólica, sem que qualquer diligência humana tenha concorrido para ela.
Ventura sabe que a relação histórica entre o pensamento coreográfico e a composição
musical é uma história apaixonada de escaramuças, de recriminações, de manifestos, de
pasmos e de contradições. Basta evocar o divórcio primordial entre música e movimento
sentenciado por Laban7, o apartheid entre a medida musical dos bailarinos e a

3
“...a música deve ser mantida dentro de limites e obrigada a diminuir o seu poder expressivo para permitir
que o elemento com o qual está associada se afirme, não em redundância, mas em colaboração” (Dalcroze,
2011, p. 9) [Tradução nossa].
4
“Estou convencido de que a solução correta é considerar música e dança com igual importância, a dança
como veículo de interpretação da música, e, ao mesmo tempo, a música como moldura tonal para os ritmos
e ânimos da dança, ambos entrelaçados numa forma orgânica que não é nem pura coreografia nem pura
música, nem a sua soma, mas a fusão em algo ainda sem nome” (Riegger, 2011, p. 61) [Tradução nossa].
5
: “Se os dois criadores desejam honestamente erguer uma verdadeira estrutura polifônica, devem ambos
aprender como, ocasionalmente, se retirar, cada um de sua vez, em favor do outro” (Engel, 2011, p. 84)
[Tradução nossa].
6
“Música para dança só é bem sucedida e efetiva quando foi tão habilmente utilizada que você não a
percepciona como um componente ou ingrediente separado” (Limón, 2011, p. 288). [Tradução nossa].
7
“Para Laban, não há qualquer relação possível ou pensável entre os dados musicais e o movimento”
(Louppe, 2012, p. 314)
5

organização rítmica dos compositores, proclamado por Mary Wigman 8, ou a insuspeita


apreciação do compositor Lehman Engel, para quem a música era tão irrelevante para a
invenção coreográfica como as características do cenário eram secundárias para a escrita
dramatúrgica9. Uma zaragata protagonizada por déspotas esclarecidos como Stravinsky,
para quem um bom bailarino deveria ser, antes de mais, um bom músico, competente para
integrar no próprio corpo as complexidades polirrítmicas da sua composição10, ou por
exploradores voluntariosos como Marta Graham, que idealizava detalhadamente o
movimento antes de o confiar à escrita de uma partitura musical11. Nas tensões inflamadas
de tal peleja não faltaram os que se esforçaram por organizar metodologias, sentenciar
plataformas conceituais, diagramar estruturalismos. O compositor Kenneth Klauss
prescrevia quatro modos de colaboração entre compositores e coreógrafos: a música
preexistindo isolada do movimento, a composição da música mediante uma descrição
geral da coreografia, o desbravamento simultâneo da composição coreográfico-musical
e, por fim, o fornecimento ao compositor de contagens estruturantes do movimento12. É
claro que, sendo o tempo a componente primária que liga as duas linguagens, este tipo de
prescrições tendia a incidir sobre questões de organização rítmica, como a organização
de eventos numa determinada duração. Mas por arrasto vem associados os conceitos de
pulsação, de andamento, de densidade, textura, fraseado. A Ventura ocorre então a “forma
elástica” inventada pelo compositor Henry Cowell, a que o próprio atribuía efeitos tão
revolucionários como a introdução da relatividade do tempo na forma de entender o
movimento das galáxias, propondo a composição de fraseados extensíveis ou retráteis,
compostos como blocos mutantes e permutáveis, adaptáveis aos imperativos

8
“…a medida dos músicos não corresponde à dos bailarinos, porque os músicos contam segundo a linha
musical e os bailarinos contam segundo o ritmo do movimento” (Louppe, 2012, p. 314)
9
“A música podia ser vista como analogia à moldura de um quadro: deveria realçar a pintura mas não a
prejudicar. O compositor Lehman Engel foi mais longe na sua declaração: o bailarino não deveria
considerar a música na sua criação mais do que o dramaturgo se preocupar com a cor ou a textura do cenário
ou outros adereços de cena” (Teck, 2011, pp. 43-44)
10
“Coreografia, tal como eu a concebo, deve realizar a sua própria forma, independente da forma musical,
embora submetida à unidade de medida da música. A sua construção será baseada em qualquer
correspondência que o coreógrafo possa inventar, mas não deverá duplicar a linha e o tempo da música.
Não imagino que alguém possa ser coreógrafo sem ser, primeiro, músico” (Joseph, 2011, p. 1).
11
“Martha criou a maior parte da coreografia antes de eu ver fosse o que fosse. Interpretou-a, sozinha ou
com suas bailarinas para fixar as contagens. Eu deveria entender o temperamento geral, escrever as
contagens, notar as frases, ou as acentuações ou os climaxes ou os momentos em que deveria haver silêncio”
(Engel, 2011, p. 80)
12
In “Making Music for Modern Dance” (Teck, 2011, pp. 175-176)
6

imponderáveis da criação coreográfica em função da sua flexibilidade métrica 13. Algo


como um dispositivo que permite estruturar a convivência de diferentes desígnios
expressivos (os do movimento e os da música) de forma negociada, como um acordo pré-
nupcial que regula a liberdade individual dos cônjuges num cerceamento territorial
tolerado mutuamente.

O sol já vai alto, numa arrogância de raios ultravioleta, e o calor começa a


incomodar o compositor Tristão Ventura, importunando os seus pensamentos. Sente
alguma impaciência quando reflete que os esforços de compositores e coreógrafos em
prol de uma convergência parecem estar presos, há muito tempo, a uma tensão histórica
entre a espontaneidade do corpo e o espartilho temporal da música, mesmo quando os
compositores se esforçam em compreender se há relações rítmicas entre música e dança,
se as frases musicais se unem a certos pontos do movimento dançado, se o fraseado da
música deve convergir ou contrastar com o fraseado do movimento, se a música deve ser
um mero pano de fundo da coreografia, se a sincronização com o movimento deve ser
estrita ou flexível, se deve haver uma relação entre a densidade dos sons e o números de
bailarinos, se a música deve realçar a dança, fundir-se inocuamente com ela ou contrastá-
la, se a uma mudança de timbre ou textura deve corresponder uma resposta coreográfica,
se repetições musicais deverão ser correspondidas com repetições coreográficas 14, mil e
uma questões que afunilam numa quimera sintática, numa processualidade petrificada na
sua própria formalidade, num esforço certamente respeitável mas que deixa Ventura ainda
mais intrigado porquanto nenhuma lógica organizadora se deixa vislumbrar na sua
pequena fabulação dominical avícola, cuja concórdia expressiva vem estimulando tais
pensamentos. Os seus olhos regressam então ao lago dos patos, mas quando os seus
ouvidos se devolvem aos pássaros encontram uma paisagem sonora em estado de sítio: o
jardim foi invadido por transeuntes perambulantes e famílias ruidosas, as cercanias
sofreram uma sobrelotação de tráfego com o seu cortejo de buzinas metálicas, acelerações
impertinentes e travagens enfáticas. Há risos prazenteiros, gritos agudos e súbitas birras

13
Para mais informação sobre “forma elástica”, consultar “Relatins Music and Concert Dance: An Idea for
Elastic Form”, (Teck, 2011, pp. 87-90).
14
Estas perguntas integram um questionário recomendado a compositores musicais interessados em
colaboração com coreógrafos, elaborado na sequência das conclusões do estudo “Composer and
Choreographer: a study of collaborative compositional process “ (Kim, 2006, pp. 106-107)”.
7

dos mais novos, admoestações moles ou agastadas dos seu pais, um cafarnaum digno de
vendilhões do templo que oblitera por completo a suave concertação inicial que ditara o
rumo das suas especulações. É certo que os patinhos continuam o seu bailado, ora se
aproximando ora se afastando da berma do lago (agora rodeado por uma plateia numerosa
e pouco reverente), resistindo ainda à perseverança pedagógica da sua tutora, e que esta
insiste na sua repetitiva estratégia de breve imersão seguida de um frenesim instantâneo.
Mas a trilha sonora ganha uma evidência de aleatoriedade, cindindo a convergência
anterior numa duplicidade discursiva angulosa e numa áspera oposição expressiva.

É nesse momento que John Cage e Merce Cunningham invadem a arena mental
do compositor Tristão Ventura. O movimento dos patos e o banzé das famílias são
percebidos em simultâneo, mas permanecem acontecimentos autônomos. Foi essa
disrupção que revolucionou o panorama colaborativo à época, e que desperta agora
Ventura para novos pensamentos, desafiando o impasse dos formalismos operacionais
que o incomodavam momentos atrás. No encontro de Cunningham com Cage, a
interpretação da imprevisibilidade como espelho da ordem dos acontecimentos naturais,
cria uma unidade objetiva nas preocupações e interesses da sua experiência de
colaboração. Cunningham tenta afastar-se de relações de causa-efeito para enfatizar a
continuidade espaço-temporal, tal como Cage procurava que a sucessão de eventos
sônicos ao longo do tempo refletisse, de algum modo, a aleatoriedade sequencial dos
acontecimentos na realidade mundana. Recorrer ao acaso (determinando sistemas de
escolha como lançar moeda ao ar, ou adotar as imperfeições de uma folha de papel para
ordenar acontecimentos) tornou-se uma ferramenta mediadora da colaboração entre os
dois, sem que a independência discursiva fosse de algum modo comprometida. Nessa
determinação obstinada e radical, Cage e Cunningham ocupam o espaço do movimento
e do som num plano que continuamente se dobra sobre si próprio e que em tal dobra forja
a co-presença da dança e da música no tempo. Respondem assim à tirania da dependência
entre desígnios coreográficos e rigores musicais com um clamor libertário, o que acalma
um pouco Tristão Ventura, que olha por fim o lago dos patos com uma empatia solidária,
irmanando-se com a turba e torcendo pelo desfecho do libreto, agora que os patinhos se
afeitam cada vez mais temerariamente aos exuberantes apelos da mãe pata. Mais do que
a qualidade dos resultados artísticos da dupla americana, o compositor sente florescer em
si a liberdade do seu pensamento, a multiplicidade da vida que envolve a arte, que a
trespassa, que lança sobre a colaboração um desafio vibrante, que a interroga e que nunca
8

lhe concede uma operacionalidade fechada, que nunca se tipifica, que nunca lhe dá
descanso.

Os patinhos acabam de entrar na água, um após o outro, sem perder por um


momento a compostura do conjunto, seguindo ordeiramente a rota triunfal da sua mãe,
flanando em círculos tranquilos, como se agradecessem as palmas da multidão que,
entretanto, se propagaram num júbilo contagioso. O compositor Tristão Ventura ergue-
se, compõe a camiseta e aplaude com sinceridade!

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