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Presunção ou menoridade presumida

Otília Maria da Cruz Araújo *

Desde a Antigüidade o homem, per si, sentiu a necessidade de criar regras


que limitassem seus próprios atos para poder viver em harmonia dentro de uma
sociedade.1[1] No entanto, ele sempre buscou uma maneira de burlar essas
normas, fazendo sua vontade valer em detrimento de outrem, através, por
exemplo, da violência.

Sempre houve extremo rigor no combate aos crimes sexuais no Brasil. Nas
Ordenações e Leis do Reino de Portugal ou Código Philippino, apesar de os
delitos estarem disposto de forma diferente da atual, sem ser dividido em
capítulos e títulos, a violência com o propósito de satisfazer os prazeres sexuais
constava no Quinto Livro, sob a rubrica do Título XVIII: “Do que dorme per força
com qualquer mulher, ou trava dela, ou a leva per sua vontade”.2[2]

O Código Criminal do Império do Brasil, de 1830, cuidava dos crimes sexuais


em seu Capítulo II, sob a rubrica “Dos crimes contra a segurança da onra”, que
protegia a liberdade do corpo em função das relações sexuais, dividindo-os em
Secção, a saber: Secção I: Estupro; Secção II: Rapto; Secção III: Calúnia e
Injúria.3[3]

1[1] BONESANA, Cesare (Marquês de Beccaria). Dos delitos e das penas. Trad. Flório de Angelis. Bauru,
Edipro, 1993, p. 16.

2[2] MARCOCHI, Marcelo Amaral Colpaert. Violência real e ficta nos crimes contra os costumes. Jus
Navigandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov.2002. Disponível
em:<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3404>. Acesso em: 01 mai. 2003, p. 2.

3[3] MARCOCHI, Marcelo Amaral Colpaert. Violência real e ficta nos crimes contra os costumes. Jus
Navigandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov.2002. Disponível
em:<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3404>. Acesso em: 01 mai. 2003, p. 2.
Mais tarde, o Código de 1890 repreendia a violência com fim da satisfação
sexual, sob a rubrica do Título VII, Capitulo I, a saber: “Da violência carnal”.4[4]

Desde então, foram criados novos preceitos, com o objetivo de defender a


liberdade sexual, que surgiram como conseqüência da evolução do homem e do
ordenamento jurídico, tornando sua conduta cada vez mais delimitada, a qual
por sua vez, reflete nas sanções cominadas.5[5]

Nas Cartas Penais citadas acima, o crime de estupro era punido inicialmente
com pena de morte, posteriormente foi cominada pena de prisão de três a doze
anos acrescido do pagamento de dote. Logo depois, a punição aplicada era de
prisão de um a seis anos. Atualmente, a pena é de reclusão de seis a dez anos.
6[6]

A seguir será estudado a violência empregada na satisfação da libido e do


apetite sexual, quando empregados contra um menor de quatorze anos.

O art. 224 do Código Penal prescreve sobre presunção de violência, em sua


alínea “a” refere-se à menoridade.

Porquanto se alguém cometer um crime sexual contra vítima menor de


quatorze anos, a violência poderá ser real ou presumida. A violência real ocorre
quando não há o consentimento da vítima, aplicando a força ou grave ameaça. A
violência presumida ocorre quando há o consentimento da vítima, todavia esse
consentimento é inválido.7[7]

4[4] MARCOCHI, Marcelo Amaral Colpaert. Violência real e ficta nos crimes contra os costumes. Jus
Navigandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov.2002. Disponível
em:<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3404>. Acesso em: 01 mai. 2003, p. 2.

5[5]MARCOCHI, Marcelo Amaral Colpaert. Violência real e ficta nos crimes contra os costumes. Jus
Navigandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov.2002. Disponível
em:<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3404>. Acesso em: 01 mai. 2003, p. 2.

6[6] LOMBROSO, Cesare. A legião do crime. In Jornal do Comércio – Rio de Janeiro 22. 08.1965,
Navigandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov.2002. Disponível em:
<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3404>. Acesso em: 01 mai. 2003, p. 2.

7[7] MARCOCHI, Marcelo Amaral Colpaert. Violência real e ficta nos crimes contra os costumes. Jus
Navigandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov.2002. Disponível
em:<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3404>. Acesso em: 01 mai. 2003, p. 4.
Importante saber se essa presunção é relativa ou absoluta. Entende-se que
presunção absoluta ou juris et juris é aquela que não cabe prova em contrário e
presunção relativa ou juris tantum é aquela que é cabível prova em contrário.8[8]

Para os que entendem ser essa presunção absoluta ocorrendo a situação


ocorrerá necessariamente o crime independente do consentimento da vítima, é
que conhecemos como a teoria innocentia consilli que consiste na consciência
inocente do sujeito passivo, ou seja assume-se que a mesma não tem
maturidade suficiente para discernir seus atos, de modo que não se pode dar
valor algum ao seu consentimento.9[9]

Essa tendência é no mínimo fundamentada numa hipocrisia atual, nos


tempos em que vivemos os meios de comunicação nos conduzem a uma vida
desregrada onde prevalece o sexo e a sensualidade da mulher chegando-se
confundir a promiscuidade e a vulgaridade10[10].

Cada vez mais cedo devido a essa influência as meninas tendem a mostrar
seu corpo ou usar a sensualidade com mais freqüência imitando o que é
transmitido através da mídia como “marketing” para vender produtos. Esses
produtos são baseados na fantasia que o mundo da mídia cria.Essas fantasias
se configurariam em novelas, filmes, minisséries, teatro, músicas, revistas, show
que tornam as atrizes poderosas exercendo um certo poder de sedução e
atração perante e “diante” dos homens, ou melhor, conseguindo despertar o
desejo masculino. Percebe-se, então, que existe todo um conjunto de
antecedentes que são necessários observar antes de avaliar a maturidade
sexual, uma presunção absoluta no caso em discussão seria no mínimo inviável.

A primeira grande falha acolhida pelo nosso Código Penal é que o Direito
Penal de culpa não se adequa com presunções fáticas. Tendo em vista que cada
um deve ser culpado pelo que faz conforme sua culpabilidade e intencionalidade
(ou seja, pode-se culpar o autor por uma coisa que ele não tenha feito, acabando

8[8] GOMES, Luiz Flávio. Presunção de violência nos crimes sexuais. São Paulo: RT. 2001, p. 19.

9[9] GOMES, Luiz Flávio. Presunção de violência nos crimes sexuais. São Paulo: RT. 2001, p. 16.

10[10] GOMES, Luiz Flávio. Presunção de violência nos crimes sexuais. São Paulo: RT. 2001, p. 16.
assim com o princípio que cada um é inocente até que se prove o contrário
“presunção de violência”).11[11]

A verdadeira interpretação que se deve fazer do dispositivo supra é dando –


lhe uma interpretação relativa, de onde se verifica se a vítima era realmente
inocente, ou se sabia o que estava praticando, analisando a vida pregressa da
vítima verificando sua forma de namoro e seu comportamento diante da
sociedade, descaracterizando o crime quando a menor se mostrar experiente em
matéria sexual ou por alguma forma despudorada, sem moral e corrompida.

Deve ser acima de tudo apurada a verdade real dos fatos, defender o
princípio constitucional da presunção da inocência, no qual ninguém é
considerado culpado antes da sentença final transitada em julgado, não devendo
presumir fato que não existe, nem culpar ninguém em razão de tal presunção.

Seguindo o princípio processual penal da busca da verdade real, em que se


deve procurar no fato do que realmente aconteceu sem presunções absurdas
que levariam a uma conseqüente injustiça.

Para a psicologia do comportamento, o ser humano desenvolve–se em um


dado meio e o seu movimento defronta–se continuamente com estímulos de
toda a natureza. Constrói–se de forma a reagir sob a influência destes estímulos,
tanto internos quanto externos. Todas estas excitações provocam respostas, que
aprendidas ou não modificam o meio. Tais modificações induzem excitações que
não provocam outras respostas, as quais serão cada vez mais adaptadas à
situação ou à demanda. Portanto o meio o qual a criança se insere, influenciará
diretamente em seu comportamento perante a sociedade.

Devido ao sentimento de segurança propiciado pela presença afetiva dos


pais, e as referências que estabeleceu no ambiente, a criança faz a experiência
de seu corpo enquanto meio de ação, faz a experiência do espaço e dos objetos.
No namoro precoce a criança associa a imagem do pai à do namorado sentindo–
se segura e acreditando piamente nas doces palavras que lhe forem proferidas,
muitas vezes entregando seu corpo e consentindo realizar o desejo de seu

11[11]GOMES, Luiz Flávio. Presunção de violência nos crimes sexuais. São Paulo: RT. 2001, p. 19.
parceiro, daí ocorre a presunção legal da violência, pois esse consentimento
estaria maculado pela inocência da criança.12[12]

O círculo de pessoas com quem a criança convive, por conseguinte a


qualidade das comunicações no seio da família desempenha também um papel
determinante no comportamento da menor e conseqüentemente, na expressão e
no desenvolvimento de suas possibilidades.13[13]

A meio caminho, saindo da infância e entrando no mundo adulto enfrenta–se


a chamada adolescência que é um estágio de transição.14[14]

Este termo é geralmente usado para se referir a pessoas que se situam em


um lapso temporal do final da infância (o início desta fase é perto dos 12 anos), e
o início da fase adulta dá–se por volta dos dezenove anos.

Este período é marcado por profundas mudanças, tanto de ordem fisiológica


como também na ordem psicológica. Com o fim das mudanças fisiológicas, da
puberdade, e obtenção sociológica do status pleno de adulto encerra–se a
adolescência.15[15]

Analogamente é difícil definir o ponto onde termina adolescência e dá–se


início a idade adulta, já que esta passagem está relacionada tanto a fatores
fisiológicos (final da puberdade) como também e principalmente, a fatores
sociológicos. Esses fatores sociológicos são dos tipos mais variados podendo
mudar com determinadas situações. 16[16]

Desta forma os fatores fisiológicos dizem respeito a transformações no corpo


do indivíduo em transição, traduzindo–se na puberdade.

12[12] PIERRE, Vayer; ROCIN, Charles. Psicologia atual e desenvolvimento da criança. Trad. PERILLO
ISAAC, Maria José; GUROVITZ, Berta Halpern. São Paulo: Manoele Dois, 1990, p. 31.

13[13] PIERRE, Vayer; ROCIN, Charles. Psicologia atual e desenvolvimento da criança. Trad. PERILLO
ISAAC, Maria José; GUROVITZ, Berta Halpern. São Paulo: Manoele Dois, 1990, p. 31.

14[14] MCKINNEY, John Paul; FITZGERALD, Hiram E; STROMMEN, Ellen A. Psicologia do desenvolvimento –
O adolescente e o adulto jovem. Trad. CABRAL, Álvaro. Rio de Janeiro: Campus, 1983, p 15.

15[15] MCKINNEY, John Paul; FITZGERALD, Hiram E; STROMMEN, Ellen A. Psicologia do desenvolvimento –
O adolescente e o adulto jovem. Trad. CABRAL, Álvaro. Rio de Janeiro: Campus, 1983, p 15.

16[16] MCKINNEY, John Paul; FITZGERALD, Hiram E; STROMMEN, Ellen A. Psicologia do desenvolvimento –
O adolescente e o adulto jovem. Trad. CABRAL, Álvaro. Rio de Janeiro: Campus, 1983, p 15.
A sociedade possui todo um conjunto de crenças, idéias, rituais e práticas
que marcam a entrada das crianças na adolescência. Essas condutas são
essencialmente culturais variando de povo para povo, que produz uma mudança
de status nas crianças que a partir daí serão vistas de formas diferentes,
integrando–se ao seu grupo social também de uma forma diferente que era
anteriormente.17[17]

Certas sociedades possuem um conjunto de ritos de iniciação ou de


puberdade que tornam bem clara essa transição, como, por exemplo, os
Massais (africanos), levando as crianças para caçar; outras tribos africanas
mutilavam o clitóris da criança, para que ela não sentisse nenhum prazer sexual;
no mundo ocidental nós temos a festa de quinze anos, onde as moça é
apresentada a sociedade como debutante, podem assumir aspectos de
observância religiosa, como o Crisma Católico e o Bar Mitzvah Judaíco, sendo
interessante observar a variação de detalhes, intensidade e dureza com que
esses ritos são executados todos possuindo um objetivo semelhante.

Todas essas iniciações dramáticas visam esclarecer a descontinuidade no


ciclo do desenvolvimento, fazendo com o que o mesmo se processe em
patamares bem definidos, criança, adulto e velhice.

A adolescência como um desses patamares do desenvolvimento humano,


tem uma história relativamente curta, tendo em vista que o conceito de criança e
família mudou muito de um período cultural para outro.18[18]

Um dos fenômenos mais preocupantes relacionados a uma visão equivocada


da sexualidade é a gravidez precoce e as doenças sexualmente transmissíveis,
que traz sérias conseqüências para a vida dos adolescentes envolvidos e de
suas famílias.

Relação sexual é um tipo particular de integração social possuindo limites


individuais e sociais. Os parâmetros de uma sociedade dependendo da época e

17[17] MCKINNEY, John Paul; FITZGERALD, Hiram E; STROMMEN, Ellen A. Psicologia do desenvolvimento –
O adolescente e o adulto jovem. Trad. CABRAL, Álvaro. Rio de Janeiro: Campus, 1983, p 17.

18[18] MCKINNEY, John Paul; FITZGERALD, Hiram E; STROMMEN, Ellen A. Psicologia do desenvolvimento –
O adolescente e o adulto jovem. Trad. CABRAL, Álvaro. Rio de Janeiro: Campus, 1983, p 17.
da cultura poderá sofrer variações, podendo ser aceitos ou não pelos indivíduos.
Muitos conflitos sexuais surgem da não aceitação dos tabus que a sociedade
criou sob a sexualidade humana, gerando uma certa dificuldade para passarmos
sobre o que poderia ser considerado como normal ou como patológico, em uma
relação sexual. Assim a convivência humana é determinada pela cultura, mas ao
mesmo tempo, o ser humano, também interfere e a modifica. Portanto, a
sexualidade é um conceito cultural dinâmico que está em constante mutação, ou
seja, a sociedade estabelece um padrão cultural, tanto sexual como em outras
áreas do comportamento humano, exemplificado pela área afetiva e emocional,
mas existem pessoas que podem sair deste padrão e estabelecer um
comportamento próprio avançado ou além do seu tempo, como também existem
pessoas que tendem a amadurecer mais rápido através das experiências vividas
em seu meio social. Ocorre dessa maneira quando a criança é abandonada
pelos seus pais e fica perambulando pelas ruas, ou orfanatos ou até mesmo na
casa de seus parentes, sendo obrigada a cuidar de se mesma desde cedo,
adquirindo assim uma larga vivência, muitas vezes tornando–se rude.19[19]

Nunca o adolescente teve tanto acesso a informação como está tendo nos
dias atuais, ao mesmo tempo, paradoxalmente, os adolescentes estão com
índices alarmantes de gestações indesejadas e abortos clandestinos.20[20]
Fenômeno que se repete tanto no Brasil como em outros países mais
desenvolvidos.

Os meios de comunicação trazem para dentro de casa uma infinidade de


informações e estímulos que nem sempre o adolescente tem condição de digerir.
Os adolescentes e os pais são bombardeados por estes conteúdos sem que
tenham um espaço de debate ou questionamento destas informações, sem que
possam formular perguntas e fazer críticas. Enfim, o diálogo não é difícil apenas

19[19] MCKINNEY, John Paul; FITZGERALD, Hiram E; STROMMEN, Ellen A. Psicologia do desenvolvimento –
O adolescente e o adulto jovem. Trad. CABRAL, Álvaro. Rio de Janeiro: Campus, 1983, p 17.

20[20] As informações obtidas pelos adolescentes através dos meios de comunicação, por um lado faz uma
prevenção quanto às doenças sexuais, informando sobre os métodos de precaução destas, e por outro lado
estimulando e induzindo a prática do sexo.
entre pais e filhos, mas também entre comunidade médica ou escolas com os
pais e adolescentes.

Na adolescência a sexualidade torna–se intensa devido a diversos


fatores:21[21] alterações hormonais e conseqüentes alterações no aspecto
físico, maturação e desenvolvimento dos órgãos sexuais, mudança no
relacionamento entre jovens do mesmo sexo e de sexo diferente, busca de
identidade e propensão a enfrentar desafios e novas experiências. A sexualidade
implica na convivência do jovem com o seu corpo, com a sua mente e com as
pessoas de sua relação.

As novas gerações se encarregaram de destruir muitos mitos e implementar


novos conceitos, em relação à sexualidade e o relacionamento entre os
indivíduos. A busca da liberdade individual da possibilidade de tomar decisões e
definir o que é ou não adequado, tem sido o preponderante.

Os pais dos atuais adolescentes foram protagonistas de mudanças


significativas nos conceitos de sexualidade e superam diversos mitos e tabus,
como virgindade; papel masculino e feminino; significado do casamento e tantos
outros. Entretanto, alguns deles têm dificuldades de assimilar os conceitos dos
filhos quando estes revisam e aperfeiçoam as verdades que as gerações
anteriores consideravam definitivas. Uma dessas novas conquistas é o “ficar”
dos atuais adolescentes. O termo define um relacionamento entre um garoto e
uma garota que sem dúvida é bem mais evoluído do que aquele que seus pais
vivenciaram. Suas principais características estão no relacionamento sem
compromisso e sem complicação, com prazo de validade durando apenas
naquele local e momento, não exigindo um amanhã. Mas talvez, sua marca mais
significativa seja a liberdade para que qualquer uma das partes tome a iniciativa;
isto significa que também a menina pode fazer escolhas e o fato dela não ficar

21[21] MONTARDO, João. Conceitos iniciais. Disponível em:


<http://planetaterra.com.br/saude/montardo/desenvolvimento/gsexualidade1.htm>. Acesso em: 19 abr. 2003, p
1.
não imprime nenhum rótulo, algo que ocorria freqüentemente em outras
gerações.22[22]

Em suma, o “ficar” é um passo adiante na trajetória aparentemente infinita na


busca de relacionamentos mais satisfatórios para ambos os parceiros desde as
primeiras descobertas. O “ficar” é um novo modo de fazer um importante
aprendizado afetivo, permitindo o ingresso nos meandros da conquista e da
descoberta da sexualidade. Na sabedoria dos jovens no momento antes de ficar
em definitivo (namorar), é preciso experimentar sem medo de cometer
erros.23[23]

Nas gerações passadas as meninas quando chegavam na idade escolar, os


pais as mandavam para um colégio interno, e estas saiam de lá preparadas
(prendadas) para o casamento. Nos dias de hoje não existem mais meninas de
doze anos, e sim, moças que muitas vezes com esta idade já têm uma vasta
experiência sexual. Destarte ocorre que em lugar delas pensarem em casar e
constituir uma família, preferem “ficar” sem compromisso.

De todas as reflexões e estudo sobre a infância e a adolescência, se alguma


coisa pode ser razoavelmente consensual é que, crescentemente, as crianças
estão mais sozinhas ou mais na convivência com seus parceiros da rua, do que
no seio familiar.24[24] O pai, a mãe, ou qualquer outro parente está se tornando
uma figura rarefeita.25[25]

A evolução pela qual a sociedade brasileira passa, em especial desde 1940,


quando foi publicado o atual Código Penal, é extraordinária. Desde os costumes,

22[22] MONTARDO, João. Ficando para não ficar. Disponível em:


<http://planeta.terra.com.br/saude/montardo/desenvolvimento/gsexualidade6.htm>. Acesso em: 19 abr. 2003,
p. 1.

23[23] MONTARDO, João. Ficando para não ficar. Disponível em:


<http://planeta.terra.com.br/saude/montardo/desenvolvimento/gsexualidade6.htm>. Acesso em: 19 abr. 2003,
p. 1.

24[24] Como hoje em dia, o pai e a mãe trabalham para sustentar a família (antigamente isso era
responsabilidade exclusiva do pai), não têm tempo para a convivência diária com os filhos, chegando em casa
apenas à noite, de modo que as crianças por sentirem a solidão desde cedo, vão buscar apoio e conforto nos seus
conhecidos da rua.

25[25] BALLONE, GJ. Adolescência e puberdade 1. Disponível em:


<http://sites.uol.com.br/gballone/infantil/adolesc1.htm>. Acesso em: 19 abr. 2003, p. 1.
o comportamento, até à Ciência e à Tecnologia, tudo se modificou. O linguajar, a
forma aberta com que o tema “sexo” passou a ser abordado, o grande acesso à
mídia e, conseqüentemente, informações. As doenças sexualmente
transmissíveis, como a AIDS, trouxeram ao público uma gama muito grande de
informações a respeito de prevenção à doença, vulgarizando as relações
sexuais. O problema da gravidez precoce também fez com que as escolas se
preocupassem com o assunto, tentando orientar os alunos a respeito de
métodos de contracepção.26[26]

As mudanças são inevitáveis. Os costumes mudam a cada ano, a cada dia. A


velocidade com que os veículos de comunicação vêm trazendo novas
informações, e a facilidade de acesso a elas, vem modificando a forma com que
passamos a nos ver, e também agilizando o conhecimento e socializando a
informação. Não só pela influência dos meios de comunicação, mas, também
pela influência de nós mesmos, a cada tempo há uma revolução diferente a ser
feita.27[27]

Todos esses problemas pelos quais passamos hoje trouxeram para a


imprensa, de uma forma bastante veemente, orientações a respeito de sexo para
os jovens (e também adultos desinformados), pois estes são o público alvo das
campanhas de prevenção às doenças e à gravidez precoce. Por outro lado, não
há que se esquecer que muitas vezes o assunto sexo foi banalizado por estes
mesmos veículos de comunicação de massa.28[28]

Como exemplo dessa banalização, tem-se a Internet, que possibilita livre


acesso a sites pornográficos, sem qualquer ressalva. Mesmo que, no Brasil, a
Internet ainda não seja acessível a todos, este é um poderoso meio de

26[26] CAMARGO, Laura Valcazara. A possibilidade do comportamento provocador da vítima menor de


quatorze anos. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0048.html#_ftnref7>.
Acesso em: 19 abr. 2003, p. 2.

27[27] CAMARGO, Laura Valcazara. A possibilidade do comportamento provocador da vítima menor de


quatorze anos. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0048.html#_ftnref7>.
Acesso em: 19 abr. 2003, p. 1.

28[28] CAMARGO, Laura Valcazara. A possibilidade do comportamento provocador da vítima menor de


quatorze anos. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0048.html#_ftnref7>.
Acesso em: 19 abr. 2003, p. 2.
comunicação que vem crescendo de forma espantosa nos últimos anos. Quanto
mais a Internet se torna acessível, mais pornografia ela ostenta, pois não há
nenhum critério de hospedagem de páginas pessoais, desde que não firam a lei
(como a pornografia infantil). Quanto mais o tempo passa (em se tratando de
tecnologia em computação, pode-se contar por meses) mais cedo as crianças
têm acesso a esse tipo de “informação”, já que é difícil um controle por parte dos
pais.29[29]

O sexo tornou-se para as adolescentes um ato que deve ser praticado


somente para o prazer, pois é dessa maneira que se é abordado na mídia; o
nudismo também é trazido de forma normal, como se vê em novelas ou filmes
exibido na televisão.

Porém, é claro, não há que se esquecer que o País é de imensas terras e que
não se pode contar com a acessibilidade da informação trazida pela imprensa
por todos. Não se pode dizer que todos os adolescentes menores de quatorze
anos têm um nível de informações que possibilita um consentimento válido, pois
isso, seria excluir os que não têm acesso a essas informações (o que não se faz
tão raro assim). Não se pode, pois, comparar um adolescente que vive em
grandes centros, como as capitais São Paulo e Rio de Janeiro, com mesmo
adolescente que mora no sertão nordestino. Esse, por muitas vezes não sabe
sequer ler.30[30]

Frisa-se aqui a palavra adolescente, pois não vislumbro a possibilidade de a


criança dar um consentimento válido, salvo raríssimas exceções, que devem ser
analisadas com extrema cautela.31[31]

29[29] CAMARGO, Laura Valcazara. A possibilidade do comportamento provocador da vítima menor de


quatorze anos. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0048.html#_ftnref7>.
Acesso em: 19 abr. 2003, p. 2.

30[30] CAMARGO, Laura Valcazara. A possibilidade do comportamento provocador da vítima menor de


quatorze anos. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0048.html#_ftnref7>.
Acesso em: 19 abr. 2003, p.3.

31[31] CAMARGO, Laura Valcazara. A possibilidade do comportamento provocador da vítima menor de


quatorze anos. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0048.html#_ftnref7>.
Acesso em: 19 abr. 2003, p. 3.
Porém, mesmo que a nossa legislação fixe uma faixa etária que considera
ainda imatura para o sexo (menores de quatorze anos), ainda será possível, se o
magistrado ou tribunal acreditar que se trata de presunção relativa de violência,
provar que aquela vítima tinha plena capacidade de consentir com a relação e
assim o fez. Portanto, a faixa etária serviria somente como um parâmetro para
que se soubesse a partir de quantos anos não haveria, de forma alguma (a não
ser por eventual incidência das outras alíneas do artigo 224 do Código Penal), a
violência ficta. Por exemplo, pode-se dizer que se a “ofendida” for maior de
quatorze anos, não haverá violência ficta, portanto, não haverá crime. Se a
vítima for menor de quatorze anos, pode se dizer que talvez tenha havido um
crime com violência ficta, desde que não reste provado que essa vítima tinha
autodeterminação sexual. Isso seria o ideal. Dessa forma, havia uma
individualização do crime, respeitando as particularidades de cada
ofendido.32[32]

O melhor critério de fixação da autodeterminação sexual de uma pessoa é o


critério da antiga União Soviética, que dizia da “madurez sexual da vítima”.
Somente haveria violência ficta se a vítima não tivesse atingido a sua maturidade
sexual.33[33]

Para que se possa afirmar que nos casos de violência ficta os princípios da
Vitimologia possam ser usados, necessário se faz demonstrar que em muitos
casos uma menor de quatorze anos pode dar um consentimento válido. Isso se
mostra imprescindível pois, se restar provado que, em nenhuma hipótese, a
menor anteriormente mencionada é capaz de dar o seu consentimento, não há
que se falar em comportamento provocador dessa vítima.34[34]

32[32] CAMARGO, Laura Valcazara. A possibilidade do comportamento provocador da vítima menor de


quatorze anos. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0048.html#_ftnref7>.
Acesso em: 19 abr. 2003, p. 2.

33[33] CAMARGO, Laura Valcazara. A possibilidade do comportamento provocador da vítima menor de


quatorze anos. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0048.html#_ftnref7>.
Acesso em: 19 abr. 2003, p. 3.

34[34] CAMARGO, Laura Valcazara. A possibilidade do comportamento provocador da vítima menor de


quatorze anos. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0048.html#_ftnref7>.
Acesso em: 19 abr. 2003, p. 2.
Por outro lado, quando se afirma que uma pessoa estava em plenas
condições de dar o seu consentimento, de que tinha completa certeza do que
estava fazendo, é claro, pode-se dizer que essa pessoa pode ter um
comportamento provocador. Aqui, não há que se dizer somente da menor de
quatorze anos, mas também do alienado mental, que pode, em algumas
hipóteses, ter plena ciência dos assuntos relacionados ao sexo, pois não é raro
que o doente mental seja alheio somente a alguns assunto e que seja
completamente capaz de discernir a respeito de outros, como acontece com as
pessoas que têm distúrbios irregulares, esporadicamente, mas que vive uma
vida normal e na maior parte do tempo sabe exatamente o que estar
fazendo.35[35]

A Legislação brasileira resguarda a liberdade sexual do indivíduo com


bastante seriedade, imputando severas penas a quem infringe os preceitos nela
vigentes. De uma forma bastante interessante, o legislador pátrio protegeu
também, e de maneira ainda mais rigorosa, a sexualidade de certos indivíduos
que, de acordo com a lei penal, não são capazes ou não podem dar seu
consentimento para ato de tal natureza.36[36]

Porém, este conceito vem sendo modificado, principalmente com o advento


do Estatuto da Criança e do Adolescente, que vê as crianças e adolescentes
como sujeitos de direitos e obrigações. O ECA entende que o adolescente tem
capacidade de discernir quanto às infrações penais, imputando medidas sócio-
educativas aos infratores, como a internação em estabelecimento
educacional.37[37]

35[35] CAMARGO, Laura Valcazara. A possibilidade do comportamento provocador da vítima menor de


quatorze anos. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0048.html#_ftnref7>.
Acesso em: 19 abr. 2003, p. 2.

36[36] CAMARGO, Laura Valcazara. A possibilidade do comportamento provocador da vítima menor de


quatorze anos. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0048.html#_ftnref7>.
Acesso em: 19 abr. 2003, p. 1.

37[37] CAMARGO, Laura Valcazara. A possibilidade do comportamento provocador da vítima menor de


quatorze anos. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0048.html#_ftnref7>.
Acesso em: 19 abr. 2003, p. 1.
Se este moderno Estatuto tem uma visão mais ampla e atual quanto ao
crime, como não considerar as evoluções no campo sexual do indivíduo? Como
não concordar que o adolescente de hoje tem plena capacidade de consentir
com uma relação sexual? Se o adolescente pode ser punido com medidas sócio-
educativas pelo ato infracional que cometer, por que não poderia dar um
consentimento válido em uma relação sexual?38[38]

Se o legislador considerou que um adolescente tem capacidade para


discernir o certo do errado, que pode ser até internado porque cometeu ato
infracional, isso mostra que o legislador de 1990 já acreditava que o adolescente
dessa época já tinha sim capacidade de dar um consentimento válido porque, se
tomarmos o exemplo de um crime cometido por um adulto, e um adolescente
colaborar para essa infração (havendo concurso de pessoas entre eles, art. 29,
caput, do Código Penal) ele poderá ser punido com tal internação. Se ele foi
punido porque aderiu à vontade ou proposta da pessoa adulta, considera-se
então que esse seu consentimento seja válido.39[39]

Por que, então, não considerar válido o consentimento do adolescente menor


de 14 anos quanto aos assuntos relacionados ao sexo? Se acaso ele possa
consentir com um ato infracional (crime ou contravenção), com mais propriedade
pode-se dizer que esse adolescente já tem capacidade para consentir com uma
relação sexual. Percebe-se, então, que o legislador de 1990 (ECA) vê de forma
bastante diferente do legislador de 1940 (Código Penal) a capacidade de
compreensão do adolescente. O Estatuto da Criança e do Adolescente está bem
mais atualizado quanto aos novos costumes e maior nível de informação dos
adolescentes de hoje, que já não mais conservam aquela inocentia consilli que o
legislador de 1940 tanto tentou resguardar. O ECA traz a realidade à tona,
mostrando que as legislações sempre devem se modernizar. Para se sujeitar a
medidas punitivas do ECA a vontade do adolescente é válida. Para anuir a um

38[38] CAMARGO, Laura Valcazara. A possibilidade do comportamento provocador da vítima menor de


quatorze anos. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0048.html#_ftnref7>.
Acesso em: 19 abr. 2003, p. 1.

39[39] CAMARGO, Laura Valcazara. A possibilidade do comportamento provocador da vítima menor de


quatorze anos. Disponível em: <http://www.advogadocriminalista.com.br/home/artigos/0048.html#_ftnref7>.
Acesso em: 19 abr. 2003, p. 6.
ato sexual não seria? Que diferença fundamental existiria entre compreender o
caráter ilícito do fato criminoso (dentro de certas limitações, é verdade) e
compreender o caráter sexual de certos comportamentos, ainda mais quando se
considera que esta última, em geral, surge antes daquela outra? Que sentido
tem, destarte, depois do ECA, a presunção legal do art. 224, alínea “a” do
Código Penal? No entanto, não há que se esquecer dos menores de 12 anos,
que, mesmo pelo ECA, apesar de poderem cometer ato infracional, são punidas
somente com medidas protetivas. Então, para os menores de 12 anos, o artigo
supra citado, ainda é bastante válido. Não se pode dizer mais que o adolescente
menor de quatorze anos é imaturo para a compreensão do caráter sexual do ato.
A ficção jurídica do artigo 224, alínea “a” do Código Penal, que diz que esse
adolescente ainda mantém sua inocentia consilli, não tem mais sentido, a não
ser pela sua aplicação à vítima criança, ou seja, menor de 12 anos, analisando-
se, como dito acima, cada situação.40[40]

A capacidade da vítima de responder pelos seus atos, na legislação


brasileira, está ligada à sua faixa etária e/ou a sua sanidade mental. Os
alienados mentais não têm capacidade de responder por algumas de suas
ações, ou por qualquer uma de suas ações, dependendo da sua enfermidade.
Portanto, não podem ser consideradas vítimas provocadoras, já que qualquer
provocação que venha de sua parte é considerada nula, ineficaz. Por outro lado,
aqui foi exposto que o adolescente menor de quatorze anos tem capacidade de
consentir, porque, até mesmo para a nossa legislação, a mais recente (ECA), ele
pode ser responsabilizado por seus atos e deverá cumprir uma pena, que
poderá, inclusive, chegar à internação. Mas, como já foi dito, considera-se que a
criança (menor de doze anos) não é capaz de responder por seus atos e,
portanto, a seu comportamento provocador não pode ser considerado.41[41]

Tomando-se por base o artigo 224 do Código Penal, o Estatuto da Criança e


do Adolescente e os estudos de Vitimologia, chega-se à conclusão de que o

40[40] CAMARGO, Laura Valcazara, op. cit. p. 6.


41[41] Idem, p. 8.
adolescente menor de quatorze anos pode ter um comportamento provocador e,
conseqüentemente, ser uma vítima provocadora. Mas, como no artigo 224,
acima referido, a violência real não é usada, pois este trata somente da violência
ficta, diz-se, então, que se esse adolescente manter relação sexual com alguém,
ele não poderá ser chamado de “vítima”, porque sequer houve crime. Não houve
violência real (e nem pode se considerar a violência ficta, devido a capacidade
de discernimento desse adolescente), o adolescente tinha capacidade de
entender o que estava se passando e dar um consentimento válido e, portanto,
não houve crime.42[42]

Porém, mesmo que tenha havido um comportamento provocador por parte da


vítima, a violência nunca é justificável. Não se pode “perdoar” um crime sexual
porque a vítima provocou o agente. O que se pode, no máximo, é diminuir a
pena cabível ao criminoso, já que, teoricamente, sem a provocação da vítima,
não haveria o crime.43[43]

Deve-se, portanto, analisar de forma minuciosa a personalidade, caráter,


cultura e comportamento da menor (maior de12 e menor de 14 anos), para que,
somente assim, perceba-se se essa tem a capacidade de dar consentimento do
ato praticado, para posteriormente, verificar se este ato é válido ou não perante a
justiça.

Proposta de Lege Ferenda

No sentido de complementariedade, e ainda na predisposição de dar ao


trabalho monográfico o tom de praticidade, resolvemos propor uma modificação
legislativa. Tal iniciativa não visa isolar, mesmo porque somos cientes de nossas
limitações, todos os problemas que enfeixam a temática da presunção da
violência, especificamente quanto a menoridade, mas não poderíamos nos furtar

42[42] Idem, p. 9.

43[43] CAMARGO, Laura Valcazara, op. cit. p. 9 (nota n. 64).


a exercitar a chamada criação legal. Assim foi formulada a seguinte norma
penal, em substituição ao disposto no artigo 224, alínea “a”, do Código Penal.

Art. 224 A violência presumida deve ser considerada:

I – absoluta:

a) Quando a vítima é alienada ou débil mental, e o agente tinha


ciência de tal circunstância;

b) Quando a vítima não pode por qualquer outra causa, oferecer


resistência;

II – relativa:

a) Quando a vítima não é maior de 14 anos, devendo incidir sobre a avaliação


do discernimento juvenil os parâmetros sociais e culturais.

A justificativa de nossa proposta vem baseada em todo o contexto já


anteriormente desenvolvido, observando criteriosamente que cada criança e
adolescente tem sua personalidade construída através de vetores variáveis, que
não podem ser valorados sem levar em conta as semânticas culturais e sociais.

Desta forma apura-se o sistema e o aproxima do razoável em matéria de


norma complementar ao tipo criminal. Atualizando as formas, nos aproximamos
dos conceitos de modernidade em termos de costumes, trazendo ao sistema o
arejamento necessário. A justiça assim torna-se deveras perceptível, sendo este
o nosso propósito.

CONCLUSÃO

O presente trabalho foi desenvolvido no intuito de demonstrar que a


interpretação mais correta que se deve fazer da alínea “a”, do artigo 224, do
Código Penal, dando-lhe conotação relativa a presunção de violência, em crimes
sexuais, para “vítimas” menores de quatorze anos. O Direito é algo dinâmico, ele
não pára no tempo, mas necessário se faz que ele se adeqüe a evolução da
sociedade. E a sociedade vive em constante mudança! O comportamento sexual
de adolescentes menores de quatorze anos na época em que foi redigido o
Código penal, que entrou em vigência em 1940, mudou consideravelmente.
Nesse sentido, pode-se extrair a seguinte conclusão de todo o exposto nessa
monografia:

a) A criança é produto do meio, e se desenvolverá de acordo com as


referências que estabeleceu com as pessoas de sua família;

b) O indivíduo na adolescência está construindo uma identidade própria, e


sua vida, nesse período, é repleta de mudanças;

c) Os parâmetros de uma sociedade, dependendo da época e da cultura,


poderão sofrer variações, podendo ser aceitos ou não pelos indivíduos;

d) Na adolescência a sexualidade torna-se intensa, devido a fatores


hormonais e maturação dos órgãos sexuais;

e) O enorme acesso aos meios de comunicação faz com que os


adolescentes sintam vontade de experimentar aquilo que lhe é mostrado. Dessa
forma, o sexo tornou-se algo comum e banal e o “ficar” (mesmo sem conjunção
carnal) é um fenômeno muito natural nessa fase;

f) A doutrina e a jurisprudência brasileira continuam aceitando a presunção


de violência prevista no artigo 224 do Código Penal. Uns a encaram como
presunção iuris tantum e outros como iuris et de iure;

g) Referida presunção legal conflita com o princípio constitucional da


presunção de inocência;

h) As presunções de violência das alíneas “b” e “c” do artigo 224 do Código


Penal são de natureza relativa (iuris tantum);

i) Igualmente, a despeito do descabido critério utilizado pelo legislador, a


presunção de violência da alínea “a” também é de natureza relativa;
j) Em 1990, como a vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente,
estabeleceu-se a diferença em relação a idade, conferindo aos adolescentes
(maiores de doze anos) uma “certa” capacidade de compreensão, e
responsabilidade pelo ato infracional que vier a cometer, inclusive com a medida
da internação;

k) Dessa forma, o adolescente pode consentir validamente frente a um ato


sexual, dependendo do caso concreto, pois desde 1990, o adolescente tem
vontade juridicamente relevante; o mesmo não pode ser dito, em princípio,
quanto à criança.

BIBLIOGRAFIA

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Flório de Angelis. Bauru, Edipro, 1993.

MARCOCHI, Marcelo Amaral Colpaert. Violência real e ficta nos crimes


contra os costumes. Jus Navigandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov.2002. Disponível
em:<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3404>. Acesso em: 01 mai.
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LOMBROSO, Cesare. A legião do crime. In Jornal do Comércio – Rio de


Janeiro 22. 08.1965, Navigandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov.2002. Disponível em:
<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3404>. Acesso em: 01 mai. 2003.

GOMES, Luiz Flávio. Presunção de violência nos crimes sexuais. São Paulo:
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PIERRE, Vayer; ROCIN, Charles. Psicologia atual e desenvolvimento da


criança. Trad. PERILLO ISAAC, Maria José; GUROVITZ, Berta Halpern. São
Paulo: Manoele Dois, 1990.
* Bacharela em Direito

ARAÚJO, Otília Maria da Cruz. Presunção ou menoridade Presumida.Disponível


em <http://www.ufsm.br/direito/artigos/penal/presuncao.htm>. Acesso em 02 de
outubro de 2006.

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