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Crianças brasileiras das classes média e alta estão mal preparadas

para o esporte e sem vontade de se exercitar. E pais e escolas não


ajudam, segundo Luiz Roberto Rigolin, autor de "Desempenho
Esportivo: Treinamento com Crianças e Adolescentes" (Phorte, 631
págs., R$ 89).
Doutor em educação física com pós-doutorado em filosofia pela USP,
Rigolin, 43, se dedica à formação de atletas e se preocupa com o
desenvolvimento das habilidades físicas na infância. Aqui, ele fala das
dificuldades atuais da educação motora.
Folha - Nunca se falou tanto de atividade física, mas as crianças estão
cada vez mais sedentárias. O que acontece?
Luiz Roberto Rigolin - A prática de exercícios resulta do
desenvolvimento motor, processo que começa desde que a criança
nasce. Ela precisa experimentar todas as possibilidades de
movimento para desenvolver habilidades físicas. Hoje tem menos
oportunidade de fazer isso. Estamos criando uma geração de
analfabetos motores.
Como chegamos a isso?
Começa pela reclusão urbana. A grande preocupação dos pais é com
a segurança. Têm medo de soltar o bebê, ele pode se machucar.
Quando o filho começa a crescer, não pode brincar na rua, por causa
do risco de assalto...
O outro elemento é a tecnologia. Com os brinquedos tecnológicos a
criança desenvolve várias habilidades cognitivas, sem dúvida, mas
muito pouco da parte motora.
E as escolas também não querem ter problemas com pais
preocupados em proteger os filhos, então dão poucas opções para a
criança experimentar seu corpo de forma mais solta, quando o risco
de se machucar é maior.
Nesse caso, não adianta pagar uma escola cara, com a ideia de dar
mais oportunidades para o filho se desenvolver?
Pode ser até pior. A inteligência motora está na periferia, onde as
crianças não são superprotegidas como as de classes média e alta e
por isso têm chance de experimentar os movimentos de forma mais
livre. Também têm menos acesso a brinquedos tecnológicos, então
têm que encontrar outras formas de brincar: soltar pipa, jogar taco.
Por isso a maioria dos atletas de esportes complexos não vem das
classes A e B.
A educação motora inclui esfolar o joelho às vezes?
Sim, isso é fundamental, mas também é natural o adulto querer
ajudar a criança para que ela não se machuque.
Como os pais podem ajudar?
Com bebês, eles precisam estruturar a casa para deixar a criança
subir no sofá, empurrar e puxar objetos etc. E precisa ter alguém
acompanhando. Se é o pai, a mãe ou a babá que vai fazer isso, não
importa, o que interessa é que a criança tenha oportunidade de
experimentar.
Depois, dos três aos sete anos, os pais podem fazer com que a
criança adquira o gosto pela atividade física. Isso não é feito só em
casa, inclui a escola, o parque, a rua.
E as atividades dirigidas, como as escolas de esportes?
Muitos pais e mães acham que vão incentivar a atividade física
colocando o filho na natação, na escolinha de futebol. Mas às vezes o
que a criança quer é andar de bicicleta ou de skate. A grande
colaboração que os pais podem dar é mostrar as alternativas de
atividades para o filho descobrir o seu caminho.
Se a criança mostra talento em alguma modalidade, como os pais
podem estimular?
Isso é um problema porque, a partir do momento em que o filho
passa a praticar um esporte, os pais já querem que ganhe medalhas.
Começa a pressão por desempenho, que vem também do técnico, do
diretor do clube. Imagine como a criança fica nessa história de
precisar atender as expectativas de todas essas pessoas.
É possível recuperar habilidades motoras que não foram
desenvolvidas na infância?
Dá para melhorar, mas nunca vai ser a mesma coisa. E os pais e os
professores têm que estar preparados para ensinar essa criança mais
lentamente e sem forçá-la a fazer atividades que estão fora de suas
possibilidades.

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